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CATIVO À RAZÃO

Vincent Cheung

editora monergismo
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www.editoramonergismo.com.br

1a edição, 2009

1000 exemplares

Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto


Revisão: Marcelo Herberts
Capa: Raniere Maciel Menezes

Proibida a reprodução por quaisquer meios,


salvo em breves citações, com indicação da fonte.

Todas as citações bíblicas foram extraídas da


versão Nova Versão Internacional (NVI),
© 2001, publicada pela Editora Vida,
salvo indicação em contrário.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Cheung, Vincent

Cativo à Razão / Vincent Cheung, tradução Felipe Sabino de Araújo


Neto – Brasília, DF: Editora Monergismo, 2009.

208p.; 21cm.

Título original: Captive to Reason


ISBN 978-85-

1. Apologética 2. Teologia 3. Filosofia 4. Bíblia

CDD 230
SUMÁRIO

Prefácio à edição de 2009 6

1. Começando com a resposta 7

2. Cativo à razão 10

3. Ocasionalismo e empirismo 13

4. Breves respostas a diversas críticas 21

5. O argumento ateísta a partir da existência 30

6. O argumento transcendental para o materialismo 32

7. Mas o que é conhecimento? 35

8. Onde está a refutação? 37

9. A incoerência do empirismo 38

10. A manobra fatal 41

11. Falácias e falácias sobre falácias 44

12. Invencibilidade, irrefutabilidade e infalibilidade 47

13. Excluído por necessidade 49

14. “Deus é Lógica” 50

15. Cristo, a Razão 52

16. Conhecimento inato do homem 53

17. Fundamento comum 55

18. Axioma e prova 56

19. Protegendo sua fé 57

20. A futilidade dos argumentos pragmáticos 58


21. Sem “fé” suficiente para ser ateu? 60

22. Quando existem múltiplas perspectivas 62

23. Apologética para estudantes cristãos 64

24. Metade vazio, metade cheio 66

25. O prático e o existencial no evangelismo 69

26. Deus e a linguagem 73

27. Idiotas profissionais 74

28. Um idiota com qualquer outro nome 87

29. Apologética de poder 93

30. O pregador fala filosofia 113


Prefácio à edição de 2009

O presente livro é uma coletânea de breves artigos que tratam


principalmente de filosofia e apologética cristã. Esses artigos explicam e
aplicam meu pensamento a perguntas e contextos específicos, representando
assim um suplemento apropriado ao que já escrevi previamente. E porque
seria melhor usar o livro como suplemento, encorajo você a ler meus
1
primeiros textos sobre esses assuntos antes de prosseguir.
Muitos dos artigos foram escritos como respostas a mensagens de
leitores, e incluo com frequência uma versão editada da pergunta original em
2
cada uma de minhas respostas. Modifiquei ou suprimi os nomes dessas
pessoas a fim de proteger sua privacidade. Isso não representa problema, pois
as declarações referidas não contribuem para a essência real dos artigos,
fornecendo apenas o contexto em que apresento minhas respostas e
explicações.
Para distinguir claramente as palavras dessas pessoas, suas declarações
foram ajustadas e exibidas com uma fonte diferente. Isso eliminou a
necessidade de se precisar sempre dizer que determinado artigo foi escrito em
resposta a uma pergunta, ou esclarecer que certa porção do texto é mensagem
de um leitor.
1
1. Começando com a resposta

Sabemos que o axioma da revelação bíblica é verdadeiro porque Deus o


revelou, e sabemos que Deus o revelou porque o mesmo axioma logicamente
inegável assim o diz. Como diz a Confissão de Westminster: “A autoridade
da Escritura Sagrada, razão pela qual deve ser crida e obedecida, não depende
do testemunho de qualquer homem ou igreja, mas depende somente de Deus
(que é a própria Verdade) que é o seu autor; tem, portanto, de ser recebida,
porque é a Palavra de Deus”.
Deixe-me usar o assim chamado “problema do mal” para fazer uma
2
consideração a respeito. Ora, desenvolvi uma resposta ao problema do mal,
mas ela não seria necessária se não houvesse antes de tudo um “problema” do
mal, isto é, se não houvesse um argumento contra o cristianismo
desenvolvido a partir da existência do mal. Por si só a existência do mal não é
uma disputa ou objeção, e assim não exige de nós uma resposta, defesa ou
explicação. Uma resposta apenas se torna necessária quando alguém faz uso
do mal para formular uma objeção contra o cristianismo.
Embora eu já tivesse reconhecido a existência do mal e mesmo
refletido a seu respeito, em momento algum, até um tempo após minha
conversão, havia considerado o “problema” do mal. Nunca me ocorrera que o
mal pudesse ser a base de uma crítica ao cristianismo, e mesmo agora a ideia
parece tola. Deus pode fazer o que lhe agrada, e é justo em tudo o que faz.
Por um bom tempo eu não considerara que essa crença positiva seria uma
resposta para qualquer objeção ao cristianismo ― a mim se tratava
meramente de uma verdade sobre Deus. Ela é, todavia, uma das principais
respostas bíblicas ao problema do mal.
Eu comecei com a resposta ― isto é, com o ensino bíblico ―, mas o
problema do mal é um argumento tão tolo e forçado que só tomei
conhecimento dele bem mais tarde, quando li a seu respeito em meus estudos.
Até então eu nunca havia considerado que o ensino bíblico pudesse ser
3
resposta a alguma coisa. Ao me tornar ciente do problema do mal, o ensino
bíblico da prerrogativa e poder soberano de Deus converteu-se numa resposta
à objeção. Trata-se da mesma verdade, mas que agora simplesmente expresso
e uso de um modo que funciona como resposta a um desafio específico.
A Bíblia é verdadeira porque Deus revelou a verdade nela ― não
havendo desafio a isso, não há apologética. Logo, apologética implica
presença de pecado. Se não existisse pecado em nós, sempre
reconheceríamos a voz de Deus, crendo em tudo o que ele nos diz. Não
existiriam objeções das quais precisaríamos nos defender, nem crenças falsas
para atacar. Sem rebelião e incredulidade não há necessidade de apologética,
embora ainda exista teologia. Quando empregamos a abordagem bíblica ou
pressuposicional na apologética, fazemos uso do que afirmamos em nossa
teologia para interagir com nossos oponentes de um modo que a revelação
funcione agora como arma defensiva e ofensiva.
Essa é uma diferença essencial entre a abordagem bíblica ou
pressuposicional e a abordagem clássica ou evidencial.
Na apologética bíblica ou pressuposicional começamos com a resposta,
e assim parte do que é dito na apologética depende da natureza do desafio, já
que nossa apologética é de fato uma adaptação da nossa teologia a uma
situação particular.
Por outro lado, o método clássico ou evidencialista começa de um
ponto muito distante da resposta e então tenta chegar à resposta a partir de lá.
A abordagem deliberadamente começa no ponto de partida do próprio
pecador ― da intuição subjetiva, da sensação falível ou do axioma falso de
uma pessoa. Porque seu próprio ponto de partida (comum ao do pecador) não
é a resposta e não é uma palavra de Deus, a abordagem precisaria argumentar
mesmo se não existisse incredulidade, rebelião ou objeção.
Essa não pode ser a forma de pensar que vem do alto, mas como
cristãos temos já agora a mente de Cristo. Se a revelação é de fato a resposta,
e se é somente pela revelação que podemos verdadeiramente entender e
interpretar alguma coisa, é autodestrutivo pôr de lado essa revelação
necessária para então retornar a ela por um ponto de partida não bíblico, só
adotado em primeiro lugar por causa da pecaminosidade e rebelião do
homem.
4
Assim, para aprendermos a abordagem bíblica de apologética devemos
nos familiarizar com o sistema bíblico ― isto é, com aquilo que a Escritura
5
revelou sobre diversos assuntos e suas inter-relações. Precisamos também
compreender quais são os aspectos necessários a cada sistema intelectual para
que possamos assim dominar e criticar o sistema oponente quando entramos
6
em contato com ele.
Se não existe desafio à revelação, ela continua verdadeira com base em
sua necessidade lógica e autoridade autoatestadora ― porque Deus não pode
jurar por alguém mais alto ― e esse é o sistema de verdade que afirmamos.
Na medida em que entendermos corretamente a Escritura não haverá
modificações essenciais em nosso entendimento desse sistema revelado,
mesmo quando chegarmos ao céu; apenas uma compreensão mais rica dessa
mesma revelação, além de acréscimos.
Ao mesmo tempo o sistema bíblico logicamente exclui todos os
sistemas não bíblicos, e assim, contanto que o nosso sistema permaneça
verdadeiro, todos os demais sistemas são falsos por necessidade lógica. Desse
modo, havendo um desafio direto ao sistema bíblico, precisamos tão somente
adaptar seu conteúdo para responder ao desafio, tanto para defender nossa fé
como para esmagar a oposição.
Em outras palavras, ao praticar uma abordagem bíblica ou
pressuposicional de apologética estamos agindo como instrumentos de Deus
para liberar sua própria sabedoria revelada, que fará sua própria defesa e
levará o inimigo à derrota. Ao invés de usar a intuição, a sensação ou o
raciocínio falacioso para dar testemunho de Deus, nossa apologética é
essencialmente uma expressão e aplicação do testemunho que Deus faz de si
mesmo, pois Deus é sua melhor testemunha, e não pode jurar por alguém
7
mais alto.
1
2. Cativo à razão

Gordon Stein perguntou a Greg Bahnsen o que seria um motivo


suficiente para convencê-lo de que o cristianismo é falso. Eu não
recordo de Bahnsen ser muito firme nessa questão. Como você lidaria
com essa pergunta?

Num certo sentido essa pergunta é difícil de ser respondida. É difícil


porque eu percebo que qualquer tentativa de ponderar como o cristianismo
poderia ser refutado ou como eu poderia ser convencido de sua falsidade
requer em primeiro lugar uma aceitação plena do cristianismo. Isto é, porque
as pressuposições da cosmovisão bíblica são as pressuposições necessárias
para todo e qualquer pensamento e conhecimento, é impossível eu mesmo
conceber como o cristianismo poderia ser refutado.
Bahnsen disse certa vez que se alguém descobrisse os ossos de Jesus
ele reconheceria que o cristianismo é falso. O ponto em si é verdadeiro. Se
alguém descobrir os ossos de Jesus, mostrando desse modo que ele nunca
levantou dos mortos, podemos de fato dizer que o cristianismo é falso. Mas
isso é quase irrelevante, pois à parte de toda a cosmovisão cristã como você
pode ter uma epistemologia que consiga aprender o próprio significado da
expressão “os ossos de Jesus”, e como você pode ter uma epistemologia que
lhe permita identificar os ossos?
Mesmo admitindo que se uma pessoa encontrasse os ossos de Jesus o
cristianismo seria falso, considerando o que já expus em outro lugar sobre
epistemologia, precisaríamos também admitir que se o cristianismo é falso,
de forma alguma podemos identificar os ossos de Jesus. Na ocasião eu havia
dito que mesmo se partirmos das pressuposições corretas pelas quais o
conhecimento é possível, todo e qualquer método científico e empírico é
logicamente falacioso, de maneira que qualquer conclusão derivada do uso
desses métodos representa quando muito uma opinião injustificada ou
conjectura arbitrária, não conhecimento. Portanto, o cristianismo jamais pode
ser refutado por algum método científico ou empírico, e os ossos de uma
pessoa jamais podem ser infalivelmente identificados.
Assim, a pergunta é difícil apenas no sentido de que eu não posso dar o
tipo de resposta esperada por um incrédulo. Mas nesse caso a esperança do
incrédulo reside na sua epistemologia irracional, de modo que não sou
racionalmente obrigado a respeitá-la. Talvez a resposta mais simples e
verdadeira fosse: “Eu vou crer que o cristianismo é falso se você puder
provar que ele é falso”; ou mais precisamente: “Eu vou crer que o
cristianismo é falso se você puder provar que aquilo que é verdadeiro pode
ser falso”.
Em outras palavras, insisto que é logicamente impossível refutar o
cristianismo, de modo que refutar o cristianismo seria estabelecer uma
contradição lógica, o que é impossível. Evidentemente, qualquer pessoa pode
fisicamente dizer o que quiser, mas isso não significa que tal coisa tenha
algum sentido, e estou dizendo que nenhum argumento contra o cristianismo
pode mesmo ter algum sentido.
O máximo que posso fazer é ouvir o incrédulo quando ele tenta refutar
o cristianismo, pois nem mesmo posso imaginar como eu faria isso por mim
mesmo. É claro, os incrédulos podem ter várias ideias e tentarão vários
argumentos, mas apenas porque são estúpidos, não percebendo que seus
argumentos são um completo absurdo até que alguém um pouco mais
instruído lhes chame atenção sobre este fato.
Em meus livros mostro ter consciência das questões relevantes e das
objeções dos incrédulos, e como responderia a elas. Explico com clareza meu
método de apologética e como esse método pode defender a cosmovisão
cristã e refutar seus oponentes. Assim, não estou seguindo pelo ponto de vista
de um fideísmo não racional ou irracional. Pelo contrário, o cristianismo é tão
racionalmente necessário que não posso sequer conceber como refutá-lo sem
ter com isso refutada minha tentativa pelo meu próprio sistema de
apologética.
Algumas pessoas afirmam que se uma declaração não é falseável ela
não pode ser estabelecida, ou simplesmente não tem sentido. Mas isso
depende do tipo de declaração com que estamos lidando e por que ela não é
falseável. E se ela não é falseável porque é necessariamente verdadeira? Se
algo é necessariamente verdadeiro, não é falseável; se é falseável, não é
necessariamente verdadeiro. Nossa reivindicação, que podemos justificar
racionalmente, é que o cristianismo é necessariamente verdadeiro.
Se uma pessoa declara que nada é necessariamente verdadeiro, essa
declaração não é necessariamente verdadeira. Ela deve fornecer um
argumento mostrando que é necessariamente verdadeiro que nada é
necessariamente verdadeiro, mas se o seu argumento é sólido, ela refuta a si
mesma (o que significa que é impossível desenvolver um argumento sólido a
partir dessa conclusão), e se o argumento não é sólido, ela falha em provar
sua conclusão (que nada é necessariamente verdadeiro).
Não existe qualquer razão para aceitarmos esse princípio de
falseabilidade em primeiro lugar. Trata-se apenas de uma desculpa para o
fracasso em refutar o cristianismo. Eu não tenho culpa que os incrédulos
sejam intelectualmente débeis. Se não podem lutar, que permaneçam fora do
ringue ao invés de inventar teorias estúpidas para se justificar.
Minha resposta à pergunta é como ela deveria ser no caso do
cristianismo ser verdadeiro e eu ser cristão. Isto é, minha mente está ancorada
na Palavra de Deus e cativa pela verdade, de modo que não vislumbro uma
saída, nem quero uma saída. Se eu posso vislumbrar uma saída ou se quero
uma saída, o evangelho não tem o poder que alega ter ou não sou de fato
cristão. Se sou cristão, não deveria ser capaz de perceber alguma forma de
refutar o cristianismo.
Se o incrédulo tem a verdade, terá que me mostrá-la; ele terá que fazer
isso sem minha ajuda. Mas ele está desde o início impedido de fazê-lo pelo
método bíblico de apologética e argumentação e pelo nosso desafio ao seu
pensamento no nível fundacional ou pressuposicional.
A verdade é que o não cristão também está cativo pelo Logos de Deus e
por seu conhecimento inato dos atributos e leis de Deus, de modo que sua
mente pode funcionar apenas nos termos de Deus, mesmo ao se rebelar
contra Cristo, que é a Razão. O não cristão está enganado ao imaginar que é
um “pensador livre”, e a única coisa da qual ele se afasta é a Razão. E ele não
pode escapar, pois a Razão vai esmagá-lo a todo instante, triturando seus
argumentos fúteis até virarem pó.
1
3. Ocasionalismo e empirismo

–A–
O que você acha de alguém (um materialista) dizendo que o mesmo
conceito pode estar em duas localizações espaço temporais? Isso
acontece porque o cérebro é como um computador que copia o programa
de outro computador. Assim, quando eu falo as ondas de som entram em
seus ouvidos e seu cérebro copia o conceito que eu tinha na minha
cabeça.

Eu esperaria que um materialista dissesse isso ― é algo que parece vir


de sua visão de realidade. Eu posso desafiá-lo diretamente nesse ponto, mas
posso também exigir justificativa para as premissas logicamente anteriores.
Por exemplo, eu não creio (1) que um “conceito” seja físico e (2) que o
cérebro “pense”. Antes, o pensamento ocorre na mente incorpórea, e a mente
continua a pensar quando se separa do corpo na morte. Agora, suponhamos
que eu desafie o materialista em (2). Se ele assume a confiabilidade da
ciência e do empirismo em sua tentativa de provar que o cérebro pensa, eu
desafiarei a ciência e o empirismo. Minha posição pessoal sobre esse tópico
de pensamento e conceitos é uma versão de ocasionalismo, de modo que
posso evitar todos aqueles problemas que apresento ao materialista.
Se o ponto principal da sua pergunta diz respeito à comunicação no
esquema materialista, é melhor desafiar imediatamente o empirismo. Se é
possível duas pessoas se comunicarem sob o esquema do materialismo, no
momento da comunicação haveria duas cópias físicas do mesmo pensamento.
Mas eu nego que a comunicação seja possível debaixo do materialismo, e
assim o materialista deve primeiro provar que a comunicação é possível por
uma epistemologia empírica ― mesmo que ignoremos por ora se o
materialismo é verdadeiro, se os pensamentos são físicos e se os cérebros
podem pensar.
Com relação ao ocasionalismo, prefiro a expressão “na ocasião” ao
invés de “ocasionalismo” para descrever as relações epistemológicas e
metafísicas. Muitos iniciantes leem meus livros, e eles acabariam não tendo
ideia do que o termo significa; então amiúde desenvolvo a sentença para usar
a explicação ou significado no lugar do termo em si.
Minha posição é que a providência de Deus inclui controle completo de
tudo acerca de tudo, e isso significa que ele deve ser o único poder que
controla toda e qualquer comunicação e aquisição de conhecimento. Usando
o cérebro como exemplo, se existe alguma relação entre cérebro e
pensamento, isso significa que na ocasião em que Deus causa um pensamento
na mente ele também causa atividade no cérebro; e na ocasião em que ele
causa atividade no cérebro ele também causa um pensamento na mente. O
cérebro não tem conexão necessária e consistente com o pensamento ― o
pensamento pode ocorrer à parte dele. Na morte, Deus separa a mente da
pessoa do seu corpo, e assim também do seu cérebro. Deus continua
causando pensamentos na mente da pessoa, mas nas ocasiões em que faz isso
ele não mais causa qualquer atividade correspondente no cérebro que
costumava estar associado à mente dessa pessoa.
Jonathan Edwards afirmou uma espécie de ocasionalismo, assim como
Malebranche e muitos outros pensadores cristãos. Você poderia ver Calvino,
Lutero etc., dizendo coisas que soam às vezes como ocasionalismo. Em todo
o caso, não importa quem afirma ou rejeita o ocasionalismo. Ele é nada
menos que uma implicação necessária e uma aplicação consistente da
doutrina bíblica da providência.

–B–
Por que você negaria a possibilidade de comunicação entre elas? É
porque quando você se comunica, está comunicando proposições, e
proposições não são materiais, de modo que a mesma proposição não
pode estar em mais de uma localização espaço temporal?

Essa seria a razão logicamente anterior ― eu nego que as proposições


sejam materiais.
Mas mesmo que deixemos de lado as questões logicamente anteriores,
elas ainda precisam mostrar que podem se comunicar pela fala e audição.
Independentemente das proposições serem ou não materiais, essas pessoas
precisam me fornecer uma prova lógica demonstrando que quando uma delas
ouve uma proposição, de fato ouve o que é dito. Isto é, elas precisam de uma
prova para o empirismo.

–C–
(1) Ora, elas mui provavelmente diriam que sua resposta é
autorrefutável, pois você teve de usar sua boca física para fazer a
pergunta, e assumiu que ela seria transmitida pelos meus ouvidos. Nessa
altura você negaria isso em favor do seu ocasionalismo, certo?
(2) Por outro lado eu poderia dizer que na minha cosmovisão Deus fez
nossas bocas para comunicar e nossos ouvidos para receber informação,
mas a partir do empirismo e da cosmovisão dessa pessoa, como ela
poderia saber que está de fato ouvindo o que é dito? Nesse ponto ela
provavelmente reafirmaria sua conclusão de que ela sabe disso porque
respondeu minha pergunta.

(1)

O ocasionalismo é minha resposta positiva ― ele descreveria meu


entendimento do que acontece na comunicação. Mas eu não preciso
mencioná-lo em primeiro lugar.
Antes, posso primeiro ressaltar que o materialista cai numa petição de
princípio ao assumir um mundo físico sem qualquer justificativa. Posso
ilustrar esse problema levando o debate a um mundo puramente mental. Isto
é, posso sugerir que poderíamos estar desenvolvendo a conversa num sonho,
ou numa condição puramente mental. Como sabemos que não é o caso? Dizer
que sabemos que estamos no mundo físico porque usamos órgãos físicos para
falar e ouvir é uma petição de princípio, pois poderíamos estar falando e
ouvindo num mundo puramente mental, em cujo caso nenhum órgão físico
estaria envolvido. Visto que, por definição, o materialista constantemente
depende do mundo físico em sua filosofia, ele não pode prosseguir até que
forneça a justificativa racional que eu exijo.
Por outro lado, todos os meus princípios básicos seguem intactos, e
minha cosmovisão permanece imune e ilesa, pois nela o mundo físico é
deduzido a partir de um princípio não físico. Assim, posso negar que esteja
necessariamente usando minha boca física quando pergunto ou respondo
2
alguma coisa ― o materialista terá de provar isso para mim.
Desse modo, quando sugiro que poderíamos estar conversando num
mundo puramente mental, isso desafia a suposição de que estamos
necessariamente agindo num mundo físico. Se a filosofia do oponente não
pode sobreviver num mundo puramente mental, ou se o oponente não pode,
pela argumentação racional, reintroduzir um mundo físico na conversa tão
logo seja forçado a um mundo puramente mental, ele perde o debate.

(2)
Como você segue Van Til, suponho que queira formular uma resposta
consistente com sua filosofia. Não posso ajudá-lo nisso, pois não sigo Van
Til e não creio que possa resultar uma boa resposta de sua filosofia. Isso
porque na melhor das hipóteses ele avança um passo lógico quando adota o
empirismo, afirmando que as pressuposições bíblicas podem justificar a
confiabilidade das sensações. Mas já mostrei em outro lugar que as sensações
são inerentemente inconfiáveis, e assim nada as pode justificar ou explicar.
Além do mais, porque a filosofia de Van Til assume em primeiro lugar que as
sensações são necessárias para acessar essas pressuposições bíblicas, fica
evidente que ele adota o empirismo desde o início. Portanto, sua filosofia está
não menos fadada ao fracasso completo e imediato do que a filosofia do
materialista ou empirista.
Seu argumento faz uma inferência falsa da Bíblia. A Bíblia de fato
ensina que Deus fez nossos corpos e órgãos; mas só porque Deus fez o
ouvido isso não significa que suas capacidades e propósitos condizem com o
que você pensa. A própria Escritura mostra que os olhos e ouvidos estão
frequentemente enganados, e pessoas que supostamente veem e ouvem as
mesmas coisas amiúde chegam a conclusões diferentes ou discordam do que
estão vendo e ouvindo (2 Reis 3.20-22; João 12.27-29).
Todos os problemas com o empirismo permanecem com você. Mesmo
que comece com pressuposições bíblicas, não há como você mostrar em
qualquer caso se sua sensação está correta. Mesmo que comece com
pressuposições bíblicas, você não pode salvar o que é inerentemente
irracional e logicamente impossível.
Com o ocasionalismo não há problema. Os ouvidos fornecem quando
muito a ocasião na qual Deus faz uma comunicação direta com a minha
mente ― na ocasião da sensação, mas independentemente dela. Além disso, é
Deus quem controla todas as coisas sobre a ocasião e a comunicação.
É improvável que um materialista reflita sobre isso e aborde a questão.
Por ser empirista, é improvável que ele desafie você no empirismo. Assim a
questão central não é vencer debates, mas envolve verdade e honestidade.

–D–
(1) Como você sabe que não está sonhando?

(2) Seria falacioso meu oponente argumentar que visto que as sensações
são às vezes enganosas, elas são sempre enganosas. Ou seria falacioso
dizer que se às vezes você não pode saber se suas sensações estão
operando corretamente, nunca pode saber se elas estão operando
corretamente.

(1)

Eu poderia estar sonhando, e isso não afetaria minha cosmovisão, com


todos os meus princípios básicos permanecendo intactos. Esse é o ponto. Mas
eu posso estar sonhando e ainda afirmar que existe um mundo físico, não
porque confie nas minhas sensações, mas porque a Bíblia me revela isso.
Por outro lado, minhas sensações sentem o mesmo quando penso que
estou sonhando e quando penso que não estou sonhando, de modo que pelas
minhas sensações não posso confirmar com segurança se estou ou não
sonhando. Ainda que quando penso estar sonhando minhas sensações sejam
diferentes de quando penso não estar sonhando, como sei que estou realmente
sonhando quando penso que estou sonhando e que não estou sonhando
quando penso que não estou sonhando? Talvez seja o inverso, e assim,
quando sinto de certa forma e penso que estou sonhando, deveria na verdade
pensar que não estou sonhando quando sinto dessa forma, e vice-versa.
Mas porque eu rejeito o empirismo, isso não me representa problema.

(2)

A menos que você possa mostrar como sabe que numa dada instância
uma sensação particular é confiável ou não, não pode justificar um critério
que lhe permita confiar numa dada instância de sensação.
Mesmo que algumas instâncias de sensação sejam confiáveis, a menos
que você possa mostrar quais delas são confiáveis e quais delas não são
confiáveis, não faz diferença ― você não tem garantia para confiar em
nenhuma delas, pois não pode saber quando suas sensações estão corretas e
quando estão incorretas.
Seu oponente não precisa mostrar que você nunca sente o que pensa
que sente. Enquanto suas sensações não forem infalíveis e enquanto você não
tiver um padrão não empírico infalível pelo qual possa julgar cada instância
de sensação, resulta que nenhuma instância de sensação é confiável.
Da mesma forma, seu oponente não precisa mostrar que suas sensações
nunca estão funcionando corretamente. Enquanto você não puder mostrar
infalivelmente se as sensações estão funcionando corretamente em cada
instância, é inútil a confissão genérica de que elas poderiam muitas vezes
funcionar corretamente, pois você ainda não sabe se elas estão funcionando
corretamente numa dada instância. Além disso, o que significa as sensações
funcionarem “corretamente”? Se o funcionamento correto diz respeito à
confiabilidade das sensações em obter conhecimento, isso é uma petição de
princípio.

–E–
Mas elas poderiam perguntar tendo em vista os sonhos serem às vezes
falsos (i.e., um monstro gigante perseguindo você), como você sabe que
está transmitindo uma verdade? Provavelmente você diria que negar sua
cosmovisão até mesmo num sonho levaria à irracionalidade, e que as
leis da lógica, as inferências necessárias etc., também valem nos sonhos.

Eu afirmo as coisas em que creio não por causa do que “vi”, seja no
mundo físico ou mental (ou sonho), mas por causa da revelação divina e da
necessidade lógica.
Seria conveniente um empirista propor essa pergunta sobre sonhos. A
pergunta seria de fato um desafio para ele, e não para mim. A menos que ele
possa responder sua própria pergunta, sucede que não deveríamos confiar no
que sentimos, estejamos ou não num sonho. Essa é também outra ilustração
da impossibilidade de obtermos qualquer conhecimento pela sensação.
Em todo o caso, o contraste real não é entre o estado de sonho e o
estado de não sonho, mas entre um mundo puramente mental e um mundo
físico. Faço referência ao sonho apenas para facilitar a visualização de um
mundo puramente mental.
Além disso, precisamos conversar sobre o que se quer dizer com “real”.
Se um monstro me persegue num mundo puramente mental ou num sonho,
isso que é “real” no mundo puramente mental ou no sonho. Ou seja, é
realmente verdade que um monstro me persegue no sonho.
Por outro lado, a pergunta parece implicar que se algo não acontece no
mundo físico, não é “real”, mas isso é uma petição de princípio.

–F–
Eu diria que (1) Deus nos fez assim, e (2) é desse modo que
normalmente agimos. (3) Seria necessário um ambiente apropriado, isto
é, se eu estivesse drogado, sob luz fraca, sem poder dormir etc., não teria
dificuldades para reconhecer que estava enganado em alguma
observação trivial, mas as sensações são geralmente confiáveis.

(1)

Sua posição é igual a do materialista e do empirista. A diferença é que


você apela a Deus usando um “exatamente assim” para defender sua
epistemologia indefensável. Você precisa mostrar a partir da Escritura que
Deus nos fez “assim”. Não basta apenas mostrar que Deus fez os olhos e
ouvidos; você deve mostrar que eles fazem o que você diz, que você pode
seguramente derivar conhecimento através deles por sensação ― por alguma
função inerente ― e que você saberia numa dada instância por que essa
instância de sensação é confiável.

(2)

É uma petição de princípio dizer que normalmente agimos de certo


modo, quando a questão de como normalmente agimos é uma das coisas em
disputa. Sua declaração assume que o conhecimento vem normalmente pelas
sensações, ou que elas são normalmente confiáveis. Mas é exatamente nisso
que discordamos.
Além do mais, mesmo que seja verdade que normalmente agimos de
certo modo, isso não prova que estamos certos. Posso simplesmente dizer que
estamos normalmente errados.
(3)

Você deverá mostrar que a Escritura ensina que as sensações são


confiáveis sob certas condições e que não são confiáveis sob essas condições
que você arrolou. Como sua defesa é que a Escritura justifica as sensações,
você deve mostrar como ela faz isso.
Você não pode afirmar essas condições se as “descobriu” em primeiro
lugar pelas sensações, porque isso seria uma petição de princípio. Isto é,
como você sabe que as drogas afetam sua sensação? Você não pode alegar
que sabe disso pela sensação se ainda não tiver provado a confiabilidade das
sensações. Como você sabe que a luz afeta a confiabilidade das sensações?
Aliás, como você sabe se a iluminação está boa ou ruim num quarto? Talvez
ela esteja boa (o que é boa?), mas você esteja ficando cego.
Também, ainda que a Escritura afirme que as sensações são confiáveis
sob certas condições e não outras, você ainda precisa saber em qual condição
se encontra no momento. Se você usa as sensações para saber a condição em
que se encontra para então poder determinar se as sensações são confiáveis,
isso é uma petição de princípio.

–G–
(1) A faca corta dos dois lados, e você precisa mostrar pela Escritura
todas as coisas que afirma e põe contra mim.
(2) Além disso, creio que você teria de negar certas noções de senso
comum, e assim não poderia saber que “Vincent é um homem”. Talvez
você queira engolir esse sapo, não sei.

(1)
Sim, eu já fiz isso em meus livros, mostrando em detalhes que minha
posição concorda com a Escritura. Por favor, leia-os.
Mas ao dizer que “a faca corta dos dois lados” você está reconhecendo
que ela corta do seu lado. Assim, por sua declaração você se põe na
obrigação de mostrar pela Escritura que seu ponto de vista está correto.

(2)

Sua autoridade é agora o “senso comum”? O que aconteceu com a


Escritura? O que aconteceu com a razão? O que aconteceu inclusive com as
sensações? Sou cético com o senso comum, e penso que a própria ideia de
senso comum seja incoerente. Deveras, “senso comum” não é comum e não
faz sentido. O que o senso comum dita não se aplica a todas as pessoas, e o
que às vezes se considera senso comum acaba se mostrando irracional e falso.
Argumentar a partir do senso comum revela desespero.
Se eu sei que “Vincent é um homem”, isso certamente não vem pelas
3 4
minhas sensações ou pelo senso comum, mas pela iluminação do Logos,
conforme minha explicação sobre ocasionalismo. Afirmar uma crença com
base no senso comum é outra tática “exatamente assim” de se desculpar pela
falta de justificativa racional para a crença.
Se você “sabe” alguma coisa, sabe alguma coisa ― somente a opinião
pode ser sustentada por graus de confiabilidade racional. Portanto, se eu não
sei alguma coisa ― se em minha mente a proposição é desenvolvida por um
processo falível, e não pela inserção direta dessa proposição por Deus como
algo que ele considera verdadeiro e justificado ― então eu não sei essa coisa.
Assim, jamais vou dizer: “Pelo senso comum eu sei que sou um
homem, e essa proposição que derivei do senso comum é tão racionalmente
confiável quanto a Escritura, ou revelação de Deus. O senso comum e a
Escritura me concedem ambos a mesma justificativa racional, e por isso creio
no senso comum tanto quanto na Escritura. Meu próprio ‘senso’ de realidade
é tão bom quanto a revelação de Deus. A Escritura não é mais confiável e
segura do que o senso comum”.
Eu me recuso a afirmar ou sugerir que aquilo que posso descobrir à
parte da revelação de Deus é tão bom quanto essa revelação. Assim, me
recuso a dizer que o “senso comum” é tão confiável quanto a Escritura. Isso
seria irracional e irreverente. Você parece ansioso em “engolir esse sapo”,
não fazendo qualquer distinção entre senso comum e Escritura, mas eu me
recuso a agir assim.
4. Breves respostas a diversas
1
críticas

–A–
Uma coisa que me torna incapaz de entender como alguém poderia
2
defender a crença de Cheung é que os nervos no cérebro são sensoriais.
Ao tomar a decisão de pensar coisas específicas e mudar processos de
pensamento em suas mentes, essas pessoas não estariam assim
confiando em seus sentidos até mesmo para pensar, e logo, confiando
em seus sentidos para deduzir com lógica e obter conhecimento?

Essa é uma petição de princípio. A declaração assume o veredito da


ciência empírica sobre as capacidades, propósitos e funções do cérebro. Ela
assume que alguns ou mesmo todos os pensamentos ocorrem no cérebro. E
isso ou identifica o cérebro com a mente ou assume uma relação necessária
entre os dois.
Eu rejeito todas essas suposições, e exigiria justificação racional para
todas elas antes de permitir que fosse feita qualquer afirmação ou objeção
com base nessas suposições. Eu nego a confiabilidade do empirismo e nego a
confiabilidade da ciência empírica. Assim, também nego o veredito da
ciência sobre as capacidades, propósitos e funções do cérebro. Eu nego que
qualquer pensamento ocorra no cérebro; afirmo antes que o que quer que
aconteça simultaneamente no cérebro quando alguém pensa, o pensamento
em si ocorre apenas na mente incorpórea.
Consequentemente, também nego que haja qualquer relação necessária
entre o cérebro e a mente. Pode existir uma relação entre os dois na medida
em que Deus causa eventos correlacionados neles, mas a relação não é
consistente, permanente ou necessária.
–B–
Aqui há algo problemático: uma pessoa usa seus sentidos para ler as
palavras na Bíblia. Se os sentidos nos permitem lembrar o que já
sabemos sobre Deus, então o que dizer das outras partes da Bíblia? Por
exemplo, o adultério de Davi. É difícil imaginar que já sabíamos desse
adultério por um conhecimento inato. Assim, não podemos saber que
Davi cometeu adultério, ainda que isso esteja registrado na palavra
infalível de Deus.

Isso revela um equívoco muito grave, e reflete a deficiência na


compreensão de leitura básica que parece comum a todos os meus críticos.
Eu nunca disse que todo conhecimento é inato, apenas que todo
conhecimento deve vir de Deus à parte da sensação, embora algum
conhecimento venha de Deus na ocasião da sensação. Isto é, a sensação
poderia se correlacionar com o momento da ação de Deus na mente, mas o
conhecimento não vem da sensação em si ou de uma inferência a partir da
sensação.
Com respeito à alegação que devemos usar os sentidos para ler a Bíblia,
respondi isso em diversos outros lugares. Entre outras coisas, a pessoa cai
numa petição de princípio ao assumir sua posição sem justificativa.
Embora eu tenha refutado a necessidade das sensações para a leitura da
Bíblia, ainda que, para fins de argumentação, seja assumida sua necessidade,
isso por si só não prova a confiabilidade das sensações. Isto é, a suposição de
que necessitamos de uma coisa não implica que também a tenhamos. Assim,
a menos que esse crítico provasse o empirismo, terminaríamos simplesmente
no ceticismo e ninguém poderia ler a Bíblia.
Sem antes provar o empirismo esse crítico não pode, partindo do seu
próprio padrão, ler a Bíblia ou saber o que está escrito nela. Por outro lado,
posso saber o que está na Bíblia precisamente porque rejeito o empirismo.

–C–
Não entendo como ele possa dizer que não podemos conhecer nada pela
percepção sensorial. De fato, pela percepção sensorial podemos
conhecer inclusive certas coisas sobre Deus (Romanos 1).

Já tratei de Romanos 1 em vários pontos dos meus livros, mostrando


3
que a passagem bíblica não requer empirismo.
Deveríamos nos lembrar de Deus em todas as ocasiões que entramos
em contato com sua criação, muito embora os pecadores suprimam esse
conhecimento por conta de sua impiedade. Contudo, a declaração desta
pessoa requer mais do que a passagem permite extrair. Ela infere que o
conhecimento de Deus pode vir “pela percepção sensorial” em si.
Ou seja, uma pessoa tem uma sensação e pode “conhecer certas coisas
sobre Deus” diretamente por essa sensação, ou pode “conhecer certas coisas
sobre Deus” fazendo inferências válidas a partir dessa sensação. É claro,
trata-se de uma abordagem católico-romana para a teologia e filosofia, uma
abordagem que é negada pela Escritura.
Todavia, se ela insiste que pode conhecer Deus diretamente pela
sensação ou que pode fazer seu raciocínio até Deus a partir da sensação,
deveria escrever a prova para que possamos analisá-la.

–D–
Eu teria o interesse de ver se funcionaria contra isso um argumento do
4
terceiro homem, um dos argumentos mais devastadores contra a teoria
de conhecimento (reminiscência) de Platão, que, com algumas
modificações, parece similar à de Cheung.

Se é necessário comparar, estou mais próximo de Agostinho e da


doutrina do Logos de vários Pais da Igreja, ao invés de Platão.
Dito isso, minha posição é apenas uma implicação necessária das
doutrinas bíblicas da soberania e da providência divina.
Ou Deus é soberano sobre todas as coisas, menos a sensação e a
aquisição de conhecimento?

–E–

Não sou da opinião que os fatos produzem seu próprio significado. Eu


estaria mais para o sistema “rede” de Quine. Mas, entretanto, você usa
seus sentidos para obter conhecimento. Diga-me, você sabe quantas
formigas há em seu quintal? Você sabia disso previamente?

Em momento algum ele nos diz como pode vir conhecimento a partir
da sensação, mas continua dizendo que deve ser assim. Nada do que ele diz
necessariamente implica que qualquer conhecimento possa vir da sensação.
Ele me acusa de seguir Platão (o que eu nego) ― mas está agora
seguindo Quine (o que ele admite)?
E quem disse que alguém pode saber quantas formigas há em seu
quintal? Ele sabe? Se não sabe quantas formigas há em seu quintal, como
pode fazer disso um argumento contra minha posição?
Sobre conhecer “previamente”, trata-se mais uma vez do mal-entendido
de que no meu entendimento todo conhecimento seria inato, coisa que nunca
ensinei.

–F–
Mas visto que em alguns casos nossos sentidos são exigidos para se
obter conhecimento (e.g., quantas formigas há em meu quintal), eu diria
que nesses casos os sentidos são um recurso necessário para ganhar
conhecimento.
É uma petição de princípio. O argumento equivale a “Mas visto que
nossos sentidos são exigidos em alguns casos, os sentidos são necessários
nesses casos”. Isso é um argumento ou uma aula de sinônimos? Posso com a
mesma facilidade dizer “Mas visto que os sentidos nunca são exigidos, nunca
são necessários”.
De fato, se os sentidos são exigidos, então são necessários. Mas isso
não prova que os sentidos são necessários. Os sentidos são necessários? E
necessários para quê? O que eles fazem? Como fazem?

–G–
Se Deus comunica todas as coisas, comunica a uma pessoa a crença de
que um herege está correto, e também a outra pessoa a crença de que ele
não está correto! Deus não é autor de confusão. Penso que isso é
devastador.

Essa é uma objeção importante e instrutiva, pois demonstra a


consequência devastadora de divergir de minha posição, isto é, do ensino
bíblico de que Deus controla e facilita todas as coisas, incluindo as crenças
falsas. Minha posição não é que Deus afirma em sua revelação crenças falsas
como se fossem verdadeiras, mas que ele é soberano sobre todas as coisas e
que isso deve incluir um controle sobre as crenças falsas. Assim, Deus revela
somente a verdade na Escritura, mas exerce controle para uma pessoa crer ou
não nela. Quando ela rejeita a verdade, o faz sob o controle de Deus, e Deus
também controla em quais mentiras essa pessoa vai crer.
Minha posição insiste que Deus exerce controle exaustivo sobre o
herege, e que Deus é o único poder metafísico que transmite até mesmo
crenças falsas à mente. O crítico rejeita tal coisa, e é isso que o afunda em sua
própria heresia. Sua recusa de que Deus controla justa e soberanamente todas
as coisas, e que desse modo comunica também crenças falsas ao herege,
necessariamente implica que existe outro poder metafísico comunicando
informação falsa à mente.
Ou seja, o crítico insinua que o homem tem à parte de Deus o poder
metafísico de produzir crenças falsas, ou que algum poder externo, talvez o
diabo, tem à parte de Deus o poder metafísico de trazer crenças falsas ao
herege. Isso equivale a dizer que Deus não é o único poder metafísico no
universo, e que existe pelo menos algum outro poder que controla grande
parte do mundo num nível metafísico.
Se isso não é heresia, nada mais é. Isso equivale a um ataque ao Deus
cristão, ou Deus conforme revelado na Escritura, e equivale a uma rejeição da
fé cristã. Representa uma forma de dualismo metafísico que reconhece dois
poderes opostos de bem e mal, em lugar de um Deus único que reina
supremo. É possível que esse crítico não entenda a implicação de sua
objeção, mas se ele persiste nessa posição após a explicação, deveria ser
provavelmente excomungado da igreja.
Quanto ao seu apelo à expressão “autor de confusão”, trata-se de um
uso indevido, e mostra que ele entende mal o versículo em que aparece a
5
expressão. Já abordei o ponto em outra publicação. Seja como for, não
devemos ignorar, muito menos tolerar, essa rebelião generalizada contra a
soberania de Deus.

–H–
Além do mais, as observações não dependem das moléculas! As
moléculas são as mesmas, independentemente. É o modo como o
cérebro do homem interpreta a coleção de moléculas que resulta em
alucinação.

Isso não ataca diretamente minha posição, mas revela o pensamento


falacioso da pessoa.
Trata-se de uma petição de princípio. A pessoa assume os preceitos da
ciência e premissas que nunca poderiam ser estabelecidas caso o empirismo
seja falso. Ela deveria provar o empirismo e a ciência antes de usar essas
premissas, já que o empirismo e a ciência são objeto de questionamento.
O que são moléculas? Sabemos que existem tais coisas? Sério,
sabemos? Temos certeza? Como?
Quanto ao comentário sobre “o modo como o cérebro do homem
interpreta a coleção de moléculas”, como ele sabe disso? O cérebro “pensa”
de fato? Interpreta algo de fato?

–I–
Se Deus está no controle de todas as coisas e transmite todas as coisas
às pessoas, o que dizer disso: João “vê” uma abelha sobre uma rosa, mas
Tim não. João crê que sua observação é verdadeira. Tim crê o contrário.
Logo, Deus transmitiu A e não A?

É claro. E daí?
Há um problema somente se dissermos que Deus afirma A e não A.
Considere o que esse crítico está pensando. Sua objeção implica que
Deus não controla de fato todas as coisas. Realmente, seu desafio é feito
contra a posição de que Deus está “no controle” de todas as coisas. Em outras
palavras, ele não crê que Deus esteja “no controle” de todas as coisas.
Está claro que o conflito não é primeiro sobre empirismo e
confiabilidade das sensações, embora tais coisas estejam certamente
envolvidas. Antes, o problema é que o crítico nem mesmo afirma o Deus
cristão, ou Deus conforme revelado na Escritura. O Deus cristão está
certamente “no controle” de todas as coisas, mas o crítico nega isso.
Ele fala como se as crenças falsas ocorressem pela autonomia do
homem, ou como se o homem possuísse independência de Deus mesmo no
nível metafísico. Se ele não pode crer que Deus controla as crenças falsas,
como pode crer que Deus esteja agora diretamente sustentando o próprio
Satanás? Ou como afirma Lutero, que Deus mesmo agora controla (não
6
somente sustenta) Satanás?
Também, sua objeção fornece um exemplo contra a confiabilidade das
sensações. João vê uma coisa, Tim não vê, ou vê algo diferente. Como esse
crítico resolveria a divergência? Ele não nos diz.

–J–
Ora, é claro que Deus pode lhe dizer quantas formigas há em seu
quintal, mas é essa a operação normal no funcionamento das coisas? De
fato, tenho grande interesse em explorar esse conceito e a noção de que
não há nova revelação.

Minha posição não é que há “nova revelação”, mas que o controle de


Deus sobre todos os atos e eventos mentais é a operação normal das coisas. É
uma questão de providência ordinária.
Esse crítico implica que se Deus exerce algum controle hoje, deve se
tratar de um milagre. E se ele controla o conhecimento, deve existir nova
revelação (no mesmo sentido que a revelação bíblica). Essa pessoa é deísta?
Creio que até mesmo a morte de um pardal seja controlada por Deus,
mas não chamo a isso de milagre, pois milagre é uma providência especial; a
morte do pardal está sujeita à providência ordinária.
Da mesma forma, assevero que o conhecimento está sujeito ao controle
da providência ordinária de Deus. Insisto que quem quer que afirme a
doutrina bíblica da providência, ou afirma o Deus cristão, deve concordar
com essa posição.
Em contraste, esse crítico almeja defender a independência das
sensações, a autonomia do mal, e designa um poder espontâneo aos erros.
Sua posição é inconsistente com a fé cristã.

–K–
A faculdade integral do homem, que Deus criou com olhos e ouvidos
para aprender e conhecer coisas sobre seu ambiente, usa seus sentidos
para adquirir conhecimento. Mas isso não pode ser separado da sua
capacidade racional ― ver uma árvore e chegar a uma conclusão
envolve uma cadeia de raciocínio.

É uma petição de princípio. Só porque Deus criou esses órgãos, não


significa que eles sejam para os propósitos e funções atribuídos por esse
crítico. Ele diz que Deus criou olhos e ouvidos “para aprender”, mas este é o
ponto em discussão. Afirmá-lo novamente não o torna verdadeiro.
Então ele admite que ver uma árvore e chegar a uma conclusão envolve
uma cadeia de raciocínio. Bom! Isso se aproxima do meu ponto: a cadeia de
raciocínio é logicamente válida? Escreva como um silogismo para que
possamos examiná-la.

–L–
Eis meu ponto sobre João e Tim. Eu disse que Deus comunicou a um
deles uma verdade e a outro uma mentira. Deus mente?

Isso envolve um mal-entendido tolo e uma confusão estranha. Dizer


algo não é o mesmo que causar algo, ou controlar ou facilitar algo. Estou
falando de causação metafísica, mas parece que ele está falando de relação e
comunicação interpessoal. Não, Deus não diz mentiras. Mas a Escritura
7
ensina que Deus causa pessoas a crer em mentiras sempre que ele deseja.

–M–
Ainda preciso de uma refutação para o versículo onde o Senhor nos
8
disse “quando virdes a figueira sabeis que está próximo o verão”.

Se o crítico limita a aplicação do versículo ao contexto restrito da


passagem, o texto não contribui em nada para o seu propósito. Assim, para
derivar algum suporte ao empirismo, fica implícito que ele deseja fazer uma
inferência que remove o versículo do seu contexto, uma inferência mais
ampla do que o conteúdo do versículo.
Mas seria falacioso inferir do versículo uma epistemologia simplista do
tipo “eu vi, portanto sei”. Não é possível derivar logicamente esse princípio
amplo do versículo. Também, essa inferência implicaria que é impossível
cometer enganos, tal que quando vejo água, sei que é água, e não existem
miragens. Estaria implícito que erros e alucinações jamais ocorrem.
Como mostrei em Confrontações Pressuposicionais, quando a Bíblia
admite que uma pessoa viu algo, isso não equivale a dizer que a própria
sensação seja um meio de conhecimento.
Por exemplo, se o apóstolo João escreve “Pedro viu o Cristo
ressurreto”, posso aceitar a declaração de João sobre o que Pedro viu sem
aceitar a própria sensação como um meio para o conhecimento. O objeto da
minha crença é a declaração divinamente inspirada de João, não a sensação
falível de Pedro. De fato, as sensações de Pedro poderiam estar erradas em
todas as ocorrências à exceção desta, e sei que ele está certo desta vez apenas
porque João infalivelmente (por inspiração divina) assim o diz.
Quando penso que estou observando um carro vermelho, é possível que
esteja de fato observando um carro vermelho, mas é igualmente possível que
eu esteja sonhando ou observando o céu azul. O problema é: como sei neste
caso se estou de fato observando um carro vermelho?
Se Deus infalivelmente afirma que estou de fato observando um carro
vermelho, eu sei que nesta ocasião o que penso estar vendo corresponde de
fato à realidade física. Mas seria falacioso inferir disso que “logo, o
conhecimento deriva das sensações”. Não, a afirmação infalível de Deus (que
estou observando um carro vermelho) é que me dá o conhecimento (que
estou observando um carro vermelho), não meu ato de observar o carro
vermelho. Isto é, a sensação fornece a ocasião para a afirmação infalível de
Deus ― a sensação em si mesma não fornece conhecimento.
Esse é o tipo de inferência inválida que o crítico faz da declaração de
Jesus. Isto é, a partir de uma declaração infalível, mas específica e limitada,
sobre algo relacionado à observação, ele infere incorretamente que a própria
observação é uma forma confiável de se obter conhecimento.
A própria filosofia do crítico nega a infalibilidade das sensações.
Contudo, se Jesus deixa implícito ou aprova em ampla medida a
confiabilidade das sensações ao invés de estar fazendo um julgamento
infalível ― ainda que específico e limitado ― sobre algo relacionado às
sensações, como pode a inferência do crítico a partir do versículo consentir
erros em sensações ou em inferências a partir de sensações? As inferências
não apenas são inválidas; a conclusão é inconsistente com o que esse crítico
supõe acerca das sensações.
Eu afirmo as palavras de Jesus no versículo, não as sensações dos
homens. Por outro lado, com base nesse versículo, o crítico afirma
diretamente as sensações dos homens, infere um suporte geral ao empirismo
e o aplica então a toda a humanidade. Essa é de fato uma demonstração
espetacular de raciocínio falacioso.
Como ele pode então sustentar que as sensações são falíveis? Sobre
qual fundamento e por qual padrão ele afirma ou rejeita uma instância de
sensação, ou inferência a partir de uma sensação? Eu sei que a declaração
“quando virdes a figueira, sabeis que está próximo o verão” é verdadeira
somente porque Jesus diz isso. Aqueles homens poderiam estar errados em
todas as demais instâncias de sensação.
5. O argumento ateísta a partir
1
da existência

A alegação feita é que o teísta, ao afirmar a existência de Deus,


automaticamente demonstra que aceita a primazia da existência.

Seguidores de Van Til frequentemente declaram como sua


pressuposição a existência de Deus, ou “Trindade Ontológica”. Em contraste,
não afirmo que meu princípio primeiro seja a existência de Deus, mas sim
toda a revelação verbal divina, que amiúde chamamos simplesmente de “a
Bíblia”. O princípio primeiro de Gordon Clark é “A Bíblia é a Palavra de
Deus”.
Greg Bahnsen declarou que ao afirmar que seu ponto de partida é a
existência de Deus, ou “Trindade Ontológica”, entende que isso é o mesmo
que dizer que seu ponto de partida é toda a Bíblia. Evidentemente os
significados dos termos não são nada parecidos, e seria pedir demais que as
pessoas entendessem que “a Trindade Ontológica” significa “toda a Bíblia”.
Também, não estou certo se essa declaração é comumente familiar aos
seguidores de Van Til, e ela não se revela aparente numa forma consistente
em seus pensamentos e prática.
É melhor sempre dizermos que nosso princípio primeiro é a Bíblia, ao
invés da existência de Deus; ou seja, é melhor evitarmos a implicação de que
o nosso ponto de partida é a mera existência de Deus. A diferença de
linguagem entre Clark e Van Til neste ponto é deliberada, refletindo também
uma diferença na clareza e na essência dos seus pensamentos.
Partir de toda a Bíblia ao invés da mera existência de Deus evita muitos
problemas e dificuldades. Se você parte da mera existência de Deus, não
começa a partir das proposições essenciais à sua cosmovisão bíblica,
incluindo aquelas necessárias para afirmar a existência de Deus em primeiro
lugar, que remetem à epistemologia, linguística, e assim por diante.
Assim, a menos que você comece com uma cosmovisão completa e
siga adiante pela dedução, o sistema resultante deve sempre falhar. Por essa
2
mesma razão, é fútil os ateus partirem da “existência”. Se eles partem da
mera existência, perdem tudo o mais, incluindo as coisas que precisam para
afirmar essa primeira proposição.
Uma pessoa me perguntou certa vez como devemos responder se o não
cristão defende usar a “lógica” como seu princípio primeiro. Uma reflexão
sobre essa questão será útil em nosso presente tópico.
A lógica, ou mais especificamente lei da não contradição, é de fato
autojustificadora num sentido ― isto é, num sentido aproximado e
secundário, não num sentido último. Mas precisamos desenvolver este ponto.
A lei da não contradição é autojustificadora pelo menos no sentido de
ser inegável; isto é, você deve afirmá-la até mesmo ao negá-la. Em vista
disso, um não cristão poderia achar apropriado assumir a lei da não
contradição como ponto de partida em seu sistema.
Contudo, a lei da não contradição não pode ser um princípio primeiro
independente na cosmovisão da pessoa. Isso porque a lei propriamente não
carrega qualquer informação, sendo impossível deduzir qualquer proposição
dela. Visto que o conhecimento estritamente por dedução não é mais uma
opção, o não cristão deve afirmar axiomas adicionais ― em cujo caso você
deve criticá-los ―, ou achar uma maneira de fornecer informação para a
lógica processar.
Por exemplo, se os seus outros axiomas envolvem intuição, você pode
atacar a intuição como um fundamento para o conhecimento. Esses outros
axiomas devem ser autojustificáveis, consistentes uns com os outros e
3
suficientes para fornecer uma cosmovisão completa. Caso contrário, o
sistema falha desde o início.
Se a própria lei da não contradição constitui seu princípio primeiro, e se
ele não possui outros axiomas baseados na intuição ou em alguma outra
fonte, ele deve fornecer conteúdo para o seu princípio primeiro processar via
indução, e isso provavelmente significa que ele deve afirmar alguma versão
de empirismo. À parte disso ele poderia apelar também à ciência ou ao
método científico.
Nessa altura eu desafiaria o oponente a justificar racionalmente a
indução, a ciência e o empirismo. É claro, ele poderia dizer várias coisas ao
tentar fazer isso, mas visto que a indução, a ciência e o empirismo não podem
ser racionalmente justificados, meu oponente não pode seguir adiante. Não
preciso ouvir mais nada que ele possa dizer, a menos que consiga avançar
este ponto, mas ele jamais o fará, a não ser que eu permita isso
temporariamente para fins de argumentação.
Por outro lado, alguém como Van Til aceitaria a indução, a ciência e o
empirismo, mas com a ressalva de que consideraria essas coisas ininteligíveis
sem as pressuposições corretas. Isso é um erro, pois a indução, a ciência e o
empirismo são irracionais em si mesmos, e até mesmo pressuposições
corretas não podem salvar o que é inerentemente falso.
Podemos também seguir outra perspectiva para atacar o não cristão que
defende a lei da não contradição como o princípio primeiro de sua
cosmovisão. Isto é, podemos ressaltar que qualquer proposição implica
inúmeras outras proposições ― implica uma cosmovisão completa.
Ele poderia dizer que “a lógica é axiomática; é autojustificadora”. Mas
o simples ato de fazer essa afirmação requer a existência de uma teoria sobre
epistemologia (lógica, verdade, conhecimento etc.), metafísica (ele precisa de
uma teoria sobre a natureza da realidade para explicar o ato de falar etc.),
linguística (ele usa linguagem), e várias outras coisas.
Isso significa que ele jamais pode descansar após afirmar a “lógica”
como seu axioma. O negócio não é assim simples. Se você exigir, ele deverá
também expor sua visão sobre cada assunto relacionado que torna possível
sua afirmação desse axioma em primeiro lugar. Além do mais, sua visão
sobre cada uma dessas áreas deve ser racionalmente defensável (você deveria
atacá-lo em cada uma delas) e coerente (e.g., sua visão de linguística não
pode contradizer sua epistemologia). Nenhum não cristão pode satisfazer
essas exigências. Se você pressioná-lo nesse ponto ele jamais conseguirá
escapar simplesmente dizendo “A lógica é o meu axioma, meu ponto de
partida”.
Mesmo se reconhecermos que a lógica é autoevidente, isso não ajuda o
não cristão de forma alguma. Já a posição do cristão é totalmente diferente e
superior. Toda a Bíblia constitui seu princípio primeiro, a partir do qual
deduz toda a informação necessária à sua cosmovisão. A lógica é parte
integral da Escritura desde o começo, mas não constitui um axioma
independente.
O exposto acima poderia igualmente se aplicar quando um não cristão
usa a “existência” como seu ponto de partida. Ele precisa de muito mais que a
simples ideia de “existência” para mesmo afirmar a “existência” através de
sua cosmovisão.
A única estrutura noética defensável é a dedução a partir de um
princípio primeiro autojustificável, o que somente é possível se o princípio
primeiro contiver toda a informação necessária para produzir uma
cosmovisão completa. Se você não parte da revelação integral dada por Deus,
seu ponto de partida não possui nem mesmo a informação necessária para
você começar. Neste caso você dependerá de sua sensação, intuição e
raciocínio indutivo para fornecer informação ao seu princípio primeiro. Mas
como então você obteve esse princípio primeiro? Se foi por esses métodos
(sensação, intuição etc.), e se o princípio primeiro não vem sozinho a você,
como pode ser primeiro? E se esses métodos falham, e é isso o que acontece,
mesmo que lhe seja permitido reter esse princípio primeiro limitado, isso é o
mesmo que não ter nada.
Revisando, quanto à estrutura de uma filosofia bíblica defensável (não
estamos tratando do que é metafisicamente anterior numa cosmovisão
bíblica), Deus se encontra no mesmo patamar de tudo o mais que está no topo
(a revelação completa). Deus, “existência”, linguagem, epistemologia etc.,
começam todos no topo, sendo a revelação divina completa o princípio
primeiro. O argumento ateísta a partir da existência começa da “existência”,
mas os ateus não podem prosseguir a menos que tenham tudo o mais que
torna possível a afirmação da existência. Assim, eles não chegam a lugar
algum com esse argumento, e ainda precisam desenvolver uma cosmovisão
completa.
6. O argumento transcendental
1
para o materialismo

Ele disse que usaria o argumento transcendental para o materialismo.


Isto é, preciso usar minha boca física para dizer “lógica”. Preciso usar
meu corpo físico para inclusive estar no debate.

O argumento não provaria o materialismo mesmo que fosse sólido, pois


sua conclusão não alcança o materialismo. O materialismo afirma que a
matéria física é a realidade ou essência primária, ou até mesmo única, e que
não existe mente ou espírito incorpóreo. O argumento não alcança essa
conclusão, nem mesmo a cita ou implica.
Tudo o que esse argumento faz é sugerir que há um mundo físico e que
quando falamos, isso ocorre através de corpos físicos. É isso o que o
argumento afirma, mas ele nem mesmo prova essa conclusão mais modesta.
Ele não prova que há um mundo físico. Ele cai numa petição de princípio ao
afirmar que precisamos usar corpos físicos para falar e estar presentes num
debate, pois assume sem justificativa que estamos num mundo físico ao invés
de um mundo puramente mental. O argumento não mostra que pensamos
apenas com cérebros físicos. Ele não oferece nada que conteste minha
posição de que pensamos com nossas mentes incorpóreas e que os cérebros
não “pensam” de forma alguma.
Na minha concepção, a existência de um mundo físico não é conclusão
derivada da sensação ou intuição, mas conclusão deduzida da Escritura. Por
“Escritura” me refiro à “Palavra de Deus”, ou revelação verbal da mente de
Deus. Isso significa que não estou me referindo essencialmente ao livro
físico, papel e tinta, mas ao conteúdo intelectual não físico representado pelo
livro físico.
É claro que a Bíblia é a Palavra de Deus, mas estritamente falando, a
Palavra de Deus não é física, mas intelectual, pois nos referimos à porção da
mente de Deus que ele nos revelou. Ao roubar minha Bíblia e retalhá-la em
milhões de pedaços, você destruiu o livro físico, não a Palavra de Deus. É
essa Palavra intelectual e indestrutível que constitui o princípio primeiro do
meu pensamento.
O conteúdo intelectual da minha cosmovisão, ou Palavra de Deus,
reside em Cristo o Logos divino; e de acordo com a providência ordinária de
Deus, esse conteúdo é diretamente comunicado a minha mente na ocasião em
que ocorrem as sensações visuais quando leio a Bíblia, mas à parte das
próprias sensações visuais. As sensações fornecem a ocasião para Deus agir
em minha mente, mas por si só não comunicam qualquer informação.
Essa é uma forma de ocasionalismo. Ela não é inteiramente nova, tendo
pontos em comum com a teoria da iluminação de Agostinho, com a “visão de
Deus” de Malebranche e com várias outras formas de “doutrina do logos”.
Entretanto, minha posição não é idêntica a deles. É mais bíblica, por ser
conscientemente estabelecida sobre um fundamento exegético, e evita as
suposições antibíblicas das outras versões de ocasionalismo. Além do mais,
faço sua aplicação consistente sobre cada aspecto da realidade. Mas de fato,
ela não é nada mais que a implicação necessária da doutrina bíblica da
providência de Deus sobre cada detalhe de sua criação.
Posso derrotar aquele tipo de argumento propondo que poderíamos
estar debatendo em um mundo puramente mental, ou num sonho. Como
podemos saber que não é esse o caso? Porque minha filosofia não depende da
sensação ou indução, isso não me afeta de forma alguma. Posso usar os
mesmos argumentos com o mesmo efeito, estejamos nós debatendo no
mundo físico ou no mundo mental. Mas visto que meu oponente é empirista
ou materialista, ele depende do mundo físico e de uma epistemologia física, e
assim deve primeiro provar que estamos debatendo em um mundo físico.
7. Mas o que é conhecimento?

Eu nego que indução, sensação e ciência possam produzir qualquer


forma de conhecimento, e tenho fornecido em meus escritos justificativa
bíblica e racional para essa posição. Além das réplicas e evasivas tipicamente
falaciosas, uma resposta é perguntar “Mas o que é conhecimento?” Isto é, se
não pudermos definir conhecimento ou justificar nossa definição de
conhecimento, pareceria insignificante dizer que a indução, sensação e
ciência não podem produzir qualquer forma de conhecimento. Esse sofisma é
apenas outra tática evasiva usada por aqueles que não podem responder meus
argumentos.
A objeção ignora o ponto em questão. O ponto é que a indução,
sensação e ciência envolvem processos falaciosos de raciocínio, de modo que
jamais podem descobrir premissas verdadeiras e jamais podem produzir
conclusões logicamente válidas a partir das premissas. Ou seja, é impossível
usar a indução, sensação e ciência para validamente raciocinar a partir das
premissas X e Y à conclusão Q com relação a um dado assunto P. Assim,
minha argumentação contra os oponentes permanece de pé mesmo sem
jamais termos definido ou mesmo mencionado “conhecimento”.
Assumindo a premissa “Eu vejo um carro vermelho”, como é possível
raciocinar validamente a partir dessa premissa para “Há um carro vermelho”?
Deve haver outra premissa suprindo a lacuna entre “Eu vejo” e “Há”, mas
como ela pode ser racionalmente obtida e justificada, ao invés de apenas
teimosamente assumida? Este é o ponto, e este é o desafio que meus
oponentes ainda não conseguem responder.
Como tal, não há diferença racional entre pular de “Eu vejo um carro
vermelho” para “Há um carro vermelho”, e pular de “Eu imagino um carro
vermelho” ou “Eu desejo um carro vermelho” para “Há um carro vermelho”.
Qual é a diferença racional entre sensação, imaginação e expectativa? Como
alguém pode pular de “Eu vejo” para “Há” e não pode pular de “Eu imagino”
ou “Eu desejo” para “Há”? Qual é a premissa adicional que faz a diferença? E
como essa premissa é racionalmente obtida e justificada? A questão não diz
respeito à definição de conhecimento, mas à validade do processo de
raciocínio.
A objeção é sofística e irracional. Se definirmos ou não conhecimento,
e se meus oponentes definem ou não conhecimento, a objeção não faz nada
para justificar a indução, sensação e ciência, mas busca distrair-nos do ponto
principal, esperando que nos esqueçamos do seu insucesso em fazer algum
progresso no estabelecimento do seu caso.
A objeção diz que eu preciso definir “conhecimento” na proposição “A
ciência não pode produzir qualquer conhecimento”. Mas eu me recuso a ser
intimidado ou distraído por tal sofisma. Posso de fato fazer o mesmo desafio
aos meus oponentes sem usar a palavra “conhecimento”. Eu os desafio a
demonstrar como as sensações podem descobrir premissas verdadeiras. Eu os
desafio a mostrar como a indução pode validamente alcançar conclusões que
estão além da informação contida nas premissas. Eu os desafio a demonstrar
como a ciência pode, com validade lógica, alcançar qualquer conclusão sobre
o que quer que seja. Eu os desafio a mostrar uma só conclusão em toda a
história humana que seja alcançada com validade lógica pela sensação,
indução e ciência.
Posso continuar impondo meu desafio contra a indução, sensação e
ciência sem usar a palavra “conhecimento”. Por exemplo, afirmo que a
ciência não pode validamente deduzir ou inferir nada, pois comete a falácia
lógica da afirmação do consequente. Estou dizendo a mesma coisa ao afirmar
que a ciência não pode produzir qualquer conhecimento.
Muito embora eu possa definir conhecimento e usar a palavra para
fazer o desafio, é provável que se fizesse isso neste contexto meus oponentes
continuariam sua política de evasiva, tentando contestar minha definição.
Mas eu me recuso a permitir que trapaceiros intelectuais me intimidem ou
distraiam. A questão real é como eles podem usar a indução, sensação e
ciência para validamente raciocinar de premissas até uma conclusão, seja no
que for.
8. Onde está a refutação?

Esse crítico atacou sua posição sobre sensação, mas penso que algumas
das coisas que ele disse já foram respondidas por você em seus artigos.
Não estou certo se ele as leu.

Minhas publicações representam uma resposta definitiva a todas as


críticas encontradas em qualquer lugar que seja, não importando por quem
tenham sido escritas. Tenho confiança de que estão corretas e são
irrefutáveis, e não existe qualquer pressão para escrever constantemente
novos textos em resposta às críticas. As pessoas podem escrever toda a sorte
de coisas contra algo, mas nem toda tentativa de refutação é logicamente
sólida ou bem sucedida.
Muitas pessoas são influenciadas pelas coisas que leram mais
recentemente, e assim, quando leem meus escritos, são dominadas por eles,
mas quando então leem uma tentativa de refutação, mudam e pensam que
estou equivocado. Então ofereço minha resposta e eles parecem se convencer
novamente. Assim, são arrastados de lá para cá, entre diferentes posições, e
nunca alcançam estabilidade intelectual.
Há pelo menos duas razões para esse problema.
Primeiro, minha posição é amplamente malvista, e sou capaz de
convencer qualquer um somente pela força bíblica e racional absoluta de
meus argumentos. Por outro lado, a maior parte das pessoas aprova alguma
versão de empirismo ainda que sem qualquer convicção, e mesmo sendo
inicialmente despertada de sua letargia empírica através dos meus escritos, se
curva facilmente ao empirismo pelo mais frágil dos argumentos ou mesmo
por uma pergunta retórica. Isto é, essas pessoas vão dar qualquer desculpa
para continuar com aquilo que já preferem crer.
Segundo, muitos leitores falham em aplicar padrões rigorosos de
racionalidade quando examinam argumentos e refutações. Eles não percebem
que nem toda acusação é uma refutação válida. Assim como no caso de
qualquer argumento sólido, uma refutação deve trazer uma conclusão que é
validamente deduzida de premissas verdadeiras e que contesta a posição do
oponente. Meus críticos não escreveram nada equivalente a isso. Eles lançam
afirmações, especulações, perguntas retóricas, mas nenhum argumento que
infere conclusões necessárias a partir de premissas verdadeiras. Além do
mais, eles não escreveram qualquer coisa que prove o empirismo. Mesmo se
fossem bem-sucedidos em me refutar, terminariam com nada mais que o
ceticismo.
9. A incoerência do empirismo

Certo argumento declara que a proposição “Todo conhecimento vem de


12
proposições bíblicas e de suas implicações necessárias” , é incoerente, pois
a proposição em si não é bíblica e não pode ser deduzida de proposições
bíblicas. Logo, se alguém aceita a proposição, deveria rejeitá-la.
Entretanto, é de fato possível deduzir esta proposição da Escritura. A
Bíblia ensina que Deus é infalível, que a Bíblia é sua revelação infalível, que
Deus controla todas as coisas, que o homem é falível, que as sensações e
intuições humanas são falíveis etc. etc. ― a proposição é facilmente deduzida
dessas premissas.
Assim, a única coisa que a objeção faz é mostrar-nos que os críticos são
incapazes de fazer as mais simples e óbvias deduções.
Por outro lado, reflita sobre o empirismo. Assume-se com frequência
que a sensação é um modo confiável de obter conhecimento, mas considere
apenas alguns dos problemas relacionados ao empirismo e à ciência:
1. Se o empirismo é racional, deveria ser possível demonstrar sua
racionalidade por um processo válido de raciocínio. Qual é esse
processo de raciocínio? E ele é realmente válido?
2. Se o empirismo necessariamente usa a indução, como pode evitar os
problemas lógicos que acompanham a indução?
3. Se o empirismo é o próprio fundamento da ciência, como a ciência
pode ser considerada notoriamente racional se ainda é preciso defender
o empirismo?
4. E quanto ao fato de que o método científico, por sua própria natureza,
comete a falácia de afirmar o consequente em todo experimento?
Quem censura minha oposição ao empirismo deve mostrar como pode
conhecer alguma coisa pela sensação através de sua epistemologia parcial ou
totalmente empírica.
Não se pode provar o empirismo pela “razão pura”, pois a lógica em si
não carrega qualquer conteúdo do qual seja possível derivar uma prova do
empirismo. E usar a intuição como fundamento para a sensação demandaria
uma prova para a intuição como meio de obter conhecimento, bem como um
padrão comprovado para determinar qual instância de intuição é correta.
Alguns cristãos empiristas afirmam que a Escritura fornece as
precondições para o empirismo, ou pressuposições que explicam ou
justificam o empirismo. De fato, a Escritura fornece as precondições para
entendermos que o empirismo é irracional e falso, mas não fornece
justificativa racional para dizer que o empirismo é verdadeiro. Apela-se a
Mateus 24.32, mas já mostrei que o versículo não pode produzir uma
epistemologia do tipo “eu vi, portanto sei”. Além disso, Mateus 24.32 não é o
único versículo na Bíblia. E quanto a João 12.28-29 e 2 Reis 3.16-24?
Se a Escritura fornece ao menos um caso em que a sensação não é
confiável, precisamos no fim das contas de um padrão ou método confiável
para saber qual instância de sensação é confiável. Qual é esse padrão ou
método? Esse padrão ou método é realmente confiável? Se eles afirmam que
uma sensação comprova outra, isso constitui uma petição de princípio, pois
não sabemos qual das sensações está correta, e talvez ambas estejam erradas.
Não importa quantas passagens bíblicas eles possam deturpar e usar
mal no seu intento, pois havendo ao menos uma passagem na Escritura
sugerindo a falibilidade da sensação, somos lançados de volta à questão do
padrão ou método pelo qual podemos dizer qual ocorrência é confiável.
Entre aqueles que dizem defender certa forma de “apologética
pressuposicional”, alguns têm sido tão obcecados em criticar minha oposição
ao empirismo que ficamos com a impressão de que defendem agora o
empirismo, e de uma forma amiúde contraditória com suas palavras ao se
manifestarem contra a apologética clássica e evidencial. Eles justificam o
empirismo quando atacam uma crítica a esta epistemologia? Como? E se o
empirismo é parte de sua epistemologia, eles precisam justificar o empirismo
antes de atacar uma oposição ao empirismo; de outro modo permanecerão
apenas na argumentação circular, em lugar algum.
Se eles dizem que uma pessoa precisa confiar em suas sensações físicas
para ler a Bíblia, que as palavras da Bíblia são transmitidas à mente a partir
das próprias sensações físicas, e se ao mesmo tempo reconhecem que as
sensações são falíveis, então se a Bíblia é ou não infalível, isso se torna
imediatamente irrelevante para elas, pois jamais podem ter uma Bíblia
infalível na prática. Pois, realmente, a Bíblia será confiável apenas até onde
forem confiáveis suas sensações.
Mesmo que eu lhes permita crer que as sensações são geralmente
confiáveis, isso permanece irrelevante até que eles possam me mostrar quão
confiáveis elas são, e ainda mais importante, como eles sabem em quais
instâncias estão corretos. Se a pessoa não pode me mostrar em quais
instâncias as sensações ou inferências das sensações estão corretas, em efeito
elas nunca são confiáveis, pois não há como distinguir a verdade do erro.
Alguns afirmam que a Bíblia ensina que Deus criou o homem de modo
a poder usar seus sentidos para obter certo conhecimento, apesar das
sensações serem falíveis. Há pelo menos dois problemas aqui:
1. Eles afirmam que precisam confiar em suas sensações para ler a
Bíblia antes de tudo, e assim sendo, como eles podem confiar naquilo
que pensam ter lido na Bíblia acerca das sensações sem primeiro provar
a confiabilidade da sensação? Eles argumentam em círculo.
2. A Bíblia fornece diversos exemplos mostrando que os sentidos são
falíveis, que eles estão frequentemente enganados. Assim, mesmo
ignorando o ponto anterior, ainda não há como eles dizerem quais
instâncias de sensações são confiáveis, e não fizeram nenhum progresso.
Portanto, a opinião deles é que se revela de fato incoerente, pois eles
não podem saber, usando as sensações, se suas sensações são confiáveis. Por
outro lado, contornamos todas essas dificuldades quando partimos da mente
de Deus ao invés da sensação do homem.
Eles exclamam, eventualmente, que sem depender de nossas sensações
não podemos saber nada. Mas essa queixa não faz nada para provar o
empirismo, e assim, não faz nada para mostrar que o empirismo é a saída do
ceticismo. Em contraste, afirmamos que a revelação é a única forma segura
de escaparmos do ceticismo. Não consideramos a Bíblia como se fosse nada,
mas tê-la como ponto de partida é construir sobre um fundamento de vasta
sabedoria e conhecimento.
10. A manobra fatal

Existe uma manobra fatal no debate, que se você puder mostrar que a
posição do oponente se contradiz ou torna a si mesma impossível,
efetivamente destruiu sua posição e tudo o mais que segue dela. É um
movimento poderoso. Põe seu oponente em xeque-mate. Contudo, se usada
de forma ilegítima pode sair pela culatra e infligir um golpe fatal na posição
de quem a usa.
Meu sistema de filosofia e método de apologética é corretamente
chamado de “bíblico” ou “pressuposicional”. Eu começo com a revelação e
deduzo dela o restante do sistema. A partir desse princípio básico pode-se
adaptar o sistema para responder a qualquer objeção, bem como destruir
qualquer sistema oponente. O sistema é desenvolvido sobre a revelação e usa
a dedução para derivar informação inerente a ela. O sistema exclui desde o
início epistemologias irracionais e impossíveis, como as que depositam
alguma confiança na intuição e sensação.
Uma escola proeminente de apologética “pressuposicional” protesta
dizendo que isso vai longe demais. Essa escola reconhece que ao menos em
si mesma, a indução é falaciosa, mas é de alguma forma redimida quando
operamos debaixo de pressuposições bíblicas. A escola admite que ao menos
por si só, a sensação não pode fornecer conhecimento, mas funciona como
um modo confiável de obter conhecimento quando se assume princípios
bíblicos. Ou defende, por outro lado, que o incrédulo pode usar a indução e a
sensação com bons resultados, só não pode “contar” com elas. Eu já critiquei
essa escola de apologética incoerente e antibíblica em vários lugares, e não é
meu objetivo principal fazê-lo novamente aqui. Mas precisamos ter em mente
até o fim da presente discussão que os aderentes dessa escola jamais
mostraram o que ou como as pressuposições bíblicas podem tornar racional e
lógico aquilo que é inerentemente irracional e ilógico. Trata-se simplesmente
de uma afirmação injustificada da parte deles.
Todavia meu ponto se refere a outra coisa, isto é, como essa escola de
apologética tenta refutar minha escola, e como o tiro sai pela culatra. Uma
objeção frequente é que se precisamos começar da Bíblia, devemos primeiro
usar nossos sentidos para mesmo ler a Bíblia. Já respondi a isso inúmeras
vezes em diversos lugares, e não houve qualquer tentativa bem sucedida de
refutação. Entre outras coisas, essa objeção cai numa petição de princípio e
de fato ignora minha posição, antes de tudo. Isso porque se eu estiver correto,
de fato não precisamos usar nossos sentidos (no sentido pretendido pelos
meus oponentes) para ler a Bíblia. Eu poderia responder a objeção do mesmo
modo que respondo a qualquer ateu empirista ― poderia levar o debate a um
mundo puramente mental (como num sonho), apenas por sugestão. Posso a
partir de lá restabelecer o mundo físico pelo meu princípio primeiro, mas o
que terá acontecido com o empirista, cristão ou não?
A objeção não pode me causar dano, pois já a respondi. Entretanto,
agora que meus oponentes lançaram a objeção ― e numa forma consistente
com sua própria posição ―, eles é que precisam respondê-la por si mesmos.
Eles afirmaram que uma pessoa precisa usar seus sentidos para saber aquilo
que a Bíblia diz, e por isso devem agora mostrar que nossos sentidos são
infalíveis, ou que, sendo falíveis, existe um modo infalível de descobrir em
quais casos os sentidos estão corretos e em quais casos não estão corretos. Se
não podem fazer isso, eles não podem ler a Bíblia, e todo o seu sistema ―
toda a sua fé cristã ― desmorona, e com a mesma facilidade que isso ocorre
no ateísmo empirista, ou qualquer religião ou filosofia não cristã.
Alguns deles tentam justificar a sensação como meio confiável de se
obter conhecimento. É impossível argumentar a favor do empirismo à parte
da Escritura, e eles reconhecem isso. Assim, numa aparente coerência com
sua posição, eles argumentam pela confiabilidade básica da sensação partindo
da Escritura. Mas o que seria assumido para eles firmarem sua posição a
partir da Escritura? Eles reconhecem que nossos sentidos são falíveis, e desse
modo não buscam defender o empirismo argumentando que os sentidos são
infalíveis. Contudo, se os sentidos são falíveis eles precisam estabelecer com
base na Escritura um método infalível de discernir as instâncias em que os
sentidos estão corretos ou incorretos. Mas se eles possuem de fato tal método,
e ele é falível, ainda precisamos infalivelmente saber o quanto e quando esse
método é falível; caso contrário, tudo sucumbe em ceticismo mais uma vez.
Eles não chegaram nem mesmo perto de estabelecer algo assim. Quando
muito mostraram que a sensação de um dado personagem bíblico estava
correta num caso particular, pois a Bíblia revela que a sensação estava correta
naquele caso. Até onde podemos saber, essa pessoa jamais teve outra
sensação correta. Assim, eles precisam muito mais do que isso. Eles precisam
(mas não conseguem fornecer) de uma teoria de epistemologia concernente às
sensações que se aplique às pessoas e experiências que não estejam já
descritas na Bíblia.
Porque insistem no empirismo, mas não conseguem justificá-lo, eles
mesmos se afastam completamente da Bíblia ao aplicar a objeção contra mim.
Ao tentarem realizar uma manobra fatal contra a minha posição, aniquilam a
sua própria. De fato, a menos que possam responder sua própria objeção, eles
nem mesmo podem sustentar uma objeção contra mim, pois de acordo com
sua própria posição, eles precisariam da confiabilidade dos sentidos para
inclusive ler ou ouvir minha posição em primeiro lugar. Assim, se eu levasse
a sério sua posição, haveria de dizer-lhes que todo o seu sistema se
desintegra, que eles não podem conhecer nada do que está na Bíblia, que eles
nunca ouviram o evangelho, e assim sendo, que não podem nem mesmo ser
cristãos. Mas porque eu não os levo a sério, e porque consigo explicar suas
vidas com minha posição, posso ser mais bondoso com eles do que sua
própria posição lhes permite.
Tal como se apresenta, qualquer não cristão pode confrontar os
proponentes dessa escola de apologética e claramente demolir o sistema
cristão usando apenas este ponto. É verdade que a maioria dos não cristãos
não faria isso, pois assume o empirismo como parte integrante do seu sistema
de crença, e numa situação normal não buscariam atacar aquilo em que eles
mesmos creem. Entretanto, se um não cristão se sente encurralado, pode
sempre levantar este ponto para garantir a mútua destruição. Assim, declaro
que esta escola de apologética pressuposicional é um completo fracasso. Em
seus vários aspectos, até onde estiver em consonância com a Escritura, a
escola será certamente superior aos sistemas não cristãos, mas isso é
irrelevante na construção de uma filosofia, pois ela fracassa em seu próprio
início, e assim não pode nem mesmo chegar àqueles aspectos que são
escriturísticos; se algum não cristão se der conta desse detalhe, a escola se
provará aos crentes um total desastre no debate e no evangelismo.
Se alguém discorda do que foi exposto acima, que prove ― não apenas
afirme ― como consegue ler uma só palavra da Bíblia pela sensação. Que
demonstre logicamente como isso acontece ― estabeleça cada premissa e
mostre que cada passo segue por inferência necessária ― e abrirei mão de
todo o debate sobre essa questão. Qualquer outra coisa que você disser é
irrelevante ― você afirmou a necessidade da sensação inclusive para ler a
Bíblia, e deve agora provar o ponto.
Se você é incapaz de fazer isso, mas mantém firme sua posição,
permita-me oferecer um pequeno conselho. Talvez você nunca venha a
encontrar um não cristão que desafie a confiabilidade da sensação, mas caso
isso aconteça, saiba que a resposta é rejeitar a sensação e permanecer
somente na revelação. Muitas pessoas têm interesse em defender um teólogo
ídolo, mas estou interessado na causa de Cristo. Se você deve permanecer em
sua posição falsa e desonesta por lealdade a uma personalidade ou escola de
pensamento em particular, não posso impedi-lo. Mas lembre-se do que estou
dizendo. Um dia você pode precisar disso. Nem todo não cristão consentirá
que num debate você passe por cima desse ponto, ainda que se permita fazer
isso.
Há também outra objeção que diz respeito a minha visão sobre a
soberania divina e como esta se relaciona com a metafísica e a epistemologia.
Afirmo que Deus deve ser ativo em facilitar e controlar todos os pensamentos
humanos, verdadeiros ou falsos, bíblicos ou heréticos. Os aderentes da escola
de apologética pressuposicional que discutimos aqui tentam mais uma vez
realizar uma manobra fatal contra mim. Eles sugerem que de acordo com a
minha visão, eu poderia estar enganado ao afirmar minha visão. Primeiro,
isso não passa de um completo absurdo, pois a Bíblia ensina que Deus pode
enviar espíritos maus para convencer pessoas a acreditarem no erro. Assim,
não importando como acontece, é Deus quem decreta que uma pessoa será
enganada. Segundo, eles realmente mostram não ter ideia de como realizar
essa manobra fatal, pois seu tiro sai novamente pela culatra. Se eu estiver
enganado tal como sugere a objeção (isto é, na minha explicação de como
alguém crê numa falsidade), isso de fato prova minha posição. Se eu estiver
enganado tal como afirmo que alguém é enganado, não estou de fato
enganado. Para exemplificar, se Deus envia um demônio para “enganar” uma
pessoa fazendo-a pensar que Deus não envia demônios para enganar, Deus
envia demônios para enganar. Do mesmo modo, se Deus me faz crer na
“falsidade” que é Deus quem faz alguém crer na falsidade, Deus faz uma
pessoa crer na falsidade, e de fato não estou enganado. Em outras palavras,
essa objeção não pode demonstrar que minha posição é autorrefutável.
A manobra fatal de mostrar a autocontradição na posição do oponente
pode ser um movimento poderoso e eficaz no debate. Apenas se assegure de
que a posição do oponente é de fato autorrefutável e que a objeção que você
oferece não é um tiro pela culatra. Atente que essa manobra fatal não seja
fatal justamente a você. É claro, se o tiro pode sair pela culatra mostrando
incoerência em sua própria posição, sua posição está errada e não merece ser
defendida em primeiro lugar, conforme mostrado acima.
E se você ainda discorda, aqui vai outro exercício. Mostre este artigo a
qualquer não cristão com educação acima da sexta-série e peça-lhe que
aplique o que está lendo. Agora veja se você ainda pode defender sua fé
contra esse não cristão usando sua apologética “pressuposicional”.
11. Falácias e falácias sobre
1
falácias

Donde posso dizer que esse crítico não compreende de fato sua posição.
Ele assume que segundo a posição, somente as proposições encontradas
na Bíblia são verdadeiras e somente elas podem representar
conhecimento ― ele exclui o conhecimento por dedução porque diz que
“conhecimento por dedução” não pode ser achado na Bíblia.

Logicamente falando, as implicações das proposições bíblicas não são


adições às proposições bíblicas, já que todas as implicações de qualquer
proposição são inerentes à proposição.
Assim, é uma objeção estranha dizer que não podemos estar corretos ou
ser coerentes porque afirmamos também o que é necessariamente deduzido
de proposições bíblicas. Eu nunca me restringi às proposições bíblicas à parte
de suas implicações necessárias, nem preciso fazê-lo, já que todas as
implicações das proposições bíblicas são inerentes às proposições bíblicas. O
que é válida ou necessariamente deduzido de proposições reveladas é tão
certo quanto aquilo que é revelado explicitamente.
Assim, embora afirme que somente as proposições bíblicas e suas
implicações sejam infalíveis, eu nunca disse que essas são as únicas
proposições pelas quais opero. Pelo contrário, levo em conta muitas
proposições extrabíblicas no meu pensar e viver diários ― ainda que somente
como opinião, não como informação revelada infalível. Isso me permite agir
e também debater sobre diversas coisas como fazem as demais pessoas, com
a diferença que faço uma clara distinção entre opinião falível e revelação
infalível, e que jamais elevo a opinião ao nível de revelação.
No que se refere à apologética, minha opinião não constitui a minha
religião, de modo que não é a minha opinião que defendo. Assim, não tenho
problema em reconhecer que certas coisas que defendo representam minha
opinião falível, mas que quando se trata da minha fé bíblica, sustento-a como
revelação infalível.
Por outro lado, o padrão pelo qual os críticos consideram algo como
“conhecimento” ou informação confiável é muito baixo e irracional, e muitas
coisas são assumidas como se fossem conhecimento ou informação confiável
mesmo sem qualquer justificativa racional, e são na verdade mera opinião e
conjetura. Como consequência, seus sistemas de crença representam uma
mescla de incerteza e confusão, e sua epistemologia irracional corrói
praticamente toda a sua estrutura noética.
Esse crítico contesta minha afirmação de que o conhecimento inato do
homem compreende conteúdo que é suficiente e específico o bastante para
corresponder somente à cosmovisão bíblica, excluindo todas as demais
cosmovisões. Ele pensa que se trata apenas de uma afirmação, que isso não
poderia ser derivado de Romanos 1 e 2.
Mas Romanos 1 diz que esse conhecimento inato contém informação
sobre os atributos de Deus, como sua eternidade e poder, e é específico o
suficiente para condenar toda a idolatria e até mesmo algo como o
homossexualismo. Em seguida, Romanos 2 ensina que as leis morais foram
escritas nas mentes dos homens, e que essa informação é completa e
específica o suficiente para acusar ou defender muitas de suas ações no dia a
dia.
É muita informação específica! Já que esse conhecimento inato é
completo o suficiente para condenar quem não adora o Deus cristão ou não
obedece às leis morais do Deus cristão, necessariamente resulta que esse
conhecimento é completo o suficiente para excluir todas as ideias não cristãs
de Deus e todos os conceitos não cristãos de moralidade.
Evidentemente, isso ainda não fornece qualquer informação sobre
como alguém pode receber a salvação, mas é suficiente para condenar todos
os não cristãos. Opor-se a isso é o mesmo que dizer que o conhecimento inato
do homem é suficiente para excluir muitas, mas não todas as religiões; assim,
se Deus condena os aderentes das religiões que não são excluídas pelo
conhecimento inato do homem, isso não poderia se dar com base no
conhecimento inato do homem. Contudo, tal visão (uma implicação
necessária de se rejeitar a minha posição) contradiz frontalmente o ponto de
Paulo em Romanos 1 e 2.
O crítico também falha em declarar e defender sua própria construção
positiva, sua própria epistemologia e filosofia, ainda que dependa delas para
me desafiar. Se ele se opõe ao meu ocasionalismo e à minha oposição ao
empirismo, qual é a sua epistemologia, e como ela é racionalmente
justificada? Como ele pode ler meus livros e então criticá-los?
Ele não pode simplesmente criticar minha epistemologia sem ter a sua
própria, e ele deve ser capaz de justificar sua epistemologia antes de criticar a
2
minha. Isso porque suas críticas devem trazer suas próprias pressuposições
básicas ― o crítico deve ter algo sobre o qual se firmar quando me ataca, e
algo com que atacar. Isso não seria verdade no caso de termos as mesmas
pressuposições básicas, discordando apenas em detalhes secundários ― neste
caso ele não teria de apresentar uma construção positiva e ser capaz de
defendê-la, mas naquele caso sim, pois nossas pressuposições básicas
estariam divergindo.
Logicamente falando, até que meus críticos (os que afirmam algum tipo
de empirismo) justifiquem irrefutavelmente o uso da sensação como meio de
conhecimento, eles nem mesmo podem começar a me criticar. Eles não
podem conhecer nada ― não podem sequer ler a Bíblia, pois alegam
depender das suas sensações para lê-la, mas não explicaram como podem
validamente derivar conhecimento a partir das suas sensações.
É fútil alegar, como fazem muitos desses críticos, que as
pressuposições bíblicas fornecem as precondições suficientes para derivar
conhecimento pela sensação. É verdade que as pressuposições bíblicas são
necessárias para os erros se tornarem inteligíveis antes de tudo, mas erros
ainda são erros, e a única diferença é que podemos agora pensar neles
inteligivelmente como erros. É por isso também que posso pensar
inteligivelmente no empirismo como falacioso. Pressuposições bíblicas não
podem transformar irracionalidade em racionalidade; podem apenas tornar a
irracionalidade inteligível como irracionalidade.
12. Invencibilidade, irrefutabilidade
e infalibilidade

Você sempre defende que seus escritos são invencíveis. Não estou
necessariamente dizendo que discordo, mas às vezes você parece
agressivo, talvez um pouco agressivo demais. Seus escritos não
poderiam conter erros?

Talvez haja um mal-entendido do que estou precisamente defendendo e


daquilo que tenho em vista ao fazer a defesa; parece também haver certa
confusão sobre os significados e as implicações de invencibilidade,
irrefutabilidade e infalibilidade.
Afirmo que alguns dos meus escritos são invencíveis e irrefutáveis.
Mas a maior parte deles está em consonância com muitos outros teólogos, de
modo que nesses casos, sobretudo quando os argumentos são similares, eu
poderia prontamente afirmar que esses teólogos também são invencíveis e
irrefutáveis.
Por exemplo, eu afirmaria que Martinho Lutero na soberania divina,
Charles Hodge na justificação pela fé, Robert Reymond na divindade de
Cristo, e muitos outros teólogos em muitos outros assuntos, são invencíveis e
irrefutáveis. Eles desenvolveram corretamente seus argumentos sobre essas
doutrinas a partir da Escritura, e a Escritura é invencível e irrefutável. Assim,
quando afirmo que sou invencível e irrefutável em certos pontos, não estou
afirmando algo exclusivo a mim.
Isso é muito diferente de afirmar infalibilidade. Considere a minha
afirmação de que meu método apologético é invencível e irrefutável. Dizer
que um determinado método apologético é invencível e irrefutável é diferente
de dizer que a pessoa é infalível, e uma pessoa ser falível não significa que
ela esteja errada a todo o momento. É possível eu escrever “1 + 1 = 2”
centenas de vezes num ensaio sem cometer um só engano, e esse ensaio seria
de fato invencível e irrefutável (ainda que não muito interessante), mas isso
não significa que eu seja infalível como pessoa.
Sob o risco de ser mal interpretado como arrogante, eu me mostro
agressivo porque anseio transmitir às pessoas minha confiança na Escritura. E
repetidas vezes lembro aos leitores que tenho toda essa certeza apenas porque
minha própria confiança deriva da infalibilidade da Escritura. Assim, não
enfraquecerei meus próprios textos adotando uma falsa humildade, ainda que
isso seja socialmente mais aceitável.
É tão raro cristãos testemunharem alguma fé em seus líderes que
quando uma pessoa sai a fazer isso, todas as demais a tomam por arrogante.
Mas suas mentes foram aprisionadas por um padrão não cristão. Se os
cristãos não podem afirmar invencibilidade e irrefutabilidade por causa da
infalibilidade da Escritura, não cristãos terão sempre espaço garantido no
reino intelectual. Mas com base na autoridade da Escritura e no nome de
1
Cristo, não permito que os incrédulos tenham tal espaço.
Se uma coisa é verdadeira e você a afirma, precisa ter certeza do ponto.
Se não tem certeza, não diga que é verdadeiro, e não haverá problema.
Muitos teólogos e pregadores dizem “Isso deve ser verdade… mas posso
estar errado”. Isso não é humilde, mas estúpido. Não se deixe tapear pelo
frequente autorrebaixamento de algumas pessoas. Talvez elas sejam de fato
humildes, mas por outro lado, talvez sejam apenas perdedoras sem
personalidade. Essas pessoas fazem alarde sem convicção, e quem as ouve
2
fica confuso e hesitante ao invés de centrado e militante.
Jamais afirmei que sou infalível, apenas que meu método de
apologética é invencível (vai sempre derrotar o oponente) e irrefutável (não
pode ser derrotado por nenhum oponente). E ele é invencível e irrefutável
porque é bíblico e racional. Mais uma vez, invencibilidade e irrefutabilidade
geral é diferente de infalibilidade ou perfeição absoluta, e nunca afirmei ser
infalível ou perfeito.
Isso também se aplica a outros cristãos quando falam a partir da
Escritura. Se você escrevesse um ensaio mostrando a partir da Bíblia que
Cristo é Deus, seria melhor afirmar invencibilidade e irrefutabilidade.
Algumas coisas são simplesmente corretas, e você deve conhecer e afirmá-
las, transmitindo assim essa confiança aos outros.
Dito isso, há um sem número de coisas sobre as quais estou incerto. E
se você seguir meus escritos perceberá que me refiro a essas declarações
usando palavras como “talvez”, “provavelmente”, “é possível”, “é minha
opinião” e assim por diante.
Em alguns casos sou hesitante sobre certas coisas porque sou
consistente com minha epistemologia, e não afirmarei mais certeza do que é
racionalmente justificado. Em outros casos, sou hesitante porque ainda não
estudei e considerei a fundo os argumentos relevantes, e não quero tomar
uma posição definida. Além do mais, porque ainda não estou convicto da
posição correta, me abstenho de sequer mencionar certas coisas; entrementes,
continuo a dispensar tempo pesquisando sobre esses assuntos.
De fato, avalio muitas das coisas sobre as quais outras pessoas
afirmariam certeza com base em sua falsa epistemologia, mas o meu padrão é
muito mais elevado. Isso também significa que quando eu declaro que uma
dada posição é invencível e irrefutável, já apliquei contra essa posição uma
quantidade muito maior de ceticismo do que qualquer um dos meus críticos e
oponentes poderia mesmo reunir.
13. Excluído por necessidade

Meu amigo apresentou uma das mais frequentes objeções ao


cristianismo, e sobriamente percebi que nunca havia dispensado tempo
lendo uma crítica do argumento; vi-me despreparado para respondê-lo.

Sua objeção era simplesmente: por que o Deus cristão é que tem de ser o
único Deus verdadeiro, e não o Deus de alguma outra religião? Eu
percebi que poderia avançar apontando as insuficiências dos deuses das
principais religiões, mas existe uma forma de também demonstrar
positivamente a reivindicação da verdade exclusiva do cristianismo?

Para qualquer proposição verdadeira, existe literalmente um número


infinito de erros ou desvios possíveis. Por exemplo, se é verdade que “1 + 1 =
2”, os erros ou desvios possíveis incluem 1 + 1 = 3, 4, 5… n. Assim, é
impossível fazer uma refutação específica de cada erro ou desvio possível da
verdade. Precisamos antes de uma afirmação ou argumento positivo que
exclua todos os erros ou desvios por necessidade lógica.
Se o cristianismo (a Bíblia) é verdadeiro, e esse mesmo cristianismo
declara que todas as afirmações e cosmovisões não cristãs são falsas, todas as
afirmações e cosmovisões não cristãs serão falsas por necessidade lógica.
Agora, para eliminar todas as afirmações e cosmovisões não cristãs por
necessidade lógica seria necessário que a demonstração positiva fosse correta
por necessidade lógica. Supondo que tenhamos tal apologética, a situação
seria a seguinte:

1. O cristianismo é verdadeiro por necessidade lógica.


2. O cristianismo exclui todas as visões não cristãs.
3. Logo, todas as visões não cristãs são falsas por necessidade lógica.
A chave é (1) ― o resto é fácil e automático. E para obter (1) você deve
ler minhas obras sobre apologética e aprender o método. Recomendo a leitura
de Questões Últimas, Confrontações Pressuposicionais e Apologética no
Diálogo, entre outros.
Deste modo isso força seu oponente a interagir com a construção
positiva do cristão ao invés de permitir que, diante da força da sua
apresentação, ele se esquive e lance apenas meras possibilidades sobre você
― pois você destruiu essas possibilidades, não por refutações específicas,
mas por necessidade lógica. Se você está lidando com uma cosmovisão não
cristã específica, pode também fazer uma refutação desse sistema de crença
em particular.
1
14. “Deus é Lógica”

Tenho no presente uma discussão sobre Deus e a lógica. Desenvolveu-se


a premissa que “Deus=lógica” e “lógica=Deus”. Em sua opinião, ela é
uma premissa válida? Ou é mais bem expressa como “Deus é lógico”?
Fornecendo um pequeno contexto, discutimos sobre a Trindade e a
natureza dual de Cristo como Deus e homem, e como essas doutrinas
são lógicas.
Uma pessoa disse “Eu discordo da declaração que Deus é lógica. Isso é
contrário à revelação bíblica. A lógica tem como alvo uma declaração
verdadeira. É importante reconhecer que lógica é uma ferramenta, não
uma verdade”.

Podemos usar a palavra “lógica” em diferentes sentidos, e deveríamos


esclarecer o sentido quando consideramos essa questão.
É errado afirmar categoricamente que “Deus é Lógica” é contrário à
revelação bíblica, pois João 1.1 diz que Cristo é o “Logos”, o que é
facilmente traduzido como “Razão” ou “Lógica”. De fato, no contexto do
versículo, que apresenta Cristo como o verdadeiro “Logos” ou princípio de
racionalidade que estrutura, regula e sustenta todas as coisas, “Razão” é
provavelmente a melhor tradução.
Portanto, neste sentido é verdade que “Deus é Lógica”. Contudo,
usamos aqui a palavra num sentido pessoal ou personificado. Neste sentido,
“Lógica” ou “Razão” é uma pessoa, e inclui conteúdo intelectual (tudo o que
Deus sabe). Assim, a ênfase está na racionalidade de Cristo o Logos ― que
todas as coisas são consistentes em sua mente e em suas obras, que ele
estrutura, regula e sustenta todas as coisas de acordo com a Sua perfeita
racionalidade.
Amiúde usamos “lógica” num sentido mais restrito — como nas “leis
da lógica”. Eu não diria que Deus representa as leis da lógica; antes, a relação
entre Deus e as leis da lógica está em que essas leis são descrições da forma
de pensar e agir de Deus.
Quando usamos a palavra neste sentido, a “lógica” é de fato vazia de
conteúdo; mas nem por isso as leis da lógica são meras “ferramentas”.
Quando pensamos logicamente (segundo as leis da lógica), não usamos meras
“ferramentas” do pensamento, como se elas estivessem separadas e fossem
independentes da mente de Deus, mas imitamos o modo como Deus pensa e
age. Chamar as leis da lógica de meras ferramentas poderia transmitir a ideia
de que elas são simplesmente algo que Deus nos concedeu ou mesmo
inventou para usarmos, mas se tratam de regras necessárias do pensamento
que devemos seguir para imitar o padrão de pensamento e ação de Deus.
A distinção acima sobre o sentido pessoal e impessoal pode ser
expressa simplesmente escrevendo “lógica” e “razão” em maiúsculas quando
usamos as palavras no sentido pessoal. É por isso que uso “Razão” em meus
escritos quando faço referência a Cristo o Logos.
1
15. Cristo, a Razão

Deparei-me hoje com uma carta escrita por Greg Bahnsen acerca de
alguns problemas que ele tinha com John Robbins.

Num dado momento, Bahnsen diz sobre Clark: “Quem pode esquecer
sua versão exegeticamente atroz de João 1.1 (‘No princípio era a
Lógica’)?” Por que Bahnsen diz isso? Ele considera “No princípio era a
Lógica” uma tradução equivocada? Se sim, por quê?

Eu pensava que você, Clark, Bahnsen e Robbins estivessem de acordo


sobre esse versículo. Qualquer ajuda para esclarecer isso será bem
vinda.

Bahnsen discorda da tradução de “logos” como “Lógica” nesse


versículo. Clark estava certo e Bahnsen errado. Dependendo do contexto,
“logos” pode ser traduzido de diferentes formas, como “palavra” [“verbo”],
“discurso”, “proposição”, “sentença”, “razão”, “lógica” e muitas outras.
João 1.1 se refere à pré-existência de Cristo o Logos e de sua relação
com Deus o Pai e a criação. É possível que João esteja declarando que Cristo
é o cumprimento do Logos da filosofia grega ― isto é, o princípio da Razão
que estrutura e regula todo o universo. Evidentemente João não está dizendo
que Cristo e o Logos grego são a mesma coisa, mas é possível que esteja
tomando a palavra ou conceito para preenchê-la de significado cristão.
Ou como dizem alguns, João tem em mente a Sabedoria da literatura
judaica. Mas isso não faz diferença para o nosso ponto. Por conseguinte,
dizem alguns que João está promovendo um conceito cristão que de forma
alguma pode ser traçado a um pano de fundo judaico ou grego. Isso também
não faz qualquer diferença para a ideia que Cristo é Razão. Permanece que
João 1 declara que Ele é o criador e sustentador do universo. Dito isso,
“Razão” e “Lógica” são provavelmente traduções melhores do que “Palavra”.
Podemos no mínimo dizer que não são traduções equivocadas. Às vezes me
refiro à “Razão” com “R” maiúsculo em meus escritos. E quando faço, é isso
o que tenho em mente. Refiro-me a Cristo, a Razão personificada ― rejeitá-
lo é rejeitar a própria racionalidade.
Não há razão exegética legítima para se proibir a tradução de “logos”
como “Razão” ou “Lógica” em João 1.1. Algumas pessoas recuam dessa
tradução talvez por seu preconceito anti-intelectual.
16. Conhecimento inato do
1
homem

Afirmo que o homem possui um conhecimento inato de Deus com


clareza e conteúdo suficientes para deixá-lo sem desculpa por negar ou
desobedecer a Deus. Entretanto, eu nego que possamos derivar ou basear um
sistema de teologia em nosso conhecimento inato de Deus. Isto é, eu nego
que o nosso conhecimento inato de Deus possa constituir o princípio primeiro
de uma cosmovisão bíblica ― entre outras razões, seu conteúdo, sua clareza
e objetividade são insuficientes.
É por essa razão que nunca apelo à intuição para fazer apologética ou
justificar alguma parte de minha teologia. Um entendimento preciso do
conteúdo e da extensão do nosso conhecimento inato de Deus vem da
revelação verbal, antes de tudo. Em outras palavras, embora eu afirme que
temos conhecimento inato de Deus, não baseamos nossa fé e confiança, ou
teologia e apologética, nesse conhecimento inato; devemos basear essas
coisas na revelação verbal.
Em meus escritos eu de fato me refiro ao conhecimento inato do
homem, mas nunca como se a verdade do cristianismo tivesse esse
conhecimento inato como seu fundamento, ou como se ele fosse em si prova
de que o cristianismo é verdadeiro. Caso contrário isso seria um apelo à
intuição humana, e o argumento se tornaria subjetivo. Apelo a esse
conhecimento inato apenas para explicar por que as pressuposições bíblicas
não são negadas na prática, mas implicitamente assumidas até mesmo pelos
incrédulos, e explicar em que sentido temos um fundamento comum ou ponto
de contato com os incrédulos quando lhes pregamos o evangelho.
Afirmo que a Escritura é logicamente inegável, mas ao dizer que o
conhecimento inato do homem é inegável a ênfase não reside na natureza
logicamente inegável da Escritura; quero dizer que algumas premissas
bíblicas centrais não podem ser negadas na prática, apesar dos incrédulos
afirmarem o contrário. Assim, não aludimos ao conhecimento inato do
homem para provar a Escritura ― é a Escritura que prova o conhecimento
inato ―, mas apenas para explicar por que podemos nos comunicar com os
incrédulos.
Quando falamos do conhecimento inato de Deus no contexto da
apologética, consideramos o aspecto estratégico da apologética, não seu
aspecto estritamente racional. Demonstramos que a Escritura é logicamente
inegável ao empregarmos não o conhecimento inato do homem, mas o
conteúdo da própria Escritura.
Algumas pessoas não percebem essa distinção nos meus escritos ou
equivocadamente supõem que não a fiz, e me acusam assim falsamente de ser
incoerente sobre esse ponto, como se eu rejeitasse a intuição como
fundamento para o conhecimento e então apelasse a ela mesmo assim. Antes,
a partir do meu sistema de teologia e apologética, não fosse o fato da
Escritura ensinar o conhecimento inato do homem, eu poderia descartá-lo e o
sistema permaneceria essencialmente intacto, pois não depende do
conhecimento inato do homem, embora alguns ajustes práticos fossem então
necessários.
Os pecadores suprimem esse conhecimento inato de Deus gravado no
coração de cada pessoa. Embora o conhecimento seja suprimido a ponto de
ser negado, ainda pode ser chamado de conhecimento. A razão é que
simplesmente porque uma pessoa conhece algo, não significa que ela
conscientemente pense em tal coisa a todo o momento. Entretanto, se uma
pessoa conhece algo, implica-se que tal coisa possa ser lembrada.
Isso possui similaridades com o que uma pessoa pretende dizer ao
referir-se à memória “reprimida”, embora eu seja cauteloso com as eventuais
implicações do uso desse termo. A Escritura ensina que os pecadores
conhecem a Deus em suas mentes, mas que num sentido moralmente
culpável suprimem ou reprimem esse conhecimento.
Na regeneração e conversão o pecador eleito é despertado de sua
letargia intelectual e moral para a luz de Cristo e da Verdade: “Mas, tudo o
que é exposto pela luz torna-se visível, pois a luz torna visíveis todas as
coisas. Por isso é que foi dito: ‘Desperta, ó tu que dormes, levanta-te dentre
os mortos e Cristo resplandecerá sobre ti’” (Efésios 5.13-14).
17. Fundamento comum

Tenho interesse num ponto que você levantou em seu livro


Confrontações Pressuposicionais. Espero que possa desenvolvê-lo para
mim:

“O verdadeiro fundamento comum entre o cristão e o não cristão é que


ambos foram criados à imagem de Deus. Entretanto, o não cristão
suprime e nega esse fundamento em sua filosofia explícita. Assim, no
que se refere às filosofias explícitas, não existe fundamento comum
entre o cristão e o não cristão. Mas o conhecimento de Deus é
inescapável, emergindo de forma distorcida em vários pontos da
filosofia do não cristão. Logo, o cristão argumenta que o não cristão já
tem conhecimento sobre o verdadeiro Deus; ele nega este conhecimento,
e assim é indesculpável e está sujeito à condenação.”

Não devemos dizer que não existe absolutamente qualquer fundamento


comum entre crentes e incrédulos. Se não tivéssemos absolutamente qualquer
fundamento comum com os não cristãos, eles nem mesmo seriam humanos.
Contudo, temos pelo menos a imagem de Deus em comum com eles, assim
como o conhecimento inato universal e inescapável de Deus e de suas leis
morais.
Visto que os incrédulos possuem um conhecimento inato de Deus e
assim já conhecem algumas proposições verdadeiras sobre Deus, há pelo
menos neste sentido um fundamento comum entre crentes e incrédulos.
Entretanto, como os incrédulos suprimem seu conhecimento inato de Deus,
negando em sua filosofia explícita o que sabem sobre ele, podemos dizer que
não existe fundamento comum explícito entre crentes e incrédulos.
Não existe concordância explícita entre a filosofia cristã e a filosofia
não cristã. Esse ponto de vista se opõe à apologética clássica e evidencial, a
qual ensina que crentes e incrédulos têm em comum inclusive algumas de
suas pressuposições mais essenciais, e que por isso os incrédulos não
precisam rejeitar seus princípios básicos para chegar a Deus, devendo apenas
raciocinar de forma mais cuidadosa.
Entretanto, não existe realmente qualquer fundamento comum em
nossa filosofia explícita, pois até mesmo “1 + 1 = 2” tem para mim um
significado diferente daquele do incrédulo. Considero o significado em sua
relação com Deus, mas o incrédulo não. Assim, “1 + 1 = 2” é uma
abreviatura de algo que conduz significados e implicações diferentes para
crentes e incrédulos.
Em outras palavras, mesmo quando o crente e o incrédulo parecem
concordar sobre uma proposição, eles na verdade discordam, pois suas
pressuposições básicas são diferentes e opostas; assim a proposição tem para
o crente um significado diferente daquele do incrédulo. Neste sentido, não
existe qualquer fundamento comum entre os dois, e o incrédulo deve
renunciar a seus princípios básicos para se converter à verdade. Essa é uma
etapa necessária do arrependimento.
1
18. Axioma e prova

A importância do conhecimento inato que o homem tem de Deus diz


respeito a como podemos ter um ponto de referência comum com os
incrédulos, podendo assim nos comunicar com eles e pressioná-los no fato de
admitirem implicitamente premissas bíblicas, apesar de explicitamente negá-
las. Isso não se refere estritamente à natureza autojustificável da revelação
bíblica. Isto é, mesmo que o homem não tivesse qualquer conhecimento inato
de Deus, a Bíblia continuaria sendo objetivamente verdadeira e
autojustificável, pois é uma revelação de Deus.
Sobre como um princípio primeiro pode ser autojustificável,
consideremos a lei da não contradição como exemplo. Essa lei é
autojustificável no sentido de ser logicamente inegável ― você deve afirmá-
la na tentativa de negá-la. Entretanto a lei seria insuficiente como princípio
primeiro, pois não traz qualquer informação, incluindo a informação
necessária para você conhecê-la em primeiro lugar. Isto é, entre outras coisas,
ela carece de uma teoria de epistemologia.
Quando afirmo que um princípio primeiro deve trazer conteúdo para se
justificar, quero dizer que ele deve fornecer toda a informação necessária ―
na metafísica, epistemologia, linguística, ética etc. ―, caso contrário o
próprio princípio primeiro não teria informação suficiente para se tornar
possível. O conteúdo do nosso princípio primeiro é a Bíblia, e está
sistematizado na teologia cristã. Esta representa, por sua vez, o fundamento
intelectual a partir do qual pensamos sobre o mundo e interagimos com os
incrédulos.
Gordon Clark diz que todo sistema deve partir de um axioma
2
“improvável” ou princípio primeiro. Isso é verdade, mas cuide para não
interpretá-lo mal. Por definição, “prova” envolve o raciocínio a uma
conclusão a partir de premissas antecedentes. Se existe “prova” para um
princípio primeiro, ele não pode ser de fato primeiro, pois seria uma
conclusão derivada de premissas antecedentes; chamá-lo de princípio
3
“primeiro” seria autocontraditório.
Assim, Clark tem razão neste ponto, mas como muitos não usam essa
definição técnica de “prova”, ao saber que um princípio primeiro é
“improvável”, tendem a pensar que ele é arbitrário ou que não existe defesa
racional para ele. Em vista disso, apesar da falha estar nas pessoas que não
compreendem o significado da palavra, procuro não chamar o princípio
primeiro cristão de “improvável” para evitar esse mal-entendido.
De fato, Clark afirma que podemos defender o princípio primeiro
cristão, mas não por aquilo que se chama de prova. Por exemplo, em A
Christian View of Men and Things ele mostra como um sistema intelectual
abrangente e coerente pode ser deduzido de nosso princípio primeiro;
também mostra por que os princípios não cristãos falham. Podemos também
demonstrar a natureza autojustificável e inegável de nosso princípio primeiro
bíblico e como ele logicamente exclui todos os demais princípios primeiros.
Assim, longe de ser arbitrário, nosso ponto de partida é racional e necessário.
1
19. Protegendo sua fé

Ao iniciar a universidade eu tinha medo da filosofia pagã. Não estava


certo se minha fé conseguiria resistir a todo pensamento pagão. Tendo
completado dois anos do curso, começo a ver como são irracionais os
sistemas de pensamento não cristãos. Jamais sonhei que seria capaz de
desafiar meus professores diante da classe inteira e demonstrar que
aquilo que estavam dizendo era irracional. Raramente uma aula
terminava sem que fosse ensinado algo sem sentido. Analisar o
pensamento não cristão ficou mais fácil para mim.

Uma vez que você tenha compreendido a superioridade e necessidade


racional da cosmovisão bíblica, não tem nada a temer dos não cristãos.
Nenhum argumento será bom o suficiente para atingi-lo. Contudo, me
permita dar alguns conselhos.
A cosmovisão bíblica, como porção revelada da mente de Deus, é
racionalmente invencível, e não importa quão alta seja sua consideração por
ela ― você jamais poderá superestimá-la. Entretanto, às vezes nos
superestimamos porque subestimamos os efeitos noéticos do pecado. Os
discípulos tinham uma falsa confiança, e abandonaram Cristo muito embora
tivessem afirmado o desejo de morrer com ele.
Você deveria alimentar e cuidar de sua fé como uma dádiva preciosa
concedida por Deus. Ainda que ela esteja protegida em Cristo, e ainda que
você deva exercitar e expressar essa fé com ousadia, você não deveria ser
descuidado com ela ou submetê-la ao abuso. Assim, ainda que formar-se em
filosofia numa universidade secular seja um passo legítimo na estruturação de
uma vida que glorifique a Deus, insisto que você se prepare de forma
adequada.
Você deveria analisar os requerimentos do curso e do currículo para
graduação em filosofia na sua universidade, e conseguir uma relação das
obras essenciais que terá de estudar e com as quais deverá interagir. Então,
ler alguns desses livros ao longo do verão para se assegurar de que pode
“lidar” com eles.
Desse modo você estará lendo os livros, talvez pela primeira vez, em
seu próprio ritmo e no ambiente de sua escolha. Você terá tempo para
meticulosamente desenvolver refutações a todos os argumentos não cristãos
nesses livros e buscar fontes cristãs relevantes para ajudá-lo, isso tudo sem o
agito e a pressão que frequentemente acompanham o ritmo do ano letivo
regular. Além do mais, isso vai ajudar também no seu desempenho assim que
as aulas tiverem começado, sobretudo se fizer anotações pertinentes nessas
leituras de verão.
20. A futilidade dos argumentos
1
pragmáticos

Com respeito a seu artigo da perspectiva bíblica sobre o uso de drogas,


não o li tão cuidadosamente como gostaria, mas desejo responder-lhe com
alguns comentários iniciais. Sua citação de John Frame é particularmente
interessante:
A legalização das drogas é a meu ver uma opção a se considerar. A
“guerra contra as drogas” não parece ter obtido sucesso, e é improvável
que tenha êxito no futuro próximo. A legalização baixaria o custo das
drogas e, por sua vez, os índices de criminalidade. Estou propenso à
ideia de legalizar as drogas para os adultos, mas estipular penalidades
severas às pessoas que vendem drogas para crianças. Isso faz um
paralelo com as leis do álcool e tabaco. Inclino-me a pensar que os
adultos deveriam assumir a responsabilidade pelas suas próprias
escolhas nessa área.
Eu não havia lido isso antes e fiquei surpreso por ele usar um
argumento pragmático tão pobre. A esta altura eu não deveria me surpreender
com argumentos ruins, mas em certos casos a falácia é tão óbvia que ainda
sou tomado de surpresa, sobretudo quando esses argumentos procedem de
pessoas que deveriam saber mais.
Mesmo que se pudesse concordar que a “guerra contra as drogas” não é
eficiente, os argumentos pragmáticos são fracos porque representam amiúde
uma forma de fazer funcionar aquilo que não funciona ― as pessoas apenas
se recusam a cooperar.
Considere a política de punição ao uso ilegal de drogas. Imagino que se
o governo tornasse crime capital até mesmo o uso mínimo de drogas, com
execução sumária sem distinção de idade, a guerra contra as drogas
“funcionaria” de fato melhor. Ou, se a política do governo fosse matar
imediatamente o usuário de drogas, todos os seus amigos e todos os seus
parentes, estou convicto de que o número de usuários de drogas seria menor.
Obviamente não estou sugerindo que se deva adotar essa política, mas
dizendo que quando uma pessoa usa um argumento pragmático contra algo,
posso amiúde propor uma sugestão que muda totalmente a conclusão.
A pena de morte é outro exemplo. Aqueles que se opõem à pena de
morte geralmente dizem que ela não é boa porque fracassa em reduzir a
criminalidade. Assume-se aqui que a punição tem a intimidação como seu
único foco, mas ignorando isso por ora, devemos perguntar por que a punição
capital não é eficiente. Talvez porque após termos prendido e condenado os
criminosos, lhes damos conforto e alimentação, permitimos que apelem da
sentença por anos a fio, concedemos toda sorte de direitos e privilégios a eles,
e depois disso tudo tiramos suas vidas com uma injeção letal indolor.
Estou convicto de que a pena capital deteria a criminalidade se o
governo tirasse a vida dos criminosos sentenciados no espaço de seis meses
com a punição mais dolorosa, horrível e prolongada que se possa imaginar ―
e que tudo fosse transmitido na televisão aberta para mostrar aos criminosos
potenciais como eles seriam tratados.
Novamente, não estou sugerindo tal política, apenas mostrando que o
argumento pragmático não é bom, pois se o raciocínio é que a pena capital
não funciona, tudo o que preciso fazer é sugerir algo que a faça funcionar.
Quando você fundamenta um argumento considerando o que funciona ou
não, o oponente pode amiúde simplesmente oferecer um contraexemplo.
Existem muitos outros problemas com os argumentos pragmáticos. Por
exemplo, eles identificam o bom ou o “dever” com o prático. Assumem
também que o fim pelo qual os meios são avaliados é de fato o fim que
deveria ser desejado.
21. Sem “fé” suficiente para ser
ateu?

Ao defender a fé cristã, crentes eventualmente afirmam algo como “não


tenho fé suficiente para ser ateu”. Aqui se incluem alguns proponentes da
apologética pressuposicional, que usariam mal o termo dizendo que toda
cosmovisão deve começar assumindo seus princípios primeiros pela “fé”.
Mas isso é biblicamente falso e estrategicamente tolo.
Quando não cristãos lançam a acusação de que afirmamos o
cristianismo somente pela “fé”, não estão usando a definição bíblica da
palavra, mas referindo-se a algo como “crença por mera suposição, sem
qualquer justificativa racional”. Alguns cristãos apresentam então um
argumento racional em favor do cristianismo e concluem: “É necessário mais
fé para ser ateu, e não tenho fé suficiente para ser ateu”.
Quando usada desta forma, fé significa mera credulidade, e isso implica
que o cristianismo é afirmado por credulidade; assim, a única diferença é que
se requer maior credulidade para ser ateu. Esse uso antibíblico da palavra
encoraja a audiência a ter uma pequena credulidade para tornar-se cristã, mas
não muita, para que não se torne ateísta. Mas se “fé” significa isso, por que
não renunciar a toda credulidade e não ter fé nenhuma?
O problema se torna pior quando cristãos afirmam no mesmo contexto
que fé não é mera credulidade, mas é racional. Porém, se trouxermos isso de
volta à declaração anterior “não tenho fé suficiente para ser ateu”, esta se
torna um reconhecimento de que o ateísmo é mais racional, que é
precisamente o que esses cristãos negaram quando primeiro disseram “não
tenho fé suficiente para ser ateu”.
Na Escritura, fé representa sempre algo bom, e é sempre bom ter mais
desta fé. Mas subitamente, no próprio contexto da defesa da “fé”, cristãos
afirmam que o ateísmo também deve começar pela “fé” e que os ateus de fato
a têm em maior medida, porquanto é necessário mais “fé” para ser ateu.
Então na mesma discussão, dizem também que a “fé” é racional, e que os
ateus na verdade não a têm, pois é um dom de Deus. Ou estão dizendo que
um pouco deste dom divino nos faz cristãos, e muito nos faz ateus?
Se usamos a definição bíblica ― se nos referimos ao tipo de fé que
temos e que desejamos que nossos ouvintes tenham ―, a verdade é que se eu
tiver alguma fé, mesmo tão pequena quanto um grão de mostarda, não serei
ateu. O ateu não tem fé nem mais fé. Se usamos a definição bíblica da palavra
e se você tiver alguma fé, já é cristão.
Assim, esse uso impróprio da palavra “fé” pode parecer esperto a
alguns, mas é na verdade antibíblico, tolo, confuso e autorrefutável. Jamais
deveríamos usar a palavra para denotar credulidade. Ao invés de dizermos
“não tenho o suficiente de uma coisa boa para ser ateu”, deveríamos dizer
“não tenho o suficiente de uma coisa ruim para ser ateu”. Assim, é bem mais
adequado dizer “não sou estúpido o suficiente para ser ateu”.
Sucede que jamais deveríamos dizer “Precisamos todos começar pela
fé”. Não, não precisamos. Começamos todos a partir de um princípio
primeiro que é o ponto de partida lógico de nosso pensamento. Cristãos
afirmam pela fé-razão (um dom divino de assentimento inteligente à verdade)
a Escritura como seu ponto de partida, mas não cristãos afirmam, por sua
credulidade e perversidade, seus princípios primeiros falsos e irracionais mais
variados.
22. Quando existem múltiplas
perspectivas

Fica a impressão, a partir dos comentários que recebo das pessoas, que
elas são muito resistentes a certos ensinos, embora nem sempre
expliquem por que. Às vezes, sua objeção se baseia no fato de
pregadores expressarem diferentes opiniões e elas ficarem inseguras no
que devem crer.

No caso do calvinismo vs. arminianismo, uma senhora que frequentara


um seminário pentecostal disse ter lido certa vez um livro que continha
cinquenta pontos a favor do calvinismo e outros cinquenta pontos a
favor do arminianismo. Assim, no que ela deveria crer?

Ela simplesmente deu de ombros e disse: “Vou ignorar essa parte e


continuar simplesmente pregando o evangelho” ― talvez implicando
que se apegaria ao arminianismo, já que na sua forma de pensar o
calvinismo de certo modo acaba com o evangelismo.

Você sugere corretamente que não é neutra, e de fato não pode ser
neutra, uma pessoa que afirma ser incapaz de assumir uma posição porque
existem argumentos de ambos os lados. No caso, esta mulher não poderia
dizer que desiste de investigar e prefere “continuar simplesmente pregando o
evangelho”, pois especialmente no caso do calvinismo e arminianismo, o
debate tem a ver com a própria natureza do evangelho.
É tolice recusar-se a tomar uma posição simplesmente por existir
múltiplas perspectivas. Pessoas oferecem argumentos a favor ou contra todas
as religiões (mas nem todo argumento é bom). Se a mulher não pode se
posicionar entre calvinismo e arminianismo porque existem argumentos de
ambos os lados, ela também não deveria ser capaz de se posicionar a favor ou
contra o cristianismo. Assim, de que modo ela se decidiu pelo cristianismo, e
como sua decisão se manteve?
Ela diz que existem argumentos de ambos os lados, mas ambos os lados
possuem bons argumentos? Por exemplo, arminianos frequentemente
argumentam que o calvinismo (especialmente na sua doutrina da eleição)
ensina algo desleal, que contradiz a justiça. Isso pode soar convincente a
pessoas irracionais e desatentas, mas não significa que seja um bom
argumento. Existem respostas simples e conclusivas para essa objeção. Por
conta de sua desonestidade intelectual, essas pessoas simplesmente não
conhecem ou, em alguns casos, se recusam a aceitar essas respostas.
Posso desenvolver dez argumentos afirmando que sou o presidente dos
Estados Unidos da América, mas não seriam bons argumentos. Por exemplo,
posso dizer “quero ser o presidente dos Estados Unidos da América, portanto,
sou o presidente dos Estados Unidos da América”. Esse é um argumento real,
mas não um argumento bom. Outro: “Minha mãe diz que sou um bom garoto,
portanto sou o presidente dos Estados Unidos da América”. Esse também é
um argumento real, com uma premissa explícita e outra presumida que levam
à conclusão. Mas este argumento é também falacioso e pode ser facilmente
destruído. Não é muito difícil destruir cada um dos argumentos do
arminianismo. Em todo o caso, seria absurdamente estúpido dizer que, por
haver agora argumentos de ambos os lados, essa mulher está indecisa se sou
realmente o presidente dos Estados Unidos da América!
Você poderia se sentar com ela e de fato examinar esses argumentos.
Sua tarefa seria então mostrar que o arminianismo não possui realmente um
só argumento bom a seu favor. A verdade é específica e exclusiva, e não
existem argumentos bons para o que é falso. Assim, não é bom o bastante o
calvinismo ganhar dez pontos e o arminianismo dois ― se você lidar
corretamente com as questões, o calvinismo ganhará todos os pontos e o
arminianismo nenhum.
Isso também se aplica a argumentos baseados em passagens bíblicas.
Se o calvinismo é verdadeiro e o arminianismo é falso, não deve haver um só
versículo da Escritura apoiando o arminianismo. Não afirmamos o
calvinismo porque existem mais passagens bíblicas a seu favor, mas porque
todas as passagens bíblicas relevantes ensinam de forma explícita, ou são
pelo menos consistentes, com o calvinismo, ao passo que não existe nenhuma
passagem bíblica ensinando o arminianismo.
Num livro em que existem cinquenta argumentos apoiando o
calvinismo e cinquenta apoiando o arminianismo, é provável que exista em
meio aos cinquenta pontos a favor do calvinismo um pequeno número de
argumentos ruins, alguns destes baseados num calvinismo inconsistente.
Todos os argumentos ruins para o calvinismo deveriam ser descartados. Mas
se você então examinasse os cinquenta argumentos apoiando o arminianismo,
deveria ser capaz de destruir todos eles.
Não faz sentido uma pessoa ficar confusa sobre um assunto apenas por
existir múltiplas perspectivas. Para toda verdade existe logicamente um
número infinito de falsidades ou desvios possíveis. Por exemplo, se é verdade
que 1 + 1 = 2, podemos desviar dizendo que 1 + 1 = 3, ou 4, ou 5, ou 6, até o
infinito. Isso vale para qualquer verdade. Ficar perturbado apenas porque as
pessoas discordam e oferecem argumentos para diferentes pontos de vista é
evidência de uma mente irracional e instável. Por outro lado, mesmo que
alguém concorde com algo, isso não significa que essa posição esteja correta.
Se algo é popular ou controverso, isso é logicamente irrelevante.
23. Apologética para estudantes
1
cristãos

Estou cursando filosofia em uma universidade do Texas. A faculdade


tem vínculo com uma igreja absurdamente liberal, e o departamento de
filosofia é constituído de seis professores ateus.

No último semestre tive aula sobre epistemologia moderna e fiquei um


pouco desapontado com a falta de material cristão reformado nessa área.
Foi um semestre desgastante para mim, sendo constantemente
bombardeado pelos meus professores.

Seus ensaios renovaram minha esperança e coragem. São objetivos, de


fácil leitura e de modo algum suavizam ou comprometem a verdade.
Minha leitura de verão tem sido muito excitante e prazerosa.

Recomendo que você domine a fundo a abordagem e o próprio modo


de pensar que delineio em meus livros. Fazendo isso você será sempre
invencível contra qualquer professor ou filosofia antibíblica que encontrar
pela frente.
Uma abordagem completa e eficaz na apologética bíblica exige que
você se torne cada vez mais instruído em sua própria cosmovisão bíblica.
Assim, estudar teologias sistemáticas e comentários bíblicos confiáveis é um
passo importante para se tornar um apologista melhor.
A Bíblia representa a Palavra de Deus infalível e ultrarracional, e assim
qualquer pessoa pode num nível maior ou menor se tornar um apologista
mestre, contanto ela se apegue firmemente à Palavra e argumente fielmente a
partir dela. Conforme escrevi em Confrontações Pressuposicionais, “Os
cristãos de hoje são prontamente envolvidos pelos desafios intelectuais dos
incrédulos. Embora não sejamos divinamente inspirados como os profetas e
apóstolos, seremos de fato os filósofos mestres do mundo se dependermos
totalmente da revelação da Escritura. Porque temos a revelação como o
fundamento de nossa filosofia, os incrédulos não competem de fato contra a
nossa sabedoria, mas contra a sabedoria do próprio Deus. Assim, se
simplesmente aprendermos a aplicar com habilidade a revelação divina
quando respondemos aos desafios dos incrédulos, não haverá de fato disputa,
pois seremos capazes de enlear os opositores e destruir todo e qualquer
argumento do incrédulo.”
O sistema bíblico é inerentemente racional e invencível. Por causa da
superioridade inerente da cosmovisão bíblica, qualquer crente pode se tornar
invencível contra a incredulidade. Essa cosmovisão não pode ser atacada com
sucesso, mas traz os componentes necessários para destruir todas as demais
cosmovisões. Você precisa apenas aprender a liberar o poder racional
devastador da revelação divina na escrita e nas conversas.
Se a pessoa entende o conteúdo e a estrutura (como nas relações entre
as suas diversas partes) do sistema bíblico, e for capaz de compreender o teor
e a estrutura da cosmovisão de seu oponente, ela terá sempre condições de
alcançar uma vitória decisiva no debate.
Não existe qualquer possibilidade dessa pessoa perder, ou mesmo
deixar de ganhar de forma decisiva, de qualquer pessoa em toda a história
humana ― ou contra todas essas pessoas juntas. Ela será capaz de esmagar o
próprio diabo no debate, pois ele não é maior que a mente de Cristo. É nessa
pessoa que você pode se tornar, e deve se esforçar para sê-la mediante o
estudo diligente e a oração persistente, e pela graça soberana de Deus.
24. Metade vazio, metade cheio

Estive conversando com certa pessoa, e ela disse que “a verdade é


apenas uma questão de percepção”.

Ela explicou com um exemplo. Pegue um copo de água que esteja


metade cheio. Uma pessoa que olha o copo pode dizer que ele está
metade cheio, e outra pessoa pode dizer que ele está metade vazio. Qual
delas está certa? Essa era a sua linha de argumentação.

Mostre-me, por favor, como posso responder algo assim.

1
Abordei o relativismo (e subjetivismo etc.) em vários pontos dos meus
livros, e assim seria bom você rever o que já escrevi a respeito. Você deveria
ler também meu livro Apologética no Diálogo para aprender a lidar com
pessoas em debates.
Uma resposta básica ao relativismo é que ele é autorrefutável. Se esta
pessoa diz que “a verdade é uma questão de percepção”, então até mesmo
esta declaração é apenas uma questão de percepção, e não pode ser
universalmente verdade que a verdade é uma questão de percepção. Em
outras palavras, que a verdade é uma questão de percepção não é nada mais
que a percepção da pessoa. Mas não significa que seja realmente este o caso,
e não significa que você tenha de aceitar isso.
Então, o exemplo consiste de declarações que são muito ambíguas para
provar o ponto desta pessoa, pois deixam de fora informações vitais como o
ponto de referência e os objetos em consideração; mas assim que você insere
a informação que falta, as declarações se tornam claramente absolutas. Isto é,
considerando a capacidade total do copo, metade dele contém água e metade
contém não água (digamos apenas ar). Refiro-me somente à água quando
declaro “o copo está metade cheio”, e refiro-me somente ao ar (parte não
água) quando declaro “o copo está metade vazio”, mas se tratam ambas de
declarações absolutas.
A afirmação é também sofística. Você assume algo definido e distinto
para “verdade” (X) e para “percepção” (Y), e tudo o que ele então faz é
mudar o significado de “verdade” para que se relacione a Y ao invés de X.
Em outras palavras, a pessoa está dizendo: “A palavra que você usa para
designar X deveria ser usada para designar Y”. Mas e sobre X? Existe ou não
um X? E X é ou não coerente? Ele se esquiva dessa questão sobre a verdade
sem mesmo tê-la refutado. De fato, ao invés de refutar a concepção de X que
você assume, o exemplo desta pessoa simplesmente mostra o que ela quer
dizer com Y.
É possível mudar a palavra “carro” para se referir agora a uma
bicicleta, e dizer que “carro é apenas uma bicicleta”, e você pode então
descrever uma bicicleta para ilustrar seu significado, mas isso não tem nada a
ver com a questão de existir ou não aparelhos de transporte motorizados de
quatro rodas. Subtrair de você a palavra “carro” não faz o carro sumir.
Além do mais, agora que ele afirmou sua premissa, que “a verdade é
uma questão de percepção”, de agora em diante tudo o que ele disser deve ser
tomado apenas como “uma questão de percepção”. Essa é a consequência
lógica de sua filosofia. Você não deveria apenas informá-lo disto, mas
também agir conforme esse padrão em todas as conversas e interações com
ele.
Isto é, argumente conforme as implicações lógicas de sua filosofia, e
então lide com ele de acordo com as implicações práticas da mesma. Insista
nisso mesmo havendo consequências sérias ou até perigosas para ele, por
exemplo, em questões que envolvam dinheiro, legalidade ou segurança, e
lembre-o sempre de que você está apenas seguindo seu padrão. Ele deve
ceder ou então sofrer as consequências de sua própria filosofia.
Embora eu seja o primeiro a dizer que somente consequências lógicas
importam em debates intelectuais, e que consequências práticas jamais
equivalem a uma refutação lógica, o oponente deveria realmente sofrer essas
consequências caso mantenha sua filosofia do relativismo. Se ele não valoriza
os argumentos racionais, talvez esse modo não racional (prático) de
persuasão o faça reconsiderar os méritos racionais da posição que você
2
defende. Por outro lado, como ele não provou sua premissa (e não pode, pois
qualquer prova seria apenas uma questão de percepção) e como você não a
afirmou, as coisas que você diz não precisam ser tomadas apenas como uma
questão de percepção.
Dependendo da atitude e da resposta do oponente (ele pode não se
render tão facilmente), talvez seja necessário chocá-lo e ofendê-lo. Assim,
munido de um gravador, peça-lhe que reafirme sua premissa, que “a verdade
é apenas uma questão de percepção”. “Então”, você pode dizer, “segue-se
que é apenas uma questão de percepção que sua mãe não é uma vagabunda e
prostituta, e que num certo sentido é de fato ‘verdade’ que sua mãe é uma
vagabunda e prostituta”. Force-o a reconhecer isso sem evasivas e ressalvas.
Chame então seus pais e reproduza a gravação.
Repita o procedimento para outras situações e relacionamentos em sua
vida. Faça-o reconhecer que é apenas uma questão de percepção que ele não
está roubando um patrimônio da empresa em que trabalha, e que num certo
sentido é de fato “verdade” que ele está roubando um patrimônio desta
empresa. Chame então seu patrão e toque a fita.
Então, faça-o admitir que é um adúltero e que sua esposa é uma porca
feia (como questão de percepção, é claro), e toque a fita para a sua esposa.
Faço-o reconhecer que é um assassino e estuprador, e que ele deseja matar e
estuprar seus próprios filhos (novamente, como questão de percepção), e
toque a fita para seus filhos ou também para alguém que o conheça.
Evidentemente você deveria deixar claro que está gravando as palavras
dele e o que faria com a fita, dando-lhe chance para abjurar de sua filosofia.
Você não pretende enganar ou fazê-lo admitir algo contrário a sua filosofia
explícita. Não é você quem de fato está dizendo essas coisas (porquanto nega
que a verdade seja apenas uma questão de percepção); você apenas quer saber
se essas seriam coisas que ele diria, e deveria dizer, a partir de sua filosofia.
Essa pessoa deveria de bom grado aceitar sobre si as consequências de sua
própria filosofia. Quanto às pessoas que ela ofendeu, talvez fosse o caso de se
defender delas ensinando-lhes o relativismo.
Qualquer coisa ruim que suceda a essa pessoa decorre de seus próprios
atos a partir de sua própria filosofia. Se lhe sobrevêm problemas por causa
disso, é apenas “uma questão de percepção” que todas essas consequências
sejam indesejáveis. Ela não precisa ser relativista, e pode se render a qualquer
momento tão logo você a confronte com o exposto acima. Assim, se ela é
teimosa, é sua culpa.
Em todo o caso, esse procedimento é um método pragmático, tornando
a vida da pessoa impraticável debaixo de sua filosofia, e nada disso equivale
3
a uma refutação lógica do relativismo. Assim, mesmo que ela se renda sob
tais circunstâncias, isso não significa que você tenha refutado logicamente o
relativismo por meio do pragmatismo, pois o pragmatismo não pode refutar
nada. Mas ao empregar esse método não racional, você poderia com sucesso
forçar essa pessoa irracional a se envolver novamente com o debate e
reconsiderar os méritos racionais da visão bíblica.
25. O prático e o existencial no
evangelismo

É sempre melhor fazer evangelismo usando a abordagem ensinada em


seu livro Questões Últimas ao invés de apelar aos valores existenciais e
às vantagens práticas de se vir a Cristo?

Em A Luz das Nossas Mentes, mostro que a apologética e o


evangelismo podem ser distinguidos um do outro, mas possuem uma relação
tão íntima que muitas vezes não há necessidade de tratá-los como separados e
diferentes ― a menos que estejamos envolvidos numa discussão que
demanda maior precisão, e logo, a distinção.
Questões Últimas é mais sobre apologética e filosofia do que
1
evangelismo. O método ali sustentado é sempre a melhor forma de se fazer
apologética, pois logicamente falando, seu oponente pode se esquivar de
qualquer coisa ― menos de argumentos dedutivos válidos ― simplesmente
dizendo “Eu não me importo”, “Isso não prova nada” ou “E daí?”
Mas como a maior parte das pessoas é irracional, elas muitas vezes
respondem melhor a métodos não racionais ou irracionais. Por exemplo, um
testemunho pessoal é amiúde eficaz (para produzir efeitos superficiais nos
ouvintes, ainda que não a fé), embora não prove realmente nada. Assim,
embora os apóstolos tenham particularmente enfatizado a graça e o propósito
de Deus, bem como a necessidade de arrependimento e fé por parte do
homem, eles revelaram alguns dos benefícios existenciais de vir a Cristo.
Quanto aos resultados que você pode esperar usando abordagens não
racionais ou irracionais, isso dependerá de sua audiência. Se fosse
argumentar que o islamismo é uma religião falsa porque instrui seus
aderentes a matar quem se opõem a ele, isso poderia pesar no juízo de
algumas pessoas, mas eu rejeitaria o argumento na hora, por notar que se trata
de uma falácia. É logicamente inválido afirmar que o islamismo é errado
porque violência é algo errado; poderia bem ser o contrário ― se o islamismo
é correto, a violência é correta. Se o islamismo verdadeiramente revela a
mente de Deus, tudo o que o islamismo ensina é verdadeiro, incluindo a
violência; mas se o islamismo é errado, a violência que ele ensina é
injustificada. Não podemos partir da violência que o islamismo ensina para
determinar se essa filosofia é ou não errada.
Encontramos, porém, a todo instante argumentos irracionais similares
― isto é, argumentos que colocam as coisas na ordem errada ―, e eles são
eficazes com muitas pessoas. Em alguns casos isso se deve à existência de
um conhecimento inato de Deus e de suas leis morais na mente de cada
pessoa. Por exemplo, existe uma oposição moral instintiva ao assassinato.
Algumas culturas ou grupos de pessoas poderiam suprimir isso em um grau
maior, deixando, contudo, outras partes de seu conhecimento inato mais
evidentes.
Por causa desse conhecimento inato de Deus e de suas leis morais, até
mesmo argumentos não rigorosamente válidos são eficazes, pois apelam a
algo inato nos ouvintes. Esses argumentos inválidos aplicam eventuais
premissas que os ouvintes já conhecem, mesmo que busquem suprimi-las em
suas mentes. Entretanto, isso não significa que deveríamos tolerar ou apoiar
esses argumentos inválidos.
Em vista de sua irracionalidade, pessoas são muitas vezes enganadas
por premissas e inferências claramente falsas, de modo que até mesmo
2
argumentos completamente destituídos da verdade são amiúde eficazes, isto
é, se apelam a algum interesse pecaminoso nos ouvintes. Um efeito
importante da regeneração e santificação é resgatar o homem dessa
irracionalidade teimosa e penetrante.
A abordagem dedutiva/pressuposicional é sempre preferível na
apologética, pois é o único caminho racional. E nos encontros apologéticos
― isto é, em discussões nas quais diferenças de cosmovisões geram
divergências ― surgem muitas vezes oportunidades para o evangelismo. A
cosmovisão cristã que você sustenta produzirá seguidas divergências com
outras pessoas em áreas como política, ciência, ética (aborto, adultério etc.),
religiões do mundo e em tudo o mais. Mas se a abordagem
dedutiva/pressuposicional é sempre a melhor num encontro apologético e se
as oportunidades evangelísticas surgem amiúde do choque de cosmovisões, a
necessidade da abordagem dedutiva/pressuposicional surgirá praticamente
toda vez que você fizer evangelismo. Ainda que o encontro tenha começado
com uma apresentação não argumentativa do evangelho, se a pessoa
apresentar uma pergunta ou objeção (o que é comum), você estará novamente
fazendo apologética.
A abordagem dedutiva/pressuposicional é uma parte necessária da
pregação do evangelho, pois muito dela envolve uma apresentação dos
ensinamentos da Bíblia, do conhecimento que é necessário para a salvação.
Os próprios apóstolos usaram argumentos dedutivos/pressuposicionais em
sua pregação a crentes e incrédulos. Ao ler a pregação dos apóstolos, algumas
pessoas podem ver apenas testemunho pessoal, pois estão predispostas a
notar essas coisas; mas elas procedem miseravelmente até mesmo quando
relacionam esses testemunhos às suas próprias experiências pessoais. E, sem
dúvida, suas experiências pessoais não são nem de perto semelhantes às
experiências dos apóstolos, que estiveram com Jesus por vários anos e
testemunharam sua morte e ressurreição.
Hoje em dia, quando pessoas falam de testemunho pessoal, geralmente
têm em vista um sentimento de êxtase ou euforia (que não é o mesmo que
conversão), uma reforma moral (mas elas ainda não são muito virtuosas), e
até mesmo uma visão ou outra experiência especial (mas a mensagem que
vinculam a ela pode não ser o evangelho bíblico), ou alguma outra história
tola que de fato não contribui em nada à causa do evangelho. Não assuma que
ao dar seu testemunho pessoal, a pessoa esteja fazendo o que os apóstolos
faziam ― usualmente não há qualquer semelhança.
Se você apresenta algum tipo de argumento pragmático, isso também
pode ser feito pelo ateu, comunista, mórmon e por praticamente qualquer
pessoa de qualquer sistema de crença. Praticamente qualquer pessoa de
qualquer sistema de crença pode lhe dizer o que no entender dela representa,
como resultado do seu sistema de crença, uma mudança positiva em sua vida.
Assim, argumentos pragmáticos são logicamente inúteis, muito embora
sejam amiúde psicologicamente atraentes. Quão racional é sua audiência?
Quanto mais racional ela for, maior o risco de você ser ridicularizado por usar
um argumento pragmático. Se um budista me diz que o budismo mudou sua
vida, não preciso desafiar sua afirmação ― posso apenas rir dele. Isso não
prova que o budismo é verdadeiro. Até mesmo um filme ou livro de ficção
pode mudar a vida de uma pessoa ou inspirar uma reforma moral, mas isso
não diz nada quanto à filosofia subjacente ao filme ou livro de ficção ser
verdadeira ou não.
Um argumento baseado no efeito ou na experiência pessoal funciona
assim:
1. Se X, portanto Y
2. Y
3. Portanto, X

Esse tipo de raciocínio é chamado de “afirmação do consequente”, que


é sempre falacioso. Mas é exatamente este o processo de raciocínio usado por
todo argumento que apela ao empírico e ao prático, representando o próprio
3
cerne da ciência.
Jesus diz “pelos seus frutos os conhecereis”; contudo, à parte da
revelação bíblica não podemos nem mesmo especificar o que é fruto bom e o
que é fruto mau. Evidentemente Jesus sabia disso, e certamente não nos
estava dizendo para avaliar uma pessoa por nossa própria opinião ou padrão
não bíblico.
De maneira similar, ao você conceder um testemunho pessoal de sua fé
ou enumerar alguns dos benefícios existenciais de vir a Cristo, o testemunho
e esses benefícios podem ser considerados positivos apenas porque têm essa
conotação segundo a perspectiva bíblica. Assim, racionalmente falando, se o
pragmático e o existencial pudessem mesmo valer alguma coisa, ainda
deveriam proceder de um fundamento bíblico/dedutivo/pressuposicional, pois
em si mesmos são irracionais e irrelevantes.
Portanto, ainda que em muitos casos seja válido apresentar seu
testemunho pessoal ou discutir os benefícios existenciais de vir a Cristo, você
não deve atribuir a essas coisas um status racional mais elevado do que elas
merecem; é preciso também estabelecer firmemente seu fundamento na
revelação bíblica, e discuti-las apenas dentro deste contexto. Você deveria
atribuir a essas coisas um papel secundário em sua apresentação geral, já que
em si mesmas elas nem mesmo apresentam o evangelho. Elas não
comunicam a palavra da vida, ou poder que salva.
Em resumo, é melhor pregar o evangelho mediante exposições bíblicas,
confrontar seu oponente usando a abordagem dedutiva/pressuposicional, e
então, como exemplos opcionais (e não como argumentos racionais), talvez
relatar sua experiência pessoal e alguns dos benefícios existenciais da fé.
Essas coisas não são necessariamente feitas na ordem acima, e podem
ser flexivelmente combinadas no curso de sua conversa com o incrédulo. Em
adição, um aspecto da sua apresentação não deve contradizer outro. Por
exemplo, assim que você tiver, como parte de sua apologética, destruído por
completo a reputação racional da indução, sensação, intuição e ciência, não
eleve sua experiência pessoal ou autoconhecimento ao nível daquela certeza
racional inegável que pode ser atribuída somente à Escritura.
Finalmente, embora as abordagens não racionais ou irracionais possam
às vezes parecer mais eficazes porque a maioria das pessoas é irracional, isso
não significa que devemos tolerar tal coisa. De fato, enquanto a fé da pessoa
não estiver única ou essencialmente baseada no bíblico e no racional, mas
sim no pessoal, prático ou existencial, essa fé pode ser até mesmo espúria ou
no mínimo permanentemente débil. Assim, parte de nossa apresentação da fé
cristã deveria envolver um desafio aos padrões irracionais dos nossos
ouvintes. Por que eles deveriam responder melhor a testemunhos pessoais, ou
a argumentos práticos ou existenciais, do que a argumentos bíblicos e
racionais? Eles não deveriam, e essa é precisamente uma das coisas que
deveríamos explicar quando pregamos o evangelho e defendemos a fé.
1
26. Deus e a linguagem

A linguagem é sempre adequada para expressar alguma coisa. A


questão real é se a mente é capaz de conceber algo. Se você pode pensar em
algo, pode designar algum sinal para representar esse algo. Em princípio você
pode usar “X” para representar o conteúdo de um livro. Não há nada
inerentemente contraditório ou impossível nisso.
Sucede que a linguagem em si é adequada para expressar qualquer
coisa sobre Deus ― estou certo de que Deus pode verbalizar qualquer coisa
sobre si próprio. Novamente, “X” é linguagem e pode representar qualquer
pensamento, de modo que a limitação reside na mente da pessoa, não na
linguagem em si. Não estou dizendo que podemos saber ou pensar
absolutamente tudo sobre Deus. Porque Deus é infinito, há sempre mais a
saber ou pensar sobre Deus do que aquilo que já sabemos ou pensamos sobre
ele. Mas o que quer que possamos saber ou pensar sobre Deus, podemos
dizer sobre ele.
Quanto à linguagem positiva e negativa sobre Deus, alguns insistem
que ao menos algumas coisas sobre Deus podem somente ser expressas em
linguagem negativa. Isso não é verdade. Posso facilmente converter em
linguagem positiva qualquer coisa dita sobre Deus em linguagem negativa.
Por exemplo, R. C. Sproul afirmou certa vez que dizer que Deus é
“imutável” constitui linguagem negativa, e sendo humanos nós sabemos
apenas o que significa “mutável”, e que Deus não é “mutável”; assim, que é
impossível expressar esse atributo divino em linguagem positiva. Isso foi um
tremendo descuido da parte dele ― o que dizer de “Deus sempre permanece
o mesmo”? É linguagem positiva, e sabemos o que significa.
Algumas pessoas pensam que parece mais piedoso ou reverente dizer
que não podemos falar sobre Deus em termos positivos, mas isso é falso e
desnecessário tanto do ponto de vista bíblico quanto filosófico.
27. Idiotas profissionais

IDIOTAS E IDIOTAS PROFISSIONAIS


1
De acordo com a Escritura, todos os não cristãos são idiotas. Até
alguns cristãos professos se ressentem dessa caracterização áspera e negativa
dos inimigos de Deus, e assim me repudiam e criticam por falar nesse tom.
Contudo, por mais que eles tentem descrever isso como sendo algo que
afirmo por mim mesmo, estou meramente repetindo o que é ensinado pela
Escritura. Se eles têm algum problema com isso, antes de me repudiar e
criticar devem enfrentar a realidade, renegar Cristo e criticar a Escritura.
Alguns escritores cristãos são muito corteses. De fato, tão corteses a
ponto de permitir que seus críticos os assombrem até a morte enquanto
pacientemente explicam repetidas vezes suas visões impopulares, ainda que
bíblicas. É claro que eu acredito no discurso cordial, sobretudo nos contextos
em que a Escritura ordena tal coisa. Mas esses críticos geralmente não estão
interessados em ouvir o que a Escritura tem realmente a dizer; querem apenas
defender suas próprias opiniões e crenças antibíblicas, ao mesmo tempo
insistindo que são crentes genuínos.
Minha política é que embora eu respeite e até mesmo prefira discussões
teológicas polidas, se meus críticos tentarem me usar para atacar a Escritura
em seu lugar, vou desmascará-los como hipócritas espirituais e criticá-los
duramente pelo poder de Cristo o Logos, isto é, pela própria Escritura e
Razão que eles tentam solapar.
É importante perceber que os não cristãos são idiotas e que tenho razão
ao declarar isso como parte integral da abordagem bíblica na apologética.
Pois se vamos enfrentar nossos inimigos intelectuais tendo a Escritura como
nossa arma, é melhor aceitarmos primeiro a descrição que a própria Escritura
dá dos incrédulos, que eles são estúpidos e depravados. Não é de admirar que
muitos cristãos sejam apologistas tão fracos! Eles rejeitam desde o início a
descrição que a própria Escritura faz da situação.
Tenho declarado repetidas vezes que a pessoa que afirma a cosmovisão
bíblica e pratica a apologética bíblica pode de forma fácil e conclusiva
derrotar qualquer não cristão. Não importa se o não cristão é ateu,
muçulmano, budista ou católico; nem mesmo se ele é altamente instruído. De
fato, já cheguei mesmo a dizer que se treinada em apologética bíblica, até
mesmo uma criança com cerca de três anos de idade pode esmagar qualquer
professor de ciência ou filosofia. Vou até mais longe. Eu afirmaria que até
mesmo uma pessoa mentalmente limitada ou incapacitada de alguma
maneira, mas apta a se comunicar com declarações truncadas (e.g., uma
pessoa com Síndrome de Down), pode derrotar qualquer cientista ou filósofo
não cristão.
Naturalmente, algumas pessoas conseguem argumentar com mais
habilidade do que outras. E caso você seja uma criança, uma pessoa com
graves deficiências mentais ou apenas uma pessoa não familiarizada com
expressões técnicas, teria de pedir ao seu oponente não cristão para expressar
suas ideias e argumentos numa linguagem mais simples. Entretanto, no que
diz respeito à essência do debate, até onde conseguir compreender os
princípios fundamentais da cosmovisão bíblica e da apologética bíblica, você
também pode se tornar um apologista invencível da fé cristã contra qualquer
oponente não cristão.
Com relação a isso, também declarei que embora um cientista ou
filósofo não cristão possa fazer uma apresentação mais elaborada de suas
visões, a essência dos seus argumentos de forma alguma é melhor do que a
argumentação de qualquer outro não cristão, incluindo pessoas retardadas e
mentalmente insanas. Isto é, um erudito não cristão poderia argumentar seu
caso com maior precisão, coerência e minúcia, mas quanto aos méritos
racionais dos seus argumentos, sua posição seria tão tola e falaciosa quanto à
de qualquer não cristão analfabeto e até mesmo mentalmente incapacitado.
Isso vale não apenas quando eles falam sobre Deus ou religião, mas
também sobre qualquer outra coisa. A visão sobre a realidade última, sendo
última, necessariamente afeta cada aspecto da cosmovisão da pessoa; assim,
se o não cristão estiver equivocado sobre a realidade última, estará
equivocado sobre tudo o mais.
Afirmo tudo isso não simplesmente porque tenho prazer em insultar e
fazer pouco caso dos incrédulos (embora isso também tenha o seu lugar; 1
Reis 18.27); antes, trata-se de um ensino escriturístico que poucos cristãos
são fiéis em enfatizar. Aqueles que fazem de algum modo referência ao
versículo, geralmente obscurecem seu ensino usando uma linguagem quase
poética, fazendo a depravação e a impiedade humana, e os efeitos do pecado
sobre a mente soarem quase como belos. Mas a Bíblia é dura e inequívoca
sobre essa questão. Ela ensina que, com suas ideias, todos os filósofos e
acadêmicos não cristãos foram tornados “idiotas” por Deus (1 Coríntios
1.20). Acerca desta expressão, até mesmo a básica e popular Concordância
de Strong fornece a definição “tornar um tolo”; assim, não existe desculpa
para não entender o versículo dessa maneira. Portanto, com a autoridade da
Escritura, acuso de estar em pecado o cristão que distorce ou oculta este
ensino, ou que busca solapar os esforços daqueles que tentam proclamá-lo.

ENSINANDO TOLICES PARA UMA VIDA

Como eu interajo quase que exclusivamente com obras de


profissionais, já forneci em meus escritos diversos exemplos de como até
mesmo os não cristãos mais instruídos jamais se põem, no teor dos seus
argumentos, acima da estupidez da humanidade. Contudo, forneço a seguir
outro exemplo com base no debate entre William Lane Craig e Walter
Sinnott-Armstrong.
Sinnott-Armstrong é professor de Filosofia e de Estudos Legais na
2
Faculdade de Dartmouth. Mesmo que ele não esteja entre os melhores
pensadores contemporâneos, suas credenciais e produções são pelo menos
equivalentes aos de muitos filósofos profissionais. Em adição, alguém com a
fama e estatura de William Lane Craig considerou válido debater com ele.
Assim, que ninguém declare que eu deliberadamente escolhi um exemplar
inferior para criticar.
Para mim, refutar um ateu é tão fácil quanto refutar qualquer outro, e
assim não preciso usar Sinnott-Armstrong como exemplo. Mas deixe-me
dizer por que o escolhi. Obtive há certo tempo atrás o livro que continha o
debate, e entre outras coisas percebi suas declarações falaciosas; logo mais
vou mostrá-las a você. Eu havia cogitado usar essas declarações como
ilustrações em algum projeto futuro.
Então, certo dia minha esposa chegou em casa e disse ter ouvido
William Lane Craig sendo entrevistado num programa de uma rádio cristã. A
entrevista tinha como principal objetivo promover o livro, e o anfitrião do
programa fez a Craig várias perguntas sobre assuntos discutidos no debate.
Minha esposa achou as respostas de Craig muito vagas e hesitantes, e se
perguntou se essas respostas fracas poderiam trazer mais dano do que
benefício à causa cristã.
Eu conseguia entender seu sentimento, pois mesmo ignorando os
defeitos da apologética clássica, tenho achado os argumentos e conclusões de
Craig sempre tão tipicamente “modestos”, que eles são quando muito sub-
bíblicos; não transparecem a confiança e certeza que um líder cristão deveria
exibir em sua atitude e argumentação, sem falar de infundir essa mesma
confiança e certeza em outros cristãos. De todo modo, não deixarei que o
presente artigo se torne numa crítica à apresentação de Craig; estou apenas
explicando por que minha esposa e eu ficamos insatisfeitos com sua
apresentação.
Seja como for, enquanto passava os olhos novamente por todo o debate,
percebi que seria infrutífero escrever uma resposta alternativa a todos os
argumentos de Sinnott-Armstrong. Isso porque muitos dos seus desafios são
voltados aos argumentos da apologética clássica ou evidencial, e nem mesmo
tocam nos argumentos bíblicos ou pressuposicionais; assim, mesmo que seus
argumentos fossem bem sucedidos, de forma alguma poderiam afetar a
abordagem bíblica que ensino e aplico. Além do mais, seus ensaios são
apresentados no contexto do seu debate com Craig, e assim, a menos que
meus leitores já tenham lido o debate, eu precisaria explicar o contexto desde
o início antes de apresentar minha própria resposta.
Assim, por mais que desejasse fazê-lo, não apresentarei uma crítica
minuciosa aos argumentos de Sinnott-Armstrong. Antes, vou criticar um
aspecto particular do seu pensamento e apresentação; diz respeito
principalmente aos seus argumentos que gravitam em torno do problema do
mal. Embora o produto disso não corresponda a uma destruição total de todos
os seus argumentos, é suficiente para mostrar que embora ele seja professor
de filosofia, sua capacidade de raciocínio não se eleva acima do ateu
mediano, e logo, um idiota profissional continua sendo um idiota. Com tudo
isso em mente, consideremos agora o caso de Walter Sinnott-Armstrong.
Em certo lugar, ele explica por que se preocupa tanto sobre o tópico a
ponto de participar de um debate público. Ele escreve o seguinte:
Minha resposta é que sou professor, e por isso, meu trabalho é educar.
Sou também filósofo. Filósofos procuram questionar suposições comuns
e examinar as razões a favor e contra essas suposições. Por isso gostaria
de ajudar os leitores a esclarecer as evidências favoráveis e contrárias à
3
existência de Deus, para que possam decidir por si mesmos.
Essa declaração sobre o seu objetivo é muito útil para a nossa análise,
pois compromete ele a certa política intelectual que servirá de parâmetro para
seus argumentos reais. E ao deixar de corresponder a esse critério, sua
hipocrisia e incompetência tornar-se-ão ainda mais evidentes.
Notamos então que embora sua política expressa seja de “questionar
suposições comuns”, ele depende de inúmeras suposições comuns e
premissas subjetivas/intuitivas ao longo de sua apresentação.
Por exemplo, na página 34 ele escreve: “Craig ainda poderia perguntar
‘O que existe de imoral em causar danos sérios a outras pessoas sem
justificativa?’ Mas parece natural responder: ‘É simplesmente assim.
Objetivamente. Não concorda?’”. Não, eu não concordo. Sua resposta
equivale a dizer “parece objetivo”, mas se uma crença é baseada apenas no
que “parece”, ela é por definição subjetiva ao invés de objetiva. Quando você
declara “parece” num contexto como este, está nos dizendo algo sobre si
mesmo ao invés de algo fora de sua própria mente.
Exijo mais do que um “parece natural”; exijo uma justificativa racional.
E se o que “parece natural” a você parece inatural a mim? E se o que parece
natural a uma pessoa normal parece inatural a uma pessoa insana? Agora, o
que é normal e o que é insano? Quem é normal e quem é insano? Como
sabemos? “Parece natural” é uma justificativa adequada a todo e qualquer
argumento? Caso não, quando é adequada e quando é inadequada? Como
sabemos? Esse “parece natural” parece totalmente irracional, para não dizer
absolutamente indolente.
Ele escreve então: “De modo similar, se olharmos detidamente a certo
mal natural, como uma obstrução intestinal, e não acharmos nada que sugira
uma compensação adequada, estamos justificados em crer que não há
4
compensação adequada para este mal”. Esse padrão de argumento ocorre ao
longo de toda a sua apresentação; isto é, nossas investidas intelectuais
subjetivas na situação são supostamente suficientes para satisfazer a produção
de uma justificativa racional ao fazermos uma inferência sobre a realidade
objetiva. Sinnott-Armstrong parece pensar que a justificativa racional
consiste de nossa satisfação subjetiva, e não de inferências necessárias.
Em outro lugar ele escreve: “Procuro mostrar que o senso comum leva
5
você às premissas do meu argumento”. Se é verdade ou não que o “senso
comum” nos leva às suas premissas, como ele sabe que aquilo que cremos de
acordo com o nosso “senso comum” é verdadeiro? Ele não desafia e também
não estabelece o nosso “senso comum” como um meio confiável para a
verdade, mas simplesmente o assume em seus argumentos.
Na página 145, ele diz: “Pode soar bonito dizer que Deus não está
sujeito aos nossos padrões, mas por essa tática se torna obscuro o que leva
Deus a ser bom. No fim das contas, precisamos usar nossos próprios padrões,
pois não podemos entender quaisquer outros”. Mas não é automaticamente
verdadeiro que se Deus não está sujeito aos nossos padrões, se torna obscuro
o que leva Deus a ser bom. A doutrina bíblica da bondade de Deus responde
a questão, e Sinnott-Armstrong deve confrontar a doutrina antes de fazer essa
declaração; isto é, ele deve estabelecer que a Bíblia não é a revelação escrita
de Deus.
Então, note o que ele diz: “precisamos usar nossos próprios padrões,
pois não podemos entender quaisquer outros”. Mas esta é uma razão
puramente pragmática, não lógica. Equivale a dizer: “precisamos fingir que
isso é verdade, pois temos apenas isto”. E quem é ele para falar por todos
nós? Só porque ele não pode “entender quaisquer outros”, não significa que
todos nós não possamos; só porque ele é estúpido e ignorante, não significa
que ele pode arrastar todos nós consigo. Mas mesmo que não possamos
“entender quaisquer outros”, isso não significa que devemos fingir que o
padrão que temos é verdadeiro. Por que não nos resignar com o ceticismo e a
ignorância? Além disso, filósofos constantemente debatem quais deveriam
ser os “nossos padrões” em primeiro lugar. Eu argumento que os padrões
bíblicos é que deveriam ser os “nossos padrões”.
Sinnott-Armstrong conclui o debate dizendo: “Em contraste, tentei
basear meus argumentos em padrões consensuais de crença racional e
6
compensação adequada”. Assim, ele parece ter esquecido completamente
durante todo o debate que havia dito “Sou também filósofo. Filósofos
procuram questionar suposições comuns e examinar as razões a favor e contra
essas suposições”.
O único modo de reconciliar sua política intelectual explícita
(questionar suposições comuns) com sua estratégia real de debate (apelar ao
senso comum) é ele fazer uma distinção clara entre suposições comuns e
senso comum. Isto é, suposições comuns se referem a certas crenças
compartilhadas, ao passo que senso comum refere-se a uma capacidade ou
intuição intelectual compartilhada que não possui conteúdo. Mas se é isso o
que ele faz, um filósofo profissional deixar este ponto sem explicação quando
as duas coisas são tão facilmente confundidas ou mesmo identificadas é ainda
injustificável.
Em todo o caso, mesmo que Sinnott-Armstrong faça uma distinção
clara entre suposições comuns e senso comum, inúmeros problemas
permanecem. Por exemplo, se o senso comum se refere apenas a uma
capacidade ou intuição intelectual compartilhada sem conteúdo, como esse
“senso”, que é tão comum, poderia produzir essas “suposições” comuns que
ele agora desafia usando o “senso” comum? Isto é, se o “senso” e as
“suposições” se contradizem mutuamente, como podem ser “comuns”?
Talvez as suposições comuns (que Sinnott-Armstrong desafia) foram
adotadas porque as pessoas falham em usar o senso comum, em cujo caso o
senso comum se refere a uma capacidade ou intuição comum que não é
geralmente usada. Ou as suposições comuns foram produzidas por uma falha
comum no pensamento, que fez as pessoas desviarem do seu senso comum.
Mas no que consiste então essa “falha”? A “falha” não é parte do “senso”?
Por quê? Como ele sabe? Essas duas visões têm problemas, mas já
complicamos por demais a questão.
A verdade é que Sinnott-Armstrong não faz uma distinção clara entre
suposições comuns e senso comum. Ele escreve:
Em contraste, tentei basear meus argumentos em padrões consensuais
de crença racional e compensação. Estes princípios não se restringem
aos ateus. A maior parte dos cristãos usa os mesmos padrões em sua
vida cotidiana. Mais importante, esses princípios são aceitos por quase
qualquer pessoa que não esteja previamente comprometida a favor ou
contra a existência de Deus. Isso as mantém em pontos de partida
7
neutros.
Ele identifica os “padrões consensuais” com “estes princípios”. Em
outras palavras, por senso comum ele não se refere a um potencial ou
capacidade intelectual compartilhada à parte de qualquer conteúdo, mas a
crenças comuns reais. Isto é, em sua mente os padrões consensuais são
suposições comuns. Mas se a tarefa do filósofo é “questionar suposições
comuns”, por que afinal ele não questiona as próprias suposições comuns
(“princípios”, “padrões” etc.) que está usando, e das quais dependem seus
argumentos?
Ele tem afirmado que argumenta contra a existência de Deus porque é
seu trabalho, como filósofo, questionar suposições comuns, mas então ele
volta atrás e argumenta como se a verdade fosse uma questão de
consentimento e opinião popular. Em outro contexto ele poderia desafiar a
mesma falácia em seu oponente, mas quando não possui justificativa,
emprega a estratégia do “todo mundo sabe”. Observe que seu erro não está
oculto, mas que os dois lados da sua autocontradição são explicitamente
declarados. Por um lado, no entender dele a própria razão do debate é
questionar suposições comuns, mas por outro, ele baseia partes essenciais dos
seus argumentos em princípios comuns (“suposições”, “padrões” etc.) sem
primeiro questionar ou justificá-los.
Embora erros gritantes permeiem toda a sua apresentação, esse apelo
ilegítimo à opinião popular é a única asneira filosófica que pretendo registrar.
Todavia, como o parágrafo supracitado contém afirmações adicionais, vou
tratar delas brevemente antes de seguir adiante.
Ele diz que os princípios comuns nos quais baseia seus argumentos são
afirmados não somente por ateus, mas também por cristãos. Mesmo que seja
verdade, isso não mostra que seus argumentos são verdadeiros, pois ele ainda
precisa estabelecer esses princípios; eles podem quando muito servir de base
para um argumento ad hominem. Isto é, talvez esses princípios comuns sejam
falsos, e assim tanto ateus quanto cristãos estariam errados em crer neles.
Mas eu disse que eles podem “quando muito” embasar um argumento ad
hominem porque não podem nem mesmo fazer isso, já que são apenas
princípios com os quais supostamente consentimos em nossa “vida
cotidiana”. Ele ainda precisa demonstrar que esses princípios que aplicamos
em nossa “vida cotidiana” necessariamente se aplicam no presente debate.
Mas sua justificativa é ainda mais fraca. Como ele apela a esses
princípios supostamente comuns como premissas essenciais dos seus
argumentos (e não como mera opinião pessoal que não afeta a validade dos
seus argumentos), isso significa que é igualmente essencial aos seus
argumentos que esses princípios sejam de fato comuns. Ele falha em mostrar
ou mesmo tentar estabelecer isso; ele simplesmente afirma repetidas vezes a
natureza comum das suas premissas. Em outras palavras, ele diz “todo mundo
sabe” quando de fato ninguém sabe se todo mundo sabe. Como ele sabe no
que “a maior parte dos cristãos” acredita? Ele ao menos sabe no que a maior
parte dos ateus acredita?
A declaração seguinte é no mínimo igualmente problemática: “Mais
importante, esses princípios são aceitos por quase qualquer pessoa que não
esteja previamente comprometida a favor ou contra a existência de Deus. Isso
as mantém em pontos de partida neutros”.
Ele diz que suas premissas são aceitas por quase todas as pessoas
neutras. Como ele sabe disso? E quem são essas pessoas neutras? Onde elas
estão? Como ele sabe que é possível ser neutro sobre a existência de Deus? E
como ele sabe que essas pessoas são neutras? E se existem tantos ateus e
pessoas neutras assim por aí, por que as crenças dos cristãos são consideradas
“suposições comuns” que ele afirma ser sua tarefa desafiar, como filósofo?
Ele fala como se quase cem por cento da população humana já
afirmasse suas premissas essenciais, mas sendo assim, resulta que suas
premissas são muito mais comuns. Neste caso ele não deveria começar
desafiando estas suposições comuns ao invés das cristãs, que agora não
parecem assim tão comuns? E mesmo existindo coisas tais como “pontos de
partida neutros”, por que eles estão isentos de uma análise crítica? Eles não
são muito mais perigosos, já que são tão comuns e aparentemente neutros,
podendo ser assim facilmente negligenciados?
Afirmar que uma pessoa deveria argumentar de pontos de partida
neutros implica outro problema, qual seja, poderíamos perguntar se a visão de
uma pessoa acerca da neutralidade é em si neutra. Para Sinnott-Armstrong,
ser “neutro” é não estar “previamente comprometido” (pelo menos neste
tópico do debate), mas ele é neutro sobre neutralidade ou está “previamente
comprometido” com a neutralidade? Se ele está “previamente comprometido”
com a neutralidade, por que deveríamos confiar nele quando fala sobre
neutralidade?
Se eu assumo isso como o próprio ponto do debate ― isto é, se
proponho discutirmos se deveríamos ser neutros sobre neutralidade, e se
proponho que deveríamos primeiro definir esta questão como uma
precondição lógica necessária para o debate sobre a existência de Deus ―,
Sinnott-Armstrong vai apelar novamente aos pontos de partida neutros a fim
de estabelecer sua preferência pelos pontos de partida neutros? Isto é, ele vai
apelar às suposições comuns das pessoas que são neutras (não “previamente
comprometidas”) sobre neutralidade (se é que existem tais pessoas) para
então argumentar por sua preferência pela neutralidade?
Segundo o seu padrão, ele deve encontrar pessoas que são neutras sobre
neutralidade, descobrir qual é a posição destas pessoas com respeito a coisas
relevantes à neutralidade e usar então estas crenças como supostos pontos de
partida neutros para argumentar por sua preferência por pontos de partida
neutros. Mas você sabe o que acontecerá depois disso? Vou sugerir que,
como precondição lógica necessária para o debate sobre ser neutro com
respeito à neutralidade, devemos primeiro discutir se aqueles que são neutros
acerca da neutralidade foram neutros sobre ser neutro acerca da neutralidade,
e assim por diante. Isso leva a um regresso infinito, e também significa que
antes de tudo, Sinnott-Armstrong não tem prerrogativa racional para os seus
supostos pontos de partida neutros no debate sobre a existência de Deus.
Perceba até que ponto sucumbiu a raça humana, até onde vai a
estupidez de uma pessoa! Assim como todos os demais eruditos não cristãos,
Sinnott-Armstrong é uma fraude intelectual. Ele se passa por filósofo
profissional, e afirma ser uma pessoa que examina as suposições subjacentes
às crenças das pessoas. Contudo, ele recorre à intuição subjetiva, ao senso
comum e à opinião popular em pontos essenciais dos seus argumentos.
Professor de filosofia? Eu não lhe confiaria nem mesmo a função de ensinar
debates na escola primária. Ele faria melhor se perambulasse pelas ruas
catando latas de soda ― ao menos ganharia a vida honestamente. Onde estão
os eruditos? Onde estão os filósofos? Onde estão os professores deste
mundo? Porventura não fez Deus migalha dessa gente?
Você poderia exclamar: “O quê?! Ele alega ser filósofo, e é assim que
argumenta? O que há de errado com ele?!” Eu já disse a você ― ele é um
idiota. E não esqueça, ele é um filósofo profissional instruído e experiente, e
não simplesmente um vagabundo bêbado. Mas enquanto permanecer
incrédulo e rejeitar a sabedoria divina, tudo o que ele pode fazer é revestir sua
estupidez com um pouco de elegância. Ainda que alguns filósofos possam
fazer uma apresentação mais cuidadosa, nenhum deles é racionalmente
superior na essência dos argumentos. Se eu posso demoli-los, você também
pode. O que você precisa é aprender como pensar de forma bíblica e lógica, e
ganhar confiança na superioridade da sabedoria divina.

VOCÊ NÃO PODE CHEGAR LÁ A PARTIR DAQUI

Por que os não cristãos argumentam como Sinnott-Armstrong e ainda


por cima pensam que fazem argumentação válida? É porque não podem
chegar às suas conclusões desejadas por inferências necessárias, e por isso
simplesmente fazem um acordo e redefinem o padrão de argumentação
racional a um ponto bem mais baixo, isto é, ao ponto de se tornar
completamente inválido. Assim, a argumentação “válida” é definida por
concordância, não por necessidade lógica.
Logo no início de seu debate com Craig, Sinnott-Armstrong escreve:
Se não nos fosse permitido chegar a qualquer conclusão sem estarmos
completamente certos, jamais poderíamos alcançar qualquer conclusão
sobre um assunto importante, pois jamais podemos estar completamente
certos sobre qualquer coisa importante (pelo menos se for controversa).
8
A exigência de certeza leva à ignorância e inércia.
Trata-se de uma confissão importante. Sinnott-Armstrong admite que
ele “jamais pode estar completamente certo sobre qualquer coisa
9
importante”. Ou seja, as conclusões dos seus argumentos jamais são
alcançadas por inferências necessárias a partir de premissas, mas por saltos
lógicos, e é isso o que faz suas conclusões serem “incertas”, ou como eu
poderia dizer, inválidas e irracionais, para serem desconsideradas num debate
racional.
Embora ele acrescente “pelo menos se for controversa”, isto de fato não
ajuda; ao contrário, confirma que para ele validade e certeza estão
diretamente relacionadas à concordância, não à necessidade lógica. A
implicação é que uma conclusão será mais “certa” quanto mais incontroversa
e aceita por concordância; sua certeza não é medida no rigor lógico pelo qual
é alcançada. Por outro lado, ele afirma mais adiante que um filósofo deve
“questionar suposições comuns”!
É claro, alguns não cristãos ainda insistem em definir raciocínio válido
por necessidade lógica, mas então enfrentam o problema de não poderem
formular argumentos válidos. Entre as pessoas cientes desse dilema, algumas
desistem da possibilidade de obter qualquer conhecimento positivo e se
tornam céticas e agnósticas. Entretanto, conforme demonstrei em outro lugar,
elas não podem se manter logicamente nessa condição, pois o ceticismo e o
agnosticismo são autocontraditórios. Elas devem adotar a cosmovisão bíblica
ou se tornar insanas. A maior parte escolhe a segunda opção.
Sinnott-Armstrong percebe que não pode demonstrar logicamente
10
“qualquer coisa importante”, e faz então da lógica e da certeza uma questão
puramente pragmática. Ou seja, ele diz que se realmente precisamos estar
completamente certos, jamais poderíamos alcançar qualquer conclusão sobre
um assunto importante. Então, ao invés de dizer “Portanto, jamais podemos
alcançar qualquer conclusão sobre um assunto importante”, ele na verdade
diz “Mas desejamos alcançar algumas conclusões a qualquer preço, e assim,
vamos simplesmente mudar as regras”. Isto é, “Se seguirmos as regras,
jamais chegaremos lá; mas queremos chegar lá, assim, vamos simplesmente
mudar as regras”. Embora não possa escapar logicamente do ceticismo, ele
permanece fora do ceticismo apenas porque não gosta dele e deseja preservar
o direito de fazer afirmações sobre várias coisas, mesmo não tendo tal direito.
Não cristãos não estão apenas praticando, mas também ativamente
ensinando essa redefinição pragmática da racionalidade. Mais uma vez,
estamos cientes de que alguns não cristãos ainda pensam que podem
estabelecer suas conclusões por necessidade lógica, mas eles realmente não
podem. De fato, na essência, nenhum dos seus argumentos é racionalmente
superior aos de Sinnott-Armstrong. A diferença é que eles se recusam a
admitir isso; é uma forma de autoilusão diferente da demonstrada por pessoas
como Sinnott-Armstrong. Assim, uma das coisas que deveríamos fazer ao
debater com essas pessoas é mostrar que seus argumentos são igualmente
falaciosos. No entanto, questionamos agora aqueles não cristãos (muito mais
numerosos do que você imagina) que reconhecem não poder demonstrar
“qualquer coisa importante” (eu diria “absolutamente nada”) por necessidade
lógica, mas que ainda querem se ter por racionais, e por isso simplesmente
redefinem a racionalidade e o raciocínio válido.
Usarei a seguir David Zarefsky como exemplo. Entre suas inúmeras
credenciais e produções, Zarefsky é professor de Argumentação e Debate e
de Estudos de Comunicação na Universidade de Northwestern. Como no caso
de Sinnott-Armstrong, que ninguém declare que eu deliberadamente escolhi
um exemplar inferior como exemplo da tolice não cristã.
11
Em seu plano de ensino para um curso de argumentação, ele faz
referência à dedução e indução, e expressa sua visão sobre a validade lógica
nessas condições; assim, seria útil definir sucintamente e revisar as
diferenças.
Dedução é o processo de raciocínio em que a conclusão é inferida de
premissas por necessidade lógica; por outro lado, indução é o processo de
raciocínio em que a conclusão não é inferida de premissas por necessidade
lógica. Na dedução, a conclusão inclui somente informação contida e
necessariamente implicada nas premissas; mas na indução, a conclusão inclui
12
nova informação não contida e necessariamente implicada nas premissas.
Em outras palavras, um argumento indutivo produz uma conclusão que
está supostamente, mas não necessariamente implicada nas premissas. Por
esse motivo a indução é sempre uma falácia formal; isto é, a conclusão nunca
é certa, nunca é estabelecida racionalmente. De fato, como a conclusão não
está necessariamente implicada nas premissas, não há como logicamente
mostrar que existe de fato alguma relação necessária entre a conclusão e as
premissas.
Com isso em mente, ele escreve: “O raciocínio formal não é visto como
13
o modelo de argumentação na erudição recente”. Por “raciocínio formal”
ele se refere à dedução, quando “uma pessoa de fato raciocina numa forma
14
silogística”. No seu entender, “a maior parte das argumentações não é
representada por uma forma na qual a conclusão não contém informação
15
nova”. Mas ao contrário do que eu faria, ele não conclui que “Portanto, a
maior parte das argumentações é falaciosa”. Ao contrário, ele diz que a
argumentação “envolve capacitar uma audiência a se mover daquilo que já se
conhece e acredita para uma nova posição”, e “Esse movimento envolve um
16
salto de fé que o argumentador busca justificar”.
Ele segue adiante e diz: “O julgamento é necessário porque a prova
17
absoluta não é possível, ainda que decisões devam ser tomadas”. Em outras
palavras, a subjetividade é introduzida no processo por questões pragmáticas,
porquanto “decisões devam ser tomadas”. Ele continua: “Busca-se o
julgamento ao dar-se razão suficiente para que um ouvinte crítico sinta que se
18
justifica a aceitação da afirmação”. Ao invés de objetiva e logicamente
demonstrada, a afirmação é “aceita” até onde o ouvinte “sinta” que ela se
justifica. Assim, para Zarefsky “A adesão do ouvinte crítico torna-se o
substituto da prova absoluta”.
Em outras palavras, os filósofos não cristãos percebem que a dedução
é, no entender deles, irrealista e amiúde impossível, e por isso decidem
abandoná-la, para em seu lugar confiar nos julgamentos subjetivos dos
argumentos indutivos.
Mas isso então significa que todos os seus argumentos são logicamente
inválidos. Zarefsky reconhece: “Aplicar o conceito de validade além da
19
lógica formal é enganador”. Por quê? “Uma vez que a afirmação não segue
da evidência com certeza, não podemos dizer que, sendo a evidência
20
verdadeira, a afirmação deve ser verdadeira”. Podemos perguntar: “Se a
afirmação não segue com certeza, então de fato segue?” Em todo o caso, o
que ela faz? Ele então diria, “Portanto, devemos reconhecer que nossos
argumentos são inválidos, e devemos ser honestos em reconhecer que nossas
conclusões são meras opiniões e especulações subjetivas não racionais ou
mesmo irracionais”?
De jeito nenhum! Ao invés de dizer que todos os seus argumentos
cotidianos são inválidos, ele com efeito diz: “Vamos redefinir a validade!
Vamos concordar que até mesmo os nossos saltos de fé são logicamente
21
válidos!” Você poderia dizer, “Mas ainda precisamos ter ‘controle sobre o
22
processo de raciocínio’, não é mesmo?” “Certamente”, responde Zarefsky,
23
“esta função é realizada focando a experiência ao invés da forma”. Ou seja,
ao invés de pensar na validade como uma questão de inferência necessária,
ele propõe que “se desenvolve gradativamente uma tendência geral de certos
24
padrões de raciocínio produzirem resultados bons ou maus”. Tal como
Sinnott-Armstrong, ele faz do raciocínio uma questão estritamente
pragmática ao invés de racional. É também sugestivo que seu curso seja
intitulado “Argumentação: o estudo do raciocínio útil”, ao passo que se fosse
eu a ministrar um curso de argumentação, chamaria de “Argumentação: o
estudo da inferência necessária”.
Você percebe, não cristãos renunciam à racionalidade, pois não podem
arcar com suas demandas. No entanto, eles fingem seguir o raciocínio, e
querem se ter por racionais. Assim, redefinem racionalidade como uma
questão de concordância ao invés de necessidade lógica. Eles não podem ir
“daqui” para “lá”, mas ainda querem chegar “lá”; assim, decidem dar
simplesmente um salto de fé. Se parece irracional e inválido, eles precisam
meramente concordar em definir isso como racional e válido.
Portanto, para deixar claro, sua estratégia é: “Se você não pode ir daqui
para lá, simplesmente trapaceie. E se todos trapacearmos, ficaremos com uma
boa imagem aos olhos uns dos outros. Embora nossas conclusões sejam
alcançadas por saltos de fé, ainda gostaríamos de pensar que somos racionais;
assim, simplesmente concordemos que somos racionais, qualquer que seja o
preço”. Em outras palavras, é racionalidade por concordância ou pura
fantasia, e não por necessidade lógica ou inferência necessária.
Você poderia exclamar: “O quê?! Eles são estúpidos ou algo assim?”
Sim, eles são estúpidos, e são os mesmos idiotas que atacam sua fé e dizem
que você é irracional. São atrevidos e desonestos. Eles percebem que é
impossível permanecer racional à parte da confiança na revelação de Deus,
mas se recusam a admitir isso. A abordagem pragmática resulta da
constatação que eles não podem chegar via dedução às conclusões que
desejam provar, pois com base em suas epistemologias não cristãs seria
impossível partir de premissas autoautenticáveis ― das quais poderiam
deduzir conclusões verdadeiras por necessidade lógica. E muito embora
alguns não cristãos ainda tentem viver à altura do padrão da dedução, não
podem fazê-lo com base em suas epistemologias e princípios primeiros não
cristãos. Portanto, de uma forma ou de outra, vencemos.

CRISTO, NOSSA RAZÃO ― RAZÃO, NOSSA ARMA

A Bíblia diz que Cristo é o Logos de Deus ― ou seja, a Palavra, a


Sabedoria, a Lógica, ou a Razão de Deus (João 1.1). Portanto, quem rejeita
Cristo rejeita a própria Razão. Aqueles que atacam o cristianismo lutam
contra a Razão, e assim, que não se repita mais que os incrédulos usam razão
ou lógica para desafiar o cristianismo ― isso jamais ocorre. Antes, sua
estratégia é atacar a nossa fé com declarações e especulações irracionais e
injustificadas. Por outro lado, Cristo é o nosso defensor, e a Escritura/Razão,
nossa arma.
Os não cristãos revindicam a posse da Razão, e isso confunde muitos
cristãos desinformados. Mas como ilustrei acima, mesmo que os não cristãos
tentem sustentar a Rocha da Razão em seus próprios ombros e proclamá-la
como seu Deus e eles como seus servos, eles não podem arcar com as suas
demandas; no fim das contas a Razão os sufoca e esmaga. Eles resvalam por
debaixo dela, tentam se justificar e também redefini-la. Então eles encaram a
ideia de que poderiam juntos remendar uma grande bola de esterco e chamar
isto de Razão e Lógica ― ela é muito mais leve, e por certo ninguém
perceberia! Mas o apologista bíblico esmagará tanto eles como sua bola de
esterco com a Rocha da Razão, a qual eles com tanta dificuldade procuram
evitar.
Utilizei Sinnott-Armstrong e Zarefsky apenas como exemplos, mas
todos os demais pensadores não cristãos estão no mesmo patamar de pobreza
mental. Seja Michael Martin, Kai Nielsen ou qualquer outro não cristão no
passado ou presente, não faz qualquer diferença. Seu irracionalismo está
necessariamente vinculado à rejeição da cosmovisão bíblica; qualquer um
que brincasse no estrume acabaria fedendo. E como sua forma de
argumentação não apenas é inadvertidamente praticada, como também
deliberada e sistematicamente ensinada aos seus estudantes, futuras gerações
de não cristãos podem apenas se tornar piores.
Isso nos leva a um aspecto importante citado inicialmente. Poderia até
mesmo uma criança derrotar esses professores não cristãos em um debate?
Certamente, caso a criança fosse apropriadamente treinada por seus pais e
pastores. Deus já fez todos os incrédulos tolos (1 Coríntios 1.20), e se deleita
em usar as coisas humildes para humilhar as orgulhosas (v. 28). Embora
todos os cristãos devessem participar, quem melhor para desconcertar
eruditos não cristãos do que as crianças, os mentalmente incapacitados e os
analfabetos? Mas para obter êxito, eles devem abraçar Cristo como sua Razão
e afirmar toda a Escritura como a revelação de Deus. Por isso, devem ser
ensinados apropriadamente.
Pais, ensinem teologia sistemática e apologética bíblica aos seus filhos.
Vocês deveriam começar isso tão logo eles iniciem o aprendizado de um
idioma. Ensinem seus filhos a pensar bíblica e logicamente. Ensinem eles
desde o começo a estimar o que Deus estima e a desprezar o que Deus
despreza.
Pastor, pregue sobre a tolice dos incrédulos ― exponha-os! Use-os
como exemplos públicos e mostre a seu povo como destruir racionalmente os
incrédulos e reduzi-los a nada. Você encontrará os piores argumentos até
mesmo nas suas melhores obras literárias. Transmita ao seu povo a
habilidade, o conhecimento e a confiança que eles necessitam para enfrentar
os incrédulos e vencê-los. Nosso objetivo é a humilhação e a aniquilação
completa da erudição não cristã; nosso propósito é usar a Razão para golpear
as costas e esmagar a cabeça dessa erudição até que ela se curve perante o
trono de Cristo. Para isso, devemos labutar a fim de erguer um exército de
apologistas bíblicos, capazes de demolir de forma decisiva qualquer não
cristão em um debate.
É claro, alguns de vocês ainda são hesitantes; ainda estão algemados
25
pelo padrão do discurso e decoro social imposto pelos não cristãos. Trata-se
de um mecanismo de defesa que eles instalaram em suas mentes para que eles
possam se salvaguardar da Razão. Parem de ser estúpidos! Parem de ser
fracos! Parem de adular e romancear aquilo que Deus condenou. Antes,
estejam alinhados com o método bíblico e o tom da proclamação e defesa do
evangelho. Levantem-se e tomem seus lugares no exército de Deus, e lutem
por sua causa.
28. Um idiota com qualquer
outro nome

INTRODUÇÃO

Certa pessoa me escreveu recentemente para indagar da linguagem


áspera que às vezes emprego ao me referir a não cristãos. Especificamente,
ela questionou se é adequado dirigir-se ao incrédulo com injúrias bíblicas.
Apesar de já ter abordado esse assunto em diversos lugares nos meus escritos,
considerei proveitoso compartilhar com os leitores minha resposta a esta
pessoa.
Como o meu propósito é ajudar no entendimento e não manter a
pergunta e a resposta no formato original, editei a pergunta e expandi a
1
resposta. A pergunta serve para fornecer um contexto com o qual a resposta
pode interagir. E como a pergunta e a resposta não estão mais no formato
original, note que o “você” na resposta não remete mais à pessoa que havia
feito originalmente a pergunta.

PERGUNTA

Li algumas de suas obras e devo confessar que realmente jamais havia


considerado a apologética e a mente de Cristo por esse prisma ― que a
“sabedoria” dos incrédulos é completamente tola e idiota, e completamente
irracional. Concordo plenamente com todas as suas conclusões.
Contudo, é realmente a melhor coisa dizer-lhes tudo isso usando palavras
como “idiota”, “fezes intelectuais”, e assim por diante? Gostaria de
entender como você interpreta 1 Pedro 3.15 e Colossenses 4.5-6 tendo em
vista seu modo de debater com incrédulos.
RESPOSTA

Devemos primeiramente considerar se as descrições são bíblicas. Você


já disse que concorda comigo nessa questão, e assim não preciso dispensar
tempo justificando o ponto, muito embora eu ainda trate de algumas palavras
específicas a seguir.
Assim, sua pergunta passa a ser se deveríamos contar aos incrédulos o
que a Bíblia diz sobre eles. Mas a pergunta mais apropriada é se temos
alguma justificativa bíblica para entender que devemos ocultar certas
verdades dos incrédulos. Minha posição é que ao invés de esconder qualquer
verdade bíblica dos incrédulos, deveríamos expor, explicar e aplicar a eles
absolutamente tudo o que a Escritura ensina.
Considere os profetas, os apóstolos e o próprio Cristo. Todos eles
usaram de palavras muito duras e até mesmo sarcásticas para criticar
pecadores endurecidos. Provavelmente, o único contra-argumento que já ouvi
sobre esse ponto é que essas palavras foram exceções infalíveis. Bom! É de
fato conveniente. Mas por que foram exceções nesta área? Por que se requer
infalibilidade para usar palavras ásperas? E por que foram exceções somente
ao se usar palavras ásperas e não também ao se usar palavras amáveis? Não,
eu me recuso a aceitar mera opinião ou especulação; exijo uma resposta
bíblica e exegética.
O princípio dessas pessoas parece ser que, sempre que você encontrar
certas coisas na Bíblia que não aprova ou não deseja praticar, simplesmente
chame de “exceções”. O elemento flagrantemente anticristão neste uso da
Escritura é que essas pessoas não apenas dizem que os profetas, os apóstolos
e Cristo foram exceções no sentido de que eu não tenho o direito de originar
essas injúrias, como também que eu nem mesmo tenho o direito de aplicar ou
repetir essas mesmas injúrias à mesma classe de pessoas às quais elas foram
originalmente aplicadas.

1 Pedro 3.15

É claro, usa-se frequentemente 1 Pedro 3.15 para afirmar que devemos


ser “legais” quando fazemos apologética. O versículo diz: “Antes,
santifiquem Cristo como Senhor em seu coração. Estejam sempre preparados
para responder a qualquer pessoa que lhes pedir a razão da esperança que há
em vocês. Contudo, façam isso com mansidão e respeito…” Mas o que
significa fazer apologética “com mansidão e respeito”? Significa aquilo que
os incrédulos dizem que significa? Significa ser não ofensivo, não
confrontador, não ameaçador e falar de maneira delicada e tímida? Ou ao
contrário, trata-se de algo infalivelmente explicado e demonstrado pelas
palavras e exemplos dos profetas, dos apóstolos e do próprio Cristo? Não
deveríamos assumir que o apóstolo tenha em vista aquilo que os incrédulos
entendem por mansidão e respeito; antes, devemos prestar muita atenção ao
contexto do versículo.
O contexto deste versículo trata principalmente de cristãos que
enfrentam perseguição e inquérito de autoridades (oficiais do governo,
patrões etc.); não se refere diretamente à pregação pública ou ao discurso
ordinário entre pessoas e seus pares. Matthew Henry escreve que o versículo
2
se refere ao “temor de Deus” e à “reverência aos nossos superiores”.
De fato, quando lemos Atos dos Apóstolos vemos que os discípulos
eram usualmente mais polidos ao fazerem sua defesa perante oficiais do
governo. Mesmo então Jesus referiu-se “àquela raposa” ao falar de Herodes
(Lucas 13.32). Existe um exemplo mais detalhado de Paulo, em Atos 23:
(3) Então Paulo lhe disse: “Deus te ferirá, parede branqueada! Estás aí
sentado para me julgar conforme a lei, mas contra a lei me mandas
ferir?”
(4) Os que estavam perto de Paulo disseram: “Você ousa insultar o sumo
sacerdote de Deus?”
(5) Paulo respondeu: “Irmãos, eu não sabia que ele era o sumo
sacerdote, pois está escrito: ‘Não fale mal de uma autoridade do seu
povo’”.
Note Paulo dizer “Deus te ferirá” e “parede branqueada”. Em essência,
Paulo amaldiçoou a pessoa no nome de Deus e chamou-a de hipócrita e
transgressora da lei em sua face. Mas então, numa relação com aquilo que
afirmei do contexto de 1 Pedro 3.15, quando Paulo descobre que se dirigia ao
sumo sacerdote, subentende que não teria dito essas coisas se soubesse (v. 5).
Assim, o versículo 3 mostra que a minha abordagem com os incrédulos
é similar a de Paulo, e os versículos 4-5 mostram que minha interpretação de
1 Pedro 3.15 faz Pedro e Paulo coerentes. A forma com que meus críticos e
muitos outros crentes distorcem 1 Pedro 3.15 levaria Pedro a condenar Paulo
acerca do versículo 3 [de Atos 23], a menos que Paulo fosse de algum modo
“exceção”, não estando assim obrigado a obedecer 1 Pedro 3.15. Por outro
lado, minha interpretação de 1 Pedro 3.15 significa que Paulo, no versículo 3,
não necessariamente contradiz 1 Pedro 3.15 (porque ele não sabia que falava
ao sumo sacerdote), e Paulo até mesmo mostra nos versículos 4 e 5 sua
concordância com 1 Pedro 3.15.
Agora, posso supor que meus críticos me condenariam se eu afirmasse
algo semelhante aos dizeres de Paulo no versículo 3. Porém, aqui está ― o
próprio Paulo o fez. Mas é claro, Paulo era uma exceção, não é mesmo? Mas
exceção para quê? Exceção para “mansidão e respeito”? Se meus críticos
usassem 1 Pedro 3.15 contra mim, tendo então os profetas, os apóstolos e
Cristo como exceções, precisariam também afirmar que os profetas, os
apóstolos e o próprio Cristo foram exceções à mansidão e respeito inúmeras
vezes, e que nestas ocasiões eles não mostraram nenhuma mansidão e
respeito.

Colossenses 4.5-6

Quanto a Colossenses 4.5-6, não há nada nos versículos que contradiga


minha abordagem. Os versículos são os seguintes: “Sejam sábios no
procedimento para com os de fora; aproveitem ao máximo todas as
oportunidades. O seu falar seja sempre cheio de graça e temperado com sal,
para que saibam como responder a cada um” (NIV).
Meus críticos erram ao aplicar estes versículos contra a minha
abordagem. Eles assumem que usar injúrias contra os incrédulos não é agir
sabiamente para com os de fora e é falar sem graça e sal. Mas no que consiste
a “sabedoria” aqui referida? O que é “graça” e “sal”? Por que essas coisas
significam o que meus críticos dizem que significam ― isto é, falar de
maneira delicada, ser “legal”, polido, não insultante, não ofensivo, acrítico e
assim por diante? O que a Bíblia pretende dizer com essas palavras, e
especialmente no presente contexto?
Matthew Henry escreve: “Graça é o sal que tempera o nosso discurso,
3
torna ele saboroso e o guarda da corrupção”. Ele parece supor que a
passagem enfatiza a qualidade ou pureza moral das nossas conversas, ainda
que outras coisas estejam também implicadas. Assim, ao invés de
simplesmente assumir que Paulo está dizendo o que os críticos querem que
ele diga, essas pessoas deveriam oferecer pelo menos um argumento
exegético elementar antes de fazer acusações.
Em todo o caso, se a instrução para os cristãos “serem sábios” e
falarem com “graça” e “sal” contradiz a minha abordagem, ela também
contradiz os profetas, os apóstolos e o próprio Cristo. É claro, meus críticos
então dizem que eles foram exceções. Mas exceções para quê? Exceções para
“graça” e “sal”? Exceções para “serem sábios”? Assim, estão dizendo que
Cristo falava algumas vezes sem graça e sal? E estão chamando Cristo de
estúpido, de modo que às vezes ele se portava tolamente para com os de fora?
Exijo que esses críticos levantem os olhos ao céu e repitam essa blasfêmia na
face de Deus antes de usarem esses versículos contra mim.
Em contraste, não me atrevo a blasfemar e nem desejo fazê-lo. Afirmo
que Cristo foi consistentemente sábio em sua conduta e diálogo, falou sempre
com graça e sal, e manteve sempre uma atitude agradável a Deus. Igualmente
atesto que meus críticos impõem sobre a Escritura suas próprias definições
antibíblicas das palavras e conceitos em questão, e que assim, ao menos
indiretamente blasfemam contra Cristo e diretamente lançam calúnias sobre
4
mim. Por conta disso, eu os acuso de pecado e insto que se arrependam. Peço
que parem de desafiar a Palavra de Deus e a condenar aqueles que a seguem;
e que antes, adotem o método e o tom bíblico na proclamação e defesa do
evangelho contra os incrédulos.

Idiotas e fezes

Com respeito a “idiota” e “fezes”, até estas palavras são bíblicas. A


palavra “idiota” deriva do grego moros. Paulo a usa em Romanos 1.22. É
traduzida como “loucos”, mas significa o mesmo que “idiotas”, que seria uma
tradução igualmente fácil e correta para o termo. Quanto a “fezes”, Paulo usa
uma palavra que é traduzida como “esterco” ou “refugo” para se referir em
Filipenses 3.8 à sua vida pregressa de incrédulo. O léxico de Thayer explica
que a palavra pode se referir a “qualquer refugo, como o excremento de
animais”. Tanto os significados destas palavras como os contextos nos quais
elas aparecem concordam com o modo como as uso contra os incrédulos.
Ademais, se “idiota” e “fezes” são tão ruins, por que chamamos os
incrédulos de “pecadores” e dizemos que são “corrompidos” ou “ímpios”?
Até mesmo meus críticos usam essas palavras quando pregam o evangelho e
falam aos incrédulos. As passagens bíblicas de 1 Pedro 3.15 e Colossenses
4.5-6 subitamente deixaram de se aplicar? Meus críticos são exceções
infalíveis também? E quanto às palavras “depravação” e “adultério”? São
palavras cheias de “graça” e “sal”? E quanto a dizer a uma pessoa que aborto
é “assassinato”? Você pensa que estas palavras não são ofensivas aos
incrédulos? Você pensa que eles preferem ser chamados de “assassinos” ao
invés de “idiotas”?
Chegamos aqui à verdadeira questão ― alguns cristãos discordam do
meu uso de injúrias principalmente porque essas injúrias os ofendem, não
porque sejam antibíblicas (mostrei que são bíblicas) e nem mesmo porque
ofendem os incrédulos (todos os ensinamentos bíblicos ofendem os
incrédulos de uma forma ou de outra). E estes cristãos se ofendem porque
suas mentes não foram ensinadas e renovadas nesta área, de forma que seus
padrões são ainda muito parecidos com os dos incrédulos; por isso, ficam
ofendidos pelas mesmas coisas que ofendem os incrédulos. Outra
possibilidade é que pelo menos alguns destes críticos ainda não se
converteram, e como sua prioridade ainda é a dignidade do homem e não a
glória de Deus, eles evidentemente se ofendem.
Uma vez tendo imposto sobre a Bíblia suas próprias definições dessas
palavras, esses críticos criaram para si inúmeros problemas e contradições
teológicas, e já mencionamos suas calúnias e blasfêmias. Por outro lado,
tenho por Deus reverência suficiente para deixar que a Escritura forneça sua
própria interpretação; portanto, afirmo que usar essas palavras bíblicas
(idiotas, fezes, pecadores, adúlteros, assassinos etc.) nos contextos similares
aos da Escritura está de completo acordo com 1 Pedro 3.15, Colossenses 4.5-
6, e com todas as demais passagens relacionadas.
De acordo com a Escritura, os incrédulos não são nada mais que
matéria fecal espiritual e intelectual. De outro modo, por que afinal você acha
que eles precisam se converter? Por que você acha que eles são impotentes à
parte da graça soberana de Deus?

CONCLUSÃO

Estamos autorizados, e algumas vezes até mesmos obrigados, debaixo


das condições sancionadas pela Bíblia, a usar de injúrias bíblicas contra
incrédulos e heréticos. Não os chamamos de “idiotas” ou “fezes” por causa
de rancores pessoais, mas para proclamar o que a Escritura diz a seu respeito
e mostrar que eles não são as pessoas racionais e decentes que imaginam ser.
Um idiota com qualquer outro nome continua sendo um idiota, e de
fato não há razão para usarmos outras palavras e expressões a não ser o
desejo de ocultar nosso verdadeiro propósito e atenuar o caráter ofensivo da
mensagem bíblica. Mas qual é a motivação perversa para obscurecer
ensinamentos bíblicos? A verdade é que os críticos dessa abordagem são
intérpretes medíocres da Escritura, comprometidos com o mundo e traidores
de Cristo e de sua causa. Estas pessoas afrontam o que Cristo aprovou e
praticou. Não ouso afrontar o meu Senhor, nem desejo fazê-lo, mas
esmagarei seus críticos sempre que necessário.
Meus críticos selecionam passagens bíblicas contendo palavras que eles
pensam concordar com a abordagem apologética que já consideram correta
(isto é, discurso socialmente polido e não ofensivo), arrancam-nas de seus
contextos originais e tentam me solapar com elas. O ensino dos críticos nesta
área encontra-se de fato sobremaneira arraigado no pensamento de muitos
crentes, e exigirá certo esforço deliberado da pessoa para recuperar o modo
bíblico de pensar e falar. Numa época em que tudo que possui relação com o
cristianismo é diluído a ponto de não restar nada, apelo a todos os crentes que
recuperem o uso apropriado das injúrias bíblicas e saibam como integrar essa
abordagem num sistema fiel e eficaz de teologia e apologética bíblica.
Compreendo que a minha posição sobre esse assunto é impopular, mas
é de fato bíblica, e aquilo que é bíblico é amiúde impopular. Embora eu seja
frequentemente criticado sobre essa questão, não me envergonho das
expressões e descrições bíblicas, e me recuso em absoluto a mudar um só
passo na minha posição. O crente tem a obrigação de examinar
cuidadosamente o que aprendeu sobre esse assunto, e reconsiderar os
contextos dos versículos tradicionalmente usados para oposição às injúrias
usadas pelos profetas e apóstolos, pelo Senhor Jesus, pelos reformadores, e
também àquelas que eu faço uso.
Ademais, é importante notar que eu procuro usar palavras e insultos
ásperos somente em contextos similares aos da Escritura. Entretanto, ao
aceitar o padrão não cristão de decoro social e distorcer inúmeras passagens
bíblicas, muitos cristãos chegaram à conclusão de que essa abordagem jamais
deveria ser usada, não importando o contexto; assim, essas pessoas
indiretamente (mas tão certo quanto diretamente) condenam os profetas, os
apóstolos e o próprio Cristo, e nisso acabam condenando a si mesmas.
A verdade é que ao afirmar que uma pessoa é idiota, pelo menos a
poupei momentaneamente do pior insulto de todos, um insulto que representa
tudo o há de mais estúpido, miserável, imundo e vil, que fala de uma pessoa
que não tem esperança de melhorar e qualquer chance de escapar do perpétuo
fogo do inferno, a não ser pela graça soberana de Deus. Refiro-me
evidentemente ao nome “não cristão”. E como já usamos o maior de todos os
insultos, o resto é apenas elogio.
29. Apologética de poder

ESCRITURA DISTORCIDA
Delicadeza anormal, respeito infundado
Em nosso contexto, apologética se refere à defesa intelectual da fé
cristã. Afirmo que ela é intelectual a fim de distingui-la da conquista e
retaliação militar, da manipulação e legislação política, ou de métodos
semelhantes de assegurar concordância ou rendição das pessoas que se nos
opõem. Nosso método é intelectual no sentido de que nossa defesa consiste
de afirmações, explicações e argumentos verbais. Usamos palavras para falar
da fé cristã e mostrar que ela é verdadeira.
Quanto a dizermos que ela é uma “defesa”, discutiremos
posteriormente os possíveis problemas dessa caracterização. Precisamos antes
confrontar um erro sutil, mas impeditivo, que permeia quase todos os ensinos
no âmbito da apologética. O erro é sutil não porque seja difícil detectá-lo; ele
consegue se ocultar com naturalidade porque se tornou tão popular que é
agora aceito como se fosse verdadeiro, mantido até mesmo como um padrão
ético inegociável para os crentes.
Refiro-me à ideia de que ao defendermos a fé, devemos fazê-lo com
“mansidão e respeito” junto aos não cristãos. Como se tratam de palavras
tomadas do apóstolo Pedro, sem dúvida concordo com o seu ensino, mas
apenas quando Pedro é corretamente entendido. O problema é que a maior
parte dos instrutores de apologética deixa de perceber ou reconhecer o
significado pretendido por ele, falhando assim em transmitir seu ensino aos
crentes. E quanto mais eles deixam de ensiná-lo, mais afastam o povo de
Deus da abordagem bíblica para a defesa da fé.
A frase aparece na primeira carta de Pedro, escrita com o propósito de
encorajar e instruir crentes que estão sofrendo perseguição severa por causa
de sua fé. Assim, a frase não se mantém num vácuo. Ela serve ao propósito
da carta, de modo que seu significado é determinado pelo contexto em que
aparece. Observando o propósito mais geral da carta, bem como as passagens
circundantes, podemos inferir o significado pretendido por Pedro.
Quando retornamos à carta com isso em mente, vemos que a “mansidão
e respeito” de fato se encaixam num ensino mais geral de Pedro aos seus
leitores. Seu principal interesse é instruir crentes naquilo que devem pensar e
como devem se portar quando enfrentam perseguição por pessoas revestidas
de autoridade. Ele alude a reis e governadores, e então a mestres, e após isso
a maridos. Em nenhum lugar Pedro alude à defesa da fé em discussões entre
pessoas e seus pares, em debates acadêmicos ou publicações da fé cristã,
como livros e sermões.
Assim, 1 Pedro 3.15 se refere a um interrogatório acerca da fé de
cristãos por parte de pessoas com posições formalmente superiores na
sociedade. Os cristãos devem estar “sempre preparados para dar uma
resposta” (NIV) quando questionados por oficiais do governo, mestres ou
empregadores, maridos e pais, e assim por diante. Isso não significa que o
versículo seja irrelevante para a defesa da fé perante os demais tipos de
pessoas. Mas significa que se subtrairmos o versículo do seu contexto
original para fazer uma aplicação mais ampla, não podemos fazer isso com
uma das partes do versículo e não com a outra.
Em outras palavras, uma vez que aplicamos “sempre preparados” a
outras situações, precisamos também considerar se ainda devemos nos portar
com “mansidão e respeito” ― ou, colocando de uma forma melhor, se
devemos ou não nos portar com mansidão e respeito no mesmo sentido.
Trata-se de uma consideração legítima. Para ilustrar, Jesus não falou com os
fariseus e discípulos da mesma maneira. E ao falar com Agripa, Paulo não
defendeu a fé da mesma maneira que fez ao escrever aos gálatas. Assim
também, seria estranho e antibíblico uma pessoa defender a fé do mesmo
modo ao falar com um juiz e ao falar com seu colega ou filho pequeno. O
conteúdo da fé permanece o mesmo, mas a forma mais apropriada de dirigir-
se a cada pessoa varia.
Pedro mostra que tinha em mente diferentes relacionamentos e também
diferentes categorias de pessoas quando escreveu: “Tratem a todos com o
devido respeito: amem os irmãos, temam a Deus e honrem o rei” (1 Pedro
2.17). Isso não significa que as formas de nos portarmos nesses
relacionamentos sejam mutuamente exclusivas. O ponto é que nesta carta,
Pedro faz essas distinções e fornece instruções específicas para situações
específicas. O amor voltado a Deus é legítimo, e temor voltado ao rei também
é legítimo, embora mesmo aqui as duas palavras já sejam usadas em
diferentes sentidos, e reconhecer mesmo isso já é estabelecer novamente o
ponto.
Quando interrogado por um oficial do governo, o cristão deve exibir
uma mansidão e respeito em honra ao ofício daquele que o questiona. Há
exceções para isso, como quando Elias disse a Acabe “tu és o problema!” ou
quando Jesus referiu-se publicamente a Herodes como “aquela raposa”. Paulo
mais tarde amaldiçoou o sumo sacerdote diante de sua face, embora ao fazer
isso não soubesse que falava ao sumo sacerdote. Quando soube, ressaltou que
não sabia, deixando implícito que poderia talvez não ter declarado a mesma
coisa se soubesse. Mas notadamente, não há registro de que ele tivesse se
retratado da sua maldição. Que existem exceções até mesmo para essa regra
ao nos dirigirmos a figuras de autoridade, reforça a minha afirmação de que é
errada a aplicação universal da admoestação de “mansidão e respeito”. E ela
é amiúde ensinada de um modo que nos levaria a suavizar nosso tom e nossas
palavras em todas as circunstâncias e com todas as pessoas, reduzindo a
apologética a um tipo de demonstração afeminada e repulsiva.
Todavia, Pedro ensina aos crentes o exercício da sabedoria e da
discrição quando eles são confrontados em sua fé por figuras de autoridade.
Aplicar esse princípio em termos mais amplos possíveis sem primeiro atentar
ao contexto específico é exegese defeituosa e um insulto à inspiração divina.
Isso não significa que o cristão deve ser um respeitador de pessoas, temendo
os inquiridores ricos e poderosos, mas zombando daqueles mais simples. A
razão para essa atitude junto a figuras de autoridade é que segundo o ensino
de Paulo, todas as autoridades procedem de Deus. Ninguém que exerça
autoridade alcança sua posição à parte da providência divina. Deus é a fonte
das próprias noções de autoridade e submissão.
Quando o cristão obedece a autoridade com mansidão e respeito, o faz
ciente de que Deus é a fonte de toda autoridade. Você respeita a posição
concedida à pessoa pela providência, embora despreze a ignorância e a
impiedade da pessoa por ela ser não cristã. Este é o ensino do apóstolo. Mas
até mesmo esse ensino transmite intrepidez ao cristão perante as autoridades.
Quando Pilatos disse a Jesus “Não sabe que eu tenho autoridade para libertá-
lo e para crucificá-lo?”, Jesus respondeu que Pilatos não teria nenhum poder
a não ser aquele que lhe fosse dado do alto. Assim, a atitude usualmente
ensinada tem origem numa má interpretação de 1 Pedro 3.15 e dos versículos
relacionados, assim como num entendimento raso do que a Escritura ensina
sobre fé, humildade e respeito. Como a interpretação popular é falsa e
superficial, ela é inútil e até mesmo prejudicial. Deveríamos lançá-la fora.
Se considerarmos o versículo por um contexto mais amplo, qual seja,
da perspectiva do Novo Testamento ou mesmo de toda a Bíblia, o erro da
interpretação popular se torna ainda mais evidente. Partimos da suposição
que se o versículo é entendido de uma forma que condenaria os profetas e
apóstolos, e mesmo o Senhor Jesus, essa não poderia ser a interpretação
correta. Qualquer pessoa que leia a Bíblia percebe que os profetas, os
apóstolos e o Senhor Jesus amiúde falaram e se portaram de maneiras que
contradizem o entendimento popular de 1 Pedro 3.15. O Senhor Jesus
chamou pessoas de víboras, cães, hipócritas, filhos do inferno e filhos do
diabo, e até mesmo agiu com violência física, virando mesas e usando um
chicote para expulsar mercadores do templo.
Aquelas pessoas que afirmam a versão popular da ética cristã não
dariam espaço ao comportamento do Senhor, e estariam prontas para
condená-lo. E ao condenar o Senhor, condenariam a si mesmas. Como
cristão, aprovo plenamente a ação do Senhor. Não desejo discordar dele, nem
ouso fazê-lo. Mas todos aqueles que afirmam a interpretação popular de 1
Pedro 3.15 não têm, ao mesmo tempo, qualquer direito de aprovar o Senhor.
Essas pessoas devem considerá-lo hipócrita, por onde blasfemam o Senhor e
rejeitam o testemunho que a Escritura dá a seu respeito, e assim renunciam ao
cristianismo e se revelam incrédulas e réprobas.
Ou, se essas pessoas não fazem isso, devem considerá-lo uma exceção
em 1 Pedro 3.15. Elas devem dizer que o versículo não deriva do exemplo de
Jesus, mas se aplica somente aos cristãos. Até isso é insuficiente, porquanto
os profetas e apóstolos também contradizem o entendimento popular de 1
Pedro 3.15, de forma que eles também devem ser considerados exceções.
Algumas pessoas de fato ensinam isso. Greg Bahnsen isenta os profetas, os
apóstolos e o Senhor Jesus de 1 Pedro 3.15 precisamente dessa maneira em
uma de suas palestras, dizendo que eles eram exceções. Ao menos ele
percebeu que o auditório não aderiu à sua interpretação do versículo.
Contudo, essa tentativa de tornar a interpretação falsa de 1 Pedro 3.15
consistente com o restante da Bíblia demonstra que essas pessoas não
entenderam ou nem mesmo consideraram as passagens adjacentes. Repetidas
vezes, Pedro alude em toda a carta ao exemplo do Senhor, e é sobre este
fundamento que ele nos instrui a dar com mansidão e respeito uma razão para
a nossa fé. Logo, o Senhor não poderia ser uma exceção, pois 1 Pedro 3.15
assume o seu exemplo em primeiro lugar. E neste caso os profetas e
apóstolos não poderiam ser exceções, já que todo o povo de Deus deve seguir
o exemplo supremo de Cristo, posto que são todos chamados a se conformar
à imagem do Filho de Deus. A interpretação popular de 1 Pedro 3.15 é
inconsistente com o contexto imediato do versículo e contradiz o restante da
Escritura. Portanto, deve ser falsa.
Como os profetas, os apóstolos e o Senhor Jesus não poderiam ser
exceções, essa interpretação favorece cristãos e não cristãos a condená-los
como hipócritas, pois não há como alguém distorcer os fatos para fazê-los se
encaixar na interpretação popular de 1 Pedro 3.15. Os profetas, os apóstolos e
o Senhor Jesus violaram a falsa interpretação com regularidade e sem
remorso. De fato, pareceram estar completamente alheios a qualquer diretriz
moral que exigisse deles a demonstração de mansidão e respeito no sentido
pretendido pela interpretação popular. Assim, quem são os verdadeiros
tutores da fé? Os profetas, os apóstolos e o Senhor Jesus, ou aquelas pessoas
que pedem para você mostrar brandura e polidez ao conversar com
incrédulos, e ignorar os inúmeros exemplos dos pregadores inspirados que
demonstraram o exato oposto?
Por outro lado, se entendemos que o propósito do versículo é dizer que
devemos mostrar respeito quando somos inquiridos por figuras de autoridade,
o problema desaparece. E dado o contexto do versículo, trata-se do único
significado possível e evidente. Conforme dissemos, existem mesmo assim
exceções aparentes inclusive para esse princípio: ao que parece, certas vezes
os profetas, os apóstolos e o Senhor Jesus não demonstraram qualquer
respeito pelas figuras de autoridade. Ao contrário da interpretação falsa de 1
Pedro 3.15, a legitimidade dessas exceções não é inventada para dar uma
aparência de consistência, mas é reconhecida abertamente na Escritura ― por
exemplo, quando sob interrogatório, Pedro disse que deveria obedecer antes a
Deus que aos homens. Assim, essas exceções não são arbitrárias, mas
claramente definidas e explicadas. Além do mais, essas exceções não ajudam
o ponto de vista oponente, qual seja, a interpretação popular, pois a
ponderação dessas exceções ocorre após se ter estabelecido que 1 Pedro 3.15
alude à demonstração de respeito por quem tem autoridade. As exceções
legítimas aparecem dentro de um contexto limitado com princípios
claramente definidos que explicam quando elas devem ser consideradas.
A verdade é óbvia. Aqueles que, com base em 1 Pedro 3.15, insistem
que devemos sempre fazer apologética com “mansidão e respeito” ― isto é,
com o que eles entendem por mansidão e respeito, que nem sempre condiz
com o significado bíblico ― afirmam simplesmente sua própria opinião
sobre a maneira adequada de se conduzir diálogos religiosos. Essas pessoas
não se importam realmente com o que Pedro diz e tem em vista. Desejam
apenas encontrar palavras na Bíblia que possam fundamentar sua própria
atitude nessa questão, o que equivale a: 1. Você deveria fazer apologética, 2.
Você deveria ser legal quando faz apologética. Essa deturpação barata do
ensino de Pedro subverte seu propósito de encorajar e instruir crentes que
vivem debaixo de perseguição severa. Quem promove esse engano deveria
ser responsabilizado.

CRISTO TRAÍDO
Honestidade infiel, humildade dissimulada
Estivemos tratando até aqui do tipo de falsa humildade concernente à
nossa postura de defesa da fé. É produto de interpretações equivocadas de 1
Pedro 3.15 e outros versículos, de tradições religiosas antibíblicas, da adoção
de padrões não cristãos na comunicação social, e da rendição às exigências
não cristãs de como não cristãos deveriam ser tratados.
Ainda que essa falsa humildade já tenha infligido um extenso prejuízo,
existe outro tipo de falsa humildade que introduz um perigo ainda maior.
Trata-se da falsa humildade que desencoraja a plena convicção da verdade do
evangelho, do conteúdo real de nossa fé. Há pessoas que promovem essa
visão de fé mesmo quando alegam defendê-la. E algumas delas poderiam
inclusive sugerir que é desonesto e arrogante afirmar e apresentar o
evangelho como se tivéssemos total certeza de sua veracidade. Afirmam que
a honestidade e a humildade exigem de nós o reconhecimento de que nossa fé
no Senhor Jesus poderia estar completamente equivocada, isto é, que a
própria fé cristã poderia estar errada.
Com respeito a essa falsa humildade, que tem influência sobre a
convicção da pessoa quando ela afirma e apresenta o conteúdo da fé cristã,
ela pode estar baseada na crença sobre a atitude mais apropriada a se tomar
ou pode ser resultado do julgamento filosófico da pessoa. Como eu pretendo
focar no problema de se tomar a admissão de incerteza como sinônimo de
honestidade e humildade, ao invés do motivo subjacente a esta admissão, o
motivo para a admissão de incerteza é aqui irrelevante. Entretanto, como ela é
importante para a defesa da fé em geral, farei uma breve consideração.
Se a pessoa faz uma admissão de incerteza porque supõe que uma
atitude de humildade necessariamente produz essa forma de agir, já refutei
isso. Mas se a pessoa faz essa admissão porque tal coisa decorre do seu
julgamento filosófico pessoal, isso se torna matéria de argumentação
racional, e a resposta é que ninguém pode produzir um só argumento que
lance dúvida sobre qualquer aspecto da fé cristã. Podemos refutar essa
tentativa sem qualquer dificuldade ou hesitação. Ademais, a defesa bíblica da
fé que apresentei em diversos lugares impede tal tentativa.
Na última página do seu livro Humble Apologetics, John G.
Stackhouse, Jr. escreve: “Nós, cristãos, cremos que Deus nos concedeu o
privilégio de ouvir e receber as boas novas, receber a adoção dentro de sua
família e ingressar na Igreja. Cremos que temos conhecimento de certas
coisas que outras pessoas não sabem, e é bom que elas ouçam essas coisas.
Acima de tudo, cremos que encontramos Jesus Cristo”. Isso está correto, mas
então ele segue: “Quanto a tudo o que nós sabemos, poderíamos estar errados
em alguma coisa ou mesmo em tudo. E admitimos honestamente essa
possibilidade. Assim, o que quer que façamos ou dissermos, seja feito com
1
humildade”.
Ele apresenta algumas das afirmações centrais da fé cristã e alega
afirmá-las como verdadeiras. Assim, quando escreve que “poderíamos estar
errados em alguma coisa ou mesmo em tudo”, ele necessariamente
subentende que a própria Escritura poderia estar errada em alguma coisa ou
mesmo em tudo, que toda a fé cristã poderia estar errada. Entretanto, como a
própria Bíblia não admite que ela “poderia estar errada em alguma coisa ou
mesmo em tudo”, Stackhouse não está mais defendendo a Bíblia quando
escreve que ele “poderia estar errado em alguma coisa ou mesmo em tudo”.
Ele poderia enfatizar sua própria falibilidade, que ele mesmo poderia
estar errado na crença de que a Bíblia é a revelação de Deus, mas isso faz
pouca diferença, pois voltamos ao ponto que se é isso o que pretende dizer,
ele não está mais defendendo a Bíblia. Stackhouse afirma que poderia estar
errado ao dizer que a Bíblia está correta, o que é o mesmo que dizer que a
Bíblia poderia estar errada. Porque ele afirma que poderia estar errado ao
dizer que a Bíblia é verdadeira, tal que no fim das contas a Bíblia poderia ser
falsa, ele não está mais fazendo apologética bíblica.
A Bíblia diz que quando afirmamos as coisas por ela ensinadas,
podemos saber com certeza que as coisas nas quais cremos são verdadeiras
(Lucas 1.3-4; João 17.6-8; Hebreus 11.1, 6). A apologética cristã é
importante para defendermos o ensino da fé cristã; como a fé cristã não
declara que poderia estar errada, ao Stackhouse dizer que ela poderia estar
errada, ele não está mais defendendo a fé cristã; mais do que isso, a está
atacando.
Se a própria Bíblia reivindica ser a revelação de Deus, e assim
completamente verdadeira, por qual padrão de humildade Stackhouse chama
sua abordagem de “humilde”? Visto que a Bíblia é o padrão último de ética,
ela também define humildade; assim, quando Stackhouse infere que a própria
Bíblia poderia estar errada, ele não está sendo humilde, mas arrogante ―
arrogante a ponto de dizer que poderia estar errado ao afirmar o que é
revelado por Deus. De acordo com o padrão bíblico, não é humilde a pessoa
dizer que poderia estar errada ao afirmar o que a Bíblia afirma; ao contrário, é
arrogância dizer que a Bíblia poderia estar errada.
Para Stackhouse, a pessoa se declarar cristã e então dizer que sua
própria religião poderia estar errada equivale a dizer que o cristianismo
poderia estar errado; assim, ao invés de fazer apologética ― humilde ou não
― Stackhouse está de fato atacando o cristianismo. Se a Bíblia é a palavra de
Deus, dizer que poderíamos estar errados sobre ela ser a palavra de Deus não
é humildade, mas blasfêmia. Se Stackhouse admite que ele próprio não tem
certeza, podemos talvez ainda aceitá-lo como um irmão mais fraco; mas
quando ele diz que não deveríamos nem mesmo alegar certeza, chegando até
mesmo a dizer que a pessoa que alega tal coisa é desonesta e arrogante, ele
faz de si mesmo um inimigo de Cristo.
Ao invés de dizer que devemos “admitir… essa possibilidade” de que
poderíamos estar errados, devemos insistir na impossibilidade de estarmos
errados ao afirmar o que a Bíblia ensina. É impossível estarmos errados
quando afirmamos o que a Bíblia afirma. Se Stackhouse é tão “humilde”,
deve também confessar que poderia estar errado ao dizer que poderia estar
errado sobre o cristianismo, pois como ele pode estar tão certo de que existe
“essa possibilidade” dos cristãos estarem errados quando afirmam a Bíblia?
Ele é falível ao afirmar a Bíblia, mas infalível quanto a “essa possibilidade”?
A arrogância de um homem é demonstrada por sua teologia modesta. A
confiança arrogante que o homem deposita em sua fé é diretamente
proporcional à confiança em si mesmo, na avaliação de sua própria
inteligência e competência. Porque essa autoconfiança, ainda que
irrealistamente grande, não é absoluta e infinita, a “fé” dessa pessoa será
igualmente limitada. Seu apelo à humildade é de fato um apelo para
subtrairmos a revelação infalível de Deus como base da fé e substituí-la pela
arrogância do homem como o único fundamento da confiança em sua
religião. A base para a sua apologética é a autolatria. A abordagem de
Stackhouse para a apologética não coloca em primeiro plano o poder e a
sabedoria de Deus, mas seu intelecto inferior e sua crise pessoal de fé.
Sua posição é antibíblica, irracional e blasfema; portanto, devemos
rejeitar essa falsa humildade e erudição em favor de uma abordagem para a
apologética que seja bíblica, pela qual se fale: “Estamos corretos, e estamos
certos de que estamos corretos. Vocês estão errados, e estamos certos de que
vocês estão errados”. Se essa posição bíblica incorrer na reprovação do
mundo, que seja ― que os incrédulos tentem nos derrotar na argumentação.
Ele diz: “Quanto a tudo o que nós sabemos, poderíamos estar errados
em alguma coisa ou mesmo em tudo”. Quanto a tudo o que nós sabemos?
Quem lhe deu o direito de falar por nós? Ele deveria falar por si mesmo. A
menos que ele possa me derrotar na argumentação, provando ser possível que
a fé cristã esteja errada, ele não pode falar por mim. Quanto a tudo o que sei,
é impossível que eu pudesse estar errado em alguma coisa ou mesmo em
tudo. E Stackhouse deveria admitir honestamente a possibilidade de eu estar
certo, e que é impossível que a fé cristã esteja errada.
Então, note que ele faz da possibilidade de erro a base da humildade:
“poderíamos estar errados… Assim, o que quer que façamos ou dissermos,
seja feito com humildade”. Isso nos leva a perguntar por que Jesus foi tão
humilde. Em todo o caso, essa não é a base bíblica da humildade. A Bíblia
não diz que devemos ser humildes porque a própria Bíblia poderia estar
errada. De fato, se a própria Bíblia pudesse estar errada, ela não poderia ser
uma autoridade infalível pela qual a humildade é ordenada, pois o próprio
mandamento poderia estar errado, e talvez a arrogância, ao invés da
humildade, é que fosse a virtude a ser buscada.
Como Stackhouse assume a falibilidade humana e não o mandamento
divino como a base da humildade, essa humildade é independente de sua
suposta crença na fé cristã. Em outras palavras, ele pode ser humilde no
sentido pretendido, sendo ou não cristão. Portanto, ele se refere a uma
humildade não cristã. Mas se essa humildade não se fundamenta no
mandamento divino, que diferença faz se sou humilde ou arrogante, mesmo
debaixo desta definição não cristã? Cristo me julgaria por eu não mostrar
humildade não cristã? Cristo me repreenderia, dizendo “Não seja tão
convencido ao enaltecer meu nome perante os pagãos”? O quê? Você é
louco? E se Cristo é falso, ninguém poderia me censurar por não mostrar
algum tipo ou grau de humildade. De qualquer forma, a versão de humildade
de Stackhouse é uma completa tolice.
Deus não nos envia para proclamar uma mera possibilidade, a qual as
pessoas devem então considerar ou investigar; ele ordena que todos os
homens de todos os lugares se arrependam. Esse chamado ao arrependimento
tem autoridade e importância porque a fé cristã é verdadeira no seu todo.
Deus não nos envia para dizer às pessoas que poderíamos estar errados, mas
ao contrário, que estamos corretos, que estamos certos de estarmos corretos, e
que estamos certos de que somos os únicos que estão corretos. Se você deseja
pregar sua própria opinião antibíblica, sinta-se livre para ser “humilde” nisso
e sinta-se livre para dizer que você poderia estar errado. Mas quando você
proclama e defende a mensagem de Cristo, não é sua opção ser modesto nesta
questão.
Um embaixador que representa seu rei quando discursa em outra nação,
age com autoridade plena e nos limites prescritos pelo rei. Isto é, ele fala pelo
rei dentro de certos contextos e situações. Não é sua opção duvidar do rei, ou
criticar ou incitar oposição a ele. Agir assim seria equivalente à traição, e
dependendo da política do seu país natal, o embaixador poderia ser destituído
da função, preso ou até mesmo executado. O monarca estaria nas suas
prerrogativas ao levar esse traidor às ruas para ser amaldiçoado e cuspido
pelo seu povo, e então decapitado em praça pública.
O reino de Deus não é menos reino que qualquer reino terreno, e Jesus
Cristo não é menos rei que qualquer rei terreno. É traição ao reino, ao rei e a
todo o seu povo Stackhouse defender uma política de apologética que
introduz incerteza e falibilidade na fé cristã. E Stackhouse promover essa
política sendo professor cristão e figura pública deixa as coisas ainda piores.
Por essa razão, ele deveria ser removido de todas as funções em qualquer
seminário, igreja ou organização cristã, e sujeito à disciplina eclesiástica
oficial, que lhe faria uma repreensão; caso ele não se arrependesse, nem
fizesse uma retratação pública, deveria ser excomungado.
A fim de não parecer que Stackhouse seja aqui usado como alvo
especial, quero dizer que qualquer cristão que advoga esse tipo de abordagem
para a apologética deveria ser tratado da mesma forma. De fato, essa culpa se
estende a qualquer crente e organização que não afirme e implemente essa
política dura contra traidores espirituais. Essas pessoas se importam mais
com o conforto e a amizade dos homens do que com a honra de Cristo. Se
você é uma dessas pessoas, arrependa-se! Busque refúgio em Cristo, a sua
misericórdia, pois ele disse que seria melhor você amarrar uma grande pedra
no pescoço e pular no mar a fazer um dos seus pequeninos tropeçarem. Seria
melhor você se matar ao invés de minar a confiança de um crente na fé cristã.
Jesus disse isso, e me alegro em repeti-lo. Eu condeno, em nome do Senhor
Jesus, a “apologética humilde” de Stackhouse, bem como todas as suas
variações, não importa quem as defenda, até onde elas propuserem que
devemos admitir a possibilidade de estarmos errados ao confessar a verdade
da fé cristã. Exijo que você faça o mesmo.
Se você confessa ter dúvidas sobre a fé cristã, isso é um problema seu.
É um problema de ignorância, irracionalidade, deficiência em sua retidão e
inteligência. Você precisa de oração, estudo, aconselhamento e graça divina
para a sua alma. Transformar essa fé defeituosa numa abordagem para a
apologética e então consagrar e chamar isso de humildade requer um tipo
especial de hipocrisia. Você introduz dúvida no povo de Deus e insinua
rebelião nos corações dessas pessoas. Você é um lobo em pele de cordeiro,
solapando a confiança do fiel, ao mesmo tempo desculpando os filhos do
inferno. Envergonhe-se. Possa sua humildade queimar no inferno, pois ela
procede da limitação e arrogância do homem, não da revelação de Deus.
Pessoas que se dizem cristãs têm lançado críticas sobre mim por eu
afirmar que sou invencível na defesa da fé. E isso apesar de eu sempre
esclarecer que isso resulta do fato de derivar meus argumentos da revelação
divina ― e a revelação é invencível, assim como Deus é invencível.
Repetidas vezes insisto que qualquer cristão que da mesma forma
permanecesse sobre a revelação também seria invencível na argumentação,
porque até mesmo a loucura de Deus é maior que a sabedoria dos homens.
Essa explicação é ignorada pelos meus críticos, pois eles sempre permanecem
sobre seus próprios méritos, e sua confiança é tão ampla quanto a estima das
suas próprias capacidades. Para eles, o ‘eu’ constitui a referência última do
que é ou não verdadeiro, possível e grande.
Ao afirmar que sou invencível, estou dizendo algo sobre Deus, não
sobre mim. Embora devesse ser essa a postura de todo crente, para algumas
pessoas é inconcebível que alguém pense dessa maneira porque
provavelmente essas mesmas pessoas são, em seus pensamentos, totalmente
centradas em si mesmas e na sua justiça pessoal. Esse é o fundamento de sua
confiança, e como elas são limitadas, pensam que o reconhecimento dessa
limitação constitui a essência da humildade. Todas as coisas são medidas
com base nos próprios méritos e capacidades dessas pessoas. Assim, quando
alguém afirma ser invencível, embora claramente atribuindo isso a Cristo,
elas não podem evitar a conclusão de que essa pessoa afirma ser invencível
em si e por si mesma. Porque elas não pensam da forma que os cristãos
deveriam pensar, negam que qualquer outra pessoa assim o faça. A Bíblia
ensina que aquele que se gloria deve se gloriar no Senhor, mas segundo essas
pessoas, se um homem se gloria deve se gloriar em si mesmo, ou não se
gloriar de forma alguma.
A verdadeira humildade reconhece que sem Cristo nós não somos
apenas limitados; somos nada e não podemos fazer nada, e que por isso não
deveríamos depositar qualquer confiança em nós mesmos. Antes, voltamo-
nos a Cristo a fim dele nos conceder sabedoria e poder, tal que a nossa
medida de fé nas capacidades de Cristo e na apreciação de sua grandeza
tornam-se a medida da nossa confiança. Essa é a base da minha declaração,
qual seja, não posso ser derrotado por não cristãos e sou invencível na
vindicação da fé cristã. Precisamos aceitar a realidade que, ao afirmar a fé
cristã, afirmamos algo que é verdadeiro, certo, belo e glorioso, e invencível
na argumentação.

A RESPOSTA PRONTA
Defenda, ataque e reafirme
A palavra “apologética” deriva do grego apologia, palavra amiúde
traduzida como “resposta” ou “defesa”. Refere-se a uma resposta ou defesa
intelectual, e por isso, a pessoa oferece uma resposta ou defesa usando
palavras, submetendo evidências e fornecendo argumentos. O exemplo
clássico para isso é o tribunal, onde o acusado, ou réu, deve apresentar uma
“resposta” como réplica às acusações que lhe são feitas. A Bíblia nos ordena
a responder ao mundo, e isso sugere uma dimensão intelectual na fé cristã.
Cristianismo envolve aprendizado, pensamento, crença, conhecimento,
discurso e escrita. Há fatos, afirmações e proposições que devemos
compreender e aplicar. Essa é uma característica determinante da apologética
bíblica.
Até aqui, tudo isso é correto; contudo, a noção de apologética como
resposta ou defesa pode ser mal entendida. Mais exatamente, as pessoas que
são descuidadas acerca do que seria uma resposta ou defesa poderiam
entender incorretamente aquilo que os cristãos são pela Bíblia ordenados a
fazer. Esse mal entendido converteu a prática da apologética numa disciplina
passiva e defensiva impulsionada por reações aos ataques dos incrédulos.
Alguns cristãos parecem pensar que devemos nos colocar à disposição
dos incrédulos, sempre prontos a reagir quando eles expressam sua
curiosidade ou animosidade, e fazê-lo com uma sujeição à maneira peculiar
conforme cada indagação se apresenta. O resultado é que os incrédulos
exercem um controle desmedido sobre as agendas e atividades, até mesmo
sobre a forma e o conteúdo da apologética, dos cristãos que pensam dessa
maneira.
Essa falsa visão considera a apologética uma disciplina principalmente
defensiva, que sempre reage à agressão intelectual não cristã. Neste caso, dar
uma “resposta” aos incrédulos significaria neutralizar objeções e corrigir mal
entendidos, mas ela não incluiria um assalto impiedoso e implacável às
crenças não cristãs. Isto é, essa visão de apologética assume a “resposta”
como algo primariamente defensivo, não ofensivo, e primariamente como
uma réplica, não algo que iniciamos. Sua interpretação falsa da instrução de
Pedro, de respondermos com mansidão e respeito, reforça para eles essa
postura.
É claro, existem aqueles que mantêm essa ideia de apologética por
razões diferentes da interpretação falsa de 1 Pedro 3.15; mas a interpretação
equivocada do versículo tem sido realmente um fator contribuinte para a falsa
humildade que tem trazido tão grande debilidade ao empreendimento
apologético da igreja. Ademais, mesmo àqueles que chegaram ao ponto de
sustentar essa visão passiva e defensiva da apologética por razões outras, um
entendimento correto de 1 Pedro 3.15 e do que significa dar uma “resposta”
aos incrédulos deve ser suficiente como corretivo bíblico.
Não há nada na ideia de uma “resposta” que exige sermos apenas
defensivos, ou mesmo primariamente defensivos. A natureza da resposta
depende do conteúdo daquilo que estamos respondendo e do que acreditamos
ser a razão para a resposta. Quando um não cristão exige saber a razão para
eu estar justificado em afirmar a fé cristã e por que é racional eu ser crente,
parte da minha resposta é que há algo de errado com ele, isto é, com o
incrédulo que faz a pergunta. Parte da minha resposta é que qualquer pessoa
que seja não cristã é imoral e irracional. Porque não desejo ser como essa
pessoa, e porque entendo que todos os tesouros da sabedoria e do
conhecimento estão em Cristo, estou justificado em afirmar a fé cristã. Parte
da minha resposta é que Deus lançará o incrédulo num lago de fogo. Porque
não desejo sofrer um destino parecido com o do incrédulo, e porque entendo
que Cristo foi feito pecado embora não tivesse pecado, de modo que nele
posso ser justo perante Deus, busco nele a salvação ― para o livramento da
ira divina e para a esperança de uma vida e glória eternas.
Esse é um aspecto integral e necessário da minha resposta, minha
defesa. É nisso que creio, e logo, é isso o que eu lhe respondo. Como está
escrito, “eu cri, por isso falei”. Também cremos, e por isso falamos. Assim,
até mesmo uma defesa não precisa ser apenas defensiva. O fato de Pedro nos
conclamar a fornecer uma resposta ou defesa é a base bíblica para
agregarmos um elemento ofensivo e agressivo à nossa apologética. Devemos
atacar as pessoas às quais respondemos. Poderíamos também chamar a
prática da apologética de vindicação da fé cristã. A palavra dá espaço tanto
ao aspecto defensivo como ofensivo da nossa batalha com os não cristãos.
Todavia, as palavras “resposta” e “defesa” são precisas, se entendidas todas
as suas implicações.
Considere novamente o exemplo do tribunal. É comum a defesa atacar
a acusação ao argumentar pela inocência do acusado. Isso não é feito
necessariamente por diversão, porquanto a força do processo de acusação é
de fato relevante para o ônus trazido sobre a defesa e o sucesso da defesa.
Assim, a defesa tentaria desmantelar o processo de acusação desacreditando
as testemunhas, oferecendo explicações alternativas para as evidências,
refutando o raciocínio e as inferências da acusação, revelando a
inconsistência dos seus argumentos e testemunhos, e até mesmo fazendo as
atenções se voltarem a questões mais amplas, como a confiabilidade da
memória e da sensação.
Todas essas táticas agressivas pertencem de forma legítima ao arsenal
da defesa legal ou de qualquer defesa racional de uma posição. De fato, a
defesa seria tola e mesmo antiética se deixasse de atacar as vulnerabilidades
no processo de acusação. E se o processo de acusação se fundasse
principalmente em conjecturas, inferências falsas, testemunhos inconsistentes
e acusações arbitrárias, é concebível que grande parte dos argumentos de
defesa fosse de teor agressivo.
O exemplo mostra que estar na defesa não necessariamente significa
estar sempre na defensiva. Mas pretendo mostrar adiante que a posição de
acusado não espelha plenamente a condição do cristão, e que existe uma
justificativa até maior, mesmo uma obrigação, para assumirmos uma postura
agressiva na apologética. Lembre-se que 1 Pedro 3.15 se refere
primariamente à postura do cristão debaixo de interrogatório oficial, e que
não é o único versículo da Bíblia que se refere à apologética.
Os exemplos bíblicos que reforçam o ponto são abundantes. Tendo eu
apontado alguns deles, você deveria ser capaz de notar muitos outros.
O primeiro exemplo vem de Lucas 11, do ministério de Jesus. Ele era
um tsunami ambulante de poder divino, uma avalanche de sinais e
maravilhas. Os evangelhos registram apenas uma pequena percentagem dos
milagres que Jesus realizou. João escreveu que se todas as suas obras
(incluindo os milagres) fossem registradas, talvez o mundo não fosse
suficiente para conter todos os livros produzidos. Mesmo se considerarmos
isso uma hipérbole, e mesmo se levarmos em conta os rolos e pergaminhos
bem maiores e inconvenientes que eram usados naquele tempo, não seria
imaginação exagerada supor que Jesus realizou milhares de milagres, até
mesmo dezenas de milhares, se não mais. Isso é mais do que plausível. Em
alguns casos ele haveria de curar multidões inteiras com uma palavra de
comando, e algumas vezes passaria toda a noite impondo as mãos sobre os
enfermos. Assim, apenas seus milagres de cura já contariam na casa dos
milhares. Seria impossível o número ser menor.
Seus adversários tinham inveja, pois ele estava atraindo muitos
seguidores e libertando essas pessoas das falsas tradições e autoridades. Mas
a própria quantidade e magnitude dos seus milagres tornavam seu poder
inegável. Portanto, como faziam muitas vezes os religiosos réprobos, eles
lançaram mão da calúnia, dizendo que Jesus expulsava demônios pelo poder
de Satanás, o diabo. Ninguém poderia acusá-lo de erro em sua doutrina ou
comportamento, e por isso a acusação de Jesus exercer poder demoníaco era
infundada. Todavia, essa é a natureza da calúnia; ela é irracional e
injustificada.
Demonologia não é o assunto principal aqui. Estamos interessados na
resposta de Jesus, a sua defesa a essa acusação.
Primeiro, ele expôs a falácia presente na acusação, mostrando que era
irracional. Ele disse que o reino de Satanás não pode ser dividido contra si
mesmo e ainda permanecer de pé (v. 17-18). Em si mesmo, tratou-se de um
ataque indireto aos críticos, já que objeções não surgem do nada ― elas são
formuladas por pessoas. Pessoas irracionais fazem declarações irracionais.
Pessoas não inteligentes fazem críticas não inteligentes. Assim, a forma com
que Jesus neutralizou a acusação fez seus críticos parecerem ignorantes e
tolos. Neste caso, ou eles eram ignorantes da operação do reino de Satanás ou
falharam em fazer inferências válidas a partir do que sabiam. Se ele tivesse
pressionado sobre este ponto, a manobra que neutralizou a objeção teria sido
também um ataque direto.
De fato, Jesus fez a seguir um ataque direto aos seus críticos. Se ele
expulsava demônios pelo poder do diabo, “por quem os expulsam os filhos de
vocês? Por isso, eles mesmos estarão como juízes sobre vocês” (v. 19).
Embora a teologia seja importante, ela não é o nosso foco principal agora, e
por isso devemos concentrar-nos na tática retórica e racional usada por Jesus.
Após ter neutralizado sua acusação com uma aplicação apropriada da
demonologia bíblica, Jesus devolveu o ônus do argumento aos críticos e
desafiou suas práticas. Inclusive colocou fogo no campo deles, expondo o
conflito que surgiria entre eles se lhes fosse permitido manter a acusação. Ele
partiu para a ofensiva.
Por último, ofereceu uma resposta positiva e disse: “Mas se é pelo dedo
de Deus que eu expulso demônios, então chegou a vocês o Reino de Deus”
(v. 20). Ele afirmou que poderia expulsar demônios, mas não pelo poder do
diabo. Ao contrário, era pelo dedo de Deus, ou Espírito de Deus. E então
usou este último ponto para levar adiante sua mensagem, que “chegou a
vocês o Reino de Deus”. Jesus usou a oportunidade para reafirmar sua missão
e pregar o evangelho. “Ora, se eu expulso demônios pelo poder de Deus”,
disse ele de fato, “então o reino de Deus está aqui. O governo de Deus
chegou. O tempo de Deus chegou. O Filho de Deus chegou! O que você fará
a respeito disso? Continuará inventando críticas irracionais e acusações
infundadas, ou se arrependerá dos seus pecados, regozijando-se pela vinda do
reino até você, entrando nele com fé e ação de graças?”
A resposta de Jesus consistiu, portanto, de uma análise da acusação e
sua neutralização no processo; de um ataque destrutivo dos seus oponentes,
fazendo o ônus da prova se voltar contra eles; e de uma declaração
construtiva sobre a verdade acerca da sua pessoa e mensagem, pela qual ele
reafirma sua missão e promove sua própria agenda. A vindicação da fé seria
muito mais fiel e efetiva se seguíssemos essa abordagem. Devemos fazer
mais do que uma declaração construtiva. Devemos fazer mais do que
neutralizar a objeção. Devemos também perseguir os hereges e atacar os
incrédulos.
Em Atos 2 os discípulos foram preenchidos do Espírito Santo, e tão
logo o Espírito os capacitava, eles falavam em línguas que jamais tinham
aprendido, declarando as maravilhas de Deus. Os judeus ficaram confusos, e
alguns disseram que esses cristãos se embebedaram com vinho. Nesse ponto,
Pedro se levantou para falar.
Ele primeiro enfraqueceu a acusação dizendo que se tratava de algo
improvável (v. 15). Então ofereceu uma declaração construtiva (v. 16-36).
Ela incluía uma explicação alternativa para a ocorrência, isto é, que se tratava
do cumprimento de uma profecia (v. 16-21). Isso se transformou, por sua vez,
numa proclamação do evangelho, da pessoa e da obra de Cristo, que foi
sustentada por argumentos de profecia, história e testemunho.
Estava integrado nessa declaração construtiva um ataque contra os
críticos, os judeus. Pedro disse que eles assassinaram Jesus com a ajuda dos
romanos. Assim, os judeus chamaram os discípulos de bêbados, mas ele os
chamou de assassinos. Eles não perguntaram isso a Pedro, ele é que trouxe
isso à luz. Mas ao contrário da acusação dos críticos junto aos cristãos, a
acusação de Pedro contra eles baseava-se na verdade, não na calúnia, no mal
entendido ou na deturpação. E os judeus que se arrependeram, reconheceram
isso e foram compungidos no coração.
Assim, aqueles mesmos três elementos presentes na defesa de Jesus
também estavam presentes na resposta de Pedro.
Então em Atos 7, Estêvão foi trazido perante o Sinédrio na acusação de
ter falado contra o templo e a lei. O sumo sacerdote inquiriu-lhe da
veracidade dessas acusações, e Estêvão apresentou então sua resposta, sua
defesa. Leia. Você notará os mesmos três elementos em sua réplica.
Poderíamos chamar sua resposta de análise redentivo-histórica. Ele
começou com o chamado de Deus junto a Abraão, e então Isaque, Jacó, e
após então, José. Mas deu mais atenção a Moisés. E é nesta seção sobre
Moisés que ele neutralizou a acusação trazida contra ele. E mencionou
também Josué, Davi e Salomão.
A conclusão inclui uma declaração construtiva sobre “o Justo”
vaticinado pelos profetas. Essa seção final também inclui um ataque contra
seus acusadores. Embora seu registro completo tenha ilustrado a rebelião e
dureza de coração do povo judeu, ele deixou o tema explícito no final:
“Vocês sempre resistem ao Espírito Santo!”. Eles alegavam honrar os
profetas, mas eram aqueles que os perseguiram. Eles alegavam honrar a lei,
mas a desobedeceram. E Estêvão disse que eles tinham agora inclusive
assassinado Jesus Cristo, seu próprio Messias. Estêvão era o acusado, mas
terminou fazendo contra seus acusadores um ataque que era mais forte do que
o ataque que lhe fizeram. Eles o acusaram de sacrilégio, mas ele os acusou
com gerações de sacrilégios e assassinatos.
O discurso de Paulo diante do Areópago em Atos 17 é amiúde
representado de forma inapropriada. Alguns comentaristas dizem que Paulo
adulou os gregos e apelou a crenças comuns para lhes introduzir a fé cristã. Já
escrevi uma exposição extensa mostrando que Paulo fez exatamente o
2
contrário, e por isso não investigaremos os detalhes aqui, mas focaremos os
três elementos de uma resposta cristã.
Como um todo, o discurso foi naturalmente uma declaração
construtiva. Em estrutura e conteúdo, essa declaração é similar a um curso de
teologia sistemática, em que começamos com a Escritura para falar de Deus,
da criação, da providência, do homem e do pecado, e então de Cristo, da
redenção e do julgamento. A afirmação popular que Paulo não era teólogo
sistemático é negada por relatos bíblicos explícitos. Paulo não apenas era
teólogo sistemático, como também o conteúdo que debateu e a forma como
discutiu com eles eram quase idênticos a muitos dos nossos livros-textos de
teologia sistemática.
Embora a maior parte dos teólogos sistemáticos não derive seus
esquemas de Paulo, eles terminam por seguir aproximadamente a mesma
ordem, discutindo os mesmos assuntos. Isso porque a teologia sistemática
segue a ordem lógica e observa as relações lógicas entre as doutrinas
consideradas, e assim, aqueles que podem pensar logicamente devem chegar
aproximadamente ao mesmo resultado. Tal como se dá conosco, Paulo
apresentou eventualmente sua teologia num arranjo diferente, mas os
assuntos discutidos permaneceram os mesmos, apenas que seu propósito
3
tornara necessário arranjar seu material de formas distintas.
Embora o discurso fosse um tipo de resposta sobre a fé cristã, a
situação era diferente, já que Paulo não foi confrontado pelo mesmo tipo de
acusações hostis que encontramos em nossos outros exemplos, e porque os
gregos estavam curiosos sobre o que ele tinha a dizer. Entretanto, ainda
podemos achar o elemento de neutralizar uma objeção. Isto é, os gregos
suspeitaram que Paulo fosse introduzir-lhes uma “filosofia ruim”, e a resposta
de Paulo mostrou que sua filosofia era uma cosmovisão ampla, coerente e
superior, neutralizando assim a acusação inicial dos gregos.
E Paulo atacou os gregos já no início do seu discurso. Tomou o altar
“ao deus desconhecido” como um sinal de reconhecimento da ignorância dos
gregos. Assim, Paulo os questionou desde o começo e reivindicou falar de
uma posição superior. Mais tarde no discurso, Paulo atacou sua idolatria
apontando que o ser divino não poderia ser representado por ouro, prata ou
pedra. Eram os gregos que praticavam má filosofia. Ele os chamou de
ignorantes e disse que Deus ordena agora que todas as pessoas de todos os
lugares se arrependam.
Assim, a resposta do cristão aos incrédulos inclui três elementos.
Primeiro, devemos neutralizar as objeções. Segundo, devemos fazer uma
declaração construtiva que explique nossas crenças e forneça suporte racional
para elas. Trata-se de reiterar e reafirmar a fé cristã, e promover nossa própria
agenda, de modo que as objeções não possam afastar nosso foco na missão.
Terceiro, devemos atacar impetuosamente os não cristãos ― suas crenças,
sua inteligência e seu caráter. Devemos trazer à luz tudo o que há de errado
sobre eles.
Os profetas, os apóstolos e o Senhor Jesus usaram todos esses métodos.
Um método de apologética que não ataca os incrédulos não é apenas
incompleto, mas por ser incompleto, é também irresponsável, e por ser
irresponsável, é também pecaminoso. É pecado não atacar os incrédulos com
todos os nossos poderes e recursos. Certos cristãos atacariam crentes que
seguem esse método antes de atacar não cristãos. Isso é traição contra o reino
dos céus.

A ESPADA DO ESPÍRITO
Razão, retórica e poder
A Bíblia diz que temos a espada do Espírito, que é a palavra de Deus.
Essa metáfora é relevante porque se aplica ao conflito espiritual, conflito que
ocorre quando uma batalha de ideias é travada entre cristãos e não cristãos.
Se nossa abordagem à apologética invoca a palavra de Deus, ao sermos
desafiados pelos incrédulos nossa resposta envolve então cravar essa arma
diretamente em seus corações. Trata-se de uma guerra, e o dever que você
tem é claro. Ao enfrentar um oponente não cristão, você deve feri-lo. Você
deve atacar seu orgulho. Deve danificar sua confiança. Deve destruir a base
de sua crença e confiança. Você deve então declarar sua derrota e mostrar ao
mundo que o colocou debaixo dos seus pés em nome de Cristo.
Se adotarmos essa abordagem bíblica na apologética ao confrontar os
incrédulos ou sermos por eles confrontados, eles nunca mais serão os
mesmos. O evangelho decreta sua derrota, morte e eterna condenação. Se eles
recusarem o arrependimento, suas trevas serão ainda maiores, seus corações
tornar-se-ão ainda mais endurecidos. Serão ainda mais privados de sua
sanidade e humanidade. Tornar-se-ão ainda mais estúpidos, ainda mais
perversos. Morrem em suas mortes. Quanto às pessoas a quem Deus escolheu
e capacitou crer, estas serão levantadas dentre os mortos e despertadas para a
justiça. Qualquer que seja o caso, uma vez que a palavra de Deus tenha
penetrado, elas nunca mais serão as mesmas.
Espada implica sangue, violência, ofensa e conquista. Incorremos em
nossa própria condenação se confessarmos que a palavra de Deus é a espada
do Espírito, mas ao mesmo tempo falharmos em dar o lugar devido à
natureza ofensiva da nossa obra. Dizemos crer na Grande Comissão, mas
enquanto a pregação do evangelho propagar ideias que contradizem aquilo
em que creem os não cristãos, o aspecto ofensivo da nossa obra terá primazia
sobre qualquer postura defensiva. Se nos mantivermos silentes sobre aquilo
em que cremos, ou mantivermos nossa espada na bainha, muito embora a
natureza ativa da espada proteste qualquer supressão, não haverá nada para os
incrédulos desafiarem. O fato de nos exigirem uma resposta ou defesa
pressupõe que nós, ou soldados mais fiéis que nós, já assumimos a ofensiva.
A espada do Espírito é embainhada na verdade, que a Bíblia compara a
um cinto que mantém os outros itens no lugar. Essa arma de ataque é extraída
da verdade, fora da verdade. Em termos mais concretos, é derivada ou
deduzida da Bíblia. Prevalecendo essa relação, se a espada remete a
aplicações específicas e ágeis, o cinto poderia se referir ao sistema bíblico
integral de doutrina. A busca e o crescimento contínuo nas disciplinas da
teologia sistemática, da teologia bíblica, do conhecimento bíblico geral e de
passagens bíblicas específicas, reforçam o nosso cinto e afiam a nossa
espada.
Quão grato sou ao Senhor ao analisar meus oponentes, divertindo-me
também um pouco. São desgrenhados, despidos e inermes. Alguns tremem, o
que deveriam mesmo fazer. Mas alguns são confiantes ― estes é que são os
iludidos, pois lhes falta qualquer senso para perceber que alguém maior está
diante deles no nome de Cristo. Ele não me deixou despreparado, mas se
assegurou de me deixar bem treinado e equipado. Ele me deu a garantia de
vencer todas às vezes, se apenas lutar, destruindo seus inimigos com golpes
decisivos da espada.
É consenso entre os cristãos que a verdade é o nosso fundamento, nosso
núcleo e fonte do nosso pensamento. É duvidoso que aquele que não
concorda com isso seja de fato cristão. Assim, extraímos nossas
pressuposições, doutrinas e argumentos da verdade, isto é, da Escritura.
Entretanto, não há consenso sobre como essa verdade deve ser aplicada e
defendida. A abordagem de apologética que aqui denuncio resulta de um
falso entendimento do que significa dar uma resposta ou defesa aos
inquiridores, e de qual o contexto e significado de se fazer isso com
“mansidão e respeito”.
Esse falso entendimento resulta, por sua vez, de uma indiferença por
aquilo que Pedro tem realmente a dizer, e também da busca por uma agenda
pessoal, isto é, de afirmar uma abordagem para o discurso e interação social
que agrade às sentimentalidades e padrões culturais dos não cristãos.
Evidentemente, a distorção das palavras de Pedro não é o único fator
contribuinte para essa abordagem pagã, mas trata-se de um bom e notável
exemplo entre aqueles versículos mal usados. Isso tem levado a uma
limitação antibíblica em duas áreas principais da apologética.
Primeiro, a abordagem antibíblica para a apologética coloca um
impeditivo sobre a razão. Cristãos demonstram certas vezes uma aversão à
“razão”, em parte porque são confusos e desobedientes, mas em parte porque
a palavra está muitas vezes carregada de suposições que os crentes não
deveriam aceitar. Quando cristãos detectam consciente ou instintivamente
essas suposições, tornam-se hostis à própria razão ao invés de desafiar as
suposições. E então os incrédulos dizem que os cristãos são contrários à
razão, irracionais. Contudo, não é da razão que devemos nos acautelar, mas
dessas suposições.
Por exemplo, o racionalismo é a forma de pensamento que alega usar a
razão para descobrir e deduzir um sistema de verdade abrangente, com uma
rejeição consciente da revelação desde o início. Cristãos não podem, é claro,
aceitar tal coisa, e nenhuma pessoa refletida deveria fazê-lo. Ou, o empirismo
é muitas vezes identificado com a razão. Como o método científico envolve
uma aplicação deliberada de métodos e suposições científicas, a ciência é
também frequentemente identificada com a razão. Mas novamente, não há
necessidade de identificar empirismo e ciência com razão.
Antes, a razão pode se referir simplesmente às leis da lógica, aos
princípios que descrevem as regras necessárias de pensamento. Por exemplo,
duas proposições não devem se contradizer mutuamente. Ou, quando um
item é igual a outro, e o segundo é igual ao terceiro, o primeiro também é
igual ao terceiro. Princípios básicos como esse também constituem a base
para a delineação das formas que os argumentos válidos devem assumir. São
regras do pensamento necessárias que uma pessoa deve seguir, quer
adentremos ou não em seus pormenores. E os homens usam-nas instintiva e
necessariamente quando falam e debatem uns com os outros.
Na perspectiva cristã, razão é uma descrição do modo de Deus pensar.
É o modo como Deus estrutura a criação e estrutura sua revelação. Assim,
uma rocha não pode ser e não ser uma rocha ao mesmo tempo e no mesmo
sentido. E a Bíblia assume a necessidade da lógica em seus ensinos e
argumentos. Por exemplo, ao discutir com Satanás, Jesus assume que a Bíblia
não pode se contradizer, e não há qualquer registro de que o próprio diabo
tivesse discorrido sobre este ponto com Jesus. Em outra ocasião, Jesus usou o
mesmo princípio para desconcertar os fariseus, como quando apontou que o
Messias haveria de ser tanto o filho como o senhor de Davi. Os escritos dos
profetas e dos apóstolos também são repletos de argumentos que assumem as
leis da lógica.
Não há nada de errado com a razão em si, se removermos as suposições
desnecessárias. E quando fazemos isso, percebemos que a razão é uma arma
fatal nas mãos do cristão. Por exemplo, descobrimos que, quando testada pela
razão, toda a ciência se desintegra em questão de segundos. É claro, se
identificamos ciência com razão, não poderíamos dizer isso, porquanto a
ciência seria sinônimo de razão. Mas se por razão nos referimos à lógica sem
a bagagem de suposições desnecessárias, a alegação de que a ciência é
racional é aniquilada. Isso ocorre por conta de sua dependência na indução,
na sensação e na falácia formal da afirmação do consequente em seus
métodos e forma de pensar. Qualquer um desses três aspectos destruiria a
alegação de que a ciência é ao menos um pouco racional. A ciência é apenas
uma versão sofisticada e sistematizada de irracionalismo.
Se insistirmos nesse ponto na apologética, todas as objeções científicas
à fé cristã serão destruídas mesmo antes de serem examinadas. O método da
ciência se autodestrói e impede a ciência de descobrir qualquer coisa sobre a
realidade. A abordagem costumeira na apologética é exaltar a ciência e dizer
que ela pode realmente descobrir a verdade se devidamente conduzida. Neste
caso a defesa do evangelho se transforma num debate sobre ciência, e com
isso o incrédulo neutraliza o propósito cristão, a despeito do resultado desse
debate. O reino dos céus não faz progresso.
Até mesmo a versão popular de apologética pressuposicional endossa a
ciência, apesar de ensinar que não podemos explicá-la à parte de
pressuposições bíblicas. Mas isso é ainda mais ridículo. A ciência é irracional
em si mesma, e assim nenhum conjunto de pressuposições pode justificar ou
explicar a ciência, a não ser revelar sua falsidade. Portanto, essa forma de
apologética pressuposicional torna a Bíblia cúmplice de uma mentira. Ao
invés de defender a fé, a abordagem incorre na blasfêmia. A razão pertence
aos cristãos. Não devemos permitir que os não cristãos sequestrem a razão,
depositando nela suas suposições pessoais. Eles reclamam a razão para si
mesmos. Eu a tomo de volta.
Alguns cristãos têm usado as falácias informais para mostrar que a
Escritura diverge da razão. Mas as falácias informais são por si só aplicações
da razão, e não pertencem à própria razão. Essas aplicações poderiam ser
corretas ou erradas. Por exemplo, a falácia informal da difamação aponta a
um problema lógico genuíno somente quando reduzida a uma falácia de
irrelevância. Isto é, se uma pessoa insulta outra com um nome ou rótulo
irrelevante ao debate, e se profere o insulto como se ele fosse relevante, trata-
se de uma falácia lógica. Mas não há qualquer problema lógico no ato em si
de difamar.
De fato, se a difamação parte da cosmovisão de uma pessoa, ela é uma
parte necessária do que precisa ser discutido. Por exemplo, a Escritura usa as
palavras “pecadores”, “tolos”, “cães”, “víboras” e similares para descrever os
incrédulos. Se o cristão evita seu uso, não está mais falando pela fé cristã.
Assim, em tais casos os insultos não são falácias informais, mas uma parte da
cosmovisão cristã. É nisso que cremos ― cremos que os não cristãos são
pecadores, tolos, cães, e assim por diante. E se o não cristão discorda dessas
caracterizações, isso é parte de sua cosmovisão. O conflito se torna agora
mais claro, e como resultado, o debate pode se tornar mais relevante e
produtivo.
Segundo, a abordagem antibíblica para a apologética coloca um
impeditivo sobre a retórica. Trata-se de outra palavra carregada. É
frequentemente associada com sofisma, ou uso habilidoso da linguagem com
o propósito de engano ou manipulação. Não é a isso que eu me refiro.
Quando esvaziada dessas suposições, a palavra pode simplesmente se referir
a um uso eficaz da linguagem, ou habilidade na fala ou escrita. O propósito é
trazer clareza à nossa comunicação e salientar a força que é inerente às nossas
crenças.
Palavras são símbolos que transmitem ideias. Os símbolos não são
vinculados às ideias por necessidade, já que um símbolo pode representar
tanto uma ideia como outra. Assim, não importa quais símbolos usemos para
representar nossas ideias. Mas uma vez que os símbolos estejam associados
às ideias, assume importância quais símbolos estamos usando ao comunicar
nossas ideias, pois diferentes símbolos representam agora diferentes ideias.
Por sua vez, o tom, o estilo e a estrutura da nossa comunicação também
afetam as nuances exatas das ideias comunicadas. Assim, a retórica não
remete ao simples efeito das palavras.
Na apologética, o cristão deve usar todos os artifícios, formas,
expressões e estilos retóricos exibidos na Escritura. Muitos deles não são
rejeitados por crentes e professores em apologética, mas outros são
condenados como ásperos e isentos de amor, apesar de constarem da
Escritura. Conforme notamos, a retórica não pode ser totalmente divorciada
do conteúdo, e por isso, opor-se à retórica da Escritura é opor-se ao seu
conteúdo. A Escritura denuncia o pecado, mas o faz em certos tons, usando
determinadas palavras e com determinadas atitudes. Se retivermos conosco o
que pensamos representar as ideias expressas, mas usarmos somente os tons e
as palavras que os incrédulos não consideram ofensivos, ainda não estaremos
declarando ao mundo o que a Escritura realmente diz, ou o que a cosmovisão
cristã realmente é. Ademais, a linguagem da Escritura também evoca uma
determinada resposta. Se você desafia a linguagem, muda a resposta.
Portanto, apresentar ou defender o evangelho dessa maneira é antibíblico e
inadequado.
A rejeição da retórica bíblica é uma desvantagem no debate e um
pecado perante Deus, pois implica vergonha ou desprezo pela sua palavra.
Possa Deus libertar seu povo das tradições humanas que o impedem de seguir
a Bíblia no seu conteúdo e na sua linguagem, na sua razão e na sua retórica.
Não importa quantos de vocês estão do outro lado da controvérsia. Vocês
estão errados. E não podem lutar contra Deus e vencer. Meu Pai é maior que
todos. E quanto àqueles que têm ouvidos para ouvir, vocês são livres para
falar e escrever tal como faziam os profetas, tal como faziam os apóstolos e
tal como fazia o Senhor Jesus. Não permitam que as tradições religiosas ou
os padrões culturais os impeçam de seguir a palavra de Deus. A menos que se
livrem dessas coisas, vocês não encontrarão liberdade para manejar a espada
do Espírito.
Devemos lançar fora todos os impeditivos que limitam nosso uso da
razão e da retórica para atacar não cristãos, criticar seu estilo de vida e
destruir tudo aquilo em que eles acreditam.
A espada do Espírito é uma arma espiritual. É manejada pelo cristão na
pregação e na argumentação. Mas essa arma é a espada do Espírito também
em outro sentido. O Espírito Santo é que determina o efeito que a palavra de
Deus terá sobre as pessoas. O cristão a maneja na fala e na escrita, mas o
Espírito a faz penetrar nos corações dos homens. Jesus disse que o Espírito
Santo convenceria o mundo do pecado, da justiça e do juízo. O Espírito Santo
é a arma secreta do cristão. Ele não deveria ser um segredo para nós, muito
embora represente um mistério para os incrédulos. Ele é o fantasma, por
assim dizer, que os assombra. Ele é o Fator-X que eles jamais podem
conceber, evitar, enganar ou subjugar.
O Espírito Santo é uma fortaleza para os cristãos. Sua influência não se
limita ao momento do conflito; ele é o espírito de amor, de poder e do juízo
perfeito. Ele é o espírito de intrepidez, de modo que os primeiros discípulos
foram preenchidos do Espírito Santo ao orar para Deus lhes conceder a
intrepidez ao pregarem sua palavra. Ele é o espírito de conhecimento e
entendimento, de discernimento e revelação, de certeza e exuberância na
defesa da fé. Assim, ele não apenas ensina apologética a mim, com respeito
às palavras a dizer e técnicas a usar, mas torna-me um apologista, um
defensor competente da fé. Como está escrito, ele “treina as minhas mãos
para a guerra e os meus dedos para a batalha” (Salmos 144.1). “Porque
contigo passei por meio de uma tropa; e com o meu Deus saltei sobre uma
muralha” (Salmos 18.29, KJV).
Mas o Espírito Santo é um terror para os não cristãos. Eles são
impotentes e indefesos perante o seu poder. Eles não podem matá-lo, não
podem argumentar contra ele e não podem escapar dele. Suas mentes estão
debaixo do seu controle soberano. O Espírito pode confundi-los no debate e
convencê-los dos seus pecados. E mesmo quando deixam a cena, ele os
acompanha, introduzindo dúvidas em suas mentes com respeito às suas
crenças, e convicção em suas consciências com respeito aos seus pecados.
Ele pode convertê-los à fé cristã a qualquer momento que desejar. Se for da
vontade do Espírito, posso abrir caminho na mente mais endurecida
simplesmente recitando o evangelho. Os incrédulos não possuem qualquer
defesa contra mim. Eles não podem impedir a conversão de qualquer pessoa
que o Espírito tenha escolhido converter. Os escolhidos estão facilmente
disponíveis para nós. Nenhuma força de vontade, argumento, educação ou
experiência pode resistir à ação direta do Espírito Santo na mente. Se Deus
escolheu você para salvação, nenhum poder pode me impedir de reivindicar
sua própria alma para o Senhor Jesus.
Muitos cristãos poderiam achar esse aspecto da apologética difícil de
compreender. Provavelmente porque o Espírito Santo não está sujeito ao
nosso controle. Ele faz o que lhe apraz, e estamos sob seu comando. Todavia,
existem princípios sobre as atividades do Espírito Santo, princípios de uma
natureza tal que podemos aprender a interagir com ele de forma deliberada e
inteligente. Por exemplo, ele é o espírito de verdade que poderia capacitar
crentes a entender as coisas de Deus. E Jesus ensinou que o Pai concederia o
Espírito àqueles que lhe pedissem. Assim, podemos rogar a Deus para que o
Espírito Santo nos preencha, nos faça fortes e sábios, e confunda os inimigos
do reino dos céus.
A GRANDE INVASÃO
Da humildade pagã à autoridade cristã
Jesus ofereceu a outra face, mas também virou mesas. Não fez apenas
uma das coisas, mas ambas, dependendo do que convinha à situação. Assim
também, devemos fazer ambas, dependendo da situação. O cristão que
oferece a outra face mesmo quando deveria virar mesas, provavelmente
oferece a outra face não por ser humilde, mas por ser covarde. E aquele que
vira mesas e jamais oferece a outra face, não vira mesas por ter zelo ou
intrepidez espiritual, mas talvez por apresentar uma personalidade agressiva e
impaciente. Ou talvez ambos estejam mal informados sobre como o crente
deveria proceder. Devemos fazer as duas coisas, e um entendimento dos
princípios bíblicos deve nos orientar sobre o que fazer em cada situação. Há
momentos na apologética que precisamos virar algumas mesas.
Algumas vezes não cristãos usam 1 Pedro 3.15 para manipular crentes.
Aproveitam-se da interpretação falsa que o cristão faz do versículo e fazem-
no dar uma satisfação para a sua fé agindo com mansidão e respeito. Essa
resposta é usualmente entendida no sentido defensivo, de modo que o cristão
deve interminavelmente fornecer respostas defensivas a perguntas e objeções.
Por conta da interpretação falsa do versículo, jamais sucede do
questionamento encontrar um desfecho, quando então o não cristão deve
justificar suas próprias crenças ou do contrário render-se ao evangelho.
Mansidão e respeito são entendidos de uma forma que levam a postura
dos cristãos se assemelhar à passividade do budismo e confucionismo, ao
invés do fruto do Espírito. Isso é uma abominação, e permite que os
incrédulos pressionem os cristãos a oferecer apenas respostas defensivas para
a sua fé que não representem qualquer ameaça intelectual direta aos
incrédulos e qualquer pressão emocional sobre seus sentimentos. E então eles
dizem: “Responda-me, cristão! Defenda sua fé! Explique-a! Prove-a para
mim! Dance! Dance! Dance! E não se atreva a levantar a voz ou insultar e
zombar de mim. Seja legal, conforme diz a Bíblia! E quando terminar, faça
tudo novamente!”
As implicações da apologética antibíblica encorajam os incrédulos a
fazer com que o ônus intelectual e emocional do conflito se mantenha o
tempo todo sobre os cristãos. Os incrédulos podem se dar bem com isso até
onde os cristãos se deixarem levar por uma interpretação falsa da Escritura, e
desnecessariamente permitirem que os incrédulos os façam sofrer, enquanto
pensam estar sofrendo derrota e humilhação pela causa de Cristo. A verdade
é que esses cristãos sofrem devido a um erro hermenêutico tolo e simplório.
Uma vez corrigida a interpretação, os cristãos se tornam livres.
De fato, quanto às pessoas que afirmam essa interpretação equivocada
ou sustentam um mal entendido mais amplo acerca do que a Escritura requer
na resposta que damos e o modo como fazemos isso, elas serão levadas ao
sofrimento sem maiores esforços por parte dos incrédulos. Elas oferecem
respostas defensivas e se privam de atacar os incrédulos. E se portam assim o
tempo todo, com humildade budista exemplar e gentileza confucionista. Eu
condeno essa capitulação pagã da ética bíblica.
Mas como a verdade nos liberta! Primeiro, Pedro alude ao modo como
os cristãos deveriam se portar quando estivessem debaixo de interrogatório
oficial, tal que a mansidão e o respeito seriam mostrados às autoridades por
causa de Deus, que estabeleceu todas as autoridades. Segundo, uma
“resposta” se refere a qualquer coisa que poderia explicar por que afirmamos
o evangelho ou por que estamos justificados em afirmar o evangelho. Isso
deve incluir nossa crença de que os incrédulos são tolos e perversos, que eles
são mentalmente deficientes e moralmente depravados, e que todas as suas
crenças são falsas e irracionais. Uma vez que tivermos esse entendimento,
lançaremos fora essa apologética “humilde” repulsiva, efeminada e
antibíblica. Levantaremos a espada do Espírito, e faremos um massacre de
todos os não cristãos, subjugando e humilhando-os por completo na
argumentação. Essa é que deveria ser a nossa resposta.
Tão logo a nossa resposta assuma essa natureza, os incrédulos
perceberão que não estão mais seguros. Eles não podem mais nos manipular
usando nossa Escritura ou 1 Pedro 3.15 como um escudo para sua
incredulidade e rebelião. Se eles atacarem a fé cristã, não sairão ilesos do
conflito. Suas próprias ideias serão criteriosamente examinadas, desafiadas,
refutadas e destruídas ― a todo o momento. Cada pergunta que nos fizerem
terá um preço. Cada objeção que lançarem contra nós será um tiro pela
culatra. E quando se cansarem do debate, não poderão mais dar desculpas
para a sua situação, como se não tivessem qualquer obrigação de nos
responder, responder aos nossos desafios voltados ao teor das suas crenças e
ao seu comportamento. Eles saberão que não apenas revidaremos quando
atacarem, mas que partiremos para cima. Nós é que somos os caçadores, e
eles a presa.
Você diz: “Essa apologética me assusta”. Você é um tolo. Não percebe
que essa é a Grande Comissão? Não percebe que a Comissão é um manifesto
para a invasão espiritual do mundo? Jesus Cristo é Senhor sobre todas as
coisas, e ele nos envia a todo lugar da Terra, até mesmo a cada pessoa, para
declarar seu senhorio e ensinar as pessoas a obedecerem tudo o que ele nos
ordenou. Portanto, temos o dever e o direito de invadir todos os lugares da
Terra, intrometer-nos em todas as vidas, e então desafiar e ordenar as pessoas
a se arrependerem, e dizer-lhes aquilo em que devem crer e como devem se
portar. Essa é a comissão e a autoridade do cristão.
Você deve aceitar e seguir o mandamento do seu Senhor, e o poder do
Espírito estará com você. Quando eu respondo aos incrédulos, não o faço por
minha própria autoridade ― não estou defendendo a mim mesmo ou pedindo
que as pessoas me adorem. Eu respondo em nome do Senhor Jesus, e por isso
respondo de acordo com os seus ensinos e de acordo com o que ele operou na
minha vida. Em seu nome, ordeno aos incrédulos que se arrependam e creiam
no evangelho, obedeçam a tudo o que Cristo ordena. Sou um mensageiro da
vida e da glória àqueles que são escolhidos para a salvação, e mensageiro da
morte e condenação àqueles que se recusam a crer. Somos chamados para
conquistar o mundo, confrontar os incrédulos, atacar seu estilo de vida e
convertê-los à nossa maneira de pensar e viver. Nada menos que isso pode
contar como ministério cristão. Se pensarmos dessa maneira, avançaremos,
conquistaremos, e nada será capaz de permanecer diante de nós. E estaremos
sempre preparados, preparados para vencer.
30. O pregador fala filosofia

O pregador se dirige a uma multidão e diz: “Jesus o Logos, a Palavra, é


a luz da mente. Todo aquele que o segue jamais andará em treva epistêmica,
mas terá a luz da verdade”.
Alguns evidencialistas o desafiam: “Você faz da Palavra o seu próprio
testemunho. Sua filosofia é circular”.
O pregador responde: “Ainda que a Palavra autentique a si mesma, o
testemunho é válido, pois ela contém todos os tesouros da sabedoria e do
conhecimento. Vocês não reconhecem a Palavra por aquilo que ela é, pois
julgam por padrões humanos. Se a Palavra julga, seu julgamento é correto,
pois ela testifica a si mesma, e Deus testifica por ela. Deus não pode testificar
por ninguém mais alto, pois não existe alguém mais alto”.
Então eles perguntam: “Se não julgarmos por padrões humanos, como
podemos reconhecer esse Deus?”
“Vocês não conhecem a Palavra, nem Deus”, replica o pregador. “Se
conhecessem a Palavra, conheceriam também a Deus”.
O Pregador lhes diz novamente: “A Palavra produz um sistema de
conhecimento, e vocês tentarão compreender ou reproduzir esse sistema, mas
a filosofia de vocês sucumbirá em impossibilidades epistemológicas e
autocontradições lógicas. Vocês não podem dividir ou duplicar aquilo que a
Palavra produz”.
Isso leva os evidencialistas a perguntar: “Ele vai simplesmente inventar
coisas ou fazer deduções sem usar métodos de descoberta baseados na
autonomia e na capacidade humana, como sensação e intuição? Por que ele
diz ‘vocês não podem dividir ou duplicar aquilo que a Palavra produz’?”
Mas ele continua: “Sua filosofia é de baixo; a Palavra é do alto. Sua
filosofia é deste mundo; a Palavra não é deste mundo. Eu lhes disse que sua
filosofia sucumbiria em impossibilidades e autocontradições. Se vocês não
creem no que a Palavra diz sobre si mesma, seus pensamentos terminarão em
ignorância e ceticismo; de fato, incapazes de conhecer qualquer coisa”.
“No que consiste essa Palavra? Como você sabe o que ela é?”,
perguntam eles.
“O que a todo o tempo venho lhes dizendo”, responde o Pregador.
“Tenho muito a dizer como crítica à vossa filosofia. Mas a Palavra é
confiável, e declaro ao mundo tudo o que tenho dela aprendido”.
Eles não entendem que ele lhes falava acerca da Bíblia, ou conteúdo
intelectual da Bíblia, a revelação de Deus. Assim, diz o Pregador: “Quando
vocês seguirem uma cosmovisão até os seus princípios últimos, tornar-se-ão
cônscios da necessidade e exclusividade da revelação bíblica, que ela
representa aquilo que afirma ser, e que seu conteúdo é nada menos que aquilo
que Deus revelou. Por trás dela está aquele que a inspirou, porquanto ela é a
expressão exata da sua mente”.
Nisto, alguns afirmam pressupor a Bíblia.
A estes pressuposicionalistas, diz o Pregador: “Se vocês se firmam à
Palavra como seu princípio primeiro, então são de fato discípulos dela, e
conhecerão a verdade, e a verdade vos libertará”.
Eles lhe respondem: “Nossa filosofia pressupõe a Trindade Ontológica
e assume a crença em Deus propriamente como básica. Jamais seríamos
escravos de outro princípio. Como pode dizer que seremos livres?”
O Pregador replica: “Digo-lhes a verdade, todo aquele que estabelece
outro princípio à frente do seu conhecimento da revelação é um escravo deste
princípio. Uma filosofia que é escrava desse princípio estranho não pode ter
lugar debaixo da filosofia da Palavra. Sua filosofia também sucumbirá em
impossibilidades e contradições. Mas se a Palavra vos libertar, serão de fato
livres. Eu sei que vocês alegam pressupor a Palavra. Contudo, vocês estão
prontos a abjurar de minha pessoa, pois não têm lugar para aquilo que eu lhes
afirmo. Estou me pronunciando a partir do meu princípio, e vocês agem de
acordo com o seu princípio primeiro”.
“Nosso princípio primeiro é a Escritura”, respondem eles.
“Se a Escritura fosse seu princípio primeiro”, diz o Pregador, “vocês
começariam da Escritura. Tal como vocês se apresentam, estão determinados
a me renegar, um homem que lhes falou a verdade aprendida da revelação
bíblica. A Escritura não lhes ensina a agir assim. Fazem aquilo que vosso
princípio primeiro requer”.
“Não somos filósofos irracionais e irreverentes”, protestam eles. “O
único princípio primeiro que temos é o próprio Deus”.
O Pregador lhes diz: “Se Deus fosse seu princípio primeiro, vocês
concordariam comigo, pois o meu sistema coloca sua Palavra em primeiro
lugar. Eu não inventei minha filosofia; ele a revelou. Por que a minha
linguagem não é clara a vocês? Porque vocês são incapazes de ouvir o que eu
falo. Vocês pertencem ao seu princípio primeiro, a confiabilidade da
descoberta humana (por sensação ou intuição), e levam a termo tudo aquilo
que esse princípio requer. Ele representa um fracasso epistêmico desde o
princípio, incapaz de se conectar com a verdade ou realidade, ou a revelação
que vocês afirmam pressupor, pois o conhecimento a partir da sensação ou
intuição é impossível. Quando esse princípio produz falsidades, faz o que lhe
é natural, pois ele é falso e o pai das falácias. Entretanto, porque lhes digo a
verdade, vocês não creem em mim! Algum de vocês pode me refutar, ou
defender seu método humano de descoberta? Se digo a verdade, por que não
creem em mim? Aquele que tem a revelação como seu princípio primeiro se
submete a este princípio e exclui todos os demais. A razão pela qual vocês
não se submetem a esse princípio e excluem todos os demais é que vocês não
têm a revelação como seu princípio primeiro”.
Os pressuposicionalistas replicam: “Não temos razão em dizer que você
é louco e arrogante?”
“Não sou louco nem arrogante,” diz o Pregador, “mas honro a Palavra,
e vocês me desonram. Não busco justificação para mim mesmo; mas há
aquele que a busca, e ele é o juiz. Digo-lhes a verdade, se a pessoa rejeitar a
sensação, a intuição e outros métodos de descoberta centrados no homem, e
verdadeiramente se firmar na Palavra somente como seu princípio primeiro,
ela se tornará invencível”.
Diante disso, os pressuposicionalistas exclamam: “Sabemos agora que
você é arrogante! Os apologistas e filósofos que seguimos não afirmaram ser
invencíveis, mas você diz que se uma pessoa adotar seu sistema, ela jamais
será derrotada. Você é maior do que esses apologistas? Quem você pensa que
é?”
O Pregador replica: “Se eu afirmo ser invencível em mim mesmo,
minha alegação não significa nada. É a Escritura, que vocês dizem
representar seu princípio primeiro, que ensina essa abordagem. Embora vocês
não conheçam a Escritura, eu a conheço. Se eu dissesse não conhecê-la, seria
mentiroso como vocês, mas eu a conheço e sustento. Os apologistas que
vocês idolatram regozijam-se na lucubração de uma filosofia escriturística.
Agora eles a veem e aprovam”.
“Você ainda não tem cinquenta anos”, disseram-lhe os
pressuposicionalistas, “e sabe qual é a opinião deles!”
“Digo-lhes a verdade”, responde o Pregador, “eles lançaram o
fundamento para isso!” Assim, eles rangem seus dentes e cerram seus
punhos, e se unem para destruí-lo. Mas o Pregador segue o seu caminho, e
continua a obra que Deus lhe preordenou.
1 Entre outros livros, veja Vincent Cheung, Questões Últimas e Confrontações Pressuposicionais
(ambos pela Editora Monergismo).
2 Entre outras modificações, em alguns artigos acrescentei números às declarações de terceiros para
que você possa reconhecer facilmente suas respostas correspondentes.
1 O que segue é uma mensagem editada que enviei como parte de uma discussão sobre apologética.
2 Veja Vincent Cheung, “O problema do mal” em O Autor do Pecado (Editora Monergismo).
3 Nunca tive qualquer objeção ao cristianismo, mesmo antes de minha conversão. Meu conhecimento
das objeções ao cristianismo veio de incrédulos que fizeram sua formulação e de crentes que tentaram
respondê-las.
4 Ela possui diferentes nomes, como dogmatismo, pressuposicionalismo, racionalismo bíblico,
fundamentalismo bíblico etc.
5 Veja Vincent Cheung, Introdução à Teologia Sistemática (Arte Editorial) e Confrontações
Pressuposicionais (Editora Monergismo).
6 Veja Vincent Cheung, Apologética no Diálogo (Editora Monergismo).
7 Essa foi uma explicação teológica do que acontece na apologética bíblica ou pressuposicional. Para
mais informações, além de instruções práticas, recomendo a exposição de Atos 17 em meu livro
Confrontações Pressuposicionais, e também em meu livro Apologética no Diálogo.
1 O que segue é uma correspondência editada sobre apologética.
1 O texto a seguir é uma carta editada de um seguidor devoto de Van Til.
2 Eu não nego que exista um mundo físico. Antes, estou dizendo que não preciso estar no mundo físico
para agir.
3 O que eu deveria sentir para saber que “Vincent é um homem”? E como sei que é isso o que devo
sentir?
4 Qual “senso” que seja “comum” me dirá que “Vincent é um homem”?
1 O que segue inclui diversas objeções a minha rejeição ao empirismo. Essas objeções foram extraídas
de uma lista de discussão online cujos membros incluíam um grande número de seguidores de
Cornelius Van Til, e foi enviada por um de meus leitores. Essas objeções representam alguns dos
frequentes mal-entendidos e argumentos falaciosos de empiristas cristãos contra a minha posição.
Embora as objeções tenham sido escritas por diferentes pessoas, não é importante citar o autor de cada
objeção, e assim, por conveniência, editei minhas respostas como se todas as objeções viessem de uma
única pessoa. Porquanto o leitor que me enviou as objeções já fosse familiarizado com meus escritos e
argumentos, fui breve na maior parte das respostas. Expandi levemente algumas delas, a fim de que as
respostas fossem inteligíveis a uma maior audiência.
2 O texto dizia originalmente “crença de Clark”. Críticos frequentemente identificam o meu sistema de
filosofia e apologética com o de Gordon H. Clark. Muitos deles têm uma percepção limitada do mundo
cristão, e tendem assim a classificar as pessoas por uma associação com os poucos escritores que elas
conhecem. Embora eu concorde com Clark em muitos pontos, concordância não necessariamente
significa influência. Mas a exemplo de tantos outros casos, meus críticos tendem a confundir correlação
com causação. Eu também desaconselho uma identificação com Clark porque não posso ter certeza de
que ele concordaria com alguns dos principais pontos em meu sistema. Assim, seria injusto com ele
considerar minha filosofia nada mais que uma reafirmação ou aplicação de sua filosofia. Nesta edição
modifiquei o texto para “crença de Cheung” para evitar confusão e enfatizar que eu falo por mim
mesmo e não por Clark.
3 Veja Vincent Cheung, Questões Últimas, capítulo 1, e Confrontações Pressuposicionais, capítulos 1
e 2 (ambos pela Editora Monergismo).
4 “Argumento do terceiro homem” é a crítica de Aristóteles contra a teoria das formas de Platão. [N. do
T.]
5 Veja Vincent Cheung, O Autor do Pecado (Editora Monergismo).
6 Veja Vincent Cheung, Commentary on Ephesians, e Martinho Lutero, Escravidão da Vontade.
7 Um exemplo claro é 2 Tessalonicenses 2.11. [N. do T.]
8 Veja Mateus 24.32, Marcos 13.28, e Lucas 21.30.
1 O que segue é uma correspondência editada. O assunto é um “argumento a partir da existência” usado
por alguns ateus. Minha resposta é uma aplicação do que escrevi em livros como Questões Últimas e
Apologética no Diálogo.
2 Sua definição de existência é uma petição de princípio, tal que eles não podem nem mesmo começar
ali, mas desconsideraremos isso por ora.
3 Veja Vincent Cheung, Questões Últimas (Editora Monergismo).
1 O que segue é uma correspondência editada. É minha resposta ao assim chamado “argumento
transcendental para o materialismo”.
1 Considera-se essa declaração um princípio do “escrituralismo”. O termo remete à filosofia de Gordon
Clark. Embora o termo seja amiúde aplicado à minha filosofia, não o uso. De fato, o princípio primeiro
da filosofia de Clark não é que todo conhecimento vem da Bíblia, mas que a Bíblia é a palavra de Deus.
2 Sou consistente nos contextos em que faço essa afirmação, ou alguma similar, ainda que nem sempre
chame atenção aos contextos. Isto é, os contextos são sempre relacionados a uma filosofia pública,
como em debates, na descrição de um sistema de teologia ou filosofia, e assim por diante. No que diz
respeito à articulação de uma visão bíblica de filosofia ou apologética, em especial na epistemologia,
tratamos da descoberta e justificação de proposições verdadeiras, bem como da refutação de todas as
proposições oponentes. Isso é principalmente feito num cenário público, isto é, público no sentido de
algo apresentado ou projetado fora da mente, como num diálogo ou numa publicação. Por exemplo, eu
afirmo que a fé cristã é verdadeira. Como eu respondo quando essa afirmação é desafiada? Como eu
articulo uma filosofia coerente, abrangente e justificada na qual essa afirmação é verdadeira? Como eu
mostro que estou correto e que o não cristão está errado? Essa é a questão, e quando essa é a questão,
tenho afirmado que não existe realmente qualquer justificativa para o conhecimento, exceto a revelação
divina, que em nosso contexto é representada pela Bíblia. Em relação a isso, frequentemente uso a
palavra “revelação” ao invés de “a Bíblia” para deixar implícito que o conhecimento deriva realmente
de algo que poderia ser maior que a Bíblia. A informação que Deus nos revelará no céu, que não consta
já na Bíblia, seria conhecimento que derivamos de revelação não bíblica. Eu jamais disse que a Bíblia
contém todo o conhecimento disponível aos homens em todos os contextos e eternamente. Repetindo,
podemos certamente receber, quando estivermos no céu, conhecimento que não está registrado na
Bíblia. Embora todo o conhecimento que recebermos no céu vai estar em perfeita harmonia com a
revelação que já temos, teremos de fato acesso a mais conhecimento, conhecimento que não se encontra
na Bíblia. Não sou tão estúpido a ponto de negar isso, e meus críticos não deveriam ser tão estúpidos a
ponto de pensar que nego isso.
1 O que segue inclui uma correspondência editada.
2 Não me refiro necessariamente a “antes” no sentido cronológico, mas pelo menos no sentido lógico.
Em outras palavras, antes de criticar minha epistemologia ele deve ter, ao menos em sua mente, uma
justificativa racional para a sua epistemologia, pronta para ser articulada e defendida a qualquer
momento. Caso contrário, racionalmente falando, ele nem mesmo pode conhecer minha epistemologia,
pois não tem de si mesmo uma epistemologia positiva e defensável pela qual possa conhecer a minha.
1 Isso também explica por que uso invectivas bíblicas ao descrever a tolice e depravação dos
incrédulos. Busco delimitar os contrastes bíblicos rígidos entre luz e trevas, sabedoria e tolice, e assim
por diante. A maior parte das invectivas que uso são derivadas ou tomadas diretamente da Escritura.
2 Para exemplificar, uma pessoa poderia mais perder do que ganhar fé ouvindo William Lane Craig
defender a fé. Ele faz seus argumentos soarem muito incertos. Tudo é suave e meramente provável, mas
nada é certo, nada é absoluto e irrefutável. Isso não é humilde ― é simplesmente patético.
1 Para mais informações sobre isso, veja o capítulo “Jesus e a Razão” em Vincent Cheung, The View
from Above.
1 Para mais sobre isso, veja o capítulo “Jesus e a Razão” em Vincent Cheung, The View from Above.
1 O que segue é uma resposta editada a uma pergunta. Para mais informações acerca do conhecimento
inato do homem sobre Deus, suas implicações e usos, veja meus livros Teologia Sistemática, Questões
Últimas e Confrontações Pressuposicionais.
1 O que segue é uma resposta editada a uma pergunta sobre a natureza dos princípios primeiros.
2 Ou seja, que não pode ser provado. [N. do T.]
3 O mesmo se aplica às palavras “indemonstrável” e “demonstração”.
1 O que segue é uma correspondência editada.
1 O que segue é uma correspondência editada com uma pessoa que me enviou seu artigo da perspectiva
bíblica sobre o uso de drogas.
1 O que segue é uma correspondência editada.
1 Por conveniência, usarei apenas “relativismo” até o final do artigo.
2 Argumentar a partir das consequências práticas de uma posição incorre na falácia de afirmar o
consequente. Mesmo que uma pessoa sofra e morra em virtude de sua filosofia, isso não faz nada para
refutar logicamente esta filosofia ― tudo o que isso poderia significar é que a filosofia verdadeira não
pode ser vivida. Muitos livros-textos de filosofia, incluindo de filósofos cristãos, declaram que um teste
crucial para uma filosofia é sua “capacidade de ser vivida”, tal que deve-se poder viver uma filosofia
verdadeira e deve-se poder colocá-la em prática. Entretanto, não existe argumento racional para esse
princípio ou suposição; isso não passa de um teste arbitrário imposto por uma mentalidade pragmática
irracional. Um teste prático não pode indicar uma filosofia verdadeira, e uma filosofia verdadeira nunca
precisa de um teste prático. A cosmovisão bíblica é de fato prática no sentido de que pode ser vivida e
que por ela uma pessoa pode seguir fielmente os preceitos e mandamentos sábios de Deus; contudo, ela
não é verdadeira porque é prática, mas porque se trata da revelação da verdade de Deus.
3 As refutações lógicas foram apresentadas no começo deste artigo. O procedimento aqui descrito visa
apenas dar um choque para que ele volte à discussão racional.
1 Veja Confrontações Pressuposicionais, capítulo 2, onde combino apologética com evangelismo.
2 Esses argumentos são inválidos e contradizem tanto a revelação bíblica como o conhecimento inato
do homem.
3 Veja Bertrand Russell, “Is Science Superstitious?”
1 O que segue é uma mensagem editada enviada em resposta a uma pergunta sobre o assunto.
1 Forneci uma justificativa bíblica para essa declaração em vários pontos dos meus escritos, e assim
não a repetirei aqui. Veja Vincent Cheung, Teologia Sistemática, Questões Últimas, Confrontações
Pressuposicionais, Apologética no Diálogo, Commentary on Ephesians e “Um idiota com qualquer
outro nome”; Douglas Wilson, The Serrated Edge: A Brief Defense of Biblical Satire and Trinitarian
Skylarking (Canon Press, 2003); Robert A. Morey, “And God Mocked Them” (áudio); e James E.
Adams, War Psalms of the Prince of Peace: Lessons From the Imprecatory Psalms (Presbyterian and
Reformed Publishing Company, 1991).
2 Faculdade americana de prestígio situada na cidade de Hanover (New Hampshire, EUA). [N. do T.]
3 William Lane Craig e Walter Sinnott-Armstrong, God? A Debate Between a Christian and an Atheist
(Oxford University Press, 2004), p. 81.
4 Ibid., p. 95.
5 Ibid., p. 144.
6 Ibid., p. 149.
7 Ibid.
8 Ibid., p. 95.
9 Ele aplica o “nós” a todos nós, mas eu respondo: “Fale por si mesmo!” Ele não nos representa quando
nossa cosmovisão e argumentos diferem dos seus e são imunes ao problema.
10 Quero lembrar a você que ele pode falar apenas por si mesmo.
11 David Zarefsky, Argumentation: The Study of Effective Reasoning, Parte 1 e Parte 2 (The Teaching
Company, 2001).
12 Zarefsky concorda com estas definições (Argumentation, Parte 1, p. 13-15).
13 Parte 1, p. 15.
14 Ibid.
15 Ibid.
16 Ibid.
17 Ibid., p. 17.
18 Ibid.
19 Parte 2, p. 8.
20 Ibid.
21 Ibid., p. 8-10.
22 Ibid., p. 8.
23 Ibid., p. 9.
24 Ibid.
25 Veja Vincent Cheung, “Um idiota com qualquer outro nome”.
1 Todavia, a resposta não representa uma exposição bíblica completa sobre o assunto. Para mais
informações, veja Vincent Cheung, Teologia Sistemática, Questões Últimas, Confrontações
Pressuposicionais, Apologética no Diálogo, Commentary on Ephesians, e “Idiotas profissionais”;
Douglas Wilson, The Serrated Edge: A Brief Defense of Biblical Satire and Trinitarian Skylarking
(Canon Press, 2003); Robert A. Morey, “And God Mocked Them” (audio); e James E. Adams, War
Psalms of the Prince of Peace: Lessons From the Imprecatory Psalms (Presbyterian and Reformed
Publishing Company, 1991).
2 Matthew Henry, Matthew Henry's Commentary on the Whole Bible (Hendrickson Publishers, Inc.,
1991).
3 Ibid.
4 Estes críticos também difamam os reformadores, os quais, a serviço de Deus e da Igreja, tão fiel e
eficazmente empregaram injúrias contra incrédulos e heréticos. Você pensa que eles eram ignorantes
sobre 1 Pedro 3.15 e Colossenses 4.5-6? Não, eles conheciam estas passagens, e escreveram sermões e
exposições sobre estes versículos. Mas ao contrário dos meus críticos, eles também conheciam os
contextos e as aplicações apropriadas desses versículos, bem como o restante da Bíblia.
1 John G. Stackhouse, Jr., Humble Apologetics: Defending the Faith Today; Oxford University Press,
2002; p. 232.
2 Vincent Cheung, Confrontações Pressuposicionais.
3 Por exemplo, Paulo resume seu sistema de teologia com cristologia como o assunto principal em sua
carta aos colossenses. Veja Vincent Cheung, Commentary on Colossians.

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