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José Roberto Covac Kildare Araújo Meira Gilberto da Graça Couto Filho

Sérgio Henrique C. Sant’ana João Paulo de C. Echeverria Daniel Cavalcante Silva


Iara Lucas de Sá Covac Helder Costa Barizon Carlos Alberto Oliveira Amaral
José Roberto Covac Junior Ana Cláudia R. Ferreira Julio Marcos Vinicius M. Caldas
Márcia Ferreira Costa de Araújo

PARECER CSA/DF nº 61 de 14 de novembro de 2008.

EMENTA: Análise da Medida Provisória n. 446, de 7 de


novembro de 2008. Perspectivas do novo cenário da filantropia
nacional.

Prezados Senhores,

Trata-se de estudo formulado com o objetivo de analisar as novas


diretrizes apontadas pela Medida Provisória n.º 446, de 7 de novembro de 2008 e a
conjuntura do sistema nacional de regência da filantropia brasileira, mormente em função
do novo marco regulatório e das conseqüências diretas e indiretas que incidirão sobre as
mais diversas instituições assistenciais do país.

Resumidamente, o presente parecer visa promover uma abordagem sistemática da nova


legislação de regência da filantropia como um todo, bem como os aspectos procedimentais
e tributários que estão atrelados ao regime de certificação das entidades beneficentes de
assistência social.
I. CONTEXTO POLÍTICO

O exaustivo debate hoje em torno da viabilidade jurídica e política da Medida Provisória n.


446, encaminhada pela Presidência da República ao Congresso Nacional no último dia 7 de
novembro de 2008 agora coloca todo o sistema de assistência social do Brasil em
condições precárias e sem um rumo definido, principalmente se considerada a falência do
sistema anterior, que demorava até 10 anos para processar um único pedido de certificação.

Nesse contexto, para que se questionar a atitude do Governo, que ainda acredita na parceria
com as instituições assistenciais, é necessário que seja esclarecida a conjuntura na qual a
medida provisória foi publicada, o que revela elementos importantes para se determinar o
alcance desse novo marco legal da filantropia.

Na ordem cronológica dos acontecimentos, a orquestração da “operação fariseu”


encampada pela força tarefa criada pelo Ministério Público Federal, Polícia Federal e
Receita Federal – cujo objetivo seria a desmoralização do Conselho Nacional de
Assistência Social como instância de certificação das entidades filantrópicas e o
esquecimento do princípio constitucional da participação da sociedade civil no processo de
certificação – foi fundamental para a apresentação do Projeto de Lei n. 3.021/2008 (depois
apensado ao PLS 7494/06).

Esse Projeto de Lei, por sua vez, tinha como premissa maior a centralização dos atos de
certificação nas mãos do Poder Público, como ato exclusivo do Governo, sob a regência
dos Ministérios da Saúde, Educação e do Ministério de Desenvolvimento e Combate a
Fome, e na repetição de velhos critérios quantitativos que trocam a obrigação de recolher
tributos por obrigações de fazer assistência social.

O efeito inicial da “operação fariseu” criou a falsa sensação no Governo de que o PL n.


3.021 tramitaria à toque de caixa. Entretanto, com o passar do tempo e a ausência de
consistência nas denúncias feitas pela espetaculosa operação, somada a mobilização do
setor filantrópico no Congresso Nacional (notadamente as Santas casas de Misericórdia),
passou a haver nítida resistência a tramitação do Projeto na velocidade esperada pelo
Governo.

Nesse meio tempo, correndo em paralelo, como tem sido comum ultimamente, o Supremo
Tribunal Federal fez prevalecer uma antiga disputa dos tributaristas e editou a Súmula
Vinculante nº 8, que reduziu o prazo de decadência das contribuições sociais dos
inconstitucionais 10 anos, que vinham sendo aplicado pela administração desses tributos,
para os 5 anos, conforme previsto pelo Código Tributário Nacional, com reflexo direto
sobre o enorme volume de processos administrativos de certificação pendentes no
Conselho Nacional de Assistência Social e no Ministério da Previdência Social (que
realizava atividade recursal dos processos).

Assim, por decorrência lógica da Súmula editada pela Corte Constitucional, em face da
aplicação da regra de decadência em 5 anos, todos aqueles procedimentos pendentes de
apreciação, seja do ponto de vista recursal ou mesmo de renovação do certificado,
perderam seu objeto tributário, já que passaram a se referir a períodos inalcançáveis por
qualquer fiscalização e, dessa forma, independentemente da sorte dos processos de
certificação pendentes, o resultado financeiro de arrecadação passou a ser inútil com a
Súmula Vinculante 8/STF.

Sempre atento a moverem-se ideologicamente contra as entidades beneficentes de


assistência social educacional, setores do Ministério Público Federal ligados a famigerada
força tarefa MPF/PF/RFB, não mediram forças no sentido de pressionar o Ministro da
Previdência com a possibilidade de ação de improbidade administrativa no caso de os
processos que seriam atingidos pelo manto decadencial não serem julgados até novembro
de 2008, o que levou, nesse meio tempo, o Governo a editar a ilegal Portaria
Interministerial nº 241/2008 que, na prática, tinha o condão de regulamentar o PL 3.021
(uma situação absurda se considerando que Projeto é apenas uma lei em tese), antecipando
a divisão de competências da certificação contida naquele PL, independentemente do que
era regido pela legislação vigente, que dava competência exclusiva ao Conselho Nacional
de Assistência Social.

Nessa balada, com a edição da malfada portaria, foram distribuídos ao Ministério da


Educação mais de 500 processos e ao Ministério da Saúde outros 250, tudo para ser
julgado em menos de 2 meses, sendo desconsiderada por completo a falta de estrutura de
ambos os ministérios, que não tinham a menor condição de receber esses processos, muito
menos de julgá-los no período proposto.

Assim, nessas condições, o resultado da Portaria Interministerial nº 241/2008 foi a pressão


política por parte dos Ministérios da Educação e Saúde no sentido de buscar uma solução
apta a resolver o problema, o que levou o Governo a se render à realidade e às dificuldades
políticas de tramitação do PL 3.021 e, literalmente, atropelá-lo com a edição da MPV n.
446/2008, em que se preservou a lógica do Projeto de Lei mas, por outro lado, acresceu
uma série de perdões que antes de serem benignidade com qualquer entidade são o
convencimento pela razão prática que o prazo decadencial de 5 anos tornou o calhamaço
de processo de certificação inócuos.

Acrescente-se, ainda, que nesse contexto mais uma vez o Supremo Tribunal Federal afetou
a discussão do direito adquirido ao Certificado das instituições beneficentes (aplicação da
Lei nº 3.577/59) para ser decidida de forma paradigmática pelo Recurso Extraordinário n.
566.622-RS, o que refletirá sobremaneira na discussão política que vem sendo tramada no
contexto político.

Enfim, nessa conjuntura é que foi editada a MPV nº 446/2008, cujo texto propositivo trás
respostas claras e soluções objetivas às regras de certificação das entidades beneficentes de
assistência social, com o estabelecimento de prazos e novas condições ao próprio direito de
ser tratada como instituição beneficente de assistência social, além de criar requisitos
estritos e vinculantes ao exercício da imunidade às contribuições sociais, consoante a
previsão constitucional do art. 195, § 7º.
O novo marco regulatório encaminhado pelo Governo por intermédio dessa Medida
Provisória criou novas diretrizes no sentido de eliminar as fraquezas que levaram à falência
do sistema de certificação, seja do ponto de vista procedimental ou material, revogando,
inclusive, o §1º do artigo 55 da Lei nº 8.212/91 (fonte da tese do direito adquirido).

Como principal lamento temos o fim da participação da sociedade civil no processo de


concessão e renovação dos certificados. E, entre outras medidas, houve gestos saneadores
do sistema, sendo concedida uma espécie de anistia aos processos em tramitação, sejam
aqueles em sede recursal, cuja certificação foi inicialmente indeferida, ou mesmo aqueles
que simplesmente pedem a renovação do certificado e que há muitos anos tramitam junto
ao CNAS sem qualquer resolução.

Esse, sem dúvidas, é o ponto mais polêmico e que gera maior repercussão política, uma
vez que essa espécie de anistia cria uma renúncia fiscal considerável na interpretação do
Ministério Público e da própria Receita Federal do Brasil. No entanto, embora haja um
grande estardalhaço acerca da matéria, essa renúncia não é tão factível como pretendem
aplacar aqueles que militam contra o sistema de assistência social, pois em que pese a
fumaça da incidência fiscal só existe fuligem, já que o fogo, por si só, já foi alcançado pela
decadência, ou seja, pouco resta de tributos a serem perquiridos pela falta de certificado e
conseqüente perda da imunidade.

A realidade é que o sistema estava falido, o Conselho Nacional de Assistência Social, pós
“operação fariseu”, mesmo com um passivo de processos gigantesco, tinha medo de julgar
e limitava-se a cumprir o mínimo da pauta mensal, prejudicando não só as instituições, mas
todos os usuários de assistência social do Brasil.

Com esse cenário, de situação precária e caminhando para o fim da parceria do Estado com
as entidades beneficentes de assistência social, é curioso observar o Presidente do Senado
criar um fato político de tamanhas proporções com a devolução da matéria à Presidência da
República, utilizando-se de um artifício – ainda mais curioso –do Regimento Interno,
precisamente no art. 48, inciso XI. É fato que essa manifestação é estritamente política,
fundada no exagero da edição de medidas provisórias por parte do Governo e,
principalmente, pela falta de negociação prévia junto à casa legislativa.

Nesse aspecto, talvez se torne imperiosa a crítica, já há algum tempo superada tanto pelo
Judiciário quanto pelo próprio Executivo, de que se o Congresso realizasse suas atividades
ordinárias talvez estivessem aptos a acompanhar o tempo e as necessidades da sociedade,
pois, como se viu do contexto ilustrado, o Projeto de Lei que discutia a matéria veiculada
pela Medida Provisória tramitava sem qualquer atenção por parte dos parlamentares, com a
ressalva do relator e alguns pouquíssimos interessados.

II. DAS NOVAS REGRAS PARA CERTIFICAÇÃO

Antes da edição da Medida Provisória n. 446/2008, a certificação das entidades que


pretendiam ser tratadas como beneficentes de assistência social, e gozar das benesses legais
e constitucionais atreladas a essa espécie de entidade, deveriam percorrer um caminho um
tanto quanto amargo, não só pela confusão legislativa que fazia a regência da matéria, mas
principalmente pela falta de estrutura e conhecimento específico dos órgãos responsáveis
na Administração Pública.

A regulação do sistema de assistência social do país, antes orientada em última instância


pelo Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), vinculado ao Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), foi especializada e distribuída com
duas outras pastas ministeriais, no caso os Ministérios da Saúde e da Educação.1

1
Art. 3o A certificação será concedida à entidade beneficente que demonstre, nos doze meses que antecederam ao do
requerimento, o cumprimento do disposto nas Seções I, II e III deste Capítulo, de acordo com a respectiva área de atuação.
Art. 22. Os requerimentos de concessão da certificação das entidades beneficentes de assistência social serão apreciados pelos
seguintes Ministérios:
I - da Saúde, quanto às entidades da área de saúde;
II - da Educação, quanto às entidades educacionais; e
III - do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, quanto às entidades de assistência social.
Com efeito, um ponto que ainda restava indefinido no cenário da administração pública,
principalmente em função da interpretação que vinha sendo concebida pelo Ministério
Público Federal acerca da abrangência do que poderia ser ou não tratado como assistência
social, foi claramente solucionado, uma vez que a MPV n. 446/08 sepultou qualquer
interpretação que caminhasse na perspectiva de compreender as atividades voltadas à
educação fora desse ciclo de beneficência e, conseqüentemente, garantias tributárias.2

Assim, em Seções individualizadas, a Medida Provisória (MPV) n. 446/08 tratou das


especificidades de concessão de cada uma das hipóteses de certificação, notadamente nas
áreas de assistência social (strictu sensu), saúde e educação:

a. Seção I – Da Saúde (arts. 4 – 12);

b. Seção II – Da Educação (arts. 13 – 18);

c. Seção III – Da Assistência Social (arts. 19 – 21).

As regras de certificação das entidades, portanto, agora são gerenciadas e materializadas de


acordo com o “serviço” oferecido pela instituição pretendente ao regime de beneficente de
assistência social, devendo sujeitar-se a regras estritamente direcionadas a suas atividades,
ou seja, a regra geral que era entabulada independentemente da área de atuação foi
substituída por regras e regimentos específicos.

Nesse sentido, a título de exemplo, a instituição que presta serviços de saúde, será regida
pelos arts. 4-12, dissociada dos arts. 13-18, que rege as instituições de ensino e, da mesma
forma, dos arts. 19-21, que trata da assistência social em seu sentido mais estrito.

Nos casos em que a mesma instituição mantém todas as atividades, a própria MPV n.
446/08 criou uma fórmula – certamente a pior opção por ferir a liberdade de associação –
de solucionar o problema, exigindo que cada uma das mantidas tenha um cadastro distinto

2
Art. 1o A certificação das entidades beneficentes de assistência social e a isenção de contribuições para a seguridade social
serão concedidas às pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, reconhecidas como entidades beneficentes de
assistência social com a finalidade de prestação de serviços nas áreas de assistência social, saúde ou educação, e que atendam
ao disposto nesta Medida Provisória.
junto a Ministério da Fazenda (um CNPJ para cada mantida de acordo com sua atividade) e
apresente, de forma individualizada, o requerimento de concessão ou renovação do
certificado no órgão especializado.3

Há, entretanto, uma ressalva no que concerne a essa exigência, na medida em que as
instituições que possuam receitas anuais inferiores a R$ 2.400.000,00 (dois milhões e
quatrocentos mil reais) poderão apresentar seus requerimentos de concessão e /ou
renovação no Ministério que represente sua atividade preponderante.4 Essa preponderância
possui critérios definidos na MPV pelo parágrafo único do art. 23, e aponta para critérios
de realização de despesas, ou seja, se a instituição tem por finalidade prestar serviços de
educação e a maior parte do seu gasto é realizado nessa área, mas, por outro lado, exerce
atividade de assistência social ou de saúde e sua renda for inferior ao limite estabelecido, o
Ministério responsável, por critério de preponderância, será o da Educação.

Assim, sinteticamente, as entidades pretendentes a concessão ou renovação dos


certificados de entidade beneficente de assistência social deverão apresentar requerimento
ao Ministério corresponde a sua atividade e, nos casos em que mais de uma atividade é
exercida, criar novos cadastros junto ao Ministério da Fazenda e apresentar um
requerimento para cada um dos centros de atividade (Cadastro de Pessoa Jurídica distintos
- CNPJs), no seu respectivo Ministério, de acordo com a sistemática adotada para cada um
deles.

3
Art. 24. A entidade que atue em mais de uma das áreas especificadas no art. 1º e cuja receita anual seja superior a R$
2.400.000,00 (dois milhões e quatrocentos mil reais) deverá requerer a certificação e sua renovação em cada um dos
Ministérios responsáveis pelas respectivas áreas de atuação da entidade, conforme previsto nos incisos I a III do art. 22.
Parágrafo único. Os efeitos da certificação terão validade apenas para a área específica em que a entidade tenha cumprido os
requisitos necessários à certificação.
Art. 35. As entidades mencionadas no art. 24 ficam obrigadas a criar uma pessoa jurídica para cada uma das suas áreas de
atuação, com número próprio no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas - CNPJ.
§ 1o Cada pessoa jurídica criada na forma do caput deverá apresentar requerimento próprio de certificação ao Ministério
responsável pela sua área de atuação.
§ 2o As entidades em funcionamento na data da publicação desta Medida Provisória que não estiverem enquadradas nas
disposições do caput deverão atender a tais exigências no prazo de doze meses.
§ 3o Durante o prazo previsto no § 2o, as entidades poderão requerer a renovação ou concessão originária da sua certificação
com base no procedimento previsto no art. 23.
4
Art. 23. A entidade que atue em mais de uma das áreas especificadas no art. 1º e cuja receita anual seja de até R$
2.400.000,00 (dois milhões e quatrocentos mil reais) deverá requerer a certificação e sua renovação no Ministério responsável
pela área de atuação preponderante da entidade.
Parágrafo único. Considera-se área de atuação preponderante aquela em que a entidade aplique a maior parte de sua receita.
III. DA CERTIFICAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES QUE PRESTAM SERVIÇOS DE SAÚDE

Com relação às instituições que prestam atividades de saúde, o ponto nodal está nos
critérios de certificação, na medida em que a entidade deverá ofertar todos os seus serviços
ao SUS (ou seja, nenhuma área do hospital pode ter atendimento exclusivo para
particulares), em no mínimo de 60% (sessenta por cento) – inclusive internações.5

O percentual mínimo exigido em gratuidades, por sua vez, poderá ser ponderado nos casos
em que o gestor local do Sistema Único de Saúde reconhecer que não há demanda para
atingir o percentual mínimo, momento em que os hospitais estarão autorizados a
comprovar os requisitos para concessão do Certificado de Entidade Beneficente de
Assistência Social (CEAS), aplicando em atendimento gratuito de saúde (exclusivamente)
de 20% (vinte por cento) a 5% (cinco por cento) de sua receita bruta, dependendo do
percentual de atendimento atingido ao SUS que vai de menos 30% (trinta por cento) a mais
de 50% (cinqüenta por cento).6

Ressalte-se, entretanto, que os valores das gratuidades em saúde, quando admitidos para
complementar os atendimentos ao SUS só serão considerados se devidamente
contabilizados seus custos efetivos, caso contrário considerar-se-á a tabela do SUS.7

5
Art. 4º Para ser considerada beneficente e fazer jus à certificação, a entidade de saúde deverá ofertar a prestação de todos os
seus serviços ao SUS no percentual mínimo de sessenta por cento, e comprovar, anualmente, o mesmo percentual em
internações realizadas, medida por paciente-dia.
Parágrafo único. O atendimento do percentual mínimo de que trata o caput pode ser individualizado por estabelecimento ou
pelo conjunto de estabelecimentos de saúde da entidade, desde que não abranja outra pessoa jurídica por ela mantida.
6
Art. 8o Na impossibilidade do cumprimento do percentual mínimo a que se refere o art. 4o na contratação dos serviços de
saúde da entidade, em razão da falta de demanda, declarada pelo gestor local do SUS, deverá ela comprovar a aplicação de
percentual da sua receita bruta em atendimento gratuito de saúde da seguinte forma:
I - vinte por cento, se o percentual de atendimento ao SUS for inferior a trinta por cento;
II - dez por cento, se o percentual de atendimento ao SUS for igual ou superior a trinta e inferior a cinqüenta por cento; ou
III - cinco por cento, se o percentual de atendimento ao SUS for igual ou superior a cinqüenta por cento, ou se completar o
quantitativo das internações hospitalares, medido por paciente-dia, com atendimentos gratuitos devidamente informados de
acordo com o disposto no art. 5o, não financiados pelo SUS ou por qualquer outra fonte.
Parágrafo único. Para os fins deste artigo, a entidade deverá comprovar o percentual de aplicação em gratuidade sobre a
receita bruta proveniente da venda de serviços, acrescida da receita decorrente de aplicações financeiras, de locação de bens, de
venda de bens não integrantes do ativo imobilizado e de doações particulares.
7
Art. 9o O valor aplicado em gratuidade na área de saúde, quando não comprovado por meio de registro contábil específico e
informado de acordo com o disposto no art. 5o, será obtido mediante a valoração dos procedimentos realizados com base nas
tabelas de pagamentos do SUS.
Outro ponto de fundamental importância, mas que não chega a ser uma novidade é a
preferência na utilização das entidades certificadas para contratos extraordinários com o
SUS quando a rede pública for insuficiente para atender a demanda local.8

A Medida Provisória, além disso, mantém a figura do Hospital Estratégico nos moldes do
Decreto nº 5.895/2006, como entidade beneficente de assistência social, que se
caracterizará não por prestar percentual de atendimento ao SUS, mas por realizar projetos
tecnológicos, de capacitação, pesquisas científicas e de gestão a serem usadas pelo Sistema
Único de Saúde.9

Nesse caso, do hospital estratégico, as entidades têm como marco para a sua certificação
não a receita bruta, mas o valor da imunidade usufruída, já que o gasto das instituições nos
projetos não poderá ser menor do que o valor total do benefício fiscal auferido, podendo
ser completado com atendimentos gratuitos em até 30% (trinta por cento) o valor do
benefício fiscal.10

8
Art. 7o Quando a disponibilidade de cobertura assistencial da população pela rede pública de determinada área for
insuficiente, os gestores do SUS deverão observar, para a contratação de serviços privados, a preferência de participação das
entidades beneficentes de saúde e das sem fins lucrativos.
9
Art. 11. A entidade de saúde poderá, alternativamente, para dar cumprimento ao requisito previsto no art. 4o, realizar projetos
de apoio ao desenvolvimento institucional do SUS, celebrando ajuste com a União, por intermédio do Ministério da Saúde, nas
seguintes áreas de atuação:
I - estudos de avaliação e incorporação de tecnologias;
II - capacitação de recursos humanos;
III - pesquisas de interesse público em saúde; ou
IV - desenvolvimento de técnicas e operação de gestão em serviços de saúde.
10
Art. 11 (...) §1º O Ministério da Saúde definirá os requisitos técnicos essenciais para o reconhecimento de excelência
referente a cada uma das áreas de atuação previstas neste artigo.
§ 2º O recurso despendido pela entidade de saúde no projeto de apoio não poderá ser inferior ao valor da isenção das
contribuições sociais usufruída.
§ 3º O projeto de apoio será aprovado pelo Ministério da Saúde, ouvidas as instâncias do SUS, segundo procedimento definido
em ato do respectivo Ministro de Estado.
§ 4º As entidades de saúde que venham a se beneficiar da condição prevista neste artigo poderão complementar as atividades
relativas aos projetos de apoio com a prestação de serviços ambulatoriais e hospitalares ao SUS, não remunerados, mediante
pacto com o gestor local do SUS, observadas as seguintes condições:
I - a complementação não poderá ultrapassar trinta por cento do valor usufruído com a isenção das contribuições sociais;
II - a entidade de saúde deverá apresentar, ao gestor local do SUS, plano de trabalho com previsão de atendimento e
detalhamento de custos, os quais não poderão exceder o valor por ela efetivamente despendido;
III - a comprovação dos custos a que se refere o inciso II poderá ser exigida, a qualquer tempo, mediante apresentação dos
documentos necessários; e
IV - as entidades conveniadas deverão informar a produção na forma estabelecida pelo Ministério da Saúde, com observação
de não geração de créditos.
§ 5o A participação das entidades de saúde em projetos de apoio previstos neste artigo não poderá ocorrer em prejuízo das
atividades beneficentes prestadas ao SUS.
§ 6o O conteúdo e o valor das atividades desenvolvidas em cada projeto de apoio ao desenvolvimento institucional e de
prestação de serviços ao SUS deverão ser objeto de relatórios anuais, os quais serão encaminhados ao Ministério da Saúde para
acompanhamento e fiscalização, sem prejuízo das atribuições dos órgãos de fiscalização tributária.
Ou seja, por evidencia, quanto maior o benefício fiscal, maior será o valor despendido para
o computo dos critérios financeiros para certificação.

Assim, quanto aos critérios para certificação das instituições de saúde que pretendam gozar
dos benefícios fiscais delineados pelo art. 195, parágrafo 7º, da Constituição Federal, resta
claro que todo o sistema fica submetido ao atendimento das necessidades do SUS, que tem
margem de manobra para certificar quem ele necessitar, com amplo poder discricionário.
Importa ainda afirmar que na nova sistemática as entidades saúde não carecem para a
certificação de estarem registradas no Conselho Municipal de Assistência Social-COMAS.

IV. DA CERTIFICAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES QUE PRESTAM SERVIÇOS DE EDUCAÇÃO

As instituições educacionais, tanto em sede de ensino superior quanto a educação básica, a


partir da MPV n. 446/2008, também tiveram seus critérios alterados de forma considerável,
principalmente no que tange aos percentuais de gratuidade e na forma de cumprimento dos
demais requisitos – notadamente às avaliações e conceitos atribuídos pelo Ministério da
Educação, que agora passam a ser observados para efeito de concessão ou renovação do
certificado.

Conforme é depreendido do texto da norma que passa a regulamentar a matéria, os 20%


(vinte por cento) que devem ser aplicados em gratuidade devem obedecer a exigências que,
de certa forma, restringem em demasia os projetos assistenciais da instituição de ensino,
sobretudo aquelas da educação básica11, uma vez que em relação às instituições de ensino

11
Art. 14. Para os fins da concessão da certificação de que trata esta Medida Provisória, a entidade de educação deverá aplicar
anualmente em gratuidade, na forma do § 1o, pelo menos vinte por cento da receita bruta proveniente da venda de serviços,
acrescida da receita decorrente de aplicações financeiras, locação de bens, venda de bens e doações.
§ 1o Para o cumprimento do disposto no caput, a entidade deverá:
I - demonstrar adequação às diretrizes e metas estabelecidas no Plano Nacional de Educação - PNE, na forma do art. 214 da
Constituição;
II - atender a padrões mínimos de qualidade, aferidos pelos processos de avaliação conduzidos pelo Ministério da Educação; e
III - oferecer bolsas de estudo nas seguintes proporções:
a) no mínimo, uma bolsa de estudo integral para cada nove alunos pagantes da educação básica; e
b) bolsas parciais de cinqüenta por cento, quando necessário para o alcance do percentual mínimo exigido.
superior ainda são vigentes as regras de regência do Programa Universidade para Todos
(PROUNI).12

Nesse ponto, em especial, é de suma importância reiterar o fato de que para as instituições
de ensino superior a regra a ser aplicada será aquela descrita no art. 10 da Lei n. 11.096, de
13 de janeiro de 2005, ainda que a mesma instituição preste serviços de educação básica,
além dos serviços na educação superior. In verbis, o dispositivo:

Art. 10. A instituição de ensino superior, ainda que atue no ensino básico
ou em área distinta da educação, somente poderá ser considerada entidade
beneficente de assistência social se oferecer, no mínimo, 1 (uma) bolsa de
estudo integral para estudante de curso de graduação ou seqüencial de
formação específica, sem diploma de curso superior, enquadrado no § 1o
do art. 1o desta Lei, para cada 9 (nove) estudantes pagantes de cursos de
graduação ou seqüencial de formação específica regulares da instituição,
matriculados em cursos efetivamente instalados, e atender às demais
exigências legais.

§ 1º A instituição de que trata o caput deste artigo deverá aplicar


anualmente, em gratuidade, pelo menos 20% (vinte por cento) da receita
bruta proveniente da venda de serviços, acrescida da receita decorrente de
aplicações financeiras, de locação de bens, de venda de bens não
integrantes do ativo imobilizado e de doações particulares, respeitadas,
quando couber, as normas que disciplinam a atuação das entidades
beneficentes de assistência social na área da saúde.

§ 2o Para o cumprimento do que dispõe o § 1o deste artigo, serão


contabilizadas, além das bolsas integrais de que trata o caput deste artigo,
as bolsas parciais de 50% (cinqüenta por cento) ou de 25% (vinte e cinco
por cento) para estudante enquadrado no § 2o do art. 1o desta Lei e a

§ 2o As proporções previstas no inciso III do § 1º poderão ser cumpridas considerando-se diferentes etapas e modalidades da
educação básica presencial.
12
§ 3o Para a entidade que atue na educação superior, ainda que também atue na educação básica ou em área distinta da
educação, aplica-se o disposto no art. 10 da Lei no 11.096, de 13 de janeiro de 2005.
assistência social em programas não decorrentes de obrigações curriculares
de ensino e pesquisa.

§ 3o Aplica-se o disposto no caput deste artigo às turmas iniciais de cada


curso e turno efetivamente instalados a partir do 1o (primeiro) processo
seletivo posterior à publicação desta Lei.

§ 4o Assim que atingida a proporção estabelecida no caput deste artigo


para o conjunto dos estudantes de cursos de graduação e seqüencial de
formação específica da instituição, sempre que a evasão dos estudantes
beneficiados apresentar discrepância em relação à evasão dos demais
estudantes matriculados, a instituição, a cada processo seletivo, oferecerá
bolsas de estudo integrais na proporção necessária para restabelecer aquela
proporção.

§ 5o É permitida a permuta de bolsas entre cursos e turnos, restrita a 1/5


(um quinto) das bolsas oferecidas para cada curso e cada turno.

A discussão que, obviamente, vai decorrer da aplicação desse dispositivo resulta do fato de
que, pela MPV n. 446/08, a aplicação das receitas em gratuidade devem ser adimplidas
integralmente com bolsas de estudos integrais de parciais (50%), e pela Lei do PROUNI
essa gratuidade de 20% (vinte por cento) pode ser atingida com outros programas de
assistência social não provenientes de obrigações curriculares.

Ou seja, os critérios para a concessão do certificado para instituições de ensino superior,


independentemente do que diz a nova regulamentação das entidades beneficentes de
assistência social, passam a ser descritas, objetivamente pelo dispositivo descrito acima, ao
menos em relação às gratuidades.

Outro fator que será objeto de grande discussão é a necessidade de a instituição ter de
aderir ao Programa Universidade para Todos. Isto porque a norma incutida no art. 10 da
Lei n. 11.096/05 regulamenta a matéria de forma inteiramente independente, ainda que
inserida no contexto do PROUNI.
Nesse ponto, crê-se que, apesar de provavelmente haver discussão nesse sentido, a norma
deve ser aplicada de forma independente, uma vez que não há qualquer descrição, seja na
MPV ou no próprio art. 10 da Lei do PROUNI, que apresente essa exigência.

Por outro lado, para as instituições que aderiram ao PROUNI, a regra de regência será
aquela descrita no art. 11 da Lei n. 11.096/05, uma vez que o texto não foi revogado e trás
critérios diferenciados em relação à forma como devem ser aplicadas as receitas em
gratuidades:

Art. 11. As entidades beneficentes de assistência social que atuem no


ensino superior poderão, mediante assinatura de termo de adesão no
Ministério da Educação, adotar as regras do Prouni, contidas nesta Lei,
para seleção dos estudantes beneficiados com bolsas integrais e bolsas
parciais de 50% (cinqüenta por cento) ou de 25% (vinte e cinco por cento),
em especial as regras previstas no art. 3o e no inciso II do caput e §§ 1o e
2o do art. 7o desta Lei, comprometendo-se, pelo prazo de vigência do
termo de adesão, limitado a 10 (dez) anos, renovável por iguais períodos, e
respeitado o disposto no art. 10 desta Lei, ao atendimento das seguintes
condições:

I - oferecer 20% (vinte por cento), em gratuidade, de sua receita anual


efetivamente recebida nos termos da Lei no 9.870, de 23 de novembro de
1999, ficando dispensadas do cumprimento da exigência do § 1o do art. 10
desta Lei, desde que sejam respeitadas, quando couber, as normas que
disciplinam a atuação das entidades beneficentes de assistência social na
área da saúde;

II - para cumprimento do disposto no inciso I do caput deste artigo, a


instituição:

a) deverá oferecer, no mínimo, 1 (uma) bolsa de estudo integral a estudante


de curso de graduação ou seqüencial de formação específica, sem diploma
de curso superior, enquadrado no § 1o do art. 1o desta Lei, para cada 9
(nove) estudantes pagantes de curso de graduação ou seqüencial de
formação específica regulares da instituição, matriculados em cursos
efetivamente instalados, observado o disposto nos §§ 3o, 4o e 5o do art. 10
desta Lei;

b) poderá contabilizar os valores gastos em bolsas integrais e parciais de


50% (cinqüenta por cento) ou de 25% (vinte e cinco por cento), destinadas
a estudantes enquadrados no § 2o do art. 1o desta Lei, e o montante
direcionado para a assistência social em programas não decorrentes de
obrigações curriculares de ensino e pesquisa;

III - gozar do benefício previsto no § 3o do art. 7o desta Lei.

Assim, ao menos no que se refere aos custos com gratuidades e a base de cálculo para
aplicação do percentual de 20% (que no artigo 11 é apenas a receita de mensalidades), às
instituições que aderiram ao PROUNI a regra a ser observada é a do caput e incisos do art.
11 da Lei n. 11.096/05. Em relação aos procedimentos, que são descritos nos parágrafos
que sucedem o caput do art. 11, acredita-se que foram tacitamente revogados, uma vez que
dispõem regras incompatíveis com o texto da MPV n. 446/08.

Nesse aspecto, importante considerar que, exceto para as instituições que aderiram ao
PROUNI, os 20% (vinte por cento) exigidos em gratuidades deve ser proveniente do
cálculo de toda a receita bruta, conforme previsão do parágrafo primeiro do art. 10 da Lei
n. 11.096/2008. Nos casos de adesão ao Programa Universidade para Todos, as gratuidades
devem ser consideradas a partir da receita efetivamente recebida pela instituição de ensino,
nos termos do inciso I, do art. 11, da Lei n. 11.096/05.

A par das considerações atinentes as instituições de ensino superior que aderiram ao


PROUNI, a MPV n. 446/08 exige que o cômputo dos 20% (vinte por cento) em
gratuidades obedeça a diretrizes especificadas, considerando-se, apenas, as gratuidades
oferecidas em bolsas de estudos integrais, com um mínimo de uma bolsa para cada 9
(nove) alunos, e parciais em 50% (cinqüenta por cento), para completar a exigência
mínima de 20% em gratuidades quando as bolsas integrais não atingirem esse percentual.
Importante o registro de que os beneficiários da bolsa de estudos devem ser considerados
carentes, com renda per capita familiar de 1,5 salários mínimos (bolsa integral) e 3 salários
mínimos (bolsa parcial de 50%).

Devem, ainda, para que sejam certificadas as instituições de ensino superior, demonstrar
adequação às diretrizes e metas estabelecidas pelo Plano Nacional de Educação (PNE) e
atender a padrões mínimos de qualidade que, por sua vez, serão aferidos em avaliações
realizadas pelo Ministério da Educação.

Esse é, justamente, outro aspecto que deve ser motivo de grande debate, uma vez que a
MPV n. 446/08, pois cria poderes extremamente discricionários à gerencia da certificação,
notadamente ao Ministério da Educação, pois os critérios ressentem de conceitos criados
pelo Ministério da Educação, notadamente o Índice Geral de Cursos – IGC e Conceito
Preliminar de Curso – CPC, não são reveladores de aferição de qualidade. Resumindo, essa
espécie de exigência cria, na verdade, uma hipótese de extrema discricionariedade na
certificação das entidades, pois a existência de diversos critérios inviabiliza a segurança
jurídica e a própria impessoalidade e isonomia, princípios estes que, por disposição
constitucional, devem ser seguidos à risca pela Administração Pública e,
conseqüentemente, pelo Ministério da Educação.

Contudo, afirme-se que em relação as instituições que aderiram ao Prouni e estão sob a
regência da Lei nº 11.096/2005 para fins de certificação, que estas possuem no Sistema
Nacional de Avaliação de Ensino Superior, critério de avaliação de qualidade estabelecido,
ante o que dispõe o artigo 7º, §4º da Lei do Prouni, que assevera:

§ 4o O Ministério da Educação desvinculará do Prouni o curso considerado


insuficiente, sem prejuízo do estudante já matriculado, segundo critérios de
desempenho do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior -
SINAES, por duas avaliações consecutivas, situação em que as bolsas de
estudo do curso desvinculado, nos processos seletivos seguintes, deverão
ser redistribuídas proporcionalmente pelos demais cursos da instituição,
respeitado o disposto no art. 5o desta Lei. (Redação dada pela Lei nº
11.509, de 2007)

Por outro lado, a questão da avaliação das entidades beneficente que atuem no ensino
infantil, fundamental ou médio feita pelo MEC, depõe contra o pacto federativo e lança na
discussão sobre avaliação de qualidade do ensino fornecido pelas entidades educacionais
assistenciais um insolúvel problema de constitucionalidade quanto a concentração de
competência na União pela fiscalização de níveis de ensino de responsabilidade de estados,
municípios e Distrito Federal.

Assim, não resta dúvida que, em relação a essa exigência, ainda haverá muito debate,
compreendendo-se que a melhor formula só será apresentada quando os regulamentos
internos forem apresentados pelo MEC e quando os tribunais modularem a questão aos
princípios da segurança jurídica e federativo.

Por fim, em relação às instituições educacionais, foi criada uma regra especifica para os
casos de renovação do certificado em os 20% (vinte por cento) em gratuidades não
haverem sido atingidos em determinado ano. A MPV n. 446/08 prevê um mecanismo
interessante, ressaltando que se a instituição apresentar à aplicação de ao menos 17%
(dezessete por cento) poderá compensar o que faltou no pedido posterior, desde que
acrescente uma espécie de multa de 20% incidente sobre o “débito”.13

Este mecanismo pode ser usado reiteradamente até o momento que o percentual
remanescente não exceda 10% do valor a ser considerado para efeito de gratuidade.

Porém, é mister consignar que na interpretação literal do artigo 18 poder-se-ia concluir que
tal benesse excluiria as entidades de nível superior submetidas aos critérios da Lei do
Prouni. Contudo, a interpretação sistemática do dispositivo permite concluir que não foi

13
Art. 18. No ato de renovação do certificado, as entidades de educação que não tenham aplicado em gratuidade o percentual
mínimo previsto no caput do art. 14 poderão compensar o percentual devido no exercício imediatamente subseqüente, com
acréscimo de vinte por cento sobre o percentual a ser compensado.
§ 1º O disposto neste artigo alcança tão-somente as entidades que tenham aplicado pelo menos dezessete por cento em
gratuidade, na forma do art. 14, em cada exercício financeiro a ser considerado.
§ 2º O pedido de renovação do certificado será indeferido quando a soma dos percentuais a serem compensados exceder a dez
por cento, considerando-se os acréscimos previstos neste artigo.
intenção do legislador excluir as instituições de ensino superior desta hipótese de
compensação do critério quantitativo de certificação de uma renovação para outra, de
modo que é possível as instituições universitárias caso necessitem requer a aplicação do
artigo 18, ficando a questão da definição que administração vai dar sobre o real alcance de
tal normativo para os regulamentos e a prática da aplicação do citado artigo da MPV
446/2008.

Por último, importa ainda afirmar que na nova sistemática as entidades educacionais não
carecem para a certificação de estarem registradas no Conselho Municipal de Assistência
Social-COMAS, estando somente submetidas ao MEC

V. DA CERTIFICAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES QUE PRESTAM SERVIÇOS ESTRITAMENTE DE ASSISTÊNCIA


SOCIAL

Inicialmente, é de suma importância definir qual a abrangência do conceito dado as


instituições assistência descrias pela Medida Provisória n. 446/2008.

Assim, cumpre esclarecer que pela disposição normativa, o conceito dado pela MPV visa a
abranger todas as entidades de assistência social que prestam serviços e ações gratuitos,
não educacionais ou de saúde, de forma continuada e planejada, sem qualquer
discriminação ou contrapartida do usuário, nas áreas de atendimento, assessoramento e
defesa de direitos.14

Além do conceito ilustrado, importa o registro de que a seção referente às entidades de


assistência social (art. 19-21), está extremamente confusa e mal redigida, comportando
interpretações extremistas em relação à certificação dessas instituições:

14
Art. 19. A certificação será concedida à entidade de assistência social que presta serviços e ações gratuitos, continuados e
planejados, sem qualquer discriminação e sem exigência de contrapartida do usuário, observada a Lei no 8.742, de 7 de
dezembro de 1993, ressalvado o disposto no § 1o do art. 35 da Lei no 10.741, de 1o de outubro de 2003.
Parágrafo único. As entidades de assistência social a que se refere o caput podem ser de atendimento, de assessoramento e de
defesa de direitos.
a) Pode se interpretar que inexiste critério quantitativo para as
entidades de assistência social serem certificadas como beneficentes
de assistência social, bastando que preste serviços e ações gratuitos,
sem vedar que no seu financiamento mantenha atividades
econômicas que as mantenha, até porque seria absurdo exigir que
qualquer entidade se mantenha sem receita, ou tentar limitar esta a
doações;

b) Ou pode ser interpretada de forma diametralmente oposta, no


sentido de considerar que as entidades de assistência para se
certificarem não podem ter qualquer atividade econômica devendo
viver só de doações.

Interessante notar, por outro lado, que a MPV estabelece regras mínimas a concessão do
certificado, deixando a interpretação descrita na alínea “a” factível e palpável, nos termos
do art. 21, que ressalta o minimalismo da inscrição da instituição nos conselhos municipais
para efeito de concessão do certificado.15

No mais, considerando o vácuo interpretativo entre as premissas descritas, a MPV n.446/08


repete as regras do Decreto nº 6.308/2007, que impõe a filiação da instituição ao SUAS e o
cadastramento da instituição em todos os Conselhos Municipais (COMAS) onde
desenvolver projetos.16

VI. DOS PROCEDIMENTOS DE CONCESSÃO E CANCELAMENTO


15
Art. 21. A comprovação do vínculo da entidade de assistência social à rede socioassistencial privada no âmbito do SUAS é
condição suficiente para a concessão da certificação, no prazo e na forma a serem definidos em regulamento.
16
Art. 20. Constituem ainda requisitos para a certificação das entidades de assistência social:
I - estar inscrita no respectivo Conselho Municipal de Assistência Social ou no Conselho de Assistência Social do Distrito
Federal, conforme o caso, nos termos do art. 9º da Lei nº 8.742, de 1993; e
II - integrar o cadastro nacional de entidades e organizações de assistência social de que trata o inciso XI do art. 19 da Lei nº
8.742, de 1993.
§ 1o Quando a entidade de assistência social atuar em mais de um Município ou Estado, ou em quaisquer destes e no Distrito
Federal, deverá inscrever suas atividades no Conselho de Assistência Social do respectivo Município de atuação ou do Distrito
Federal, mediante a apresentação de seu plano ou relatório de atividades e do comprovante de inscrição no Conselho de sua
sede ou de onde desenvolva suas principais atividades.
§ 2o Quando não houver Conselho de Assistência Social no Município, as entidades de assistência social deverão inscrever-se
nos respectivos Conselhos Estaduais.
O período de comprovação de análise dos requisitos para concessão do certificado que
antes da publicação da MPV n. 446/08 referia-se aos 3 (três) anos anteriores ao
requerimento de renovação (ou concessão), agora passa a ser, em regra, de apenas 1 (um)
ano antes do requerimento.17

Além disso, esse período de 12 (doze) meses – ou 1 (um) ano – poderá ser apreciado no
limite dos primeiros 12 meses de um lapso de tempo compreendido em 16 (dezesseis)
meses que antecederam ao requerimento, facilitando, assim, o aspecto contábil da
apresentação.18

O processo de requerimento e de renovação e concessão do CEAS (inclusive prazo para


apreciação) será definido por cada Ministério, devendo o pedido de renovação ser
protocolado em até 6 (seis) meses antes do vencimento do certificado anteriormente
concedido.19

A validade do certificado concedido ou renovado, por sua vez, poderá ser de 1 a 3 anos
definido por regulamento.20

Uma das grandes polêmicas originadas com a MPV n. 446/2008 está no fato de que as
entidades que exercem atividades mistas (saúde, educação e assistência, ou mais de uma
delas combinadas) sofrerão um tratamento diferenciado em função da sua receita bruta, na
medida em que as que têm faturamento até R$2.400.000,00 (dois milhões e quatrocentos
mil reais) podem eleger uma atividade preponderante, de acordo com a origem de suas

17
Art. 3o A certificação será concedida à entidade beneficente que demonstre, nos doze meses que antecederam ao do
requerimento, o cumprimento do disposto nas Seções I, II e III deste Capítulo, de acordo com a respectiva área de atuação.
18
Art. 3º (...) § 1o Nas situações previstas em regulamento, a demonstração do cumprimento do disposto no caput poderá ter
como base os primeiros doze meses contidos nos dezesseis meses que antecederem ao do requerimento.
§ 2o O período mínimo de cumprimento dos requisitos de que trata este artigo poderá ser reduzido se a entidade for prestadora
de serviços conveniados com o Sistema Único de Saúde - SUS ou com o Sistema Único de Assistência Social - SUAS, em caso
de necessidade local atestada pelo gestor do respectivo sistema.
19
Art. 26. Os Ministérios referidos nos incisos I a III do art. 22 deverão zelar pelo cumprimento das condições que ensejaram
a certificação da entidade como beneficente de assistência social, cabendo-lhes confirmar que tais exigências estão sendo
atendidas quando da renovação do pedido de certificação.
Parágrafo único. O requerimento de renovação da certificação deverá ser protocolizado com antecedência mínima de seis
meses do termo final de sua validade.
20
Art. 22 (…)§ 4o O prazo de validade da certificação será fixado em regulamento, observadas as especificidades de cada uma
das áreas e o prazo mínimo de um ano e máximo de três anos.
receitas, e pedir apenas um certificado, a ser requerido no Ministério responsável pela
atividade tratada como preponderante.21

Nessa primeira hipótese, não há muito problema, uma vez que a estrutura da instituição
não será alterada. Entretanto, nas instituições cuja receita seja superior a esse limite, a
MPV n. 446/08 conferiu um tratamento extremamente confuso, ilegal e inconstitucional
(em uma observação branda), pois passam a ser compelidas a requerer o CEAS para cada
atividade que exercem (como se o CEAS pudesse ser concedido a meia instituição, mesmo
erro da Lei nº 9.732/98), no respectivo Ministério.22

Esse tipo de exigência gera um problema um tanto quanto curioso, pois pode acontecer de
apenas uma parcela da instituição ser certificada e, conseqüentemente, apenas essa parcela
ser beneficiária da imunidade descrita no art. 195, parágrafo sétimo da Constituição.

Para piorar, ou melhor, para agravar o problema, a MPV n. 446/08 determinou que em um
prazo de 1 (um) ano, as instituições que sejam enquadradas no art. 24 deverão criar
cadastros especificados para cada atividade junto ao Ministério da Fazenda, ou seja, cada
atividade deverá realizar um cadastro nacional de pessoa jurídica (CNPJ) próprio,
obrigando a todas essas instituições a realizar processos de cisão interna ou até mesmo
eliminar programas sociais extremamente vitoriosos, uma vez que nem sempre é possível a
realização de cisão.23

21
Art. 23. A entidade que atue em mais de uma das áreas especificadas no art. 1º e cuja receita anual seja de até R$
2.400.000,00 (dois milhões e quatrocentos mil reais) deverá requerer a certificação e sua renovação no Ministério responsável
pela área de atuação preponderante da entidade.
Parágrafo único. Considera-se área de atuação preponderante aquela em que a entidade aplique a maior parte de sua receita
22
Art. 24. A entidade que atue em mais de uma das áreas especificadas no art. 1º e cuja receita anual seja superior a R$
2.400.000,00 (dois milhões e quatrocentos mil reais) deverá requerer a certificação e sua renovação em cada um dos
Ministérios responsáveis pelas respectivas áreas de atuação da entidade, conforme previsto nos incisos I a III do art. 22.
Parágrafo único. Os efeitos da certificação terão validade apenas para a área específica em que a entidade tenha cumprido os
requisitos necessários à certificação.
23
Art. 35. As entidades mencionadas no art. 24 ficam obrigadas a criar uma pessoa jurídica para cada uma das suas áreas de
atuação, com número próprio no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas - CNPJ.
§ 1o Cada pessoa jurídica criada na forma do caput deverá apresentar requerimento próprio de certificação ao Ministério
responsável pela sua área de atuação.
§ 2o As entidades em funcionamento na data da publicação desta Medida Provisória que não estiverem enquadradas nas
disposições do caput deverão atender a tais exigências no prazo de doze meses.
Assim, não restam dúvidas de que o procedimento estabelecido certamente irá gerar muitas
discussões e interpretações enviesadas por parte dos mais diversos órgãos que, hoje
compõem o sistema de assistência social.

Com relação ao procedimento, ainda de forma primitiva, a MPV n.446/08, estabelece um


esboço de rito para o processo de concessão ou renovação de CEAS, inclusive com a
possibilidade de recurso em 30 (trinta) dias e garantida de ampla defesa – ao menos às
instituições – ressaltando, entretanto, que os Ministérios deverão criar seus próprios
regulamentos para concessão.24

Não há previsão de recurso em caso de deferimento do CEAS ou arquivamento da


representação, ao menos da MPV n. 446/08. No entanto, nada obsta que sejam criadas, por
regulamento interno, regras recursais também para aqueles descritos no art. 33, na medida
em que, quando indeferidos, seja a renovação ou certificado, é possível que a instituição
recorra, nos termos do caput do art. 32.

Nesse sentido, embora ainda em juízo de probabilidades, essa é uma das disposições que
certamente serão objeto de discussão quando da edição dos regulamentos internos, seja
porque não existe a previsão do recurso na lei e, dessa forma, o regulamento não poderia
superá-la, seja pelo fato de que a concessão, por entendimento da lei, será assinada pelo
Ministro da Pasta responsável e, dessa forma, não haveria a quem se recorrer.

De outra parte, embora não seja possível o recurso, é mantida a possibilidade de


representação, incluído como competente para representar os usuários e gestores das
políticas públicas estaduais e municipais.25

24
Art. 32. Da decisão que indeferir o requerimento para concessão ou renovação de certificação e da decisão que cancelar a
certificação caberá recurso por parte da entidade interessada, na forma definida em regulamento, no prazo de trinta dias
contados da publicação da decisão.
25
Art. 33. Verificada prática de irregularidade na entidade certificada, são competentes para representar, motivadamente, ao
Ministério responsável pela sua área de atuação, sem prejuízo das atribuições do Ministério Público:
I - o usuário dos serviços prestados pela entidade;
II - o gestor municipal ou estadual do SUS ou do SUAS, de acordo com a sua condição de gestão, bem assim o gestor da
educação municipal ou estadual; ou
III - a Secretaria da Receita Federal do Brasil.
Parágrafo único. A representação será dirigida ao órgão que concedeu a certificação e conterá a qualificação do representante,
a descrição dos fatos a serem apurados e, sempre que possível, a documentação pertinente e demais informações relevantes
para o esclarecimento do seu objeto.
A representação será dirigida ao órgão concedente do certificado26 e, como mencionado,
não há previsão de recurso na MPV n. 446/08 em caso de indeferimento da representação,
ao contrário das hipóteses de deferimento, em que a instituição pode recorrer na forma do
art. 32.

VII. DOS CRITÉRIOS E REQUISITOS PARA O EXERCÍCIO DA IMUNIDADE ÀS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS

No que concerne à garantia de imunidade – embora o texto insista com a idéia do termo
isenção, já amplamente refutado pelo Supremo Tribunal Federal – é de suma importância
considerar que as regras outrora apresentadas pelo art. 55 da Lei n. 8.212/91 27,
independentemente da discussão acerca da aplicação do art. 14 do Código Tributário
Nacional, foram explicitamente revogadas, passando os requisitos considerados a ser
aqueles descritos pelo art. 28 da Medida Provisória n. 446, de 7 de novembro de 2008.28

Assim, para que goze do beneficio constitucional da imunidade, a instituição deverá,


inicialmente, ser constituída nos termos do art. 1º, ou seja, ser certificada nos termos da
MPV n. 446/08, conforme previsão do inciso I. Nesse aspecto, é importante considerar
todas as peculiaridades antes descritas, inclusive o fato de que cada atividade (Saúde,
Educação e assistência) deverá ter seu certificado e usufruir da imunidade

26
Art. 34. Caberá ao Ministério competente:
I - dar ciência da representação à entidade, que terá o prazo de trinta dias para apresentação de defesa, assegurada a proteção da
identidade do representante mencionado no inciso I do art. 33, quando por este solicitado ou quando julgado necessário pela
autoridade competente; e
II - decidir sobre a procedência da representação, no prazo de trinta dias a contar da apresentação da defesa.
§ 1o Se improcedente a representação de que trata o inciso II, o processo será arquivado.
§ 2o Se procedente a representação de que trata o inciso II, a autoridade responsável deverá cancelar a certificação e dar
ciência do fato à Secretaria da Receita Federal do Brasil.
§ 3o O representante será cientificado das decisões de que tratam os §§ 1o e 2o .
27
Art. 48. Revogam-se: I - o art. 55 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991
28
Art. 28. A entidade beneficente certificada na forma do Capítulo II fará jus à isenção do pagamento das contribuições de que
tratam os arts. 22 e 23 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, desde que atenda, cumulativamente, aos seguintes requisitos:
independentemente da outra29, salvo aquelas que possuírem receita anual inferior à R$
2.400.000 (dois milhões e quatrocentos mil reais).30

Essa regra, diga-se, aplica-se a todos os requisitos.

A instituição, de acordo com sua atividade, não pode remunerar seus diretores sob qualquer
forma por funções que lhe sejam atribuídas no estatuto, reforçando a tese segundo a qual as
atividades na instituição mantida podem ser remuneradas.31 Da mesma forma, por óbvio,
não pode distribuir resultados, dividendos, bonificações, participações ou parcelas do seu
patrimônio.32

A regra atinente à evasão territorial de receitas foi mantida pela MPV, que fez consignar no
inciso III a necessidade de que todos os recursos sejam aplicados em território nacional, o
que não é uma novidade para as instituições beneficentes de assistência. Da mesma forma,
no mesmo inciso III do art. 28, foi mantida a exigência de que tais recursos sejam
aplicados inteiramente de acordo com os objetivos institucionais, fielmente disciplinados
no Estatuto da instituição.33

Outro fator que, embora não seja inovador no cenário da certificação, é a necessidade de
que os atos constitutivos da instituição, para que seja considerada imune, prevejam que em
caso de dissolução ou extinção os bens sejam destinados a instituições congêneres ou
entidades publicadas, nos termos do inciso IV.34

29
Art. 29. A isenção de que trata esta Medida Provisória não se estende a entidade com personalidade jurídica própria
constituída e mantida pela entidade à qual a isenção foi concedida.
30
Art. 28 (...) I - seja constituída como pessoa jurídica nos termos do caput do art. 1o;
31
Art. 28 (…) II - não percebam, seus diretores, conselheiros, sócios, instituidores ou benfeitores, remuneração, vantagens ou
benefícios, direta ou indiretamente, por qualquer forma ou título, em razão das competências, funções ou atividades que lhes
sejam atribuídas pelos respectivos atos constitutivos;
32
Art. 28 (…) VIII - não distribua resultados, dividendos, bonificações, participações ou parcelas do seu patrimônio, sob
qualquer forma ou pretexto;
33
Art. 28 (...) III - aplique suas rendas, seus recursos e eventual superávit integralmente no território nacional, na manutenção
e desenvolvimento de seus objetivos institucionais;
34
Art. 28 (...) IV - preveja, em seus atos constitutivos, em caso de dissolução ou extinção, a destinação do eventual patrimônio
remanescente a entidades sem fins lucrativos congêneres ou a entidades públicas;
Contudo, fosse essa a limitação imposta ao associado, não haveria qualquer novidade,
entretanto, quanto ao entendimento patrimonial da associação, a MPV vai além, e
estabelece, nos termos do inciso V35, uma forma impeditiva a qualquer interpretação nesse
sentido, sucumbindo à aplicação do art. 55 do Código Civil para as instituições
beneficentes certificadas.

Nesse caso, há que se considerar qualquer movimento no sentido de se patrimonializar a


associação deve antes ser precedida de uma espécie de transformação de sua natureza,
abrindo-se mão dos benefícios auferidos pela certificação.

Superados esses requisitos, a MPV n. 446/08 estabelece que a instituição deverá apresentar
as certidões negativas de débito, de inscrição em divida ativa, CADIN e FGTS36. Essa, sem
dúvida, é uma inovação em relação aos critérios anteriores e, notadamente, pode gerar
muitos problemas em relação à manutenção da imunidade, na medida em que a constatação
da existência de um débito, seja ele fiscal ou até mesmo fruto de um empréstimo não pago
na Caixa Econômica Federal (passível de inscrição no CADIN), por exemplo,
desencadeará a discussão da imunidade, no rito do Decreto n. 70.235/72.37

Apenas nos casos em que o débito for estritamente proveniente de lançamento fiscal
(débitos fiscais que estão fora da imunidade) é que haverá tempo de discussão da dívida em
si, uma vez que a própria MPV acata a certidão positiva com efeitos de negativa (art. 206
do CTN). Essa regra aplica-se, na mesma medida, em relação a exigência de cumprimento
das obrigações acessórias, descritas no inciso XI.38

35
Art. 28 (...) V - não seja constituída com patrimônio individual ou de sociedade sem caráter beneficente;
36
Art. 28 (…) VI - apresente certidão negativa ou certidão positiva com efeito de negativa de débitos relativos aos tributos
administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e à dívida ativa da União, certificado de regularidade do Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço - FGTS e de regularidade em face do Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor
Público Federal - CADIN;
37
Art. 30. O direito à isenção das contribuições sociais poderá ser exercido pela entidade a contar da data da sua certificação
pela autoridade competente, desde que atendidas as disposições da Seção I deste Capítulo.
Art. 31. Constatado o descumprimento pela entidade dos requisitos indicados na Seção I deste Capítulo, a fiscalização da
Secretaria da Receita Federal do Brasil lavrará o auto de infração relativo ao período correspondente e relatará os fatos que
demonstram o não-atendimento de tais requisitos para o gozo da isenção.
§ 1o O lançamento terá como termo inicial a data da ocorrência da infração que lhe deu causa.
§ 2o O disposto neste artigo obedecerá ao rito processual do Decreto no 70.235, de 6 de março de 1972.
38
Art. 28 (...) XI - cumpra as obrigações acessórias estabelecidas na legislação tributária; e
Para exercício da imunidade, a MPV n. 446/08 ainda exige regras de regência contábil39 e
administrativa de documentos40 em consonância com as Normas Brasileiras de
Contabilidade, além da necessidade de que as subvenções e doações sejam sempre
aplicadas de acordo com a finalidade em que foram repassadas.41

Os requisitos para o gozo da imunidade ainda estabelecem que a instituição deverá cumprir
com qualquer outra regra ou requisito estabelecido em lei. Nesse caso, embora o conceito
seja extremamente aberto, há que se considerar a limitação do principio da legalidade, uma
vez que somente poderão ser exigidas praticas estabelecidas em lei, ficando excluídos
quaisquer outros atos normativos fruto da discricionariedade da administração pública,
ressaltando o mínimo de segurança jurídica.

Por fim, é importante que fique registrado que a imunidade em nada se confunde com a
certificação da instituição, sendo este apenas um dos requisitos para o exercício daquele
(inciso I), ou seja, para que a instituição seja certificada deverá ser formada nos termos do
Capítulo II da MPV (arts. 3º - 27), e os critérios para o gozo da imunidade serão
estritamente, ressalvada a discussão acerca da necessidade de Lei Complementar, aqueles
descritos pelo art. 28.

A distinção que a MPV opera em regras para a certificação e para a imunidade faz ressurgir
o antigo entendimento do Ministério da Previdência de que os fiscais tributários só têm
competência para exame de critérios da imunidade (agora previstos no artigo 28 da MPV),
sendo vedados cassarem o Certificado pois esta seria competência do Ministério.

Percebe-se nas regras para o gozo da imunidade duas supressões de exigências anteriores
que acabam por facilitar o procedimento, a primeira diz respeito a desnecessidade da

39
Art 28 (…) VII - mantenha escrituração contábil regular que registre as receitas e despesas, bem como a aplicação em
gratuidade de forma segregada, em consonância com os princípios contábeis geralmente aceitos e as normas emanadas do
Conselho Federal de Contabilidade;
40
Art. 28 (…) X - conserve em boa ordem, pelo prazo de dez anos, contado da data da emissão, os documentos que
comprovem a origem de suas receitas e a efetivação de suas despesas, bem como os atos ou operações realizados que venham a
modificar sua situação patrimonial;
41
Art. 28 (…) IX - aplique as subvenções e doações recebidas nas finalidades a que estejam vinculadas;
apresentação das utilidades públicas como condição para o gozo da imunidade e a segunda
está adstrita a desnecessidade de se requerer a imunidade para o seu efetivo gozo.

O gozo da imunidade a partir da MP é automático com a certificação (independentemente


de requerimento), devendo os requisitos serem apresentados sempre que solicitados pela
fiscalização tributária.

VIII. DOS PROCESSOS EM ANDAMENTO, DAS REMISSÕES E DAS DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS

Os pontos que hoje representam a maior repercussão midiática da MPV n. 446/08 são,
justamente, aqueles que visam a resguardar a segurança jurídica atrelada aos processos em
andamento junto aos antigos órgãos de regulação do sistema de assistência social.

Pelas disposições transitórias, aquelas instituições que realizaram o pedido originário de


certificação junto ao Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), e ainda não
obtiveram qualquer resultado, terão seus processos remetidas aos órgãos que passaram à
regular a matéria, de acordo com a atividade preponderante da instituição,
independentemente das limitações de receita impostas pelo art. 24.42 Ou seja, esses
processos serão remetidos aos Ministérios da Saúde e Educação, embora ainda não exista o
regulamento interno de nenhuma das duas pastas ministeriais tratando da forma e
procedimento de recepção desses requerimentos.

Nesse ponto, o Conselho Nacional de Assistência Social, em reunião realizada no dia 13 de


novembro de 2008, fez publicar a Resolução CNAS n. 79/08, destacando que a elaboração
de um Plano de Transição Gerencial, para o cumprimento dos arts. 36, 37, 38 e 39 da
Medida Provisória nº 446, de 7 de novembro de 2008.
42
Art. 36. Os pedidos de concessão originária de Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social que não tenham
sido objeto de julgamento pelo Conselho Nacional de Assistência Social - CNAS até a data de publicação desta Medida
Provisória serão remetidos ao Ministério responsável, de acordo com a área de atuação da entidade, que os julgará, nos termos
da legislação em vigor à época do requerimento.
§ 1o Caso a entidade requerente atue em mais de uma das áreas abrangidas por esta Medida Provisória, o pedido será remetido
ao Ministério responsável pela área de atuação preponderante da entidade
Assim, criada a regulamentação e os procedimentos de transição, os requerimentos serão
julgados pelos seus respectivos órgãos, remanescendo a regra criada para os novos pedidos
em que das decisões que deferem o certificado não cabe recurso43, ao contrário daquelas
que indeferem o certificado, em que a instituição tem o direito de recorrer.

Há, entretanto, uma peculiaridade nesses processos objeto da transição do CNAS para os
Ministérios, pois embora a MPV n. 446/08 estabelece um prazo de 30 (trinta) dias para
recorrer em relação aos novos pedidos de certificação (art. 32), no caso dos processos
inseridos no bojo do art. 36 possuem um prazo de apenas 10 (dez) dias para recorrer44.
Nesse ponto, por princípio de isonomia, acredita-se haver uma grave inconstitucionalidade.

Ressalte-se, ademais, que a certificação das entidades enquadradas na hipótese do art. 36


tem a mesma validade que os novos certificados para efeito de imunidade, desde que
cumpridos os demais requisitos do art. 28.45

A par dessa transição, aquelas instituições que hoje aguardam o julgamento dos pedidos de
renovação por parte do CNAS, nos termos do art. 37, passam a ser consideradas
certificadas, com o pedido deferido, ficando as representações perpetradas pelo Poder
Público prejudicadas, ou melhor, arquivadas.46

Alerte-se contudo que a instituições que tiveram descontinuidade na renovação do seu


CEAS tem o pedido de renovação seguinte ao indeferimento da certificação considerado
não como renovação, mas como pedido de novo certificado, portanto, a este pedido após o
indeferimento do CEAS não se aplica o artigo 37 que permite a renovação automática, mas

43
Art. 36 (…)§ 2o Das decisões proferidas nos termos do caput, que sejam favoráveis às entidades, não caberá recurso.
44
Art. 36 (...) § 3o Das decisões de indeferimento, proferidas com base no caput, caberá recurso, sem efeito suspensivo, no
prazo de dez dias, dirigido ao Ministro de Estado responsável pela área de atuação da entidade.
45
Art. 40. A concessão originária deferida na forma do art. 36 será reconhecida como certificação da entidade para efeitos da
isenção de que trata esta Medida Provisória, desde que atendidos os demais requisitos nela previstos.
46
Art. 37. Os pedidos de renovação de Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social protocolizados, que ainda
não tenham sido objeto de julgamento por parte do CNAS até a data de publicação desta Medida Provisória, consideram-se
deferidos.
Parágrafo único. As representações em curso no CNAS propostas pelo Poder Executivo em face da renovação referida no
caput ficam prejudicadas, inclusive em relação a períodos anteriores.
sim o artigo 36 de remessa do processo ao novo órgão competente para seu julgamento.
Porém, se o indeferimento do CEAS ainda tramita administrativamente em grau recursal,
pela cumulação dos dispositivos remissivos da MPV há que se considerar o pedido de
CEAS posterior ao indeferimento em tramitação como verdadeira renovação e aplicar-se o
artigo 37 da MPV.

Da mesma forma, os recursos apresentados em face decisões que deferiram renovações ou


concessões de certificados foram extintos e, conseqüentemente, arquivados47, tal como os
recursos interpostos pelas instituições provenientes do indeferimento do certificado e/ou
representações, que foram automaticamente deferidos por força da MPV n. 446/08.48

Em suma, a MPV n. 446/08 regularizou todos os processos de renovação pendentes,


assumindo uma nova ordem de assistência social, reiniciada em todas as suas
peculiaridades e garantindo que não haverá qualquer prejuízo às instituições já certificadas.

O art. 41 ainda amplia o prazo dos certificados que tenham vencimento até 10 de
novembro de 2009 por outros 12 (doze) meses.49

O prazo de vigência dos certificados deferidos automaticamente pela MPV n. 446/08 serão
avaliados somente após o ato publicado pelo CNAS, individualizados para cada processo,
uma vez que o período de analisa é distinto para cada entidade. No entanto, entende-se que,
mesmo estes prazos de vigência, serão prorrogados por outros 12 (doze) meses.

Nesse caso, é importante a ressalva normativa de que os requisitos para certificação


aplicáveis para seu reconhecimento serão os da legislação vigente à época da concessão do

47
Art. 38. Fica extinto o recurso, em tramitação até a data de publicação desta Medida Provisória, relativo a pedido de
renovação ou de concessão originária de Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social deferido pelo CNAS.
48
Art. 39. Os pedidos de renovação de Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social indeferidos pelo CNAS, que
sejam objeto de pedido de reconsideração ou de recurso pendentes de julgamento até a data de publicação desta Medida
Provisória, consideram-se deferidos.

49
Art. 41. Os Certificados de Entidade Beneficente de Assistência Social que expirarem no prazo de doze meses contados da
publicação desta Medida Provisória ficam prorrogados por doze meses, desde que a entidade mantenha os requisitos exigidos
pela legislação vigente à época de sua concessão ou renovação.
certificado, ou seja, não há que se exigir das instituições que hoje são certificadas o
cumprimento dos requisitos da MPV n. 446/08 para a manutenção do certificado.

Todavia, considerando a manutenção do status de instituição beneficente de assistência


social, a recomendação é no sentido de que seja feita uma adaptação as novas regras para
que não haja problema quando do pedido de renovação, já sob as novas orientações.50

Quanto ao ato declaratório de imunidade, aqueles que ainda estão pendentes de julgamento
observarão o revogado art. 55 da Lei n. 8.212/91, mais uma vez ressalvando o
entendimento de que a regra a ser aplicada, por disposição constitucional do art. 146, inciso
II, é o art. 14 do CTN.

IX. CONCLUSÕES E CRÍTICAS

A primeira crítica que merece comentário é o fato de a MPV n. 446/08 insistir em tratar o
art. 195, §7º, da Constituição como espécie de isenção, embora o Supremo Tribunal
Federal já tenha assentado que, considerando-se sua disposição na orbita constitucional, só
pode ser tratada como imunidade.

Além disso, mais uma vez os requisitos para o exercício dessa imunidade é veiculada por
meio de Lei Ordinária (ainda Medida Provisória), o que segue de encontro ao
questionamento já diversas vezes suscitado no sentido de que essa forma normativa nega
vigência ao art. 146, inciso II, da Constituição Federal, e, portanto, é formalmente
inconstitucional.

Uma das virtudes da MPV é o enquadramento legal e de forma clara de que instituições de
saúde e educação podem ser tratadas como entidades beneficentes de assistência social,

50
Art. 42. A entidade que tenha interesse em obter ou manter a isenção deverá formular requerimento de certificação como
entidade beneficente de assistência social, nos termos do disposto no Capítulo II.
que vai de encontro a dissidências estritamente fiscais tributárias que tinham uma
interpretação enviesada e distante da realidade.

Essa disposição da norma, já no art. 1º, rebate o pensamento ideológico da Força Tarefa
constituída pelo Ministério Público Federal, Polícia Federal e INSS, que defendem a
impossibilidade dessas instituições serem tratadas como beneficentes, o que foi ilustrado
em recentes precedentes do Conselho de Contribuintes, precisamente da 5ª Câmara do 2º
Conselho.

A MPV traz a mesma lógica já reprovada pelo Supremo Tribunal Federal tanto na ADIN
20306 MC/DF (Rel. Min. Moreira Alves, inconstitucionalidade da Lei nº 9.733/98) como
na ADIN 2.545MC/DF (Rel. Min. Elen Gracie, inconstitucionalidade do art. 19 da Lei nº
9.10.26.0/98) de criar correlação entre a isenção usufruída e a exigência para o seu
exercício, trocando uma relação de pagar tributos por uma relação de prestar serviços, tal
como o faz no artigo 11, §2º em relação ao conceito de hospital estratégico e também o faz
no artigo 14 quando limita a prática assistência das educacionais a bolsa de estudo e o
próprio artigo 4º em relação ao atendimento ao SUS.

Em relação às entidades de assistência social, a MPV é vaga deixando para a legislação


regulamentar definições que deveria ser dadas por Lei.

Outro ponto de fundamental importância, e por isso a necessidade da crítica, é a supressão


da participação popular no processo de concessão do CEAS, em total desrespeito ao artigo
204 da Constituição, uma vez que deixa a cargo exclusivo do Ministério a concessão do
certificado.

Ademais, o dispositivo dos artigos 24 e 35 da MPV ferem a liberdade de associação


consagrada no art. 5, inciso XVIII da Constituição.

A expectativa de tramitação da MPV 446/2008 é de muita tensão em relação as remissões


fiscais, há na mídia falta de compreensão da problemática inserida no processo de
certificação e um trato das remissões concedidas no texto da MPV como algo meramente
imoral. A pressão exercida pela mídia já teve reflexos na data de hoje quando o Presidente
do Senado devolveu a Medida Provisória ao Presidente da República, usando os poderes
do artigo 48, inciso XI do Regimento Interno do Senado.

Esse gesto de devolução da MPV pelo Presidente do Senado tem conteúdo mais político
que jurídico, pois não altera a vigência da MPV que só perde sua vigência pelo decurso do
prazo ou se a Presidência da República a revogar, de modo que o ato do Presidente do
Senado deteriora o clima de tramitação da MPV, mas isoladamente não deterá sua
tramitação.

Nesse sentido, orienta-se que as instituições acelerem seus pedidos de benefício em face
das remissões concedidas, afim de, obterem um ato jurídico perfeito, devendo requer que o
CNAS, o MPS ou MEC realizem logo ato de aplicação dos dispositivos remissivos.

Contudo, a par de todas as críticas que podem ser realizadas, é salutar considerar que a
Medida Provisória n. 446/08 trouxe um grande avanço ao sistema de regulação da
assistência social no país, não só por demonstrar que ainda existe interesse do Estado nas
instituições beneficentes de assistência social, até então sendo inseridas em uma vala de
completo descrédito, mas principalmente por moralizar o sistema como um todo,
ressaltando que daqui para diante os requisitos haverão de ser cumpridos, sob pena de, sem
delongas, os benefícios cessarem.

É o parecer.

José Roberto Covac


OAB/SP n.º 93.102

Kildare Araújo Meira João Paulo de Campos Echeverria


OAB/DF n.o 15.889 OAB/DF n.o 21.695
OAB/SP n.º 249.220

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