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BRUYNNE, Paul de, HERMAN, Jacques e

SCHOUTHEETE, Marc de. Dinâmica da Pesquisa em


Ciências Sociais. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1977.
CIENTIFICIDADE
As normas de cientificidade são um produto do próprio devir da
ciência, não é uma espécie de exigência colocada a priori ou vinda de
fora, elas só puderam se elaborar graças a uma interação constante
entre métodos e objetos. Isto porque nem os métodos nem os objetos
são dados a priori. Existe elaboração progressiva dos métodos em
contato com determinados objetos graças ao acionamento de
terminados métodos.
O que parece essencial, finalmente, não é tanto o resultado ao qual se
chegou, isto é, a ideia de cientificidade tal coo se impõe hoje na física,
mas antes todo o processo de interação que levou ao seu resultado.
(p.1 4)
Construção do objeto
A construção é pois uma operação continua, na verdade, ela nunca
pode ser considerada acabada, pois a partir do momento em que se
consegue desprender o objeto da situação problemática na qual se
encontrava, ele não tarda a suscitar, por seu próprio funcionamento,
novos problemas. A progressão é feita por patamares. Mas ela abre
para um horizonte indefinido, aliás desdobrado previamente pela
intencionalidade constituinte que é o verdadeiro motor da construção
do objeto. Todas as operações nas quais a pesquisa se deixa analisar
inscrevem-se nesse horizonte ou, o que vem ser a mesma coisa, ligam-
se a intencionalidade que o suscita.
O ambiente societal da pesquisa
O campo da pesquisa se inscreve desde o inicio, e ao longo de toda sua
elaboração, num ambiente societal bem mais vasto do que o de todas
as práticas sociais.
...é útil discernir determinados campos de influencia ou de coerção
e/ou facilitação relativamente à pesquisa cientifica que limitam ou
contrariam a liberdade das escolhas metodológicas do pesquisador.
Esses campos são de natureza e importância muito diversa e sua
influencia é especifica a cada contexto particular da pesquisa.
Campo da demanda social

A organização social da pesquisa não escapa aos conflitos políticos e sociais...


Os cientistas não estão acima da disputa social e política; ao mesmo tempo
sua ciência não se reduz a ideologia dos atores que se confrontam.
1. O campo da demanda social. O pesquisador – membro de uma sociedade
articular, sua atividade é permitida/legitimada de um certo modo pelo
sistema sócio-cultural dessa sociedade. Aponta para a influencia da divisão
sociotecnica do trabalho exemplificada com o “teórico” distinguido
abstratamente do “pesquisador de campo” enquanto suas abordagens são
inseparáveis metodologicamente. Observa a questão da encomenda social,
o financiamento da pesquisa como ameaça para sua autonomia.
Campo da demanda social
Destaca a cooptação cria para o pesquisador o risco de ser manipulado por
grupos de pressão quaisquer. A “sociedade do discurso”, isto é, o conjunto de
pesquisadores, as teorias, as experiencias, os rituais e as normas, as
instituições acadêmicas e cientifica, exerce um controle direto sobre toda a
pesquisa. A Sociedade do discurso tem aspectos nefastos -
conservadorismo, modismo, dogmatismo, nepotismo, não entanto, sua
contribuição é capital. Cada sociedade do discurso pode incluir varias
escolas, o que representa caráter fecundo de confrontação de pontos de
vista reciproco, mas pode desencadear a intransigência e o dogmatismo. O
papel das sociedades do discurso que formam a “cidade cientifica” tem o
papel de elaborar uma ética da profissão. A demanda social na produção
cientifica justifica uma sociologia da prática científica.
Campo axiológico
É o campo dos valores da sociais e individuais que condicionam a pesquisa
cientifica. A persecução do esforço cientifico é sustentado por valores
específicos (conhecimento, poder, etc). Os valores culturais inerentes à
sociedade impõem-se ao pesquisador a escolha de suas problemáticas, dos
temas que ele aborda. Marx Weber insistia sobre a “relação aos valores”,
Carlos Marx dizia que os homens só se colocam os problemas que podem
resolver, quer dizer as conexões da pesquisa com os contextos sociais,
técnicos e culturais nos quais ela se inscreve.
Ora, a ESCOLHA DA PROBLEMATICA deve esforçar-se por ser explicita. Os
interesses próprios ao pesquisador sugerem-lhe igualmente orientações
especificas. O pesquisador deve levar em conta seus juízos de valor pessoais
e estabelecer uma demarcação graças a uma linguagem e procedimentos
científicos.
Campo doxológico (doxa crença comum ou
opinião popular)
Campo do saber não sistematizado, da linguagem e das evidencias da
prática cotidiana, de onde a PRÁTICA CIENTIFICA deve esforçar-se para
arrancar suas problemáticas especificas. O campo doxológico é o
suporte e o produto da linguagem comum, das práticas empíricas,
pode despertar no pesquisador uma “certeza sonambúlica”
(Mannheim). Uma doxologia teria o papel de estudar a incidência do
saber sobre as práticas científicas.
O conjunto da “tradição teórica” das disciplinas das ciências do
homem tem ligações orgânicas com o campo doxológico. Ora, o
dialogo, ou melhor, a interação deveria se instaurar a partir de dois
tipos de linguagens diferentes, cada um com sua especificidade, sem se
tornar um simples jogo de espelhos. (p.33)
Campo epistêmico
Campo que chegou a um grau de objetividade reconhecido: estado das
teorias, estado da reflexão epistemológica, estado da metodologia,
estado das técnicas de investigação. A região epistêmica mais próxima
de uma pesquisa especifica é, evidentemente, a da disciplina do
pesquisador na qual ele procede a escolhas teóricas, epistemológicas,
técnicas, etc. , no próprio seio do que a tradição dessa disciplina lhe
oferece. O que ele não escolhe - por ignorância ou não – nem por isso
deixa de exercer influencia sobre o desenvolvimento de sua pesquisa,
de modo idêntico ao campo doxológico.
Espaço metodológico quadripolar
O campo autônomo da prática cientifica pode ser concebido do ponto de
vista metodológico como a articulação de diferentes instancias, de diferentes
polos que determinam um espaço no qual a pesquisa se apresenta como
apanhada num campo de forças, submetida a determinados fluxos.
1. Pólo epistemológico - exerce função de vigilância critica. Ao longo da
pesquisa é garantia da objetivação, isto é, da produção do objeto
cientifico, da explicitação das problemáticas da pesquisa. Encarrega-se
de renovar continuamente a ruptura dos objetos científicos com os do
senso comum. Decide as regras de produção e de explicitação dos fatos,
da compreensão e da validade das teorias. Esse polo tem em sua orbita
uma gama de “processos discursivos”, de métodos que impregnam com
sua logica as abordagens do pesquisador.
Pólo teórico
Guia a elaboração das hipóteses e a construção dos conceitos. É o lugar
da formulação sistemática dos objetos científicos. Propõe regras de
interpretação dos fatos, da especificação e da definição das soluções
provisoriamente dadas às problemáticas. É o lugar da elaboração das
linguagens cientificas, determina o movimento de conceitualização.
O polo teórico avizinha-se dos “quadros de referencia” que lhe
fornecem inspirações e problemáticas provenientes das contribuições
teórico-práticas das disciplinas e dos “hábitos” adquiridos.
Pólo morfológico e pólo técnico
É a instancia que enuncia as regras de estruturação, de formação do
objeto cientifico, impõe-lhe uma certa figura, uma certa ordem entre
seus elementos. Permite colocar uma espécie de causação em rede
onde se constroem os objetos científicos, seja como modelos/copias
seja como simulacros das problemáticas reais. O polo morfológico
suscita diversas modalidades de quadro de analise.
O pólo técnico controla a coleta dos dados, esforça-se por contatá-los
para poder confronta-los com as teorias que os suscitou. Exige
precisão na constatação, mas sozinho não garante sua exatidão.

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