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Diferenciar para aprender na

sala de aula

Ariana Cosme
Universidade do Porto
“ (…) se é triste ver meninos sem
escola, mais triste ainda é vê-los
sentados enfileirados em salas sem
ar, com exercícios estéreis sem valor
para a formação do Homem”

Carlos Drummond de Andrade


Para alguns esta é
a metáfora
do mundo
perfeito…
O mundo perfeito !??
O mundo perfeito!??

Será?
Esse não é o mundo perfeito!!!

O mundo perfeito terá


que ser diverso, desde
que seja organizado
O mundo perfeito!!!
O mundo perfeito!!!

Será?
Um outro mundo é possível?
A diferença: O que fazer com ela?

 Como é que entendemos a


diferença no mundo em que
vivemos?

 A diferença é um problema ou
uma propriedade?
Diferenciação pedagógica:
De que é que estamos a falar?

 A diferenciação pedagógica como


resposta de natureza assistencialista

 A diferenciação pedagógica como


resposta de natureza compensatória

 A diferenciação pedagógica como


resposta de natureza inclusiva
A diferenciação pedagógica como resposta
de natureza assistencialista

 Segregam-se os alunos em função de


desafios curriculares e pedagógicos
com níveis de exigência diferentes.

 Admite-se a coexistência de vias


escolares insulares, entre si, com valor
formativo distinto.
A diferenciação pedagógica como resposta
de natureza assistencialista

 Diferenciar é sinónimo de segregar, em


nome da não penalização da diferença;

 A segregação educativa corresponde


quer a um propósito ideológico, quer à
preservação do paradigma pedagógico
da instrução como modelo educativo
dominante.
É este o mundo que desejamos?
A diferenciação pedagógica como resposta
de natureza compensatória

 Os projectos de diferenciação
pedagógica definem-se pelo seu
carácter remediativo;

 São projectos que se configuram em


torno de uma abordagem circunscrita
de diferenciação pedagógica.
A diferenciação pedagógica como resposta de
natureza compensatória

 A diferenciação dos desafios, dos


procedimentos e dos meios
pedagógicos é, nesta perspectiva, uma
resposta que se circunscreve, apenas,
aos alunos em dificuldades de
aprendizagem.
Só se reconhece a
diferença quando a
diferença penaliza?
A diferenciação pedagógica como uma
resposta de natureza inclusiva

 No âmbito de um projecto de uma Escola


Inclusiva recusa-se que a função da
Escola seja a de ensinar tudo a todos
como se de um só se tratasse.

 A diferenciação pedagógica não é


entendida como uma resposta para
enfrentar, apenas, as dificuldades de
aprendizagem dos alunos
A diferenciação pedagógica como uma
resposta de natureza inclusiva

 A diferenciação pedagógica como


eixo estruturante de uma escola
inclusiva conduz obrigatoriamente à
interpelação do próprio modelo de
educação escolar, dos planos de
estudos ou das estratégias de
mediação e de avaliação pedagógicas
que se animam e utilizam.
A diferenciação pedagógica como uma
resposta de natureza inclusiva

 Os projectos de diferenciação pedagógica,


nesta perspectiva, constroem-se a partir :

 da gestão flexível dos planos de estudos;


 da diversificação dos desafios, das
estratégias e das acções de apoio aos
alunos;
 da diversificação dos procedimentos e dos
instrumentos de avaliação e de uma
utilização formativa e formadora desses
procedimentos e desses instrumentos.
A diferenciação pedagógica como
uma resposta de natureza inclusiva
Promover a diferenciação pedagógica
inclusiva: Que obstáculos?

 Obstáculos de natureza pedagógica;

 Obstáculos curriculares.
Obstáculos de natureza pedagógica

• A afirmação de um projecto de
diferenciação inclusiva é incompatível
com a crença de que:
• o acto de aprender se constrói como
um processo de reprodução, o mais
fiel possível, por parte dos alunos,
desse conjunto de informações que os
professores vão divulgando, como
este acto não obrigasse a uma
actividade intelectual mais complexa
e exigente.
Obstáculos de natureza pedagógica

• A afirmação de um projecto de
diferenciação inclusiva é incompatível
com o peso que a avaliação normativa
assume num universo escolar mais
preocupado com a hierarquização dos
alunos do que, propriamente, com a
hetero e a auto-regulação das
actividades que aí ocorrem.
Obstáculos de natureza curricular

• A afirmação de um projecto de
diferenciação inclusiva é incompatível
com:

• uma concepção tecnocrática do currículo;

• a gestão burocratizada dos planos de


estudo.
Promover a diferenciação pedagógica
inclusiva: Que necessidades?

 Necessidade de estabelecer uma


ruptura com as concepções que
subordinam o processo de construção
do saber à reprodução de informação;

 Necessidade de estabelecer uma


ruptura com as concepções que
identificam a influência educativa com o
acto de ensinar e este com as
estratégias pedagógicas de carácter
expositivo;
Promover a diferenciação pedagógica
inclusiva: Que necessidades?

 Necessidade de afirmar os professores


como interlocutores qualificados.
Promover a diferenciação pedagógica
inclusiva: Que desafios?

 Desafios relacionados com a gestão


curricular;

 Desafios relacionados com a gestão


pedagógica das actividades;

 Desafios relacionados com a avaliação.


Desafios relacionados com a gestão
curricular

 Necessidade de promover uma


gestão curricular em função de
regulações de tipo interactivo, a
qual se distingue quer das
regulações de tipo antecipatório,
quer das regulações de tipo
retroactivo.
Desafios relacionados com a gestão
curricular

 As regulações de natureza interactiva


(Perrenoud, 2001) constroem-se em
função de um projecto de avaliação
dos alunos que visa, entre outras
coisas, apoiar os professores a
tomarem e a redefinirem decisões de
natureza curricular e pedagógica.

 Trata-se de um projecto de avaliação


que se caracteriza pelo seu carácter
contínuo e formativo.
Desafios relacionados com a gestão
curricular

 As regulações de natureza antecipatória


(Perrenoud, 2001) decorrem de todas as
actividades de avaliação diagnóstica que
visam diferenciar os alunos, por grupos de
rendimento escolar, no início de um ano
lectivo.

 O risco deste tipo de decisão curricular diz


respeito ao facto de poder contribuir para a
construção de uma Escola-Arquipélago, feita
de ilhas onde são reduzidas as oportunidades
para se sair desses espaços.
Desafios relacionados com a gestão
curricular

 As regulações de natureza retroactiva


(Perrenoud, 2001) decorrem das actividades
de avaliação que ocorrem no fim de um
determinado período de trabalho lectivo, de
forma a identificarem-se os alunos que
necessitam de ser submetidos a programas
de remediação educativa.

 As regulações de natureza retroactiva visam


estabelecer respostas «a posteriori» face aos
problemas sentidos pelos alunos.
Desafios relacionados com a gestão
curricular

 Não se recusam liminarmente, e em absoluto,


as regulações antecipatórias ou as
regulações retroactivas, apenas somos
obrigados a reconhecer alguns dos riscos que
as mesmas pressupõem.

 As regulações antecipatórias podem estar na


origem de procedimentos de discriminações
antecipadas que acabam por conduzir a
processos de segregação educativa
Desafios relacionados com a gestão
curricular

 As regulações retroactivas podem


traduzir uma opção pela utilização de
respostas compensatórias que tendem
a iludir a reflexão em torno da natureza
e da qualidade dos desafios e
actividades que os professores
propõem aos seus alunos.
Desafios relacionados com a gestão
pedagógica das actividades

 A construção de comunidades de
aprendizagem e a afirmação de um
projecto de diferenciação
pedagógica inclusiva

 A gestão de modalidades de apoio


pedagógico dirigidas a alunos com
dificuldades de aprendizagem
Desafios relacionados com a gestão
pedagógica das actividades

A construção de comunidades de
aprendizagem e a afirmação de
um projecto de diferenciação
pedagógica inclusiva
Comunidades de aprendizagem

 Uma sala de aula organizada como


uma comunidade de aprendizagem é
um espaço onde:

 cada um aprende à medida que os


outros aprendem;

 se sabe que todas as aprendizagens


são pessoais, mas ninguém aprende
sozinho.
Comunidades de aprendizagem

 Uma sala de aula organizada como


uma comunidade de aprendizagem terá
de ser abordada, do ponto de vista:

 da organização do espaço;
 da organização do tempo;
 do tipo de actividades que aí se
realizam.
A dimensão do espaço

 É um espaço organizado de forma a


possibilitar o trabalho colectivo, o
trabalho em grupo, o trabalho pessoal
e o trabalho autónomo dos alunos.

 Trata-se de um espaço cuja


funcionalidade tem de ser
compreendida pelos alunos, para que
estes o possam utilizar da forma mais
autónoma possível.
A dimensão do espaço
A dimensão do espaço
A dimensão do tempo

 A organização do tempo de trabalho


deverá permitir a realização do conjunto
de actividades atrás referidas que
permitem uma relação diferenciada com
as tarefas escolares.
 Neste domínio, há um conjunto de
instrumentos cuja utilização pelos alunos
estimula a sua participação na gestão do
tempo de trabalho que lhe diz respeito
A dimensão do tempo
A dimensão do tempo

Conselho • É a primeira e a última


actividade da semana
de Cooperação
Educativa • Espaço onde se tomam
as decisões acerca da
vida da turma, se
avaliam os
comportamentos, se
aprecia o trabalho
realizado e se planificam
as actividades
Instrumentos de apoio à gestão do
tempo e das actividades
Avaliação dos Planos Individuais de Trabalho
no Conselho de Cooperação Educativo
A dimensão do tempo

Tempo de • Ocorre diariamente (dura entre 1 h.


e 1,30 h.)
Estudo
Autónomo • É o tempo de que os alunos
dispõem para realizar actividades,
à sua escolha, previstas no seu
Plano Individual de Trabalho (PIT)

• Actividades: Fichas de trabalho,


escrita e revisão de textos,
resolução de problemas, trabalho
em grupo, projectos, etc.
Instrumentos de apoio à gestão do
tempo e das actividades
A dimensão do tempo

O trabalho • Corresponde a um tempo de


trabalho que nalgumas turmas é
em projectos diário e noutras é definido em
torno das necessidades dos
grupos

O tempo das • Surge na sequência do trabalho


em projectos
comunicações
• Corresponde a um tempo em que
obrigatoriamente se apresentam
os projectos e os seus
resultados à turma
Os projectos na Educação Infantil
Os projectos nas Séries Iniciais
O tempo das comunicações
A dimensão do tempo

As sessões • Não obedecem a nenhum tipo de cronologia


estabelecida
colectivas
• Devem corresponder a necessidades do
conjunto da turma

• Sessões mais frequentes:


- Reescrita de textos
- Apresentação de produtos e de estudos
- Discussão de diferentes tipos de soluções
face a um problema matemático
Desafios relacionados com a gestão
pedagógica das actividades

A gestão de modalidades de apoio


pedagógico dirigidas a alunos com
dificuldades de aprendizagem
Desafios relacionados com a gestão
pedagógica das actividades

Dentro da Fora da
sala de aula sala de aula

• Grupos de nível •Apoio pedagógico


. Ensino Mútuo acrescido
• Mentorias
. Salas de Estudo
•Planos de ensino . Apoio ao
individualizado Estudo/laboratórios
•Coadjuvações
de especialização
•Tutorias
. Apoio ao estudo
para exames
Grupos de Nível

 Os grupos de nível constituem uma resposta


para responder a dificuldades de aprendizagem
que não sejam nem episódicas nem profundas

 Os grupos de nível constituem-se no seio de


uma turma, sob a supervisão de uma ou mais
professoras que trabalham, em simultâneo, em
programas educativos diferentes
Grupos de Nível

 Vantagens:

Permitem que se desenvolvam programas


de intervenção educativa diferenciados,
sem sobrecarregar o horário escolar dos
alunos e sem os excluir da turma
Grupos de Nível

 A decisão de constituir grupos de nível obriga a


que se avalie:

• Quais os recursos humanos e materiais que a


escola pode disponibilizar;

• Se os professores têm experiência e


disponibilidade suficiente para trabalharem em
conjunto ao nível da planificação, da
monitorização e da avaliação dos projectos.
Grupos de Nível

 Questões a ter em conta:


 Não se pode confundir o projecto dos grupos
de nível com o projecto das turmas de nível;
 Os grupos de nível não constituem um
pretexto para excluir alunos;
 A criação de grupos de nível visa criar
oportunidades credíveis e autênticas de
aprendizagem diferenciada
Grupos de Nível

 Etapas da construção do projecto:

 Avaliação diagnóstico

 Identificação dos objectivos do programa

 Definir as sequências de ensino

 Avaliação formativa
Avaliação diagnóstico

 Objectivos:

 Identificar os pontos fortes e os


pontos fracos dos alunos
relativamente a temáticas
fundamentais no âmbito das diversas
disciplinas
Identificar os objectivos

 A identificação dos objectivos deverá


ter por referência os programas e os
documentos oficiais

 Devem identificar-se e definir-se as


tarefas que se espera que os alunos
realizem num determinado período de
tempo
Definir sequências de trabalho

 Define-se de forma sequencial as


tarefas que se espera que os alunos
realizem

 São as sequências de trabalho que


constituem um roteiro de apoio à
avaliação continuada dos alunos, por
parte dos professores
Avaliação formativa

 A função da avaliação consiste em


favorecer a pilotagem do projecto, de
forma a que os professores possam
tomar as decisões pedagógicas mais
adequadas
Ensino mútuo

 Finalidades:

 Organizar situações de trabalho em


que se geram situações de apoio
interpares
Ensino mútuo

 O papel do aluno-monitor

 Não é o de substituir o professor no papel


de ensinar, mas o de apoiar os colegas a
realizar determinados tipos de tarefas,
como, por exemplo, ajudando-os a superar
pequenas dificuldades instrumentais,
ajudando-
-os a decidir, tirando pequenas dúvidas e
incentivando-os.
Ensino mútuo

 Procedimentos básicos

 Definir previamente em que situações é


que se acciona este dispositivo

 Construir roteiros de apoio à acção dos


alunos envolvidos em situações de ensino
mútuo
Ensino mútuo

 Procedimentos básicos

 Utilizar quadros onde se registam as


situações de apoio mútuo (Preciso de ajuda
/ Quem ajuda?)

 Avaliar o trabalho desenvolvido com os


alunos, a partir de critérios previamente
estabelecidos
Planos de Ensino Individualizados

 É uma medida que se acciona:

 quando se verifica que os alunos têm


dificuldade de acesso ao currículo
estipulado;

 na sequência de reprovações.
Planos de Ensino Individualizados

 Procedimentos:

 Pressupõe uma avaliação precisa do


tipo de necessidades educativas
específicas que os alunos
manifestem
Planos de Ensino Individualizados

 Procedimentos:

 Explicitar o que os alunos são capazes de


realizar;
 Definir, em seguida, o que têm que realizar,
através da elaboração de um programa
educativo, onde se publicita o que se
pretende que os alunos realizem, os
períodos de avaliação e os intervenientes
no processo
 Apoio Pedagógico Acrescido:
 Assessorias
 Coadjuvações

 Tutorias de Estudo

 Aulas de Apoio

 Sala de Estudo

 … /…
Apoio Pedagógico Acrescido

 É uma medida de carácter compensatório

 É uma actividade educativa que se


acrescenta às actividades lectivas regulares
já existentes

 O objectivo é permitir que os alunos


superem as suas dificuldades académicas
Apoio Pedagógico Acrescido

 Situações que podem explicar o insucesso


da medida

 Os diagnósticos acerca das dificuldades vividas


pelos alunos são vagos e ambíguos

 As intervenções educativas subordinam-se à


lógica «mais do mesmo», que está na origem da
repetição dos conteúdos, da manutenção das
mesmas estratégias educativas ou da inexistência
de qualquer tipo de articulação entre os
professores regulares e aqueles que são
responsáveis pelo apoio acrescido
Apoio Pedagógico Acrescido

 Situações que podem explicar o


insucesso da medida

 Não se discute a aplicação


estandartizada do currículo, afirma-se,
apenas, a necessidade de promover a
adaptação dos alunos a esse modo de
gerir o currículo
Apoio Pedagógico Acrescido

 Como contrariar a estratégia «mais do


mesmo»?

 Organizar um processo de avaliação que


permita superar os estereótipos habituais,
clarificando-se o que os alunos já sabem e
são capazes de realizar e definindo-se,
assim, um programa adequado de trabalho
Apoio pedagógico acrescido

 Como contrariar a estratégia «mais do


mesmo»?

 Definir sequências de ensino que tenham em


conta a avaliação realizada;

 As sequências de ensino estruturam-se em


função de tarefas diversas que os alunos
deverão assumir;

 A monitorização deste processo ocupa um


lugar central na condução do mesmo.
Apoio Pedagógico Acrescido

Avaliação ambígua Avaliação precisa

O aluno tem dificuldades de O aluno identifica as ideias


interpretação principais de um texto, mas tem
dificuldades de aí encontrar a
informação pretendida

O aluno tem dificuldades na O aluno não utiliza as noções de


Estatística moda e média aritmética
Desafios relacionados com a
avaliação
 A avaliação constitui uma operação capaz de
apoiar o desenvolvimento de práticas de
diferenciação pedagógica quando passa a
ser pensada em função de um tipo de
avaliação de natureza criterial;

 A avaliação criterial visa aferir o


desempenho individual de cada aluno, em
função da referência que os objectivos de
aprendizagem definidos para esse aluno
constituem.
Desafios relacionados com a
avaliação
Avaliação normativa Avaliação criterial

A referência é o grupo, A referência é o próprio


com o qual os alunos são desempenho do indivíduo
comparados face aos objectivos do
programa
Desafios relacionados com a
avaliação
Avaliação normativa Avaliação criterial

A finalidade é classificar A finalidade é obter


e hierarquizar os alunos informações, de forma a
reorganizar as condições
da aprendizagem
Desafios relacionados com a
avaliação
Avaliação normativa Avaliação criterial

Adequa-se ao ensino Adequa-se a um tipo


simultâneo de ensino diferenciado
Desafios relacionados com a
avaliação

 A avaliação constitui uma operação


capaz de apoiar o desenvolvimento de
práticas de diferenciação pedagógica
se deixar de ser pensada, apenas,
como avaliação normativa
“ (…) se é triste ver meninos sem
escola, mais triste ainda é vê-los
sentados enfileirados em salas sem
ar, com exercícios estéreis sem valor
para a formação do Homem”

Carlos Drummond de Andrade


Ariana Cosme
ariana@fpce.up.pt

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