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Apendicite aguda

Anne Sanford, Jhéssica Almeida e Samuel Bitu


Fisiopatologia

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O quadro é originado devido à obstrução do
apêndice cecal por:
• Fecalitos/apendicolitos;
• Hiperplasia de folículos linfoides (principalmente em crianças);
• Neoplasias apendicular ou cecal (carcinoide, adenocarcinoma,
cistoadenoma mucinoso, mucocele de apêndice);
• Parasitas;
• Corpos estranho.
Segue com aumento da produção de muco intraluminal, distensão e
proliferação bacteriana, inflamação intensa com aumento da tensão
transmural, gerando congestão vascular com risco de necrose e
perfuração.

Microbiologia: Aeróbios e anaeróbios, principalmente E. coli, Bacterioides spp.

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Patogenia

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Epidemiologia

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Causa mais comum de abdome agudo!!!
• Mais comum nas segunda e terceira décadas de vida;
• Discreta predileção pelo sexo masculino;
• Risco ao longo da vida de 8,6% para o sexo masculino e 6,7% para
o sexo feminino;
• Emergência cirúrgica não obstétrica mais comum durante a
gestação;
• Risco aumentado em três vezes em membros de famílias que
possuem história positiva;
• Risco de malignidade associada é de 1%.

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Apresentação clínica

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Quadro clínico:
Dor abdominal difusa, mal localizada, com posterior migração para a
fossa ilíaca direita (FID);

Devido a sua localização variada, o apêndice pode


gerar padrões variados de dor: 
◦ Irradiação lombar, hipocôndrio direito, hipogástrica.
• Anorexia (sinal mais precoce);
• Náuseas e/ou vômitos;
• Febre;
• Queda do estado geral.

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Exame físico

• Dor à palpação no ponto de McBurney;

• Sinal de Blumberg: Dor à descompressão súbita no ponto de McBurney


(localizado na fossa ilíaca direita);

• Sinal de Rovsing: Dor na fossa ilíaca direita à palpação da fossa ilíaca


esquerda. A palpação do cólon descendente desloca os gases atingindo
o apêndice inflamado hipersensível, provocando dor;

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• Sinal de Lenander: Temperatura retal maior que a temperatura
axilar em mais de 1ºC;

• Sinal de Dunphy: Dor na FID que piora com a tosse;

• Sinal de Aaron: Dor epigástrica referida à palpação do ponto de


McBurney;

• Sinal do Iliopsoas: Dor na hiperextensão passiva ou flexão ativa do


membro inferior direito com o paciente em decúbito lateral esquerdo.
Presente no apêndice retrocecal;

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• Sinal de Lapinsky: Dor à compressão da FID enquanto se eleva o membro
inferior direito esticado. Presente no apêndice retrocecal;

• Sinal do obturador: Dor hipogástrica à flexão e rotação interna do quadril.


Presente no apêndice pélvico;

• Sinais de peritonite: Dor abdominal difusa, localizada, descompressão


dolorosa, abdome em tábua;

• Dor à percussão, soluços ou tosse (mais comum em crianças);

• Massa abdominal (suspeita de abscesso ou plastrão apendicular);

• Plastrão abdominal localizado;

• Redução do peristaltismo ou até mesmo ausência.


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Sinal do Psoas

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Sinal do obturador

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Abordagem diagnóstica

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◦ Exames Laboratoriais
• Exames laboratoriais estão indicados para
O diagnóstico de avaliação de gravidade, do
comprometimento sistêmico e sepse.
apendicite aguda é
clínico, • Achados:
Leucocitose com ou sem desvio à
dispensando esquerda;
exames • Elevação de proteína C reativa (PCR);
• Piúria.
complementares
• Atenção! Importante solicitar de teste de
confirmatórios. gravidez (ß-HCG) em mulheres em idade
reprodutiva para diagnóstico diferencial.

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Exames complementares
A) Ultrassonografia de abdome: Exame de eleição em gestantes e crianças;
• Sensibilidade moderada (86%), especificidade (81%);
• Pode confirmar o diagnóstico de apendicite aguda, porém, dada sua baixa
sensibilidade, não exclui o mesmo;

Achados:
• Sinal do alvo;
• Líquido livre em pelve;
• Estrutura tubular não compressível > 6 mm.
Limitações: Operador dependente, obesos, grande distensão de alças;
• Ultrassonografia pélvica/transvaginal são relevantes na avaliação de
mulheres dependendo da suspeita clínica;

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B) Tomografia de abdome:

Indicada em caso de dúvida no diagnóstico clínico (principalmente em crianças, adultos


mais velhos, mulheres em idade fértil, pacientes com diabetes, obesidade e
imunossupressão);
• Considerar em quadros de risco intermediário;
• 15% apresentam diagnóstico alternativo;
• Melhor avaliação em pacientes obesos, pela limitação da ultrassonografia;
• Inicialmente, solicita-se TC de abdome total sem contraste, sendo o exame com
contraste oral e venoso considerado em casos duvidosos;

• Não realizar TC de abdome em crianças antes da realização de ultrassom abdominal;


• Importante papel em idosos por conta de quadros neoplásicos simulando apendicite

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• Principais achados na TC:
• Diâmetro > 6 mm, com oclusão do lúmen;
• Espessamento da parede do apêndice (> 2 mm);
• Densificação da gordura periapendicular;
• Apendicolito (visto em aproximadamente 25% dos pacientes).

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C) Ressonância magnética de abdome: Também pode ser utilizada
como alternativa à tomografia em gestantes ou crianças;
• Pouco se sabe sobre seu uso e acurácia no diagnóstico de abdome
agudo;
• Não possui maior acurácia que o ultrassom na discriminação de
apendicite perfurada;
• Achados:
• Líquido pélvico;
• Linfadenopatia;
• Edema do íleo terminal.

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Escore de Alvorado modificado

Define a probabilidade diagnóstica de apendicite aguda a partir da análise da soma de


parâmetros clínico-laboratoriais, com pontuação máxima de 9:

•Três sintomas: •Achado laboratorial:


•Anorexia (1 ponto); •Leucocitose > 10.000/mm³ (2
•Náusea e/ou vômitos (1 ponto); pontos).
•Dor típica migratória (1 ponto).
•Três sinais: Atenção! O escore original de
•Dor em fossa ilíaca direita (2 Alvarado inclui desvio à esquerda (1
pontos); ponto), totalizando 10 pontos.
•Defesa à descompressão (1
ponto); Para cálculo existe calculadora. 
•Temperatura > 37,5°C (1 ponto).

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Classificação e conduta

Classificação e conduta:

0-3: Baixo risco:


• Orientação para retorno, se não melhora ou piora da clínica;
• Probabilidade de apendicite aguda: 3,7% adultos e 1,9% em crianças;

• Investigar outras causas de dor.


4-6: Risco moderado
• Admissão para observação e reavaliação;
• Se a pontuação continua a ser a mesma em 12 horas, indica-se cirurgia;
• Se paciente do sexo feminino, considerar TC de abdome;
• Probabilidade de apendicite aguda: 45% adultos e 12% em crianças.

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≥ 7: Alto risco:
• Se paciente do sexo masculino, proceder à apendicectomia;
• Se paciente do sexo feminino não grávida, indica-se laparoscopia
diagnóstica ou TC de abdome;

• Probabilidade de apendicite aguda: 87% adultos e 67% em crianças.

Limitações: Não considera comorbidades e estado de imunossupressão.

Boa sensibilidade, especialmente em homens, porém baixa especificidade.

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Air Score

◦ O AIR score (appendicits inflammatory response) avalia menos sintomas clínicos, porém


adiciona parâmetros inflamatórios como PCR e permite avaliar diferentes graus de
descompressão dolorosa, PCR, leucocitose, leucograma.

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Estratificação de risco AIR SCORE:

• Baixo: 0-4 pontos: Acompanhamento ambulatorial, se condição inalterada;

• Indeterminado: 5-8 pontos: Observação hospitalar, exames seriados, imagem


ou laparoscopia diagnóstica;

• Alto: 9-12 pontos: Exploração cirúrgica.

Probabilidade de apendicite em alto risco (88%), moderado risco (50%), baixo risco
(5%).
Parece sobrepor o escore de Alvarado em termos de acurácia.

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Classificação

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• Apendicite simples (não complicada): Edematosa/flegmatosa:

•Forma reversível;
•Aspecto macroscópico: Congestão, alteração de coloração, aumento no diâmetro,
exsudato, pus;
•Aspecto microscópico: Inflamação transmural, ulceração ou trombose com ou sem pus
extramural.
Apendicite complicada/complexa:

•Gangrena:
•Aspecto macroscópico: Apêndice friável, arroxeado/esverdeado ou enegrecido;
•Aspecto microscópico: Inflamação transmural com necrose;
•Perfuração iminente.

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•Perfuração:
•Aspecto macroscópico: Perfuração visível;
•Maior risco de complicações pós-operatórias;
•Ocorre em 13-20% dos casos;
•Mais comum em homens e idosos.

•Abscessos (pélvico/abdominais):

•Aspecto macroscópico: Massa identificada durante o exame ou abscesso


em imagem pré-operatória ou durante a cirurgia;
•Aspecto microscópico: Inflamação transmural com pus com ou sem
perfuração;
•Maior risco de complicações pós-operatórias.

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Diagnósticos diferenciais

• Enterite bacteriana ou • Pancreatite aguda


viral • Diverticulite sigmoide
• Adenite mesentérica • Obstrução intestinal
• Pielonefrite • Gravidez ectopica
• Litiase renal • Cisto ovariano roto
• Doença de Crohn • Torção ovário
• Colecistite • Salpingite aguda
• Diverticulite de Meckel • Abscesso tubo-ovariano
• Diverticulite cecal

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Complicações

• Infecção de sítio cirúrgico • Hérnia abdominal;


(mais comum); • Obstrução intestinal;
• Perfuração; • Fístulas entéricas;
• Peritonite fecal; • Apendicite de coto ou
• Coleções intra-abdominais; recorrência;
• Abscesso hepático • Sepse;
piogênico; • Óbito.
• Abscesso retroperitoneal;
• Pileflebite (trombose
séptica);

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Abordagem terapêutica

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Abordagem Geral
• Monitorização de sinais vitais;
• Hidratação e correção de distúrbios hidroeletrolíticos.
• Analgesia:
Pode ser realizada com combinações de analgésicos comuns (Dipirona,
Paracetamol), anti-inflamatórios não estereoidais e opioides;

• O controle álgico não aumenta significativamente o risco de intervenção


cirúrgica tardia ou desnecessária, assim como não altera o escore de
Alvarado.

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Tratamento Conservador

◦ Antibioticoterapia isolada pode ser considerada a primeira linha de tratamento em casos


selecionados de apendicite não complicada.

◦ Indicação: Apendicite simples não complicada tanto para crianças quanto para adultos.

• Antibioticoterapia: Cobertura para aeróbios e anaeróbios;

• Uso intravenoso por pelo menos 1-3 dias, depois seguir para via oral;

• Observação hospitalar;

• Total de terapia: 7-10 dias.

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Resultados: Resposta adequada inicialmente em 90% dos casos. Os 10% restantes
necessitam de cirurgia de resgate;

• Comparado com o tratamento operatório, os pacientes de tratamento conservador


apresentaram dor menor ou similar, menores doses de opioides, retorno precoce ao
trabalho e não apresentaram maior risco de perfuração;

• Cerca de 20-40% dos pacientes necessitam de apendicectomia durante o primeiro ano


após o tratamento, tanto adultos quanto crianças.

Preditores de boa resposta: PCR < 60 mg/L;


• Leucograma < 12.000;
• Idade < 60 anos.

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◦ Atenção! A presença de apendicolito no exame de imagem aumenta o risco de falha
terapêutica e recorrência, por associação de até 40% com apendicite complicada.

• Controversas/ressalvas:
Dificuldade da tomografia abdominal em definir o quadro complicado;
• Maior risco para pacientes idosos, imunossuprimidos ou comorbidades.
• Seguimento:Risco de 1,2% de malignidade associada aos quadros tratados
conservadoramente;
• Seguimento com colonoscopia:
• Indicação:Abscessos apendiculares tratados conservadoramente em pacientes com ≥
40 anos;
• Sintomas ou sinais laboratoriais/radiológicos suspeitos para malignidade colônica.

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Algoritmo de decisão

Baixo Risco (Alvarado < 4, AIR ≤ 4)

• Manejo extra-hospitalar;

• Considerar diagnóstico alternativo;

• Se possível, dar alta com revisão em 6-12 horas;

• Eventualmente, considerar ultrassonografia.

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Risco Intermediário (Alvarado 4-6, AIR 5-8)

• Considerar exame de imagem: Tomografia ou USG;


• Se normal, alta;

• Se dúvida, considerar observação;

• Se apendicite simples: Em paciente com sintomas moderados, há a possibilidade de


tentativa inicial de tratamento conservador ou seguir diretamente para o tratamento
padrão (apendicectomia);
• Se apendicite complexa:
• Instabilidade/peritonite: Apendicectomia de emergência;
• Estabilidade/abscessos/massa: Antibióticos, monitorização, drenagem percutânea,
repouso intestinal. Na falha, cirurgia.

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Alto Risco (Alvarado ≥ 7, AIR ≥ 9)

• Considerar tomografia para confirmação diagnóstica conforme protocolo local ou seguir


diretamente para tratamento cirúrgico;
• Avaliação cirúrgica precoce;

• Apendicite aguda simples: Se paciente com sintomas moderados, há a possibilidade de


tentativa inicial de tratamento conservador ou seguir diretamente para o tratamento padrão
(apendicectomia);
• Apendicite aguda complexa:
• Instabilidade/peritonite: Apendicectomia de emergência;
• Estabilidade/abscessos/plastrão: Antibióticos, monitorização, drenagem percutânea,
repouso intestinal. Na falha, cirurgia.

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Vias cirúrgicas
Vias:Laparoscópica: Vantagens:
• Menor taxa de infecção de sítio cirúrgico;
• Menor dor no pós-operatório imediato;
• Menor tempo de internação hospitalar;
• Menor formação de aderências.

Aberta: Vantagens:
• Menor taxa de abscessos intra-abdominais;
• Menor tempo cirúrgico (à depender da experiência do cirurgião).

Preferência pela via laparoscópica:


• Dúvida diagnóstica;
• Obesos;
• Idosos.

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Novas modalidades terapêuticas existem na literatura, incluindo cirurgia laparoscópica por
incisão única, cirurgia endoscópica transluminal por orifício natural (NOTES), via
transvaginal ou transgástrica, sendo ainda controversas.
• Cuidados pós-operatórios:
Iniciar com dieta leve dentro de 24-48 horas da cirurgia conforme aceitação;
Em quadros não complicados, suspender o uso de antibióticos;
Mobilização precoce.

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Referências bibliográficas

Rushing A, Bugaev N, Jones C, et al. Management of acute appendicitis in adults: A practice


management guideline from the Eastern Association for the Surgery of Trauma. J Trauma. 2019;
87(1)214-24.

Lee C K, Pelenyi SS, Fleites O, et al. Chronic Appendicitis, the Lesser-Known Form of
Appendiceal Inflammation: A Case Report. Cureus. 2021; 13(11):e19718.

Alvarado A. Clinical Approach in the Diagnosis of Acute Appendicitis. IntechOpen. 2018. 1-31.
Snyder MJ, Guthrie M, Cagle S. Acute appendicitis: efficient diagnosis and management.
American Family Physician. 2018; 98(1):25-33.

Sartelli, Chichom-Mefire A, Labricciosa FM, et al. The management of intra-abdominal infections


from a global perspective: 2017 WSES guidelines for management of intraabdominal infections.
World J Emerg Surg. 2017; 12:29 .

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