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Metropolis

Por Mariana Vieira Viveiros

Considerado por muitos como o primeiro filme de ficção científica, Metropolis representa
também o début da figura do robô na história do cinema.

O filme é a grande obra-prima do diretor austríaco Fritz Lang e um dos célebres


representantes do expressionismo alemão, ao lado do igualmente clássico O Gabinete do
Doutor Caligari, de Robert Wiene.

A história se passa no ano de 2026, exatamente um século depois do lançamento do filme,


de 1926.

O mundo de Metropolis, a futurística e aterradora cidade do título, é frio, mecânico e


industrial.

A descrição reflete o imaginário característico da época, quando a Revolução Industrial já


atingira seu ápice e o sistema econômico de produção capitalista começava a dar sinais
evidentes de desgaste, o que certamente levava a um certo pessimismo quanto ao futuro.

E o futuro de Fritz Lang, ainda que apresente certos traços de ambigüidade (uma beleza
deliciosamente decadente e melancólica), traça um prognóstico nefasto do que
aconteceria aos grandes centros urbanos caso o industrialismo seguisse um caminho
desenfreado e inconseqüentemente manipulador.

Metropolis é um território dividido entre duas classes, ontologicamente opostas: de um


lado os senhores, os mestres da cidade, e de outro, a grande massa de operários,
oprimidos não somente pela elite dominante, como, sobretudo, pelas máquinas.

As máquinas... Elas ocupam um lugar de tamanha importância no funcionamento e


sobrevivência de Metropolis, que poderiam mesmo ser classificadas como uma "terceira
classe social" na estrutura da cidade.

Na verdade, elas se tornam, num sentido, mais importantes até mesmo que os próprios
trabalhadores humanos e se localizam num nível intermediário entre a beleza onírica dos
"Jardins do Paraíso" e a opressão de concreto da cidade dos operários.

Os trabalhadores operam as máquinas e, por sua vez, as máquinas operam os


trabalhadores. Homem e tecnologia estão fatidicamente ligados, numa relação de
dependência que ilustra o terror da modernidade frente o pretenso poder dominador da
técnica sobre o ser humano, uma certa crença paranóica na sua independência e no seu
descontrole.

A desumanização do trabalhador, a formação de hordas de autômatos, massacrados pela


rotina mecânica e monótona, escravizados pelo aparelho é um dos temas presentes no
filme, uma preocupação que permeava o início do século e as doutrinas filosóficas, a
exemplo do Marxismo.

Os operários de Metropolis, assim como os de Tempos Modernos, de Charles Chaplin,


formam rebanhos. A cena em que Freder tem uma alucinação e vê trabalhadores sendo
literalmente engolidos pela monstruosa máquina em que trabalham revela uma tecnologia
cuja fome de vidas humanas é insaciável.

Previsões trágicas, futuros fantasticamente aterrorizantes, a cidade como um universo


caótico, belo e perverso, as "aero-vias", a tecnologia massacrando a humanidade...
Algumas das mais sólidas bases para a ficção científica cinematográfica são aqui lançadas
e irão influenciar a construção de outras "Metropolis", como a Los Angeles de 2019,
de Blade Runner.

Como em tantos outros filmes do gênero, o robô de Metropolis não possui vontade própria,
mas apenas obedece a uma programação pré-determinada pelos seus manipuladores, os
"velhos homens humanos".

Ainda assim, ele, também como manda a cartilha da ficção científica, é o grande culpado
pelos descaminhos e mazelas que causa. O homem por trás da máquina está sempre
acima das críticas e punições. No fim, somente o robô e seu criador, aquele que ousou
"brincar de Deus", são condenados.

Todos os conceitos e análises aqui elaborados são maximizados pela força e poder das
imagens criadas por Fritz Lang. Ele abusa da iluminação focal, especialmente na cena em
que Rotwang persegue Maria nas catacumbas com uma lanterna; da força expressiva das
mãos e olhos, basta atentar para as diferenças sutis, mas fundamentais, entre a
verdadeira Maria e o robô, e da teatralidade no gestual.

Além disso, Lang fez de Metropolis uma verdadeira superprodução para a época,
utilizando-se de recursos técnicos impressionantes, construindo cenários perfeitos e
grandiosos e utilizando-se de 36.000 figurantes para criar, em dois anos de filmagens, sua
visão claustrofóbica e angustiante do futuro. Não deixando de ser um filme de idéias,
Metropolis sabe dosar uma boa história com efeitos especiais que até hoje convencem.

A cena em que o robô assume as feições e o invólucro humano de Maria, que lembra
muito o "nascimento" de Frankenstein, estabeleceu paradigmas estéticos que até hoje são
seguidos em filmes do gênero. A miríade de fios, ligando homem a máquina, as luzes, a
fumaça, os efeitos especiais usados na transformação já tornaram-se clichês de cenas
semelhantes.

Metropolis não é apenas um clássico da ficção científica cinematográfica, mas também


reforça o papel do cinema, enquanto meio de massa, inserido no fluxo de uma
determinada era cultural, em manifestar e dar corpo, através das imagens, a aspectos
sociais, filosóficos e relacionais da situação do homem perante seu tempo, perante o outro
e perante a técnica.

http://www.nautilus.com.br/clientes/Backup_pontes/diversos/metropolis.htm

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