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O GLOBO ● O PAÍS ●

PÁGINA 12 – Edição: 21/03/2010 – Impresso: 20/03/2010 — 10: 27 h

COMO O FUNDO DA BANCOOP NAUFRAGOU - Leila Suwwan

O que é o "FDIC Bancoop 1"?

É um "fundo de investimento em direitos creditórios", o que significa que o investidor compra uma carteira de
"créditos a receber", neste caso, garantidos pelos contratos de financiamento da Cooperativa Habitacional dos
Bancários de São Paulo. A meta de rentabilidade dos pagamentos foi estabelecida em 12,5% + IGPM

Qual é a suspeita?

O Ministério Público investiga se os recursos captados pelo FDIC no mercado foram usados para cobrir um
"rombo" na Bancoop,supostamente causado por desvios milionários para as campanhas do PT desde 2002

Quem investiu no Fundo?

O fundo tem 10 cotistas "sêniores", que no total aportaram R$ 37,4 milhões, sendo cerca de R$ 26 milhões de
fundos de pensão de estatais: Funcef, Petros e Previ. A Bancoop detém as cotas subordinadas, completando
um capital total de R$ 49 milhões

O que aconteceu?

O Fundo, lançado com nota AA de risco, se deteriorou até virar um "papel podre", com nota "CCC" de risco,
a pior da escala. No fim do ano passado, a Bancoop comprou a participação dos outros investidores e pretende
liquidar o fundo neste mês Participação dos cinco principais cotistas, de meados de 2005 até novembro de
2009:

Funcef (Caixa)
27,22%

Petros (Petrobras)
26,72%

Banesprev (Banespa)
12,82%

Previ
(Banco do Brasil)
11,63%

08Lançamento do Fundo, com a expectativa de captar até R$ 60 milhões. O Fundo arrecada cerca de R$ 43
milhões; cerca de R$ 27 milhões são dos fundos de pensão de estatais O Ministério Público de São Paulo abre
inquérito criminal para investigar os supostos crimes de formação de quadrilha, estelionato, apropriação
indébita e lavagem de dinheiro na Bancoop; em julho, a Justiça autoriza a primeira quebra de sigilo bancário
da Bancoop João Vaccari Neto assume a presidência da Bancoop Standard&Poors rebaixa nota do FDIC
Bancoop 1 Standard&Poors rebaixa nota do FDIC Bancoop 1 para "CCC", o
pior patamar, indicando

"EXTREMA VULNERABILIDADE"

Standard&Poors aponta divergência entre o valor real do patrimônio e das cotas do Fundo e o valor divulgado
pela Bancoop, que está inflado. Aponta ainda que o acordo de liquidação resultará em lucro reduzido João
Vaccari Neto se licencia da Bancoop e assume tesouraria do PT Promotor José Carlos Blat acusa Bancoop de
ser uma "organização criminosa" e consegue aval da Justiça para obter mais dados bancários sobre a
cooperativa Bancoop compra as cotas dos investidores pelo valor original mais rentabilidade acumulada
equivalente ao INPC + 6% ao ano, menor que a prevista de IGPM + 12,5% Bancoop anuncia intenção de
liquidar Fundo
Fundos de pensão arriscaram dinheiro na Bancoop

Cooperativa, hoje mergulhada em denúncias de fraude e desvios


políticos, montou operação em que assume sozinha rombo no
FDIC

Leila Suwwan

● SÃO PAULO. Cinco anos depois de ser lançado com pompa e prestígio, o fundo de investimento da
Bancoop (Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo) deve ser liquidado neste mês com um
prejuízo acumulado de quase R$ 34 milhões.

O tamanho exato do rombo que ficou no colo da cooperativa é uma incógnita.

A operação foi montada de forma a garantir uma “saída honrosa” para os fundos de pensão de estatais e
outros investidores — deixaram de lucrar R$ 11 milhões, mas se livraram do papel “podre” da Bancoop, hoje
mergulhada em denúncias de fraude e desvios políticos.

Em tom de celebração, a Bancoop divulgou em informativo enviado a milhares de cooperados na virada do


ano que “O FDIC Bancoop não existe mais” e que “todos os compromissos
foram honrados”. Na realidade, o que aconteceu é que a cooperativa não deve mais a terceiros, se tornou
a dona única do desfalque.

Para isso, desembolsou R$ 18 milhões de recursos próprios adicionais para bancar a saída dos demais.
De acordo com o balancete de fevereiro, enviado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o FDIC
acumula R$ 33,97 milhões em recebíveis vencidos e não pagos.

O FDIC é um fundo de investimento em direitos creditórios, no qual os investidores aplicam uma soma
inicial e recebem o dinheiro de volta com prazos e lucros programados.
Entre 2004 e 2005, a Bancoop captou R$ 37,5 milhões no mercado — R$ 26 milhões vieram dos fundos
Petros, Funcef e Previ — e entrou com uma garantia de outros R$ 9 milhões em recebíveis.

A promessa era repagar em três parcelas anuais, com um lucro de 12,5% ao ano, mais correção de inflação
pelo IGPM. Mas o negócio azedou no fim de 2007, quando a Bancoop começou a cobrar custos adicionais
dos cooperados, além de ter seu nome envolvido em escândalos políticos do PT, como o “mensalão” e os
“aloprados”.

Suspeitas de que os milhões do FDIC não foram para obras

As associações de cooperados suspeitam que os milhões do FDIC “sumiram”, já que as obras teriam
praticamente parado desde então.

— Esperávamos que as construções ficassem a pleno vapor, com um investimento tão


alto. Mas não foi isso que aconteceu. Nossa suspeita é que o dinheiro entrou e saiu sem ser
aplicado nas obras — desabafa Dinalva Lombardi, uma das cooperadas no empreendimento Anália Franco.

De acordo com um dos advogados dos cooperados, Valter Picazio, o FDIC afundou ao
mesmo tempo em que começaram a chegar as cobranças adicionais. Foi justamente em 2007, conforme relata
a Standard & Poors, agência de risco responsável por monitorar o FDIC, que a Bancoop começou a injetar
mais recursos próprios para honrar os compromissos com os investidores.
Regras do fundo foram flexibilizadas

Prazos foram estendidos até 2011, e as regras do fundo foram flexibilizadas. Mesmo assim, o fundo não se
sustentava sozinho. Em 2008, o fundo ganhou nota “CCC”, ou “junk”, a pior categoria de risco no jargão
econômico. Em 2009, uma espécie de maquiagem contábil foi usada para esconder o tombo das cotas, e a
Standard & Poors quase foi afastada.
Até fechar negócio, os fundos de pensão estavam numa canoa furada, sem expectativas reais
de conseguir receber seus direitos.
Essa deterioração é a história que contam os balancetes, relatórios de risco e atas
de assembléias de cotistas do fundo, recolhidas e analisadas pelo GLOBO. Somente a quebra do sigilo
bancário do FDIC vai revelar onde foi parar esse dinheiro. Nas obras não foi. Sumiu — disse Picazio.
O promotor José Carlos Blat, do Ministério Público Estadual de São Paulo, conseguiu na Justiça acesso
a essa movimentação.

Venda de cotas evitou prejuízo para investidores.


Saída de emergência assegurou meta de rentabilidade

● SÃO PAULO. Diante do risco de perder quase R$ 29 milhões com o naufrágio do Fundo Bancoop, a venda
das cotas acabou significando uma saída de emergência para os investidores
entre eles Funcef (Caixa), Petros (Petrobras) e Previ (Banco do Brasil). Todos saíram com uma
lucro de 6% ao ano, com correção pelo IPCA, o que cumpre as metas de rentabilidade e impede
acusações de prejuízo, freqüentes na arena política.

Segundo dados da Planner, administradora do FDIC, a Bancoop pagou R$ 18 milhões pelas cotas dos
investidores, obtendo um desconto de cerca de R$ 11 milhões no que era originalmente devido.
Cerca de R$ 7 milhões se referem aos três fundos de pensão estatais, cujos dirigentes eram ligados
ao PT e ao Sindicato dos Bancários.
A meta original de rentabilidade do FDIC era 12,5% ao ano, com correção pelo IGPM.
A diferença entre a rentabilidade- meta e a rentabilidade do acordo é expressiva, conforme calculou o
economista José Dutra Sobrinho.
No caso da Petros, que investiu R$ 10 milhões de setembro de 2004 a novembro de 2009, o resgate final
poderia ter alcançado R$ 23 milhões. Porém, pelo IPCA mais 6% ao ano, a rentabilidade ficaria em torno de
72%, compatível com o valor presente do resgate informado em nota, R$ 17,3 milhões.

Rentabilidade de 6% ao ano, mais IPCA, é satisfatória

Procurados, todos os fundos manifestaram posições semelhantes: a saída foi um bom negócio, porque o
acordo evitava perdas financeiras e o prognóstico era sombrio, diante do risco elevadíssimo que o FDIC
adquiriu a partir de 2008. A rentabilidade de 6% ao ano mais IPCA cumpre a exigência mínima de todos eles.

O acordo foi bom para ambas partes. Para os investidores, garantiu um retorno dentro do que a
regulamentação do setor estabelece. E a cooperativa conseguiu um deságio que foi benéfico. Permitirá a
liquidação do fundo com dispêndio de recursos menor do que o previsto — disse o advogado da Bancoop,
Pedro Dallari.

Segundo ele, se o fundo fosse à liquidação judicial, os cooperados seriam os maiores prejudicados, porque
os contratos de financiamento eram a garantia do investimento.

A decisão de investir no FDIC sempre foi questionada e pouco se sabia sobre a composição dos cotistas,
que incluem, aparentemente, uma pessoa física, Tomio Otsuka, com 0,15% de participação. Também
participaram, com 2,67%, o Instituto de Previdência dos Servidores de Nova Iguaçu (Previni), ligado à
prefeitura comandada pelo petista indberg Farias desde 2005.

Presidente desse fundo, Gustavo Falcão Silva é cobrado pela fundação de servidores municipal
por um suposto rombo de cerca de R$ 80 milhões. Ele não foi localizado
no Previni. ■
Para auditoria, cooperativa alterou balanços
Consultoria reclamou de atrasos e dos dados apresentados
● SÃO PAULO. Na tentativa de esconder a inviabilidade do FDIC em 2009, a Bancoop chegou a
“maquiar” o valor das cotas e a pagar amortizações aos investidores com recursos próprios, de origem
desconhecida. Mesmo ao questionar o rótulo de prejuízo na cifra negativa de seu próprio balanço, a
cooperativa reconhece que a liquidação do fundo pode significar perda de mais de R$ 34 milhões, caso a
inadimplência prossiga.

— Desde 2007, as amortizações começaram a ser feitas com recursos próprios — explicou Jean Pierre Cote
Gil, analista da Standard & Poors que monitorava o FDIC até o início deste mês. Depois que a agência
rebaixou o fundo para “CCC”, quase teve seu contrato rescindido.

A decisão foi aprovada em janeiro e revogada em agosto de 2009. Em seus relatórios, a agência registrou
atrasos excessivos no envio de dados e discordou publicamente da contabilidade do cliente, que estava
inflando o valor das cotas dos investidores.

Os valores das cotas não vêm sendo calculados com base na definição (do regulamento do fundo). O valor
das cotas subordinadas reportado é negativo, enquanto o valor da cota sênior incorpora uma valorização de
acordo com a rentabilidade-alvo, embora o desempenho do colateral não propicie lastro para o reconhecimento
da rentabilidade- alvo”, diz o relatório de risco de outubro de 2009.

— Isso não é pratica comum — reiterou Jean Pierre Gil.

Manobra mantinha valor de cotas artificialmente alto

A manobra mantinha o valor das cotas dos investidores, entre eles os fundos de pensão, artificialmente
elevado, quando deveriam valer, na ausência de lucro, apenas o equivalente ao patrimônio que restava.
No período, o FDIC não gerava recursos para honrar compromissos. A Bancoop esticava a dívida ou entrava
com mais dinheiro.
— Não são novos aportes. O fundo tinha recebíveis. Quando alguns estavam vencidos há mais de 60 dias, a
Bancoop mandava recebíveis com prazo mais longo ou mandava dinheiro, e eu devolvia os vencidos —
explicou Arthur Martins de Figueiredo, diretor da Planner.
— Onde ela vai buscar esses recursos, essa é uma situação que deve ser bastante indagada.
a gente não pode dizer.
A não ser que ela tenha fontes que eu desconheço — completou.
Não está claro se a Bancoop usou recursos de outros cooperados para dar sobrevida ao fundo.
Figueiredo disse que o prejuízo de R$ 34 milhões se refere a recebíveis vencidos e não-pagos.
Outros R$ 15 milhões são recebíveis que não venceram. Juntos, somam patrimônio líquido de R$ 49 milhões.
— É prejuízo em termos, porque agora ela vai ter toda a essa carteira de recebíveis para cobrar
de novo — disse. ■

EXTRA -Fontes externa ao jornal Globo publica:

FUNDOS DE PENSAO

FUNCEF...................27,22%..........CEF (11.2 MILHOES 2004)


PETROS...................26.72%..........Petrobrás (10.6 MILHOES SET 2004)
BANESPREV ...........12,82%..........Banespa (5.0 MILHOES OUT 2004)
PREVI......................11,63%..........Banco do Brasil (5.0 MILHOES MAIO 2005)
FIPECq.................... 8,02%...........Servidores da FINEP do IPEA,CNPq, INPE, INPA
Megainvest..............5,84%...........Fundo de aplicação em cotas
Redeprev..................4,64%...........Fundação rede de previdência
previni.................... 2,67%............Servidores Mun. NOVA IGUACU
Pouprev..............,.....0,27%...........Fundação de seguridade social
Tomio Otsuka...........0,15%..........Investidor

total...................100%

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