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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.1 INTRODUÇÃO

A revisão de literatura discorre inicialmente sobre a manga (Mangifera indica),


abordando aspectos de sua classificação botânica, origem e difusão geográfica, enfatizando a
origem das duas variedades de manga utilizadas neste trabalho, Var. ‘Espada’ e Var. ‘Tommy
Atkins’.
Além disto, são reportados alguns dados sobre a produção nacional e mundial da
fruta, bem como formas de consumo. Estas informações têm o intuito de chamar a atenção
para o volume de resíduo gerado pelo processamento da fruta, atualmente disposto em aterro
ou usado para compostagem.
Na sequência, são abordados alguns aspectos sobre a classificação e estrutura
química genérica dos principais grupos de compostos fenólicos. Contextualizando para a
manga, é apresentado um resumo histórico dos estudos sobre os constituintes fenólicos da
planta, tornando evidente que ainda há poucas publicações sobre os constituintes da casca da
fruta.
São também abordados tópicos relacionados à metodologia de extração sólido-
líquido e determinação de compostos fenólicos, bem como sua importância para a indústria de
alimentos e para a saúde humana.
Finalmente, com o intuito de permitir um melhor entendimento ao leitor, são
abordados tópicos referentes ao tratamento estatístico adotado no presente trabalho.

2.2 A MANGA

No que se refere à classificação botânica, a manga (Mangifera indica L.) pertence


ao gênero Mangifera, que inclui cerca de 850 espécies de árvores da família Anacardiaceae,
constituída em sua maioria, de espécies tropicais nativas da Ásia (UDR, 2007a). Originou-se
no segundo grande centro que se divide em dois subcentros: o Indico-Burma-Tailandês e o
Filipínico-Celeste/Timor. Estes dois subcentros deram origem às duas raças de mangas hoje
conhecidas pelos estudiosos da mangicultura: a raça indiana que possui frutos de formato
oblongo-ovalado com sementes monoembriônicas e, em geral, com casca rósea a vermelha
conforme Figura 1 e a raça filipínica ou indochinesa com frutos de formato longo com
sementes poliembriônicas e casca variando de verde a amarela conforme figura 2
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(MUKHERJEE, 1985 apud PINTO e FERREIRA, 1998a). Neste trabalho foram utilizadas
duas variedades de manga, com potencial econômico para a região, representantes das duas
raças citadas: manga da variedade “Tommy Atkins” representando a raça indiana e manga
“Espada”, representando a raça filipínica.

Figura 1 - Fruto da variedade “Tommy Atkins”

Figura 2 - Fruto da variedade “Espada”


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Popenoe (1939 apud PINTO E FERREIRA, 1998b) atribui o início da dispersão da


manga em todo mundo ao viajante chinês Hwen Tsang que visitou o Hindustão por volta de
632 d.C. Quanto à dispersão na América, os portugueses foram os primeiros a introduzirem a
manga no início do século XVIII, provavelmente no Brasil e os espanhóis no México por
volta de 1779. A manga então introduzida no Brasil pertencia à raça filipínica, geralmente
fibrosa e poliembriônica, apresentando limitada variação genética. A dominância desta raça
perdurou por três séculos limitando a expansão da cultura.
A introdução da manga no México e Panamá também foi proveniente das Filipinas
o que justifica a predominância até pouco tempo da manga Manila, no México. Já na Flórida,
a manga foi introduzida de Cuba, com variedades da raça indiana, que são monoembriônicas e
portadoras de melhor qualidade. (PINTO e FERREIRA, 1998c; UDR, 2007b).
Pinto e Ferreira (1998d) destacam que na década de 60, novas variedades de manga
procedentes da Flórida foram introduzidas no Brasil, com frutos mais resistentes à antracnose,
com pouca fibra e bem coloridos. Apesar destes frutos trazerem novo alento à cultura
organizada da manga, somente a partir de meados dos anos 80 iniciou-se a expansão da
mangicultura no Brasil, estendendo-se por toda década de 90. Do estado de São Paulo, foram
difundidas as novas variedades para o restante do país. Na região semi-árida nordestina foram
implementados vários empreendimentos, com plantios comerciais de variedades demandadas
pelo mercado externo.
Segundo Silva e Correia (2004a), estes empreendimentos consistiam de pólos de
agricultura irrigada com incorporação de plantios tecnificados, principalmente no Vale do São
Francisco, abrangendo os estados de Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe, e
em outras áreas irrigadas como as dos Vales do Jaguaribe, Açu-Mossoró e Parnaíba situadas
nos estados do Ceará, Rio Grande do Norte e Piauí, respectivamente.
Com relação a outras regiões do mundo, de acordo com Araújo (2004), a produção
de manga na Europa ainda é pequena, concentrando-se principalmente no sul da Espanha e na
região da Sicília, Itália, onde se cultivam as variedades Tommy Atkins e Keitt. Entretanto, a
quantidade produzida é insuficiente para suprir a demanda do mercado, motivo pelo qual a
comunidade européia ainda ter que importar manga do México, Brasil, Peru, Equador e Haiti.
Para se ter uma idéia, em 2000 estes países responderam por 95% da manga importada pela
União Européia.
Já na Índia, uma das regiões que deram origem ao fruto, as plantações de manga
ocupam uma área correspondente a 1,23 milhões de hectares, de um total dos 5,57 milhões de
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hectares ocupados com pomares. Nesta região a manga não está ligada apenas à atividade
econômica, mas à vida cultural e religiosa.(HORTICULTUREWORLD, 2007).
Atualmente a manga pode ser encontrada nos principais mercados mundiais, ao
longo de todo o ano, fazendo jus ao seu cognome de "rainha das frutas", sendo considerada
uma das frutas tropicais mais importantes do mundo, ocupando o quarto lugar no mercado
internacional, depois da banana, abacaxi e abacate. (UDR, 2007c; SHARMA e outros, 2005a;
PINO e outros, 2005).
Com relação ao panorama mundial, a produção de manga em 2005 ficou em torno
de 28,51 milhões de toneladas, englobando mais de 90 países, com um crescimento médio
anual de 2,6% entres os anos de 1996 a 2005. A produção mundial de manga ainda é bastante
concentrada, visto que deste total, 38,6% são produzidos na Índia, cerca de 12,9% na China,
6,2% na Tailândia, seguidos do México com 5,5%, Indonésia com 5,3%, Paquistão com 4,5%
e Brasil ocupando o sétimo lugar entre os dez maiores produtores mundiais, com uma
produção anual de cerca de 1,22 milhões de toneladas, e participação de 4,3% no volume
total ofertado (BERARDINI e outros, 2005b; EVANS, 2008; MANICA e OLIVEIRA, 2005;
PEROSA e PIERRE, 2002).
No que diz respeito à forma de consumo, a manga pode ser utilizada de diversas
formas, sendo que a principal delas ainda é consumo in natura. Quando processada, pode ser
consumida na forma de: geléias, gelatinas, conservas em forma de picles, barrinhas da fruta e
sucos concentrados em pó (SCHIEBER e outros, 2003). Além destas formas mais consumidas
no mercado externo, aqui no mercado interno a manga madura serve de matéria-prima para
produção de sucos concentrados, ultrafiltrados, clarificados e polpa congelada, esta última
também utilizada como matéria-prima na indústria de produtos lácteos, sorvetes, doces,
néctares e bebidas refrigerantes (KUSKOSKI e outros, 2006). Como resíduos do
processamento industrial as cascas e os caroços, que representam de 35 a 60% do peso total
da fruta, freqüentemente são descartados em aterro, resultando em acúmulo de lixo e
conseqüentemente causando impacto ambiental (LARRAURI e outros, 1996). Mais
recentemente, estão sendo propostos outros usos para compostagem ou produção de rações,
produtos com baixo valor agregado.
Pode-se resumir o que foi exposto anteriormente, concernente à origem, produção e
utilização da manga, dizendo que a manga originária dos dois subcentros Índia e Filipinas, ao
longo dos séculos, foi disseminada para diversos países, sendo produzida atualmente em
quase uma centena de países. Apesar da dispersão, a produção de manga ainda é bastante
concentrada, com a Índia, ocupando a liderança do ranking de produção. O Brasil ocupa
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posição entre os dez maiores produtores, com destaque para a região Nordeste, que responde
por 50% da produção nacional. Uma parte desta produção é destinada ao processamento de
sucos, polpas, geléias e outros. Como resultado do processamento da fruta, a casca e o caroço,
que a depender da variedade representam 35 a 60% do peso total da fruta, são descartados em
aterros. Pelo exposto, presume-se que estudos são necessários para avaliar o potencial de
utilização deste resíduo como forma de minimizar o impacto ambiental e agregar valor aos
subprodutos do processamento da manga.

2.3 OS COMPOSTOS FENÓLICOS

Os compostos fenólicos fazem parte de um grande e complexo grupo de substâncias


orgânicas, que ocorrem de maneira universal nas plantas. Os vegetais superiores sintetizam e
acumulam uma grande diversidade de compostos fenólicos, os quais conferem defesa contra
os ataques dos radicais livres, que são formados como subprodutos provenientes do processo
de fotossíntese e contra injúrias dos tecidos.
Tais compostos parecem estar envolvidos em praticamente qualquer interação da
planta com o ambiente abiótico. Fatores naturais como irradiação solar, luz UV, seca,
nutrientes e estações do ano influenciam no metabolismo e na produção destes compostos.
Além destes, outros fatores artificiais, como poluentes, também podem interferir (JORDAN e
outros, 1991, apud SANTOS e BLATT, 1998; SHUKLA e outros, 1997).
Mamede e Pastori (2004a), afirmam que já foi detectada a ocorrência de mais de
8.000 compostos fenólicos em plantas. Segundo Luthria (2006a), os compostos fenólicos
podem ser classificados em dois grandes grupos: grupo dos compostos fenólicos simples e
grupo do compostos polifenólicos, que podem ser observados através do quadro mostrado na
Figura 3.

2.3.1 Os compostos fenólicos simples

Os compostos fenólicos simples são substâncias que se caracterizam pela existência


de um anel benzênico, um grupamento carboxílico e um ou mais grupamentos de hidroxila ou
metoxila ligados diretamente à estrutura cíclica, conferindo propriedades antioxidantes tanto
para os alimentos como para o organismo (MARASCHIN, 2003). A atividade antioxidante
dos fenólicos simples está relacionada com a posição dos grupos hidroxilas e também com a
proximidade do grupo carboxílico com o grupo fenil. Quanto mais próximo esse grupo estiver
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do grupo fenil, maior será a capacidade antioxidante do grupo hidroxila na posição meta
(MAMEDE e PASTORI, 2004b).

Figura 3 - Classificação química dos compostos fenólicos


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De acordo com os grupos de substituintes, os compostos fenólicos simples podem


se dividir em dois subgrupos: os ácidos fenólicos e as cumarinas. Os ácidos fenólicos estão
largamente distribuídos nos legumes e grãos de cereais, conjugados com açúcares e proteína,
enquanto que as cumarinas são amplamente encontradas na natureza, distribuídas entre
espécies de hábitos bastante diversificados, como árvores, arbustos e ervas e estão presentes
tanto nas raízes como nas flores e frutos de diferentes famílias de Angiospermae como
Apiaceae, Rutaceae, Asteraceae. (RIBEIRO e KAPLAN, 2002; WHITE e XING, 1997a).
O grupo dos ácidos fenólicos se divide basicamente em dois subgrupos, os
derivados do ácido benzóico e os derivados do ácido cinâmico. Os derivados do ácido
benzóico são substâncias com uma estrutura básica de sete carbonos (C6-C1) cujas estruturas
básicas estão ilustradas na Tabela 1. Estes ácidos sofrem substituições nas posições meta e
para dando origem, por exemplo, ao ácido gálico.
Já os derivados do ácido cinâmico, também chamados de fenilpropanóides são
estruturas com nove carbonos (C6-C3) com um anel aromático ligado a uma cadeia carbônica
constituída de três carbonos (WHITE e XING, 1997b), estão ilustrados na Tabela 2.
Pratt e Birac (1979, apud SOARES, 2002) investigaram a presença e atividade
antioxidante de ácidos fenólicos em grãos de soja, farinha de soja desengordurada,
concentrado e isolado protéico de soja e concluíram que dentre os compostos encontrados,
quatro derivados do ácido cinâmico apresentaram uma atividade antioxidante significativa.
São eles: ácido clorogênico (encontrado em maior quantidade e com maior atividade
antioxidante), caféico, p-cumárico e ferrúlico.
As cumarinas, cuja estrutura básica está representada na Figura 4, representam o
outro subgrupo dos fenólicos simples. Seu primeiro representante foi isolado por Vogel, em
1820, na espécie Coumarona odorata. São derivadas do metabolismo da fenilalanina, e
estruturalmente são lactonas do ácido cumarínico. As cumarinas e seus derivados são
substâncias que contêm estruturas químicas do tipo o-heterocíclicos-alfa-carbonilados que são
amplamente encontradas na natureza, e empregadas em diferentes áreas do conhecimento
científico, tais como: farmácia, química, biologia e medicina. (OLIVEIRA; SILVA)
De acordo com Miranda e outros (2007), estes sistemas hetero-aromáticos
apresentam inúmeras atividades biológicas como, por exemplo, anticoagulantes, rodenticidas,
ictiotóxicas, e outras. Um grupo raro desta mesma classe de compostos, são as denominadas
3-aril cumarinas, que apresentam interessantes aplicações industriais, destacando-se como,
branqueadoras de roupas em saponáceos domésticos, principal componente do veículo de
tintas invisíveis para atestar a veracidade de documentos valiosos, etc.
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Tabela 1: Substâncias derivadas do Acido benzóico


Estrutura Nome do composto/ Ocorrência
Substituições dos derivados
Ácido benzóico

Derivados do ácido benzóico Cereais e legumes

Ácido salicílico Casca do salgueiro


R1=OH; R2=R3=R4=H

Acido gentíssico Milho painço


R1= R4=OH; R2=R3=H

Acido protocatequínico Chá verde


R1= R4=H; R2=R3=OH

Ácido gálico Hamamelis, folhas de chá,


R1= H; R2=R3= R4=OH carvalho e outras plantas

Ácido vanílico
Cevada e sorgo
R1= R4=H; R2= OCH3; R3=OH

Ácido siríngico
R1=H; R2= R4=OCH3; R3=OH

Fonte: www.bichoonline.com.br/.../images/apa00142.gif
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Tabela 2: Substâncias derivadas do Acido cinâmico


Estrutura Nome do composto/ Ocorrência
Substituições

Cinamomo,
Ácido cinâmico
manteiga de karité

Derivados do ácido cinâmico

Ácido o-cumárico Especiarias, chás


sementes
R1=OH; R2=R3=R4=H
oleaginosas

Ácido p-cumárico
R3=OH; R1=R2=R4=H

Café, pêra,
Acido caféico
alecrim, orégano
R2= R3=OH; R1=R4=H

Cereais (aveia,
Acido ferrúlico
milho, trigo)
R2= OCH3; R3=OH; R1=R4=H

Ácido sinápico
R2= R4=OCH3; R3=OH; R1=H

Fonte: www.scielo.br/img/fbpe/rn/v15n1/a08fig03.gif
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Figura 4 - Estrutura básica das cumarinas

2.3.2 Os polifenóis

O outro grande grupo dos compostos fenólicos é o dos polifenóis. De acordo com
Fennema (1993a) não existe uma definição rigorosa para este grupo de substâncias, que
possui diversas estruturas. O grupo dos polifenóis se divide em dois subgrupos: o dos
flavonóides e o dos taninos.
Os flavonóides são pigmentos responsáveis pela cor outonal das folhas e de várias
frutas e legumes que vão desde o amarelo, laranja, vermelho ao azul das flores. A palavra
flavonóide vem do latim “flavus” que quer dizer amarelo. De acordo com Silva, estas
substâncias foram descobertas em 1930 pelo prêmio Nobel Szent-Gyorgy, que extraiu a
citrina da casca do limão. Na época a substância recebeu a denominação de vitamina P, depois
vitamina C2 até que esta classificação foi abandonada em 1950.
Com relação aos taninos, inicialmente o termo foi dado à infusão de cascas de
árvores como o carvalho e a castanheira, na qual as peles de animais eram tratadas para
obtenção de couros maleáveis e de maior durabilidade (QUEIROZ e outros, 2002a). Segundo
Fennema (1993b), os taninos são compostos fenólicos especiais, com pesos moleculares
compreendidos entre 500 e 3.000. A química dos taninos é complexa. Estes compostos são
solúveis em água e sob condições específicas de pH, têm a capacidade de formar complexos
razoavelmente fortes com proteínas e alcalóides, precipitando-os. Concentrações elevadas
destes compostos podem comprometer o sabor e a palatabilidade de alimentos, devido a sua
adstringência. (AGOSTINI-COSTA e outros, 2000).
Quanto à estrutura e classificação, os flavonóides possuem uma estrutura básica de
quinze carbonos do tipo C6-C3-C6 com três anéis aromáticos (dois anéis fenóis e um anel
pirano) e várias substituições (AGOSTINI-COSTA e outros, 2000; MAMEDE; PASTORI,
2004). Sua classificação depende dos substituintes e do grau de oxidação do anel pirano. As
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classes ou subgrupos de flavonóides variam de autor para autor: Silva enumera 14 subgrupos
de flavonóides. Já Fennema (1993c) enumera dez subgrupos, enquanto que Luthria (2006b),
em publicação de onde foi extraída a ilustração da Figura 3 do presente trabalho, engloba sete
subgrupos de flavonóides, sendo eles: o das Antocianinas, o dos Flavanóis, o das Flavanonas,
o das Flavonas, o dos Flavonóis, o das Isoflavonas e o das Clalconas
Apesar da discordância entre os autores sobre o total de constituintes representantes
do grupo dos flavonóides, verifica-se na literatura, que existe um consenso entre vários
autores em que apenas seis dos subgrupos enunciados estão incluídos na dieta humana. Fazem
parte deste consenso, Buhler, Fennema (1993 d), Marcucci e outros e Silva. Segundo estes
autores os subgrupos são os seguintes: o das Antocianinas, o dos Flavanóis, o das Flavanonas,
o das Flavonas, o dos Flavonóis e o das Isoflavonas. A diferença entre estes subgrupos é
estabelecida pelo grau de aromaticidade, ordenamento do número de hidroxilas substituídas,
bem como tipo e extensão de glicosilação destes grupos. De acordo com Cadenas, o sítio
preferido para glicosilação é a posição 3. A estrutura básica de um flavonóide e dos subgrupos
mais importantes estão ilustradas na Tabela 3, que além de ilustrar as estruturas, lista também
as principais substâncias de cada subgrupo e sua ocorrência na natureza.
Dando início à descrição dos subgrupos de flavonóides, as antocianinas constituem
o grupo de flavonóides mais abundantes na natureza, sendo o mais importante e diversificado
grupo de pigmentos vegetais hidrossolúveis. São constituídas de uma aglicona chamada
antocianidina, que é esterificada com um ou mais açúcares nas posições 3, 5 ou 7.
Podem também conter uma ou mais moléculas de ácidos, esterificando os açúcares
nas posições 3, 5 ou 4. Quando estão esterificadas, são conhecidas como antocianinas
aciladas. Em função destes grupos substituintes ligados aos seus anéis aromáticos são
moléculas polares, mais solúveis em água do que em solventes apolares (GUIMARÃES,
2009; VALDUGA e outros, 2008a).
De acordo com Fennema (1993e), vinte tipos de antocianinas são conhecidos,
sendo que apenas seis delas são importantes para a tecnologia de alimentos, encontradas em
hortaliças e frutas: pelargonina, cianidina, delfinidina, peonidina, petunidina e malvidina. As
cascas de uvas tintas, subproduto das indústrias de vinho e de suco, por exemplo, são fontes
comerciais de antocianinas para a produção de corantes para fins alimentícios (VALDUGA e
outros, 2008b).
As demais são encontradas em flores e folhas. Os pigmentos das antocianinas não
são estáveis. Dependendo das variações de atividade de água, pH, luz, temperatura, presença
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do oxigênio e de traços de metais presentes no meio, o seu espectro de cores vai do vermelho
ao azul, apresentando também tons de púrpura e alaranjado (COUTO e outros, 1998).

Tabela 3: Estrutura dos principais subgrupos de flavonóides


Estrutura Nome do Principais substâncias do
subgrupo/ grupo/ Substituições
Ocorrência

Estrutura básica
dos flavonóides

Antocianinas Pelargonina
Cascas de uvas R1= H R2=H
tintas, e vinho
Cianidina
tinto
R1= OH R2=H
Delfinidina
R1= OH R2=OH
Petunidina
R1= OCH3 R2=OH
Malvidina
R1= OCH3 R2= OCH3

Flavanol Catequina, epicatequina


Chás verde e Possuem grupo de hidroxila da
branco,
posição 3
cacau e
chocolate

(continua)
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Tabela 3: Estrutura dos principais subgrupos de flavonóides (continuação)


Estrutura Nome do subgrupo/ Principais substâncias do
Ocorrência grupo/ Substituições

Flavanona Naringenina
Cítricos R1= H R2=OH
Eriodictiol
R1= R2=OH
Hesperidina
R1=OH R2=OCH3

Flavona Apigenina
Salsa, tomilho, aipo R1=H
e pimenta
Luteolina
R1= OH

Flavonol Campferol
Alho, brócolis, maçã R1= R2=H
e chás
Quercetina
R1=OH R2=H
Miricetina
R1=OH R2=OH

Isoflavona Daidzeína
Alimentos à base de R1= R2=H
soja, sementes de
Genisteína
linhaça e trevo
vermelho R1=H R2=OCH3
Fonte: Linus Pauling Institute/Oregon State University

O subgrupo dos flavanóis é caracterizado pela substituição com uma hidroxila na


posição 3. As principais representantes do subgrupo são as catequinas e epicatequinas,
substâncias encontradas principalmente no cacau, chocolate e chá verde.
O subgrupo das flavanonas está amplamente distribuído nos cítricos. As principais
representantes são naringenina e hesperidina.
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O subgrupo das flavonas é caracterizado pela presença de uma ligação dupla no


anel central. Diferem dos flavonóis por não possuírem hidroxila ligada à posição 3, o que
altera o espectro na região do ultravioleta, reações colorimétricas e mobilidade
cromatográfica. Estas substâncias são encontradas principalmente em especiarias, tais como:
salsa, pimenta e tomilho.
O subgrupo dos flavonóis possui substituição o-hidroxila no anel B, que participa
na deslocalização dos elétrons, conferindo maior estabilidade ao radical. Além disso, possui
também ligação dupla com a função 4-oxo no anel C e substituição com outras hidroxilas nas
posições 3 e 5 dos anéis A e C. Estes fatores todos reunidos são necessários para exercer um
potencial máximo antioxidante, principal característica das substâncias do grupo,
principalmente da quercetina.
O subgrupo das isoflavonas é de ocorrência quase exclusiva da família das
Leguminosae. Este grupo de substâncias vem despertando o interesse de mulheres na
menopausa, devido a sua ação estrogênica. De acordo com Park e outros (2001, apud
DEGÁSPARI e WASZCZYNSKYJ, 2004), as isoflavonas funcionam como antiestrógenos
em presença de estrogênios humanos, competindo com os hormônios por seus receptores nas
células-alvo. No entanto, na ausência ou insuficiência destes, passam a substituí-los aliviando
os sintomas indesejáveis do climatério, já que sua atividade estrogênica é cem vezes inferior à
do β-estradiol.
Já com respeito aos taninos, de acordo com Queiroz e outros (2002b), estes se
dividem em dois subgrupos: taninos hidrolisáveis e não-hidrolisáveis. Os primeiros são
ésteres do ácido gálico e de seus dímeros que, após hidrólise, produzem ácido gálico e ácido
elágico, como pode ser observado na Figura 5. Normalmente são encontrados em raízes,
flores, frutos e folhas.

Figura 5 - Estrutura básica de tanino hidrolisável


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Com respeito aos taninos não hidrolisáveis ou condensados, estes são mais comuns
em madeiras, perfazendo a metade da matéria-seca da casca de muitas árvores. De acordo
com Trugilho e outros (2003), a casca da árvore está mais sujeita a maiores problemas com
injúrias. De forma que estas substâncias com propriedades germicidas muito fortes asseguram
defesa da planta contra os microorganismos patogênicos.
Segundo Queiroz e outros (2002), a estrutura dos taninos condensados é formada
pela ligação de uma série de monômeros de unidades catequina (flavan-3-ol), ou por um
derivado desta. Esta ligação ocorre normalmente entre os carbonos 4 de uma estrutura e
carbono 8 da outra. Na figura 6 está ilustrada a estrutura de um tanino condensado muito
comum, a procianidina.

Figura 6 - Estrutura básica dos taninos não hidrolisáveis

A exposição teve como objetivo mostrar a grande diversidade do grupo dos


compostos fenólicos, principalmente no que diz respeito à diversidade de suas estruturas
químicas. Este entendimento ajuda na compreensão da dificuldade de serem estabelecidas
metodologias para extração e determinação destes compostos. Sendo assim, são necessários
estudos que busquem métodos simples e menos dispendiosos que sirvam de estímulo para um
melhor aproveitamento destas substâncias.
34

2.4 OS CONSTITUINTES FENÓLICOS DA MANGA

No que diz respeito às características da manga, sabe-se que existem cerca de 1500
variedades de manga no mundo. Devido a esta grande variedade, a fruta tem pronunciada
diversidade de tamanho, cor, formato, sabor e composição. (SHARMA e outros, 2005b). Em
termos de valor nutricional, a manga é rica fonte de fibras e carotenóides, com β-caroteno
respondendo por mais da metade do conteúdo de carotenóides totais na maioria dos cultivares.
De acordo com os pesquisadores SELLÉS e outros (2002a) e BERARDINI e outros
(2005c) os esforços para identificar os constituintes da manga começaram na década de 60,
com El Sissi e Saleh, que constataram a presença de quercetina e kampferol em extrato etéreo
da folha. Mais tarde, Nott e Roberts (1967, apud SCHIEBER e outros, 2000a) estudaram a
casca do tronco, isolaram e elucidaram a estrutura do glicosídeo mangiferina. Ainda na
mesma década, El Ansari e outros (1969, apud SCHIEBER e outros, 2000b) pesquisaram a
fruta, encontrando ácido gálico, m-digálico e m-trigálico, galotaninos, quercetina,
isoquercetina, mangiferina, e ácido elágico.
Prosseguindo as pesquisas, El Sissi e Saleh, (1970, apud SELLÉS e outros, 2002b)
detectaram quercetina 3-glucosideo e kampferol 3-glucosidio, ácido protocatêico, gálico e
mangiferina em folhas de Mangifera indica L. Var. ‘Taimour’ e em 1975 ao estudarem 20
variedades da planta, detectaram que as folhas são ricas em mangiferina, a fruta verde e a
semente (caroço) em galotaninos.
Mais tarde Tanaka e outros (1984) isolou galoil e hidroxi-benzoil-ésteres, bem
como epicatequina das flores, compostos fenólicos das folhas, frutos e caroços. SELLÉS e
outros (2002c) desenvolveram um extrato aquoso, obtido da decocção da casca do tronco da
mangueira. Este extrato tem sido tradicionalmente usado no tratamento de menorragia,
escabiose, diarréia, sífilis, diabetes, feridas cutâneas e anemia. Visando descobrir a origem das
propriedades do referido extrato, estes pesquisadores identificaram e quantificaram os
compostos fenólicos nele contidos. Dentre os compostos isolados foi identificada a
quercetina, um flavonóide com poder antioxidante, anticancerígeno, antialérgico e com efeito
protetor do sistema cardiovascular.
Com relação à composição do caroço e sua utilização como fonte de nutrientes,
Puravankara e outros (2000) pesquisaram o conteúdo de gordura e antioxidantes naturais e
Soong e Barlow (2004 apud BERARDINI e outros, 2005d) pesquisaram os teores de amido e
farinha.
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Já com relação à casca, Lakshiminarayana e outros (1970, apud


SRIRANGARAJAN E SHRIKHANDE, 1977) realizaram meticuloso estudo comparativo
durante o desenvolvimento da fruta e constataram que o conteúdo de fenólicos totais era mais
alto na casca que na polpa, em todos os estágios de maturação da fruta.
Schieber e outros (2003) estudaram a casca da variedade “Tommy Atkins” e
caracterizaram quinze compostos fenólicos usando cromatografia e espectrometria de massa
e, em estudo mais recente, BERARDINI e outros (2005e) estudaram quatorze variedades da
fruta produzidas ao redor do mundo (África, Ásia, Austrália e América do Sul) e
demonstraram que as cascas da fruta continham diversos flavonóis e xantonas.
No que concerne à pesquisa nacional sobre a manga, Kuskoski e outros (2006)
verificaram o conteúdo de polifenóis de dez diferentes polpas de frutas congeladas
comercializadas em Santa Catarina e verificaram que a polpa de manga continha teores de
polifenóis superiores aos da maioria das polpas consideradas, ficando um pouco abaixo
apenas da polpa de morango.
Já ASSIS e outros (2004) pesquisaram a evolução dos teores de amido e açúcares
solúveis durante o desenvolvimento e amadurecimento de diferentes cultivares de manga.
Mais recentemente, Ribeiro (2006) fez a caracterização e avaliação do potencial antioxidante
de quatro variedades de manga comercializadas na região de Minas Gerais. Como a variedade
“Ubá”, apresentou maior teor de bioativos ele fez também a caracterização dos resíduos do
processamento da fruta e propôs seu aproveitamento para produção de farinha e para futuros
estudos relacionados à viabilidade econômica da extração de bioativos.
Concluindo, como se pode ver, o que se encontra na literatura são basicamente
estudos que mostram que o conteúdo de fenólicos totais é mais alto na casca que na polpa da
manga. Apesar disto, não foram encontrados estudos voltados à maximização do processo de
extração de fenólicos na casca da fruta. Desta forma, este estudo se propõe a investigar o a
extração de fenólicos totais na casca de duas variedades de manga com importância comercial
para a região, com vistas ao futuro aproveitamento desta fonte de compostos bioativos.

2.5 A EXTRAÇÃO E A DETERMINAÇÃO DE COMPOSTOS FENÓLICOS

A extração sólido-líquido, também chamada lixiviação, é uma técnica para


purificação e separação de sólidos que abrange o contato íntimo entre um líquido (solvente) e
um sólido (soluto). A partir do momento que as duas fases entram em contato, o soluto pode
difundir através da fase sólida para a fase líquida, causando a separação do componente que
36

estava originalmente na fase sólida. A fase solvente transforma-se no extrato, que depois é
separado do sólido por filtração, sedimentação ou centrifugação, ou por combinação de ambos
(FOUST e outros, 1982).
Alguns parâmetros podem ser considerados neste processo, sendo os mais
importantes a granulometria, a temperatura, o tempo de contato e a velocidade de difusão do
princípio ativo a ser extraído, que normalmente fixa os tempos de permanência.
No caso de estruturas biológicas, formadas de uma estrutura celular que contém o
soluto, a taxa de lixiviação pode ser lenta, porque as paredes celulares opõem resistência à
difusão. Para aumentar a eficiência da extração, o sólido deve ser preparado, de modo a
facilitar o contato com o solvente.
Porém, como reduzir o material a um tamanho que exponha o conteúdo individual
de cada célula é praticamente impossível, no caso de folhas, raízes e outros materiais vegetais,
a secagem do material antes da extração ajuda a romper as paredes celulares. Depois de seco,
portanto, o material é triturado, para que o solvente possa dissolver o soluto presente em seu
interior. (GEANKOPLIS, 1993).
Além dos aspectos físicos da extração, existem também os aspectos químicos, que
devem ser considerados no processo como um todo. Para um soluto se dissolver em um
solvente, o soluto precisa ter uma interação com o solvente igual ou superior às interações
solvente-solvente e soluto-soluto. Sendo assim, a eficiência da extração de fenólicos está
relacionada tanto aos procedimentos de extração bem como às características químicas das
moléculas.
Existe um consenso na literatura, a respeito da escolha do solvente para a extração
de compostos fenólicos. Os textos mostram que solventes aquosos são mais eficazes na
extração que os solventes puros. Keinänen (1990, apud LIMA e outros, 2004) evidenciou que
solventes aquosos (MeOH 80% e EtOH 80%) foram mais eficazes na extração de fenólicos.
Georgé e outros (2005) usaram a mistura Acetona-Água a 70% para extração de fenólicos em
diversos sucos de fruta.
Luthria (2006c) comparou o desempenho de cinco solventes puros, com a mistura
metanol-água a 60% na extração de fenólicos. De acordo com este autor, a mistura de
solventes foi mais eficiente que os solventes usados sem mistura. Ele justifica que os
compostos fenólicos solúveis em água, normalmente são encontrados nos vacúolos das
células vegetais, enquanto que os insolúveis são constituintes da parede celular.
Considerando ainda o processo de extração, acrescente-se à solubilidade outros
fatores como: estrutura química, grau de polimerização, interação com outros componentes da
37

matriz, polaridade do solvente e técnicas de extração, que podem ser as mais variadas:
sonicação, percolação, maceracão dinâmica, extração supercrítica, Soxhlet entre outras e as
condições da extração que também influenciam no processo, tais como: tempo, temperatura e
pressão.
Levando-se em conta tantas variantes, Luthria (2006d) estudou a influência do
preparo das amostras para a determinação de fitoquímicos e ressalta que este aspecto tem sido
freqüentemente considerado como um meio e não um fim. De acordo com ele, poucos
pesquisadores tentaram otimizar o processo de preparo das amostras e muitos fazem uma
abreviada descrição destas etapas do experimento, o que tem contribuído para uma grande
variação nos resultados das análises.
Os trabalhos publicados, em quase sua totalidade, utilizam a Cromatografia Líquida
de Alta Eficiência (CLAE) para caracterização e quantificação destes compostos. No entanto,
grande parte dos pesquisadores se queixa do custo elevado e da dificuldade para encontrar
padrões de nível cromatográfico para caracterizar uma tão grande variedade de compostos
fenólicos (BERARDINI e outros, 2005f). Marcucci e outros comentam que a cromatografia
apesar de ser um método muito bom para quantificar individualmente os compostos fenólicos,
devido à falta de padrões de substâncias ainda não elucidadas, não consegue estimar
corretamente o conteúdo dos fenólicos totais.
Sendo assim, uma alternativa para quantificação, mais simples e barata, com
procedimentos que permitem a análise mais rápida de numerosas amostras, é a
espectrofotometria em UV-Vis. O método data de 1912, e consiste de reação colorimétrica
com o reagente de Folin-Ciocalteau, uma mistura contendo molibdato, tungstato e ácido
Fosfórico (H3PW12O40 e H3PMo 12O40) que se complexa. Sob condições alcalinas,
proporcionadas pelo carbonato de sódio, o complexo sofre redução na presença de compostos
fenólicos, formando óxidos azuis de molibdênio e de tungstênio (W8O23 e Mo8O23). O
produto da reação é instável e é determinado com absorção máxima em 760 nm.
O método foi descrito por Folin-Ciocalteau, aperfeiçoado pelo professor Vernon
Singleton durante a década de 60 (SINGLENTON & ROSSI, 1965 apud MARTINELLO,
2006) e otimizado recentemente por Georgé e outros (2005). Este último estudou a influência
do solvente de extração e a cinética da reação após a adição de cada um dos reagentes, sob
diferentes temperaturas. A reação colorimétrica foi otimizada com a determinação dos tempos
de reação para cada reagente. Os resultados encontrados foram: 2 minutos para a reação com
o reagente FC à temperatura ambiente e 15 minutos em banho-maria a 50 ºC, para a reação
38

com carbonato de sódio. O estudo revelou que após um tempo de 30 minutos a coloração do
meio já sofre declínio.
Como visto anteriormente, a eficiência da extração sólido-líquido depende de
diversos fatores físico-químicos, relacionados ao preparo da amostra, à escolha do solvente de
extração, à técnica de extração propriamente dita e ao processo de separação do soluto
desejado. De acordo com Luthria (2006e) poucos pesquisadores fazem descrição detalhada
das etapas relacionadas ao preparo das amostras ou otimizaram esta etapa do experimento.
Sendo assim, o presente trabalho se propõe a estudar a extração de compostos fenólicos totais
da casca de manga fazendo uma descrição mais detalhada do preparo das amostras, dando
atenção ao tempo de secagem, fator determinante no preparo da amostra.

2.6 AS APLICAÇÕES DOS COMPOSTOS FENÓLICOS NA SAÚDE HUMANA

Uma das principais causas de deterioração dos alimentos é a oxidação lipídica. Os


produtos da oxidação primária geralmente são inodoros e incolores, mas são instáveis.
Prontamente produzem substâncias secundárias como alcanos, álcoois, aldeídos e ácidos com
odor ativo e baixíssimo valor nutritivo. Estes subprodutos além do aroma e “flavor”
indesejáveis, provocam descoloração e outras formas de deterioração (NAKATANI, 1997a).
De acordo com Shahidi (1997c), a peroxidação lipídica não é um problema que
envolve apenas a indústria de alimentos, mas também o corpo humano, uma vez que nossas
células são formadas pela camada bilipídica. A produção excessiva de radicais livres
provenientes do metabolismo, pode afetar a membrana lipídica das células produzindo
“substâncias reativas oxigenadas” (ROS). Estes subprodutos do nosso metabolismo normal
podem causar dano ao DNA, e diversas doenças degenerativas como: câncer, doenças
cardiovasculares, disfunções cerebrais, enfraquecimento do sistema imunológico, etc. A
figura 7 ilustra algumas das principais doenças degenerativas envolvidas no processo natural
de oxidação das células.
Estudos epidemiológicos têm evidenciado que os compostos fenólicos presentes em
frutas, cereais e legumes têm contribuído significativamente para a redução de doenças
crônicas e degenerativas em populações cuja dieta tem alta ingestão destes alimentos. Outros
estudos clínicos verificaram que estas substâncias promovem a síntese de interferons e
produção de anticorpos (RIBEIRO, 2006; SANTOS e outros, 2002).
39

INFECÇÕES

DIABETES PARKINSON

CÂNCER ROS ARTRITE

ISQUEMIA ENVELHECIMENTO

Figura 7- Doenças causadas por ROS


Fonte: M.T. Huang: Natural antioxidants

Sellés e outros (2002d) evidenciaram que a ingestão de polifenóis está


inversamente relacionada com incidentes de câncer. Numerosas culturas de células e modelos
animais indicam potente atividade anticarcinogênica por certos polifenóis mediante uma gama
de mecanismos, incluindo atividade antioxidante, modulação enzimática, expressão gênica,
etc. (SHAHIDI, 1997d). No que diz respeito à manga, Sellés e outros (2005b) testaram o
extrato produzido a partir da casca do tronco da manga, em comparação com as vitaminas C,
E, C+E e caroteno em termos de inibição da oxidação lipídica e proteção contra oxidação da
enzima Peróxido Dismutase mitocondrial (POD). Os valores obtidos demonstraram poder
similar aos das vitaminas no plasma, significativamente maior que a vitamina C e caroteno no
fígado, e similar às vitaminas C+E no cérebro. No que diz respeito a POD, os valores foram
consideravelmente maiores que todas as vitaminas e caroteno.
Estudos mais recentes retratam uma nova visão para o mecanismo de ação dos
flavonóides no corpo humano. De acordo com Frei (2007) o mecanismo de ação dos
flavonóides no organismo é bem diferente daquele observado em um tubo de ensaio. O que
acontece no organismo é que o corpo considera os flavonóides como corpos estranhos e
produzem enzimas para expulsarem os compostos indesejados. Neste processo de se livrar das
substâncias indesejáveis, as enzimas produzidas também ajudam a eliminar agentes
cancerígenos e mutagênicos. Desta forma estes mecanismos ajudam a eliminar células
cancerígenas e inibem a invasão tumoral.
Como visto anteriormente, o processo de oxidação lipídica é comum tanto aos
alimentos, como às células do corpo humano. Várias doenças degenerativas estão associadas
40

ao estresse oxidativo das células, decorrente da ação de radicais livres, provenientes do


próprio metabolismo. Estudos têm evidenciado que o consumo de compostos fenólicos
contribui para a redução de doenças crônicas como câncer e outras. Sendo assim, pesquisas
que priorizem a descoberta de novas fontes de compostos fenólicos, antioxidantes naturais,
bem como a viabilidade de sua extração são muito importantes. Este trabalho, portanto visa
estudar o processo de extração de compostos fenólicos totais da casca de manga e propõe que
futuros trabalhos possam explorar o uso do extrato para fabricação de suplementos
nutricionais e outras aplicações.

2.7 O TRATAMENTO ESTATÍSTICO

A seguir será dada uma breve exposição de alguns termos e conceitos da Estatística
utilizados neste trabalho, sendo eles: conceito e classificação de variáveis, planejamento
experimental, nível de significância, distribuição t Student e análise de variância (ANOVA).
Primeiramente, pode-se dizer que variáveis são características medidas, controladas
ou manipuladas, observáveis em cada elemento pesquisado. Segundo Reis (2003a) e Milone
(2006a) as variáveis podem ser classificadas de acordo com o nível de mensuração em
variáveis qualitativas, quantitativas e intervalares.
As variáveis qualitativas podem ser medidas apenas em termos de quais itens
pertencem a diferentes categorias, mas não se pode quantificar nem mesmo ordenar tais
categorias. Já as variáveis quantitativas expressam alguma propriedade mensurável do evento
de interesse. Em geral resultam de medição, enumeração, contagem ou cálculo.
No presente trabalho as variáveis qualitativas adotadas foram a variedade da manga
e o tipo de solvente. Enquanto que as quantitativas foram o tempo de secagem da casca e a
temperatura do solvente usado na extração. Quanto às variáveis intervalares, Milone (2006b)
esclarece que expressam propriedades graduáveis dos eventos em intervalos de valores
retratando os graus de intensidade de seus atributos, como por exemplo números de estrelas
com que um hotel é classificado.
Normalmente em um experimento o pesquisador manipula algumas variáveis e
então mede os efeitos desta manipulação em outras variáveis. As que são manipuladas são
chamadas de variáveis independentes enquanto que as são apenas medidas ou registradas são
as variáveis dependentes. Uma vez definido o termo variável, será explanado brevemente o
tópico planejamento experimental.
41

Todo experimento envolve uma série de variáveis com maior ou menor grau de
importância para o processo em estudo e geralmente o objetivo principal das pesquisas ou
análises científicas é encontrar relações entre variáveis. Entretanto, somente o resultado de um
experimento adequadamente planejado e realizado poderá indicar uma relação causal entre
duas ou mais variáveis (NEVES e SCHVARTZMAN, 2001; REIS, 2003b).
Comumente se realizam os experimentos alterando uma variável de cada vez,
enquanto as demais permanecem constantes. Entretanto, esta não é a maneira mais eficiente
de se realizar um experimento, uma vez que este planejamento univariado convencional
negligencia as interações entre as variáveis (ZAMORA, 2006). A técnica denominada
planejamento fatorial de experimentos é mais apropriada, já que todas as variáveis são
modificadas ao mesmo tempo, podendo influenciar-se mutuamente, de forma que o valor
ideal para uma delas pode depender do valor de outra.
No planejamento fatorial de experimentos estão envolvidos k fatores (ou variáveis)
cada um deles presente em diferentes níveis. O caso mais simples é aquele em que cada fator
k está presente em apenas dois níveis. Na realização de um experimento com k fatores em dois
níveis, são feitas 2 x 2 x ... x 2 (k vezes) = 2k observações da variável resposta e, portanto, este
planejamento é denominado experimento fatorial 2 k. No presente trabalho foi utilizado
inicialmente, um planejamento fatorial 24 para triagem das variáveis de maior importância,
bem como para verificar a interação entre elas. Uma vez explanado o conceito de
planejamento experimental, agora será abordada o conceito de nível de significância, nível-p.
Milone (2006c) afirma que a forma como dados amostrais são interpretados, como
se tomam decisões e se redefinem parâmetros é objeto da teoria da inferência estatística. Ao
se tomar uma decisão estatística, são formuladas hipóteses: uma hipótese nula e uma hipótese
alternativa. A hipótese nula geralmente consiste em uma afirmação do tipo “não há diferença”
ou “não há a relação” na população em estudo.
Considerando a decisão a ser tomada, existem duas possibilidades de erro: o erro de
tipo I que consiste em se rejeitar a hipótese nula, quando ela é verdadeira e, o erro de tipo II
que consiste em se aceitar a hipótese nula, quando ela é falsa. Como se sabe que mesmo
eventos raros podem ocorrer é razoável se supor que, seja qual for a decisão tomada a respeito
da hipótese nula, existe a possibilidade de erro (ROCHA, 2008). Infelizmente, quando a
probabilidade de cometer o erro do tipo I diminui, a probabilidade de cometer o erro do tipo II
aumenta. Sendo assim, os testes estatísticos normalmente são delineados para controlar o erro
de tipo I, chamado de nível de significância.
42

O nível de significância pode ser estimado quantitativamente sendo representado


por p. Especificamente, o nível-p representa a probabilidade de erro envolvida em rejeitar a
idéia de que a relação em questão não existe na população e em aceitar o resultado observado
como válido. Desta forma, o nível p mede a confiabilidade de uma relação observada entre
variáveis na amostra. O valor do nível-p representa também um índice decrescente da
confiabilidade de um resultado. Quanto mais alto o nível-p, menos se pode acreditar na
relação observada entre as variáveis. Por exemplo, um nível p de 0,05 (1/20) indica que, caso
o experimento de interesse seja repetido várias vezes, pode-se esperar que em
aproximadamente 20 realizações do experimento em apenas uma a relação entre as variáveis
em questão seria igual ou mais forte do que a que foi observada naquela amostra. No presente
trabalho foi adotado um nível-p de 0,05 como um limite aceitável de erro. Uma vez explanado
o conceito de nível de significância, agora será abordado o conceito de distribuição de
probabilidades.

2.7.1 A distribuição de probabilidades

Um estudo estatístico pode ter por base toda a população ou uma de suas amostras.
No entanto o maior interesse está na população. O interesse na amostra reside na informação
que ela pode prover sobre a população. E um dos aspectos básicos da relação entre as
variáveis é justamente a confiabilidade, um conceito que está relacionado com a
"representatividade" do resultado encontrado em uma amostra específica de toda a população.
Em outras palavras, a confiabilidade diz quão provável será encontrar uma relação similar se
o experimento fosse feito com outras amostras retiradas da mesma população. Sendo assim, o
princípio básico é descobrir as relações entre os parâmetros, avaliar as amostras
representativas e transferir os resultados para o universo de estudo.
As distribuições amostrais ou distribuições teóricas de probabilidades permitem
fazer estas medições, à medida que descrevem como os parâmetros se dispõem. De um modo
geral, a maior parte dos fenômenos probabilísticos de natureza contínua tende a seguir uma lei de
distribuição designada por função de distribuição normal, ou de Gauss. Esta lei de distribuição
estabelece que os valores mais frequentes (isto é, os valores a que correspondem as maiores
probabilidades) se encontram em torno da média da variável aleatória. Quanto mais afastados os
valores estão da média (este afastamento é quantificado em termos de variância ou segundo
momento em relação à média), menos frequentes são. Esta interpretação imediata da lei de
43

distribuição normal é coerente com o que se passa com a maior parte dos fenômenos que ocorrem
na natureza (MILONE, 2006d; REIS, 2003c).
Existem outros modelos de distribuição, entre eles o da distribuição t de Student,
onde o modelo é semelhante à curva normal padrão, porém com caudas mais largas. O único
parâmetro que define a distribuição t Student é o grau de liberdade (v), e caracteriza a sua
forma. Quanto maior for esse parâmetro, mais próxima da normal ela será. A figura 8 ilustra
uma simulação da distribuição “t” de Student. Pode-se observar que é possível gerar valores
mais extremos que uma simulação da normal.

Figura 8 - Curva de distribuição “t” Student


Fonte: Wikipedia

2.7.2 A análise de variância (ANOVA)

Uma vez explanado o tema de distribuição de probabilidades, finalmente será


explanado o conceito de análise de variância ANOVA e os seus termos. De acordo com
Balestrassi (2009) a análise de variância é uma técnica estatística que permite avaliar,
44

comparar médias. Já segundo Barros e outros (2003a), a ANOVA é o método mais usado para
se avaliar numericamente a qualidade do ajuste de um modelo empírico. Para tanto, faz-se a
análise com a decomposição algébrica dos desvios das respostas observadas em relação à
resposta média global (desvio total). A variação total das observações em torno da média é
descrita pela equação de regressão e o restante fica por conta dos resíduos. Geralmente, de
acordo com literatura, para se fazer a análise de variância de um modelo utiliza-se a equação
1, apresentada a seguir:

- = - + -
(1)
Total Regressão Resíduo

Onde:
- Respostas reais, obtidas experimentalmente
- Média global dos valores observados experimentalmente
- Resposta calculada, prevista pelo modelo matemático

Na equação apresentada, o desvio total foi decomposto em duas parcelas que


representam: o desvio da previsão feita pelo modelo para o ponto em questão em relação à
média global (regressão) e a diferença entre o valor observado experimentalmente e o valor
previsto (Resíduo). Num modelo bem ajustado a parcela do resíduo deve ser bem pequena.
Para expressar esta comparação em termos quantitativos, utiliza-se o método dos
mínimos quadrados, elevando-se a equação proposta anteriormente ao quadrado, e fazendo o
somatório de todos os pontos. O processo não vai ser demonstrado neste trabalho, mas o
resultado obtido pode ser ilustrado pela equação 2:

2 2 2
= + (2)

Estas somas de quadrados dos desvios são chamadas de somas quadráticas, ou SQ.
Sendo assim, de forma compacta, a equação anterior pode ser escrita conforme a equação 3,
apresentada a seguir:

= + (3)
45

Ou seja, a variação total das observações em torno da média é descrita pela equação
de regressão e o restante fica por conta dos resíduos. Sendo assim, quanto maior for a fração
descrita pela regressão, melhor será o ajuste do modelo. Esta conclusão pode ser quantificada
através da determinação do coeficiente de determinação do modelo, R2, que é descrito através
da equação 4.

= (4)

Onde:

O valor máximo de é 1 e só ocorrerá se não houver resíduo. Para um


experimento em que os ensaios sejam realizados em duplicatas, os resultados podem ser
utilizados para se obter uma estimativa do erro aleatório. Neste caso, o termo dos resíduos é
decomposto em dois termos, que representam o erro aleatório puro e a falta de ajuste do
modelo. Os resultados da ANOVA proposto por Barros (2003c), para o caso particular de um
modelo quadrático, cujas amostras foram duplicadas, como foi o estudado no presente
trabalho, estão apresentados na Tabela 4.

Tabela 4: Análise de Variância (ANOVA) para um modelo quadrático


Fonte de Soma Quadrática Graus de Média Quadrática R2
Variação Liberdade
Regressão
f-1
2
=
Resíduo n-f
2

Falta de ajuste m-f

n-m =
Erro puro

Total n-1 -
2
46

Onde n, f e m são respectivamente o número de ensaios realizados, o número de


fatores e o número de níveis utilizados no experimento.

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