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LENDAS

A Lenda é uma narrativa fantasiosa transmitida pela tradição oral


através dos tempos. De carácter fantástico e/ou fictício, as lendas
combinam factos reais e históricos com factos irreais que são meramente
produto da imaginação humana.

Com exemplos bem definidos em Portugal e em todos os países do


mundo, as lendas geralmente fornecem explicações plausíveis, e até certo
ponto aceitáveis, para coisas que não têm explicações científicas
comprovadas, como acontecimentos misteriosos ou sobrenaturais. Podemos
entender que lenda é uma degeneração do Mito.

Como diz o dito popular "Quem conta um conto aumenta um ponto",


as lendas, pelo fato de serem repassadas oralmente de geração em
geração, sofrem alterações à medida que vão sendo recontadas. Estas são
algumas das lendas por nós recolhidas, no âmbito da Língua Portuguesa.

A LENDA DAS AMENDOEIRAS

Há muito tempo, antes da independência de Portugal, quando o


Algarve pertencia aos mouros, havia ali um rei mouro que desposara
uma rapariga do norte da Europa, à qual davam o nome de Gilda.

Era encantadora essa criatura, a quem todos chamavam a “Bela


do Norte”, e por isso não
admira que o rei, de tez
cobreada, tão bravo e audaz
na guerra, a quisesse para
rainha.

Apesar das festas que


houve nessa ocasião, uma
tristeza se apoderou de
Gilda. Nem os mais ricos
presentes do esposo faziam
nascer um sorriso naqueles
lábios agora descorados: a “Bela do Norte” tinha saudades da sua
terra.
O rei conseguiu, enfim, um dia, que Gilda em pranto e soluços,
lhe confessasse que toda a sua tristeza era devida a não ver os
campos cobertos de neve, como na sua terra.

O grande temor de perder a esposa amada sugeriu, então ao rei


uma boa ideia. Deu ordem para que em todo o Algarve se fizessem
plantações de amendoeiras, e no princípio da Primavera, já elas
estavam cobertas de flores.

O bom rei, antevendo a alegria que Gilda havia de sentir, disse-


lhe:

- Gilda vinde comigo à varanda da torre mais alta do castelo e


contemplareis um espectáculo encantador!

Logo que chegou ao alto da torre, a rainha bateu palmas e


soltou gritos de alegria ao ver todas as terras cobertas por um manto
branco, que julgou ser neve.

- Vede – disse-lhe o rei sorrindo – como Alá é amável convosco.


Os vossos desejos estão cumpridos!

A rainha ficou tão contente que dentro em pouco estava


completamente curada. A tristeza que a matava lentamente
desapareceu, e Gilda sentia-se alegre e satisfeita junto do rei que a
adorava. E, todos os anos, no início da Primavera, ela via do alto da
torre, as amendoeiras cobertas de lindas flores brancas, que lhe
lembravam os campos cobertos de neve, como na sua terra.

Ricardo Dias, nº 23

“ A LENDA DO MENINO DOS OLHOS GRANDES”

Uma noite, quando os pescadores iam para a faina,


encontraram um bebé, com os olhos muito grandes, que começou a
chorar e os pescadores foram pegá-lo ao colo e quanto mais andavam
com ele, mais pesado ficava, até que o deixaram
cair e ele desapareceu.
Todos os dias, desde a queda, à meia-noite o menino estava a
chorar, num canto das ruas de Olhão.

Raquel Laginha, nº 22

“Lenda da Moura dos Pés Descalços”

Há uma lenda pouco conhecida que conta uma história que


dizem ter acontecido no interior algarvio, na zona da Serra do
Caldeirão.

Antes do nascer do sol, numa manhã de S. João, um pastor que


andava por um vale viu uma formosa donzela sentada no gargalo de
um poço, que lhe acenou. Ele aproximou-se e perguntou-lhe o que
fazia ali sentada àquela hora da manhã, e ela, batendo os pés
descalços na água, disse-lhe que estava à espera de quem lhe
trouxesse os seus sapatos., para poder regressar ao seu país.

Em contrapartida quem lhe levasse os sapatos seria


grandemente recompensado e, parando de bater os pés, retirou da
parede do poço atrás das suas pernas duas grandes esmeraldas que
mostrou ao pastor.

- Onde estão os teus sapatos? – perguntou-lhe o homem já só


vendo as esmeraldas na sua frente.

- Isso terás tu de descobrir. Mas será no ano que vem, pois


agora tenho de me ir embora – respondeu-lhe a donzela e, antes do
sol começar a aparecer por cima do horizonte, saltou para dentro do
poço e desapareceu como num passe de magia.

O homem ainda procurou as jóias, mas não as encontrou. Foi


para casa muito perturbado e
contou à mulher o que
acontecera. Esta aconselhou- o
a, no ano seguinte, levar uns
sapato seus. O homem assim o
fez. Quando chegou ao poço já
a donzela lá estava a bater os pés na água. Ela disse-lhe o mesmo
que no ano anterior e voltou a mostrar-lhe as jóias. O pastor deu-lhe
os sapatos que levava, mas ela recusou-os dizendo que não eram os
seus. O homem insistiu, mas de nada adiantou.

Por fim, rendido, voltou a perguntar-lhe onde estavam os seus


sapatos, mas a donzela não respondeu, apenas parou de bater os pés
e ficou longamente a olhar para a água. O homem irritou-se, pois o
céu estava a clarear e ela não lhe respondia. Voltou a perguntar uma
e outra vez, mas a donzela mantinha-se imóvel a olhar para a água
do poço. O pastor não queria ter de esperar mais um ano para ter as
suas esmeraldas. Assim, puxou a moura para fora do poço para lhe
poder roubar as esmeraldas antes que desaparecessem com ela ao
nascer do sol. Mas, no momento em que os seus pés saíram da água
começaram a desfazer-se em salpicos de água e, em pouco tempo,
todo o seu corpo se desfez em água na frente do homem.

Este, perturbado, procurou as jóias onde ela estava sentada,


mas não as encontrou; acabou por destruir todo o gargalo do poço à
procura das jóias, mas não as encontrou. Por fim, cansado, debruçou-
se sobre a água para beber um pouco e foi quando viu dois
sapatinhos verdes alinhados no fundo do poço.

Diz quem lá vive que nas manhãs de S. João ainda possível ver
os sapatos verdes no fundo do poço, esperando pelo regresso da sua
dona.

Cristina Matei, nº 9

“Lenda de Mareares”
Uma tradição local inscreve no terreno da lenda o episódio da conquista do castelo
pelos cristãos.

Consciente da posição privilegiada do castelo e da cerrada vigilância mantida pelos


mouros, D. Paio Pires Correia despachou alguns batedores portugueses a sondar o
terreno e os hábitos das gentes da povoação, a fim de delinear o seu plano de assalto.
Em campo, estes conseguiram aliciar uma moura de rara beleza, Maria Aires, que lhes
informou a prática de um antigo costume dos habitantes da região, de se banharem na
praia da Amoreira (Aljezur) na madrugada do dia 24 de Junho.
De posse desse dado, o D. Paio dispôs os seus homens de modo a que, na noite
de 23 para 24 daquele mês, se ocultassem no vale vizinho ao castelo, hoje
conhecido como vale de D. Sancho certamente em homenagem ao soberano à época, D.
Sancho II de Portugal. Camuflados com a vegetação, aguardaram o movimento dos
mouros rumo à praia, na madrugada. Tão logo este se iniciou, os cristãos, ainda a
coberto pela escuridão, encetaram a aproximação final para o assalto à povoação e
castelo desguarnecidos. Neste momento, uma menina, neta de uma velha que havia
ficado para trás na povoação, percebendo a movimentação incomum fora de portas,
correu a avisar a avó que as moitas estavam a andar. A velha senhora explicava à neta
os efeitos da brisa sobre a vegetação quando de surpresa os cristãos irromperam pelas
portas, dominando a senhora que ainda intentou dar o alarme, fazendo soar um sino na
torre da cisterna. Senhores do terreno, os portugueses deram então o alarme, atraindo os
defensores para uma armadilha mortal, no interior do recinto.

Com a povoação conquistada para as armas de Portugal, D. Paio, afirma-se que


sensibilizado pelos encantos da bela Maria Aires, poupou-lhe a vida e a honra, fazendo-
lhe erguer uma casa em local próximo da povoação que ainda hoje, em sua memória, se
chama Mareares.

Alexandre. Gonçalves (6*D N*4) 29/1/2011

Lenda dos Corvos de S. Vicente.


Em tempos muito antigos
(711), quando o rei Rodrigo perdeu a
batalha de Guadalete e os Mouros
ocuparam a Península Ibérica e
ordenaram que todas as igrejas
fossem convertidas em mesquitas
muçulmanas, os cristãos de
Valência, entre eles um deão,
quiseram pôr a salvo o corpo do mártir S. Vicente que estava
guardado numa igreja. Com intenção de chegarem às Astúrias por
barco, fizeram-se ao mar levando consigo o corpo do santo. Cruzaram
o Mediterrâneo sem perigo, mas quando chegaram ao Atlântico o mar
estava mais turbulento e foram forçados a aproximar-se da costa.
Perguntaram então ao mestre da embarcação qual era aquela terra
tão bela e aquele cabo que avistavam. O mestre respondeu-lhes que
a terra se chamava Algarve e que o cabo se chamava promontório
Sacro. Foi então que os cristãos de Valência consideraram a hipótese
de desembarcar, construir um templo em memória de S. Vicente e
dar o nome do santo ao cabo mais ocidental, junto ao promontório de
Sagres. Mas enquanto estavam nestas considerações, o barco
encalhou, o que os forçou a passar ali a noite. Na manhã seguinte,
quando se preparavam para retomar viagem, avistaram um navio
pirata. O mestre da embarcação propôs-lhes afastar-se com o navio
para evitar a abordagem dos corsários, enquanto os cristãos se
escondiam na praia com a sua relíquia. Depois viria buscá-los. Mas o
barco nunca mais voltou e os cristãos ficaram naquele lugar,
construíram o templo em memória de S. Vicente e formaram uma
pequena aldeia à sua volta, isolados naquele lugar ermo.

Entretanto D. Afonso Henriques entrou em guerra com os


mouros do Algarve e estes vingaram-se dos cristãos de S. Vicente,
arrasando-lhes a aldeia e levando-os cativos. Passados cinquenta
anos um cavaleiro veio avisar D. Afonso Henriques que existiam
cativos cristãos entre os prisioneiros feitos numa batalha contra os
Mouros. Chamados à presença do rei, o deão, já muito velho, contou-
lhe a sua história e confidenciou-lhe que tinham enterrado o corpo de
S. Vicente num local secreto. Pedia ao rei que resgatasse o corpo do
mártir para um local seguro. D. Afonso Henriques aproveitou um
período de tréguas na sua luta contra os Mouros e zarpou num barco
com o deão a caminho de S. Vicente. Mas o deão morreu durante a
viagem e sem saber o local exacto onde estava enterrado o santo, D.
Afonso Henriques aproximou-se do cabo e das ruínas do antigo
templo. Foi então que avistou um bando de corvos que sobrevoavam
um certo lugar onde os seus homens escavaram e encontraram o
sepulcro de S. Vicente, escondido na rocha. Trouxeram o corpo de S.
Vicente de barco para Lisboa e durante toda a viagem foram
acompanhados por dois corvos, cuja imagem ainda hoje figura nas
armas de Lisboa em testemunho desta história extraordinária.

Joana Gonçalves, Nº15

A lenda da Moura Cássima

Esta lenda passa-se em 1149, na véspera da reconquista de


Loulé aos Mouros pelo Mestre D. Paio Peres Correia.
Loulé estava sob domínio dos mouros e seu governador tinha três
belas filhas Zara, Lídia e Cássima que era a mais nova.
Quando D. Peres se encontrava no exterior das muralhas da
cidade pronto para conquistar a cidade, o governador levou as suas
filhas até uma fonte onde as encantou, com o objectivo de as
preservar de um possível do cativeiro. Contudo o governador nessa
noite conseguiu fugir para Tânger deixando as suas filhas para trás.

Mas este não conseguia viver feliz ao pensar na pouca sorte


das suas pobres filhas. Até que num certo dia apareceu em Tânger
um "carregamento" de escravos vindos de Portugal onde se
encontrava um homem de Loulé, que o governador não hesitou em
comprar.

Já no palacete o mouro perguntou ao Carpinteiro se ele não


gostaria de voltar para perto da sua família, este sem perder um
segundo disse que sim. Logo o mouro pegou num alguidar cheio de
água dizendo ao louletano para ele se colocar de costas para o
alguidar e saltar para o outro lado, prevenindo-o que se caísse dentro
da água iria-se afogar no oceano, dando-lhe 3 pães (pães esses que
continham a chave para o desencantamento das mouras) diz-lhe o
que fazer com eles a fim de libertar as suas lindas filhas do
encantamento a que foram sujeitas. O carpinteiro salta e como num
passe de mágica chega a sua casa abraçando a sua mulher, logo de
seguida ele vai até um canto da casa e esconde os 3 pães dentro de
um baú.
Passado algum tempo mulher descobre os pães e fica
desconfiada por ele estarem escondidos, então ela pega numa faca a
fim de ver se há alguma coisa dentro deles, espetando a faca num de
imediato ela ouve um grito e as suas mãos enchem-se de sangue
vindo do interior do pão.

Na véspera de S. João (dia para o encantamento ser


quebrado) o carpinteiro estava indiferente à animação pois só
pensava em cumprir a promessa por ele feita ao ex-governador, logo
que pode pegou nos pães e foi até fonte. Chegando a altura certa,
este atira o 1º pão para a fonte e grita por Zara, a mais velha das
irmãs e uma figura feminina sobe no espaço e desaparece diante dos
seus olhos. Logo de seguida atira o 2º e grita por Lídia volta a
aparecer-lhe outra bela rapariga que desaparece no ar diante dele.
Por fim atira o 3º e grita pela filha mais nova do ex-governador, nada
acontece, ele volta a grita por Cássima e uma jovem moura aparece-
lhe agarrada ao gargalo da fonte, que lhe diz que não pode sair dali
devido a curiosidade da sua esposa. Ele pede-lhe desculpa em nome
da sua pobre mulher, esta diz que a perdoa e que tem uma coisa para
a mulher deste pois jamais poderá sair daquela fonte e atira um cinto
bordado a ouro para as mãos do carpinteiro, enquanto desaparece no
interior da fonte...

No caminho o Carpinteiro para ver melhor a beleza do cinto


coloca-o em redor de um troco de um grande carvalho, mas de
imediato a árvore cai por terra, cortada cerce pelo cinto fantástico.

Benzendo-se e rezando o carpinteiro compreende tudo:


Cássima dera-lhe o cinto apenas para se vingar! Sua mulher ficaria
cortada ao meio, como o carvalho gigantesco!
Este correu para casa abraçou a mulher e nessa noite não
conseguiu pregar olho com medo que a moura ali aparecesse, mas
isso nunca aconteceu. Tal como a moura Cássima lhe dissera não
mais poderia sair da fonte. Apenas por vezes, segundo se diz -
principalmente nas vésperas de S. João - ela consegue agarrar-se ao
gargalo da fonte, e mostrar sua beleza, e chorar a sua dor aos que se
aventuram até lá.

Pedro Costa Nº20

A Moura do Castelo de Tavira


A noite de S. João é, desde tempos imemoriais, a noite das mouras
encantadas. A tradição conta que no castelo de Tavira existe uma moura
encantada que todos os anos aparece nessa noite para chorar o seu triste
destino. Os mais antigos dizem que essa moura é a filha de Aben-Fabila, o
governador mouro da cidade que
desapareceu quando Tavira foi
conquistada pelos cristãos, depois
de encantar a sua filha. A intenção
do mouro era voltar a reconquistar
a cidade e assim resgatar a infeliz
filha, mas nunca o conseguiu.
Existe uma lenda que conta a
história de uma grande paixão de
um cavaleiro cristão, D. Ramiro, pela moura encantada. Foi precisamente
numa noite de S. João que tudo aconteceu. Quando D. Ramiro avistou a
moura nas ameias do castelo, impressionou-o tanto a sua extrema beleza
como a infelicidade da sua condição. Perdidamente enamorado, resolveu
subir ao castelo para a desencantar. A subida através dos muros da
fortaleza não se revelou tarefa fácil e demorou tanto a subir que,
entretanto, amanheceu e assim passou a hora de se poder realizar o
desencanto. Diz o povo que a moura, mal rompeu a aurora, entrou em
lágrimas para a nuvem que pairava por cima do castelo, enquanto D.
Ramiro assistia sem nada poder fazer. A frustração do jovem cavaleiro foi
tão grande que este se empenhou com grande fúria nas batalhas contra os
Mouros. Conquistou, ao que dizem, um castelo, mas ficou sem moura para
amar.

Lucas Silva
Nº.17 6ºD

LENDA DA CASTELÃ MOURA DE SALIR

A vila de Salir, no Algarve, deve o seu nome à filha do alcaide de


Castelar, Aben-Fabilla, que fugiu quando viu o seu castelo ameaçado pelo
exército de D. Afonso III.

Antes de fugir, o alcaide enterrou todo o seu ouro, pensando vir


mais tarde resgatá-lo. Quando os cristãos tomaram o castelo
encontraram-no vazio, à excepção da linda filha do alcaide que rezava
com fervor que tinha preferido ficar no castelo e morrer a “Salir”.

De um monte vizinho, Aben-Fabilla avistou a filha cativa dos


cristãos e com a mão direita
traçou no espaço o signo de
Saimão, enquanto proferia
umas palavras misteriosas.
Nesse momento, o cavaleiro
D. Gonçalo Peres que falava
com a moura viu-a
transformar-se numa estátua
de pedra. A notícia da moura
encantada espalhou-se pelo
castelo e um dia a estátua
desapareceu. Em memória
deste estranho fenómeno ficou aquela terra conhecida por Salir, em
homenagem pela coragem de uma jovem moura. Ainda hoje no Algarve se
diz que em certas noites a moura encantada aparece no castelo de Salir.

Catarina Gonçalves Costa, nº 8

A Lenda da Moura Floripes

No sítio do Moinho do Sobrado, havia antigamente uma casa, onde


aparecia à janela, noite fora, uma formosa mulher vestida de branco.

O único que se atrevia a andar por aquelas bandas à noite era um


sujeito de meia idade – o compadre Zé - que se embriagava e adormecia na
rua, sem receio.

A mulher de branco aproximava-se do bêbado, fazia-lhe meiguices e até


se sentava a seu lado.
Moinho do Sobrado (séc. XIX): actualmente o Grupo Naval de Olhão!

O compadre Zé contava a sua história sem convencer ninguém a


deslocar-se ao local para a comprovar. No entanto, o compadre Zé tinha um
amigo mais jovem que se iria casar brevemente. Aproveitando-se do evento,
promete ao amigo oferecer-lhe um seu terreno como prenda de casamento,
caso ele tivesse a coragem de o acompanhar a ver o fantasma.

Este, transido de medo, lá foi à aventura, atendendo ao grande jeito que


lhe fazia a prenda.

Sentou-se numa pedra, junto ao Moinho do Sobrado, e esperou pelas


doze badaladas. Nesse momento surge da porta do Moinho uma mulher
vestida de branco até aos pés. O vestido terminava numa bainha esfarrapada,
a cobrir-lhe os pés descalços. A mulher aproximou-se com a face envolta num
véu e uma flor nos cabelos loiros.

Julião, assim se chamava o amigo do compadre Zé, pergunta –l he


quem era e donde vinha.

- Sou a desditosa Floripes – respondeu, numa expressão triste.

- O que faz por aqui?

- Sou uma moura encantada. Quando a minha raça foi expulsa da


província, viu-se o meu pai obrigado a partir, sem poder prevenir-me. Eu tinha
um namorado que também fugiu e aqui fiquei sozinha, à espera a cada
momento que o meu pai me viesse buscar. Numa noite em que esperava, vi ao
longe a luz de uma embarcação. A noite era de tormenta e o barco
escangalhou-se de encontro aos rochedos. Não era o meu pai que ali vinha:
era o meu namorado, que foi engolido pelas ondas. Soube o meu pai deste
funesto acontecimento e vendo que não lhe era possível vir buscar-me,
encantou-me de lá.

Julião, penalizado com a triste história, logo pensou em oferecer-se


para salvar a moura e perguntou:

— Existe algum meio de a salvar?

— Há sim – respondeu a moura.

— Que meio?

— É necessário que um homem me dê um abraço, à beira de um rio, e


me fira no braço contíguo ao coração. Logo que tal aconteça, irei de imediato
para junto dos meus familiares. Mas existe
uma dificuldade.

— Que dificuldade – perguntou


Julião, quase resolvido a ser o seu
libertador.

— O homem que me abraçar e me


ferir terá de me acompanhar até África,
atravessar o oceano com duas velas
acesas e casar comigo à chegada.
"A Moura de Olhão", quadro de Carlos
— Isso é que eu não poderei Porfírio, 1962, disponível no Museu
Municipal de Faro.
fazer. Já tenho casamento marcado
com a minha Aninhas.

Bibliografia

Conceição Pires - Elucidário, Cidade de Olhão da Restauração - 1ª ed.


da autora, 2001, p.179.
Barbosa, José - Visto e ouvido... em Olhão... reflexões - Câmara
Municipal de Olhão, 1993, p.104)

“A lenda da Serra”A LENDA DA SERRA DA ESTRELA

Era uma vez um jovem pastor que vivia numa longínqua aldeia.

Por único amigo tinha um cachorrinho, que nas longas noites de


solidão se deitava a seus pés sem esperar nenhum gesto, nenhuma palavra.

Sofria este pastor de uma estranha inquietação, um grande desejo: cismava


alcançar uma serra enorme que via muito ao longe.

E muitas noites passavam meditando nesse seu desejo infindável.

Certa noite em que se julgava acordado, sonhou que uma estrela descia até si e
lhe segredava que o guiaria até ao objecto dos seus desejos. Acordou o pastor mais
inquieto e angustiado que nunca, e procurou no céu a verdade com que sonhara. Lá
estavam todas as estrelas iguais a si mesmas, imutáveis e eternas aparentemente. Mas
também uma que lhe pareceu diferente.

Passavam-se os dias e o desejo do pastor aumentava, fazia doer-lhe o corpo,


ardia-lhe febre na cabeça. De noite, todas as noites, procurava no céu a sua estrela
diferente. E em sonhos ela aparecia-lhe muitas vezes desafiando-o, desafiando-lhe
sempre a vontade. Mas a vontade por vezes é tão difícil!

Uma noite, num ímpeto, decidiu-se…

Arrumou tudo o que tinha e era nada, chamou o cão e partiu. Ao passar pela
aldeia o cão ladrou e os velhos souberam que ele ia partir. Abanaram a cabeça ante a
loucura do que assim partia à procura da fome, do frio, da morte. Mas o pastor levava
consigo toda a riqueza que tinha: a fé, a vida, um cachorrinho e uma estrela.

E o pastor caminhou tantos anos que o cão envelheceu e não aguentou a


caminhada. Morreu uma noite, nos caminhos, e foi enterrado à beira de uma oliveira. Só
com a sua estrela, agora, o pastor continuou a caminhar, sempre com a serra adiante. E à
medida que caminhava a serra ia estando sempre ali, no mesmo sítio e à mesma
distância.

Passou todas as fomes e frios que os velhos lhe tinham dito.


Atravessou rios, caminhou campos verdes e campos ressequidos, saltou sobre
rochedos escarpados, passou dentro de cidades cheias de muros e gentes, mas a
montanha dos seus desejos nunca a baniu do coração.
Por fim, já velho, alcançou a muralha escarpada que desde a infância o chamava.
Subiu até ao mais alto da serra e ali pôde então largar o desejo do seu coração, agora em
paz e sem desejo.
O horizonte era tão vasto e maravilhoso, a impressão de liberdade tão
avassaladora que o pastor, sem falar, gritava dentro de si um hino de louvor que mais
parecia o vento uivando por entre os penhascos rochosos de silêncio.

Instalou-se o velho pastor, e a sua estrela ficou com ele, no céu.


O rei do mundo, porém, ouviu falar naquele velho pastor e na sua estrela
fantástica. Mandou emissários à serra: todas as riquezas do mundo ao pastor em troca da
sua pequena estrela.

O pastor ouviu com atenção o que lhe diziam os emissários. Depois, olhou em
volta, tudo eram pedras e rochedos. Uma pequena cabana coberta de colmo era a sua
morada. Uma côdea de pão negro e uma gamela de leite as suas refeições. A sua
distracção a paisagem infinitamente igual e diferente do mundo de lá em cima. A sua
única amiga, a estrela.

Suavemente, como quem sabe o segredo das palavras e o valor de todos os bens
possíveis, virou-se para os emissários do rei do mundo e rejeitou todos os tesouros da
terra, escolhendo a pequena da sua estrela.

Passaram os anos e o velho morreu. Enterraram-no debaixo de uma fraga e nessa


noite, estranhamente, a estrela brilhou com uma luz mais intensa. Os pastores da serra
notaram essa diferença porque a reconheciam também entre as outras, pelo que o velho
lhes contava em certas noites.

E em memória desta lenda, a serra passou a chamar-lhe, para sempre, Serra da


Estrela.

Retirado do livro “Lendas Portuguesas” Investigação, Recolha e textos de Fernanda


Frazão
Amigos do Livro, Editores, LDA.

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