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p=1991
Este espaço está aberto aos realizadores, editores, sonoplastas, compositores, cinéfilos e
todos que trabalham com cinema. Sejam Bem Vindos!
Inaugurando, apresento a tradução do artigo: “Designing a Film for Sound” escrito por
Randy Thom em 1997. Trata-se de um texto de fácil compreensão que levanta algumas
questões relacionadas a som no cinema. Traduzi esse texto em outubro de 2007, e em
março de 2008 contei com a ótima ajuda de Ana Cláudia Gama Barreto para revisar a
tradução. A versão original em inglês pode ser encontrada AQUI . As notas de rodapé
foram incluídas por minha conta, com o intuito de fornecer algumas referências ao leitor.
O artigo foi dividido em duas partes, nesta primeira estão as críticas e na próxima edição
vêm as soluções.
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O maior mito sobre a composição e edição de som é que estes tratam da criação de
excelentes sons. Não é verdade, ou pelo menos não é verdade o suficiente. (Randy Thom
1999).
Você pode pensar que trata-se de fabricar bons efeitos sonoros. Mas isso não descreve
muito bem o que Ben Burtt[3] e Walter Murch[4], que inventaram esse termo fizeram em
“Guerra nas Estrelas” e “Apocalipse Now” respectivamente. Nestes filmes eles viram-se
envolvidos com diretores que não estavam interessados apenas em anexar sons impactantes
a uma estrutura pré-concebida.
Através da experimentação sonora, brincando com sons (incluindo música e diálogos e não
apenas efeitos sonoros), desde a produção até a pós-produção, o que Francis Coppola e
Walter Murch, George Lucas e Ben Burtt descobriram é que o som começou a determinar a
imagem às vezes tanto quanto a imagem determinava o som. O resultado foi muito
diferente de qualquer coisa que havia sido ouvida anteriormente. Estes filmes são marcos, e
o trabalho de som neles desenvolvido mudou para sempre a forma como pensamos o som
de um filme.
O que é considerado hoje um “ótimo som” em filmes, muitas vezes trata-se somente de som
com volume alto. Sons bem gravados de disparos e explosões, bem como vocalizações bem
construídas de criaturas alienígenas não constituem, todavia, um bom design de som.
Músicas bem orquestradas e bem gravadas têm valor mínimo se não são integradas ao filme
como um todo. Dar falas abundantes aos atores em todas as cenas não necessariamente está
ajudando a eles, a seus personagens, ou ao filme. O som, musical ou não, tem valor quando
faz parte de um continuo, quando muda no tempo, quando tem dinâmica e está em
ressonância com outros sons e com outras experiências sensoriais.
Todo filme quer ou precisa ser como “Guerra nas Estrelas” ou “Apocalipse Now” ?
Absolutamente não. Mas muitos filmes poderiam se beneficiar desses modelos. Sidney
Lumet disse recentemente em uma entrevista que ele ficou impressionado com o que
Francis Copolla e Walter Murch foram capazes de alcançar na mixagem de “Apocalipse
Now”. Bem, o que foi ótimo naquela mixagem teve início muito antes de qualquer um
chegar perto do estágio de dublagem. Na verdade, começou no roteiro e com a disposição
de Coppola de dar aos personagens de “Apocalipse” a oportunidade de ouvir o mundo ao
seu redor.
Muitos diretores que gostam de pensar que apreciam o som ainda têm uma idéia bastante
estreita do potencial do som na narrativa. A visão geralmente aceita é que é útil ter um
“bom” som para acentuar as imagens e enraizá-las numa espécie de realidade temporal.
Mas isso não é colaboração, é escravidão. E o produto disso estará limitado a ser menos
complexo e interessante do que seria se o som pudesse ter sido de alguma forma libertado
para ser um elemento ativo no processo. Apenas quando cada área influencia cada uma das
outras é que o filme começa a tomar vida própria.
É um mito comum que a etapa para o cineasta pensar seriamente sobre som seja o fim do
processo de produção cinematográfica, quando a estrutura do filme já está pronta. Afinal,
como um compositor irá saber que tipo de música irá compor a menos que ele ou ela possa
examinar pelo menos uma montagem bruta do trabalho final? Para alguns filmes, essa
metodologia é adequada. Raramente funciona incrivelmente bem. Mas não parece estranho,
que neste ambiente supostamente colaborativo, música e efeitos sonoros raramente tenham
oportunidade de exercer qualquer influência em áreas não sonoras? Como o diretor poderá
saber como fazer o filme sem ter um plano para o uso da música?
Um filme dramático que realmente funciona é, em certo sentido, quase vivo, uma complexa
rede de elementos interconectados, quase como tecidos vivos, e que, apesar de sua
complexidade, trabalha em conjunto para apresentar uma série de comportamentos mais ou
menos coerentes. Não faz nenhum sentido configurar um processo no qual o papel de uma
área, o som, seja simplesmente reagir, obedecer, ser prevenido de dialogar com o sistema
do qual faz parte.
Muitos diretores destacados tendem a oscilar entre dois estados de consciência ferozmente
diferentes sobre o som em seus filmes. Por um lado, tendem a ignorar qualquer
consideração séria sobre o som (incluindo a música) durante as fases de planejamento,
filmagem e o início da edição. Depois eles repentinamente adquirem uma dose temporária
de religião quando se dão conta de que existem “furos” na estória, cenas fracas, e edições
ruins para disfarçar. Então eles desenvolvem uma fé enorme e de vida curta no poder e no
valor do som de tornar seus filmes toleráveis. Infelizmente, em geral é tarde demais, e
depois de algumas tentativas vãs de estancar a hemorragia com um esparadrapo, a cabeça
do diretor cai, e o cinismo em relação ao som dita as regras novamente até mais tarde na
pós-produção do próximo projeto.
Segue-se agora uma lista de algumas realidades sombrias encaradas por aqueles de nós que
trabalham com som em filmes, e algumas sugestões para melhorar essa situação.
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Pré-Produção
Se o roteiro faz muitas referências a sons específicos, poderíamos ser tentados a concluir
que se trata de um roteiro amigável ao som. Mas esse não é necessariamente o caso. O grau
com que o som pode eventualmente participar na tarefa de contar uma estória será mais
determinado pelo uso do tempo, espaço e ponto de vista na estória do que pela freqüência
com a qual o roteiro menciona sons específicos. A maioria das grandes seqüências de som
em filmes são sequências “PDV[5]“. A fotografia, a organização dos atores, o planejamento
de produção, a direção de arte, a edição e os diálogos foram organizados de forma que nós,
o público, experimentamos a ação pelo ponto de vista de um ou mais personagens daquela
seqüência. Como o que nós vemos e ouvimos está sendo filtrado pelas consciências deles,
aquilo que eles ouvem pode nos dar muitas informações sobre quem eles são e o que eles
estão sentindo. A compreensão da utilização do “PDV”, bem como o uso do espaço
acústico e do elemento tempo deveriam começar pelo roteirista. Alguns roteiristas pensam
naturalmente nestes termos, a maioria não, e esses aspectos quase nunca são ensinados nos
cursos de roteiro.
Considerações sérias sobre como o som será usado na estória são tipicamente deixadas a
cargo do diretor. Infelizmente, a maioria dos diretores tem apenas uma idéia vaga de como
usar o som porque a eles também isso não foi ensinado. Em praticamente todas as escolas
de cinema o som é ensinado como se fosse simplesmente uma série de operações técnicas
mistificantes e entediantes, um mal necessário no caminho para fazer as partes divertidas.
ProduçãoNo set, quase todos os aspectos do trabalho da equipe de som estão submetidos
às necessidades da equipe de câmera. As locações para filmagem foram escolhidas pelo
diretor, diretor de fotografia e designer de produção, muito antes que qualquer um
relacionado com o som tenha sido contratado. Os sets são tipicamente construídos com
pouca ou nenhuma preocupação, ou sequer consciência, das implicações para o som. A
iluminação gera ruídos, o caminhão com gerador está estacionado muito perto. O teto, ou o
assoalho poderiam ter sido facilmente forrados[6] para abafar o som de passos quando os
pés não estão em quadro, mas não há tempo suficiente. As cenas são geralmente compostas,
organizadas e iluminadas com muito pouco empenho para ajudar ou a equipe de som direto
ou a de pós-produção a se beneficiarem da gama de possibilidades dramáticas intrínsecas às
situações. Em quase todos os casos, o critério visual determina quais cenas serão reveladas
e usadas. Qualquer momento que não contenha algo visualmente fascinante é rapidamente
descartado.
Raramente há discussão, por exemplo, sobre o que deveria ser ouvido ao invés de ser visto.
Se muitos dos nossos personagens estão conversando num bar, talvez um deles pudesse
estar num canto escuro. Nós ouvimos sua voz, mas não o vemos. Ele pontua as poucas
coisas que diz com o som de uma garrafa que rola para frente e para trás numa mesa à sua
frente. Finalmente ele coloca um bilhete na garrafa e a rola pelo chão do bar escuro. Ela
pára aos pés dos personagens que vemos. Esta abordagem poderia ser adotada para uma
comédia, um drama, ou ambos, como foi usado em “Era uma vez no Oeste”. De qualquer
forma, o som está dando uma contribuição. O uso do som exercerá forte influência sobre a
forma como a cena é configurada. Provocar o olhar irá inevitavelmente trazer a audição, e
portanto a imaginação, para a ação.
Pós-Produção
Se sua reação a tudo isso é “- Então, o que você esperava, não se trata uma mídia visual?”
pode ser que não haja nada que eu possa dizer para mudar sua opinião. Minha opinião é que
um filme definitivamente não é uma “mídia visual”. Penso que se você olhar
detalhadamente e ouvir uma dúzia ou mais dos filmes que considera excelentes, irá
compreender que importante papel o som desempenha em muitos, senão na maioria deles.
Dizer “o papel que o som desempenha” é até mesmo um pouco enganoso, porque, na
verdade, quando uma cena é realmente impactante, os elementos visuais e auditivos
trabalham conjuntamente tão bem que é quase impossível tomá-los separadamente. As
sugestões que estou prestes a fazer obviamente não se aplicam a todos os filmes. Nunca
haverá uma “fórmula” para se fazer um grande filme ou um grande som no filme. Seja
como for…
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- Guerra nas Estrelas: Uma Nova Esperança (Star Wars: Episode IV - A New Hope),
George Lucas. EUA, 1977, cor, 121 min.
- Apocalipse Now, Francis Ford Coppola. EUA, 1979, cor, 153 min.
- Cidadão Kane (Citzen Kane), Orson Welles, Alemanha, 1941, pb, 119 min.
- Touro Indomável (Raging Bull), Martin Scorsese, EUA, 1980, pb e cor, 128 min.
- O Homem Elefante (The Elephant Man), David Lynch, EUA / Inglaterra, 1980, pb, 125
min.
- Never Cry Wolf, Carroll Ballard, EUA, 1983, cor, 105 min.
- Era uma vez no Oeste (Once Upon a Time in the West), Sergio Leone, Itália / USA,
1968, cor, 165 min.
[1] Uma biografia sucinta de Randy Thom pode ser encontrada neste link:
http://www.imdb.com/name/nm0858378/bio. Nota do tradutor.
[2] O termo sound design surgiu no cinema para definir o trabalho de produção de sons e
efeitos sonoros inéditos desenvolvido por Ben Burtt em “Star Wars”, e, numa outra
acepção, no trabalho de planejamento cooperativo desde o roteiro e a filmagem até edição
de imagens e edição de som realizado por Walter Murch com o diretor Francis Coppola em
“Apocalipse Now”. Nota do tradutor.
[3] Uma biografia sucinta Ben Burtt pode ser encontrada neste link:
http://www.imdb.com/name/nm0123785/.
[4] Uma biografia sucinta de Walter Murch pode ser encontrada neste link:
http://www.imdb.com/name/nm0004555/.
[5] PDV: Ponto de vista, também chamado de plano subjetivo. Nota do tradutor.
[6] Forrado com mantas de som ou outro material absorvente com objetivo controlar
reverberações, melhorando assim o som. Nota do tradutor.
[8] ADR é termo em inglês para dublagem, significa Automated Dialog Replacement. Nota
do tradutor.