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TRATADO DE DIREITO PRIVADO


PARTE ESPECIAL

TOMO XLIII

Direito das Obrigações: Mandato. Gestão de negócios


alheios sem outorga. Mediação. Comissão.
Corretagem.

TÍTULO XXXI

MANDATO

CAPÍTULO 1

MANDATO

§ 4.675.Conceito e Natureza do Mandato. 1. Conceito. 2. Gratuidade e onerosidade; poder de representação. 3.


Negócios jurídicos subjacentes, justajacentes e sobrejacentes. 4. Recepticiedade e representação
§ 4.676.Elementos do contrato de negocio . 1. Composição de negócio jurídico do mandato. 2. Oferta. 3.
Aceitação
§ 4 .677. interesse e regras juridicas do mandato. 1. Interesse na atividade do mandatário. 2. Regras jurídicas
sobre o mandato

CAPÍTULO 11

PRESSUPOSTOS E ESPÉCIES DO CONTRATO DE MANDATO

§ 4.678.pressupostos do contrato de mandato. i. Capacidade e mandato. 2. Forma, mandato e poder de


representação. 3. Forma da outorga do poder de representação e mandato. 4. Direito civil e direito comercial. 5.
Princípio de simetria da forma escrita. 6. Instrumento particular de procuração e reconhecimento da firma
§ 4.679.Extensão dos poderes conferidos. i. Espécies de extensão. 2.Pluralidade de outorgados. 3. Extensão
objetiva
§ 4.680.Espécies de contrato. 1. Mandato tácito e mandato presumido. 2. Mandato civil e mandato comercial
§ 4.681.Mandato e figuras jurÍdicas afins. 1. Mandato e locação de serviços, mediação, corretagem, nunciatura
e preposição. 2. Atos e atos-fatos sem serem em relação jurídica intencional com outrem. 3. Regras jurídicas
sobre mandato e invocabilidade a respeito de outros negócios jurídicos

CAPÍTULO III

EFICÁCIA DO CONTRATO DE MANDATO

§ 4.682.Deveres e obrigações do mandatario i. Desempenho do mandato. 2. Dever de comunicação. 3.


Instruções do mandante. 4.Contas. 5. Cláusula insertiva de prestação de contas.
§ 4.683.Deveres e obrigações do mandante. 1. Provisão de fundos.2. Efeitos dos atos do mandatário. 3.
Remuneração. 4. Somas adiantadas. 6. Perdas e danos
§ 4.684.O mandatários relações com terceiros. 1. Contratos e atos futuros. 2. Atuação do mandatário. 3.
Atuação do mandatário em nome próprio e transmissão da propriedade. 4. Direitos de crédito e adimplemento
do mandato em nome do mandatário. 5. Contrato do mandatário consigo mesmo...
4.685.Atos do mandatário sem poderes suficientes. 1. Falta de poderes . 2. Impugnação e ratificação de atos

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praticados sem poderes. 3. Atos praticados com excesso de poderes. 4. Terceiro e atos praticados sem poderes
.156. Retificação do excesso. 1. Excesso de poderes e ratificação. 2.Ratificação expressa e ratificação tácita. 3.
Ratificação e eficácia. 4. Denegação da ratificação e suas consequências. 5.Falta de poderes e excesso de
poderes. 6. Nulidade e falta de poderes. 7. Alternatividade
§ 4.687.Falso nome e falso procurador. 1. Deveres e obrigações contraídas com falso nome e falso procurador.
2.Representaçãode pessoa já morta. 3. Código Civil, arts.1 .316, II, e1.31872
§ 4.688. Procurador só aparente. 1. Procuração só em aparência. 2.Mandato só aparente e procuração só
aparente
§ 4.689. Adiantamentos ao outorgado e desembolso pelo outorgado.
1.Despesas de execução do mandato. 2. Inadimplemento pelo mandante. 3. Adiantamento e imputação. 4.
Desvio de aplicação. 5. Direito de retenção

CAPÍTULO IV

EXTINÇÃO DO MANDATO

§ 4 690.Causas de extinção. 1. Código Civil, art. 1.315. 2. Revogação do mandato. 3. Denúncia pelo
mandatário. 4. Morte do mandante. 5. Morte do mandatário. 6. Incapacidade superveniente do mandante. 7.
Interdição por incapacidade superveniente do mandatário. 8. Mudança de estado. 9. Terminação do prazo
(têrmo final) . 10. Conclusão do ato ou impossibilitação do que se desejava. 11. Condição resolutiva. 12.
Transferência da posição de mandatário. 13. Distrato do contrato de mandato. 14. Outras causas de extinção
4.691.Eficácia após a extinção do mandato. 1. Tutela dos interesses do mandatário. 2. Tutela dos interesses do
mandante. 3.Remuneração e gratuidade

CAPÍTULO v

PROCURAÇÃO E PROCURAÇÃO EXTRAJUDICIAL


§ 4.692.Conceito e natureza da procuração. 1. Conceito da procuração.2.Precisões conceptuais. 3. Natureza da
procuração....
§ 4.693.Espécies de procuração. 1. Quanto aos 3 poderes outorgados.2.Quanto à forma. 3. Procuração para
obrar em nome próprio. 4. Prazos e condições. 5. Procura e mandato, concorrência e discordâncias. 6. Início da
procura e recepticiedade.7.Forma da procuração. 7. Pluralidade de outorgados. . .
§ 4.694. Excessão da procuração extra judicial. 1. Revogação. 2 Mortedo procurador e morte do procurado. 3.
Denúncia pelo procurador. 4. Mudança de Estado. 5. Interdição do procurado ou do procurador. 6.
Impossibilidade superveniente dos atos de procura. 7. Exercício completo dos poderes. 8.Prazo, condição
resolutiva e procuração. 9. Substabelecimento da procuração e extinção da outorga de poderes...

CAPITULo VI

PROCURAÇÃO JUDICIAL
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§ 4.695 .Procuradores e partes perante o Justiça. 1. Direito processual e procura judicial. 2. Representação
processual. 3. Capacidade postulacional. 4. Conceito e natureza do contrato de advogado. 5. Pressupostos
formais da procuração. 6. Falta e defeituosidade da procuração. 7. Pluralidade de outorgas. 8. Impedimento
para a procura judicial. 9. Capacidade do procurador judicial
4.696.Poderes “ad iudicia”. 1. Poderes especiais. 2. Advocacia a favor de outrem e advocacia em causa própria
§ 4.697.Caução de rato. 1. Conceito. 2. Caução de rato e pressupostos. 3. Caução que se há de prestar. 4.
Inadimplemento da promessa. 5. Procuração com caução de rato por advogado ou não
§ 4.698. Extinção dos podére s de procuração judicial. 1. Revogação. 2.Morte do procurador e morte do
procurado. 3. Denúncia da procura. 4. Interdição do outorgante ou do outorgado.
5.Mudança de estado do outorgante. 6. Impossibilidade superveniente dos atos de procura. 7. Extinção da
relação jurídica processual, exercício completo dos poderes, expiração de prazo e implemento de condição

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CAPÍTULO VII

PROCURAÇÃO EM CAUSA PRÓPRIA

§ 4.699.Conceito e natureza da procuração em causa própria. 1. Origem. 2. Natureza e extensão do poder de


gestionar “in rem suam”. 3. Procuração em causa própria e irrevogabilidade. 4.Outorgante, outorgado e poderes
outorgáveis em causa própria
§ 4.700.Eficácia da. procuração em causa própria. 1. Ato em nome de outrem. 2. Revogabilidade e causas de
extinção. 3. Quais os direitos que se atribuem ou são atribuíveis ao procurador em causa própria. 4.
Responsabilidade pela evicção. 5. Substabelecimento da procuração em causa própria

CAPITULO VIII
SUBSTABELECIMENTO DA PROCURAÇÃO

4.701.Conceito e natureza do substabelecimento. 1. Pessoalidade do cumprimento dos deveres do mandatário.


2. Poder de substabelecer
§ 4.702.Espécies e efeitos do substabelecimento. 1. Considerações prévias. 2. Substabelecimento e suas
espécies. 3. Substabelecimento sem reserva de poderes. 4. Substabelecimento com reserva de poderes. 5.
Responsabilidade do substabelecente. 6.Cessação dos poderes do substabelecido. 7. Substabelecimento e
procuração em causa própria. 8. Morte do procurador substabelecente
§ 4.703.Honorários do substabelecido. 1. Precisões. 2. Substabelecimento total e definitivo. 3.
Substabelecimento sem saída da relação jurídica

TÍTULO XXXII

NEGÓCIOS ALHEIOS SEM OUTORGA

cAPÍTULO 1

CONCEITO E NATUREZA DA GESTÃO DE NEGÓCIOS ALHEIOS SEM OUTORGA


§ 4.704.Conceito e precisões. 1. Conceito. 2. Precisões. 3. Elementos negativos e elemento positivo. 4. Interesse
do dono do negócio. 5. Vontade a favor, manifesta ou presumida, e vontade contrária à gestão por outrem sem
outorga. 6. Conceito de dono de negócio. 7. Entidades estatais e seus órgãos como gestores. 8. Gestão a favor
de entidades públicas. .
§ 4.705.Natureza do. gestão de negócios alheios sem outorgo. 1. Elementos componentes. 2. Interesse alheio e
gestão por outrem.3. Vontade contrária inoperante

CAPíTULO II

PRESSUPOSTOS E EFICÁCIA DA GESTÃO DE NEGÓCIOS ALHEIOS

§ 4.706. Pressupostos da gestão de negócios alheios sem outorga.


1.Preliminares. 2. Inexistência do dever de gestão. 3. Pressuposto da alienidade do objeto da gestão. 4. Vontade
de gerir negócio alheio. 5. Gestão de negócios alheios sem outorga e ação proposta em juízo. 6. Capacidade do
gestor de negócios alheios sem outorga. 7. Gestão a favor de incapazes. 8. Gestão em nome próprio. 9.
“Prohibitío domini”. 10.Limites objetivos da gestão
§ 4.707.Distinções quanto à responsabilidade do gestor. 1. Inicio da gestão de negócios sem outorga. 2.
Vontade do dono do negócio. 3. Gestão contra a vontade do dono do negócio. 4. Deveres de interesse público

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198§ 4.708.Deveres do gestor de negócios alheios sem outorga. 1. Dever de aviso. 2. Dever de diligência. 3.
Dever de informações intercorrentes. 4. Dever de cuidado provisório. 5. Dever de continuar a gestão
§ 4.709.Responsabilidade do gestor de negócios alheios sem outorga. 1.Responsabilidade do gestor se há
vontade manifesta ou presumida do dono do negócio. 2. Responsabilidade do gestor sem outorga e contra a
vontade manifestada ou presumida do dono do negócio. 3. Regras jurídicas sobre a atividade do gestor. 4.
Operações arriscadas. 5. SubstituIção na gestão. 6. Interesses e inversões. 7. Compensação e contas da gestão.
8. Morte do dono do negócio
§ 4.710.Comunidade ou conexidade de interesses. 1 Interesses comuns. 2. Sociedade e gestão
§ 4.711.Ratificação e não-ratificação pelo dono do negócio. 1. Ratificação e espécies. 2. Eficácia da
ratificação. 3. Ratificação ordinária pelo “dominus negotil”. 4. Falta de ratificação e desaprovação por haver ou
ter havido contrariedade aos interesses do dono do negócio. 5. Gestão do negócio alheio para si
§ 4.712. Interesses do dono do negócio. 1. Vinculação do dono do negócio. 2. Negócio gentilmente gerido. 3.
Dever “ex lege” e gestão de negócios alheios sem outorga. 4. Gestão a título de dádiva. 5. Irremunerabilidade e
remunerabilidade da gestão de negócios alheios sem outorga
§ 4.713.Extinção da gestão de negócios alheios sem outorga e suas consequiências . 1. Casos de cessação. 2.
Conseqüências da cessação da gestão. 3. “Actio negotiorum gestorum directa”. 4. “Actio negotiorum gestorum
contraria”

TÍTULO XXXIII

MEDIAÇÃO

CAPÍTULO 1

CONCEITO E NATUREZA DO CONTRATO DE MEDIAÇÃO


§ 4.714.Conceito de mediação. 1. Precisões para o conceito da mediação. 2. Atividade do mediador. 3.
Expressão “Mediação”.
§ 4.715.Natureza do contrato de mediação. 1. Precisões sobre a natureza da mediação. 2. Negociabilidade da
mediação. 3. Momento da conclusão do negócio de mediação. 4. Referência errônea a condição. 5. Referência à
acessoriedade. 6. Mediação e outros contratos. 7. Se é bilateral ou unilateral o contrato de mediação. 8.
Contrato de mediação e contrato de opção. 9. Mediadores, corretores e outros agentes...

CAPÍTULO II

PRESSUPOSTOS, EFICÁCIA E EXTINÇÃO DO CONTRATO DE MEDIAÇÃO

§ 4.716.Pressupostos do contrato de mediação. 1. Liberdade de mediação. 2. Admissão da mediação e


admissão da futura vinculação a remunerar. 3. Consentimento e vinculação dos interessados. 4. Manifestação
pré-elidente, tardia, de vontade.
1.Ocultação do nome de figurante. 6. Possibilidade da mediação. 7. Licitude da mediação. 8. Forma do contrato
de mediação. 9. Momento da conclusão do contrato de mediação. 10. O que se quer e o negócio jurídico para se
obtero que se quer. 11. Que se há de entender por “conclusão de negócio”. 12. Atividade do mediador, concausa
da conclusão do negócio jurídico
§ 4.717.Eficácia da mediação nomundo fáctico. 1. Precisões. 2. Deveres jurídicos e ajurídicos.3. Pactos
adjectos ou não à mediação
4.718. Deveres ajurídicos do mediador. 1. Dever de informação. 2.Óbices ao que os interessados têm por fito. 3.
“Culpa in contrabendo” e mediação. 4. Dever de sigilo. 3. Propriedade e autenticidade

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§ 4.719.Deveres dos interessados. 1. Dever de comunicação. 2. Pluralidade de mediadores separados. 3.


Comunicação para a remuneração. 4. Despesas feitas pelo mediador
§ 4.720. Eficácia do contrato de mediação. 1. Momento de irradiação. 2.Eficácia e eficiência da mediação. 3.
Prestações. 2. Remuneração do mediador. 1. Pluralidade de mediadores e remuneração. 6. Despesas feitas pelo
mediador. 7. Nulidade do negócio jurídico
§ 4.721.Extinção da mediação fáctica e extinção do contrato de mediação. 1. Revogação pelos interessados. 2.
Revogação pelo mediador. 3. Pagamento, distrato. 4. Morte dos figurantes do negócio jurídico. 5. Morte do
mediador. 6. Rescisão do negócio jurídico obtido. 7. Condição inserta no negócio jurídico obtido. 8. Concurso
de credores
§ 4.730.Eficácia quanto ao comitente. 1. Deveres do comitente. 2. Remessa ou entrega do bem ao
comissionário. 3. Comitente e terceiros. 4. Cessão judicial dos direitos contra terceiro ou terceiros
§ 4.731.Extinção do contrato de comissão. 1. Causas de extinção. 2.Denúncia cheia e denúncia Vazia da
comissão. 3. Morte do comitente. 4. Morte do comissionário. 5. Falência e outros concursos de credores. 6.
Prazo resolutivo ou prazo resilitivo e condição resolutiva ou condição resilitiva

TÍTULO XXXV

CONTRATO DE CORRETAGEM

CAPÍTULO 1

CONCEITO E NATUREZA DO CONTRATO DE CORRETAGEM COMISSÃO

CAPÍTULO 1

CONCEITO E NATUREZA DO CONTRATO DE COMISSÃO

§ 4.722.Conceito do contrato de comissão. 1. Conceito. 2. Dados históricos. 3. Figurantes de contrato. 4.


Mandato para atos em nome próprio e comissão
§ 4.723.Natureza e estrutura da comissão. 1. Suporte fáctico do negócio jurídico. 2. Comissão e mandato. 3.
Contrato consensual. 4. Comissionário e conteúdo das operações. 5. Revelação do nome do comitente e dos
clientes. 6. Mandato sem representação, mandato exercido em nome próprio e comissão
§ 4.724.Espécies de comissão. 1. Dever de conclusão e espécies de comissão. 2. Comissão imperativa. 3.
Comissão indicativa. 4.Comissão facultativa. 5. Usos da praça. 6. Cláusula “livre após prazo”. 7. Contrato de
comissão e contrato estimatório. 8. Contrato de comissão e contrato de opção...
§ 4.725.Pressupostos do contrato de comissão. 1. Comitente e comissionário. 2. Capacidade para ser
comissionário. 3. Prova do contrato de comissão
§ 4.726.Eficácia quanto ao comissário. 1. Eficácia entre contraentes e entre êles e os terceiros. 2. Contrato de
comissão e negócio jurídico concluído. 3. Ação do comitente contra o terceiro ou os terceiros
§ 4 . 727.Deveres e obrigações dos comissionários. 1. Deveres em geral. 2. Dever de concluir o negócio
jurídico. 3. Dever de guarda. 4. Dever de comunicação. 2. Outros deveres. 6. Responsabilidade do
comissionário. 7. Dever de comunicação e de contabilidade. 8. Seguro do bem consignado. 9. Comissão “dei
credere”. 10. Operações a crédito. 11. Exceções do comitente. 12. Prazo para a operação. 13. Terceiros,
comitente e comissionário
§ 4.728.Restituição dos bens e dos créditos em concurso de credores do comissionário. 1. Falência ou outro
concurso de credores do comissionário e cessação do contrato de comissão. 2. Compra-e-venda e transmissão
§ 4.729.Substituição do comissionário. 1. Outorga pelo comissionário. 2. Substituição e adição de outro
comissionário
§ 4.732.Conceito de contrato de corretagem. 1. Conceito de corretagem e de corretor. 2. Corretor e étimo. 3.
Função do corretor. 4. Certidões e atestados. 5. Atos comerciais e corretagem
§ 4.733.Natureza do negócio jurídico de corretagem. 1. Unilateralidade ou bilateralidade ou plurilateralidade. 2.
Contrato de corretagem e espécies afins

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§ 4.734.Contrato de corretagem e certos contratos. 1 Corretagem e mediação. 2. Contrato de corretagem e


comissão. 3 Corretagem e locação
§ 4.735.Espécies de corretores e funções específicas. 1. Espécies de corretores quanto à ligação ao estado. 2.
Corretores públicos. 3. Corretores matriculados. 4. Corretores livres. 5. Fé pública. 6. Traduções pelos
corretores de navios

CAPÍTULO II

PRESSUPOSTOS E EFICÁCIA DO CONTRATO DE CORRETAGEM

§ 4.736.Pressupostos para o contrato de corretagem. 1. Capacidade para ser corretor. 2. Matrícula e nomeação.
3. Forma de contrato
§ 4.737.Eficácia do contrato de corretagem quanto ao corretor. 1. Eficácia em geral do contrato. 2. Segrêdo e
corretagem. 3. Responsabilidade ordinária dos corretores. 4. Responsabilidade extraordinária <legal ou
convencional)
§ 4.738.Eficácia do contrato quanto ao incumbente. 1. Eficácia em geral do contrato. 2. Dever de comunicação.
3. Responsabilidade pelos atos dos prepostos. 4. Remuneração do corretor

CAPÍTULO III

EXTINÇÃO DO CONTRATO DE CORRETAGEM

§ 4.739. Princípios gerais sobre extinção do contrato do corretor. 1.Espécies de extinção. 2. Inadimplemento e
extinção...
§ 4.740. Análise das espécies. 1. Extinção voluntária e extinção automática. 2. Revogação. 3. Denúncia cheia
pelo corretor e pelo incumbente. 4. Expiração de prazo e implemento de condição resolutiva. 5. Morte do
corretor. 6. Incapacidade superveniente do corretor. 7. Impossibilidade superveniente e ilicitude superveniente
da operação. 8. Distrato. 9. Resolução e resilição. 10. Falência ou concurso civil de credores do corretor. 11.
Conclusão do negócio jurídico

CAPÍTULO IV

CORRETORES DE FUNDOS PÚBLICOS E OUTROS VALORES

§ 4.741.Conceito e natureza do corretor de valôres. 1. Fundos públicos e corretagem. 2. Privatividade oficial


das operações. 3.Agentes auxiliares do comércio. 4. Pressupostos para a nomeação do corretor de valôres. 5.
Caução. 6. Deveres anteriores ao exercício. 7. Prepostos e assistentes-sucessores. 8.Falecimento do corretor e
outras causas. 9. Vedações aos corretores oficiais. 10. Livros e documentos dos corretores oficiais. 11. Certidões
e atestados. 12. Procuração e função de correspondente. 13. Legislação brasileira sobre corretores
§ 4.742.Prepostos de corretor. 1. Preposição e substituição. 2. Preposto e grangeador ou zângão. 3. Disciplina
dos prepostos. 4.Atividade dos prepostos do corretor
§ 4.743. Câmara sindical. 1. Conceito e natureza. 2. Eleição do síndico e dos membros da Câmara Sindical. 3.
Reuniões extraordinárias e assembléia geral extraordinária. 4. Deliberações da Câmara Sindical
§ 4.744.Síndico. 1. Conceito e natureza. 2. Duração do cargo.3.Funções
§ 4.745.Bôlsas oficiais de Valôres. 1. Conceito e natureza. 2. Recinto e balaustrada da Bôlsa. 3. Pregões e
operações bolsísticas.
4.Livros, regimento interno e trabalhos da Bôlsa. 5. Títulos cotáveis. 6. Sessões da Bôlsa e pregões. 7.
Operações fora da Bôlsa. 8. Operações feitas pelos próprios figurantes. 9. Câmara de compensação
§ 4.746.Contacto inicial do corretor com o incumbente e conclusão do contrato de corretagem. 1. Incumbência.
2. Retirada da incumbência pelo incumbente. 3. Dever de comunicação.
4.Entregas e garantias. 5. Garantias exigíveis. 6. Responsabilidade dos incumbentes. 7. Natureza das entregas e

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das coberturas. 8. Liquidação por compensação. 9. Conseqilências da falta de entrega e de cobertura. 10.
Adimplemento e inadimplemento pelo incumbente. 11. Contagem (remuneração). 12. Recibo pelo corretor. 13.
Dever de sigilo.14.Responsabilidade dos corretores de fundos públicos e outros valôres. 15. Prescrição
§ 4.749. Junta dos Corretores. 1. Composição e expediente. 2. Atestados. 3. Classificação das mercadorias. 4.
Reúnião da Junta dos Corretores. 5. Competência do síndico. 6. Competência do adjunto-secretário. 7.
Funcionários da Secretaria da Junta de Corretores. 8. Regulamentação. 9. Destituição dos corretores de
mercadorias
§ 4.750.Competência e deveres dos corretores de mercadorias. 1. Princípios básicos. 2. Corretores oficiais de
mercadorias. 3. Deveres dos corretores oficiais de mercadorias. 4. Certidões.5.Proíbições aos corretores de
mercadorias. 6. Cargos de corretor e de prepostos. 7. Responsabilidade civil e cri
minal
§ 4.751.Penalidades. 1. Penas e espécies. 2. Procedimento . ...
§ 4.752.Assembléias gerais.1. Função das Assembléias. 2.Competência das Assembléias. 3. Privatividade
7§ 4.753.Corretores de navios.1. Preliminares. 2. Nomeação. 3.Caução. 4. Destituição.5. Preposto. 6.
Atribuições dos corretores de navios. 7. Livros dos corretores de navios. 8.Responsabilidade civil.9. Penas
disciplinares e emolumentos.10.Nota final

CAPÍTULO V

CORRETORES DE MERCADORIAS E DE NAVIOS

§ 4.747. Conceito e natureza do corretor de mercadorias. 1. Conceito.2.Natureza do corretor de mercadorias e


do corretor de navios
§ 4.748.Nomeação dos corretores oficiais e regras jurídicas sobre exercício do cargo. 1. Exigências. 2.
Proibições aos corretores de mercadorias e de navios. 3. Caução. 4. Remuneração dos corretores de
mercadorias. 5. Morte do corretor e documentos.

MANDATO

§ 4.675. Conceito e natureza do mandato

1.CONCEITO. Mandato, para o direito romano, era o ato de dar a mão, manus + dare, que supunha igualdade,
préstimo gratuito. Se a remuneração intervinha, havia locação de serviços, negócio juridico; então, entre
desiguais. A forma intercalar, já nos tempos imperiais, foi a dação de honorário, remunerandi grafia honor, sem
que tivesse o mandatário ação para obter remuneração. Assim foi o mandato do velho direito português:
“Mandatum tandem, conventio alia benefica, is contractus dicitur, qua quis alteri negotium gratis gerendum
conimittit” (MELO FREIRE, Institutiones, 5•a cd., IV, 27>.
Já no direito romano, o contrato de mandato podia ter por objeto cuidar dos negócios ou desempenhar qualquer
outra classe de atividade. A gestão havia de ser no interesse do mandante ou de terceiro. Não se conceberia o
mandato no só interesse do mandatário. Dai não ser mandato o conselho, porque em aconselhar está implícito o
indicar alguma solução, ou algum caminho, no interesse de quem recebe o conselho. Isso não significa que
sempre se precisassem, na República, os dois conceitos. Ao conselho chamou-se inandatum tua gratia, o que
revela a incaracterização. Nos fins da República, a discriminação firmou-se, com regulamentação mais
adequada, progressiva, durante a época clássica, O interesse misto foi admitido (CELSO, referido por
ULPIANO, L. 16, D., mandati vel contra, 17, 1), ressaltando no chamado mandato de crédito, que era o
contrato pelo qual se dava crédito a terceiro, por encargo de outra pessoa (SABINO considerava mandato, mas
4TRATADO DE DIREITO PRIVADO houve objeções, tE. GAIO, Irtst., III, 156; cp. L. 2, § 5, O., mandati vel
contra, 17, 1). No direito comum chamou-se a isso mandaturn qualificatum, expressão estranha às fontes.
Diz-se, hoje, mandato o contrato pelo qual se criam a a]guém o dever e a obrigação, perante outrem, da gestão
de negócios que se lhe entregam, com ou sem poder de representar. Contrato bilateral, ou unilateral, porquanto
os deveres e obrigações que surgem ao mandante, se não foi estipulada a remuneração por ser gratuito (Código
Civil, art. 1.290, parágrafo único), não importam dever de contraprestar. No Código Civil, art. 1.288, alinea 1a,

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define-se o mandato dizendo-se: “Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes, para, em seu
nome, praticar atos, ou administrar interesses”. Na alínea 2•a, acrescenta-se: “A produração é o instrumento do
mandato”.
Conforme já frisamos e veNeremos a acentuar, não se há de confundir com o mandato a procuração . Tem-se de
distinguir do contrato de mandato o negócio juridico da outorga de poderes , unilateral, que se contém na
procuração. Nem todo mandato importa haver a procura, nem tôda procura supóe mandato.
Se o mandato é gratuito, n&o há bilateralidade; se é oneroso, a bilateralidade ressalta. No direito brasileiro, não
podemos dizer que o mandato em que, se se acordou em haver retribuIção, seja contrato de serviços (locação de
serviços), ou de obra (empreitada, sensu lato) persiste a reminiscência do elemento romano que, no mandato
oneroso, não via contraprestação, mas doação honorária (honorarum e não salarium = dádiva para comprar
sal). Reminiscências, dissemos; porque, em verdade, há contraprestação no mandato oneroso. Assim como
longe ia o tempo em que “Mandatum nisi gratuitum nuilus” (= não é juridicamente existente o negócio de
mandato oneroso), já hoje vai bnge o em que se confundia o poder com o mandato de representação e já não
incorremos no êrro de outros sistemas jurídicos, em que se considera haver sempre mandato se há qualquer
assunção gratuita de atos-fatos (traçar planos, construir, vigiar, montar guarda). O conceito de gestão é mais
largo do que o de mandato.
O mandato, no direito brasileiro, não só se refere a poder de representação; não é limitado a negócios
jurídicos: há mandato para atos jurídicos stricto sensu e para atos-fatos, e no tocante a êsses não há
representação. De modo nenhum, no direito brasileiro, a gratuidade serve a distinguir mandato e locação de
serviços ou locação de obra. Se bem que não aprofundado pelos juristas, é êsse o ponto principal na
classificação dos contratos. A natureza do ato que se exige de alguém é que distingue mandato e locação de
serviços, não a unilateralidade, ou a gratuidade. Quem exige limpar-se a vala, ou o desviar-se o rio, não manda:
é locatário de serviços, ou de obra; quem exige que alguém assine, pelo outorgante, o documento, ou interpele,
ou intime a outrem, manda; quem exige que outrem adquira a posse para quem exige, ou abandone a posse que
é de quem exige, manda. Ê contraente de serviços quem exige que outrem especifique, ou procure tesouro, ou
escreva cartas; porém o mandato pode ir até aí. Não a representação.
A gestão em negócios jurídicos ou mesmo noutros atos jurídicos pode ser por órgão (presentação da pessoa
juridica), ou por incidência de lei que estabeleça representação (pai ou mãe que é titular de pátrio poder,
testamenteiro, síndico de falência, curador), ou em virtude de negócio jurídico, unilateral ou bilateral.
Há princípios comuns a tôdas essas gestões e princípios comuns somente às representações.
Ao mandato, por fôrça de razões históricas, há remissões quando se quer aludir a princípios comuns. Por
exemplo, a propósito do contrato de comissão, do contrato de transporte ou do contrato de corretagem.
Quando se fala de contrato de mandato e se diz que é gestão de negócios com mandato, permite-se pensar em
que só há a gestão de negócios alheios com mandato e a gestão de negócios alheios sem a vontade do dono do
negócio. Ora, há gestão de negócios alheios sem mandato, porém com a manifestação de vontade do dono do
negócio ou do possuIdor. O mandato é apenas uma das espécies de gestão de negócios com a expressão volitiva
do dono ou possuidor; melhor, do titular. Nem sempre quem gestiona gratuitamente negócios alheios é
mandatário, ou gestor de negócios alheios sem que o tenha querido o titular do negócio, ou dos negócios.
Quem se encarrega, gratuitamente, de velar pela casa, ou pelo sítio, após oferta do titular do direito sobre o bem
ou aceitação por êle, está em relação jurídica contratual. Não há, porém, sempre, mandato. Pode haver gestão de
negócios alheios (~ de interesses alheios) sem se tratar de mandato, nem da gestão de negócios alheios a que o
Código Civil dedica os arts. 1.331-1.345. As regras jurídicas são, a cada momento, invocáveis, porém de jeito
nenhum se pode considerar mandato o contrato a que falta assunção dos deveres característicos de mandatario.
O mandato não esgota as espécies de gestão por conta de outrem, com outorga de poder. Ao tempo em que o
pater familias podia servir-se de pessoas subpostas, especialmente servi actores, de mandato não se tinha
necessidade. Mesmo após a manumissão do servus actor, o patrão ainda encarregava o liberto, até que surgiu o
procurator omn4um rerum (cf. L. 60, § 4, D., mandati vel contra, 17, 1). A figura do flt’OL alor unius rei é pós-
clássica.
Ao núncio não se exige não ser absolutamente incapaz. Os absolutamente incapazes podem ser núncios. Os
vícios de vontade do núncio, o conhecimento de certos fatos e o que seria a sua vontade (interpretação do ato
jurídico) são irrelevantes.
A acho mandati é posterior à actio negotiorum gestorum, n~aIs ampla, evidentemente.
O mandato veio do jus gentium (VINCENZO ARANCIO-RUIZ,
diritio romano, 44 s.), não se confundindo com a procura. A aquisição da posse ficou a essa, mas o assunto,

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assaz discutido, é sem relevância, hoje, porque faltava o acôrdo de transmissão da posse, real e abstrato. Repila-
se a própria explicacão artificiosa de causa condiccional (Kondiktionscausa), que tentou A. EHRHARDT (Justa
causa traditionis, 37 s.).

2.GRATUIDADE E ONEROSIDADE; PODER DE REPRESENTAÇÃO.


(a) A gratuidade não caracteriza o mandato. No § 662 do Código Civil alemão fala-se, apenas, de cuidar (ou
gestionar) negócio entregue (em tibertragenes Geschãft zu besorgen), mas, a despeito da palavra “negócio”,
ficou entendido que pode ser objeto de mandato qualquer ato de natureza fáctica, como altear muro, traçar ou
debuxar plano. Quaisquer assuntos, foi dito, que podem ser objeto de contrato de serviço, ou de obra, podem ser
objeto de contrato de mandato, de modo que somente a gratuidade e a onerosidade distinguiriam as categorias
contratuais. Assim o mandato aos advogados só teria do contrato de mandato o nome; seria contrato de
serviços, ou de obra, nunca mandato, salvo se gratuito. No comêço, quis-se resistir a essa discriminação
simplista e houve hesitação. Assim, B. MATTHIASS (Lehrbuch, J, 3? ed., 612) somente via como objeto do
contrato de mandato negócios jurídicos (eigent]iche Rechtsgeschãfte) e atos jurídicos stricto sensn
(Rechtshandlungen); P. SIMÉON (Reckt und Rechtsgang, 1, 1•a ed., 444), negócios jurídicos e atos jurídicos
stricto sensn; o próprio L. ENNECCERUS (Das Ejirgerliches Rech>t, ~, 1? ed., 635), negócios jurídicos ou
atos, que se referem a relação jurídica. Dai F. SCHOLLMEYELi (Recht der einzelnen Schutdverhiiltnisse, 1?
ed., 40) achar que a expressão foi de consumada obscuridade; e KONRAD COSACK (Lehrbuch, J, 1? ed., 513)
pensou em conclusão de negócios jurídicos e exercício de atividade que não seja negocial, mas esteja ligada,
juridicaniente, ao patrimônio do mandante (igualmente, H. ISAY, Die Geschdftsfuihrung, 44 s.). Defendeu R.
BERNAU (Amtsniederle.gung der Mitglieder des Aufsichtsraths einer Aktiegesellschaft, Jherings Jahrb’iicher,
44, 233 s.) a tese certa, mas sem conseguir suplantar a interpretação que temia deixar sem trato e sem nome o
encargo gratuito de atos de puro fato (cf. L. ENNECCERUS, Lehrbuch, ~J, 31?-35? ed., 526, nota 5). A
dificuldade de caracterização foi, em grande parte, causa dessa escapada para a solução simplista. Destoou da
grande altura técnica, a que se alçou o Código Civil alemão, o seu conceito de mandato, qual o interpretou a
doutrina dominante, regressiva ao direito romano. Tê-lo-ia salvo, nesse ponto, o entendimento que se lhe havia
proposto no limiar do século.
A concepção mais próxima da que se tem no direito brasileiro não idêntica é a austríaca. Nem confunde o
mandato, contrato que contém, por vêzes, alusão a outorga de poder de representação, com o poder de
representação, que pode não provir de mandato, nem abstrai, sempre, dêsse poder, nem reduz o mandato ao
típico, antigo romano, que o Código Civil alemão ressuscitou. Simples outorga de poder de representação não é
mandato; só não há mandato se só houve tal outorga (cp. Alígemeines Landrecht, 1, 13, § 8; Código Civil
francês, art. 1.984; diferentes, alemão, § 662, e suíço, art. 392).
O mandato a profissional, como o advogado (4? Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 2
de dezembro de 1941, A. 1., 61, 249), presume-se remunerado.
(b)Há, quase sempre, poder de representação no mandato, porém o mandato e o poder de representação não se
confundem. Pode haver mandato, no direito brasileiro, sem poder de representação, e. g., quanto aos atos que,
sem poder de representação, podem ser praticados por outrem. No Código Civil, art. 1.288, alínea 2?, diz-se que
“a procuração é o instrumento do mandato”. Aí, procuração está por documento, forma de eficácia usual, sem
que se devesse tirar daí que o Código Civil se ateve à atitude de velhos códigos segundo a qual o poder de
representação e o mandato são o mesmo.
A teoria moderna entronca-se em P. LABAND (Die Stellvertretung bei dem Abachiusse von Rechtsgeschãften,
Zeitschrift flir das gesamie Handelsrecht, 10, 208) : mostrou êle que os deveres e as obrigações do mandatário
nada têm com o poder de representação; a conferência de poder de representação é apenas especie de outorga
de poder, assente em manif estação unilateral de vontade do outorgante. Enquanto os legisladores, juizes e
juristas não se acostumam à distinção, não é de espantar que, aqui e ali, o uso de velhas expressões os traia (e.
g., no Código suíço das Obrigações, o art. 35, 1).
A representação só se refere à posição de alguém, em vez de outra pessoa, mas a gestão de negócios pode ir
além da representação; portanto, do mandato. Há gestão de negócios quando se gestiona e liquida qualquer
assunto do interesse alheio, como se E se incumbe de tomar conta da casa de A, durante as férias, sem qualquer
retribuição; ou de expedir a correspondência de A, ou pagar-lhe contas, ou de redigir as respostas às cartas que
A recebe, ou de limpar o escritório de A, ou de arrumar as fichas, ou de consertar o rádio de A, ou, até, de pintar
os móveis de A. A gratuidade afasta que se pense em locação de serviços ou de obra.
A procura, a outorga de poder de representação, é abstrata, e não se há de confundir com o mandato, que é

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contrato vinculativo de quem é mandante e de quem é mandatário. A procura, a dação de poder, é negócio
jurídico unilateral, que se constitui pela manifestação de vontade, receptícia, do representando. A procura
legitima o representante fora de qualquer relação jurídica com o dono do negócio.
Por isso, se é certo que o mandato é, quase sempre, acompanhado (seguido ou precedido) da procuração, não se
há de ter êsse acompanhamento como essencial. O mandato pode ser sem a outorga do poder de representação.
A 5? Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 12 de novembro de 1948 (R. dos T., 178, 717),
pretendeu, sem razão, que não há mandato onde não há representação:
se falta êsse poder, há locação de serviços. Não haveria mandato, por exemplo, na outorga de poder para que o
amigo retirasse, com as chaves, a correspondência; nem para que entregasse o dinheiro dos salários aos
empregados.
Mandato é contrato unilateral, ou bilateral, em que há prestação de serviços, ou de obra, e poder de
representação ou outro poder.
(c) É preciso que o ato seja praticado em nome do mandante. O comissionário não é, nem se pode fazer
mandatário. Se procede como se mandatário fôsse, exerce papel de representante sem ter poder de
representação (certo, J. IJNGER, Sgstem, II, 5.~ ed., 135 s.; sem razão, J. v. SCHEY, ObligationsverMltn,isse,
456, M. SCHUSTER V. BONNOTT, Grundrzss des Obligationenrechts, 155, HORAZ KRASNOPOLSKI,
Lehrbuch, III, 852, que foram vítimas da confusão entre outorga de poder e outorga de poder de
representação).
(d) Em geral, os juristas não descem a pormenores sobre os atos jurídicos para os quais pode haver mandato.
Não basta dizer-se, como A. EHRENZWEIG (S’ystem, ~ 6? ed., 505), que podem ser objeto de mandato cuidar
de negócio, representando o mandante, e a conclusão de negócios jurídicos e alguns atos jurídicos (também, J.
v. SCHEY, Obligationsverht?iltnisse, 450). É preciso enunciar-se: a prática de qualquer ato para o qual seja
preciso poder de representação, ou poder de obrar em nome de outrem. Se A deu ordem para que E cortasse
a grama do terreno vizinho não lhe deu poder de representação, não lhe mandou tomar posse do terreno.
Entendia 5.DNIESTRZANSKL (Die Auftrãge zugunsten Dritter, 301 e 315) que no conceito de mandato cabia
o negócio jurídico de corretagem. Ora, corretor não representa; se representa, outro fato jurídico se deu.
Nas expressões “gestão de negócios”,” cuidado de negócios , ‘gerência de negócios”, já se revela
impropriedade, se não se restringe o conceito àquelas espécies em que se tratam “negócios”. £sse sentido estrito
não é o usual, nem o que resulta dos dados históricos. Também se gestionam interesses que não consistem em
negócios jurídicos, nem, sequer, em atos jurídicos. Cuida-se de atos-fatos jurídicos e até de fatos, que
interessam ao dono do bem ou dos bens. A expressão “negócio” foi empregada em sentido latissimo, de modo
que abrange qualquer fato que entre na esfera dos interesses de alguém.

3.NEGÓCIOS JURÍDICOS SUBJACENTES, JUSTAJACENTES E SOBREJACENTES. O contrato de


serviço, ou o de obra, pode estar subjacente ao de mandato, como pode estar subjacente ao de comissão, ao de
corretagem, ou a outro contrato. Diga-se o mesmo quanto às relações jurídicas justajacentes e sobrejacentes.
Tudo que não é a outorga do poder de representação ou de obra em nome de outrem, é parte de outro contrato
(e. g., se foi dada procuração ao jurisconsulto para representar em assembléia geral e, no contrato de mandato,
se acrescentou que êle daria “parecer” para ser publicado, há dois contratos, o de mandato e o de obra).
Oato a ser levado a cabo é por conta do mandante, salvo procuracão in rem suam.

4.RECEPTICIEDADE E REPESENTAÇÃO. O direito romana ignorou a representação direta, que o direito


comum desenrolou de elementos que os doutrinadores não sabiam egípcios. O ponto culminante foi o
Preussisches Alígemeines Landrecht, 1, 13, § 1, com a possibilidade de se adquirir direito pessoal ou real por
ato de terceiro, O assunto nada tem com a função do órgão das pessoas jurídicas, porque êsse, precisamente,
presenta, não representa.
A representação pode ser para manifestar vontade, unilateralmente ou bilateralmente, e para receber
manifestações unilaterais de vontade. Por outro lado, se alguma regra jurídica sobre forma não o impede, a
representação pode ocorrer em se tratando de manifestação de vontade expressa ou tácita, ou, embora mais
dificilmente, pelo silêncio (E. ZITELMANN, AUge‘íncnwr Te ii, 89; R. LEONHARD, Der Allgemeine Teu,
280>.
~preciso que se não confunda com o representante o núncio, o servidor, se bem que a eficácia possa ser a
mesma, por se não exigir, para a recepção das manifestações de vontade, que o intermediário represente, se êsse
intermediário transmite ou foi pôsto para receber. Para que se dê a recepção por intermédio do núncio, é de

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mister que tudo se passe de forma tal que a manifestação de vontade se tenha como inserta no circulo de
senhoria e vigilância do destinatário (I-IAROLD FRIEDEBERO, Die Vertretung im Entpfang von~
empfangsbedUrftigeu WiitenserkUirungen, 26). O núncio pode ser menor absolutamente incapaz; o
representante, não. Aquêle, todavia, pode falhar, como caixa de correio viva, no dizer de Tt. LEoNHARD, com
certas conseqúências, se as circunstâncias, inclusive a da incapacidade absoluta do núncio, não punham fora de
dúvida, para o manifestante da vontade, que o destinatário receberia.
Há poderes de representação e de ação jurídica, desde o de praticar atos jurídicos unilaterais e de concluir
contratos até o de administrar, que permitem que os atos de alguém tenham eficácia na esfera jurídica de
outrem, como se fôssem atos dêsse, ou, até, como atos dêsse. Quem representa pratica atos que não são do
representado, mas perfazem relações jurídicas em que o representado figura. Não é o que se passa, certamente,
com os órgãos das pessoas jurídicas: êsses presentam, não representam.

§ 4.676. Elementos do contrato de mandato

1.COMPOSIÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO DO MANDATO. O negócio jurídico do mandato é negócio


jurídico bilateral: há a oferta, que pode partir da pessoa que vai ser incumbida,e a aceitação , pela outra pessoa.
De regra, a oferta parte do que vai outorgar o poder de representação. Se o poder de representação já estava
com aquêle a que se vai dar a incumbência,o mandato é só à parte: o instrumento de procuração, aí em sentido
próprio, apenas documenta a outorga de poder, e não havia mandato.

2. OFERTA. Quando se diz que a procuração é instrumento do mandato (Código Civil, art. 1.288, alínea 2~a; cf.
Código Comercial, art. 140) apenas se exprime que a outorga de poder de representação se tem como oferta de
contrato de mandato se não se prova que houve tal outorga sem haver mandato. A outorga de poder de
representação ao preposto não é mandato; nem no é a outorga de poder de representação ao empregado de
escritório. Tão-pouco, a outorga tem de ser feita, sempre, sob a forma de “procuração”, no sentido usual, para a
qual, sendo por instrumento particular, há a exigência dos requisitos do Código Civil, art. 1.289, § 1.0: “O
instrumento particular deve conter designação do Estado, da cidade ou circunscrição civil em que fôr passado, a
data, o nome do outorgante, a individuação de quem seja o outorgado e bem assim o objetivo da outorga, a
natureza, a designação e extensão dos poderes conferidos”. Há o poder conferido em carta missiva, ou por
telefone, ou por telegrama, se é o caso.

3.ACEITAÇÃO. É preciso que a oferta de contrato de mandato seja aceita. Ninguém é obrigado a aceitar
mandato; salvo: a) se o destinatário da oferta foi nomeado para desempenho de cargo, em cujas funções caiba o
cuidar de assuntos que lhe tenham de ser confiados por terceiros, espécie em que o dever é irradiado do negócio
jurídico concernente ao cargo, tendo direito a aceitação o nomeante, ou o nomeante e os terceiros, se se trata de
cargo público, ou de cargo privado sobre o qual se fêz a publicidade necessária à comunicação aos terceiros; b)
se o destinatário fizera e não revogara a oferta que fêz, de público, ou diretamente, ao público ou a determinada
pessoa (o que não se há de confundir com simples mv liationes ad olferendum). Em qualquer das espécies,
somente há contrato de mandato se houve aceitação, expressa ou tácita. Se havia dever de aceitar, a recusa é
inadimplemento da obrigação de aceitar e surge a obrigação de indenizar.
A aceitação do mandato pode ser expressa, ou tacita (e. g., se, recebendo o instrumento do mandato, não o
devolve,
nem manifesta vontade contrária, ou modificante, o mandatário, Código Civil, art. 1.083; ou principia a
executar). O Código Civil, art. 1.293, estatui: “O mandato presume-se aceito entre ausentes, quando o negócio
para que foi dado é da profissão do mandatário, diz respeito à sua qualidade oficial, ou foi oferecido mediante
publicidade, e o mandatário não fêz constar imediatamente a sua recusa”. No Código Comercial, art. 141, está
escrito: “Completa-se o mandato pela aceitação do mandatário, e a aceitação pode ser expressa ou tácita: o
princípio da execução prova a aceitação para todo mandato”. Se alguém se oferece como mandatário, aceita a
oferta, ou não, a outra pessoa; de modo que, chegando ao oferente a aceitação, ou o instrumento de procuração,
que o é, se estabelece o contrato e, pois, a relação jurídica contratual.
Tem-se de atender a que a outorga de poder de representação, que vai no instrumento, é por declaração
unilateral, receptícia, de outorga, e não se confunde com o negócio jurídico bilateral do mandato. A remessa da
procuração é ato que se tem como outorga de poder de representação, com a remessa da oferta, ou mais
aceitação da oferta, tanto que poderia o destinatário ter aceito o mandato sem se lhe haver enviado a procuração

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: receberia o oferente a aceitação da oferta de mandato (Código Civil, art. 1.292; Código Comercial, art. 126),
sem receber o poder de representação, que exigiria, ex hypothesi, o instrumento de procuração. Por isso mesmo,
se E se oferece a A para ser o seu representante na venda do prédio e A aceita a oferta, sem remeter a
procuração, tem E contrato de mandato com A, porém não está investido dos poderes. A remessa da procuração
é remessa de poder de representação e de aceitação tácita da oferta do mandatário. (É êrro dizer-se, como faz J.
X. CARvALHO DE MENDONÇA , Tratado, VI, Livro IV, Parte II, 234, que, aí, “o destinatário não precisa
manifestar a vontade de aceitar o mandato”: o destinatário aceitou, tâcitamente.) Se tivesse enviado a
procuração, acompanhada de outra oferta, ou de alteração da oferta recebida, ou antes de conhecer essa oferta, a
remessa da procuração não significaria aceitação; nem no significaria a remessa de procuração com poderes
diferentes daqueles a que a oferta para ser mandatário se referia. Tudo faz ressaltar quanto é independente
do contrato de mandato e como é abstrata a outorga de poder de representação.
O que recebeu a oferta de mandato, pelo futuro mandante. ou responde ou não responde: se demora, sem que
haja prazo, findo o qual se haja de ter como aceito o mandato, não tem dever de providenciar quanto aos
interesses do oferente; mas as circunstâncias podem ter de ser interpretadas como se o oferente houvesse
confiado na aceitação e pois esperado resposta imediata, o que assaz ocorre nos negócios jurídicos comerciais
(arg. ao Código Comercial, art. 144, 23 alínea). No silêncio pode haver, em certas circunstâncias, declaração de
aceitação do mandato.
Ao mandato refere-se o Código Civil, no art. 1.293, para dizer que, naquelas circunstâncias, êle se presume.
Não se disse que se estabelece, tâcitamente, a manifestação de vontade.
O Código Civil alemão, § 663, estabelece responsabilidade pela falta de aviso imediato; o Código federal suíço
das Obrigações, art. 895, emprega “est reputé accepté”, o que o aproxima do Código Civil brasileiro, porém
mais do art. 2.901, 39, do Esbóço de TEIXERA DE FREITAS, que considerava, pelo silêncio, aceito o mandato
“se o mandante lhe conferir por carta mandato relativo a negócios, de que, por oficio, profissão, meio de vida,
ou como comissário de comércio, costuma encarregar-se, e êle recebeu a carta, e não lhe deu resposta”. No
direito brasileiro, há apenas presunção juris tantum; no direito civil alemão (aliter, Código Comercial alemão, §
362>, só a responsabilidade, sem qualquer presunção, pôsto que as circunstâncias possam fazer o silêncio
significar manifestação de vontade (L. ENNECCERUS, Lehrbuch, II, 528). No direito brasileiro, ou há o dever
de aceitar o mandato, devido a relação jurídica entre o que oferta o mandato e o que o aceita, ou há o dever de
responder, devido a relação jurídica ou circunstâncias entre êles, espécies que dão ensejo à pretensão à
indenização; ou há a presunção juris tantum de mandato.
Uma vez que o destinatário não provou que a oferta, entre ausentes, não foi aceita, aceitação houve; responde,
pois, por perdas e danos. Se a oferta partiu do que tem de ser mandatário, incidem as regras jurídicas do Código
Civil, arts. 1.079--1.086(cf. ‘Código Comercial, art. 126), não o art. 1.293 (sem razão, CLóvís BEVILÁQUA,
Código Civil comentado, V, 38). Se partiu do que há de ser mandante, incidem, quanto à aceitação, as regras
jurídicas do Código Civil, arts. 1.293 e 1.082-1.086 (cf. Código Comercial, art. 126).
É preciso que se não confunda com a aceitação da oferta de contrato a outorga de poder de representacão. A
outorga é manifestação, unilateral, receptícia, de vontade, que se dirige ao outorgado, ou ao terceiro com quem
se haja de tratar. Pode bem ser que se tenha concluído o contrato de mandato, sem que se tenha remetido a
procuração, de modo que tem o mandatário pretensão à outorga de poder de representação, porém ainda não
está investido dêle.
Também se pode dar que o destinatário haja recebido procuração, haja começado a exercer o poder, por alguma
razão de urgência, tendo, contudo, respondido imediatamente para evitar que incida o art. 1.292 do Código
Civil, que diz:
“A aceitação do mandato pode ser tácita, e resulta do comêço de execução”, ou o art. 141 do Código Comercial,
ambos regras jurídicas dispositivas. Ésse ponto é assaz importante. Quando
o Código Civil estatui que a aceitação resulta do comêço de execução, não afasta as espécies em que o oferente,
dono do negócio, pré-excluiu a incidência do art. 1.292 do Código Civil, nem aquelas em que o destinatário da
oferta a pré-exclui. O art. 1.292 incide se nenhuma disposição em contrário foi estabelecida na oferta, ou na
resposta do destinatário. Se não chegarem a acôrdo os dois interessados, a despeito de ter exercido o poder de
representação o destinatário, mandato não houve, nem sobreveio; e tudo se decide segundo os princípios que
regem a outorga de poder de representação. Porque poder de representação houve; não houve mandato. O
mandato é que precisa de aceitação; a outorga de poder de representação é manifestação unilateral de vontade,
pôsto que receptícia.

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§ 4.677. Interesse e regras jurídicas do mandato

1.INTERESSE NA ATIVIDADE DO MANDATÁRIO. O assunto sobre que versa o mandato pode pertencer
ao mandante ou a terceiro, ou também ao mandatário (e. g., para cobrar,pagando-se). Se o interesse é
exclusivamente do mandatário,o que crê mandar apenas aconselha. Disse GAIO, na L. 2, pr.,mandati vel
contra, 17, 1: “Contrai-se mandato entre nós ou se te mando somente por minha utilidade, ou sOmente por
alheia, ou por minha e por tua, ou pela tua e pela alheia. Se te mando só por tua utilidade, supervácuo é o
mandato, e por isso dêle nenhuma obrigação nasce”. Textualmente:
“Mandatum inter nos contrabitur, sive mea tantum gratia tibi mandem sive aliena tantum sive mea et aliena sive
mea et tua sive tua et aliena. quod si tua tantum gratia tibi mandem, supervacuum est mandatum et ob id nuíla
ex eo obligatio nascitur”. Depois dos exemplos de utilidade própria, alheia, própria e alheia, do mandatário e
alheia, acrescentou (§ 6) : “Mas por teu interesse intervém mandato, por exemplo, se te mando que coloques teu
dinheiro em compras de prédio, em vez de o emprestares a juros, ou, diversamente, que o emprestes a juros, em
vez de o colocares em compra de prédios, espécie de mandato que é mais conselho do que mandato e por isso
não é obrigatório, pois ninguém se obriga por conselho, ainda que não convenha a quem se dá, uma vez que
cada um é livre de explorar, a seu jeito, se lhe convém o conselho”. Se o conselho vai ligado a garantia, ou se
provém de dever de aconselhar, espécie em que o conselho é prestação, muda-se de questão; se foi dado de má
fé, para prejudicar, e causa dano, pode o ato de conselho ser ato ilícito absoluto, inclusive criminal. ou ato ilícito
relativo.
com a cessão ou com os contratos de alienação ou os acôrdos de transmissão da propriedade ou da posse. O
outorgante atribui, mas o que atribui é direito a dispor, e não o direito sobre o objeto da procura.
tsse é um dos pontos mais dignos de atenção.
2.REGRAS JURÍDICAS SOBRE O MANDATO. Algumas regras jurídicas sobre mandato incidem, por
analogia, noutros suportes fácticos, como a gestão de negócios para constituir sociedade, associação, ou
fundação, ou para a direção de sociedade, associação, ou fundação, os atos dos sócios gerentes, dos
inventariantes e testamenteiros, e dos que gerem sem mandato. Por outro lado, regras jurídicas concernentes ao
poder de representação incidem a respeito do mandato, sem se conterem nos arts. 1.288-1.330 do Código Civil.
Quanto à procuração em causa própria, as regras jurídicas da cessão de direitos, inclusive de créditos ou sobre
os contratos a que se siga ou se insira o acôrdo de transmissão, são invocáveis, sem que conforme mostraremos
oportuna-mente se possa identificar a procuração em causa própria

CAPITULO II

PRESSUPOSTOS E ESPÉCIES DO CONTRATO


DE MANDATO

§ 4.678. Pressupostos do contrato de mandato

1.CAPACIDADE E MANDATO. Diz o Código Civil, no art. 1.289: “Tôdas as pessoas maiores ou
emancipadas, no gôzo dos direitos civis, são aptas para dar procuração mediante instrumento particular, que
valerá desde que tenha a assinatura do outorgante”. (O Código de Processo Civil, art. 107, estabeleceu que “a
procuração, quando outorgada por escrito particular, valerá desde que tenha assinatura do outorgante e haja sido
reconhecida a sua firma~~ ; e acrescentou : ‘‘Qualquer que seja o estado da causa, o juiz mandará suprir a falta
mediante reconhecimento da firma ou ratificação do mandato”.
Tais regras jurídicas somente concernem ao direito processual; de modo nenhum contêm alteração ao Código
Civil.) O art. 1.289 do Código Civil deve ser entendido no sentido de se exigir que haja a capacidade do
mandante; porém não no de que o menor entre os dezesseis e os vinte e um anos, o pródigo e o silvícola não
possam outorgar poderes de representação, ou contratar mandato, nos atos que êles poderiam praticar só por si
(a capacidade dêles é relativa) ou para
que alguém os represente nos atos que êle teria de praticar, assistidos do titular do pátrio poder, tutor, ou
curador. O mandato do menor de vinte e um anos e maior de dezesseis para se inscrever em exames é válido. O
do pródigo para os atos que não têm de ser assistidos pelo curador são válidos. Por outro lado, sempre que essa
pessoa precisa da assistência, ou autorização, ou assentimento de outras, ou do consentimento

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de 2 outras, para a prática de algum ato, nada obsta a que passe procuração, ou assine contrato de mandato
0 (ficando êsse dependente de ulterior manifestação de quem devia funcionar assistindo, assentindo, ou
consentindo).
Lê-se no Código Civil, art. 1.298: “O maior de dezesseis e menor de vinte e um anos não emancipado (art. 99,
1) pode ser mandatário, mas o mandante não tem ação contra éle senão de conformidade com as regras gerais
aplicáveis às obrigações contraídas por menores”. Cf. arts. 154, 155,157 1.289 e 1.825, 1.
Quanto à mulher casada, estatui o Código Civil, art. 1.299:
“A mulher casada não pode aceitar mandato sem autorização do marido”. Leia-se: sem assentimento do marido.
O art. 242 estabelecia, no inciso IX, que, sem assentimento do marido, não podia a mulher casada aceitar
mandato. O inciso IX foi suprimido pela Lei n. 4.121, de 27 de agôsto de 1962, art. 1.0, sem que se suprimisse
o art. 1.299. O assentimento é exigido, salvo se o mandato é um dos atos da profissão, ou o objeto da profissão
<art. 246).
A respeito do mandato, cumpre advertir que o ato a que se refere o mandato pode exigir pressupostos pessoais,
inclusive capacidade, que a própria outorga ou a aceitação do mandato não exige. Aliás, pode, também, exigir
menos. Por outro lado, os requisitos para a outorga ou para a aceitação do mandato podem ser diferentes
daqueles que se exigem para a outorga ou para o exercício da procura. Têm-se, por conseguinte, três figuras
diferentes. Se o mandato tem por objeto dois ou mais atos, é possível que, no primeiro plano (que é o do
objeto), haja duas ou mais figuras distintas, sem se pré-excluirem as espécies em que o ato entra no mundo
jurídico como ato-fato jurídico, e não como ato jurídico (negócio jurídico ou ato jurídico siricto sensu).

2.FORMA, MANDATO E PODER DE REPRESENTAÇÃO. Diz o Código Civil, art. 1.290: “O mandato pode
ser expresso ou tâcito, verbal ou escrito”. Entenda-se: pode ser expresso, isto é, por escrito, ou oralmente, e
pode ser tácito. Cumpre que se não confundam o mandato tácito e o mandato presumido ou presunto (presunção
do mandato), de que mais adiante falaremos.
Por outro lado, o mandato não precisa ter a forma do poder de representação, nem o poder de representação
precisa ter a forma do mandato. A carta do oferente, com as cláusulas do mandato, basta como forma dêsse,
ainda que a procuração tenha de ser por instrumento público, ou como tal já se tenha feito. O mandato, em tal
espécie, pode ser aceito por escrito, oral, ou tàcitamente. Em todo o caso, para os atos que exigem instrumento
público, ou particular, a procuração há de ser por escrito (Código Civil, art. 1.291: “Para os atos que exigem
instrumento público ou particular, não se admite mandato verbal”). No art. 1.291, “mandato” está por
procuração, meio de comunicação da outorga ao terceiro. De modo nenhum se pode tirar do art. 1.291 e do art.
1.289, § 39, que se adotou, no direito brasileiro, o
* principio da simetria das formas, pelo menos. Quanto ao mandato, tendo havido, para os atos que exigem
instrumento público, ou particular, procuração por instrumento público, ou particular, entende-se aceito pelo
comêço de execução, ou tàcitamente, uma vez que “mandato”, no art. 1.290, é o contrato de mandato e, no art.
1.291, é poder de representação. Ainda mais: recebida a procuração, sem qualquer escrito quanto ao contrato de
mandato, presume-se aceito entre ausentes, quando o negócio para que foi dado é da profissão do mandatário,
diz respeito à sua qualidade oficial, ou foi oferecido mediante publicidade, e o mandatário não fêz constar
imediatamente a sua recusa (Código Civil, art. 1.293).
t da maior relevância distinguir-se, sempre, do mandato a procura. Mesmo se, no caso, as regras jurídicas são
as mesmas, é preciso que se saiba, com exatidão, de que é que se está falando: se de mandato, ou se de
procuração, se do contrato, ou se do negócio jurídico unilateral de outorga.

3.FORMA DA OUTORGA DO PODER DE REPRESENTAÇÃO E MANDATO. Caracterizada a diferença


entre forma do contrato de mandato e forma da outorga para representar, atos que, ainda na prática, se separam
e seria estranhável que se inserissem na procuração cláusulas concernentes ao negócio jurídico bilateral do
mandato, tem-se de advertir em que os arts. 1.289 e 1.291 do Código Civil só se referem a procuraçio, a outorga
do poder de representação. Diz o art. 1.289:

“Tôdas as pessoas maiores ou emancipadas, no gôzo dos direitos civis, são aptas para dar procuração mediante
instrumento particular, que valerá desde que tenha a assinatura do outorgante”. No direito administrativo, há a
regra do Decret.o n. 24.112, de 11 de abril de 1934, art. único: “Nenhum funcionário público, efetivo ou adido,
em disponibilidade ou aposentado, poderá ser procurador de partes, perante qualquer repartição administrativa,
federal, estadual ou municipal; revogando-se as disposições em contrário”. O Código de Processo Civil, art.

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107, só se refere ao mandato judicial; de modo que, para os atos de renúncia a direitos, ou outros atos de
disposição, no plano do direito material, continua em vigor o art. 1.289 do Código Civil.
Se o ato, em que se vai dar a representação, exige instrumento público, ou particular, a procuração tem de ser
por escrito. Pode ser oral, ou tácita, a outorga, se o ato, que se deseja, não exige forma escrita (Código Civil, ad.
1.291).
São freqUentes os mandatos orais (não-escritos>. O cartão ou o recibo para ser apresentado aos fregueses induz
que houve a outorga. Todavia, não se confunda a função do caixeiro com a do mandatário (e. g., 3~a Câmara
Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 4 de fevereiro de 1942, R. dos T., 199, 247). Onde cabe o mandato
oral, o art. 141 do Código Civil ou o art. 123 do Código Comercial não são invocáveis (Câmaras Civis
ReUnidas do Tribunal de Alçada de São Paulo, .26 de março de 1952, 200, 488).
O art. 1.289, § 19, do Código Civil, explicita: “O instrumento particular deve conter designação do Estado, da
cidade ou circunscrição civil em que fôr passado, a data, o nome do outorgante, a individuação de quem seja o
outorgado e, bem assim, o objetivo da outorga, a natureza, a designação e extensão dos poderes conferidos”. A
data não precisa ser por extenso. O nome do outorgante é aquêle de que usa, nos tratos da vida civil, ou
comercial, ou por inteiro. Por individuação do outorgado não se há de compreender a indicação da
nacionalidade, estado civil e residência do outorgado; tão-pouco, o nome: basta que por algum modo se torne
certa a pessoa a que se outorgam os poderes (Tribunal da Relação de Minas Gerais, 14 de setembro de 1918, R.
F., 30, 387; cf. Parecer aprovado pelo Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros. a 29 de outubro de 1917:
“O Código Civil, no art. 1.289, § 19, exigindo, nas procurações particulares, a individuação de quem seja o
outorgado, sem entretanto estabelecer quais os requisitos necessários para essa individuação, deixou ao arbítrio
do outorgante o modo de tornar certo quem seja o seu procurador. Uma vez que, pela redação do instrumento,
se verifique inequivocamente quem é o outorgado, está satisfeita a exigência legal.
O legislador obedeceu a um critério liberal, procurando facilitar a constituição do mandato”, E. doS. T. 9., 17,
151 s., e E. 9., 30, 93; repelidas as Instruções do Tesouro Nacional de 8 de agôsto de 1917, E. 9., 28, 290).
Quando por instrumento público, a procuração é passada por tabelião, observadas as regras jurídicas sobre
forma e outros requisitos, ou apud acta, escrita pelo escrivão do feito. Em princípio, deve declarar o nome do
outorgante e o nome do outorgado; o lugar, o dia, o mês e o ano em que é escrita; o conteúdo e extensão dos
poderes conferidos; assinatura do outorgante e as de duas testemunhas, sendo que, pelo outorgante que não
sabe, ou não pode escrever, a de assinar outra pessoa por êle; a assinatura do tabelião (Ordenações Filipinas,
Livro 1, Titulo 78, § 6). Se a procuração é apud acta, passada na presença do juiz, não precisa de testemunha
(Ordenações Filipinas, Livro III, Titulo 29, pr.).

4.DIREITO CIVIL E DIREITO COMERCIAL. Se na outorga de poder são dois ou mais os outorgantes, têm
de assinar todos. No direito comercial, os comerciantes matriculados já podiam passar procuração somente
assinada, sem a exigência de o ser do próprio punho (Código Comercial, art. 21:
“As procurações bastantes dos comerciantes, ou sejam feitas pela sua própria mão ou por êles somente
assinadas, têm a mesma validade que se fôssem feitas por tabeliáes públicos”.) A ordem do Tesouro n. 82, de 30
de março de 1849, ad. 8.0, atendendo aos estilos forenses, judiciais e administrativos (art. 1.0, § 2.0), declarou
que se estendia às mulheres e viúvas dos que tinham privilégio de outorga da procuração por instrumento
particular esse privilégio. Tais pessoas eram: bispos, titulares, viscondes e barões sem grandeza, fidalgos da
casa imperial, magistrados, doutôres e advogados, cavaleiros das Ordens do Império, oficiais militares desde o
pôsto de capitão, abades, que gozassem de prerrogativas episcopais, beneficiados e clérigos de ordens sacras;
finalmente, os comerciantes matriculados.
Tudo isso acabou, como privilégio. Não acabara, desde logo, a permissão de passar o comerciante matriculado
procuração sômente assinada, por se tratar, apenas, de regra jurídica especial, cuja ratio legis estava em
exigirem os negócios comerciais maior celeridade e serem em tão avultado número que tomariam demasiado
tempo ao comerciante (Conselho do Tribunal Civil e Criminal do Distrito Federal, 16 de maio de 1904, E. de
D., II, 580; 2•a Câmara Cível da Côrte de Apelação, 1.0 de julho de 1908, 10, 598; Câmara Cível do Tribunal da
Relação de Minas Gerais, 20 de julho e 13 de novembro de 1907, E. 9., 11, 457 s.; Aviso do Ministério da
Fazenda, n. 54, de 15 de abril de 1891: “A faculdade de passar procuração do próprio punho consiste em regalia
do direito privado, que não contraria o sistema firmado pela Constituição”; Superior Tribunal de Justiça do
Maranhão, 23 de agôsto de 1892, examinando a repercussão da Lei n. 79, de 23 de agôsto de 1892:
“Encerrando disposição genérica, pela qual é concedida a tôdas as pessoas, no gôzo dos direitos civis, passar
procuração de próprio punho, não revogou a disposição especial do art. 21 do Código Comercial de poder

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passar o comerciante matriculado procuração, feita por sua própria mão. ou por êle somente assinada, não só
pelo muito conhecido preceito direito “a lei geral não revoga especial”, como por não existir incompatibilidade
alguma entre o citado artigo do Código e o Decreto legislativo n. 79”, O D., 85, 275; Superior Tribunal de
Justiça da Paraíba, 28 de setembro de 1906, E. & D., IV, 477). Nada obstava a que os comerciantes usassem
fórmulas impressas, com claros, ou não, desde que as assinassem. Por outro lado, a prerrogativa do comerciante
matriculado por ser subjetiva estendia-se aos atos de direito civil. Foi SALUSTIANO ORLANDO (Código
Comercial, ~, 7Y ed., 40, porém desde a 6~a ed.) quem sustentou tal opinião, com grande argúcia, pelos
argumentos de que usou e por deixar de usar de argumentos favoráveis porém falsos, como o de BENTO DE
FARIA (Código Comercial, nota 85 ao art. 21, retirado nas últimas edições
o de ser geral a lei civil e especial a comercial). No mesmo sentido, TEIXEIRA DE FREITAS (Aditamentos ao
Código do Comércio, 395; Consolidação das Leis civis, nota 4 ao art. 457), e J. X. CARVALHO DE
MENDONÇA (Tratado de Direito ‘Comercial, VI, Livro IV, Parte II, 113). Questão diferente era a de se
estender tal prerrogativa às mulheres casadas. No direito imperial encambulhava-se a prerrogativa do
comerciante matriculado com os privilégios aristocráticos, eclesiásticos e de classe que então existiam; donde
ter-se entendido que a ordem do Tesouro n. 82, de 80 de março de 1849, art. 89, havia de ser observada.
TEIXEIRA DE EREITAS (Consolidação das Leis civis, art. 459) continuou a não distinguir a prerrogativa e os
privilégios. Com a República, veio o Decreto n. 181, de 24 de janeiro de 1890, ad. 56, que disse: “São efeitos
do casamento: § 49 Conferir A mulher o direito de usar do nome da família do marido e gozar de suas honras e
direitos, que pela legislação brasileira se possam comunicar a ela”. Firmado em tal regra jurídica, J. X.
CARVALHO DE MENDONÇA entendeu que as mulheres casadas com comerciantes e as viúvas de
comerciantes podiam passar procurações somente assinadas. Primeiro, seria desatender-se à ratio tegis do art.
21 do Código Comercial (“As procurações bastantes dos comerciantes, ou sejam feitas feitas pela sua própria
mão ou por êles somente assinadas, têm a mesma validade que se fôssem feitas por tabeliáes públicos”) : ou se
deu a prerrogativa, devido à apertura de tempo, em que importaria a exigência de escrever tôdas as procurações
o comerciante, ou não se deu por essa razão e seria contrário à Constituição, que desde a República, sem
ressalva de privilégios, adotou o princípio de isona-inia (Constituição de 1946, ad. 141, § 39). Segundo, não é
verdade que o Decreto n. 181 haja atribuído à mulher prerrogativas profissionais do marido: a mulher do
advogado não toma parte nas discussões da Ordem dos Advogados, nem a mulher do Ministro do Supremo
Tribunal penetra no recinto das sessões, nem a mulher do Presidente da República assina papéis de expediente.
O que o Decreto n. 181 disse foi que a mulher goza das honras e direitos, que pela legislação brasileira se
possam comunicar a ela, e. g., ter o pátrio poder dos filhos, na falta do pai (direito), ter no protocolo situação
correspondente à do marido, quando se trate de solenidade ou cortesia em que os dois tenham de tomar parte
(honra ou honraria). De acôrdo com o art. 56, § 42, do Decreto n. 181, a mulher do deputado, iio banquete,
senta antes da mulher do embaixador, a mulher do embaixador depois da mulher do Ministro de Estado e antes
da mulher do desembargador, porém nada se diz sobre não poder ser prêsa, sem licença das Câmaras dos
Deputados, a mulher do deputado. O comercialista confundiu privilégio e prerrogativa, prerrogativa e “honras e
direitos
No ad. 21 do Código Comercial, fala-se de ter a procuração do comerciante matriculado a mesma validade que
a procuração por instrumento público. Devemos entender que a procuração do comerciante matriculado, apenas
assinada, era tão válida quanto a procuração feita pelo tabelião ou apud acta. Para se desconstituir, por alegação
de invalidade, a procuração feita pelo comerciante matriculado, sem ser de próprio punho, não se precisaria de
propor ação de nulidade; nem a procuração do comerciante matriculado, não escrita ou escrita por êle, goza de
fé pública.
O comerciante matriculado somente podia passar procuração apenas assinada enquanto exercia o comércio
(CARLOS DE CARVALHO, Nova Consolidação das Leis Civis, art. 1.836; Conselho do Tribunal Civil e
Criminal do Distrito Federal, 16 de maio de 1904, E. de O., II, 580) ; porque, se assim não fôsse, se trataria de
privilégio. Insurgiu-se contra isso J. X. CARVALHO DE MENDONÇA, invocando o Aviso do Ministério da
Fazenda, n. 472, de 14 de novembro de 1877, e o Aviso n. 206, de 30 de abril de 1881, que se referia a
continuarem com as prerrogativas as viúvas dos comerciantes matriculados, bem como o art. 14 do Título único
do Código Comercial (“Podem votar e ser votados nos colégios comerciais todos os comerciantes (art. 4.0>
estabelecidos no distrito onde tiver lugar a eleição, que forem cidadãos brasileiros e se acharem no livre
exercício dos seus direitos civis e políticos, ainda que tenham deixado de fazer profissão habitual do comércio”)
mas evidentemente sem razão. Entre os comerciantes estão os corretores, se são comerciantes.
Tudo isso passou. No sentido da evolução social, a igualdade cresce: há as três dimensões, a da democracia, a

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da liberdade e a da igualdade, por onde o homo avança, se bá melhora da estrutura coletiva. Como era de
esperar-se, a Lei n. 3.167, de 3 de junho de 1957, art. l.~, apagou a exigência de ser de próprio punho a
procuração. Na prática, já se havia quebrado o privilégio dos comerciantes, porém havia a possibilidade de
alguma decisão reacionária. Não há mais qualquer diferença entre as regras jurídicas do direito civil e as do
direito comercial.
No tocante à própria procuração para atos processuais, tem-se afastado a ineficácia irremediável da falta de
reconhecimento da firma (e. g., 1•a Câmara Cível do Tribunal de Apela-são de Minas Gerais, 18 de julho de
1940). Aliás, a solução acertada é exigir o juiz ou o tribunal, convertendo em diligência o julgamento, que se
reconheça a firma. Qualquer atitude de juiz ou de tribunal que dê importância à falta de reconhecimento, se
ainda pode haver conversão do julgamento em diligência para que se reconheça a firma, viola a lei processual
civil.

5.PRINCÍPIO DE SIMETRIA DA FORMA ESCRITA. O representante tem de manifestar que o figurante do


ato jurídico é o representado. Se o ato jurídico, que se deseja, é manifestação de vontade recepticia, ou
comunicação de vontade, ou de conhecimento, ou de sentimento, o terceiro, a que se dirige, deve conhecer (=
receber) a vontade de representar. Como se faz essa explicitação, depende da espécie. Se o ato jurídico, que se
deseja, é formal, a comunicação é também formal e há de inserir-se, como elemento, no suporte fáctico, de que
resultará o ato jurídico. Daí, em princípio, dever-se exigir à outorga de poder de representação a mesma forma
que ao ato jurídico para que se outorgou o poder de representação. No contrato de compra-e-venda de imóveis,
haveria de ser por instrumento público a procuração (cf. A. VON TUHR, Der Alígemeine Teil, III, 342).
Todavia, sem estudo sistemático ou com estudo defeituoso do direito civil, alguns juristas aventuraram que,
para os atos jurídicos que exigem instrumento público, a procuração não poderia ser por instrumento particular.
Se o ato exige instrumento público, ou particular, o mandato tem de ser por instrumento público, ou por
instrumento particular, porque rege a espécie o art. 1.291 do Código Civil; porém, com isso, não se supõe ter-se
afastado o principio de simetria da forma escrita. “Para o ato que não exigir instrumento público, o mandato,
ainda quando por instrumento público seja outorgado, pode substabelecer-se mediante instrumento particular”
(Código Civil, art. 1.289, § 2.0). Se o ato exige instrumento público, a procuração pode ser por instrumento
público, ou por instrumento particular; se foi outorgado por instrumento público, somente por instrumento
público pode ser substabelecida, porque assim o exige o art. 1.289, § 22.
Temos, por conseguinte:
a) Ato jurídico para o qual se exige a forma escrita. A procuração somente pode ser por escrito (= por escritura
pública, ou por instrumento particular).
b) Ato jurídico para o qual se exige instrumento público. A procuração pode ser por instrumento público, ou por
instrumento particular. Não há, no direito brasileiro, a regra jurídica segundo a qual, para os atos jurídicos que
exigem a forma de instrumento público, a procuração somente possa ser por instrumento público.
c) Se o ato jurídico não exige instrumento público ou instrumento particular, não há pressuposto formal da
escrita. A outorga de poder de representação pode ser sem a forma escrita (oral, inclusive pelo telefone).
(Não se argumente com o direito alemão. Nêle, há regra jurídica explícita, a alínea 2!- do § 167, que diz: “A
declaração”, referindo-se à procuração, “não precisa da forma exigida para o negócio jurídico a que se destina a
outorga de poder”. Não há no sistema jurídico brasileiro tal regra jurídica, demasiado geral, que rompeu com
um dos princípios sobre forma.)
Cumpre que se não confunda o assentimento do marido ou da mulher, na espécie do art. 132 do Código Civil,
com a procuração outorgada por um ou outro, se o negócio jurídico, para que se deu a procuração, exige forma
especial (e. g., compra-e-venda de bem imóvel, cf. 1!- Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Sul, 12 de outubro de 1948).
Se o ato jurídico para que se outorga procuração exige instrumento público, pode essa ser por instrumento
público, ou por instrumento particular (43 Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 29 de novembro
de 1948, E. F., 178, 168). A firma pode ser abreviada, se há o reconhecimento (23 Câmara Civil do Tribunal de
Apelação de São Paulo, 16 de março de 1941, E. dos T., 135, 97).
O art. 1.289, § 2.0, não pode ser interpretado como só concernente às relações jurídicas entre o mandante e o
mandatário; seria sofisma, que vem de CLÓVIS BEVILÁQUA (Código Civil comentado, V, 32) e de
EDUARDO ESPINOLA (Dos Fatos jurídicos, 30), passando a J. X. CÀRVALHO DE MENDONÇA (Tratado
de Direito Comercial, VI, Livro IV, Parte II, 258),

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6.INSTRUMENTO PARTICULAR DE PROCURAÇÃO E RECONHECIMENTO DA FIRMA. O


reconhecimento da firma é formalidade que pode ser exigida ao mandatário pela pessoa com que êle trata, ou
por terceiros. Assim se há de interpretar o Código Civil, art. 1.239, § 3.0: “O reconhecimento da firma no
instrumento particular é condição essencial à sua validade, em relação a terceiros” (Lei n. 3.167, de 3 de junho
de 1957, ad. 12). Validade está, aí, por eficácia. Porém, ainda entendido como eficácia, não se pode pretender
que não tenha eficácia, quanto ao terceiro, o instrumento particular cuja firma não foi reconhecida, se o
mandante não o impugna como falso, ou falsificado. A falta de terminologia técnica nos redatores do Código
Civil tem levado a erros de doutrina e de jurisprudência, que se devem lamentar. No mandato judicial, a
procuração tem de ter o reconhecimento da firma. Também no Código de Processo Civil se fala de validade
(art. 107, verbo “valerá”), se bem que de eficácia se trate: a nulidade, que acaso decorra, é quanto ao ato
praticado pelo representante sem ter eficácia, em juízo, a procuração. Aliás, pode êle, a qualquer tempo, ser
ratificado pelo dono do negócio.

§ 4.679. Extensão dos poderes conferidos

1.ESPÉCIES DE Extensão . Os poderes são de representação ou de pura gestão. A extensão de podéres,


inclusive de representação, pode ser subjetiva (pluralidade de outorgados), ou objetiva (quantidade e qualidade
dos poderes). Quanto à pluralidade de outorgantes, não há, propriamente , distribuição subjetiva ou objetiva de
poderes. Cada titular outorga o poder que tem, ou que entende ter. Nos casos de comunhão pro indiviso, o poder
só se refere à parte ideal; nos de comunhão pro diviso, a cada quota. Se o bem pertence, em partes iguais, aos
outorgantes, a outorga por todos não apresenta dificuldades; por alguns, interpreta-se como restrita aos direitos
que os comuneiros outorgantes têm. Se todos os proprietários de apartamento de edifício outorgam poderes de
venda, entende-se que o outorgado vende a totalidade dos apartamentos, prestando contas, separadamente, a
cada um dos donos, salvo cláusula expressa em negócio jurídico subjacente, justajacente ou sobrejacente. ~
preciso atender-se a que o mandato ou outra relação jurídica subjacente, justajacente, ou sobrejacente pode
estabelecer a outorga ativa conjunta. Então, cada outorgante é responsável solidàriamente e o outorgado presta
contas a qualquer dêles, salvo cláusula expressa do negócio jurídico subjacente, justajacente ou sobrejacente. A
respeito do mandato, diz o Código Civil, art. 1.314: “Se o mandato fôr outorgado por duas ou mais pessoas, e
para negócio comum, cada uma ficará solidâriamente responsável ao mandatário por todos os compromissos e
efeitos do mandato, salvo direito regressivo, pelas quantias que ela pagar, contra os outros mandantes”.
Também assim o Código Comercial, art. 148: “Se o mandatário fôr constituído por diversas pessoas para um
negócio comum, cada uma delas será solidâriamente obrigada por todos os efeitos do mandato”. O princípio é
comum aos vários sistemas jurídicos (Código Civil francês, art. 2.002; argentino, art. 1.945; português, art.
1.348). A ratio legis está em que o ato ou os atos compõem um todo e os outorgantes quiseram a conjunção.
Uma das consequências é poder o outorgado exigir instruções a qualquer dos outorgantes. Bem assim, qualquer
dos outorgantes exigir do outorgado iniciar ou continuar no exercício do poder de representação ou de outro
poder ou de outros poderes.
Ooutorgante não pode pretender que se anule o ato jurídico por êrro do seu representante se, ao dar-lhe as
instruções, conhecia a falta de qualidades a respeito das quais incorreu em êrro o outorgado (Fa. RELLMANN,
Vortrãge, 146).
Especialidade do ato é inconfundível com expressão do ato. O ato outorgado pode ser expressamente
mencionado ai ( o poder para êle ser expresso) e não ser especialmente apontado. Exprimiu-se que o outorgado
pode vender, porém não se disse o quê, ou qual o bem cuja venda se permite. Tem-se, na outorga de poder
especial, de determinar o que pode fazer. Cf. 4!- Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 20 de
abril de 1944 (E. dos T., 151, 651). O art. 1.295, § 1.0, do Código Civil é explícito em exigir, para certos atos,
poderes especiais e expressos. Não só expressos, nem só especiais. A alternatividade dentro de um dos
pressupostos de especialidade não retira a especialidade (e. g., vender a casa a ou a casa b, ou alguns dos lotes,
que são de minha propriedade, na Fazenda F; doar a casa da rua a, n. 1, à minha irmã E ou aos seus filhos;
comprar uma casa de três quartos, sala e mais dependências, em Boa Viagem, no Recife, até o preço x).
O art. 1.294 do Código Civil fala de mandato especial e de mandato geral. Com isso foi corrigido o que se diz
no Código Civil francês, art. 1.988, e nos que o copiaram (Código Civil francês, art. 1.988, 1!- alínea: “Le
mandat conçu en termes généraux n’embrasse que les actes d’administration”).
O nôvo Código Civil italiano, art. 1.708, 2!- alínea, seguiu o Código Civil brasileiro, pois a redação do antigo
Código Civil dava ensejo a discussões (cf. FRANCESCO SAGOESSE, La Rappresentanza nelia teoria e nella

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pratica deI diritto privato,


161 s.; BATTISTA, Del Contratto di Società e del Mandato, Ii Diritto Civile italiano de PIORE e BRTJGI,
Parte XII, 474).

2.PLURALIDADE DE OUTORGADOS. Se os mandatários são dois, ou mais, e há cláusula expressa de serem


solidários (cláusula de solidariedade), cada um obra por todos. Se, em vez disso, há cláusula de
simultaneidade, ou conjunção, nenhum pode, sôzinho, exercer o mandato. Se há cláusula de discriminação dos
atos pelos outorgados (cláusula discriminatória), a cada mandatário toca um ou tocam alguns, ou classe de atos.
Se nenhuma das três cláusulas acima está expressa, entende-se que são sucessivos os mandatários, isto é, o
segundo somente Pode obrar na falta do primeiro, o terceiro, na falta do primeiro e do segundo, e assim por
diante (Código Civil, art. 1.804: “Sendo dois ou mais os mandatários nomeados no mesmo instrumento,
entender-se-á que são sucessivos, se não forem expressamente declarados conjuntos, ou solidários, nem
especificamente designados para atos diferentes”.) Faltar é não poder exercer, ou não querer exercer o mandato
(Tribunal de Justiça de São Paulo, 12 de novembro de 1922, E. dos T., 44, 741 s.), ou já não ter os poderes, e.
g., foram revogados. Na dúvida, tratando-se de mandatários conjuntos, ainda que alguns não aceitem, os
restantes podem exeqúir. Todavia, no direito comercial, exige-se que reste maioria e tal maioria exerça o
mandato. Diz o art. 147 do Código Comercial: “Quando no mesmo mandato se estabelece mais de um
mandatário, entende-se que são todos constituídos para obrarem na falta, e depois dos outros, pela ordem da
nomeação; salvo declarando-se expressamente no mandato que devem obrar solidária e conjuntamente: neste
último caso, ainda que todos não aceitem, a maioria dos que aceitarem poderá exeqijir o mandato”.
Evidentemente, “todos” foi êrro de redação; “alguns” é que se há de ler. Em consequência, se a maioria dos
nomeados não aceita o mandato, não se conclui o contrato de mandato.
Nada obsta a que se combinem, expressamente, as quatro espécies (solidariedade, conjunção, discriminação,
sucessividade), desde que não haja contradição. Tão-pouco, sendo dois ou mais os mandatários, o exercido
preferencial implica, sempre, exclusão dos outros quanto à retribuição e às obrigações.
Oart. 1.304 do Código Civil põe como ins dispositivum a regra jurídica da sucessividade. O Código Civil
francês, art. 1.995, apenas diz que, se há “plusieurs fondés de pouvoir ou mandataires par le même acte, il n’y a
pas de solidarité entre eux qu’autant qu’elle est exprimée”. ‘O Código suíço das Obrigações, art. 403, 23 alínea,
parte da solidariedade para o cumprimento pelos mandatários conjuntos, e da necessidade de vinculação do
mandante se em conjunto o cumprimento. No Código Civil italiano, art. 1.716, 2A alínea, estatui-se que, se não
é declarado que os mandatários devem agir conjunta-mente, cada um pode concluir o negócio. A sucessividade
foi criticada durante a vigência do direito italiano anterior (Código Comercial italiano, revogado, art. 364,
alínea 13), principalmente por ser “mecânico e material” o caráter da regra jurídica (cf. ARTURO CAPUrrO,
La Procura coilettiva, 30 s.).
Os mandatários sucessivos têm de obrar um em falta do outro anterior, ou dos outros anteriores. Isso não quer
dizer que o mandatário nomeado em segundo, terceiro ou posterior lugar somente possa aceitar se o anterior ou
os anteriores não aceitaram. Ésses que somente podem aceitar se o anterior ou os anteriores não aceitaram são
os ordinalmente nomeados, e não os nomeados no mesmo instrumento, que são sucessivos quanto ao exercício,
ao adimplemento. Não compreendeu isso a 2!- Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio de Janeiro, a 30
de janeiro de 1940, que citou a TEIXEIRA DE FREITAS (Consolidação das Leis Civis, nota 31 ao art. 471),
que não diz o que se lhe atribuiu. O consolidador distinguia os procuradores in soliduni, os nomeados
indistintamente (conjuntos), os sucessivos para o adimplemento e os “nomeados ordinalmente”, que “devem
aceitar o mandato um depois do outro, na ordem indicada, por não querer ou não poder aceitar o precedente”. O
sucessivo é o procurador que somente pode obrar “quando o primeiro não queira ou não possa exeqúir o
mandato, assim como o terceiro não poderá agir a não ser quando o segundo esteja em idênticas condições e
assim por diante” (53 Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 18 de janeiro de 1940, A. J.,
55, 106 s.).
3.EXTENSÃO OBJETIVA. No art. 1.294 do Código Civil, diz-se que “o mandato pode ser especial a um ou
mais negócios determinadamente, ou geral a todos os do mandante”. Entenda-se: o mandato pode ser para
algum ou alguns atos, positivos ou negativos, de interesse do mandante, ou para todos os atos que entrem na
esfera jurídica, patrimonial ou não, do mandante. O mandato para todos os atos não compreende aquêles para os
quais não há outorga de poder, ou que exigiriam poderes especiais. No direito brasileiro, o mandato em têrmos
gerais não é para todos os negócios do mandante, de modo que a cláusula “para quaisquer negócios”, sem maior
explicitude, não passa da outorga de poderes de administração. Por vêzes, o poder especial, que se outorga,

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supóe outro, de que êle depende. Por exemplo: o poder de hipotecar é poder que vem após o de contrair dívida,
que se garanta com a hipoteca (2!- Turma do Supremo Tribunal Federal, 21 de outubro de 1949, E. 11’., 129,
407), salvo se alguma dívida já existe, ou vai existir,e se haja de pré-excluir outorga de poder para a assunção.
O poder de administrar imóveis locáveis compreende o de dar em locação (23 Turma, 24 de dezembro de 1948,
A. J., 72, 19). Quando se outorgam poderes para alienação de bens imóveis, ou determinada classe de bens, não
se precisa dizer quais os bens que se incluem no rol dos imóveis, ou quais os bens que se incluem na classe que
se referiu (cf. Supremo Tribunal Federal, 23 de abril de 1941, A. J., 58, 875).
Diz-se no Código Civil, art. 1.295: “O mandato em têrmos gerais só confere poderes de administração”.
Acrescenta-se no Código Civil, art. 1.295, § 1.0: “Para alienar, hipotecar, transigir, ou praticar outros quaisquer
atos, que exorbitem da administração ordinária, depende a procuração de poderes especiais e expressos”.
São atos frequentes que exorbitam da administração ordinária, além dos atos de alienação e de gravação com
hipoteca, ou anticrese: a) empenhar; b) caucionar; e) transigir; d> firmar compromisso; e) ceder crédito ou
direito, ou remitir dividas, exceto em se tratando de remissões nas concordatas judiciais; f) criar, aceitar,
endossar, ou avalizar letra de câmbio; g) criar, endossar, ou avalizar nota promissória, ou cheque h) criar,
aceitar, endossar, ou avalizar duplicata mercantil; i) prestar fiança (Código Comercial, art. 145) ; 5) entrar como
sócio ou acionista de associações ou sociedades (Código. Comercial, art. 145) ; /r) comparecer e tomar parte
nas assembléias das sociedades anônimas; 1) requerer falência ou outro concurso de credores.
Ao mandatário com poderes gerais é dado praticar os atos jurídicos necessários à execução do mandato, os atos
conservatórios e exercer as pretensões e ações assecuratórias. Também lhe é atribuído pela legislação falencial
representar o credor na falência; o Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945, art. 82, II, manteve a regra
jurídica de serem aptos os procuradores ad negotia, embora sem poderes especificados para falência, e tais
procuradores ficam habilitados a tomar parte em qualquer ato ou deliberação da massa, fazer declarações de
crédito e receber intimações independentemente de poderes especiais (Decreto-lei n. 7.661, art. 31, § 2.0, 13
parte). Tal atribuição somente se inclui no poder ad negotia porque a lex specialis o diz.
Estatui o art. 145 do Código Comercial: “O mandato geral abrange todos os atos de gerência conexos e
conseqúentes, segundo se entende e pratica pelos comerciantes em casos semelhantes no lugar da execução,
mas, na generalidade dos poderes, não se compreendem os de alhear, hipotecar, assinar fianças, transações, ou
compromissos de credores, entrar em companhias ou sociedades, nem os de outros quaisquer atos para os quais
se exigem neste Código poderes especiais
Mandato expresso e mandato com poderes especiais são conceitos diferentes. ~ expresso o mandato em que se
diz:
“com poderes para alienar, hipotecar, prestar fiança”. Porém não é especial. Por conseguinte, não satisfaz as
duas exigências do art. 1.295, § 1.0, do Código Civil que fala de “poderes especiais e expressos”. Cf. Código
Comercial, art. 145, iv, fine. Poderes expressos são os poderes que foram manifestados com explicitude.
Poderes especiais são os poderes outorgados para a prática de algum ato determinado ou de alguns atos
determinados. Não pode hipotecar o imóvel a o mandatário que tem procuração para hipotecar, sem se dizer
qual o imóvel:
recebeu poder expresso, mas poder geral, e não especial. Cf. 43 Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São
Paulo, 20 de abril de 1944 (E. dos T., 151, 651). Nada obsta a que se insira cláusula de alternatividade; “alienar
(ou hipotecar) o prédio a, ou o prédio b”, ou “um dos prédios a, b e c”, ou “um ou mais prédios da rua R, ns. 2,
4, 6, 8 e 10, até que apure a quantia líquida de tantos milhões de cruzeiros
O poder de alienar não compreende o de gravar de direito real de garantia (e. g., de hipoteca, 43 Câmara Civil
do Tribunal de Apelação de São Paulo, 22 de janeiro de 1942, E. dos T., 185, 682; 4a Câmara Civil do Tribunal
de Justiça de São Paulo, 18 de fevereiro de 1954), ou qualquer direito real limitado.
O poder de contrair empréstimo e dar hipoteca em garantia não contém o de confessar dívida e garanti-la com
hipoteca (4.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 31 de março de 1945, E. dos T., 162, 168).
O poder para transigir há de referir-se à lide em que se bá de fazer a transação. Não há poder de transigir em
geral. Por outro lado, o poder para transigir não compreende o de alienar, fora da transação, o bem a que a
disputa se reporta (cf. Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Espirito Santo, 80 de junho de 1943).
O art. 1.295 do Código Civil não inclui, na enumeração explícita dos poderes que precisam ser especiais, o de
prestar fiança, mas está implicito no art. 1.295, § 12 (verbis “outros quaisquer atos que exorbitem da
administração ordinária”). Cf. 1.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 8 de maio de 1951 (E. dos
T., 193, 191).
Os poderes para depositar e retirar dinheiro, subscrever

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cheques, saques ou ordens de pagamento não compreendem o de avalizar títulos cambiários (1~ Câmara Civil do
Tribunal de Anulacão de São Paulo, 3 de março de 1941, E. dos 2’.,
12, 218).
Na cláusula de substituição é permitido dizer-se o nome de quem, ou das pessoas dentre as quais o substituinte
há de escolher o substituto.
“O poder de transigir (arts. 1.025 a 1.086)”, diz o art. 1.295, § 22, do Código Civil, “não importa o de firmar
compromisso (arts. 1.087 a 1.048)”.
O instrumento do mandato com poderes gerais e para fins comerciais (chamado mandato institório) e o da sua
revogação deveriam ser depositados no registo do comércio do domicilio do mandante e do mandatário (Código
Comercial, art. 159),
providência que caiu em desuso. Dizia o art. 159 do Código Comercial: “O instrumento do mandato geral e o
da sua revogacão deverão ser registados no Tribunal do Comércio do domicílio do mandante e do mandatário,
ou no cartório do escrivão do Juízo do Comércio, nos lugares distantes da residência do Tribunal. A falta de
registo estabelecerá a presunção da validade dos atos praticados pelo mandatário destituído”.
Se o preposto, ou locador de serviços, recebe o mandato do preponente, ou locatário, trata-se de mandato
mercantil, ou civil, conforme a espécie (lY Câmara da Côrte de Apelação do Distrito Federal, 18 de abril de
1912, E. de D., 24, 416 s.) e não de relação juridica de órgão .

A publicidade que se obtém com o registo apenas estabelece eficácia erga omites; não pertence ao plano da
existência (errado, J. X. CARVALHO DE MENDONÇA, Tratado, VI, Livro IV, Parte II, 244), em dizer que a
publicidade é meramente declarativa (?), e não constitutiva: atribuição de eficácia é constitutividade, no plano
da eficácia). Enquanto não se regista a revogação, tendo-se registado o mandato, tem-se por ainda não
revogado o mandato. O art. 159, alínea 22, estatui que a falta de registo estabelece a presunção da validade dos
atos praticados pelo mandatário destituído. Entenda-se: se não houve outra notificação, o terceiro de boa fé fica
incólume às alegações do mandante quanto à falta de poderes, pelo fato da revogação (Código Civil, art. 1.818:
“A revogação do mandato, notificada somente ao mandatário, não se pode opor aos terceiros que, ignorando-a,
de boa fé com êle trataram; mas ficam salvas ao constituinte as ações, que no caso lhe possam caber, contra o
procurador”).
Cumpre distinguirem-se poderes gerais e poderes genéricos. Se o instrumento se refere a poderes para alienar
bois, ou terrenos, não é de mister que diga quais os bois, ou os terrenos (Tribunal de Justiça de São Paulo, 17 de
setembro de 1920 e 5 de fevereiro de 1924, E. dos 2’., 86, 128, 49, 294 s.). Os poderes para criar, aceitar,
endossar, ou avalizar títulos cambiários, compreendem letras de câmbio e notas promissórias de qualquer valor
e de qualquer prazo, com quem quer que seja e dc quem quer que seja. Não se estende aos poderes concernentes
aos títulos cambiariformes. Os poderes para criar, aceitar, endossar, ou avalizar títulos cambiários e
cambiariformes comnprendem letras de câmbio, notas promissórias, duplicatas mercantis e cheques. Poderes
para criar, aceitar, endossar ou avalizar letras de câmbio não compreendem os de criar, aceitar, endossar, ou
avalizar duplicatas mercantis, ou vice-versa. Os poderes para defesa dos interesses do mandante em juízo
abrangem os de defesa de quaisquer interesses pecuniários, inclusive o de poder constituir advogado (Supremo
Tribunal Federal, 2 de agôsto de 1922, E. do S. 2’. 9., 48, 113, e 44, 105), não, porém, os de defesa em ações
que sejam de assunto de família.

Se o negócio jurídico que se há de concluir é gratuito, tem-se de indicar com quem se há de concluir. Não se
pode passar procuração eficaz para que se doe a quem quer que seja, salvo se se alude a pobres ou algum
círculo social, pôsto que a procuração para vender ou trocar não exija tal expressão e precisão sobre quem há de
ser o comprador, ou o outro contraente na troca.
Na doação, se o bem é comum aos cônjuges e é de mister o assentimento de um cônjuge para que o outro doe, o
negócio jurídico exige o consentimento dos dois, quanto às metades que lhes tocam, e assentimento de cada um
para a doação pelo outro. Cf. 1a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 14 de fevereiro de 1944
(E. dos T., 149, 244).
Para quaisquer atos de vinculação cambiária ou cambiariforme (subscrição, aceite, aval, endôsso), são
necessários poderes expressos, mesmo se é gerente de emprêsa quem pratica o ato. Pode haver, a respeito,
qualquer restrição permitida quanto ao ato; e. g., avalizar endossos, e não aceites, ou avalizar aceites, e não
endossos; endossar para mandato (endôsso-mandato, endôsso-procuração). Sobre o endôsso-mandato, a Câmara
Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, a 15 de março de 1984 (E. dos 2’., 122, 287). O poder para

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avalizar, ou endossar, não compreende o de prestar fiança (13 Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São
Paulo, 1$ de agôsto de 1950, E. ãos 2’., 188, 819) ; nem vice-versa.

§ 4.680. Espécies de mandato

1.MANDATO TÁCITO E MANDATO PRESUMIDO. Mandato tacito é mandato tâcitamente conferido. Não
se confunde com presunção de mandato, isto é, com o chamado mandato presumido. Mandato presumido é o
mandato que se presume existir, isto é, que, salvo prova em contrário, se tem por existente. Mandato tácito é o
mandato que tâcitamente foi conferido, mandato que é, sem se ter de presumir a sua existência (cf. Lei n. 2.044,
de 81 de dezembro de 1908, art. 49: “Presume-se mandato ao portador para inserir a data e o lugar do saque na
letra que não os contiver”; Código Civil, art. 640: “‘O condômino, que administrar sem oposição dos outros,
presume-se mandatário comum”). Quem se presume mandatário pode não ser mandatário; tem por si e contra si
a presunçãO, até que se prove o contrário, ou que êle mesmo prove não ser. Não ~ o gestor de negócios sem
mandato; porque êsse sabe não ser mandatário. Nem é o mandatário que surgiu do contrato tàcitamente
concluído de mandato; porque êsse sabe, ao certo, que o e.
Tão-pouco se podem confundir o mandato tácito e a ratificação tácita. O mandato tácito mandato é. A
ratificação supôe não ter havido mandato, ou não ter havido o poder de representação que foi afirmado pelo
mandatário (Código Civil, arts. 1.806 e 1.843). Aliás, é preciso atender-se a dois sentidos diferentes de
ratificação, no Código Civil, arts. 1.806 e 1.343 (Genehmigun g), que é exercício de direito formativo gerador
por parte do dominu.s negotii, e art. 148 (Bestãtigung), que torna válido o inválido. Lê-se no art. 1.806 do
Código Civil:
“O terceiro que, depois de conhecer os poderes do mandatário, fizer com êle contrato exorbitante do mandato,
não tem ação nem contra o mandatário, salvo se êste lhe prometeu ratificação do mandato, ou se
responsabilizou pessoalmente pelo contrato, nem contra o mandante, senão quando êste houver ratificado o
excesso do procurador”. Cf. arts. 929 e 1.296. Observe-se que a referência a “contrato” (verbis “ou se
responsabilizou pessoalmente pelo contrato”) é apenas exemplificativa:
omandatário pode ter-se responsabilizado pelo negócio jurídico unilateral, ou por negócio jurídico bilateral ou
plurilateral não contratual, ou por outro ato jurídico.
O mandato presumido é, portanto, o mandato, expresso ou tácito, provável. Presumindo-se o mandato, pode ser
que êle exista, expresso ou tácito. Isto é, expresso por escrito, ou oralmente, ou por gestos, ou tácito, por meio
de palavras ou atos, de que se possa inferir a manifestação de vontade (facta concludentia). Grave confusão
terminológica em J. X. CARVALHO DE MENDONÇA (Tratado de Direito Comercial, VI, Livro IV, Parte TI,
287 s.) ; também, em VITTORIO NEPPI, La Eappresentanza, 264).

2.MANDATO CIVIL E MANDATO COMERCIAL. Embora sem alcance prático, ainda existe a diferença
entre mandato civil, que é aquêle que se rege pelo Código Civil ou por alguma lei de direito civil, e o mandato
comercial ou mercantil, regido pelo Código Comercial ou alguma lei de direito comercial. As diferenças são
mínimas e a jurisprudência, como a doutrina, se foi encarregando de uniformizar o sistema jurídico. Lê-se no
Código Comercial, art. 140, alínea l.a: “Dá-se mandato mercantil quando um comerciante confia a outrem a
gestão de um ou mais negócios mercantis, obrando o mandatário e obrigando-se em nome do comitente”. A
redação é má. O mandatário obra como tal, porém, normalmente, não se vincula. Vincula o mandante. Obra em
nome do mandante (não “comitente”) e a eficácia que se irradia é de deveres, direitos, obrigações, pretensões e
ações de que é titular ou sujeito passivo o mandante. Quando o mandatário mesmo se vincula, se obriga e se faz
sujeito passivo de ações, houve ato seu, fora dos poderes do mandante, de que se irradiaram tais efeitos.
0 comissionário é, de regra, comerciante. Portanto, mercantil a comissão. Não ocorre o mesmo com o mandato,
que pode ser mercantil, ou não no ser, se o mandante ou o mandatário é comerciante.
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§ 4.681. Mandato e figuras jurídicas afins

1.MANDATO E LOCAÇÃO DE SERVIÇOS, MEDIAÇÃO, CORRETAGEM, NUNCIATURA E


PREPOSIÇÃO. O mandato muito se parece com a locação de serviços, a mediação, a corretagem, a
nunciatura e a preposição. Já falamos da diferença entre o mandatário e o núncio. No direito brasileiro, o poder
de representaçâo não é essencial ao mandato, que às vêzes tem como objeto a promessa de outorga (e. g.,
assina-se o contrato em instrumento particular de mandato e promete-se a procuração por escritura pública).

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Isso não quer dizer que a procuração não possa ser outorgada a pessoas que não são mandatários. Há, no direito
brasileiro, mandato sem representação, como se há relação jurídica entre pessoas e não há negócio jurídico,
nem ato jurídico stricto sensu, e há poder de representação, ainda voluntária, sem ser em mandato.
O empregado da companhia que tem procuração para receber quantias fora do estabelecimento está investido de
poder de representação, não de mandato; é preposto, não mandatário. O empregado do escritório do advogado,
ou do médico, a quem
Esse, ou aquêle, passa procuração para receber as contas, não é mandatário, é locador de serviços, investido
apenas de poder de representação.
Se é certo que, no direito brasileiro, não há mandato para atos que não entrem, como atos, no mundo jurídico,
isto é, em que não possa haver representação, ou ato por outrem, que penetre no mundo jurídico como ato-fato
jurídico, a conferência de poderes de representação não torna mandato os outros contratos. Os que podem
ordenar não precisam mandar: se A ordena a B que receba o cheque, que êle lhe endossa, e compre máquina de
escrever, A não mandou; não há mandato entre êles, ainda quando, em vez de cheque, entrega A a procuração ao
motorista do carro e diz que receba as peças na alfândega. O representante da casa comercial e o corretor não se
confundem com o mandatário: aquêle pode ser preposto, se permanentemente se encarrega de representar a casa
comercial, com poderes de representação, como pode não chegar a isso, e ficar mediador, ou mandatário, ou
comissionário; êsse pode fazer-se comissionário, ou mandatário. O mandato, em alguns casos, exige
observância do Código Civil, art. 141, ou do Código Comercial, ad. 140, alínea 23; a nunciatura, não.
Não é caixeiro-viajante, mas sim mandatário, quem trabalha para duas ou mais firmas, nos lugares que percorre,
com outorga de poderes que não revelam tratar-se de empregado. Daí serem invocáveis as regras jurídicas sobre
mandato (cf. Câmaras Civis ReUnidas do Tribunal de Alçada de São Paulo, 10 de março de 1958, 1?. dos 2’.,
212, 475).
É preciso que se não confunda o preposto com o mandatário. Outrossim, e a fortio’ri, o preposto ou mediador
com o representante (pessoa que recebeu poderes de representar), de modo a chegar-se ao absurdo de se chamar
“representante” a quem “se limita a diligenciar os negócios e aproximar os contratantes, pondo-os em relações
diretas”, êrro cometido por J. X. CARVALHO DE MENDONÇA (Tratado de Direito Coinercial, IV, Parte II,
286), com reflexos na jurisprudência (e. g., E. de D., 101, 540).

2.ATOS E ATOS-FATOS SEM SEREM EM RELAÇÃO JURÍDICA INTENCIONAL COM OUTREM. Quem
se oferece ou aceita tomar conta da casa de outrem, gratuitamente, na sua ausência, ou durante doença ou outro
empecilho a que o dono da casa cuide do que é seu, não exerce mandato, mesmo se passa recibo de
correspondência, ou responde a quem pergunta se quer fornecimento doméstico, ou paga contas. Tem havido
grave confusão a êsse respeito. O tráfico jurídico, aí, é acidental. Quem toma conta, gratuitamente, em tais
circunstâncias, é apenas gentil tomador de conta, ou outro doador (senso largo), ou núncio, ou um e outro com
posse ou com serviço da posse (servidor de posse imediata). Conforme teremos de ver, a doação não é só de
coisas, nem de créditos. Há doação de serviços, de obra, de atos e atos-fatos.
Isso não quer dizer que até aos fatos jurídicos stricto sensu não possa ir, excepcionalmente, o mandato.
O mandato pode consistir em qualquer fato jurídico (E. LENT, Wille und Interesse bei der Geschdftsbesorgung,
1 s.; HELIMUT GEORG ISELE, Geschdftsbesorgung, 90 s.; sem razão, J. vON SCHEY, Die
Obligationsverhãltnis, 449 s., que entendia, no direito austríaco, só haver mandato para negócios jurídicos e
atos jurídicos stricto sensu).

8.REGRAS JURÍDICAS SOBRE MANDATO E INVOCABILIDADE A RESPEITO DE OUTROS


NEGÓCIOS JURÍDICOS. Tratando-se de contrato de locação de serviços ou de locação de obra, em que o
objeto seja gestão de negócios, são invocáveis, além das regras jurídicas sobre êsses contratos, as que
concernem ao mandato, no que não se choquem com aquelas. Algumas das regras jurídicas sobre mandato que
freqúentemente incidem são as dos arts. 1.293, 1.301, 1.308, 1.811, 1.321 e 1.322 do Código Civil.

L.
CAPÍTULO III

EFICÁCIA DO CONTRATO DE MANDATO

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§ 4682. Deveres e obrigações do mandatário

1.DESEMPENHO DO MANDATO. Tem o mandatário de exercer o poder de representação, ou outro poder ou


os poderes que lhe foram outorgados, com diligência, sendo responsável por tôda culpa. ‘O Código Civil, no
art. 1.300, estatui:
“O mandatário é obrigado a aplicar tôda a sua diligência habitual na execução do mandato, e a indenizar
qualquer prejuízo causado por culpa sua ou daquele a quem substabelecer, sem autorização, poderes que devia
exercer pessoalmente”. No Código Comercial, arts. 142 e 162, os princípios são os mesmos:
“Aceito o mandato, o mandatário é obrigado a cumpri-lo segundo as ordens e instruções do comitente,
empregando na sua execução a mesma diligência que qualquer comerciante ativo e probo costuma empregar na
gerência dos seus próprios negócios” (art. 142) ; “O mandatário responde ao comitente por tôdas as perdas e
danos que no cumprimento do mandato lhe causar, quer procedam de fraude, dolo ou malícia, quer ainda
mesmo os que possam atribuir-se somente a omissão ou negligência culpável (art. 189)” (art. 162). O dever é de
diligentia quam suzs.
Em virtude do mandato, o mandatário vincula-se à prática dos atos, a que corresponde o mando, por conta do
mandante. São inclusos nos atos prometidos aquêles atos, não previstos, que sejam essenciais ao cumprimento
do mandato. No contrato de mandato, como em outros contratos, o conteúdo das prestações é relevante;
também o é a intercedência entre elas. Algumas prestações só dependem do mandatário, ou, até, só êle é o
indicado, ou só êle pode fazê-las. Outras êle não pode fazer, mas suscitar ou requerer <e. g., licença de venda).
O mandatário não é só vinculado ao que se apontou no contrato como conteúdo mas ao que, ato ou fato, é
necessário ao adimple mento daquele dever.
O Código Comercial alude à diligência usual dos comerciantes (ativos e probos) ; o Código Civil, à diligência
habitual do mandatário. Sobre isso, Tomo II, § 178, especialmente n. 7.
Rege o princípio da pessoalidade do desempenho: o mandatário mesmo há de executar o mandato (art. ~ 23
parte; Código Comercial, art. 146). Se não lhe foi permitida substituição e se substituiu, responde por sua culpa
e pela culpa do substituto. No direito brasileiro, a substituição, sem poder de substituição, não tem eficácia para
a conclusão do ato, de modo que só a ratificação o pode fazer entrar no mundo jurídico. O substituto, se o
substituinte não tinha poder de substituição, “representou” sem poder de representação, ou praticou o ato
positivo ou negativo, sem ter poder para isso, com tôdas as consequências que daí decorrem. Ao terceiro
responde êle, se não sobrevém ratificação (Código Civil, arts. 1.832, 1.348 e 1.844).
Da falta de poder para substituição há-se de distinguir a proibição de substituição (Código Civil, art. 1.800, §
19)
“Se, não obstante a proibição do mandante, o mandatário se fizer substituir na execução do mandato,
responderá ao seu constituinte pelos prejuízos ocorridos sob a gerência do substituto, embora provenientes de
caso fortuito, salvo provando que o caso teria sobrevindo, ainda que não tivesse havido substabelecimento”. Se
há poder de substituição, responde o mandatário pela culpa in eligendo, mas apenas nas duas espécies do art.
1.300, § 2.0, onde “incapaz” está no sentido de inapto ou sem competência para o assunto: “Havendo poderes
de substabelecer, só serão imputáveis ao mandatário os danos causados pelo substabelecido, se fOr
notoriamente incapaz, ou insolvente”.
A 53 Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 25 de setembro de 1951 (R. F., 146, 276), disse,
de modo geral, que o mandatário não pode ser demandado pelo
inadimplemento por parte de comprador, em contrato de compra-e-venda em que representou o vendedor. No
caso, firma francesa, sendo compradora firma brasileira. Podia ter havido negligência do mandatário, se foi êle,
por exemplo, que escolheu a firma compradora ou a reputou idônea sem no ser.
Se o mandatário recebeu a letra de câmbio com aceite insuficiente, ou nulo, ou ineficaz, e não fêz o protesto,
responde pela sua falta (l.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 5 de novembro de 1928, li.
de D., 71, 568).
O mandato pode ser com estipulação a favor de terceiro, de jeito que o mandatário obre por conta de terceiro,
em segundo grau (não deixa de obrar por conta do mandante).
Ao mandatário que tem de praticar o ato d, para o qual são necessários os atos a, b e e, incumbe a prática de tais
atos, sem ser preciso que o contrato a êles se refira expressamente. Quem promete o fim há de prover aos
meros. Se para algum ato é de mister que o mandatário encarregue outra pessoa, tem êle o poder e o dever de
fazê-lo. Não têm as leis de conter regra jurídica a respeito, porque resulta dos fatos mesmos. Não se pode
transferir, para outrem, propriedade imobiliária sem se obter o que é acôrdo de transmissão, pagamento de

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impostos e registo.
2. DEVER DE COMUNICAÇÃO. O mandatário tem o dever de comunicar ao mandante o que se está
passando a respeito dos seus assuntos, quando Ibo peça, ou quando o exijam os interesses do mandante.
Desempenhado o mandato, tem o dever de apresentar as contas e os documentos do desempenho.
O mandatário tem de observar as linhas dos seus poderes. Como devedor, que é, há de exequir, com exatidão, a
prestação devida. Tem de comunicar ao mandante as circunstâncias supervenientes que possam determinar a
alteração dos poderes, ou das instruções, ou a revogação do mandato. Não estaria a salvaguardar os interesses
do mandante se lhe ocultasse o que êle conhece e o mandante ignora, ou é de supor-se que ignora. Aliás, se as
circunstâncias são tais que, conhecendo-as o mandante, não manteria as instruções que deu, e há urgência em
que o mandatário exerça os poderes, por ser difícil ou impossível receber manifestação de vontade do
mandante, feita a comunicação, o mandatário procederia como lhe diria o mandante, devido à mudança de
circunstâncias. Cf. Código Civil alemão, § 665, Código suíço das Obrigações, art. 397, 1.~ alínea, e Código
Civil italiano, art. 1.710, 2,a alínea.
O mandatário deve levar em consideração as circunstâncias supervenientes e aquelas que, embora existentes ao
tempo em que se concluiu o mandato, ou se remeteram as instruções, eram ignoradas pelo mandante e pelo
mandatário (PAUL OERTMANN, Die Geschãftsgrundlage, 88 5.; SCHMIDT-RIMPLER, em V.
EHRENBERC, Handbuch des gesammten Handelsreehts, V, 1, 678, nota 81). Aí, o que não se conhecia é como
se não existiu:
o conhecimento superveniente trata-se como inexistência no tempo anterior à conclusão do mandato.
Para que nasça o dever de comunicação é preciso que sejam tais as circunstâncias, ora ocorridas ou ora
reveladas, que o mandatário tenha de supor que o mandante, conhecendo-as, não faria o contrato tal qual, ou
não daria as instruções ou as modificaria.
Se o mandatário não pode e não deve esperar que o mandante, após o recebimento da comunicação, aprove o
que explícita ou implicitamente sugere o mandatário, nasce-lhe o dever de obrar conforme o interesse do
mandante, mantendo o seu dever de diligência habitual.
O dever de desviar-se não é só quanto às instruções, é também no tocante ao próprio mandato (sem razão,
WEtDMANN, Das Kornmissionsgesehãft, 1, 86 5.; com razão, entre outros, SCHMIDT-RIMPLER, em V.
EHRENBERG, Handbuch des gesam.mten Handelsrechts, V, 1, 604 s.).

Basta melhor conhecimento posterior pelo mandatário, que não tinham êle e o mandante (O. WARNEYER,
Kommentar, 1, 1089; sem razão, G. PLANCK, Kommentar, II, 663).
O silêncio do mandante é tido como manifestação de vontade modificativa, se a comunicação mesma sugeria,
claramente, determinada mudança.

8.INSTRUÇÕES DO MANDANTE. O mandato há de ser desempenhado segundo as instruções do mandante.


Não importa se foram simultâneas , ou posteriores ao mandato, desde que não alterem, com sacrifício para o
mandatário, caso em que o mandatário deve comunicar ao mandante que não as vai
seguir, para que as modifique; se anteriores, com previsão do mandato, tem-se de verificar se o mandato não as
modificou.
Se o mandatário entende que as instruções do mandante destoam do interesse objetivo dêsse, tem de seguir as
instruções, e não o de que está convicto. Salvo se o mandante ignorava as circunstâncias, ou se outras
sobrevieram. A intenção do mandante, para o mandatário, passa à frente do interesse objetivo dêsse. Se o
mandatário tem dúvida sobre a intenção do mandante, há o dever de fazer ao mandante as perguntas que bastem
ao esclarecimento.
As instruções devem ser interpretadas segundo os princípios gerais de interpretação dos negócios jurídicos, com
particular atenção ao uso do tráfico e à natureza do objetivo do mandato. E. g., as instruções sobre depósito do
dinheiro hão de ser para que se escolha banco que mereça confiança. Se é grande a quantia, entende-se incluída
tal instrução. Sempre que se fixa o preço de venda, tem-se como preço mínimo; sempre que se fixa preço de
compra, tem-se como preço máximo: Melior causa inandantis fieri potest (L. 5, § 5, D., mandati vel contra, 17,
1). Casos há em que o vendedor tem interesse em que a venda só se faça pelo preço marcado, ou pelo que,
negocialmente, lhe foi exigido vender; mas, para que o mandatário tenha de ater-se à exceção ao princípio, é
preciso que seja expressa no contrato, ou provenha de instruções, ou resulte das circunstâncias conhecidas pelo
mandatário,
Ao mandatário é dado afastar-se das instruções quando, examinadas as circunstâncias novas, ou já anteriores,

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não agravadas, o mandante aprovaria o desviar-se o mandatário das instruções e o mandatário delas discrepa,
convicto disso. O ônus da prova incumbe ao mandatário. Pode também ocorrer que o mandatário haja de
separar-se das instruções:
tem êle o dever, por exemplo, de não tratar com pessoa de cuja insolvência tem notícia, ou forte suspeita, se
adstringuir-se ao mandato ou às instruções seria danoso para o mandante; salvo se da inobservância resultaria
prejuízo ou risco para o próprio mandante. As desviações, que não importem afastamento aos têrmos do poder
de representação, ou de outro poder outorgado, não atingem o ato que foi objetivo do mandato. O mandatário
que não obtém aprovação, ou decisão judicial que reconheça o seu dever de desviar-se, tem de indenizar o
mandante.
No mandato irrevogável, se foi incluída a cláusula sobre o direito de denúncia por parte do mandatário, ou do
mandante, cabe denunciar-se se já não é possível o desempenho do mandato de acôrdo com as instruções.
O que importa aos terceiros e, pois, à existência, validade e eficácia do ato, para que se passou o mandato, é o
teor do instrumento, onde está o poder de representação, ou outro poder, ou outros poderes, e não o das
instruções, que pertencem ao contrato de mandato. Daí o art. 1.313 do Código Civil: “Ainda que o mandatário
contrarie ~ do mandante, se não excedeu os limites do mandato, ficará o mandante obrigado para com aquêles,
com quem seu procurador contratou; mas terá contra êste ação pelas perdas e danos resultantes da
inobservância das instruções”.
Grave confusão entre poder de representação e instruções encontra-se em VIRGILE ROSSEL (Manuel de Droit
fédéral des Obligations, 1, 479), interpretando o art. 397 do Código suíço das Obrigações. Se o terceiro exige a
apresentação das instruções e nao só do instrumento da procuração, e conclui o negócio, a despeito da
inobservância das instruções pelo mandatário, não há pensar-se em inexistência, anulabilidade ou ineficácia do
negócio jurídico, e o que pode ocorrer é responsabilidade pelo ilícito (colusi%o) ; salvo dolo (Código Civil
brasileiro, arts. 92-97), aí provâvelmente acidental (Código Civil brasileiro, art. 93, 1~a parte). No Código Civil
argentino, o art. 1.938 estatui:
“Los terceros con quienes el mandatario quiera contratar ànombre deI mandante, tienen derecho à exigir que se
les presente el instrumento de la procuración, las cartas órdenes, 6 instrucciones que se refieran aí mandato. Las
órdenes reservadas, ó las instrucciones secretas del mandante, no tendrán influencia alguna sobre los derechos
de terceros que contrataron en vista de la procuración, órdenes ó instrucciones, que les fueron presentadas”.
O locatário de serviços, mandatário ou empregador tem ação contra o procurador, locador de serviços,
mandatário ou empregado, pelo afastar-se das instruções, mesmo se não houve
excesso de poderes (2.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 5 de maio de 1954, R. 1.,
12, 154).

4. CONTAS. As contas do mandatário têm de ser prestadas após a prática do ato, ou dos atos, inclusive atos-
fatos, de que foi incumbido o mandatário (dever de prestação de contas), e hão de ser seguidas da entrega do
saldo do dinheiro, das pertenças e acessões aos bens recebidos e do que tenha sido pago ao mandatário por
indenização (Código Civil, art. 1.301: “O mandatário é obrigado a dar contas de sua gerência ao mandante,
transferindo-lhe as vantagens provenientes do mandato, por qualquer titulo que seja”). Os têrmos do mandato,
ou das instruções, ou as circunstâncias podem estabelecer o dever de prestação periódica de contas, o que se há
de entender se os atos são sem ligação entre si, pôsto que resultem de cumprimento do mesmo contrato de
mandato (e. g., venda de três prédios, cada um ao seu preço). Se termina, antes de execução, a relação jurídica
de mandato, as contas devem ser prestadas imediatamente e entregue ao mandante o bem que fôra confiado ao
mandatário, com as acessões e as pertenças. O mandante tem o ônus de provar o conteúdo do mandato e das
instruções, bem como a entrega de meios para a execução do mandato.
O dever e a obrigação de prestar contas transmitem-se aos herdeiros e demais sucessores do mandatário. O
direito e a pretensão, aos herdeiros e sucessores do mandante. O fato de haver conta em banco, de que o
mandante retire, por meio de cheques, ou por outro meio, o que foi depositado, não é quitação, nem aprovação
dos atos do mandatário, mesmo se o mandatário faleceu (sem razão a 63 Câmara Civil do Tribunal de Justiça de
São Paulo, a 2 de outubro de 1958, R. doa 2’., 218, 261).
Se, com a revogação do mandato, ou a denúncia cheia, houve ato ilícito do mandante, responde êle por perdas e
danos (l.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 22 de março de 1943, 1?. dos T., 147, 123).
Se não há contas a prestar, não há dever de prestá-las. Mas o fato de ter havido contas e não haver saldo não
exclui o dever. Discute-se se pode ser dada quitação prévia. A 23 Turma do Supremo Tribunal Federal, a 26 de
novembro de 194& (1?. F., 109, 891), respondeu que sim, por haver doação; mas, advirtamos, é preciso que

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haja elementos para se entender que houve doação.


Desde que houve início de cumprimento do mandato, há dever de prestar contas (6Y Câmara Cível do Tribunal
de Apelação do Distrito Federal, 12 de abril de 1946, II. E’., 111, 430). Se o mandante dispensou a prestação de
contas, dizendo que “perdoava a dívida”, tem-se de verificar se podia doar e quanto doou (sem razão, a 5•a
Câmara Cível, a 17 de outubro de 1941, 88, 470; com razão, o voto vencido do Desembargador CÂNDIDO
LÓBO).
A quitacão, prévia ou não, pode ser atacada por nula, ou anulável (e. g., por simulação, 1•a Câmara Cível do
Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, 8 de agôsto de 1941, A .J., 63, 67), pois que se trata de ato jurídico
stricto sensu (Tomo II, ~ 159, tabela).
Diz o Código Civil, art. 1.302: “O mandatário não pode compensar os prejuízos a que deu causa com os
proveitos, que, por outro lado, tenha granjeado ao seu constituinte”.
A fortiori, não pode o mandatário compensar os prejuízos a que deu causa com os favores e gentilqzas que dêle,
ou por influência dêle, ou devido a êle, tenha recebido o mandante (5.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação
do Distrito Federal, 2 de julho de 1940, A. J., 56, 202).
No art. 1.303 do Código Civil, estatui-se: “Pelas somas que devia entregar ao mandante, ou recebeu para
despesas, mas empregou em proveito seu, pagará o mandatário juros, desde o momento em que abusou”.
Os interesses começam de fluir desde que o mandatário inverteu o dinheiro, ou outro bem que pertença ao
mutuante, e não desde a interpelação judicial, à parte ou incluída na citação judicial (5.~ Câmara Cível do
Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 13 de janeiro de 1942, A. J., 62, 351; 29 Grupo de Câmaras Civis do
Tribunal de Justiça de São Paulo, ‘7 de outubro de 1948, R. dos 2’., 177, 607). Se o mandatário deixa de
inverter os bens conforme o mandante disse nas instruções, infringe o contrato e responde por perdas e danos.
Se deixou de depositar a juros, a indenização é do
valor dos juros. Se deixou de inverter em ações, o dos dividendos, das bonificações, do valor dos direitos de
subscrição e de quaisquer outros proveitos.
O mandatário tem de transferir ao mandante “as vantagens provenientes do mandato, por qualquer título que
seja” (Código Civil, art. 1.301). Vantagens do mandato, diz a lei. Portanto, o que resultou do mandato, o que
adveio por causa do mandato, e não in occasione. Se o preço do bem para ser vendido sutiu, tem de ser entregue
ao mandante aquilo que foi recebido. Se o preço, que baixou, foi o do bem que se havia de comprar, a sobra é
devolvida ao mandante. Se, em vez disso, o mandatário recebe prêmio do terceiro, pelo número de negócios
que com êle fêz, não é devido ao dono do negócio o que recebeu. Idem, se o que o terceiro prestou, fora do que
se estipulara para o interesse do mandante, foi em ato de amizade, de caridade (SGHMIDT-RIMPLER, em V.
ERRENHERO, Handbuch des gesammten Handelsrechts, V, 1, 685), ou de agradecimento por ter o mandatário
cuidado espontâneamente, ou não, de atos que ao terceiro cabiam para que o negócio se concluísse, e. g.,
pagamento de impôsto de transmissão da propriedade imóvel, se o terceiro foi o adquirente. Cf., em geral, C. 5.
GRÚNHUT (Das Reeht des Kommissionshandels, 240 s.). Se foram muitos os negócios, de diferentes pessoas,
incluído o mandante, e o terceiro fêz abatimento, devido a essa preferência que lhe tributou o cliente
mandatário, tem-se de examinar cada espécie: a) Se o abatimento foi somente quanto ao último negócio,
embora levada em consideração a plurali~ dade de negócios, e o negócio não foi o do mandante, estt~ afastado
que possa ter o mandante direito a êsse beneficio. 74 Se o último foi o negócio do mandante e não há qualquer
alusão à pluralidade de negócios, o mandatário tem de remeter ao mandante o que sobrou; se há alusão, só tem
o dever de remessa de parte do abatimento, proporcional ao todo dos negocios que o mandatário concluiu com
o terceiro, por conta <lo mandante. Aí, a vantagem foi tôda obtida na própria execução do mandato.
Se o terceiro admitiu ou ofereceu melhor negócio do que aquêle que o mandante previa, a êsse tocam tôdas as
vantagens (menor preço, se comprador; maior preço, se vendedor; maior prazo para pagamento, ou menor para
recebimento). Cf. Código Comercial alemão, § 387; para o direito francês, FERNAND DERRIDA (Le Contrai
de Commission, 11).

5.CLÁUSULA ISENTIVA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. No direito brasileiro, não há regra jurídica escrita
sobre a validade ou a invalidade da cláusula ou do pacto que dispense ao mandatário a prestação de contas.
Passa-se o mesmo no direito alemão; e a solução interpretativa da lei, reveladora de regra jurídica não-escrita, é
no sentido da validade (SCHMIDT-RIMPLEE, em V. EHRENBERG, Handbuch des gesammten
Handelsrechts, V, 1, 761). Se foi estipulada soma global para despesas, de jeito que se interprete como
prestação fixa, que não pode ser excedida nem diminuída, dispensadas estão a prestação de contas e a própria
exibição de documentos. Contra a cláusula à for .fait, radicalmente, ARTHUR NUSSBAUM (Tatsacken uM

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Begriff im deutschen Kommi.ssionsreeht, 48 s.) ; mas a solução não pode ser a priori. O contrato de mandato
pode conter cláusula de despesa predeterminada, ou ser com a cláusula despesas até tanto, ou a cláusula sendo
tanto para tal.
Cumpre que se não confundam com as cláusulas de ~restricão ou as cláusulas de margem determinada (“não
podendo exceder de x as despesas de expedição”, “até o preço de x”> as cláusulas em que se predestina x para
as despesas pessoais do mandatário (hotel, transportes), ou as despesas de exposição para grande clientela. O
que importa é a vontade dos figurantes (C. 5. GRÚNIIUT, Das Redil des Kommissionshandeis, 275 s.).

A cláusula de dispensa de prestar contra não pré-exclui a alegabilidade do inadimplemento de algum dever do
mandatário por dolo.
Nem a onerosidade, nem a gratuidade são características do mandato. O mandato é, dispositivamente, gratuito,
se de direito civil; dispositivamente, oneroso, se de direito comercial. É contrato “indiferente” (Luím
CARlOTA-FERRARA, Gratuità ?lel ncgocii di garanzia, 13 5.; 11 Negocio giuridico, 284).
§ 4.688. Deveres e obrigações do mandante

1. PROVISÃO DE FUNDOS. Se, para o desempenho do mandato, precisa o mandatário de fundos, com que
satisfaça as despesas do mandato, tem o mandante o dever de provê-lo do necessário, nos têrmos do contrato,
ou das instruções, ou conforme as circunstâncias e usos (dever de provisão do mandato). Se o mandante se
recusa a prestá-lo, o mandatário ou provisôriamente se abstém de cumprir o mandato, comunicando-o ao
mandante, se tal atitude não era de se lhe prever, ou exerce contra o mandante a ação de provisão do mandato
(PAUL OERTMANN, Das Recht der Schuldverhãlínisse, 792; CARL CROME, System, II, 618; L.
ENNECCERUS, Lehrbuch,, II, 530, nota 1; contra, mas sem razão: E. KOBER, 1. v. Staudingers Kommentar,
II, 2, 1275; E. GOLDMANN-L. LILIENTIL&L, Das liuirgerliche Gesetzbuck, 1, 698; F. ENDEMANN,
Lehrbuch,, 1, 8~a~9•a ed., 1086, nota 22), ou adianta o necessário aos gastos, para o exigir, depois, ao mandante.
O ônus de alegar e de provar que fêz a provisão incumbe ao mandante; o de alegar e provar o adiantamento, ao
mandatário .
Se o adiantamento, a que se refere o art. 1.311 do Código Civil, foi em bens não pecuniários, o percentual é
calculado sobre o valor dos bens antecipadamente prestados. O art. 1.811 não é de invocar-se se houve cláusula
“à forfail”. Aí, a incidência foi pré-eliminada, pois jus dispositivum é o art. 1.811.

2.EFEITOS DOS ATOS DO MANDATÁRIO. Os atos praticados pelo mandatário, dentro dos poderes do
mandato, são atos do mandante (Código Civil, art. 1.809: “O mandante é obrigado a satisfazer tódas as
obrigações contraídas pelo mandatário, na conformidade do mandato conferido, e adiantar a importância das
despesas necessárias à execução dêle, quando o mandatário lho pedir”). Pode dar-se que o mandatário haja
assumido, em seu próprio nome, algum dever, para executar o mandato; então a êle é obrigado o mandante, na
razão do que era necessário à execução do mandato.
Surge a questão de se saber se, quando o mandatário exerce o mandato, é preciso que declare fazê-lo em nome
de outrem e por conta de outrem, ou se basta a vontade, que se manifesta, e. g., pela coincidência entre o ato de
gestão prometido e o ato que êle pratica. A corrente mais forte dispensa a declaração e satisfaz-se com a
congruência entre o ato de gestão praticado e o prometido.

3. REMUNERAÇÃO. Se o mandato é remunerado, “é obrigado o mandante a pagar ao mandatário a


remuneração ajustada e as despesas de execução do mandato, ainda que o negócio não surta o esperado efeito,
salvo tendo o mandatário culpa” (Código Civil, art. 1.810).
Só existe o dever de remunerar se foi negocialmente criado, inclusive se resulta de ter o mandatário a qualidade
a que se refere o art. 1.290, parágrafo único, do Código Civil, ou se há de incidir o art. 154 do Código
Comercial. Se cabe a remuneração e não foi dito qual o importe, atendem-se os usos locais, as tarifas
profissionais ou o arbitramento judicial, ou
o laudo arbitral. O lugar é o da execução do mandato. Idem, quanto às tarifas profissionais, salvo se o
profissional se deslocou para exeqúir o mandato.

4.SOMAS ADIANTADAS. Diz o Código Civil, art. 1.311:


“As somas adiantadas pelo mandatário, para a execução do mandato, vencem juros, desde a data do
desembôlso”. E o Código Comercial, art. 154: “O comitente é obrigado a pagar ao mandatário tôdas as despesas

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e desembolsos que êste fizer


-na execução do mandato, e os salários ou comissões que forem devidos por ajuste expresso, ou por uso e
prática mercantis do lugar onde se cumprir o mandato, na falta de ajuste”. E o art. 155: “O comitente e o
mandatário são obrigados a pagar juros um ao outro reciprocamente: o primeiro pelos dinheiros que o
mandatário haja adiantado para cumprimento de suas ordens, e o segundo pela mora que possa ter na entrega
dos fundos que pertencerem ao comitente”.
O art. 1.809, 2Y alínea, do Código Civil é jus dispositivuin.
O mandante também tem o dever de prestar ao mandatário o que cubra as despesas que êsse já fêz, no próprio
nome, ou no do mandante, para exeqüir o mandato, bem como o que seja necessário para adimplir os deveres
que, no próprio nome, assumiu. Os meios para tal reembôlso ou antecipação ou adimplemento podem ser
pecuniários ou não .
O mandatário que despendeu para o adimplemento do mandato despendeu pelo mandante. O que êle despendeu
sem Ler incluso no seu encargo não está sujeito ao art. 1.309, 2~a alínea, do Código Civil. Aí, o dever é
principal, e não acessório (cf. ANGELO FALZEA, L’Offerta reale e la Liberazione coattiva del debitore, 77
s.).

5.PERDAS E DANOS. O mandante tem de ressarcir ao mandatário as perdas que êsse não teria sofrido se não
houvesse aceito o mandato, uma vez que não tenha havido culpa do mandatário (L. 26, § 6, D., mandati veZ
contra, 17, 1; Código Civil francês, art. 2.000).
Pergunta-se se o mandatário que sofreu perda fortuita ao adimplir deveres do mandato tem direito à indenização
contra o mandante. A resposta dependia, sem dúvida, da inteligência do texto de PAULO (L. 26, § 6). A
discussão entre glosadores e comentadores foi grande, inclusive na Alemanha, na França e na Suíça. A solução
certa é a de se reputar responsável o mandante, salvo se o mandato conferido, em si, acarretava risco, ou
acarretava riscos, que o mandatário conhecia e se há de entender que assumiu (cf. E. 11. KADEN, Des pertes
fortuites des mandataires, Mélanges SAUSER-IIALL, 22 s. e 35 s.). Aliás, a responsabilidade do mandante é
contratual, pela suportação do risco (cp. A. PEZZANA, Note esegetiche in tema di rischio contrattuale nel
mandato, Ruíletino dell’Istituto di Diritto Romano, 59-60, 213-228, que pretende não ser contratual a
responsabilidade), o que então permitiria a assunção pelo mandatário.
É preciso que haja a relação de causalidade entre o adimplemento dos deveres do mandatário e o dano que êle
sofreu. Se o mandatário, sem necessidade, se expôs a riscos, não é ressarcível. Aliás, também não são
reembolsáveis as despesas que o mandatário fêz, adiantadamente, sem serem necessárias.

§ 4.684. O mandatário nas relações com terceiros

1.CONTRATOS E ATOS FUTUROS. O mandatário está autorizado, por fôrça do poder outorgado para o ato
de que se trata, à prática de todos os atos e entendimentos que sejam necessários à execução do mandato. O
terceiro pode exigir-lhe a apresentação do instrumento do mandato, entendendo-se que o mandante lhe impôs
tal dever de apresentação com tempo para o bom desempenho do mandato (Código Civil, art. 1.305:
“O mandatário é obrigado a apresentar o instrumento do mandato às pessoas, com quem tratar em nome do
mandante, sob pena de responder a elas por qualquer ato, que lhe exceda os poderes”).
A falta de apresentação é sem consequências para a existência, validade e eficácia do ato em que o mandatário
figurou, se não houve exceSSO de poderes. Se não houve apresentação e o mandatário excedeu os poderes, tem
ação contra êle o terceiro, ainda que o mandatário não haja prometido ratificação (arg. ao art. 1.306, verbis
“depois de conhecer os poderes do mandatário”). Lê-se no art. 1306: “O terceiro que, depois de conhecer os
poderes do mandatário, fizer com êle contrato exorbitante do mandato, não tem ação nem contra o mandatário,
salvo se êste lhe prometeu ratificação, ou se responsabilizou pessoalmente pelo contrato, nem contra o
mandante, senão quando êste houver ratificado o excesso do procurador”. O?. arte. 929 e 1.296-
O terceiro sabe que o mandatário somente responde, pessoalmente, se excedeu os poderes, sem lixo dizer, ou se
há dolo, ou culpa sua, em ter aparentado poderes ou instruções que nao tinha (ei. 6.~ Câmara Civil do Tribunal
de Justiça de São Paulo, 81 de outubro de 1952, R. dos T., 207, 225). Quando o ad. 1.805 do Código Civil fala
em apresentar instruções, em verdade alude ao instrumento do mandato, a qualquer documento que dêle faça
parte, ou a que êle se refira, e às instruções e alterações às instruções.
No mesmo sentido, o Código Comercial, art. 151: “Havendo contestação entre um terceiro e o mandatário, que
com êle contratou em nome do comitente, o mandatário ficará livre de tôda a responsabilidade apresentando o

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mandato, ou ratificação daquele por conta de quem contratou”.


Se o terceiro sabia que o mandatário não tinha os poderes, de que usou, ou os não tinha suficientes, o mandante
não é responsável, salvo até onde iam os poderes (7.8 Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal,
6 de abril de 1948, A. J., 97, 71).

2.ATUAÇÃO DO MANDATÁRIO. O mandatário, pois que tem poder de representação, ou outro poder, há de
obrar em nome do mandante (Código Civil, art. 1.28S, verbis “em seu nome”), ou pelo mandante. Pode dar-se
que obre no seu proprio, ocultando os poderes de representação, ou outro poder. Diz o Código Civil, art. 1.307,
alíneas 1a e 2.a: “Se o mandatário obrar em seu próprio nome, não terá o mandante ação contra os que com êle
contrataram, nem êstes contra o mandante. Em tal caso, o mandatário ficará diretamente obrigado, como se seu
fôra o negócio, para com a pessoa, com quem contratou”. O direito comercial discrepa (art. 149) : “O comi
tente é responsável por todos os atos praticados pelo mandatário dentro dos limites do mandato, ou êste obre em
seu próprio nome, ou em nome do comitente”; no art. 150:
“Sempre que o mandatário contratar expressamente em nome do comitente, será êste o único responsável;
ficara, porém, o mandatário pessoalmente obrigado se obrar no seu próprio nome, ainda que o negócio seja de
conta do comitente”. Todavia, se houve falta de poder, ou excesso de poder, os princípios são os mesmos para o
direito civil e para o comercial (Código Comercial, ad. 163: “Quando um comerciante sem mandato, ou
excedendo os limites dêste, conclui algum negócio para o seu correspondente, é gestor do negócio segundo as
disposições da lei geral: mas, se êste fôr ratificado, toma o caráter de mandato mercantil, e entende-se feito no
lugar do gestor”).
Se o mandatário atua em nome próprio, quer em negócio jurídico, quer em outro ato jurídico, nenhuma relação
jurídica se estabelece entre mandante e terceiro. Figurante é o mandatário, e não o mandante. No direito
comercial, estabelece-se a responsabilidade do mandante, se o mandatário não excedeu os poderes.
O mandante, se o mandatário agiu em nome próprio, tem contra êsse direito, pretensão e ação à transferência
dos efeitos do ato que se praticou em nome do mandatário.
O contrato de mandato pode conter cláusula sobre a atividade do mandatário em nome próprio, quer a respeito
de todo o objeto do mandato, quer a respeito de algum ou de alguns elementos. Não há regra jurídica
dispositiva, nem cabe, nessa matéria, qualquer presunção inris tantum. Decide o contrato, levadas em
consideração as circunstâncias (H. STAUB, Kommentar zum Handeisgesetzbuck, II, 2, 11•a ed., 1259; H.
LEHMANN, em A. DÚRINGER-M. IIACHENBURG, Das Handeisgesetzbuoh, V, 2, 5•a ed., 668), a despeito
de dizer-se, no art. 1.288, que há mandato quando alguém exerce poderes de outrem, para, em seu nome,
praticar atos, ou administrar interesses. Cf. também A. RAMELLA (Dei Contraito di Conto corrente, dei
Mandato, deila Commissione, 417). Se as palavras do instrumento e as circunstâncias deixam dúvida, há
presunção hominis de não se ter mandado que a atividade fôsse em nome do mandatário (C. 5. GRÚNHUT,
Das Recht des Kommissionshandels, 67).

8.ATUAÇÃO DO MANDATÁRIO EM NOME PRÓPRIO E TRANSMISSÃO DA PROPRIEDADE. Se o


mandato foi exercido em nome próprio, surgem os problemas da aquisição da propriedade, mobiliária ou
imobiliária, pelo mandante.
a) Quanto à propriedade mobiliária, tem-se de distinguir da propriedade mobiliária que se transfere sem registo,
ou outra ou outras formalidades, a propriedade mobiliária cuja transferência depende de registo, ou de outra ou
outras formalidades. Na primeira espécie, o mandatário adquire a posse própria e, pois, a propriedade para o
mandante e a posse imprópria, imediata, para si, ficando com o dever de fazer ao mandante a tradição dessa. Na
segunda espécie, o mandatário recebe a posse própria para o mandante e a posse imprópria, imediata, para si,
assumido o dever de registar em nome do mandante, ou de satisfazer outra ou outras exigências legais, para que
a transmissão da propriedade mobiliária se opere. No tocante à posse, se, em vez de receber o bem, o terceiro
havia ou há de expedi-lo ao mandante, a posse própria, mediata, foi ao mandante, em virtude do que se assentou
entre o mandatário e o terceiro quanto a êsse ponto, e a posse imediata toca ao mandante, ou ao terceiro,
conforme os têrmos do contrato ou as circunstâncias.
A propósito dos bens móveis, cuja transferência da propriedade não depende de registo, ou de outra ou outras
formalidades, tem-se dito que o dever de entrega pelo mandatário
é só de direito das obrigações, e daí afastarem-se a ação possessória e, a fortiori, a ação de reivindicação. Nos
sistemas jurídicos que não têm teoria da posse à altura da que se construiu no direito brasileiro, não surpreende

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a discussão, e compreende-se que haja perplexidade diante do art. 1.706, 1.& alínea, do Código Civil italiano
(“11 mandante puõ rivendicare le cose mobili acquistate per suo conto daí mandatario che ha agito in nome
proprio, salvi i diritti acquistati dai terzi per effetto deI possesso di buona fede”). No direito brasileiro, não se
precisa de tal regra jurídica, que, em sua generalidade, pode ser sem incidência justificada de lege ferenda. Na
doutrina italiana, discute-se qual o fundamento da regra jurídica: uns afastam que seja o da transferência direta
da propriedade (= do terceiro para o mandante), e. g., FRANCESCO FERRARA .íjunior (OU Imprenditori e le
Societá, 2•a ed., 68 s.) e Luxor CARRARO (II Mandato ad aliendre, 9), e entendem que há transferência, ex
lege, da propriedade, do mandatário ao mandante (também, Luíci MENOONI, L’Ao quisto “a non domino”, 4 e
42; ARTURO DALMATEILO, La Prestazione nell’obbligazione di dare, Rivista Trimestrale di Diritto e
Procedura Civile, 1, 220) e há quem pense em rei vindicatio utills (LuiGi FERRI, recensão do livro de LUIGI
CARRARO, Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, II, 377).
Não há, no direito brasileiro, a regra jurídica escrita sobre a ação de reivindicação, de jeito que seria absurdo
pensar-se em transferência ex lege. Se o mandatário adquiriu em nome próprio e o terceiro se vinculou a
remeter ao mandante, o que se há de decidir é que houve a transferência da posse própria, mediata, ou plena,
conforme o que se passou no tocante ao terceiro. Se o mandatário adquiriu em nome próprio, mas comunicou
ao mandante a operação, ou procedeu de modo a ter o mandante ciência do ato por sua conta, a posse própria
foi transferida ao mandante. Telegrama ao mandante (por exemplo) em que o mandatário diz: “amanhã fecho o
negócio, pode contar com o prédio”, tal manifestação de vontade, que está inserta na comunicação de vontade e
do fato futuro, induz que a posse própria, mediata, é adquirida pelo mandante, embora 1~aja o mandatário
obrado em nome próprio e recebido a posse imprópria, imediata.

Mesmo em direito fiscal, o mandatário, que revela para quem adquire, embora o faça, perante o terceiro, em
nome próprio, não se supõe proprietário intercalar, mas o que é:
mandatário. Se a nota dá o seu nome, sem qualquer referência a mandato, o Estado, que é terceiro, pode alegar
a ineficácia relativa da operação por conta de outrem. Daí poderem surgir, com as circunstâncias, questões
delicadas, mais quaestiones facti do que quaestiones virís.
b)Quanto à propriedade imobiliária, o mandatário tem o dever de providenciar quanto a todos os pressupostos,
de direito material ou de direito formal, de direito privado ou de direito público, para que haja a transmissão ao
mandante. Quanto a credores do mandatário ou outros interessados em que a propriedade ou o direito a adquiri-
la se considere do mandatário, o mandato pode ser oposto, se tem eficácia erga omnes, ou, pelo menos, contra o
interessado ou contra os interessados.
Se o mandato é para alienar em nome próprio, há problema sutil, mas de alcance prático: ~ Como se opera a
transferência da propriedade ao terceiro? tÉ entre o mandante e o terceiro, ou entre o mandatário e o terceiro?
Se se nega que se possa transferir o poder de disposição, a transmissão da propriedade é entre o mandante e o
terceiro, a despeito de ter sido em nome próprio o negócio jurídico. Mas a outorga do poder de disposição não é
transferência, de modo que cai por terra o argumento de que, se o mandato pudesse conter poder de disposição,
perderia o mandante o conteúdo do direito de propriedade. Há, aí, confusão entre outorga de poder de
disposição que é revogável, inclusive tàcitamente, e transferência do poder de disposição, que é dis~posiçõ~o
do poder de disposição. Se o titular do direito tem o poder de dispor, o que é o normal, pode dispor ou outorgar
o poder de dispor. Por vêzes, o sistema jurídico permite que a outrem que não o titular do direito caiba o poder
de dispor; então, o titular não pode dispor, nem outorgar o poder de dispor. Cf. Tomo XXXIX, §§ 8.846, 5,
8.848 e 8.849. A respeito, cumpre lembrar a tentativa de explicação, abstrusa, que pretendeu dar à transferência
da propriedade, em caso de mandato em nome próprio, LUIGI CARRARO (Ii Mandato ad aiienare,
9, 44, 82 e 94), um tanto na esteira de FRANCESCO SANTORRO
-PÂSSARELLI (Tradizione e potere di disposizione nel contratto estimatorio, Rivista di Diritto Civile, 1949, 1,
174 s.). Não se preclsa atribuir eficácia real ao mandato para se adquirir bem môvel não registrado: o poder
para o acôrdo de transmissão, quer como outorgante, quer como outorgado, é que tem tal eficácia, uma vez que
se transmita ou se adquira a posse. O mandatário não adquire a posse própria, nem a propriedade, de modo que
passem, automàticamente, ao mandante; adquire, de ordinário, a posse imprópria. Se o mandato é para alienar,
tal mandato é para o negócio jurídico de direito das obrigações e para o negócio jurídico de direito das coisas (=
para o acôrdo de transmissão). Se o mandatário não tem tais poderes e vende e acorda em transmitir, é ineficaz
o que manifestou. Se os tem, pode vender e transmitir a propriedade, não por ser titular do direito de
propriedade, mas por ter o poder (outorgado) de dispor. Tais considerações respondem ao que escreveu LUIGi
CARRARO. Por outro lado, as considerações de LUIGI MENGONI (L’Acquisto “a non domino”, 38 e 54) são,

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em parte, verdadeiras: a ratificação pelo dono, no caso de gestão de negócios alheios com outorga, mesmo se o
gestor cria que era próprio o negócio, é fonte de legitimatio supervenie’ns; a outorga do poder de dispor é como
a anteposição do que, na ratificação, se pospôs. Cf. A. GIORDANO (Tradizione e potere di disposizione nel
contratto estimatorio, Rivista dei Diritto Commerciaie, 47, 174 sj, que frisa haver só poder de vender, se o
vendedor não tem o poder de disposição, e haver outorga de poder de disposição, em nome próprio.
De modo nenhum se há de exigir, para a construção da transferência da propriedade através do mandatário que
a êle passe, pelo menos no momento em que se aliena, o direito de que se trata. Donde ser inadmissível a
opinião de LUIGI CARRARO, com a alusão a suporte fáctico complexo (contrato de mandato e execução da
parte do mandatário). Execução de poder não vai além do poder. Não há “situação fiduciária” do mandatário.
Ésses artifícios perturbam a exposição científica. Se o mandante somente deu poderes, por exemplo, para o
contrato de compra-e-venda e não os poderes para a transferência, o mandatário não os tem. Nas escrituras
públicas de procuração a praxe dos tabeliães luso-brasileiros e brasileiros frisa bem que os poderes são “para
vender e transmitir”. A eficácia transiativa resulta do exercício do poder de transmitir propriedade e posse. Os
poderes do mandante, como dono, são os de contratar a compra-e-venda e os de alienar, o que êle exerce
respectivamente, com o contrato de compra-e-venda e com o acôrdo de transmissão. Tais poderes são
outorgáveis ao mandatário (negócio jurídico bilateral) ou ao procurador (negócio jurídico unilateral). Pode o
dono não outorgar êsses, como se só dá poderes para vender ou para concluir pactum de contrahendunz. Se o
proprietário vendeu e ainda não transimitiu o direito de propriedade, pode outorgar poder para o acôrdo de
transmissão do mesmo mandatário ou do procurador, ou a outra pessoa. (De passagem digamos que o art.
1.825, 2, do Código Civil italiano, sobre a causa, com a interpretação que lhe dão os juristas, é nota infeliz da
idade da doutrina.)
O mandante, no tocante à alienação, não transfere ao mandatário o poder de disposição. Outorga-lhe,
revogâvelmente , se não há afastamento da revogabilidade, o poder de disposição. O mandatário opera como
mandatário.
Se o mandatário tem poderes para alienar em próprio nome, o que êle faz é negocialmente eficaz, quanto ao
terceiro e quanto ao mandante. Se “alienou” em nome próprio, sem irem até aí os seus poderes, há a espécie do
art. 1.806 do Código Civil.
A outorga de poder para alienar em nome próprio é de poder que suscita a invocabilidade do art. 1.807 do
Código Civil. Não há transferência do poder de dispor, nem outorga em causa própria. Apenas o mandante se
põe, diante do terceiro, como se a sua figura não fôsse transparente: o mandante lá está, por trás do mandatário,
mas o mandatário foi pôsto, pelo mandante, para ser visto mais do que êle.

4.DIREITOS DE CREDITO E ADIMPLEMENTO DO MANDATO EM NOME DO MANDATÁRIO. O


terceiro, se o mandatário obrou em nome próprio, nenhuma relação tem com o mandante. Desde, porém, que se
dê a aquisição pelo mandante, o terceiro responde ao mandante, como sucessor do mandatário. Não há
transferência ex lege ao mandante dos créditos obtidos pelo mandatário em nome próprio. Se de ato com
eficácia contra terceiro, ou erga omnes, consta o mandato e a caracterização dos atos que o mandatário havia de
praticar, passa à frente dos direitos dos outros credores o direito do mandante.

5.CONTRATO DO MANDATÁRIO CONSIGO MESMO. O contrato em que o mandatário há de obrar pelo


mandante pode ser consigo mesmo (mandatário, como tal, e como o outro figurante), se o mandante o permitiu.
Não há, aí, a precisa figura do contrato consigo mesmo, que é aquêle em que a mesma pessoa é outorgante e é
outorgado, em que A é um dos figurantes e o outro (ou um dos outros). Se o mandatário exerce o mandato como
se êle fôsse, também, terceiro, o contrato não é de A com A, mas entre A, através do mandatário, e o mandatário
como se terceiro fôsse (uni-subjetividade).
Se não há permissão expressa para a conclusão do contrato entre o mandatário e o próprio mandatário, como
terceiro, podem as circunstâncias ou dados intrínsecos permitir tal vinculação. Quem dá mandato para vender
os objetos a, b e o pelos preços x, ij e z, não reputa relevante a figura do comprador. E vice-versa.
Casos há em que a uni-subjetividade é A + A, em vez de B, mandatário de A, ~ E. Cf. Tomos 1, § 91, 8; III, §§
ais e 319; XV, § 1.756, 8.
A permissão do contrato com o próprio mandatário assenta na presumida igualdade de resultados econômicos
para o mandante. Se o mandante tem interesse em que o terceiro seja de certo círculo social ou econômico,
como se tem por fito combater a concorrência desleal, e o mandatário não está dentro dêle, falta o elemento de
igualdade para se supor permitido contrato feito pelo mandatário consigo mesmo. É preciso, para que haja a

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permissão, que seja indiferente para o mandante ser o outro figurante terceira pessoa ou ser o outro figurante o
próprio mandatário.

§ 4.685. Atos do mandatário sem poderes suficientes

1.FALTA DE PODERES. No mandato, a pessoa que pode,~ por si, praticar o ato dá a outra o poder de o
praticar. Se o mandante não é o interessado, e só o é o mandatário, ou vice-versa, há conselho ou
recomendação, e não mandato .
O contrato supóe determinação suficiente dos poderes, pôsto que possa haver mandatum certum e mandatum
incertum (L. 3, § 1, L. 85, L. 46 e L. 48, § 1, D., mandativel contra, 17, 1). Se o mandatário excede os poderes
do mandato, não vincula o mandante. No § 8, 1., de mandato, 3, 26, diz-se que inútil a ação de mandato,
quanto ao excesso e quanto ao que cabia nos poderes, “mas outros (diversae scholae auctores) concederam-na,
até a concorrente quantia, isto é, quanto ao que cabia nos poderes, o que melhor solução pareceu”. No excesso,
por exemplo, da posse, o ato só prende o mandatário: é êle quem faz a fôrça, o espólio (MIGUEL DE
REINOSO, Observationes Practioae, 114: “Limita tamen principalem conclusionem in procuratore mandatum
excedente, quo casu contra eum competit interdictum unde vi, licet alias non competeret, si speciale mandatum
ad spoliandum ostenderet”; MANUEL ÁLvARES PÉGAS, Resolutiones Forenses, II, 851, que dá notícia de
julgado de 1661). Se o esbulho ou a turbação resultou do exato cumprimento do mandato, ou das instruções,
esbulhador ou turbador é o mandante. Mas ambas esbulham ou turbam se o mandatário sabia que o mandante
não tinha legitimação para o ato de posse, ou de tença, de jeito que se havia de dar esbulho ou turbação.

2.IMPUGNAÇÃO E RATIFICAÇÃO DE ATOS PRATICADOS SEM PODERES. Estatui o Código Civil, ad.
1.296: “Pode o mandante ratificar ou impugnar os atos praticados em seu nome sem poderes suficientes”. O art.
1.297 mais o caracteriza:
“O mandatário, que exceder os poderes do mandato, ou proceder contra êles, reputar-se-á mero gestor de
negócios enquanto o mandante lhe não ratificar os atos”. Nenhuma alusão à não-validade do que o mandatário
praticou, nem, tão-pouco, à inexistência do seu ato: o ato existe, e vale; não tem eficácia contra o mandante,
porque o não faz um dos figurantes, por falta de poder outorgado. Os arts. 1.296 e 1.297 apanham quaisquer
negócios jurídicos, inclusive contratos reais e acôrdos de direito das coisas (G. PLANCK, Kommentar, 1, 469;
PAUL OERTMANN, Allgemeiner Teu, 544) e atos jurídicos stricto sensu. Mandatário sem poderes é também o
que administra, em virtude de função pública, ainda putativa, interesses alheios, e o que pratica atos superiores
à fundação e personificação de sociedades.
Também se o mandato é para ato-fato jurídico, ou se o é para outros atos e para ato-fato jurídico, o caso é de
ineficácia.
Se há dúvida sobre a regularidade da outorga da procuração, ou do substabelecimento, a solução acertada, no
processo, seja judicial seja extrajudicial a procuração, é a conversão em diligência, para ser ouvido o dono do
negócio (cf. 6~a Cámara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 3 de setembro de 1948, 1?. dos T., 177, 314).
O art. 1.297 do Código Civil incide a propósito de qualquer procuração, inclusive da procuração em causa
própria.
Os atos dos membros da futura pessoa jurídica regem-se pelos arts. 1.296 e 1.297 do Código Civil. A lei
somente aludiu, aí, ao excesso de poderes; vale dizer: àqueles casos em que há mandato e o mandatário pratica
atos que não cabem no mandato. A respeito do que ultrapassa os poderes outorgados, o que o mandatário haja
concluído é ineficaz pró e contra o mandante; e ainda que o mandatário os haja excedido, de boa fé.

8.ATOS PRATICADOS COM EXCESSO DE PODERES. O excesso de poder não se confunde com o abuso
dos podéres de mandatário. Dá-se êsse quando o mandatário, conscientemente, usa os poderes, que tem, sem os
exceder, mas de modo tal que infrinja instruções ou a vontade do mandante. Tal indicação, explícita, ou
implícita, “instruída” ou não, do mandante, não interessa às relações jurídicas entre o mandatário e a pessoa
com que êle trate, mas, apenas, à relação jurídica entre êle e o mandante (Código Civil, art. 1.318). Nem a
pessoa, com que êle tratou, pode alegar o abuso do direito. Se houve excesso, ao mandante cabe argiji-lo, ou
ratificar o que foi excedente-mente praticado. A terceira pessoa é interessada na notificação do mandante. Diz o
art. 1.813: “Ainda que o mandatário contrarie as instruções do mandante, se não exceder os limites do mandato,
ficará o mandante obrigado para com aquêles, com quem o seu procurador contratou; mas terá contra êste ação
pelas perdas e danos resultantes da inobservância das instruções”. Se o terceiro, ou terceiros, conheciam o

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abuso, ou deviam, pelas circunstâncias, conhecer, podem ao deduzirem contra o mandante o que
abusivamente foi tratado (L. ENNECCERUS, Lehrbuch, 1, 461, que, sem razão, fala de exceptio
doU;
A.VON TUER, Der Allgemeine Teu, TU, 400, de nulidade, pela colusâ~o, conforme o art. 95 do
Código Civil) ser repelidos por ação de anulação, com fundamento no dolo (Código Civil, arts.
92-97).
Afasta-se do mandato quem pratica ato, para o qual o recebeu, diversamente do que queria o mandante. É de
PAULO (L. 5, § 1, 13., mandati vei contra, 17, 1) : “qui excessit, aliud qui facere videtur”. No Epítome
visigótico de GAIO (2, 9, 20) precisa-se: “si (is cui mandatur, mandati formam] egressus fuerit, et mandatori
teneatur obnoxius, et quod extra mandaizum egit, non praeiudicet mandatori”.
:0 que está fora do mandato excede-o. É extracontratual, extra mandatum. A gestão, para ser eficaz no tocante
ao mandante, há de ser ratificada, isto é, ser-lhe posterior a vontade do mandatário, que teria de ser anterior.
O ressarcimento do dano tem de ser feito sempre que, a despeito da regra jurídica do art. 1.296 (art. 1.306, 2Y
parte) do Código Civil, o ato do mandatário tenha efeitos contra o mandante (e. g., contrato concluído dentro
dos poderes da procuração, mas discordante do texto do mandato). Tal ress-arcimento do dano não se pode
confundir com o que resulta de ter o mandatário retardado o adimplemento do mandato ou ter deixado de
adimpli-lo (excelentemente, LEO RAAPE, Die Rechte des Mand.anten bei vertragswidriger Ausfúhrung des
Auftrags, Archiv fiir die civilistische Praxis, 141, 88 s.). Se E, o mandatário, que havia de vender a O, vende a
13, a venda é eficaz no tocante a A, mandante, pôsto que tenha havido infração do contrato de mandato. Se a D
se abre a falência, responde o mandatário pelos danos, se os houve. Em todo o caso, pode E, o mandatário, ter
prejudicado a A com o simples ato de vender a D, e não a C, se havia pactum de contraflendum entre A e C, o
que LEO RAAPE não previu.

4.TERCEIRO E ATOS PRATICADOS SEM PODERES. Se o terceiro não conhecia a falta de poderes do
mandatário e com êle concluiu negócio jurídico, até que chegue a ratificação, e ainda que tenha feito a
notificação provocatória, ~pode êle revogar o que manifestou de vontade? Não temos no sistema jurídico
brasileiro regra jurídica que permita a revogação enquanto o mandante não ratifica o excesso. Na L. 23 (24),
13., de negotiis gestis, 3, 5, lê-se: “Se eu der dinheiro a procurador, para que o entregue a credor, não é
adquirida certamente, por procurador, a propriedade. Mas pode o credor, ainda contra a minha vontade (etiam
invito me), ratificando (ratum habendo), fazê-la sua, pois o procurador, recebendo-o, geriu negócio do credor; e,
por conseguinte, libero-me com a ratificação do credor”. Por aí bem se vê que a solução do direito romano era a
vinculação do terceiro, quando contratava, ou praticava outro ato jurídico, ao dono do negócio, conhecesse, ou
não, a falta de poderes. Textualmente (PAULO) : “Si ego hac mente pecuniam procuratori dom, ut ea ipsa
creditoris fieret, proprietas quidem per procuratorem non adquiritur, potest tameu creditor etiam invito me
ratum habendo pecuniam suam facere, quia procurator in accipiendo creditoris dumtaxat negotium gessit: et
ideo creditoris ratihabitione liberor”. Sobre a autenticidade da L. 28 (24), Pn. MEYLAN (Por procuratorem
possessio nobis adquiri potest, Festsckrift ITANS LEWALD, 105 s.). Também na L. 65, § 8, O., pra socio, 17,
2, PAULO aplica princípio que supóe a x’inculaçâo. 0 mais em que se pode limitar a viucuiação é exclui-Ia, em
relação ao mandante, se o negócio não lhe interessa (assim, F. HELLMANN, Die Stellvertretung in
Recktsgeschãften, 119 s.) ; porém, aí, faltaria o pressuposto da gestão de negócios do mandante. Pretendia F.
REGELSBERGER (Die l7orverhandlungen bel VertrÉigen, 89) que o negócio jurídico fôsse somente com o
representante. Mas E. RUHSTRAT (Uber die adio negotiorum gestorum directa, Jahrbiicher flir die Dogmatik,
19, 279 s.), OTrrO KARLOWA (Das Rechtsgeschãft und seine Wirkung, 60), E. ZIMMERMANN (Die Lebre
vou der stellvertretenden Negotiorum Gestio, 188 s.) e L. MITTEIS (fie Lehre von der Stellvertretung, 218)
afirmaram a vinculação ao dono do negócio. No Código Civil alemão, inseriu-se o § 178 que permite ao
terceiro, ainda se notificou, provocatôriamente, o dono do negócio, revogar (ist... zum Widerruf berechtigt),
enquanto não se dê a ratificação, salvo se conhecia a falta de poderes , ao tempo do negócio jurídico.
Se o terceiro ignora a extensão dos poderes outorgados e o mandante alega excesso de poderes, sem que o
mandatário

possa provar o contrário, a ação é contra o mandatário (4.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito

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Federal, 30 de julho de 1940, R. F., 88, 752), pois o ônus da prova de ter havido exercício de poderes suficientes
incumbe ao terceiro. Isso é diferente, em todo o caso, do que resulta do art. 1.307 do Código Civil, se o
mandatário, em vez de obrar em nome do mandante, obra no seu próprio. Aí, não há mandante, ou peío menos
no ato jurídico com o terceiro não se cogitou de mandato, mesmo se existia. Nenhuma relação jurídica se
estabeleceu entre quem outorgou o mandato e o terceiro:
quem era outorgado, no mandato, se absteve de figurar, no contacto com terceiro, como tal; faltaria ao terceiro
legitimatio ad causam (cf. 2•a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás, 22 de maio de 1956, R. dos T.,
252, 609).
Os atos praticados com excesso de poder não são inexistentes nem são nulos (sem razão, a 3? Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, a 18 de fevereiro de 1952, 1?. dos 2’., 200, 177). São ineficazes em relação ao
mandante. Se há eficácia em relação ao mandatário, depende de indagar-se se a espécie cabe no art. 1.305, ou
no art. 1.306, ou no art. 1.307 do Código Civil.
“O mandatário”, diz o art. 1.305 do Código Civil, “é obrigado a apresentar o instrumento do mandato às
pessoas, com quem tratar em nome do mandante, sob pena de responder a elas por qualquer ato, que lhe exceda
os poderes”. A responsabilidade, aí, é ex iege, e não contratual:
resulta do ato do que representou sem ter poderes de representação, por se tratar de ato contrário a direito. Êsse
ato ou entra na classe dos atos ilícitos do art. 159, ou, se o mandatário estava de boa fé (= ignorava o excesso de
poderes), na classe dos atos objetivamente contrários a direito, não na classe dos atos-fatos jurídicos, de que
resulte indenizabilidade, ao lado, por exemplo, da indenização com base nos arts. 1.519 e 1.520 do Código
Civil (art. 160, 1 e II). Assim, quando o art. 1.305 fala de “responder” o mandatário, o conceito de
responsabilidade é unitário (= classe com um só elemento)
responde, seja culpado, ou não no seja; essa responsabilidade permite alternatividade, que consiste em cumprir
ou indenizar. 9 cumprimento é pessoal, e só se dá se a natureza do ato o permite, unia vez que, es hypothesi, o
representado não ratifica. A indenização é a dos danos que causou ao terceiro o ato excussívo, por não ter sido
eficaz quanto ao “representado” (~ tal como havia sido concluído). A responsabilidade do “representante” é
totalmente excluida, se a outra parte sabia, ou tinha de saber que faltava o poder de representação-É como se há
de entender o art. 1.306 do Código Civil:
“O terceiro, que, depois de conhecer os poderes do mandatário, fizer com êle contrato exorbitante de mandato,
não tem ação nem contra o mandatário, salvo se êste lhe prometeu ratificação do mandante, ou se
responsabilizou pessoalmente pelo contrato, nem contra o mandante, senão quando êste houver ratificado o
excesso do procurador”. Para a incidência do art. 1 206 é indiferente que o mandatário haja ignorado, ou nao. a
falta de poderes (O. WARNEYER, Kommentar. 1, 327). A culpa do mandatário em não ter havido a ratificação
não cria eYCCP io (úsrccption o) doU; porque o art. 1.306 é excludente da rusponsabilidade (o suporte fáctico,
desde o seu início, não se completou), e não criador de exceptio dou contra a qual fôsse oponível replicatio ou
exceptio exceptionis doU.
A responsabilidade, perante terceiros, do procurado independe do que possa haver de má fé, inclusive de crime,
no ato do procurador, se êsse não excedeu os limites expressos, gerais ou especiais, da procuração. O terceiro
tem dever de verificar se há os poderes e não se as instruções foram diferentes ou se o procurador comete ato
ilícito. Por isso, foi justa a decisão da 6? Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 25 de junho de
1954, que, para irresponsabilizar o procurado pelo pagamento de cheques que o procurador podia emitir, ter
frisado tratar-se, in casu, de portador de má fé, que conhecia o abuso do direito de emitir cheques para
pagamentos que estavam fora do interesse do procurado. Se de boa fé o portador, a solução seria diferente.
Se o procurador exerce a procuração duas ou mais vêzes, a despeito de só haver poder para um ato (e. g.,
vender a casa a), o segundo e os demais atos que pratique são atos de falso procurador, que expõe o procurador
à invocação das regras jurídicas sobre gestão de negócios alheios (cf. ta Câmara Civil do Tribunal de Justiça de
São Paulo, 24 de janeiro de 1950, E. t-los T., 185, 692) ; aí, das regras jurídicas do Código Civil, arts. 1.297,
1.332 e 1.338.

§ 4.686. Ratificação do excesso

1.EXCESSO DE PODERES E RATIFICAÇÃO . De ratificação fala, e bem, o art. 1.296, parágrafo único, do
Código Civil, porque representação houve, sem poder de representação, ou outro poder; portanto, falta o ato de
outorga, a dação do poder (manunidare). Se o mandante dá por outorgado o poder, o cálculo fica certo (ratum
vem de reor, vem, calcular) : o poder fica calculado, ratum. A manifestação de vontade é ao mandatário, ou ao

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terceiro. Os entendimentos para ratificação entre o mandante e o mandatário ainda não são ratificações; nem,
tão-pouco, os entendimentos entre o mandante e o terceiro. A ratificação não pode ser só em parte (aliter, em se
tratando de pluralidade de negócios jurídicos, ou outros atos independentes entre si), salvo se a outra parte
aceita. Permite-se, todavia, ratificação condicional; exceto se o mandante foi notificado para se manifestar
contra o excesso, ou pela ratificação, dentro de certo prazo, porque então a ratificação não pode ser condicional
(O. WARNEYER, Kommentar, 1, 322). A ratificação modificativa depende de aceitação do terceiro.
O Código Civil, art. 1.296, estatui: “Pode o mandante ratificar ou impugnar os atos praticados em seu nome
sem poderes suficientes”. O art. 1.296 apenas reproduz, quanto ao mandato, princípio geral concernente à
representação sem poder de representação. No parágrafo único, acrescenta: “A ratificacão há de ser expressa, ou
resultar de ato inequívoco, e retrotrairá à data do ato”. No Código Civil, art. 1.297, explicita-se:
“O mandatário, que exceder os poderes do mandato, ou proceder contra êles, reputar-se-á mero gestor de
negócios, enquanto o mandante lhe não ratifica os atos”. O art. 1.296, parágrafo ornei, não afasta a ratifica ção
tácita, quando fôr o caso de admitir.so; mas, na dúvida, ratificação não houve.
Quanto à ratificação, pensou-se em construir a situação criada pelo excesso do mandatário como oferta por
parte dêsse, de modo que a ratificação seria aceitação. O artifício é ressaltante. Se de algum instituto se
aproxima a atitude excedente do mandatário é da gestão de negócios sem outorga, que também teria de ser
explicada como oferta, como que a dinamitar-se a história do direito.
A exigência de inequivocidade da ratificação tácita é conteúdo de regra jurídica interpretativa: ato inequívoco é
o ato que tem um só sentido, sem qualquer dúvida. Resta saber (argúi-se) se, tendo havido ratificação tácita, por
ato inequívoco, se pode admitir tal prova a respeito de ato jurídico para o qual se haveria de exigir instrumento
público. Por exemplo:
comprou C, em nome de A, mas sem poderes, a casa; antes de A ratificar ou repelir a ratificação, toma posse da
casa e aluga-a, como dono, a D. Dir-se-á que há ato inequívoco, mas tanto não há que pode A ter ressalvado, no
instrumento do contrato de locação, o ganho de causa na ação, que vai propor, declaratória da não-existência de
poderes de O. A inequívocidade só existe se o ato é na mesma forma, pelo menos, que a do ato que exigia forma
especial. Fora daí, a apreciação judicial é que examinará os fatos e servirá para suprir a falta do instrumento
formalmente suficiente.
A ratificação parcial, sendo dois, ou mais, os atos praticados pelo mandatário sem poderes suficientes, só é
eficaz se os atos são separáveis.

2.RATIFICAÇÃO EXPRESSA E RATIFICAÇÃO TÁCITA. A ratificação pode ser expressa ou tácita. Não é
preciso que se lhe dê a forma que acaso só se exija ao negócio jurídico: a ratificação é da outorga de poderes;
não do negócio jurídico.

8.RATIFICAÇÃO E EFICÁCIA. Se o mandatário ratifica o negócio jurídico ou o ato jurídico síricto sensu (=
dá poderes após o uso dêles), o negócio jurídico, ou o ato jurídico síricto sensu, é eficaz quanto ao mandante,
ex tunc. Se recusa a ratificação, continua ineficaz o negócio jurídico, ou o ato jurídico stricto sensu, no tocante
ao mandante; pôsto que outro fato, o do enriquecimento, possa obrigá-lo ao ressarcimento (Código Civil, art.
964-971). Até que o mandante decida se ratifica, ou não, o negócio jurídico, ou o ato jurídico stricto sensu,
mandatário e terceiro estão vinculados, sem o poderem desfazer. Enquanto o mandante não decide, pode o
terceiro ou o mandatário notificar, provocatêriamente, o mandante, para que se pronuncie quanto à ratificação.
Então, só ao notificante provocante, ou aos notificantes provocantes, pode responder o mandante. A lei
brasileira não fixa prazo, nem diz qual a interpretação do silêncio eventual do mandante: ratificação, ou não-
-ratificação (aliter, o Código Civil alemão, § 177, alínea 2.~). A notificação provocatória (Aufforderung)
obedece ao art. 720 do Código de Processo Civil.

4.DENEGAÇÃO DA RATIFICAÇÃO E SUAS CONSEQÜÊNCIAS . Denegada a ratificação do negócio


jurídico, ou do ato jurídico stricto sensu, o mandatário responde àquele com quem tratou.
Tão-pouco, há responsabilidade quando o representante, em vez de afirmar que tem poderes suficientes,
comunica o que recebeu, ou os fatos, excluindo que a interpretação tenha de ser admitida por êle e pelo terceiro
(J. 1-IUPKA, Die Haftung des Vertreters ohne Vertretungsmaeht, 193 5.; PAUL OERTMANN, Allgemeiner
TeU, 546).

5.FALTA DE PODERES E EXCESSO DE PODERES. A responsabilidade é a mesma, se o representante não

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tem qualquer poder, em vez de somente não ter aquêle em que se excedeu, ou se a pessoa representada, por sua
incapacidade, não poderia dar poderes (e, se já capaz, não os dá), ou quando já extintos os poderes.
6.NULIDADE E FALTA DE PODERES. O negócio jurídico não pode gerar, se o representante não tinha
poderes, responsabilidade dêsse pela falta de poderes (O. WARNEYER, Kommentar, 1, 325), pêsto que seja
firmável no ato ilícito que acaso esteja à base da nulidade a responsabilidade delitual.
Se é caso de ser considerado figurante o representante, então responde êle porque está como um dos sujeitos no
negócio jurídico.
7.ALTERNATIVIDADE. A alternatividade, se o representante é obrigado à responsabilidade, obedece aos arts.
884 e 885 do Código Civil. No direito brasileiro, a escolha é do representante (devedor), e não do outro
figurante (aliter,o Código Civil alemão, § 179, alínea i.ft).
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§ 4.687. Falso nome e falso procurador
1.DEvERES E OBRIGAÇÕES CONTRAÍDOS COM FALSO NOME E FALSO PROCURADOR. O que
contrai dever ou obrigação, com falso nome, não é falso procurador. Não representou, falsa ou excessivamente,
aquêle cujo nome consta do ato jurídico; fingiu ser êsse cujo nome usou. Responde pela prática de ato ilícito
(Código Civil, arts. 159 e 160) ; não como quem procurou falsa-mente, ou com excesso (art. 1.305). Mas
vincula-se a si mesmo (sem razão, J. HUPKA, DL Ilaftnng des Vertreters oPine 1/ertretungsmacht, 111 s4.
Idem, se a pessoa, de quem se diz representante, não existe (G. PLANCE, Kornrnentar, ~, 4.~ ed., 476; J.
STRUCKSBERG, Handeln fúr nicht existente Personen, Leipziger Zeitsehrift, VI, 378) ; aqui, não só responde
o que usou do falso nome, pelo interesse negativo; vincula-se.

2.REPRESENTAÇÃO DE PESSOA xÁ MORTA. A representação de pessoa já morta é representação sem


poderes e responde o representante à pessoa com que tratou, se essa ignorava a morte (arg. ao Código Civil,
arts. 1.808 e 1.806). f~ indiferente se o representante sabia, ou não, da morte do representado. Se, porém, o
negócio já estava começado, e há perigo na demora, deve o mandatário conclui-lo; de modo que a vida do
representado só se exige ao ter-se iniciado o negócio. O mesmo há-se de entender no tocante à interdição ou
mudança de estado (viúvez, casamento). “Embora ciente da morte, interdição ou mudança de estado do
mandante, deve o mandatário concluir o negócio já começado, se houver perigo na demora” (Código Civil, art.
1.308). Considera-se subsistente o mandato até a terminação do negócio. No caso de morte do mandante, o
negocio e em nome dos herdeiros (O. PLANCK, Kommentar, 1, 476). Quanto ao processo, a intentação pode
ser segundo o art. 1.808 do Código Civil; a morte após a propositura é causa de suspensão da instância (Código
de Processo Civil, art. 197, III). As regras jurídicas do art. 1.816, II e TI!, do Código Civil, sobre extinção, são
cogentes, a despeito de não ser síricti luris o art. 1.808; no direito alemão, a regra de extinção por morte ou
interdição é ins interpretativum (Código Civil alemão, § 672).
Lê-se no Código Civil, art. 1.821: “São válidos, a respeito dos contraentes de boa fé, os atos com êstes
ajustados em nome do mandante pelo mandatário, enquanto êste ignorar a morte daquele ou a extinção, por
qualquer outra causa, do mandato (art. 1.816)”. A regra jurídica do art. 1.821 tem ligação, porém não decisiva, à
regra jurídica do art. 1.808, onde se diz que, embora ciente da morte, interdição ou mudança de estado do
mandante, deve o mandatário concluir o negá-. cio já começado, se houver perigo na demora. Se se estabelece a
situação de que se cogita no art. 1.308, os atos do mandatário são eficazes, mesmo se o terceiro conhecia a
extinção do mandato, O art. 1.821 tem incidência naquelas espécies em que o mandatário não poderia invocar o
art. 1.308.
Lê-se no Código Comercial, ad. 160: “A morte do emitente, ou a sua incapacidade civil não prejudica a
validade dos atos praticados pelo mandatário até que receba a notícia, nem também aos atos sucessivos que
forem conseqüência dos primeiros, necessários para o adimplemento do mandato”.

8.CÓDIGO CIVIL, ARTS. 1.816, II, E 1.818. As regras jurídicas dos arte. 1.316, II, e 1.818 do Código Civ! 1
também incidem: a) quando algum herdeiro, que devia entrar na posse corporal da herança, a repudia; b)
quando se extingue pessoa jurídica (E. SCHOLLMEYELt, Aligemeiner Teu, 125; II. DERNBURG, Das
B’Urgerliohe Reckt, II, 2, 458; sem razão: G. PLÂNCK, Kommentar, II, 671; PAUL OERTMANN,
Aligemeiner TeU, 798; L. ENNECCERTJS e II. LEMMANN, Lehrbueh,, II, 533, nota 5, que adotam a
insustentável opiniâo de que, de regra, se extingue o mandato). A infraçâo do dever de continuar ou levar a
cabo o negócio iniciado, cuja demora no concluir-se pode ser perigosa (art. 1.308), importa responsabilidade do
representante (OTTO WARNEYER, Kommentar, 1, 1.097). O dever só-mente cessa se o herdeiro, o

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inventariante, o tutor ou curador, ou a própria pessoa que mudou de estado, pode, por si, continuar e levar a
cabo o negócio iniciado, de acôrdo com as circunstâncias do caso (PAUL OERTMANN, Aligemeiner TeU, 799)
trata-se de regra lata (verbis “se houver perigo na demora”).

§ 4.688. Procurador só aparente

1.PROCURAÇÃO SÓ EM APARÊNCIA. A reserva mental de jeito nenhum atinge a existência ou realidade


do negócio jurídico ou do ato jurídico stricto sensu (Tomo III, § 815, 1; ALFRED WOLFF, Rechtsfolgen einer
zum Schein erteilten Vollmacht, 8 s.). Se o mandatário conhecia a reserva mental, não pode esperar efeitos da
procuração. Idem, se a reserva mental foi por parte do mandatário e o mandante a conhecia (cf. R.
LANDWERS, Abhãngigkeit der Vollmaoht von. ihrem Grundverhuiltnis, 1 s.). A reserva mental pode não
ocorrer a propósito da procuração, mas antes, a propósito do mandato, ou do negócio jurídico fundamental.

2.MANDATO só APARENTE E PROCURAÇÃO só APARENTE.


Se a manifestação de vontade do mandante foi proferida só em aparência, com a combinação com o
mandatário, ou vice-versa, é nenhum o contrato de mandato. Se foi aparente o mandato e outro negócio jurídico
com isso se ocultou, existe e vale o negócio jurídico ocultado. Entende-se o mesmo se está em causa ato
jurídico strictu sensu.

§ 4.689. Adiantamentos ao outorgado e desembolso pelo outorgado

1.DESPESAS DE EXECUÇÃO DO MANDATO. Diz o Código Civil, no ad. 1.809, 2? parte: “O mandante é
obrigado a adiantar a importância das despesas necessárias à execução dêle, quando o mandatário Iho pedir”. A
presença dessa regra jurídica, que dá pretensão ao adiantamento, ainda que se não haja convencionado, suscita
algumas questões de teoria geral do direito privado. Não há dúvida que o adiantamento supôe solução de
dividas Lituras. Ler-se o art. 1.309, 2~a parte, como se não atribuisse ao mandante o dever, seria ir-se contra a
letra da lei. Entendia A. VON TUHR (Der AUgemeine TeU, III, 69, nota 35) que o § 669 do Código Civil
alemão, que corresponde ao ad. 1.309, 2•a parte, apenas dá ao mandatário a faculdade de abster-se, enquanto o
mandante não lhe adianta pagamento de desembolsos. Também outros pensaram assim (e. g., E. ComMANN-L.
LILIENTEAL, Das BiirgerUohe Gesetzbueh, 1, 698; F. ENDEMANN, Lehrbuch, ~, 8A-9.~ ed., 1.086, nota
22) ; mas sem razào, por êrro de interpretação do texto legal. Há pretensão, e pretensão dotada de ação (G.
PLANCK, Kommentar, II, 3•a cd., 666; PAUL OERTMANN, Das Reoht der Schuldverhiiltfltsse, g•a ed., 792;
H. DERNBURG, Das Búrgerliche Rechi, II, 2, g~a ed., 456; L. ENNECCERUS, Lehrbuch, II, 81 a45a ed., 530;
e F. SCHOLLMEYER, Recht der einzelnen Sehvldve’rhtUtnisse, 2•a ed., 123). O mandatário, se não foi dito, no
contrato, quando e quanto lhe teria de entregar o mandante, tem de pedir que se lhe preste o que lhe parece
necessário (se há exagêro, fica à apreciação judicial, razão por que é de tôda a conveniência que o mandatário
fundamente o pedido, no que concerne ao quanto). Do não atendimento ao pedido nasce a ação, e não, como
parece a alguns, somente a causa para se revogar o mandato. Se o mandatário, depois de ter comunicado ao
mandante que precisa do quanto e de tê-lo pedido, não no obtém, pode ou abster-se de executar o mandato ou
prover aos gastos com meios seus, debitando ao mandante.

2.INADIMPLEMENTO PELO MANDANTE. Se o mandante não presta o que prevê o ad. 1.309, 2•a parte, do
Código Civil, fica livre ao mandatário adiar a execução. A prestação há de ser em dinheiro. O quanto
determina-se segundo a necessidade objetiva das despesas a serem feitas (PAUL OERTMÂNN, Das Recht der
Schuidverhilltnisse, 792). O ônus da prova de haver prestado por conta das despesas compete ao mandante.
8.ADIANTAMENTO E IMPUTAÇÃO. O que se prestou em virtude do Código Civil, art. 1.309, 2•a parte,
solve como prius:
as dívidas futuras vão sendo pagas à medida que nascem, ainda que delas não tenha notícia o mandante. Se no
contrato se prevê que se entrega x por conta, tal adiantamento é devido desde a data em que se havia de prestar,
e as dívidas futuras vão sendo extintas à medida que forem nascendo, por aplicação da verba por conta
(encontro de contas).

4.DESVIO DE APLICAÇÃO. Se o procurador aplica em seu proveito quantia que recebeu para determinado

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fim, ou para despesas da procura, incorre em mora desde o momento em que o faz ( 4,a Câmara Cível do
Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 14 de novembro de 1944, 1?. F., 102, 278), por tratar-se de ato ilícito
absoluto (Código Civil, art. 962). Não houve, aí, inadimplemento. ou adimplemento ruim. Houve apropriação
indébita (Código Penal, arts. 168 e 169). Não compõe a figura penal, nem a de direito privado, o depósito em
conta do procurador, com ou sem interesses, se não foi previsto ter conta aberta o outorgante.
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No art. 152 do Código Comercial está dito: “Se o mandatário, tendo fim dos ou crédito aberto do comitente,
comprar, em nome dêle mandatário, algum objeto que deverá comprar para o comitente por ter sido
individualmente designado no mandato, tora ele ação para o obrigar à entrega da coisa comprada”. Cf. Código
Civil, art. 1.301. A ação, aí, é pessoal, e não real, O mandante ou outorgante da procuração não chegou a ser
dono. Cabe aí, todavia, a ação cominatória (Código de Processo Civil, art. 302, XII). Em todo o caso, pode ter
sido transferida ao mandante a posse mediata própria, o que muda a situação.
Lê-se no Código Comercial, art. 153: “O comerciante, que tiver na sua mão fundos disponíveis do comitente,
não pode recusar-se ao cumprimento das suas ordens relativamente ao emprêgo ou disposição dos mesmos
fundos; pena de responder por perdas e danos que dessa falta resultarem”. A ação é a declaratória, ou a
condenatória, ou a cominatória.

5. DIREITO DE RETENÇÃO. “O mandatário tem sobre o objeto do contrato direito de retenção”, lê-se no
Código Civil, art. 1.315, “até se reembolsar do que no desempenho do encargo despender”. O direito de
retenção somente existe em se tratando de pretensão a reembôlso de despesas, e não quanto a remuneração, ou
salário, ou honorários (cf. g•a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 15 de janeiro de 1941, .1?.
dos T., 134, 145). O art. 1.315 é invocável quer a relação jurídica entre o outorgante e o outorgado seja de
locação de serviços, seja de locação de obra, seja de contrato de trabalho.
No Código Comercial, art. 156, também se diz: “O mandatário tem direito para reter, do objeto da operação que
lhe foi cometida, quanto baste para pagamento de tudo quanto lhe fôr devido em conseqúência do mandato”.
Sobre direito de retenção, principalmente, Tornos VI, §§ 628, 1, 4, 633, 4, 631, 3, 647, 2, 677, 3, 691, 7, 639, 1,
2, 8, 4, 5; X, §§ 1.061, 2, 1.118, 4; XIV, ~ 1,579, 4, XXI, §§ 2.622, 3, 2.627, 3; XXII, §~ 2.680, 7, 8, 2.683, 1,
2.731, 2, 2.734-2.789.
O art. 1.315 do Código Civil pode ser invocado, quer somente haja mandato, quer haja mandato e procuração,
quer somente haja procuração. O outro negócio jurídico, se existe,é que nada tem com a incidência do art.
1.315. Ou não admite a retenção, mas o direito de retenção pode ser exercido devido a despesas oriundas do
exercício do mandato ou da procuração; ou também a admite, e há dois direitos de retenção que são
independentes e podem ser exercidos simultâneamente.

CAPITULO IV

EXTINÇÃO DO MANDATO

§ 4.690. Causas de extinção

1.CÓDIGO CIVIL, ART. 1.315. Diz o art. 1.315 do Código Civil:“Cessa o mandato: 1. Pela revogação, ou pela
renúncia.
II.Pela morte, ou interdição de uma das partes. III. Pela mudança de estado, que inabilite o mandante para
conferir os poderes, ou o mandatário, para os exercer. IV. Pela terminação do prazo, ou pela conclusão do
negócio”. O mandato pode ser revogado, a qualquer momento, pelo mandante, se não é, excepcionalmente,
irrevogável. O art. 1.317, que é taxativo, enumera as espécies do mandato irrevogável: “1. Quando se tiver
convencionado que o mandante não possa revogá-lo, ou fôr em causa própria a procuração dada. II. Nos casos,
em geral, em que fôr condição de um contrato bilateral, ou meio de cumprir uma obrigação contratada, como é,
nas letras e ordens, o mandato de pagá-las. III. Quando conferido ao sócio, como administrador ou liquidante da
sociedade, por disposição do contrato social, salvo se diversamente se dispuser nos estatutos, ou em texto
especial de lei”.
As leis, por influência de tradição classificatória e terminológica, chamam revogacão ao que se poderia
conceber como denúncia vazia, por parte do mandante. Consequência: tem-se de considerar a eficácia do ato
como desconstitutívo do suporte fáctico, e não como desconstitutivo lo negócio jurídico ou da sua eficacía.

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A procuração pode ser revogada sem que o tenha sido o mandato, como pode ser revogado o mandato sem que
o tenha sido a procuração. Se a procuração é que, na espécie, importa apresentar-se, o que é quod plerum que
fit, o procurador só-mente está inibido de exercer os poderes, ou o poder, se a revogação do mandato implica
para êle a retirada dos poderes ou do poder que consta da procuração. Por exemplo:
se no texto da revogação se diz que “não pode mais o mandatário exercer qualquer dos poderes que lhe haviam
sido outorgados”; porque, aí, houve revogação implícita. Perante os terceiros, o que decide é a boa fé. Se o
terceiro estava de boa fé ao tratar com o procurador, tenha havido, ou não, revogação explícita ou implícita da
procuração, a eficácia da revogação não foi até êle. Cf. 2Y Câmara Civil do Tribunal de Alçada de São Paulo,
27 de junho de 1955: “Para ficar livre e exonerado de qualquer responsabilidade, portanto, incumbia ao
apelante tornar pública a revogação por todos os meios ao seu alcance, quer avisando ou notificando as pessoas
com quem comerciava, quer por intermédio de avisos ou editais da imprensa”. Daí a importância, às vêzes, dos
editais.
O mandato não revogável não é mandato com a obrigação, para o outorgante, de não o revogar. ~l,
objetivamente, irrevogável. A obrigação (o dever) de não revogar seria outro efeito, que não se confundiria com
o de irrevogabilidade. Quando o mandante ou o outorgante da procuração insere a cláusula de irrevogabilidade,
cessa o seu poder de revogar. Ser irrevogável não significa haver, para o outorgante, obrigação de não revogar.
Os que incorrem em confusão mergulham em passado que desconhecia a irrevogabilidade do mandato ou da
procuração. Sem razão, portanto, todos os julgados que pretenderam reduzir a irrevogabilidade à existência de
dever de não revogar. Quem insere cláusula de irrevogabilidade não assume dever e obrigação de não revogar:
não pode revogar. O seu ato de revogação seria como o de quem manifestasse a vontade de revogar a
manifestação de vontade que subscreveu em letra de câmbio, ou nota promissória, já emitida. Sem defesa
possível os acórdãos da g•a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 5 de dezembro de 1945 (E.
dos 1’., 161, 72), e da 2.~ Câmara Cível do Tribunal de Justica de Minas Gerais, a 1.0 de setembro de 1956.
Revogação é retirada da voz (revocatio). Se o mandatário já iniciou o exercício dos poderes, e talvez esteja a
ponto de terminá-lo, ainda assim é revogável o mandato, o que mostra que não se retira a voz, mas sim parte da
voz. O têrmo “denuncia~~ seria melhor, mas de algumas conseqUências um tanto diferentes.
A procuração, negócio jurídico unilateral, abstrato, só é irrevogâvel se nela há a cláusula de irrevogabilidade, ou
a cláusula de ser em causa própria. Aquela não atribui direitos; essa, sim.
O art. 188 do Código Comercial somente é invocável a respeito do mandato mercantil (art. 164). Cf. 1•a
Câmara Cível do Tribunal de Apelação da Bahia, 26 de setembro de 1944 <R. dos T. da Bahia, 86, 254).
A procuração pode ter sido revogada sem ter sido revogado o mandato, como pode ter sido revogado o mandato
sem o ter sido a procuração. Se, com o instrumento do mandato, o mandatário exerceu o poder, ou os poderes,
já estando revogados, o que importa saber-se, de início, é se, na espécie, era dispensável a procuração, ou se o
não era. Se o era, ainda se há de indagar se conhecia a revogação o mandatário, ou se não a conhecia. Depois,
se a conhecia o terceiro. A eficácia vai até onde há conhecimento da revogação. Não é eficaz, a respeito do
mandatário, a revogação de que não teve ciência; nem para o terceiro, aquela de que não foi conhecedor. Se,
para o ato, era indispensável a procuração, não há boa fé, quanto ao terceiro, se se satisfez com a apresentação
do contrato de mandato.
Nos arts. 1.816, 1, e 1.820 fala-se de “renuncia’. Renuncia-se a direito, a pretensão, ou a ação, ou a exceção, ou
a alguma vantagem. Trata-se de terminação de contrato, o que se chamou “renúncia” é, em verdade, “denuncia

2. REVOGAÇÃO DO MANDATO. Permite-se ao mandante retirar a voz, que dirigiu ao mandatário. Todo o
negócio jurídico vem abaixo, pela subtração do elemento volitivo ao suporte fáctico. A irrevogabilidade
negocial pode ter sido inserta, como cláusula, no contrato de mandato, e pode ser posterior, o que subordina o
pacto às exigências formais do mandato em que se conferiu o poder de gestão e às exigências para haver
eficácia contra terceiros. Resta saber-se se, revogável o mandato, como se há de interpretar a declaração de se
tornar irrevogável.
Alguns sistemas jurídicos reputam nula a renúncia ao direito de revogar e há juristas que a proscrevem em
qualquer caso (G. PLANCK, Komment ar, II, 670; PAUL OERTMANN, Das Recht der Schuldverhdltnisse,
797; 11. DERNBURO, Das Elirgerliche Reeht, II, 2, 457); outros, que a admitem em quaisquer casos (e. g., F.
SCHOLLMEYER, Recht der cinzeineu Schuldverhãltnisse, 124) ; outros, enfim, que só a excluem quando,
tratando-se de todo um patrimônio, ou de parte considerável dêsse, importa submissão imoral à vontade do
mandatário, ou há outro fundamento sério (L. ENNECCERUS, Lehrbuch, II, 582).
No direito brasileiro pode haver a cláusula de irrevogabilidade (Código Civil, art. 1.317, 1) ou o pacto posterior

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que exclua a revogação. Tal pacto somente não é admissível se ilícita ou impossível a irrevogabilidade (art. 145,
II). Há opiniões contrárias a tornar-se irrevogável o mandato revogável ao início (G. PLANCK, Komme’ntar, II,
670; PAUL OERTMANN, Das Recht der Schuldverãltnisse, 797; H. DERNEURG, Das Búrgerliche Recht, II,
2, 457, nota 1); mas a opinião acertada prevalece (E. MATTHIASS, Lekrbuch, 610; E. SCHOLLMEYER,
Recht der einzelnen Sohuldverhdltnisse, 124; W. IMMER.WAHR, Die Kiindigung, 169).
(a) A revogação é negócio jurídico; consiste em declaração unilateral de vontade receptícia. Nada obsta a que se
faça sob condição (PAUL OERTMANN, Recht der Schuldverhãltnisse, 798; L. ENNECCERUS, Lehrbuch, II,
582; O. WARNEYER, Komntentar, 1, 1095). “Tanto que fôr comunicada ao mandatário a nomeação de outro,
para o mesmo negócio, considerar-se-á revogado o mandato anterior” (Código Civil, art. 1.819).
(Em tôrno da palavra “revogação”, com referência ao mandato, tem havido críticas. Cf. DANTE CALLEGARI,
Ii Recesso unilaterale de! contratio, 82 5.; Lulai CARLOTA-FERRARA, Ii Negozio giuridico, 170. Tratar-se-ia
de “recesso”, em língua italiana; de denúncia vazia ou cheia, conforme a espécie. As leis empregam
“revogação”. O que mais importa é revelar-lhe o exato conteúdo conceptual, no caso do mandato.)
A revogação do mandato pode ser em manifestação de vontade de simples revogação, ou resultar de
comunicação de se ter constituído nôvo mandatário. Manifestação unilateral, receptícia, de vontade, ali e aqui,
a sua eficácia começa, para o mandatário, ao ser recebida; para o terceiro, ao ser-lhe comunicada (art. ~ 1a parte:
“A revogação do mandato, notificada somente ao mandatário, não se pode opor aos terceiros, que, ignorando-a,
de boa fé com êle tratavam”). O terceiro somente está incólume a que se lhe objete que já estava revogado o
mandato ao tempo em que tratou com o mandatário, se lhe foi comunicada a revogação, ou se êle a conhecia,
ou se devia conhecê-la (cf. PAULO, na L. 15, D., mandati vel contra, 17, 1: “Se te houvesse mandado que
comprasses fundo e depois te houvesse escrito que o não comprasses, e tu, antes que soubesses que to proibira,
o houvesse comprado, estarei obrigado pela ação de mandato, para que não sofra dano quem aceita mandato”).
Diz o Código Comercial, art. 158: “A nomeação de nôvo mandatário é sempre derrogatória” quis dizer:
“revocatória” “do mandato anterior, ainda que esta cláusula se não expresse no nôvo mandato”.
Para que a procuração revogue, tàcitamente, a anterior, é preciso que sejam os mesmos e relativos aos mesmos
interesses os poderes outorgados. Se os poderes de ambas são gerais, para o mesmo negócio, a posterior
revogou a anterior. Se são especiais, só há revogação total, ou parcial, se os poderes são os mesmos, ou se o são
alguns ou o é algum, sobre o mesmo negócio. Se a anterior era com poderes especiais e na posterior é geral,
êsse não abrange aquêles (cf. Código Civil, art. 1.295 e ~§ 1.0 e 2.0). Sem razão, aí, 5. DE M. (Manual prático
do Procurador, 1, 78). Se a posterior é que é com poderes especiais, a revogação ocorre quanto a êsses.
(b) Para eficácia contra terceiros, a revogação tem de ser notificada. Diz o Código Civil, art. 1.818: “A
revogação do mandato, notificada somente ao mandatário, não se pode opor aos terceiros, que, ignorando-a, de
boa fé com êle trataram; mas ficam salvas ao constituinte as ações, que no caso lhe possam caber, contra o
procurador.
No art. 1.818 do Código Civil fala-se de “notificação”. O têrmo foi empregado em sentido demasiado largo:
basta que tenha havido suficiente comunicação do ato de revogação. No art. 1.819 melhor está “comunicar”.
Não é acertado interpretar-se o art. 1.313 como se êle exigisse a “notificação” judicial sempre que se quer
eficácia da revogação do mandato (cp. Cámaras Cíveis Conjuntas do Tribunal de Apelação do Distrito Federal,
7 de agôsto de 1941, A. J., 59, 455, que aliás confununam revogacão e eficácia da revogação).
(e)Se a irrevogabilidade do poder de representação não resulta de alguma espécie como as do art. 1.317, II ou
III, resulta de declaração unilateral, receptícia, de vontade, ou de manifestação tácita de vontade, se aí cabe.
Não há princípio absoluto de faculdade de irrevogabilização. Daí: a) haver poderes de representação a respeito
dos quais é ineficaz a cláusula ou pacto posterior de irrevogabilidade, e. g., poderes institórios, ou se a
irrevogabilidade seria ilícita ou impossível; b) ter de haver razão para se fazer irrevogável poder de
representação, como ser no interesse do outorgado, e. g., procuração em causa própria, inclusive simples causa
donandi (sem razão, A. vON TUHR, ffie unwiderrufliche Vollmaoht, 54), ou em comum; e. g., para
administração de bem ou bens em condomínio ou para executar contrato em que têm de receber quotas o
outorgante e o outorgado; ou haver interesse do próprio outorgante, o que é raro, e. g., para tornar possivel
execução de acôrdo com os credores, para garantia de alguma conclusão de negócio, ou de solução de dívida,
ou para algum pormenor relativo à dívida (L. ROSENEERO, Stellvertretung im Prozess, 910), ou para
cumprimento de lei (e. g., para fazer alguma comunicação que a lei exige). A procuração ?fl rem suam pode não
ser irrevogável (cp. art. 1.317, 1, 2•a parte; L. ROSENEERO, Stellvertretnng im Prozess, 910) pelo princípio de
que o poder de representação pode ser outorga com faculdade da revogação, ainda que pudesse ser outorgado
com irrevogabilidade. O art. 1.817, 2•a parte, é ins dtspositivum.

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No Código Civil, art. 1.317, diz-se que o mandato é irrevogável se em causa própria a procuração. Poderia
parecer que não se admitiria procuração in rem suam que revogável fôsse. Essa não é a verdade: com a
procuração em causa própria não é incompossível a cláusula de revogabilidade (L. RoSENBERC,,
Stelh’ertretunq im Prozess, 912) ; depende da vontade do outorgante outorgá-la revogável, ou não; se a
outorgou irrevogável, ou sem nada dizer, incide o art. 1.317, 1, 2~a parte,
que contém regra jurídica dispositiva. Também segundo o art. 1.817, II, são irrevogáveis os mandatos quando
forem ligados a alguma relação jurídica bilateral, ou meio de cumprir obrigação contratual, modo canhestro
com que o legislador exprimiu mandato concernente a relação jurídica subjacente, justajacente ou sobrejacente,
que dêle precise. A alusão às “letras” e “ordens” é de todo descabida. Não há, aí, sempre, poder derivado de
obrigação contratual; pode ter derivado de negócio jurídico unilateral. Por outro lado, se se pensou em
assinação, em títulos cambiários e cambiariformes em que haja saque, a figura seria a da autorização, ou, no
cheque, a do exercício de autorização, e não a do mandato. Se a irrevogabilidade não deriva da lei, o art. 1.817
é dispositivo.
(d) De regra, é revogável o mandato. É preciso que haja pressupostos suficientes para a irrevogabilidade, se se
concebe como irrevogável o mandato. O art. 1.817 do Código Civil aponta os pressupostos suficientes. O art.
1.317, II, refere-se às espécies em que o mandato é de representação do mandante, em contrato bilateral, ou se
tem por fim a prática de ato com que se há de adimplir dever do mandante, como se o ato do mandatário há de
ser o de receber para solução de divida do mandante a êle, ou a outrem. O ônus da prova incumbe ao
mandatário (cf. 4Y Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 8 de outubro de 1942, 1?. dos T., 143,
145). No direito comercial, a despeito do art. 157, 1, do Código Comercial, que fala de se extinguir o mandato
pela revogação, há o art. 164 que remete ao art. 188, relativo a comissão, no qual se estatui que se deve, pelo
menos, metade da remuneração, “ainda que não seja a correspondente aos trabalhos praticados”, se a
revogação, antes da execução, foi “sem causa justificada” (cf. Câmaras Cíveis Reúnidas do Tribunal de
Apelação da Bahia, 24 de agôsto de 1945, 1?. dos T. da Bahia, 87, 225: “A faculdade, o direito de revogação do
mandato não encontra óbice na lei e muito menos seria tolerável encontrá-los no campo do direito comercial,
que abrange atividades impulsionadas pela rapidez das negociações e protegidas pelo sentimento de confiança.
A revogação do mandato mercantil é permitida por escassear ou faltar a confianca no mandatário, ou por se ter
tornado desvantajoso o negócio (2•~ Câmara do Tribunal de Justiça de Goiás, 21 de julho de 1939, E. E., 82,
884).
Se o contrato de mandato se prende a algum outro contrato, bilateral, de que seja efeito, é irrevogável (e. g., A
vendeu a E e dá procuração em causa própria a C, por indicação de E, mas E não presta o preço, o mandato é
revogável, mas a procuração não no é se já foram exercidos os poderes a terceiro de boa fé). Sem clareza, o
acórdão do Supremo Tribunal Federal, a 21 de dezembro de 1954 (A. J., 116, 54).
O art. 1.317, II, do Código Civil supóe que um dos figurantes do contrato bilateral haja contratado mandato
para que ao mandatário se preste ou contrapreste aquilo a que, pelo contrato bilateral, tem direito. ~Não está em
causa a procuração, que é outro negócio jurídico e só é irrevogável, como negócio jurídico abstrato que é, se
dos seus têrmos consta a cláusula de ser procuração em causa própria, ou a de ser irrevogável.
Aqui, há um ponto delicado: o mandato em que se diz que o mandatário opera para se satisfazer do que lhe deve
f mandante é irrevogável. Se nêle não se disse para que se contratou e só no contrato bilateral foi dito, a
revogação, que, ali, seria inexistente , porque, conceptualmente, não poderia haver irrevogabilidade revogável,
aqui apenas importa infração do contrato bilateral. Se o contrato bilateral nada diz, nem o instrumento do
mandato, mas na procuração se diz, há dois negócios jurídicos no mesmo instrumento: o da procuração, que é
abstrato; e o do pacto de destinação, que se integra no mandato e no contrato bilateral.
O art. 1.317, II, não se refere à procuração; mas ao mandato.
Lê-se no art. 1.319 do Código Civil: “Tanto que fôr comunicada ao mandatário a nomeação de outro, para o
mesmo negócio, considerar-se-á revogado o mandato anterior”. Primeiramente, observemos que se supõe
incompatibilidade entre o segundo mandato e o anterior. Se o mandato de A a E foi para ps atos a, b e c e o
posterior mandato é somente para o ato e ou os atos o, não houve revogação do mandato para os atos a e ti. Na
dúvida, tem-se como ocorrida a revogação; ~ as próprias circunstâncias podem estabelecer que houve
revogação, ou criar a dúvida. Por outro lado, não se pode dizer que a prática de algum ato pelo mandante
importa, sempre, revogação do mandato (sem razão, as Câmaras Cíveis Conjuntas do Tribunal de Apelação do
Distrito Federal, a 7 de agôsto de 1941, A. J., 59, 455), porque o mandato pode permanecer para outros atos, ou
ser irrevogável e pois ineficaz o próprio ato do mandante.
Se há outro contrato de mandato, ou nomeação de outro procurador, está revogado o mandato. A revogação é

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eficácia -do nôvo ato. O ato, êsse, pode existir, valer e, para outros propósitos, ser eficaz. O que depende da
comunicação é o efeito extintivo. Se não houve outro contrato de mandato ou outra nomeação de procurador,
mas sim revogação expressa, a eficácia depende da comunicação (TH. ENCELMANN, J. v. Staudingers
Kommentar, ~J, 3, 93 ed., 1104; SCHMIDT-RIMPLER, em \T. ERRENEERO, Handbuoh dos gesammten
Handelsrechts, V, 1, 1055).
A revogação não está adstrita à exigência da mesma for tua que teve o mandato, mesmo se para o negócio
jurídico que se há de concluir se exige forma especial. AUtor, em se tratando de distrato (Código Civil, art.
1.098, 1•a parte), por se ter aberto exceção à regra geral.
Se a revogação já se fêz após o início do adimplemento tio mandato, tem o mandatário a pretensão à
indenização dos danos. A pretensão ao reembôlso de despesas, essa, nasce a cada momento em que se
desembolse como adiantamento. Se remunerado o mandato, há a pretensão à parte correspondente ao mandato
adimplido. Aí, não há ressarcimento de danos, mas prestação da parte do correspectivo (ALESSANDRO
BERTINI, 1 Negozi fiduciari di preparazione dell’adempimento, 99 s.). A revogabilidade protege o mandante;
se há remuneração, tem-se de admitir aquela e proteger-se o interesse do mandatário. Em verdade, não há só
ressarcimento pelo prejuízo que sofre o mandatário (cf. ARTHUR NUssBAiJM, Tatsachen und Begriffe im
deutschen Kommissionsreeht, 45), mas atingimento da correspectividade. O mandatário contava com a
remuneração, e pode ter, por exemplo, pôsto de lado outros encargos.
Se o mandato é revogável, o mandante tem de pagar os serviços que lhe foram prestados (43 Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 80 de novembro de 1945, 1?. E., 107, 494), salvo se a revogação não
exime o mandatário de prestar serviços que sejam urgentes, e há perigo na demora. AUter, em se tratando de
mediação.

3. DENÚNCIA PELO MANDATÁRIO. O mandato conclui-se com a aceitacão da vosc do mandante; ainda
quando foi o mandatário que fêz oferta, o mandato é proveniente de suporte fáctico em que é elemento,
histórica e sistemâticamente distintivo, o man date, que é a voz do mandante, que deseja o ato de outrem, quase
sempre no direito brasileiro com o poder de representação. Ainda onde, como no direito alemão e no brasileiro,
se eliminou a essencialidade do poder de representação, o mandato continuou revogável pelo mandante.
Revogação de mandato é forma elíptica de revogação do elemento volitivo, voz, que há no suporte fáctico do
mandato. Retirado êsse elemento, o negócio jurídico se extingue, porque lhe falta o alicerce, algo da sua
estrutura. Muito diferente é o que se passa com a denúncia pelo mandatário: nao se trata de qualquer eliminação
de elemento do suporte fáctico, que deixasse, assim, de ser suficiente; trata-se de manifestação de vontade
contrária à continuação do negócio jurídico. O mandato extingue-se para o futuro, como acontece com a
revogação; porém não se vai ao suporte fáctico .
A denúncia por parte do mandatário é manifestação unilateral de vontade, receptícia. Enquanto o mandante não
tem conhecimento do ato denunciativo, há a eficácia do mandato.
O mandatário pode lisamente renunciar melhor diríamos “denunciar” se o mandante pode prover, de outra
maneira, ao cuidado e à gestão dos seus interesses (= se há tempo para isso e não foi inoportuna a atitude do
mandatário).
A denúncia pelo mandatário é eficaz, mesmo se inoportuna ou sem deixar tempo ao mandante e sem a
eventualidade de prejuízo considerável para o mandatário se não denunciasse.
A lei cogitou de espécies em que o mandante não pode revogar o mandato; não, porém, da indenunciabilídade
(irrenunciabilidade) por parte do mandatário. Se há irrevogabilidade do mandato, não entra no mundo jurídico o
ato revocatório. A denúncia (dita “renuncia~~) do mandato, mesmo nas espécies em que o mandatário terá de
indenizar, entra no mundo jurídico e é eficaz. O ato é ato jurídico eficaz e ato jurídico ilícito.
Os sistemas jurídicos costumam tratar diferentemente a revogação pelo mandante e a renúncia (denúncia pelo
mandatário), porque há, do lado do mandante, o elemento confiança, que justificaria a denúncia vazia pelo
mandante. Porém, conforme frisamos, o que se conserva, na técnica jurídica, é a revogação pelo mandante, em
vez de se ter cogitado, explicitamente, de denúncia.
No Código Civil, só se fala da denúncia nos arts. 1.816, ~, 23 parte, e 1.320. A técnica legislativa oferecia ao
legislador três soluções: a) apontar as espécies de denúncia cheia, como fêz, a respeito da locação de serviços
(arts. 1.226 e 1.229), para a denúncia pelo locador e para a denúncia pelo locatário; lO adotar a simples
denunciabilidade (denúncia vazia), sem outra conseqúência que a negativa, a favor do mandatário; e) permitir a
denúncia vazia (= sem necessidade de apontar as razões), com a conseqUência específica, negativa, e o
nascimento de eventual pretensão à indenização, por parte do mandante. O Código Civil preferiu a solução e).

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No direito alemão, adotou-se e), atenuada: se alguma causa importante (em wichtiger Grund) ocorre (§ 671,
alínea 3.~). No direito francês, arts. 2.003, alínea 33, e 2.007, a solução e). Idem, os códigos civis, que lhe
seguiram a trilha, inclusive o nôvo Código Civil italiano, arts. 1.722, 8), e 1.727, e o argentino (arts. 1.963, 2.~
1.978: “El mandatario puede renunciar eI mandato dando aviso aí mandante; pero si lo hiciese en tiempo
indevido, sin causa suficiente, deve satisfacer los perjuícios que la renuncia causare aí mandante”; e 1.979).
No Código Comercial, art. 148, diz-se: “Não é livre ao mandatário, aceito o mandato, abrir mão dêle, salvo se
sobre-vier causa justificada que o impossibilite de continuar na sua execução”. No art. 157, 2, falou-se da
demissão (denúncia) apresentada pelo mandatário. Não atento à diferença entre infração das obrigações de
mandatário e ato de denúncia, J. X. CARVALHO DE MENDONÇA (Tratado de Direito Comercial, VI, Livro
IV, Parte II, 297) aludiu à pretensão para cumprimento, se o mandatário denuncia o mandato, ou dêle se demite,
como preferiu ao errado “renúncia” o Código Comercial, art. 157, 2, salvo “causa justificada que o
impossibilite a continuar na sua execução”. Ora, a denúncia, no direito civil e no direito comercial brasileiros, é
vazia; o art. 143 do Código Comercial, com o art. 1.320 do Código Civil, somente funda a pretensão à
indenização. O art. 1.320, 13 parte, exige, para a eficácia da denúncia, que seja comunicada ao mandante; em
verdade, está-se ante manifestação unilateral, recepticia, de vontade. Pode ser condicionada (PAUL
OERTMANN, Das Rech,t der Sckuldverhitltnisse, 798; L. ENNECCERUS, Lehrbuch, TI. 582; contra, sem
razão, G. PLANaR, Kommentar, ~J, 43 ed., 670; W. IMMERWAHR, Pie Kiíndigung, 81): se o mandatário
escolhe o momento para a denúncia, não importa que escolha o momento em que ocorra a condição; se há
inconveniência para o mandante, que o revogue. Discute-se se é admissível a renúncia ao direito de denunciar
(aqui, é de renúncia que se trata, pois a denunciabilidade não é faculdade, é direito).
Mesmo a respeito da procuração judicial, a denúncia pelo procurador é vazia; apenas responde o denunciante se
não houve motivo justo. Diz o art. 1.329: “Sob pena de responder pelo dano resultante, o advogado, ou
procurador, que aceitar a procuratura, não se poderá escusar sem motivo justo, e, se o tiver, avisará em tempo o
constituinte, a fim de que lhe nomeie sucessor”. No Código de Processo Civil, ad. 109, estabeleceu-se prazo
para o comêço da eficácia da denúncia pelo procurador judicial: “O procurador que renunciar o mandato
judicial continuará durante os dez dias seguintes à notificação da renúncia, a representar o mandante, desde que
necessário para evitar-lhe prejuízo”.
No art. 1.320, estatui o Código Civil: “A renúncia do mandato será comunicada ao mandante, que, se fôr
prejudicado pela sua inoportunidade, ou pela falta de tempo, a fim de prover à substituição do procurador, será
indenizado pelo mandatário, salvo se êste provar que não podia continuar no mandato sem prejuízo
considerável”. Por influência danosa de escritores franceses e italianos, há, na jurisprudência,
alusões a resultar a renúncia de qualquer manifestação de vontade do mandatário levada ao conhecimento do
mandante (e. g., M. PLANIOL-G. RIPERT, 23 Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 3 de
outubro de 1938, E. dos T., 117, 164) ; ou a que com a comunicação se conclui a renúncia. A renúncia preexiste
à comunicação. Falta aos expositores e aos juizes atenção à diferença entre existência, validade e eficácia.
Antes de ser comunicada, a renúncia já existe porém não é eficaz. O art. 1.320 do Código Civil regula eficácia,
e não existência ou validade.
“Se o mandatário”, diz o Código Comercial, art. 144, alínea 13, “depois de aceito o mandato vier a ter
conhecimento de que o comitente se acha em circunstâncias que êle ignorava ao tempo em que aceitou, poderá
deixar de exeqüir o mandato, fazendo pronto aviso ao mesmo comítente”. E a alínea 2.a: “Pode igualmente o
mandatário deixar de exeqúir o mandato, quando a execução depender de suprimento de fundos, enquanto não
receber do comitente os necessários; e até suspender a execução já principiada se as somas recebidas não forem
suficientes”. Cf. Código Civil, art. 1.309.

4.MORTE DO MANDANTE. A morte do mandante extingue o mandato (Código Civil, art. 1.316, II; Código
Comercial, art. 157, 3). A técnica legislativa poderia estabelecer: a) que o não extingue, salvo cláusula em
contrário (jus dispositivum); b) que, na dúvida, não no extingue (Código Civil alemão, § 672, 13 parte; ins
interpretativum) ; e) que, salvo cláusula em contrário, o extingue; d) que, na dúvida, o extingue; e) que sempre
o extingue (ius cogens). A primeira questão, que surge, é a de se saber se o art. 1.316, II, do Código Civil e o
art. 157, 3, do Código Comercial são regras jurídicas dispositivas ou cogentes, isto é, se há o), ou e). Se o
mandato é irrevogável (art. 1.317), seria absurdo pensar-se em incidência do art. 1.316, II, do Código Civil, ou
do art. 157, 3, do Código Comercial. No direito romano (GAIO, na L. 13, D., mandati vel contra, 17, 1;
PAULO, na L. 108, D., de solutionibns et liberationit’ws, 46, 3), admitia-se a clausula heredum. A resposta
radical contra isso, no direito brasileiro, foi adotada por pareceres de CLÓvIS BEVILÁQUA, CÂNDIDO DE

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OLIVEIRA e AsToLEO RESENDE (O D., 117, 343-854)


mas, pelo menos, o art. 1.317 existe e o poder irrevogável de representação não se extingue com a morte. O
mandato com clausula heredum (isto é, por si e seus herdeiros) pode ser mandato irrevogável, que se inclui na
classe do art. 1.317, 1. , Quando é, porém, que se pode fazer irrevogável o mandato? A questão, já a ventilamos,
e a resposta serve à solução do problema sobre a extinção: se o mandato aliás, o poder de representação
poderia ser irrevogável, não se extingue com a morte do mandante.
Temos, pois, de relevantar a questão.
Discute-se se pode ser admitido o mandatum post mortem mandcttoris, isto é, se pode existir mandato em que a
prestação, por conta do mandante, seja exigida após a morte dêsse. Há o princípio Mandatum morte finitur, que
está no art. 1.316, 1, do Código Civil. A opinião corrente é pela admissibilidade (contra G. NAvARRA, Dei
Mandato e dell’incarico post mortem, Rivista Italiana di Scienza Giuridica, 1939, 239 s.).
O principio da extinção do mandato com a morte do mandante não é essencial ao instituto do mandato. Se o
poder, que o mandante tinha, cessou com a morte, evidentemente não se pode sustentar que êle pudesse
outorgar o que não mais teria. Nem se diga que vige a maxima Ab heredis persona obligatio incipere nou
potest, pois os deveres do mandante nasceram em vida: a eficácia é de contrato anterior à morte. Mesmo sem a
cláusula, as conseqüências do mandato vão aos herdeiros e até se prevê que o mandatário ignore a morte do
mandante (Código Civil, art. 1.321). Se o mandato é revogável e os herdeiros estão diante da cláusula, o que
podem fazer é revogá-lo.
Nas procurações é usual o “por si e seus herdeiros e sucessores”.
Uma vez que não é vedado o mandatum. post mortem (mandatoris) ezequendum, apresenta-se outro problema:
pode o mandante, que inseriu a cláusula, fazer irrevogável pelos herdeiros o mandato? Tratando-se de mandato
ou de procuração em causa própria, não há outra solução que a de reputar irrevogável pelos herdeiros o
mandato ou a procuração. Resta a espécie do art. 1.317, f, 1.~ parte, do Código Civil em que se estabelece a
irrevogabilidade sem se darem em causa própria os poderes. Não se há de invocar, no direito brasileiro, a
opinião de PIETRO I3ONFANTE (Scritti giuridici vari, III, 270),
L. CoVIELLO junior, 11 “mandatum post mortem”, Rivista di Díritto Cvile, 1930, 28 s.) e LUIGI CARlOTA-
FERRARA (Man(ÂhO “post mortem” e disposizioni suíla sepoltura, Foro Lomba~ do, 1934, 748 s.). Se o
mandato não fere direitos dos herdeiros legkimos, ou a comunhão conjugal, a cláusula de irrevogabilidade pode
ser posta.
Nas espécies do art. 1.317, II, do Código Civil, também a morte do mandante não atinge o mandato; bem assim,
nas espécies do art. 1.317, III. Quanto às espécies do art. 1.317, II, está na tradição do direito luso-brasileiro,
com a lição de 13. B. DE ALTIMARO (Tractatus de Nuijitatibus Senten.tiarum, II, rub. 11, q. 36, n. 26 s.). Cf.
MANUEL DE ALMEIDA E SOUSA (Segundas Linhas, 1, 42).
Morto o outorgante, em se tratando de procuração para alienação ou gravame de bens, o patrimônio passa aos
herdeiros, e cessa a outorga de poderes.
A eficácia dos atos do mandatário, se ignorava ter falecido o mandante, depende da boa fé em que está o
terceiro. Os atos praticados pelo mandatário que não dependem de manifestação de vontade do terceiro, ou de
ato de apresentação do terceiro, são eficazes se o mandatário não sabia da morte do mandante. Aí, não há boa fé
a apurar-se. O que o art. 1.821 do Código Civil tem por fito é preexcluir eficácia com respeito a figurante de má
fé, ou quem de má fé se quer beneficiar do ato que o mandatário pratica por ignorar o falecimento do mandante.
Aliás, o art. 1.321 concerne à ignorância, pelo mandatário, de qualquer causa de extinção do mandato. Os atos
praticados pelo mandatário que sabia da morte do mandante são ineficazes em relação ao mandante: o
mandatário não o é mais e obrou falsamente. (O art. 1.321 fala de serem “válidos” se ocorrem os dois
pressupostos ignorância da extinção pelo mandatário, boa fé em que estava o terceiro mas o caso éde eficácia,
e não de validade. A referência à nulidade repete-se em acórdãos; e. g., 5•a Câmara Cível do Tribunal de Justiça
do Distrito Federal, 10 de dezembro de 1946, R. 9., 112, 132; 4~a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São
Paulo, 29 de novembro de 1948, 1?. dos T., 178, 168.)
5. MORTE DO MANDATÁRIO. No Código Civil, art. 1.316, II, incluiu-se entre as causas de cessar o
mandato a morte do mandatário. Também aqui a técnica legislativa concebe a regra jurídica ou como cogente,
ou como dispositiva, ou como interpretativa. A última solução foi a que prevaleceu no Código Civil alemão, §
673. No direito brasileiro, a permanência pode resultar de cláusula de continuação com os herdeiros, ou sécios
do mandatário, ou comuneiros, ou das circunstâncias do caso. Se o mandato foi conferido à pessoa jurídica, a
morte do órgão que o exercia, ou ia exercê-lo, não extingue o mandato (Supremo Tribunal de Justiça, 9 de
fevereiro de 1887, Relação da Côrte, 11 de maio de 1886, O D., 42, 339-346; Tribunal de Justiça de São Paulo,

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8 de abril de 1926, R. dos T., 57, 33 s.).


No direito romano, GAIO (JnsL, III, § 158) somente aludiu ao mandatum post mortem mandatarii (“Item si
quid post mortem meam faciendum mibi mandetur, mutile mandatum est, quia generaliter placuit ah heredis
persona obligationem incipere non posse”). Mas, se isso não basta para se concluir que valesse o mandatum
post mortem mandatoris (tese de CESARE SANFILIPPO, Mandatum post mortem, Studi Solazzi, 554-567), e
não o mandatum post mortem mandatarji, há outros argumentos que fazem pensar-se assim (contra a opinião
dominante, 5. ZIMMERN, Ober den nach des Mandatars Tode zu vollziehenden Auftrag, Archiv fitr die
civili.stisehe Praxis, IV, 235 s.).
~ Que é que se passa entre a morte do mandatário e o momento em que o mandante vem a ter conhecimento do
ocorrido? ~ Há ficção, como se argúi (JOSEF EssER, Wert und Bedeutung der Rechtsfiktionen, 124, nota 99) ao
§ 673 do Código Civil alemão?
No intervalo, a causa da extinção já existe, mas a eficácia ainda não se operou. Demais, a morte o fato entra no
mundo jurídico, sem que se hajam de produzir todos os seus efeitos: a extinção da relação jurídica do mandato é
um dêles. Tem-se de ter presente a diferença entre existência e eficácia.
Lê-se no art. 1.322 do Código Civil: “Se falecer o mandatário, pendente o negócio a êle cometido, os herdeiros,
tendo ciência do mandato, avisarão o mandante e providenciarão a bem dêle, como as circunstâncias exigirem”.
Estatui o art. 1.323 do Código Civil: “Os herdeiros, no caso do artigo antecedente, devem limitar-se às medidas
conservatórias, ou continuar os negócios pendentes que se não possam demorar sem perigo, regulando-se os
seus serviços, dentro dêsse limite, pelas mesmas normas, a que os do mandatário estão sujeitos”.
Diz o Código Comercial, art. 161: “Morrendo o mandatário, seus herdeiros, sucessores, ou representantes legais
são obrigados a participá-lo ao comitente, e, até receberem novas ordens, devem zelar os interesses dêste, e
concluir os atos de gestão começados pelo finado mandatário, se da mora puder vir dano ao comitente”.

6.INCAPACIDADE SUPERVENIENTE DO MANDANTE. A incapacidade superveniente, seguida de


“interdição”, diz o Código Civil, art. 1.316, II, 23 parte), de regra extingue o mandato. Se bem que mais
acertado pareça a alguns a regra jurídica interpretativa (Código Civil alemão, § 672), a solução do art. 1.316, II,
23 parte, entendido como regra jurídica dispositiva, é a que mais atende aos fatos da vida. Se a outorga do poder
de representação podia ser feita como irrevogável e o foi, a incapacidade superveniente, seguida de interdição,
não a atinge: o procurador em causa própria, como os outros mandatários referidos no art. 1.317, continuam
com poder de representação e como contraentes do contrato de mandato.

7.INTERDIção POR INCAPACIDADE SUPERVENIENTE DO MANDATÁRIO. O mandato em que


mandatário aceitou vàlidamente o mandato, a despeito da incapacidade relativa, pode ser atingido por interdição
superveniente. Quanto ao maior de dezesseis e menor de vinte e um anos pode ser mandatário (Código Civil,
art. 1.298) ; não é, para isso, incapaz. Resta saber-se se a interdição por incapacidade absoluta e a interdição por
prodigalidade têm efeitos quanto ao mandato, a) Quanto à incapacidade absoluta, a regra jurídica do art. 1.316,
II, 2.~ parte, apanha tOdas as espécies, exceto quando se trate de mandato que podia ser irrevogável e foi
outorgado como tal (art. 1.317, 1-111).
b) Quanto à interdição por prodigalidade, ou o mandato foi conferido a respeito de ato para o qual o interdito
precisa de assistência do curador, ou o foi para ato que de tal assistência não precisa. Na última espécie, o art.
1.816, ~ 2Y parte, não incide.
A interdição do procurado faz cessar a procura desde o trânsito em julgado (5.~ Câmara Civil do Tribunal de
Justiça de São Paulo, 1.0 de fevereiro de 1952, 1?. dos T., 199, 156). No intervalo entre a causa da interdição e
a sentença, a eficácia da procuração depende da boa fé em que se ache o terceiro.

8.MUDANçA DE ESTADO. A mulher, que se casa, nao pode aceitar mandato sem assentimento do marido
(Código Civil, art. 1.299). Se fizera, antes, contrato de mandato, extingue-se êsse com a incidência do art.
1.816, III. Aqui o que se retira à mulher é o ser mandatário. Quanto ao ser mandante, não há a mesma regra
jurídica. A mulher, ou o marido, se pode outorgar poderes de representação, pode contratar como mandante. Em
caso de concurso civil ou comercial, o mandato não se extingue, mesmo se não se refere a patrimônio que não
entre na massa concursal.
Temos de focalizar as duas soluções diametralmente opostas que se encontram nos sistemas jurídicos:
a)No direito brasileiro, o mandato conferido pelo mandante perdura, a despeito da decretação de abertura da sua
falência, ou de concurso de credores civil ou de liquidação coativa. Passa a ser revogável pelo síndico, se

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revogável seria pelo mandante, e ao síndico é que o mandatário tem de prestar contas, se versa sobre matéria
comercial (= bens alcançados pela falência), ou se versa sobre bens que o concurso civil de credores ou a
liquidação coativa alcance.
Lê-se no Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945, art. 49: “O mandato conferido pelo devedor, antes da
falência, acêrca de negócios que interessam à massa falida, continua em vigor até que seja revogado pelo
síndico, a quem o mandatário deve prestar contas”. E no art. 49, parágrafo único:
“Para o falido cessa o mandato ou comissão, que houver recebido antes da falência, salvo os que versem sobre
matéria estranha a comércio”.
b)A falência do mandante é causa específica de extinção do mandato, conforme a ligação à massa concursal.
Aliás, não só a falência tem êsse efeito. Qualquer decretação eficaz de abertura de concurso de credores,
inclusive liquidação coativa, o tem. Não se compreenderia que o mandatário escolhido pelo falido, ou pela
pessoa sujeita a concurso de credores, continuasse a ter a mesma ingerência, quanto aos negócios da massa
concursal. É preciso que tenha começado a eficácia da decisão judicial constitutiva (não declaratória, como
vulgarmente se diz) e o mandatário tenha tido ciência (e. g., mandato para outro Estado-membro). No mesmo
sentido, ROBERTO MONTES-SOEI (Gil Effetti del Faílimento sui corttratti bilaterali non ancora eseguiti,
57), EUGENIO CIOTOLA (Le Obbligazíoni nel failimento, 194 s. e 384 s.), RENZO PROVINCIAL!,
(Manuale di Dirilto failimentare, 2•a ed., 896) e outros. A ratio legis está em que o mandante não pode outorgar
poderes que êle não tem: tinha-os, e acabaram-se. Não é admissível a raMo legis, que lhe atribuem WILHELM
SCHÓNENBERGER (Kommenta.r zum Scliweizeri.schen Zivilgesetzbuck, Das Obligationenrecht, 2Y~ ed.,
1504), UMBERTO AZZOLINA (Gli Effetti del faílimento sul contratti bilaterali ineseguiti, Rivista Jrirnestrale
di Diritto e Procedura Civile, V, 389 s.) e outros, de ter o requisito da confiança quem foi escolhido pelo falido
ou dexedor concursal. O mandatário pode merecer tôda a confiança. O devedor concursal é que não mais tem
poderes que possa outorgar. Também não se há de dizer que a ratio legis está na tutela dos interesses do
mandatário (e. g., GUSTAVO MINERVINI, 11 Mandato, la Commissione, la Spedizione, 217).
A solução seguida pelo sistema jurídico brasileiro é a melhor. Cumpre, portanto, ter-se tôda a atenção, quando
se consultam livros estrangeiros.
Os mandatos conferidos com irrevogabilidade não são atingidos pela decretação de abertura de falência, ou do
concurso civil de credores, ou da liquidação coativa.
Quanto à falência ou outro concurso de credores do mandatário, desaparece a confiança, salvo se o mandato é
estranho à atividade econômica do mandatário.

A decretação de abertura do concurso, falencial on não, do mandante, se os poderes são, por exemplo, para
alienar bem que está fora da massa concursal, não atinge o mandato. Nem a decretação de abertura do concurso,
falencial ou não, do mandatário, se os atos que êle tem de praticar são os de sua profissão não -comercial, ou
atividade envolvida no concurso, ou para requerer em repartições públicas em nome do mandante.
A Lei n. 4.121, de 27 de agôsto de 1962, art. 1.0, retirou ao arr. 242 do Código Civil os incisos 1V-Vil e IX, um
dos quais, o inciso IX, dizia que, sem assentimento do marido, não pode a mulher “aceitar mandato”. Porém o
legislador não ab-rogou o Código Civil, art. 1.299, onde explicitamente se diz que a mulher não pode aceitar
mandato sem assentimento do marido. O art. 1299 tem de ser interpretado no sentido de que pode a mulher
aceitar mandato em todos os casos previstos pelo art. 246 do Código Civil, com a nova redação que recebeu.

9.TERMINAÇÃO DO PRAZO (TERMO FINAL). A terminação do prazo é a que resulta de cláusula do


próprio mandato, ou da relação jurídica subjacente, justajacente ou sobrejacente de que resulte o poder de
representação. O prazo não faz, por si só, irrevogável o mandato, nem indenunciável. Escreveu J. X.
CARVALHO DE MENDONÇA (Tratado de Direito Comercial, VI, Livro IV, Parte II, 299) : “Convém
observar que, não obstante ter o mandato tempo determinado, o mandante pode revogá-lo e o mandatário
renunciá-lo. Como, porém, se dá flagrante e manifesta infração do contrato, um ou outro fica obrigado a
indenizar o contratante que cumpriu fielmente a obrigação”. Sem razão; a existência de prazo no mandato não
contém irrevogabilidade. O art. 1.320 do Código Civil deve ter influído no pensamento do comercialista; mas o
art. 1.820 só se refere à denúncia pelo mandatário.

10.CONCLUSÃO DO ATO OU IMPOSSIBILITAÇÃO DO QUE SE DESEJAVA. Uma vez que o mandatário


executa o mandato, exaustivamente, acaba o mandato. Outrossim, se se tornou impossível o ato que se desejava
(e. g., perecimento do objeto, morte ou incapacidade do terceiro com que se devia negociar).

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O mandatário, se está diante de impossibilidade superveniente de prestar o que prometeu, não sendo por sua
culpa, tem a alegação de extincão da dívida (Tornos II, § 172; III, § 258, 7; IV, § 397, 4; XXII, § 2.690, 3;
XXIII, § 2.795, 1; XXV, §§ 8.054, 1, e 3.059, 1). Não se trata de revogação, nem de denúncia, o que sup5’e
existente a relação jurídica, nem tão-pouco (o que depõe contra os autores de leis) da chamada “rescisão”,
ampla cesta em que êles misturam conceitos diferentíssimo. A desconstituíção é pelo fato, não por ato do
figurante do negócio jurídico. 1-lá resolução automática. Não se precisa pensar em denúncia, ou em revogação;
nem se precisa do rodeio de MAmO ALLARA (Le Fattispecie estintive dei rap porto obbligatorio, 49 e 140),
que não considera a impossibilidade superveniente como suporte fáctico extintivo da relação jurídica, mas
vicissitude de elemento essencial da relação jurídica, o mesmo que ser a causa mais do que o efeito. (Aliás, ou a
extinção seja automática, instantânea, ou dependa de exercício de pretensão, como a resolução ou a resilição
por inadimplemento, eu de ato negocial, como a revogação, ou a denúncia, a extintividade é a mesma, o que
leva a não se adotar a terminologia de ANGELO FALZEA, La Condizione e gli elementi dell’atto gzurídico,
236 s., “extintiva” e “extintiva-constitutiva”, tanto mais quanto a extinção é, em tôdas essas espécies,
desconstitutiva.)
A técnica de se considerar a impossibilidade superveniente da prestação como justa causa para a denúncia tem a
mesma política da solução que a faz causa de pretensão à resolução ou à resilição. Não é isso, porém, o que se
há de entender, em falta de regra jurídica escrita. De jeito que se tem de considerar a impossibilidade
superveniente como causa de extinção automática, embora fique ao mandatário o ônus de alegá-la e prová-la.
Se o mandatário já fêz despesas e sobrevém a impossibilidade inculposa da prestação, quer de começar (as
despesas, aliás, são comêço), quer de ultimar, tem pretensão ao reembôlso. O reembôlso é o correspectivo do
desembôlso (GINO GORLA, Dei Ris chio e Pericolo nelie obbligazioni, 258 s.). Trata-se de impossibilidade
superveniente de prestação que repercute na responsabilidade do mandante.
Se ao mandante é que se refere a impossibilidade superveniente, sem culpa, como se pereceu a coisa que ia ser
vendida pelo mandatário, tem êle de reembolsar as despesas antes feitas, ou feitas antes de o mandatário ter
conhecimento do ocorrido.
Se o que pereceu foi o que o mandante tinha de prestar ao mandatário para as despesas, ou se ocorre outra mas
igual impossibilidade, a impossibilidade é impossibilidade de eooperação (Código Civil, art. 1.309, 2a parte; e
ad. 1.310, 2a parte), e não impossibilidade de prestação do devedor <sem razão, 1-1. LERMANN, em
DURINGER-HACHENRURO, Das llandelsgesetzbuch, V, 2, 727; SCI-IMmT-RIMPLER, Handbuch eles
gesammten Handelsreohts, V, 7, 7, 858). O mandante que não deixou de prestar não incorreu em mora;
reembolsa, sem se ter de invocar mora accipiendi, ou mora debitoris. Salvo, está claro, se a não-realização do
“negócio” foi por culpa do mandante (= credor).
Se há, ou não, culpa do mandante na impossibilitação, de modo que não atenda ao Código Civil, art. 1.809, 2•a
parte, o mandatário libera-se. No caso de falta de cooperação e não de prestação ou de mora accipiendi por
impossibilidade supervemente por culpa do mandante é preciso que o mandatário, se a falta de cooperação não
era suficiente para a mora no cooperar (e. g., a quota havia de ser prestada no dia 11, Código Civil, art. 960, ou
art. 961), interpele o mandante.
A resolução por inadimplemento, em caso de mandato oneroso, pareceu a muitos sem razão de ser, porque, se o
inadimplemento é por parte do mandatário, pode o mandante, sem alegar qualquer justa causa, revogar o
mandato, e, se é por parte do mandante (que, no mandato oneroso, não presta o que prometeu de remuneração
ao mandatário, bilateralizando o contrato), há a denúncia (dita “renúncia”). Argumento só de inutilidade. Ora,
quem tem por si a resolução do contrato tem a ação de indenização dos danos e a resolução pode não ser só a
resilição (de que mais se aproxima a denúncia), mas a resolução stricto sensu, que é de eficácia ea~ tufo.
1A falta de inadimplemento do dever de cooperação, que não é o de reembôlso, também dá a resolução ou a
resilição do contrato de mandato? A opinião que o afirma, mesmo se não há regra jurídica especial, tem de ser
posta de lado. Há fundamento para a denúncia (dita “renúncia”, Código Civil, art. 1.820; Código Comercial,
arts. 157, inciso 2, e 162).
Não para a resolução por inadimplemento. Aliter, quanto ao (lever de remunerar, ou outro dever de interesse do
mandatário. Se o mandante permitiu que o mandatário obrasse em nome próprio, a colaboração principalizou-
se, de modo que é de admitir-se a resolução por inadimplemento.
Se o contrato de mandato é de duração, com diferentes objetos, cada adimplemento só extingue a relação
jurídica no que se adimpliu. Não há prôpriamente extintividade da relação jurídica, mas sim diminuição do seu
conteúdo.

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11. CoNDIÇÃO RESOLUTIVA. Ocorrendo a condição resolutiva, extingue-se o mandato. Idem, se há


resolução que atinjao poder de representação, porque o mandante perdeu, nos limites, a legitimação.

12.TRANSFERÊNCIA DA POSIÇÃO DE MANDATÁRIO. Se o contrato de mandato permite que o


mandatário se substitua no mandato, e êsse o faz sem reservas (quanto a todos os poderes), dá-se a extinção do
mandato. Vulgarmente se fala de substabelecimento do mandato, mas o mandato é contrato, de modo que há,
em verdade, substituição em virtude de cessão ou de transferência da posição jurídica, e não substabelecimento.
O que se chama “substabelecimento do mandato” é substabelecimento da procuração a que se refere o contraú
de mandato, ou que se passou em cumprimento do contrato de mandato. Se o contrato de mandato alude à
procuração, ou se a procuração que se passou é de todos os poderes de que cogita à mandato, o
substabelecimento da procuração, sem reserva, extingue o mandato.
A substituição do mandatário pode dar-se: a) sem permissão, nem necessariedade decorrente da natureza do
encargo; b) permitida, mas sem ter havido indicação da pessoa que haveria de substituir; e) não permitida
expressamente, mas necessária pela natureza do encargo; d) permitida, com indicação, pelo mandante, da
pessoa que haveria de ser o substituto; e) vedada pelo mandante.
O mandatário somente pode fazer-se substituir no mandato se lhe foi permitido pelo mandante, salvo se tal
permissão é implícita pela natureza dos poderes conferidos. Assim, quem contrata mandato, para juízo, com
pessoa que não é advogado,dá poder de substituição. Aí, tal poder é necessário para que possa ser eficaz o
mandato.
Se o mandante não indicou a pessoa que seria ou poderia ser escolhida como substituto, tem o mandatário a
responsabilidade da escolha.
a)Se não há permissão da substituição, nem proibição, responsabilidade é regida pelo art. 1.300, pr., do Código
Civil (“a indenizar qualquer prejuízo causado por culpa ... daquele a quem substabelecer, sem autorização,
poderes que devia exercer pessoalmente”). O art. 1.300, pr., fala de “substabelecer poderes”, de modo que se há
entender: substituir-se no mandato, ou substabelecer (poderes da) procuração. A regra jurídica serve aos dois
institutos, ao mandato, contrato, e à procuração , negócio jurídico unilateral.
A sanção, para a substituição não permitida (e não vedada) nem necessária pela natureza do encargo, não é a de
inexistência, nem a da invalidade do ato negocial do mandatário (doutrina assente, no direito francês e no suíço,
cf. RARL OFTINGER, Sckweizerisches Haftpflicktrecht, II, 488 s.), o que já se entendia ao tempo da
elaboração do Código Civil francês, art. 1.994, 1,a alínea. Se a substituicão foi nociva aos interesses do
mandante, há, ai, ilicitude absoluta, e não invalidade. O substituinte responde, qualquer que seja a causa
determinante, se houve culpa. Não há a responsabilidade pelo caso fortuito, salvo se, tendo havido culpa, da
situação que se criou resultou a fortuídade. Não há equiparar-se a espécie à do ad. 1.300, § 1.0, que supée ter
havido a proibição.
b)Se foi permitida a substituição, sem indicação da pessoa que haveria de substituir, a responsabilidade do
substituinte
é só para os casos de o substituto ser “notôriamente incapaz
(3 u ir solvente”.
c) Se a substituição é necessária devido à natureza do encargo, passa-se o mesmo que dissemos a propósito de
b).
d)Se houve permissão, com a indicação da pessoa que substituiria, o mandatário, que se faz substituir, não
responde pelos atos do substituto. Com a substituição, liberado está. Em todo o caso, se o mandatário soube de
circunstância relativa à pessoa indicada, que o mandante ignorava, ou sobreveio sem que êle soubesse, há o
dever do mandatário, quanto à comunicação, antes de se fazer substituir. Quem se vinculou a executar o
mandato, com tôda a diligência habitual, vinculado está a não cumprir o mandato na parte da substituição se há
razão para comunicar ao mandante o que ocorreu ou está ocorrendo ou vai ocorrer (e. g., a pessoa indicada vai
abrir falência, ou vai ser interdita, ou está sem escritório de advocacia na cidade).
e) Se, não obstante a proibição do mandante, o mandatário se faz substituir no mandato, tem a responsabilidade
de que cogita, explicitamente, o Código Civil, ad. 1.800, § 1.0. Aí, não se trata da falta de permissão , mas sim
da permisão .
A substituição é efeito de negócio jurídico. Que negócio jurídico é êsse?
Se a substituição é definitiva, sem reserva e total, há transferência negocial da posição subjetiva, em virtude de
outorga de poder para transferir (cláusula permissiva ou pacto permissivo da substituição). Cf. Tomo XXIII, §§
2.871-2.877.

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Se a substituição é com ressalva de determinados poderes, pode ser definitiva, ou não, quanto aos outros. Se
definitiva. há a liberação do substituinte, no que foi transferido. Se com reserva, somente quanto ao que se
transferiu e enquanto o substituinte não reassuma (ci Tomo XXIII, § 2.877).
Se a substituição é definitiva, o substituto não é mandatário do mandatário substituinte: o substituinte foi
figurante de negócio jurídico bilateral de transferência da posição jurídica, no qual exerceu poder que lhe foi
outorgado e representou o mandante; não foi mandante em relação ao substituto. Não se trata de outro mandato
em que mandante seja quem era mandatário. Há outro mandato, sim, mas em virtude de exercício de poder de
substituição, que é de transferência da posição jurídica (dita, por elipse, transferência do contrato), com outorga
de poder pelo outro contraente. O substituto é mandatário que obra por conta do mandante. O mandatário,
substituindo-se, não é mandante, no nôvo contrato de mandato, exerce poder que lhe provém do contrato
anterior, da cláusula ou do pacto de substituibilidade.
Tem-se de repelir a concepção do substituinte como mandante. É mandatário, exercente do poder de
substituição, e não mandante. Seria difícil, assim, explicar-se a ação direta entre o dominus e o substituto. Bem
assim, a de estipulação a favor de terceiro (estipulação do mandatário a favor do mandante, que preferiu
GusTAvo MINEItvINI, II Mandato, la Cornntissione, Ia Spediz2one, 62). A explicação precisa que demos é a
única que satisfaz.
Se a substituição não é definitiva, há têrmo ou condição resolutiva. Se o suboutorgado não se põe em relação
jurídica com o mandante, não é substituto, é mandatário do mandatário. Não há transferência da posição
jurídica subjetiva. O mandatário do mandatário, submandatário obra por conta do mandatário, e não do
dominus. Aí, o mandatário confia ao submandatário, como poderia confiar a socios, ou a gerente, ou qualquer
preposto, ou núncio, ou servidor da posse, o exercicio do mandato. Rigorosamente o submandatário não
“substitui”; apenas, pratica, por conta do mandatário, atos que teria de praticar, pessoalmente. fl o submandato.

18.DISTRATO DO CONTRATO DE MANDATO. O mandato é negócio jurídico bilateral. Pode ser distratado,
com observância do art. 1.093, la parte, do Código Civil, se é o caso. Quase nunca se usa, porque há, em
princípio, as desconstituições por atos unilaterais.

14. OUTRAS CAUSAS DE EXTINÇÃO. Também se desconstitui a relação jurídica do mandato, em casos de
resolução, resilição ou decretação de anulação. (A decretação de nulidade da relação jurídica, porque não se
irradiou; desconstitui o negócio jurídico.)

§ 4.691. Eficácia após a extinção do mandato

1.TUTELA DOS INTERESSES DO MANDATÁRIO. O Código Civil não tem regra jurídica escrita sobre a
eficácia da extinção do mandato quanto ao mandatário. Mas é princípio implícito, ou por se tratar de revogação,
que é manifestação unilateral, receptícia, de vontade (arta. 1.316, 1, 1•a parte, e 1.318 e 1.819), ou por se tratar
de fato de que pode não ter notícia o mandatário, nem ter dever de conhecer. “São válidos”, diz o art. 1.821, a
respeito dos contraentes de boa fé, “os atos com êstes ajustados em nome do mandante pelo mandatário, en
quanto êste ignora a morte daquele, ou a extinção, por qualquer outra causa, do mandato”. A respeito da
revogação, estatui, porém, o art. 1.318: “A revogação do mandato, notificada somente ao mandatário, não se
pode opor aos terceiros, que, ignorando-a, de boa fé com êle trataram; mas ficam salvas ao constituinte as
ações, que no caso lhe possam caber, contra. o procurador”. A diferença entre a extinção pela revogação e a
extinção por outras causas ressalta: a revogação notificada ao mandatário deixa eficaz o mandato quanto aos
terceiros de boa fé (art. 1.318> havendo extinção por outras causas, para que o mandato continue eficaz é
preciso que mandatário e terceiro não conheçam a extinção, nem a devam conhecer (art. 1.321, verbis
“contraentes de boa fé”, “mandatário, enquanto êste ignorar”).
Se o terceiro alega que o mandatário não contratou no proprio nome, e sim em nome do mandante, fica
incólume a qualquer responsabilização mandatário se apresenta o mandato, que disse ter, ou a ratificação que
prometera. Assim se há de entender o art. 151 do Código Comercial. Cf. Código Civil, arta. 1.305, 1.806 e
1.296.
Os casos dos arts. 1.319 (ex argumento), i.820, 1.321-~
-1.823 do Código Civil são de ultra.eficacia, isto é, eficácia que persiste após a causa da extinção. O mandato
não existe mais. Os seus efeitos continuam, como fumaça de fôgo extinto. O que se estabelece, no art. 1.821,
não só se refere à morte, mas, também, à interdição, à mudança de estado, à incapacidade postulacional do

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mandatário advogado, à situação do substabelecente já sem poderes de substabelecimento. Ex lege, o mandato é


ultra-eficaz: continuam-lhe os efeitos, pôsto que ê]e se houvesse extinto.
Se o mandato foi a duas ou mais pessoas, conjuntamente, extingue-se com a morte de qualquer dos
mandatários.
A ignorância culposa equiparase ao conhecimento. Tem-se como ciente quem por sua culpa deixou de
conhecer (L. ENNECCERUSH. LEHMÁNN, Lekrbuck, Jf, l8.~ recomposição, 648; Tu. ENCELMANN, J. ‘o.
Staudingers Kommentar, II, 9A ed., 1.111; PAUL OERTMANN, Das Recht der SchuldverMltnisse, Vi,
5.a ed., 1062).
2.TUTELA DOS INTERESSES DO MANDANTE. Se falece o mandatário, pode não estar a par disso, nem do
estado dos negócios o mandante, ou não haver tempo para os atos recomendáveis na emergência. Daí dizer o
Código Civil, art. 1.322:
“Se falecer o mandatário, pendente o negócio a êle cometido, os herdeiros, tendo ciência do mandato, avisarão
o mandante, e providenciarão a bem dêle, como as circunstâncias exigirem
E acrescenta o art. 1.323: “Os herdeiros, no caso do artigo antecedente, devem limitar-se às medidas
conservatórias, ou continuar os negócios pendentes que se não possam demorar sem perigo, regulando-se os
seus serviços, dentro dêsse limite, pelas mesmas normas, a que os do mandatário estão sujeitos”.
Se o mandato foi conferido por duas ou mais pessoas, em negócio jurídico de interesse comum e indivisível, a
revogação tem de ser feita por tôdas. O contrato de mandato há de ser um só; e comum o interesse. Por
exemplo: se o prédio é de A, E e C e concluíram contrato de mandato para que D o venda, A não pode revogar o
mandato sem que E e C o façam. Se cada um é dono de um apartamento, o mandato é plúrjino, e não coletivo.
O interesse comum não é suficiente para se justificar a exigência da revogabilidade somente em conjunto.

3.REMUNERAÇÃO E GRATUIDADE. Se foi estabelecido como se retribuiria o exercício do mandato, que é


serviço, tem-se de observar o que se estabelece (e. g., quantia fixa, percentagem, tempo de exercício). Se não
foi inserta cláusula no escrito, ou não foi acordado, oral, ou tàcitamente, que se retribuiria o serviço, retribuição
não há; se não se prova o contrário, foi aceito como contrato de mandato gratuito. É isso o que estatui o Código
Civil, art. 1.290, parágrafo único: “Presume-se gratuito, quando se não estipulou retribuição, exceto se e objeto
do mandato fôr daqueles que o mandatário trata por ofício ou profissão lucrativa”. Se o contrato de mandato se
concluiu sem haver escrito (e. g., se o destinatário, recebendo a procuração em que é outorgado, começa de o
executar), o contrato não precisa ser provado por outro meio que o de se mencionar a procuração usada e se
presume gratuito. O ônus de alegar e provar que foi oneroso incumbe ao mandatário, e não ao mandante. Se não
se consegue provar o quanto da retribuição, arbitra-se.
No Código Comercial, art. 140, os princípios sobre prova são os mesmos, com a limitação da admissão da
prova testemunhal aos negócios jurídicos cujo valor não exceda de quatrocentos cruzeiros (art. 123).
O mandante tem de pagar a remuneração ajustada e as despesas que resultaram da prática dos atos necessários
no adimplemento. O mandante pode alegar que os deveres do mandatário não foram cumpridos por culpa do
próprio mandatário e, por conseguinte, não lhe deve o mandante a remuneração; ou que, por culpa do
mandatário, o adimplemento foi ruim, espécie em que ou entende que só há de remunerar até onde o
adimplemento satisfez, ou exige a indenização do dano causado pelo mau cumprimento. O ônus da prova da
culpa do mandatário incumbe ao mandante (33 Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, 8 de março de
1952, Paraná J., ~5, 553).
Se o mandante revoga o mandato, ou o denuncia, apenas lhe incumbe pagar os serviços que foram prestados
(4•~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 30 de novembro de 1945, E. P., 107, 494).
Lê-se no art. 1.312 do Código Civil: “É igualmente obrigado o mandante a ressarcir ao mandatário as perdas
que sofrer com a execução do mandato, sempre que não resultem de culpa sua, ou excesso de poderes”. O
mandatário pode ter adiantado somas, ou sofrido danos, sem o ter querido. Se excedeu os poderes, quis o que
ocorreu. Se foi por culpa sua que o dano resultou, também lhe falta qualquer direito a ressarcimento.

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CAPÍTULO V

PROCURAÇÃO E PROCURAÇÃO EXTRAJUDICIAL

§ 4.692. Conceito e natureza da procuração

1.CONCEITO DE PROCURAÇÃO. Já vimos que a confusão entre mandato e procuração revela que se não
aprofundou o estudo dos institutos. Pode alguém ser mandatário sem ser, ou ainda sem ser procurador, e o
procurador pode não ser mandatário, ou ainda não no ser. A revogação dos poderes de procura deixa intacto o
contrato de mandato e o mandante, que revogou o mandato, tem de revogar a procuração. Quando a lei diz que
a procuração é o instrumento do mandato (Código Civil, art. 1.288, 2•a alínea), apenas pode ser entendida como
se dissesse que a procuração pode ser um dos instrumentos
o mais eficiente do mandato.
Pode haver mandato oral, a procuração, essa, tem de ser por escrito.
Procura é o instrumento pelo qual alguém, pessoa física ou jurídica, outorga a outrem poder ou poderes de
representação. O órgão da pessoa jurídica não é procurador, não exerce procura, não representa: presenta. Por
isso, apenas precisa de escrito, ou mesmo telegrama, ou qualquer meio de prova, que as pessoas com quem trata
reconheçam suficiente, para que se faça certa a sua função de órgáo. O presidente da emprêsa não é procurador;
é órgão. Se os estatutos exigem que dois ou mais diretores integrem o órgão, só o número dêles, conforme a
regra estatutária, presenta a pessoa jurídica.

§ 4.692. CONCEITO E NATUREZA DA PROCURAÇÃO 111


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2. PRECISÕES CONCEPTUAIS. Quando o Código Civil diz, no art. 1.288, 23 alínea, que a procuração é o
instrumento do mandato, não faz da procuração a forma, o documento do mandato; apenas se referiu ao que
mais acontece: fazer-se a procuração para que mais fácilmente se exerçam os poderes a que alude o mandato e
podem ser diferentes daqueles que se mencionam no escrito ou no contrato oral de mandato. Não há a
essencialidade de se passar a procuração (= outorgar, unilateralmente, poderes), de modo que há mandato sem
procuração e há procuração sem mandato. A procuração, conforme temos frisado, é negócio jurídico unilateral,
abstrato. Se, no mesmo instrumento (na mesma forma!), se dão os poderes, unilateral-mente, e se conclui o
contrato de mandato, o que exige a assinatura dos dois figurantes, porque se trata de negócio jurídico bilateral, é
outro problema, que se reduz à afirmação de se terem pôsto no mesmo escrito os dois negócios jurídicos. No
mesmo “instrumento” (no sentido técnico), poder-se-iam inserir três ou mais negócios jurídicos diferentes,
como o contrato de advogado, o contrato de mandato e o negócio jurídico unilateral de procuração. Procuração
não se aceita. Quando se diz que o outorgado “aceita a procuração”, apenas, sem têrmos próprios, se declara
que o outorgado aceitou e se fêz mandatário, ou o advogado aceitou o contrato de advocacia. Nos autos, por por
exemplo, o juiz, que verifica quais os poderes do procurador judicial, nada tem com o que se concluiu como
contrato de mandato, ou como contrato de advocacia, entre o outorgante e o outorgado.

3.NATUREZA DA PROCURAÇÃO. O mandato é contrato causal; a procuração é negócio jurídico unilateral,


abstrato.
Aquêle é indiferente à gratuidade e à onerosidade, porque se permitiram o mandato gratuito e o oneroso. Não se
passa o mesmo com a compra-e-venda e a troca, que são contratos onerosos, e com a doação, que é contrato
gratuito. Não há, sempre, a correspectividade, no mandato; mas pode haver (sem razão, FRANCESCO
SANTORO-PASSARELLI, Nozioni di Diritto dei lavoro, 65; e FRANCESCO MESSINEO, Dottrina generale
dei Contratto, ga ed., 237, e antes La Natura giuridica del Contratto di Sconto dopo la riforma deI Codice
Civile, Studi per L. BARASSI, 4 s.). A procuração, essa, é sempre negócio jurídico unilateral, negócio jurídico
abstrato.
Em boa terminologia, o negócio jurídico unilateral, de que resulta o instrumento de procuração, é negócio
jurídico de procura. Procurar é exercer a incumbência ou outorga de procurador. Procurado é o outorgante:
cura, pro, diante, à frente, em vez de. A própria lingua alemã tem Prokura; e a holandesa, procuratie.
Devido à unilateralidade do negócio jurídico da procura, se a pessoa nomeada atende à outorga e responde que
“aceita”, supôs, como existente, subjacentemente, ou justajacentemente, oferta de mandato, ou de contrato de

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advocacia, ou de outro contrato, para a qual êle dirige a aceitação. Outro negócio jurídico, bilateral, ou mesmo
plurilateral, se conclui, inconfundível com o negócio jurídico unilateral da procura. Aliás, o procurador, antes
ou já após o início do exercício dos poderes outorgados, pode oferecer contrato de mandato, de advocacia, ou
outro contrato, de jeito que precise ser aceita pelo outorgante a oferta. Mesmo assim, tem-se de evitar qualquer
confusão entre o negócio jurídico unilateral da procuração e o negócio jurídico bilateral ou plurilateral
sobrejacente.

§ 4.693. Espécies de procuração

1.QUANTO AOS PODERES OUTORGADOS. A procuração pode ser com outorga de poderes para
determinada classe de atos, ou para determinado ato, ou para determinados atos. Os poderes podem ser gerais,
ou especiais. Especiais são os poderes para atos que hajam de ser indicados em suas figuras jurídicas. Por isso,
se a lei exige poderes especiais, tem de dizer para que atos hão de ser êsses poderes. O outorgante da
procuração pode apontar os atos para os quais outorga poderes e pode pré-excluir a outorga para determinados
atos, inclusive se contidos em poderes outorgados.
Ao outorgante fica inteiro auto-regramento de vontade para precisar os limites dos poderes outorgados. -

2. QUANTO À FORMA. As procurações ou são por instrumento particular, ou por instrumento público. As
procurações por instrumento público podem ser feitas em processo, apud acta. Não só para atos processuais se
justifica a outorga de procuração apud acta. O que importa é que haja ligação entre o que se expõe, se discute
ou se há de apreciar, ou se aprecia, ou se apreciou em juízo, e o objeto ou finalidade da procuração. Por
exemplo: se alguma das partes tem de consentir ou de assentir, de ratificar, ou de desaprovar, ou de revogar, ou
de fazer interpelar, intimar ou notificar, para que o ato conste do processo; se a parte ou assistente quer alienar,
gravar, ou dividir, ou partilhar algum bem de que se cogite no processo; a fortiori, se é para cumprimento por
parte, assistente ou estranho, de mandamento, ou de exigência do juízo, ou para concordância, discordância, ou
interposição de recurso, ou para que alguém possa pedir extração de traslados ou de certidões.

3.PROCURAÇÃO PARA OBRAR EM NOME PRÓPRIO. A procuração para agir em nome próprio (do
procurador) é procura sem referência ao procurado, ainda que a procuração não seja em causa própria (o que é
outra coisa e envolve cessão). A relação jurídica com o terceiro é entre êsse e o procurador, e não entre êsse e o
outorgante. Há outorga de poderes, sem haver representação direta, como que em pulo para o passado romano.
Na procuração em causa própria, a outorga de poderes é para que êsses sejam exercidos em nome do
outorgante. Há representação direta. As relações jurídicas exsurgentes são entre o outorgante e o terceiro, muito
embora por conta do procurador.
Se se analisa o que se passa quando se diz que a procuração é com outorga em nome próprio, cessa a razão de
ser da discussão sobre a cantemplatio domini (cfr. LUIGI MONACCIANI,Azione e Legitimazione, 183 s., e
GUSTAVO MINER’JINI, II Mandato, la Commissione, la Spedizione, 13, que discorda daquele).

4.PRAZOS E CONDIÇÕES. O outorgante pode estabelecer prazo suspensivo ou condição suspensiva para que
o outorgado possa exercer os poderes. Pode, também, inserir na procuração prazo resolutivo ou condição
resolutiva.

5.PROCURA E MANDATO, CONCORRÊNCIA E DISCORDÂNCIAS.


A outorga de procuração pode ser anterior ou posterior à conclusão de contrato de mandato, ou de qualquer
outro contrato em que se insira, ou em que se suponha, ou em que se prometa outorga de poder de
representação.
A procuração pode ser outorgada a quem, sem ela, seria núncio, ou empregado sem poder de representação, ou
a quem já tenha outra procuração, ou outras procurações, para o mesmo assunto, ou para diferentes assuntos.
Quem tem duas ou mais procurações para os mesmos atos, sem que a posterior ou as posteriores digam que a
anterior ou as anteriores estão revogadas, pode utilizar qualquer delas. Há conveniência, às vêzes, em se
outorgarem duas ou mais procurações, como se o vendedor não quer que os interessados na compra saibam o
preço pelo qual pode vender. Por exemplo: o procurador exibe a B a primeira ou outra procuração, em que se
explicitam as cláusulas da compra-e-venda do bem imóvel, e B entende que não lhe convém o preço e oferece a
compra-e-venda por menos; o procurador pode fechar o negócio por êsse preço, se outra procuração se satisfaz

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com êle, ou nada diz quanto ao preço.


Para o mesmo ato ou para os mesmos atos podem ser apresentadas duas ou mais procurações que se
completem. E. g., uma procuração deu poderes para a venda do prédio e a transmissão da propriedade e da
posse, outra, para a estipulação e o recebimento do preço em prestações, outra, para o acôrdo de constituição de
hipoteca sobre o imóvel para garantia das prestações futuras.
A remessa da procuração investe de poderes o procurador, de jeito que o comêço de exercício é investidura na
função de procura. Se antes dela, com ela, ou após ela chegou ao procurador oferta de mandato (ou aceitação de
mandato), com diferença de têrmos, o que se há de entender é que o procurador pode exercer os poderes
outorgados mesmo se deixa de aceitar a oferta de mandato, ou se não foi aceita a sua oferta e êle nao aceitou a
contra-oferta. Para que os poderes outorgados sem procuração cessem, é preciso que haja revogação ou
sobrevenha outra causa de extinção dos poderes outorgados.
Conforme dissemos no § 4.681, o empregado da companhia que recebe procuração para assinar negócios
jurídicos, ou fazer pagamentos ou receber o que à emprêsa é devido, não é mandatârio. Entre êle e a emprêsa há
outra relação jurídica, que se não confunde com o mandato. O advogado que assinou ou vai assinar ou nsLo
cogitou de assinar contrato de advogado e recebeu procuração e propôs a ação, ou apresentou contestação, ou
opôs exceção, ou interpôs recurso, não é mandatário:
Advogado e procurador.
6.INÍCIO DA PROCURA E RECEPTICIEDADE. Não há aceitacão da procuração. Há aceitação do mandato
ou de qualquer oferta de contrato por parte de quem precise, para o adimplemento, de outorga de poderes de
representação. A procuração é negócio jurídico unilateral, e não contrato. Quando o procurador recebe a
procuração, a outorga está consumada, como está consumada a promessa (unilateral) de recompensa (Código
Civil, art. 1.512-1.517) desde que chegou ao unus ex publico:
quem faz o que há de ter a recompensa não aceitou; não mais se cogitava de conclusão de negócio jurídico, e
sim de adimplemento do dever do promitente.
Se a pessoa a quem se fêz a outorga de poderes de representação tem dever de exercê-los, tal dever há de
resultar de outro negócio jurídico ou de lei. Se ela já iniciou o exercício. ou aceitou alguma oferta de contrato
ou há de responder como gestor de negócios alheios com outorga. Não se pode pensar em mandato (ou noutro
contrato), se não é de interpretar-se que a remessa da procuração implicava, na espécie, oferta de mandato (ou
de outro contrato), ou aceitação do contrato que o próprio outorgado oferecera, e se não houve oferta explícita
ou aceitação explícita. A oferta, explícita ou implícita, como a aceitação explícita ou implícita, pode ser ao
público. Por exemplo: o advogado põe nos jornais “Quem desejar figurar no pedido de mandado de segurança
que entrará em juízo no dia tal, remeta-me até o dia anterior a procuração”. Ai, há
oferta, ao publico, de contrato de advogado. A procuracão, que chegue, é negócio jurídico unilateral,
acompanhado de aceitação talvez somente tácita da oferta do contrato de advocacia. Se, ao reme ter a
procuração, o outorgante expressou que o outorgado tinha de responder dentro do prazo, ou apenas que tinha de
responder, surgem as seguintes situações: a) a resposta dentro do prazo é vinculação do procurador, por
aceitação de oferta (implícita) de mandato ou de outro contrato; b) a não-resposta o silêncio até se extinguir o
prazo é recusa da oferta do contrato e recusa de exercer os poderes unilateralmente conferidos; c) se não havia
prazo e se exigiu resposta, a outorga unilateral de poderes foi sob condição suspensiva, de modo que o exercício
dos poderes há de ser após a resposta.
7. FORMA DA PROCURAÇÃO. Para separarmos, rigorosamente, o que é comum ao mandato e à procura e o
que só se refere (z~ é especifico) ao mandato ou à procura, tivemos de tratar da forma da procuração no §
4.678, 3.
Se o poder de representação é para ato que não exija forma escrita, pode haver outorga oral de poder de
representar, sem que o art. 1.289 do Código Civil, sobre a procuração, seja invocável. O exemplo melhor
esclarece: A deixou no cambador duas canetas de ouro, velhas, para que E as vendesse, canetas que têm
gravado o nome de A; não se poderia pensar em contrato de comissão, porque o adquirente poderia exigir de E
a prova de que adquira de A as canetas, ou de pessoa que de A as adquira, ou de todos os sucessores de A até E.
Uma vez ou e a figura mais simples é a de outorga de poderes para alienar em nome de A, essa é a figura que se
há de presumir composta.
Por vêzes, têm-se confundido o assentimento conjugal a atos do outro cônjuge, a assistência (assentimento) do
titular do pátrio poder, da tutela ou da curatela, a atos de relativamente incapazes, e outros assentimentos, com a
procuração . Fazem inexpertos a instrumentação de tais manifestações de vontade como procuração. O êrro é
evidente, mas, por se tratar apenas de êrro de nome, sem conseqúências, se se adverte que assentir ou assistir

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não é outorgar poderes. Quem tem de assentir ou de assistir pode outorgar poderes, mas, aí, a procuração é para
que o procurador assista ou assinta, e o ato de assentimento ou de assistência depende do exercício da
procuração.

8.PLURALIDADE DE OUTORGADOS. A procuração pode ser passada a favor de duas ou mais pessoas. Se
nada se explicita no texto da procuração, nem resulta de diferentes qualidades das pessoas ou dos atos, os
poderes são outorgados com sucessão: um procurador há de funcionar na falta do outro, ou dos outros que
foram anteriormente designados. Há jus dispositivura. As cláusulas que podem ser insertas na procuração, para
que se afaste a solidariedade, foram apontadas a respeito do mandato (§ 4.679).
Na mesma procuração podem estar os nomes de procuradores sucessivos, de modo que os terceiros hão de
exigir a prova escrita de que os nomeados em lugares anteriores foram afastados. Sem essa prova, o que se há
de entender é que a pessoa que figurou na procuração é o procurador que pode exercer o poder ou os poderes
outorgados.

§ 4.694. Extinção da procuração extrajudicial

1. REVOGAÇÃO. De regra, a revogação da procuraçãoextingue os poderes de procura. Se foi inserta a


cláusula de irrevogabilidade, essa se opera objetivamente. O que se fêz irrevogável não pode ser revogado. Não
há eficácia da revogação se a outorga de poderes, em virtude de cláusula da procuração ou por lei, é
irrevogável. O outorgante não prometeu não revogar a procuração (dever de não fazer) ; o outorgante fêz
irrevogável a procuração. A manifestação de vontade que consistisse em revogação seria sem qualquer eficácia
de retirada da voz, que foi lançada definitivamente.
Em capítulo especial falaremos da procuração em causa propria.

2.MORTE DO PROCURADOR E MORTE DO PROCURADO. Os poderes outorgados cessam com a morte


do procurador ou com a morte do outorgante. A incapacidade superveniente do procurado não os extingue. É
preciso que se dê a interdição para que cessem os poderes outorgados.
3.DENÚNCIA PELO PROCURADOR. A renúncia, pelo procurador, é mais própriamente denúncia, e
denúncia cheia (“motivo justo”, Código Civil, art. 1.320).
4. MUDANÇA DE ESTADO. Se a lei estabelece que a mudança de estado, na espécie, faça cessar a procura,
os poderes outorgados cessam. O art. 1.316, III, do Código Civil de certo modo é remissivo.
5.INTERDIÇÃO DO PROCURADO OU DO PROCURADOR. A interdição, quer do procurado quer do
procurador, extingue os poderes. Enquanto não passa em julgado a sentença decretativa da interdição persistem
os poderes outorgados. Isso não quer dizer que, durante o processo, o curador ou algum dos legitimados a pedir
a decretação da interdição não possa pedir medida cautelar.

6.IMPOSSIBILIDADE SUPERVENIENTE DOS ATOS DE PROCURA.


Se os atos que, pelo procurado, havia de praticar o procurador, se tornaram impossíveis, cessam os poderes
outorgados. (Se a impossibilidade já existia, a espécie é de nulidade da procura; portanto, nenhum poder fôra
outorgado. O nulo não produz efeitos.)

7.EXERCÍCIO COMPLETO DOS PODERES. Enquanto há algum dos poderes que pode ser exercido,
persiste, a respeito do que resta, a procura. Se todos já foram exercidos, extingue-se a procura.

8.PRAZO, CONDIÇÃO RESOLUTIVA E PROCURAÇÃO. O outorgante pode estabelecer prazo ou condição


resolutiva para o exercício dos poderes outorgados. Se aquêle se esgota, ou essa se imple, dá-se a extinção da
procura.
Se o prazo ainda não foi esgotado, pode haver conveniência em prorrogação. A procuração, em que se diga
prorrogado o prazo, é instrumento de negócio jurídico unilateral que se integra no anterior. Não há duas
procuras, mas uma só que, em virtude da manifestação de vontade prorrogativa, se estende no tempo.
Se o prazo se esgotou, a outra procuração é instrumento de outra procura, ainda que o objeto e as cláusulas
sejam os mesmos. Em todo o caso, pode o primeiro procurador prover

a sua renovação, por ato do outorgante dentro de determinado tempo após o esgotamento do prazo, com efeitos

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a partir, retroativamente, do momento imediato àquele em que o prazo se esgotou, ou como resultado de
exercício de pretensão do procurador à renovação.

9.SUBSTABELECIMENTO DA PROCURAÇÃO E ExTINÇÃO DA OUTORGA DE PODERES. O


substabelecimento sem reservas, se, ~em virtude de cláusula negocial da procuração, ou ex lege, o pro,curador
pode substabelecer, determina a extinção automática da outorga de poderes. O substabelecimento é exercício de
facultas alternativa.
Cumpre que se distinga do substabelecimento da procuração (isto é, dos poderes da procuração) a
subprocuração. Na sub-procuração, o procurador não faz procurador do outorgante 1= do procurado) a pessoa a
que conferiu os poderes. Não há substituição. O subprocurador é procurador do procurador. Nenhuma
transferência houve da posição jurídica do procurador. Continua êle procurador e, por conta dêle, exerce os
poderes o subprocurador. Sobre a suboutorga e o subpoder, Tomo III, §§ 314, 8, e 821, 1. O assunto pertence à
teoria da representação e já foi longamente versado.

CAPÍTULO VI

PROCURAÇÃO JUDICIAL

§ 4.695. Procuradores e partes perante a Justiça

1.DIREITO PROCESSUAL E PROCURA JIJIHCIAL. O Código de Processo Civil, arts. 106-111, supôe o
direito material a respeito, que aliás o conceito de mandato não esgota e não é, sequer, o que mais acontece; não
o faz, nem o refaz. A priori, essa, pelo menos, deveria ser a atitude do legislador processual. Deixou isso de ter
conseqUências relativas à validade do texto, desde que o legislador central recebeu a função de edictar leis de
processo. As relações jurídicas entre os procuradores e as partes escapam, conceptualmente, à legislação
processual. Em todo o caso, os deveres de ética profissional e as regras de lei sobre a conduta dos advogados
constituem fundo comum em que os conceitos de “direito” e de “dever”, quer no plano do direito material quer
no plano do direito formal, bebem parte do seu conteúdo. Ésse fato de o conteúdo dos conceitos variar com o
fundo comum que varia é conhecido no método de fontes e interpretação das leis. A ambiência dos conceitos
legais não põe os conceitos como absolutos, e sim como relativos uns aos outros, sem se precisar das noções de
“ab-rogação” e “derrogação”, para se notar a variação de um conceito.
A procuração, como tôda outorga de poderes, é negócio jurídico. Ela, por seu conteúdo e sua construção formal,
negóelo jurídico unilateral. A opinião que negava ser negócio jurídico a outorga de poderes (e. g., ERNST
ZITELMANN, Irrtum und Rechtsgeschãft, 297 s.; J. 1-IUPKA, Die Vollmacht, 26) desde cedo se revelou
insustentável. O argumento de alguns, ERNST ZITELMANN à frente, era o de não haver, com a outorga, surgi
mento de direito subjetivo. O de J. HUPKA consistia em frisar que, com a outorga de poderes, nada se muda no
mundo jurídico. Deve-se a E. HÓLDER (Kom~mentar zum Allgemeinen Teu des Búrgerlichen Gesetzbucks, 1,
286) ter respondido àqueles. j.Por que se haveria de exigir que sempre nascesse direito subjetivo se o ato é
negócio jurídico? tSó os negócios jurídicos extinguem? A natureza negocial da outorga de poderes ficou assente
(H. DERNBURG, Pandekten, 1, IY ed., 278; F.RECELSBERCER, Pandekten, 1, 593; CARL CROME,
Sustem, 1, 459; G. PLANCK, Ritígerliches Gesetzbuch, 1, 215; 1-1. REHBEm, Das Búrgerliches Gesetzbuch,
1, 101; VIKTOR TRINKs, Vothnctchtserteilung und Einwilligung, 6).
A propósito do art. 1.317, II, do Código Civil, cumpre advertir-se que a irrevogabilidade resulta da ligação com
o contrato. A outorga de poderes não deixa de ser abstrata. Apenas há interesse, contratual, do terceiro, para
quem se há de adimplir algo com o exercício da procuração pelo procurador. A procura é no interesse do
outorgante, ou dêle e do terceiro, e não do procurador, o que puseram bem claro J. BIERMANN (Zur Lehre
vou der Vertretung und Vollmacht, Fest gabe .f’Ur H.DERNBURG, 21), EDUARD GOLDSCHMIDT
(Bevollmdchtigung und gewilfltriirte Stellvertretung, 50 s.) e JAMES BREIT (Lhe Gesckãftsfãhigkeit, 208).

2.REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. A respeito dos “procuradores” (processuais) convém abstrair-se da


relação jurídica entre o procurador e a parte. O que interessa é a representação processual, relação jurídica
entre a parte e o juízo, através de alguém. É a procura, conceito diferente e mais vasto do que o de mandato, a

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despeito da expressão “mandato”, que aparece logo no Código de Processo Civil, art. 106, por defeito de
terminologia vulgar que acabou por se introduzir nas leis. Muito se ganharia em usar, sempre, a expressão
“procura processual”, ou “procura judicial”, de conteúdo suficientemente largo e exato.
Nunca deixemos de atender a que pode haver (e é o que mais acontece) a procuração, o contrato de mandato e
o contrato de advocacia, que é, de regra, locação de serviços. Se o advogado presta os serviços gratuitamente,
de locação de serviços não se pode falar. Por outro lado, o contrato de locação de serviços pode ser contrato de
trabalho, de modo que há o contrato de trabalho e a procuração, sem haver o contrato de mandato. Pode,
outrossim, ter sido concluído o contrato de trabalho, sem se ter dado (ou remetido) a procuração, o que não
habilita o advogado a mais do que ao exercício da pretensão à caução de rato.
Lê-se no art. 106 do Código de Processo Civil: “O ingresso das partes em juízo requer, além da capacidade
legal, a outorga de mandato escrito a advogado legalmente habilitado”. Em vez de “mandato” deveria estar
“procuração”. O mandato, se existe, pode ser oral. O que mais ocorre é que o advogado faz com o cliente o
contrato de locação de serviços, ou de obra, ou o contrato de trabalho (menos frequente) e recebe depois a
procuração, que é inconfundível com o contrato entre cliente e advogado e, a fortiori, com o contrato de
mandato, que pode não existir e pode ser concluído com outra pessoa, que constitua procurador algum
advogado, ou, até, que substabeleça a procuração, com a judicialidade, a advogado. Só o advogado pode, em
juízo, prestar serviços, obra ou trabalho de advogado, e exercer procura em juízo. Pessoa estranha à advocacia
pode ser mandatário, ou procurador para que constitua procurador judicial, ou substabeleça, com caráter
judicial, a procuração.
A procuração judicial pode não ser ligada a mandato. Raramente o é.
O art. 106, § 1.0, do Código de Processo Civil permite que as partes defendam os seus direitos, se legalmente
habilitadas para a advocacia. Outrossim, se no lugar não há advogado, ou os que há recusam ou estão
impedidos.
O art. 106, § 1.0, pr., do Código de Processo Civil fala dos advogados legalmente habilitados. A capacidade
legal é dada pelo direito material, vulgarmente o direito civil, porém não só êle, em muitos casos. Há, ainda, a
respeito, a capacidade postulacional.
Oadvogado pode ingressar nos autos ou promover a ação em virtude de substabelecimento de procuração por
procurador não-advogado (5.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 10 de abril de 1951, D.
da J. de 18 de março de 1958; 23 Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 13 de março de 1951, E.
dos T., 192, 250), ou se é um dos procuradores.
Quanto aos contratos de advogado feitos por inventariante, cumpre observar-se que o contrato com o
inventariante somente pode ser para os atos que caibam na função do inventariante. Não para atos processuais
ou extraprocessuais dos herdeiros. Cf. 3•a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, 27 de
outubro de 1941 (A. J., VI, 458 s.).
A representação sem poder de representação é ineficaz. O processo ou ato processual não tem eficácia quanto à
parte que se dizia representar. Não se trata de nulidade (2Y- Turma do Supremo Tribunal Federal, 11 de outubro
de 1949, O D., 67, 173, com impropriedade de linguagem, e 2•a Turma, 3 de dezembro de 1948, O D., 60, 285).
Quem foi representado por advogado sem poderes não entrou, eficazmente, no processo.
As decisões que negam a ratificabilidade do ato processual em que funciona pessoa sem procuração partem da
premissa falsa de se tratar de nulidade (e. g., 6~a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 19 de
fevereiro de 1952, R. dos T., 199, 400), e não atenderam ao art. 107, in fine, que mostra admitir-se a ratificação.
A 1.a Câmara Civil, a 22 de fevereiro de 1951 (192, 228), assentou, e bem, que, embora interposta por
advogado sem poderes, é de se tomar conhecimento da apelação se, dentro do prazo legal, foi oferecida
procuração com poderes bastantes. A ratificação pode dar-se até a hora de se iniciar o julgamento. Se não
advém ratificação, o recurso foi ineficaz (cp. Tribunal Regional do Trabalho da 2.~ Região, 21 de junho de
1951, E. dos 2’., 194, 1028). O caminho, para o advogado, teria sido o de promover a caução de rato.
A ratificação tem de ser escrita; mas, na Justiça do Trabalho, têm-se admitido procura tácita e ratificação tácita
(í.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, 27 de dezembro de 1951, O. da J. de 30 de novembro de 1953). Há
ainda a serem consideradas as regras jurídicas especiais do art. 848, §§ 1.0 e 29, da Consolidação das Leis do
Trabalho (Decreto lei n. 5.452, de 1.0 de maio de 1943>.
O Conselho de Justiça do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 16 de setembro de 1950 (D. da J. de 10 de
julho de 1951), admitiu o pedido de purga da mora pela própria parte, por envolver confissão. O fundamento é
supérfluo (cf. 6.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 9 de janeiro de 1951, R. dos 2’., 211,
522).

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Os serviços de advogado podem ser prestados ao Estado, ou a autarquia, ou a entidade paraestatal, ou a alguma
emprêsa, de modo que não exista contrato de mandato ou locação de serviços entre quem recebe os serviços e
quem os presta. Outra figura se interpõe. Às vêzes ocorre que, nos estatutos de emprêsa, se entregue a seção
jurídica a um dos diretores, advogado, e se considere tal diretor um órgâo para a atividade processual, espécie
em que, por analogia, se há de invocar o art. 106, ~ 1.% do Código de Processo Civil, ou a pessoa a quem o
presidente da emprêsa, ou a diretoria, há de outorgar poderes de procura judicial.

8.CAPACIDADE POSTULACIONAL. Advogado legalmente habilitado é que pode procurar em juízo;


portanto, excluídos os solicitadores, respeitadas apenas as autorizações antes concedidas (Código de Processo
Civil, Disposições finais e transitórias, art. 1.050). Tem de ser inscrito no quadro da Ordem dos Advogados
(Decreto n. 20.784, de 14 de dezembro de 1931, art. 21). O que a lei proibe é o ingresso em juízo, ou a prática
dos atos processuais. A relação entre as partes e alguém, que delas receba poderes, não lhe interessa. Tal relação
jurídica pertence ao direito material, público, ou privado, em que se plasmou a relação jurídica. O que a lei
proibe, portanto, é apenas a representação processual, no sentido estrito e exato. A pessoa que recebeu poderes
de alguma das partes não fica privada de substabelecê-los em advogado legalmente habilitado. Essa solução,
adotada pela antiga Côrte de Apelação do Distrito Federal (A. J., 34, 249), a 9 de maio de 1984, confirmava
corrente anterior, a despeito da criação do quadro da Ordem dos Advogados.
A representação por pessoa não inscrita na Ordem dos Advogados produz nulidade dos atos processuais
(Decreto n. 22.478, de 21 de fevereiro de 1988, art. 24) ; os atos praticados por pessoas impedidas (não as
proibidas!) de advogar são desconstituíveis, somente podendo requerer a decretação a outra parte interessada no
mesmo processo (Decreto n. 22.478, art. 24, § 1.0). O art. 24, § 19, do Decreto n. 22.478 refere-se ao art. 11, e
não ao art. 10; de modo que deve ter havido lapso no julgado da lA Turma do Supremo Tribunal Federal, a 27
de outubro de 1949 (1?. F., 148, 118), que aludiu a “impedidos ou proibidos de advogar”. A nulidade por não
ser inscrito na Ordem dos Advogados o procurador judicial é nulidade cominada; a nulidade, por ter funcionado
pessoa proibida, se não há a nulidade por falta de inscrição, é nulidade não cominada.
(Mais uma vez frisemos, com tôda a precisão: a atividade de quem não tem poderes para estar em juízo, ou não
os tem suficientes, é ineficaz; a atividade de quem não pode procurar em juízo, mesmo se houve outorga de
poderes, é causa de nulidade.)
Não há procuração judicial outorgada pela parte se o caso é de assistência judicial, ou cabe ao juiz nomear o
advogado (Código de Processo Civil, art 106, § 1.~, 1a parte). As exceções do art. 106, §§ 1/~ e 29, não são as
únicas. Se a lei material, de direito público ou de direito privado, ou os estatutos da pessoa jurídica conceberam
a relação jurídica entre a parte e o advogado sem ser como direta, tem o juiz de se satisfazer com o escrito,
desde que o investido de poderes tenha capacidade legal e seja advogado legalmente habilitado. A exigência do
registo da procuração só lei especial pode dar. O Código de Processo Civil não no exige. Nem exige o Código
de Processo Civil mais do que o reconhecimento da firma, O art. 106 não derroga o art. 1.824 do Código Civil;
se bem que fôsse excesso da lei de direito material tratar do “mandato judicial” (‘fl, na sua forma. A 2•a Câmara
Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 11 de novembro de 1941 (R. F., 89, 508), entendeu que é preciso
o reconhecimento da firma, mas é formalidade suprível a qualquer tempo.
Se a parte é advogado legalmente habilitado (ou solicitador autorizado antes do Código de Processo Civil, cf.
Disposições finais e transitórias, art. 1.050), pode defender, por si só, os seus direitos em juízo, ou como autor,
ou como réu, ou em qualquer outra posição jurídica processual. Nem seria de admitir-se a obrigatoriedade da
representação. Já é muito que se exija a formalidade de cursos jurídicos que nem sempre correspondem à
realidade das habilitações. Os conceitos de advogado e legalmente habilitado não são conceitos de direito
processual.
O Estado fêz da profissão de advogar função dependente dêle, no que se refere à habilitação, deixando livre a
escolha. Não há classificação por instâncias, nem matérias; de modo que o princípio da igualdade, interior à
classe, continua intacto. A capacidade para exercer, nas ações, a advocacia, é chamada capacidade
postulacional.

O art. 106, § 1.0, prevê que não exista, no lugar, advogado, ou que não aceitem o mandato judicial os que
houver, ou não o aceite o que houver; e permite que a parte mesma defenda os seus direitos. Entenda-se: ela, ou
pessoa sem habilitação legal (2A Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, 23 de fevereiro de 1951,
Paraná J., 53, 590; Tribunal de Justiça do Piauí, 25 de setembro de 1952>.
Em país de extenso território, de comarcas quase despovoadas, em que muita vez o único letrado foi escolhido

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para juiz, é natural que se pense na falta de advogado no lugar, ou recusa, ou impedimento, dos que haja.
Recusa do advogado significa recusa por parte daquele que vai litigar (Reg. n. 737, de 25 de novembro de 1850,
art. 703: “não sendo êles da confiança da parte”), ou por parte do próprio advogado, quando, segundo o seu
estatuto, puder esquivar-se ao patrocínio da causa. Os impedimentos são as proibições legais ou de ordem
ligada à fôrça maior (individual), como doença, ausência forçada, ou suspensão do serviço profissional.
No caso de nomeação do advogado, o Estado, através do juiz, na sua função protectiva, investe de poderes o
advogado escolhido. O “mandato” não só seria desnecessário como também simularia relação jurídica que na
espécie não existe. Quando o Estado investe de poderes o advogado ou o curador especial, de nenhum modo
constitui mandatário. Muitos erros na aplicação do direito resultam dessa expansão da noção de mandato, que
durante muito tempo invadiu todo o domínio do direito público, levando, aqui e ali, a consequências
contraditórias com a natureza, a finalidade e a própria economia das instituições de direito público. Aliás, êsse
advogado nomeado não tem os poderes que só a própria parte poderia conferir, ou por mandato ou por outro
instituto de direito público ou privado. Não recebe citação inicial; não confessa; não transige; não desiste; não
recebe nem dá quitação; não firma compromisso; nos casos em que tem de litisdenunciar, ou chamando ou
nomeando alguém à autoria, não pode desligar-se da causa sem ciência do juízo que o nomeou.
Se alguma lei atribui a determinado funcionário público receber citações, ou propor ação, em nome da União,
ou do Estado-membro, ou do Município, ou de alguma autarquia, oti entidade paraestatal, tal funcionário
público não tem mandatário: é outorgado, ex lego, de poderes para agir em juízo.
Na Lei n. 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, art. 16, estatuiu-se: “Se o advogado, ao comparecer em juízo, não
exibir o instrumento do mandato (?) outorgado pelo assistido, o juiz determinará que se exarem na ata da
audiência os têrmos da referida outorga”. Tal regra jurídica só diz respeito aos advogados que funcionem como
de assistência judiciária, o que der-roga, só nesse ponto, o art. 106, § 2.0, do Código de Processo Civil. (Em
lugar de “mandato” leia-se “procuração”.)
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4.CONCEITO E NATUREZA DO CONTRATO DE ADvOGADO. No trato superficial do chamado “mandato
judicial”, expressão equivoca, ou, melhor, equivocamente empregada pelo vulgo, pela doutrina e por textos
legais, as confusões entre o contrato de mandato judicial, o contrato de advogado e a procuracão judicial sao
grandes; e é presente que se clareie o assunto.
O contrato de advogado é negócio jurídico bilateral distinto do contrato de mandato e da procuração, que é
negócio jurídico unilateral. Por isso mesmo, não há procuração oral para funcionar em juízo, pôsto que o
contrato de advogado possa ser oral. Cf. 2•a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 11 de março
de 1940 (R. dos T., 127, 204).
Tem havido grave confusão entre o contrato de locação de serviços ou o contrato de trabalho do advogado e o
mandato. Diz-se, por exemplo, que o mandato judicial não se presume gratuito. Não há regra jurídica que o
diga. O art. 1.290, parágrafo único, do Código Civil é concernente a qualquer mandato. Não se presume
gratuito, porque a advocacia é profissão lucrativa. E contrato de advocacia não é mandato. Pode, até, ser
gratuito, sem ser mandato.
A remuneração ajustada é cláusula do contrato de mandato, ou de outro contrato de que haja resultado a
procuração.
Não há remuneração ao procurador. Qualquer remuneração há de ser em virtude de outro negócio jurídico. À
unilateralidado do negócio jurídico da procura seria absurdo que se ligasse a contraprestação, que é elemento
dos contratos bilaterais ou das doações (negócios jurídicos bilaterais), remuneratórias.
A propósito do mandato judicial, cumpre que se façam distinções rigorosamente conceptuais e precisas.
a) O contrato com o advogado é negócio jurídico bilateral em que algumas regras jurídicas são invocáveis. Não
é mandato. O que se chama, vulgarmente, mandato judicial, é a procura. Cf. art:. 1.324-1.829 do Código Civil.
O art. 1.330 alude ao contrato, “escrito ou verbal, em que se lhes houvessem ajustado os serviços~~ . Assim,
por exemplo, advogado que dá conselho, inclusive sobre a propositura da ação, é responsável por negligência.
O advogado contrata, “verbalmente, ou por escrito”, honorários, de acôrdo com as praxes e taxas habituais no
local, sendo, porém, vedado estipular, a título de honorários, a participação em bens (Decreto n. 22.478, de 20
de fevereiro de 1938, art. 25, VII). Trata-se de locação de serviços ou de locação de obra; menos
freqúentemente, de contrato de trabalho, o que só se estabelece se foi atendido o art. 89 do Decreto-lei n.
5.452, de 19 de maio de 1948.
b) O contrato de serviços ou de obra ou de trabalho em que é figurante o advogado, regula-se, no seu conteúdo
e no modo de se fazer a prestação de serviços, pelo contrato, em suas cláusulas, inclusive tácitas, conforme os

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usos do tráfico e as circunstâncias~ Por vêzes, pela natureza do serviço, há de prevalecer a liberdade limitada
do advogado em relação às ordens de quem tem direito aos serviços. O advogado não se escusa da
responsabilidade dos seus atos com a alegação de ter seguido as instruções do cliente ou de se ter adstrito às
ordens recebidas (e. g., “recorra”, “não recorra”).
O contrato do advogado não é revogável. A revogabilidade da procuração, que é negócio jurídico unilateral,
abstrato, de modo nenhum implica a revogabilidade do contrato de advogado. Se há locação de serviços, ou de
obra, ou de trabalho, de revogação não se há de falar; mas sim de resolução ou de resilição, de denúncia cheia,
ou de denúncia vazia. Para se saber qual a regra jurídica ou quais as regras jurídicas invocáveis, tem-se,
preliminarmente, de verificar se houve conclusão de contrato de locação de serviços, de obra, ou de trabalho.
O contrato de serviço de advocacia não se presume gratuito. Presume-se remunerado. Não se trata de mandato,
mas de locação de serviços, ou de obra, ou de contrato de trabalho. Em todos, a regra é o dever de remuneração.
“Não se tendo estipulado”, diz o Código Civil, art. 1.218, “nem chegado a acôrdo as partes, fixar-se-á por
arbitramento a retribuição, segundo o costume do lugar, o tempo de serviço e sua qualidade”. No Decreto-lei n.
5.452, de 1.0 de maio de 1943 (Consolidação das Leis do Trabalho), art. 460, estatui-se: “Na falta de
estipulação do salário ou não havendo prova sobre a importância ajustada, o empregado terá direito a perceber
salário igual ao daquele que, na mesma emprêsa, fizer serviço equivalente, ou do que fôr habitualmente pago
para serviço semelhante”.
Na jurisprudência, é lamentável a invocação das regras jurídicas sobre mandato, por faltar conhecimento da
distinção mandato e procuração, o que levou a falar-se de mandato judicial, sem se advertir que o mandato
judicial é raro e freqúentissima, necessária mesmo, a procuração judicial.
A denúncia vazia somente cabe se não há prazo fixado para a duração do contrato, nem se há de entender que o
contrato é para se levar até o fim a prestação de serviços, de obra ou de trabalho.
No art. 1.329 do Código Civil diz-se: “Sob pena de responder pelo dano resultante, o advogado ou procurador,
que aceitar a procuração, não se poderá escusar sem motivo justo, e, se o fizer, avisará em tempo o constituinte,
a fim de que lhe nomeie sucessor”. Aí apenas se explicita que, tendo sido a procuração dada para cumprimento
de locação de serviços, ou de locação de obra, ou de contrato de trabalho, o contraente prestador de serviços
somente pode deixar de adimplir o que prometeu se há “motivo justo” com que encha a denúncia. Tal motivo
justo é o que se há de ter como tal para o caso de locação de serviços, ou para o caso de locação de obra, ou
para o caso de contrato de trabalho.
No art. 1.880, acrescenta o Código Civil: “As obrigações do advogado e do procurador serão determinadas,
assim pelos têrmos da procuração, como, e principalmente, pelo contrato escrito, ou verbal, em que se lhes
houvesse ajustado os serviços”. Obrigações de quem exerce a procura, não do procurador como tal.

5.PRESSUPOSTOS FORMAIS DA PROCURAÇÃO. O Código Civil, ao tempo da pluralidade do processo,


entendeu exigir às procurações para juízo não só o reconhecimento da firma, como também o da letra (art.
1.289, § 49, derrogado). O Código de Processo Civil satisfaz-se com o reconhecimento da firma e não fala em
qualquer registo da procuração. Prevaleceu o Código de Processo Civil, por ser lei, posterior, do mesmo foco
legislativo. No que se refere a abrogaçóes e derrogações, quando dois textos são incompossíveis e a mesma a
autoridade legislativa, prevalece o texto posterior. Demais, o art. 107 do Código de Processo Civil pertence a lei
especial, no assunto da sua especialidade. A procuração pode ser dactilografada, impressa, ou escrita por
outrem. O que importa é que a firma seja do outorgante e essa firma tenha sido reconhecida.
Lê-se no Código Civil, art. 1.824: “O mandato judicial pode ser conferido por instrumento público ou
particular, devidamente autenticado a pessoa que possa procurar em juízo”. A redação não é boa. Primeiro, ou
a) mandato judicial se chama ao mandato a respeito de atos que hão de ser praticados em juízo, ou b) apenas ao
mandato para êsses atos. A inteligência do art. 1.324 no sentido de b) deixa margem para que se possa concluir
contrato de mandato com B, que não pode procurar em juízo, de modo que E substabeleça a quem possa
“procurar em juízo”. No sentido de a), não poderia A, herdeiro no inventário do pai, por exemplo, fazer
mandatário a E, médico, para que êsse escolhesse o advogado. O mandato, a respeito de atos que têm de ser
praticados em juízo, com poderes conferidos a pessoa que não pode procurar em juízo, não é mandato para os
atos processuais, mas sim para constituir procurador em juízo, ou concluir contrato de mandato, ou, até, fazer
contrato com o advogado. Desde que se parta de tais precisões indispensáveis, tudo se resolve sem dificuldade.

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Se apenas houve a procuração para juízo passada a pessoa que não pode advogar, ou que, in casu, não o
poderia, tem-se de entender que se outorgou poder de substabelecimento, se o outorgante sabia que o outorgado
não é advogado, ou que não poderia funcionar como tal. A atitude do intérprete é a de quem percebe, na
procuração, cláusula implícita. O art. 1.800 do Código Civil não é invocável, porque se afirma a permissão
implícita.
Diz-se apud acta. a procuração feita por têrmo nos autos:
escreve-a o escrivão da causa, perante o juiz, e assinam-na os outorgantes ou o outorgante e alguém que haja de
assistir ou assentir (cf. JOsÉ MARIA DA TRINDADE, Coleção de Apontamentos jurídicos sobre as
Procurações extra judiciais, nota 39). Nada obsta a que na procuração apud acta também se outorguem poderes
extrai udiciais, ou mesmo que os poderes outorgados só sejam extrajudiciais

6.FALTA E DEFEITUOSIDADE DA PROCURAÇÃO. A falta de procuração, ou a apresentação de procuração


defeituosa, ou a juntada de procuração sem a firma reconhecida do outorgante, não tem as conseqUências que
sola ter ao tempo em que se exigia ser apurado se era sanável ou insanável a nulidade. A qualquer tempo pode
dar-se sanação ou ratificação. Advirta-se em que o Código de Processo Civil manda que o juiz, decorrido o
prazo para a contestação, ou reconvenção, se houver, saneie, por despacho, dentro de dez dias, os autos. Então
pronunciará as nulidades insanáveis e mandará suprir as sanáveis ou as simples irregularidades (Código de
Processo Civil, arts. 298 e 294). Para a sanação ou ratificação deve o juiz marcar prazo (art. 295).
As nulidades decorrentes de infrações dos arts. 106 e 107 do Código de Processo Civil são nulidades não-
cominadas; de modo que é aplicável o art. 278, onde se faz a diferença.
Insistamos: falta de poderes é causa de ineficácia, não de nulidade.

7.PLURALIDADE DE OUTORGAS. No art. 1.327 do Código Civil cogita-se da pluralidade de outorgas:


“Constituídos, para a mesma causa e pela mesma pessoa, dois ou mais procurado
res, consideram-se nomeados para funcionar na falta um do outro, e pela ordem da nomeação, se não forem
solidários. Mas a nomeação conjunta pode conter a cláusula de um nada praticar sem os outros”.
Se há pluralidade de outorgados, o outorgado que não é o primeiro tem o ônus de alegar e provar que o anterior
ou os anteriores faltam, ou que foram nomeados com solidariedade. Se o terceiro admite o exercício do poder
de representação sem que haja a prova da falta do anterior ou dos anteriores, há de ser tratado como o terceiro
que se pôs na situação prevista no art. 1.306 do Código Civil.

8.IMPEDIMENTO PARA A PROCURA JUDICIAL. Lê-se no Código Civil, art. 1.825: “Podem ser
procuradores em juízo todos os legalmente habilitados, que não forem: 1. Menores de vinte e um anos, não
emancipados ou não declarados maiores. II. Juizes em exercício. III. Escrivães ou outros funcionários judiciais,
correndo o pleito nos juízos onde servirem, e não procurando êles em causa própria. IV. Inibidos por sentença
de procurar em juízo, ou de exercer ofício público.
V.Ascendentes, descendentes, ou irmãos do juiz da causa.
VI.Ascendentes ou descendentes da parte adversa, exceto em causa própria”.
Os juizes em exercício não podem ser procuradores em juízo. O impedimento não atinge os juizes que não
estão em exercício, como os licenciados. Se os juizes licenciados não podem exercer advocacia, di-lo a lei que
rege a função judiciária ou a que concerne a advocacia. O art. 1.325, II, do Código Civil só pré-excluiu os
juizes em exercício (contra, o Superior Tribunal de Justiça de Mato Grosso, 16 de novembro de 1928).

9.CAPACIDADE DO PROCURADOR JUDICIAL. Se o procurador judicial é incapaz, há a exceção de


incapacidade, de que que falaram as Ordenações Afonsinas, Livro III, Título 22 (“por ser emfanado, ou menor
de idade, ou por alguma outra rezam”). Se a incapacidade é só postulacional, por não ser advogado o
procurador, ou lhe faltar outra qualidade que se exija para funcionar em juízo, pode o procurador substabelecer,
se lhe foi dado tal poder. Substabelecer não é postular.

§ 4696. Poderes “ad judicia”

1. PODERES ESPECIAIS. Lê-se no Código de Processo Civil, art. 108: “A procuração que contiver a cláusula

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ad iudicia ixabilitará o procurador a praticar todos os atos do processo, dispensada a menção especial de outros
poderes, salvo para receber citação inicial, transigir, desistir, receber e dar quitatão, e firmar compromisso”. A
procuração para juízo habilita a todos os atos do processo, exceto para receber citação, inclusive a de chamada
ou nomeação à autoria, confessar, transigir, desistir e praticar atos que resultem em desistência (como deixar
que se expirem prazos que importem perda da ação), receber, dar quitação, firmar compromisso.
No art. 1.326, diz o Código Civil: “A procuração para o fôro em geral não confere os poderes para atos que os
exijam especiais”.
A procuração para o fôro em geral dá poderes para interpor quaisquer recursos, inclusive o recurso
extraordinário, não para propor a ação rescisória da sentença mesmo se no processo em que o advogado
funcionou.
o caso de ineficácia, por ter praticado algum dos atos vedados pelo Código de Processo Civil, art. 108, cabe ao
juiz proceder na forma dos arts. 293, 294, 1 e III, 295 e 296 do Código de Processo Civil. A qualquer tempo
pode dar-se a ratificação.
O poder de recorrer e o de variar de recurso incluem-se nos poderes ad indicia (Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Ceará, 4 de agôsto de 1952, 1. e 11, VIII, 286).

2.ADVOCACIA A FAVOR DE OUTREM E ADVOCACIA EM CAUSA PRÓPRIA . Quem atua em juízo a


favor de outrem ou em causa própria tem de declarar na petição inicial, ou na contestação , o lugar, na sede do
juízo, onde é encontrado para as intimações (Código de Processo Civil, art. 111). As mudanças de domicilio têm
de ser comunicadas ao escrivão do feito. Se há omissão, é eficaz a intimação que se fêz em carta registada, ou
telegrama, para o enderêço que fôra declarado (art. 111, § 1.0). Antes de despachar a petição inicial, ou de
receber a contestação, há de exigir o juiz que seja indicado o domicílio (art. 111, § 2?).
A providência é para o recebimento de intimações. Recebe-as o advogado, ou a parte advogado em causa
própria, ou a pessoa sem ser legalmente habilitada, no caso do art. 106, § 1.0, do Código de Processo Civil.
Se os procuradores ou as partes não observam o art. 111, § 1.~, pode o escrivão intimar o faltoso a cumpri-lo
(Código de Processo Civil, art. 168).
O§ 2.0 do art. 111 do Código de Processo Civil está de acôrdo com a função do juiz, que o legislador, fugindo à
tradição menos estatalista do Brasil, lhe atribuiu. Porém aí nada de nôvo contém a providência de simples
direção material do feito. O direito anterior reconhecia ao juiz êsse papel de verificar as petições, de pôr em
ordem peças e atos, evitar o tumultuamento dos autos, a confusão propositada ou acidental nas discussões, etc.
lSe o juiz não no fêz antes? Pode ordená-lo, a qualquer tempo, sendo observado, muta~is mutandis, o art. 106, §
1.0, do Código de Processo Civil.
No processo, em caso de ser o autor procurador em causa própria, há cumulação de funções: a) a função de
parte (ou de assistente litisconsorcial, ou de assistente simples) e b) a função de advogado. As regras jurídicas
sobre capacidade são as relativas a cada uma dessas funções.
É preciso não se confunda a procuração em causa própria, no plano do direito material, com a procuração em
causa própria, no plano do direito processual. Quem é, materialmente, procurador em causa própria e o pode
ser, também, processual-mente, se exerce a procura processual em causa própria, é tratado como quem quer que
seja titular do direito e com aptidão à procura processual em causa própria.
As regras jurídicas sobre a procura processual em causa própria são as do art. 111 do Código de Processo Civil
e as de direito público sobre habilitação profissional dos advogados.

§ 4.697. Caução de rato

1. CONCEITO. A caução de rato sempre foi admitida no direito luso-brasileiro, quer como promessa de fato
próprio (e. g., apresentar, se se esqueceu do instrumento, ou perdeu o traslado ou a certidão que tinha consigo),
quer como promessa de fato de terceiro (= promessa de ser reproduzido o instrumento, em declaração
reprodutiva de vontade, ou de nôvo mandato, ou de ratificação). Na última espécie, há promessa de fato de
terceiro (in condicione, não in obligatione, subentendendo-se o “me effecturum”). O direito ateve-se ao
postulado de só se poder começar o fato próprio, devendo-se entender que prometer o fato de outrem é
prometer diligenciar por obtê-lo. Mas essa construção é bem frágil para o romanismo da caução de rato, com
as regras jurídicas do Código de Processo Civil, um tanto novas. Diz o art. 110 do Código de Processo Civil:
“Sem a apresentação do instrumento de mandato, ninguém será admitido em juízo para tratar de causa em nome
de outrem, salvo, em caso de urgência, quem se obrigue, mediante caução, a concordar com o que fôr julgado e

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a exibir procuração regular dentro em prazo fixado pelo juiz”. Absurdo o acórdão do Tribunal de Justiça de São
Paulo, a 13 de fevereiro de 1921 (E. dos T., 37, 292), que só admitia a caução de rato se o procurador não tinha
à mão a procuração, ou se à procuracão algo faltasse. Não era certo, nem no é hoje, nem há, em qualquer dos
casos, suspensão da causa (Tribunal de Justiça de São Paulo, 12 de dezembro de 1918, 29, 158 s.).

2.CAUÇÃO DE RATO E PRESSUPOSTOS. No art. 110, estatui o Código de Processo Civil: “Sem a
apresentação do instrumento do mandato” leia-se “do instrumento da procuração” “ninguém será admitido em
juízo para tratar de causa em nome de outrem, salvo, em caso de urgência, quem se obriga, mediante caução, a
concordar com o que fôr julgado e a exibir a procuração regular dentro em prazo fixado pelo juiz”. E no
parágrafo único: “Os atos praticados ad referendum serão havidos como inexistentes, se a ratificação não se
realizar no prazo marcado”.
Dizia-se que o marido pode pedir caução de rato pela muIher, e não a mulher pelo marido (e. g., 5. DE M.,
Manual Prático do Procurador, 1, 89). Hoje, evidentemente sem razão.

3.CAUÇÃO QUE SE HÁ DE PRESTAR. A procuração com caução de rato presta-se mediante caução, real
ou fidejussória. Essa caução abrange tôda a responsabilidade do que se passa desde a sua assinatura, ou antes
dela, se é o caso, até à apresentação da procuração, no prazo que o juiz fixar. Os efeitos da ratificação são ex
tunc, apanham todos os atos do processo praticados durante a caução de rato. A caução é sempre judicial . No
direito anterior, fundava-se no Aviso n. 43, do Ministério da Fazenda, de 18 de março de 1882.
No direito romano, se o procurator se apresentava como autor, o réu podia exigir-lhe a cautio ratam rem
dominum habiturum, para resguardar-se do risco de lhe mover outro processo o dominws (GAIO, IV, 84, 97 e
98; Vaticana Pra gmew. ta, 333; aliás, o Frag. 340 mostra que havia casos de caução de rato prestada pelo
procurador do réu).
Hoje, a caução de rato pode ser prestada, indiferentemente, pelo procurador do autor, ou pelo procurador do réu.
segundo o sugeriu a natureza das coisas, a bilateralidade da postulação; ou por quem quer que possa postular.
Não depende de aceitação da outra parte, porque pode ser do interesse do juízo, de outra parte, ou de terceiro
(CHR. Fn. VON GLÚCK, Ausfiihrliche ErWuterung der Pandeeteu, III, 444), e a sua falta é causa de
inexistência dos atos, se, exigida, não foi prestada. Por isso mesmo que interessa ao Estado, é exigível de ofício.
Se há interesse do Estado em proteger o dontinus litis, o juiz tem o dever de exigi-la, conforme já o mostrara
J.H. BOEHMER, na sua dissertação de 1712.

4.INADIMPLEMENTO DA PROMESSA. Estatui no art. 110, parágrafo único, o Código de Processo Civil:
“Os atos praticados ad referendum serão havidos como inexistentes, se a ratificação não se realizar no prazo
marcado”. Os atos não serão nulos; e sim inexistentes. Portanto, nenhuma ratificação é possível depois de
expirado o prazo. Os atos são como se não houvessem sido processados. Não cabe, aí, invocar-se o art. 275 ou
qualquer outro. O caucionante responde, então, pelo que fêz ao réu ou ao autor que pretendia representar
<Código Civil, art. 1.332).
Usava-se a caução de rato também no caso de ser defeituosa a procuração, ou o procurador sem poderes
suficientes, etc. Se êsse não foi obrigado a recorrer à caução de rato, o juiz, por ocasião do despacho saneador,
lhe marcará prazo para suprir a falta. Não se hão de confundir as duas espécies.

Todavia, nada obsta a que a pessoa, cuja procuração não satisfaça, qualquer que seja a causa., requeira a
prestação da caução ce rato. Quem pode o mais dizer que não tem procuração, ou retira-la pode o menos
(enunciar que não é bastante, ou que não vale, ou que não mais tem eficácia).
A caução segura o juízo e a satisfação dos danos que o procurador com caução de rato causa às partes litigantes.
Se houve sentença e “passou em julgado”, o procurador, a que não chega a procuração, tem de sofrer a
execução; Rias o domínus está incólume.
Alguns problemas podem surgir. Por exemplo: antes de começar o prazo para a interposição do recurso, o
advogado pede para prestar caução de rato e recorre. Antes de chegar a ratificação, julga-se o recurso, perdendo
o recorrente. Solução: o prazo não correra contra o legitimado recursal ativo e pode êle interpor, devidamente, o
recurso. O advogado que mio juntou a ratificação assume as consequências do julgamento, inclusive a de
indenizar ao recorrido. Pode dar-se que o prazo não tenha começado de correr contra o recorrido, e tenha
havido a caução de rato, com os mesmos resultados de julgamento desfavorável ao recorrido. Não pode ter
eficácia contra o não-ratificante o julgamento. Também se pode dar que o advogado que prometeu a ratificação

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perca algum prazo. É sem consequências contra o legitimado recursal, seja ativo seja passivo, a expiração de
prazo a que, ex hypothesi, êle fôra estranho.
5.PROCURAÇÃO COM CAUÇÃO DE RATO POR ADVOGADO OU NÃO. o advogado, ou o que se
obrigue, constituindo advogado para os atos postulacionaís, e os outros, entenda se, estão sujeitos aos arts. 110
e 111 do Código de Processo Civil.
Se o que caucionou de rato não é advogado, o que figura como advogado pratica os atos como procurador com
poderes conferidos, e é procurador do procurador com caução de rato. Se sobrevém, tempestivamente, a
ratificação pelo autor ou réu, que o procurador com caução de rato representou, passa êle a ser advogado do
autor ou réu, salvo se a ratificação pré-exclui assumir o autor ou o réu representado a situação do caucionante
de rato perante o advogado (~ não perante a justiça 9. Entende se que o caucionante continua responsável
perante o advogado nos têrmos do contrato. Para a justiça, a ratificação tem de abranger os atos do advogado
até o momento em que se apresenta em juízo outro advogado, constituído pelo autor ou pelo réu, ou há
revogação da procuração. Nas relações jurídicas entre o caucionante de rato e o advogado, considera-se ainda
em caso de dúvida que o contrato de serviços contém a cláusula de ser em nome do autor ou do réu, salvo não-
ratificação .

§ 4.698. Extinção dos poderes de procurador judicial

1.REVOGAÇÃO. A revogação da procuração é causa de extinção dos poderes, se revogável a procura.


Qualquer ato em que funcione o advogado (e. g., ato de recurso, Câmaras Civis Conjuntas do Tribunal de
Justiça de São Paulo 16 de agosto de 1950, E. dos 7h, 188, 355), antes de lhe ser comunicada, a revogação é ato
processual com poderes.
2.MORTE DO PROCURADOR E MORTE DO PROCURADO. A procuração judicial termina, sem qualquer
ato do procurado ou dos sucessores do advogado, ipso jure, com a morte dêsse (arg. ao Código de Processo
Civil art. 197, IV>. Tratando-se de quem é advogado de beneficiado de gratuidade, com a extinção do direito a
essa (R. PaIrAs, System, 151). A morte do procurado extingue-a (arg. ao art. 197, III, do Código de Processo
Civil). Porém ela não se extingue pela incapacidade superveniente do procurado. Extingue-a a interdição. Em
caso de morte do procurador, há suspensão da instancia.
Se a parte constitui procurador judicial, com podAres de substabelecer, e o procurador morre, a procuração do
substabelecido continua eficaz. Já o ensinava MELCIJIOR FEnO, nas Decisiones, decisão 199, n. 6.
3.DENÚNCIA DA PROCURA. No direito civil, se o procurador denuncia sem motivo justo, responde pelo
dano resultante (Código Civil, art. 1.820). No art. 109 do Código de Processo Civil, tem, ainda mais, de
representar processual.. mente a parte durante os dez dias seguintes à notificação da denúncia Nos arts. 1.816,
1, e 1.820 do Código Civil, também se fala de renúncia. No Código Comercial, art. 157, diz-se que
o mandato acaba quando o mandatário demite de si o mandato. O têrmo é impróprio. Renuncia-se a direito, a
pretensão, ou a ação, ou a exceção, ou alguma vantagem. Trata-se de terminação de contrato, o que se chamou
“renúncia” é, em verdade, “denúncia”. Se morre o advogado, suspende-se a instância (Código de Processo
Civil, art. 197, IV). Compare-se o art. 1.308 do Código Civil com o art. 197, III, do Código de Processo Civil.
admissível a renúncia ao direito de denúncia, salvo se a causa da denúncia é enfermidade ou fôrça maior.
Tanto a revogação da procuração pela parte quanto a denúncia pelo procurador são declarações de vontade
receptícias.
A ~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 15 de dezembro de 1951 (Paraná 3., 55, 142),
decretou nulidade de audiência porque não fôra notificado quanto a ela o advogado, tendo de realizar-se nos dez
dias a que se refere o art. 109. Sim; pois que algum prejuízo poderia advir de não ter sido notificado o
advogado, o que a parte afirma pelo fato mesmo de reclamar.

4.INTERDIÇÃO DO OUTORGANTE OU DO OUTORGADO. O que se disse a respeito da extinção do


mandato também se entende com a procuração. O curador do outorgante tem de dar ciência ao procurador da
interdição do outorgante, como o curador do outorgado tem de comunicar ao outorgante a interdição do
outorgado, para que não haja a ultra-eficácia (cf. Código Civil, arts. 1.821, 1.322 e 1.323).
‘7. EXTINÇÃO DA RELAÇÃO JURÍDICA PROCESSUAL, EXERCÍCIO COMPLETO DOS PODERES,
EXPIRAÇÂO DE PRAZO E IMPLEMENTO DE CONDIÇÃO. a) Se a procuração judicial foi para
determinado processo e se extinguiu a relação jurídica processual, extinguem-se os poderes. Para a propositura
de ação rescisória, são de mister poderes especiais. Os poderes para recorrer abrangem todos os recursos,

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inclusive o de revista e o recurso extraordinário.


O processo pode prosseguir, a despeito da extinção da relação jurídica processual para a qual foram conferidos
os poderes. Êsses se extinguem conforme o seu conteúdo e o da relação jurídica processual.
b) Se o ato foi completamente praticado, ou se foram completamente praticados os atos para os quais se
outorgou a procuração, extinguem-se os poderes.
c) Se fôra estabelecido prazo para o exercício dos poderes e expirou, êsses se extinguiram. A cláusula tem de
ser cláusula expressa.
Também com o implemento da condição resolutiva se extinguem os poderes outorgados.
De passagem, observemos que o outorgante pode estabelecer prazo suspensivo ou condição suspensiva, como
pode criar prazo resolutivo ou condição resolutiva.
O substabelecimento dos poderes sem reserva extingue a procuração do substabelecente.
5.MUDANÇA DE ESTADO DO OUTORGANTE. Se o outorgante dos poderes de procura mudou de estado
de modo que não possa, sôzinho, outorgar poderes, cessa a eficácia da procuração. Se foi o outorgado que
mudou de estado, de jeito que não mais os possa exercer, cessa a eficácia da procuração. O que se disse sobre o
mandato é invocável, inclusive no tocante à ultra-eficácia.

6.IMPOSSIBILIDADE SUPERVENIENTE DOS ATOS DE PROCURA.


Se o procurador está diante de impossibilidade superveniente de atender, satisfatôriamente, aos poderes, isto é,
de exercê-los, extinguem-se êles. É o caso do advogado a que se cassou o exercício da advocacia.

CAPITULO VII

PROCURAÇÃO EM CAUSA PRÓPRIA

§ 4.699. Conceito e natureza da procuração em causa própria

1. ORIGEM. No direito romano, se não se tinha a posse, não se podia fazer tradição da coisa, com efeito de
transmissão da propriedade. O proprietário sem posse não podia alienar. O expediente que se teve, dentro da
dontrina da posse que era vigente, foi o de se constituir mandatário judicial ou procurador judicial o
pretendente, dispensando-o de prestar contas (co quiUm, procurator im rem suam>.
Quanto aos direitos pessoais, a dificuldade era mais geral. O expediente que primeiro se apresentou para quem
queria ceder o crédito, solvendi causa, donandi causa, ou credendi causa, era a delegação, mediante a qual o
devedor prometia ao credor nôvo o que devia ao antigo: um crédito desaparecia, outro nascia. Em todo o caso,
era preciso haver o consentimento do devedor.
Com a introdução do processo formular, recorreu-se ao mandato judicial, em que se inseria a cláusula de co
quitar in rent suam, ou de procurator im rem suam, expressão que se fêz a única apropriada desde que o co
quitar desapareceu. Com a litis coutestatio e a fórmula da condenação do devedor em relação ao mandatário,
conseguia-se o que, segundo os princípios, não seria possível. Mesmo assim, o outorgado não adquiria mais do
que os efeitos do mandato judicial da luis contestatio: tinha-se de esperar o vencimento do crédito, para se ir a
juízo (P. GInE, Étude sur la Novatiou et le Transport des créauces eu droit romain, 818 s., discordava, mas sem
razão) ; daí as diferentes reformas, até que se chegou à criação da cessão de crédito, tal corno hoje a
concebemos, sem que se houvesse deixado de parte o instituto da procuração em causa própria.
No direito brasileiro, nunca deixamos de ter a procuração em causa própria, pôsto que nos tivesse faltado
estudo cientifico do instituto, como outorga abstrata de poder de representação, que êle é.
Antes e depois do Código Civil, a procuração em causa própria foi e é de grande uso (cf., sobre uso das
procurações em causa própria, Decreto n. 8.561, de 22 de janeiro de 1900; Lei n. 8.966, de 25 de dezembro de
1919; Decreto n. 17.538, de 10 de novembro de 1926; Lei de Si de dezembro de 1930). As leis de organizaçâo
do serviço judiciário e de custas cogitavam e algumas ainda cogitam da distribuição das procurações em causa
própria.

2.NATUREZA E EXTENSÃO DO PODER DE GESTIONAR “IN REM SUAM”. No direito romano, podia o
credor ir contra o devedor, mediante a atividade de terceiro (rnxzndatum ad agendum), que obteria sentença em
seu nome, dando ensejo à adio judicati. O dominus litis era o terceiro, e não o credor. A transformação do

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direito romano, no tocante a fazer dominus litis o credor, nada tem com a figura do cognitor in rem suam (cf. P.
F. GnaRn-R. v. MAYR, Geschichte und Sqstem des ràmischen Rechtes, 1120 sji.
Oinstituto do mandatum in rem suam apresentava alguns inconvenientes. Por exemplo: enquanto o outorgado e
o devedor não concluíam a litis contestatio, era revogável pelo outorgante o mandato; enquanto continuava
sendo o credor, podia dispor do crédito, sem ser preciso que expressamente revogasse o mandato, inclusive
transigir ou remitir a dúvida; com a morte do mandatário ou do mandante, extinguia-se o mandatum in rem
suam. Nenhuma segurança tinha o outorgado até que adviesse a lUis contestcttio. A isso, tacteando, procurou
dar remédio a época clássica.
(Mais uma vez observemos que o direito romano não tinha a representação direta. As exceções que se apontam
mostram que não se tratava prôpriamente de exceções, mas de expedientes. Atribuíram ações ou exceções ao
terceiro. A representação direta foi recebida de prática do comércio com o Egito.)
O poder de representação em causa própria é como qualquer outro poder de representação; apenas o outorgado
o exerce em seu próprio interesse. Se há, ou não, re1ação jurídica subjacente, justajacente, ou sobrejacente, a
que êsse poder se ligue, não importa, no que diz respeito à natureza e à extensão do poder in rem suam. Pode
bem ser que, nos têrmos da relação jurídica básica, haja outros direitos ou outros deveres do outorgado, ou do
outorgante; nada disso atinge o poder de representação iii rem suam, na sua abstrativídade. Infelizmente,
imprecisões lamentáveis surgiram nos livros e nas decisões, exceto em COELHO DA ROCHA (Instituições de
Direito Civil português, II, ~ ‘799, 625) e JOAQUIM INÁCIO RAMALHO (Praxe Rrasilleira, § 61, 86), que o
seguiu. COELHO DA ROCHA disse que, havendo procuração em causa própria, não acaba pela morte de
qualquer dos figurantes, nem pode ser livremente revogada pelo outorgante, nem o mandatário fica sujeito a
prestar contas (salvo, é claro, negócio jurídico subjacente, que lhe dê tal dever), e pode êsse praticar todos os
atos relativos ao negócio jurídico, sejam, ou não , expressos na procuração. Cumpre advertir-se em que a
procuração em causa própria é abstrata. Pode bem ser que exista relação jurídica subjacente, justajacente, ou,
até, sobrejacente. Por exemplo:
O credor, que, para se pagar, obtém procuração em causa própria, assume o dever de creditar ao devedor o que
receber. Mas o poder de representação, em si mesmo e em sua extensão, independe da relação de direito
(mandato, locação de serviços, sociedade, contrato de trabalho). Se a procura em causa própria é apenas para
que o procurador receba de alguém aquilo com que o outorgante lhe pagará o que deve, o procurador em causa
própria dá recibo e o ato do devedor que, por intermédio do procurador em causa própria, paga ao devedor do
procurador em causa própria, pode ser somente ato-fato jurídico.
A procura em causa própria é procura em nome do outorgante, pôsto que por conta do outorgado. A diferença,
em relação ao mandato em nome próprio, à COMISSÃO e a outros institutos é de grande relevância. Quando
ao procurador nascem direitos, pretensões, ações e exceções já são seus, já êle pode exercê-los em nome
próprio.
A procuração em causa própria pode ser instrumento de outorga abstrata de poder para assegurar ao procurador
a eficácia de cessão de crédito, in soluium ou solvendi causa, ou, tratando-se de crédito, ser notificada ao
cedido, para ter os efeitos da cessão, não se precisando caracterizar se in solutum ou soivendi causa, porque tal
caracterização somente importaria à relação jurídica entre cedente e cessionário. Se houve cessão solvendi
causa e foi passada, a favor do cessionário, procuração em causa própria, tal procuração em causa própria é
apenas instrumento abstrato, que serve ao exercício dos direitos do cessionário e para o cumprimento dos seus
deveres perante o cedente, como cessionário solvendi causa e como procurador.
Afirmando-se, como erradamente se afirma, que a procuraçáo em causa própria pode produzir cessão de crédito
ou de outro direito, surge o problema de se saber, se, havendo duas ou mais procurações, ou procuração em
causa própria e cessão, qual se há de considerar como eficaz. Tem-se de encarar a eficácia perante o outorgante,
a eficácia perante o devedor cedido e a eficácia quanto a terceiros. Quanto a esse, é eficaz o primeiro negócio
jurídico notificado (e não tem tal efeito o registo). Quanto a terceiros, o primeiro registado, se não é revogável a
manífestação de vontade. Quanto ao outorgante, a procuração ou a cessão posterior à procuraçãO em causa
própria irrevogavel contém revogação ineficaz. Se, contudo, o devedor pagou, tem o outorgado ou têm os
outorgados anteriores ação contra o outorgante que, na espécie, contra direito.
Há jurisprudência favorável a bastar a procuração em causa própria para se proceder à transmisão da
propriedade imobiliária, pela transcrição. A questão o consiste em se saber se se pode omitir o instrumento da
alienação a si mesmo.
a) A opinião negativa funda-se em que a procuração em causa própria pode importar cessão de direitos pessoais,
com eficácia contra o cedido desde a notificação. b) A opinião afirmativa é espúria, só atende a interesses

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fiscais do sêlo proporcional, mas sem ver que desatende à própria legisIação fiscal no ponto em que exige o
pagamento do impôsto de transmissão antes de se fazer a escritura de aquisição . O voto do relator na decisão
da 1? Turma do Supremo Tribunal Federal, a 7 de abril de 1947, é insustentável; certo, o voto vencido do
Ministro CASTRO NUNES (1?. F., 114, 392-395). Os argumentos do direito romano não bastam, e são falsos;
a procuratio in ‘sem suam, por si só, não transferia o domínio. Não bastam, porque o registo de imóveis nada
tem com o direito romano. Na jurisprudência, o que a cada passo se vê é a confusão entre escritura de compra-
e-venda com o nome de procuração em causa própria, pago o impôsto de transmissão, e a procuração em causa
própria (e. g., Tribunal de Justiça de Alagoas, 11 de outubro de 1946, O D., 46, 203 s.: “A procuração em causa
própria não é título hábil para transferir o domínio. Mas, se ela, na espécie, fôr passada por escritura pública,
com indicação da res, do pretium, e do consensus, valerá como instrumento de compra-e-venda, perdendo o
caráter de procuração. Transcrita essa escritura no registo de imóveis, o domínio fica transferido ao adquirente”;
ta Turma do Supremo Tribunal Federal, a 16 de dezembro de 1943, 1?. 9., 100, 278 sj. Aí, o nomen foi errado.
Todo mal está nas expressões “para valer”, “valerá” e outras semelhantes, que aparecem nos acórdãos: em vez
de dizerem “se o instrumento, chamado procuração em causa própria, fôr em verdade instrumento de
transmissão, pode ser transcrito”, dizem “a procuração em causa própria para valer como instrumento de
transmissão ”. A própria escritura pública de compra-e-venda em que se não diz “vendo” e transfiro a
propriedade” rão transfere. Falta o acôrdo de transmissão . A opinião b), que afirma importar transferência a
procuração em causa própria, essa é rara; e interessante é verificar-se que tão desabusadas afirmações se
contradizem, por vêzes, com a asserção também falsa de terminar o poder de representação em causa própria
com a morte do outorgante. Há outro aspecto que tem de ser considerado: feita a transcrição , o problema já é
no plano do direito das coisas; e ter-se-ia de desconstituir o registo, se se pretende que tenha sido ilegal.
Conforme adiante diremos, ao cuidarmos, especialmente. do assunto, o que importa é saber-se qual o direito
que aos procuradores em causa própria se atribui. Não se pode dizer que, com a outorga da procuração em
causa própria, nenhum direito se transfere ou constitui: é iri, rem suam. Mas confundi-la com a cessão de
crédito ou outro direito, ou com a transferência da propriedade, é de repelir-se, enêrgicamente.
Tem-se dito que a procuração em causa própria somente pode ser substabelecida se não há reserva de poderes;
porém isso não impede que o procurador em causa própria passa procuração, não em causa própria, porque, aí,
suboutorga poder de representação, não substabelece.
Se o direito atribuído ao procurador em causa própria é divisível, o substabelecimento pode ser de parte do
direito. Nada obsta a que o procurador em causa própria substabeleça, quanto à parte a, a procuração em causa
própria, e outorgue poderes de procuração ordinária quanto à parte b.

3.PROCURAÇÃO EM CAUSA PRÓPRIA E IRREVOGABILIDADE.


A procuração em causa própria contém a manifestação de vontade da procura, razão por que há outorga de
poderes, e a manifestação de vontade de atribuição da res, da causa, de modo que, tendo a procuração a cláusula
in rem propriam, nascem direitos, pretensões e ações ao procurador. Faz-se procurador e titular, e não só
procurador, ou só titular. Há algo de híbrido, que lhe veio das origens, quando se concebeu como expediente
para se obter o que o direito romano não tinha: a cessão de créditos. O procurador em causa própria exerce os
poderes em nome do procurado, pôsto que para si. Quando surgiu a cessão de créditos, o cessionário
diferenciou-se do cognitor in rem suam. Antes, ao tempo do cognitor ou procurator, com que <quase) se
obtinha a eficácia que a cessão de crédito daria, a actio mandata não permitia que o cessionário demandasse em
nome próprio (GAIO, II, 39: “Sine hac vero novatione non poteris tuo nomine agere, sed debes ex persona niea
quasi cognitor aut procurator meus experíri”). Com a acUo utilis, o outorgado (cessionário) passou a suo
nomirte agere (L. 18, C., de legatis, 6, 37; L. 5, C., quando fiscus vel privatus debitoris sui debitoris ezigere
potest, 4, 15; cf. Tomos XXIII, § 2.817, e XXV, § 3.004, 5). Não haveria transposição de sujeitos, pOsto que,
conforme a intentio, já o outorgado fOsse titular da acUo utilis. Porém permanecia o inconveniente da
ação direta, que tinha o outorgante. Hoje, não mais ocorre isso com a cessão de créditos.
A procuração em causa própria, essa, supõe que o procurador “alienas actiones suo commodo exercet, et ad
quam pertinet utilitas, vel damnum”. O outorgante pode morrer, sem qualquer efeito na procuração in rem
propriam. É o que está em D. B. ALTIMARO (Tractatus de Nuilitatibus, II, rub. 11, q. 36, n. 31), em Diooo
GUERREIRO (De Munere judicis arphanorum opus, Tractatus IV, Lib. 6, Cap. 2, n. 116). COELHO DA
ROCHA (Instituições, II, § 799, 625) pôs claro que a procuraçáo em causa própria: “12, não acaba pela morte
de qualquer das partes; 2.0, nem pode ser livremente revogada pelo constituinte; 3.~, como o procurador
adquire direito ao objeto, sobre que versa a procuração, não fica sujeito a dar contas; 42, pode praticar todos os

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atos relativos ao negócio, sejam, ou não, compreendidos na procuração”. No mesmo sentido, 3. H. CORREIA
TELES (Digesto Português, III, § 652, 93), JOAQUIM INÁCIO RAMALHO (Praxe Brasileira, 85 s.),
TEIXEIRA DE FREITAS (Consolidação das Leis Civis, nota 34 ao art. 473) e CARLOS DE CARVALHO
(Nova Consolidação, art. 1.399).
LAFAIETE RODRIGUES PEREIRA (Parecer, O Direito, 87, 25 s.) foi de grande acuidade: “No direito
moderno, a cláusula in rem propriam, sem especificar a cessão com os requisitos legais” entenda-se: sem
haver, no mesmo instrumento, o negócio jurídico da cessão de crédito ou de outro direito “jamais pode operar a
cessão ou transferência do direito ou da coisa”. No caso que êle examinava, faltava o negócio jurídico da
cessão, com os seus pressupostos necessários; daí acrescentar o jurista: “Ora, a simples declaração de que o
procurador é constituido in causam propriam não traz a designação do preço da cessão; não pode, portanto,
valer como cessão, porque falta um dos elementos essenciais do contrato”. Apenas se advirta que a cessão
poderia ser gratuita.
A decisão da g•a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 5 de dezembro de 1945 (R. dos T., 161,
72), que admitiu a revogação da procuração em causa própria e vedou que o procurador em causa própria
requeresse a execução da sentença, em nome dos outorgantes, é dessas peças que entristecem. ~ Que pode
importar a opinião de F. LAURENT e de MARCEL PLANIOL, se temos a letra da lei, no art. 1.317, J, 22-
parte. do Código Civil, e a tradição do direito luso e do direito brasileiro? Que diferença de lisura doutrinária na
sentença de Juiz de São Paulo (J. M. CARNEIRO DE LACERDA), a 8 de julho de 1943 (E. dos T., 149, 619) 1
M.1. CARVALHO DE MENDONÇA (Contratos no direito civil brasileiro, 1, 255), após enumeração dos casos
de irrevogabilidade do mandato, escreveu que em todos êles há, implícito, contrato bilateral. De modo nenhum.
Primeiro, a irrevogabilidade pode existir por simples manifestação de vontade. Segundo, mesmo no caso de
procuração em causa própria, a procuração é negócio jurídico abstrato e pode haver, no próprio negócio jurídico
subjacente, justajacente ou sobrejacente, unilateralidade. O art. 1.317, II, do Código Civil alude a contrato
bilateral, mas a alusão não elimina a abstratividade da procuração, e tudo se passa no plano do contrato de
mandato e do contrato de que êle é um dos efeitos.
Na jurisprudência, as divergências eram inevitáveis, porque se discutia o problema dos efeitos da procuração
em causa própria, sem se distinguirem poder de representação in rem suam e mandato in rem suam. Daí a
extrema confusão. No aceso da luta, LAFAIETE RODRIGUES PEREIRA e RUI BARBOSA, em pareceres (O
D., 87, 28 s., e E. fl, 1, 29 s.), em vez de discutirem a questão, apenas disseram que a eficácia da procuração iii
rem suam se circunscreve à outorga dos poderes ilimitados (fl. CLóvís BEVILÁQUA (Código Civil comentado,
V, 64), por ter ignorado tôda a evolução da ciência no tocante ao poder de representação em si mesmo, acoimou
a cláusula in rem suam de desnaturadora do mandato(?) e J. X. CARVALHO DE MENDONÇA (Tratado de
Direito Comercial i, VI, Livro IV, Parte II, 251) chamou-a de “velhíssimo traste, que a concepção moderna da
obrigação repele e condena” (?!Ij, atacando o Código Civil onde tal cláusula penetrou “sorrateiramente”. Entre
si, não se entenderam êles na caracterização do instituto, nem, tão-pouco, quanto à sua eficácia. Quando
falavam de procuração in rem suam, tinham em mente o mandato, em que tal cláusula se inserisse. O resultado
foi a enorme balbúrdia na jurisprudência e nos livros de exposição do direito. Aqui, afirmava-se que a
procuração em causa própria era forma particular da cessão de crédito, ou ato de alienação, ou cessão de
crédito, ou de direito (e. g., Conselho do Tribunal Civil e Criminal do Distrito Federal, 25 de agôsto de 1904, E.
de D., 241 s.; 1.a Câmara Cível, 18 de junho de 1906, 1, 157 5.; 22- Câmara Cível, 11 de janeiro de 1907, III,
393 s.; Tribunal de Justiça de São Paulo, 4 de julho de 1919 e 1.0 de dezembro de 1920, E. dos T., 30, 323, 37,
66; 22- Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 10 de junho, e Câmaras Cíveis Reunidas, 19
de dezembro de 1921, E. de D., 66, 121, E. do S. T. F., 50, 170; Tribunal de Justiça de São Paulo, 7 de outubro
de 1924 e 13 de abril de 1926, E. dos T., 52, 70-73, e 58, 426) ; ali, a procuração em causa própria não importa
a cessão (2~~ Câmara Cível da Côrte de Apelação do Distrito Federal, 9 de novembro de 1917, E. O. dc D., 1,
382; 12- Câmara Cível, 11 de setembro de 1919, E. de D., 54, 511 s.). Ora, o que se tinha de fazer era distinguir
e caracterizar-se o poder de representação, que, em si mesmo e em sua extensão, é abstrato. O procurador em
causa própria tem de exercer o poder que se lhe outorgou; se quer adquirir, tem de representar o outorgante, em
contrato do representante consigo mesmo; se quer alienar a outrem, representa o outorgante na alienação da
propriedade, ou na alienação e transmissão da propriedade, ou na alienação e transmissão da propriedade e da
posse, se a tem. No direito brasileiro, há a representação na transmissão da posse e nada obsta a que tal
representação seja ín rem suam. Se o outorgado adquire a propriedade, porém não se lhe deu a posse, a que tem
direito, cabe pedir a imissão de posse (Código de Processo Civil, arts. 381-383). A posse do representante é só
posse imediata, ou posse mediata inferior à do representado. A posse do representado é, de regra, posse mediata.

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Resulta isso da natureza da posse segundo o Código Civil. O servidor da posse não representa, nem é possuidor,
quer se trate de pessoa subordinada, ou não (hóspede sem ser locatário, cf. RICHARD HEINRICHS,
Resitzerwerb und Besitzerhaltung, 40 sã. Passa-se o mesmo com o órgão. Qualquer ato do árgão é ato da pessoa
jurídica.
Tratando-se de procuração in rem suam, passada pelo credor, longe vai o tempo em que se exigia a litis
contestatio,para que, dando-se a novação, o crédito passasse ao procurador, dominus litis. O expediente prestou
enormes serviços, devido $t intransferibilidade romana das obrigações, porém, no próprio direito romano, a
evolução se operou: o procurador, que não podia exercer as ações senão como mandatário, passou a poder
exercê-las como ações úteis, em nome próprio, e não mais alieno nomine, cessando, assim, os inconvenientes
resultantes de haver morrido o representado, ou de ter revogado o mandato (FR. EISELE, Die actio utilis des
Cessionars, 26 e 40 s.; J.UNGER, Cession und Aktivdelegation, Jahrbiicher flir die Dogmatik, 26, 402 s.),
razão por que foi absurdo o acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 9 de abril de 1913 (E. dos T., VI,
42), em que se disse não poder o procurador em causa própria propor ação em próprio nome (certo, a 19 de
julho de 1918, E. dos T., 26, 474 s.) ; introduziu-se, com a segunda reforma do direito imperial a denuntiatio,
comunicação ao devedor, com eficácia de não mais poder pagar ao credor originário (L. 4, C., quas res pignori
obligari possunt vel nou O qualiter pignus contrahatur, 8, 16; L. 3, pr., C., de novationibus eI delegationibus, 8,
41). Tendo a procuração em causa própria passado a ser tanto extrajudicial quanto judicial e havendo perdido a
Utis contestatio o papel que tinha (Comentários ao Código de Processo Civil, II, 47, 79 e 200; III, 22- ed., 25,
119, 142 e 354), é óbvio que a notificação da procuração em causa própria ao devedor lhe dá a eficácia em
relação a êsse, tal como acontece com a cessão de crédito, instituto que dela se tirou, através de reformas
multisseculares.
4.OUTORGANTE, OUTORGADO E PODERES OUTORGÁVEIS EM CAUSA PRÓPRIA. O outorgante da
procuração em causa própria tem de ser capaz. Outorgáveis em causa própria precisam ser os poderes que êle
quer atribuir. Outorgáveis ativa e passivamente; isto é, que o outorgante os possa atribuir e o outorgado os possa
receber. A inoutorgabílidade pode ser objetiva ou subjetiva, como se, respectivamente, a procuração seria de
poder para alienar bem inalienável, ou de poder para alienar algum bem para cuja alienação é necessário
consentimento ou assentimento de outrem.
O outorgado somente precisa poder adquirir. Em todo o caso, se a procuração em causa própria foi quanto a
direito que o outorgado não poderia adquirir, tem-se de interpretar que só se outorgou poder para, em causa
própria, alienar a outrem.
O nome do outorgado consta da procuração em causa própria, como consta de qualquer procuração, porém êle
não é figurante do negócio jurídico da procura, que é unilateral.
Cumpre advertir que a procuração em causa própria é abstrata. Pode bem ser que exista relação jurídica
subjacente, justajacente, ou, até, sobrejacente. Por exemplo: o credor que, para se pagar, obtém procuração em
causa própria, assume o dever de creditar ao devedor o que receber. Mas o poder de representação, em si
mesmo e em sua extensão, independe da relação de direito (mandato, locação de serviços, sociedade, contrato
de trabalho). Por isso mesmo, a procuração em causa própria passada em favor do louco, ou de qualquer outro
absolutamente incapaz, é válida, ainda que nulo o mandato, ou o contrato de sociedade. Negócio jurídico
unilateral, a procuração em causa própria, se o outorgado é absolutamente incapaz, atribui ao outorgado o
direito, proveniente da cláusula in rem propriam, e o exercício dos poderes há de ser pelo representante legal do
absolutamente incapaz. Por onde se vê quão importante é distinguir-se do mandato, que é negócio jurídico
bilateral, e seria nulo se o mandatário que aceitasse ou oferecesse fôsse absolutamente incapaz, a procuração,
que resulta de manifestação unilateral de vontade. O outorgante é que precisa ser capaz.
Qualquer poder de disposição, no qual o titular se possa representar, é suscetível de ser outorgado in rem suam.

§ 4.700. Eficácia da procuração em causa própria

1.ATO EM NOME DE OUTREM. O ato do mandatário, se êle manifestou que exercia por êle o mandato, é ato
do mandante, que é o figurante do negócio jurídico, ou do ato jurídico stricto sensu, ou mesmo do ato-fato
jurídico. A vontade do mandante manifestou-se através dêle. O próprio ato-fato, se é o caso, uma vez que foi
ato do mandante através dêle, entra no mundo jurídico como ato-fato do mandante. Porém é preciso que se não
confunda com o mandato a procuração; máxime, com a procuração em causa própria.

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Na procuração em causa própria, o procurador passou a ser o dono do negócio: a procura continua ineliminável,
porém não a sua eficácia; o mandato, se existia, e foi desconstituído, acabou; mas a procura não se confunde
com o mandato. Cp. 22- Turma do Supremo Tribunal Federal, a 26 de outubro de 1954 (A. J., 115, 438), que, a
respeito, incorre em algumas confusões.
Em virtude de ser negócio jurídico unilateral a procura, a procuração em causa própria atribui ao outorgado a
res, independentemente de qualquer manifestação de vontade do outorgado. Se a procuração em causa própria
foi feita por instrumento particular, com ela se passa o que ocorre com todos os negócios jurídicos unilaterais
(e. g., subscrição, aval ou endôsso de títulos cambiários ou cambiariformes). Assim como quem subscreveu a
nota promissória pode, antes de entregá-la, rompê-la, ou assim como quem a endossou pode riscar o endôsso, o
outorgante da procuração em causa própria pode rompê-la.
Surge o problema quanto à procuração em causa própria feita por instrumento público. Aí, a assinatura, com as
demais formalidades, torna inatingível por ato do outorgante a procuração em causa própria, que é, desde logo,
irrevogável.
O que não se pode sustentar é que, com a procuração em causa própria, se haja transferido a propriedade
imobiliária, e o procurador, que, tendo de transferi-la a terceiro, teria de fazer escritura da transmissão da
propriedade e da posse, não precise disso se a quer transferir a si mesmo. O que a procuração tornou em causa
própria foi o poder, não o ato que o outorgado poderia, a seu líbito, praticar. O procurador em causa própria
para vender não no é em causa própria para vender e transferir a propriedade e a posse (= para os acôrdos de
transmissão), O procurador em causa própria para vender e transferir a propriedade e a posse não vende a si
mesmo, nem, a fortiori, transfere a si mesmo a propriedade e a posse. Pode fazê-lo, como pode vender a outrem
e transferir ao outorgado a propriedade e a posse. Na outorga da procuração em causa própria não há o ato do
outorgado; há o do outorgante. O outorgado ainda não procurou, vai procurar, para si, porque foi isso o que se
lhe outorgou. Daí merecer exposição à parte o problema sobre qual o direito que, na procuração em causa
própria, se transfere ao outorgado.
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2. REVOGABILIDADE E CAUSAS DE EXTINÇÃO . A procuração em causa própria é irrevogável, de modo
que as causas extíntivas a que se refere o art. 1.816, 1-111, do Código Civil não a atingem. Isso não quer dizer
que, pelo negócio jurídico subjacente, justajacente ou sobrejacente não esteja exposto o outorgado a direitos,
pretensões e ações de que é titular o procurado. Tais direitos, pretensões e ações se ligam ao outro negócio
jurídico, unilateral, bilateral ou plurilateral, e não ao negócio jurídico da procura. Certas, pôsto que sem a
devida exposição sistemática da matéria, as decisões da 22- Câmara Civil do Tribunal de Alçada de São Paulo,
a 14 de março de 1955, da Seção Civil do Tribunal de Justiça, a 28 de março de 1953, e da 62- Câmara Civil, a
12 de junho de 1950 (1?. dos T., 188, 221), confirmativa de sentença do juiz PAULO OTAvIANO DINIZ
JUNQUEIRA, bem fundamentada, onde se lê: ..... o mandato in rem propriam, não obstante o casamento,
permanece re integra, podendo o autor, munido dêle, transferir o terreno”.
Não se pode dizer que não há o princípio de irrevogabilidade da procuração em causa própria. Há o princípio, e
está explícito no art. 1.817, 1, 22- parte, do Código Civil, sem que possam ser admitidos argumentos e sofismas
como os da g,a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, a 28 de agôsto de 1941 (R. F., 88,
221; 1?. dos T., 137, 806), e os da g,a Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 24 de outubro de 1946
(1?. dos T., 169, 201).
No sentido da incolumidade, o 1.0 Grupo de Câmaras Civis do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 13 de
outubro de 1950 (1?. dos 7’., 190, 206), e a 52- Câmara Civil, a 25 de maio de 1952, (208, 240).
Tem-se aludido à revogabilidade da procuração em causa própria por ser sem causa o negócio jurídico (e. g.,
g•a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, 11 de setembro de 1941, 1?. F., 88, 525).
Proveio isso de alguns juristas que nunca se preocuparam com o estudo dos negócios jurídicos abstratos; e a
procuração é um dêles.
Enquanto o procurador em causa própria não exerce os poderes, inclusive a seu próprio favor, pode ser que haja
alguma pretensão do outorgante a que o outorgado não os exerça, mas isso só é efeito de alguma outra relação
jurídica entre o outorgante e o outorgado, que consista em poder-se exigir que o procurador em causa própria
não exerça os poderes. Somente a criação de eficácia contra terceiros poderia dificultar o exercício dos poderes;
somente decisão judicial poderia constringir o procurador em causa própria a não exercer os poderes. Se os
pressupostos necessários se compõem, a medida cautelar pode ser pedida. Tudo isso é por fora da procuração
em causa própria, que o direito brasileiro considera, e bem, procuração irrevogável.

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Sempre que se diz revogar o que é irrevogável, não há nulidade: há inexistência, isto é, o ato de revogação não
entra no mundo jurídico. O acórdão do Supremo Tribunal Federal, a 8 de setembro de 1919 (R. dos 7’., 33,
227), e o que proferiu a 4.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 4 de novembro de 1948 (178,
330), negaram que houvesse nulidade, mas deixaram de frisar tratar-se de inexistência. Somente viram a
pretensão à indenização pelo ato ilícito, pretensão à indenização que existe sempre que tenha havido dano. Há
ponto digno de exame, que não foi ferido pelos acórdãos: .~ o ato é ilícito relativo, ou absoluto? Se atendemos a
que já nasceram direitos ao procurador in rem ~ssropriam, a resposta há de ser no sentido de se tratar de ato
ilícito absoluto. A revogação contra direito é revogação de poderes que ainda não foram exercidos, de modo que
relação jurídica ainda existe, oriunda da procuração, entre o outorgante e o outorgado, tanto que o exercício é
em nome daquele, pôsto que dêsse a res. ~Haveria ato ilícito relativo? Ora, a irrevogabilidade é qualidade
objetiva, de modo que o ato de revogação não entra no mundo jurídico.
O acórdão da 3.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 24 de outubro de 1946 (R. dos 77., 169,
201), interpretou a acórdão do Supremo Tribunal Federal, a 8 de setembro de 1919, como se êle considerasse
existente, válida e eficaz a revogação do ato irrevogável. Dai ter considerado válida a alienação pelo outorgante,
a despeito da outorga da procuração em causa própria, o que posterga, aberta e surpreendentemente, o que está
escrito no art. 1.317, 1, 2.~ parte,
do Código Civil. É preciso que se não confunda a revogação, sem justa causa, da procuração que não é em
causa própria, dando ensejo à invocação de regra jurídica como a do art. 148, 22- parte, do Código Comercial,
com a “revogação” de qualquer procuração irrevogável, de que é espécie a procuração em causa própria. Ali, a
revogação, a despeito da falta de justificação, entra no mundo jurídico. Aqui, a “revogação” não entra no
mundo jurídico: seria absurdo que se considerasse revogável o irrevogável.
No art. 1.816, II, do Código Civil diz-se que, pela morte, ou interdição, do mandatário ou do mandante, se
extingue o mandato. Surgem as questões da extinção, por morte do procurador, ou do procurado, em se tratando
de procuração em causa própria. Se a procuração em causa própria serviu a algum dos fins do art. 1.317, II, o
que se há de entender é que o negócio jurídico subjacente, justajacente ou sobrejacente tornou incólume a
qualquer acontecimento pessoal a definitividade da outorga. O que se há de assentar é que, se há
irrevogabilidade, o art. 1.316, II, do Código Civil não incide, nem, tão-pouco, o art. 157, 8, do Código
Comercial. Cf. 1•a Turma do Supremo Tribunal Federal, 20 de maio de 1948 (A. J., 87, 152) ; Câmaras Cíveis
ReUnidas do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 23 de dezembro de 1943 (1?. V., 99, 678)
62- Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 10 de abril de 1951 (D. da J. de 30 de julho de
1952).
Contra o direito, sustentou não haver subsistência da procuração em causa própria, se falece o dono do negócio,
ou mesmo o procurado não dono do negócio, a 22- Turma da Câmara Cível do Tribunal de Justiça de
Pernambuco, a 8 de maio de 1946 (A. J., V, 189).
A Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Santa Catarina, a 13 de dezembro de 1948 (Jurisprudência, 1944,
78), frisou que, sendo irrevogável a procuração em causa própria, não pode a morte dos figurantes extinguir a
outorga de poderes.
Na procuração em causa própria há a outorga de poderes e a atribuição de direito, de modo que êsse elemento
passa àfrente. Daí a irrevogabilidade e a inextinguibilidade pela morte ou interdição do procurado ou do
procurador, ou pela mudança de estado de qualquer dos dois. A procura permanece,a atribuição de direito não
mais se liga, por princípio, a quem atribuiu. Daí ter sido êrro de alguns julgados, como o que acima citamos
(certo, no mais), ter reproduzido o que alguns juristas (e. g., MÁRIO FERREIRA, Do Mandato em causa
própria no direito civil brasileiro, 104) disseram sobre, no caso de morte do outorgante, não poder o outorgado
obrar em nome daquele. O outorgado age em nome do sucessor ou dos sucessores do falecido, e não no seu
próprio. Se ignorava a morte, não importa. Se há, a respeito das procurações que não são em causa própria, a
regra jurídica do Código Civil, art. 1.321, a fortiori no que concerne à procuração em causa própria. A
procuração em causa própria é, conforme o nome, in rem gropriam, e não nomifle suo.
Quanto ao prazo, de que fala o art. 1.316, IV, 12- parte, do Código Civil, também a procuração em causa
própria pode ser prazo, como se A outorga poderes, em causa própria, a E para que receba os alugueres das
casas a, b e e de que A é proprietário. Também pode dar-se que, em vez de Urino, haja condição suspensiva ou
resolutiva. Por exemplo: a procuração é em causa própria para que 13 receba os alugueres desde o momento em
que A embarque para o estrangeiro, ou que os receba enquanto A estiver no estrangeiro.
A procuração em causa própria é abstrata, mas do seu teor pode ressaltar condição resolutiva, como se A
outorga poderes em causa própria a E, seu genro, para que transfira a propriedade do imóvel a C, filha de A, e

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sobrevém desquite ou divórcio entre E e C.


3.QUAIS OS DIREITOS QUE SE ATRIBUEM OU SÃO ATRIBUÍVEIS AO PROCURADOR EM CAUSA
PRÓPRIA. ~. Que é que o outorgante atribui ao procurador em causa própria? Não é a propriedade imobiliária,
ou a mobiliária; nem o crédito, se a procura é a respeito de crédito. A notificação ao devedor não é a notificação
do art. 1.069 do Código Civil, se bem que com ela se pareça e tenha de regular-se por analogia (art. 1.078)
notifica-se para que a atribuição da causa tenha eficácia contra o devedor.
Ao procurador em causa própria, “em coisa sua própria”, como mais romanisticamente diziam as Ordenações
Filipinas, Livro III, Título 45, § 7, fica “todo o proveito e dano da demanda”, se a procuração é para juízo, ou
todo o proveito e dano da relação jurídica, ou das relações jurídicas, para que se outorgou a procura.
O que se transfere não é o direito de crédito, ou de propriedade, ou outro direito transferível: é o poder de
transferi-lo, com todo o proveito e dano desde o momento em que se deu a procuração em causa própria. Tanto
o procurador pode transferir a outrem como a si mesmo e, se o bem é divisível, a duas ou mais pessoas, dentre
as quais se pode pôr. Há, portanto, atribuição de direito formativo dispositivo. Não houve a transferência do
direito de que se pôde dispor, houve a transferência ou a constituícão do poder de dispor do direito como seu.
No Código Civil brasileiro, tal explicação, que tem fontes históricas, é a que se há de sustentar. Se se
entendesse que a procuração em causa própria é cessão de direitos, inclusive de créditos e de propriedade, ter-
se-ia pôsto na lei confuso bis iii idem. Seria supérflua e desaconselhável a alusão à procuração em causa
própria. Não se “abrevia” qualquer instituto, seja o da cessão de créditos, seja o da transferência da propriedade
ou de outro direito (sem razão, MÁRIO FERREIRA, Do Mandato em causa própria no direito brasileiro, 87).
O outorgante não transferiu o direito, pessoal ou real, que poderia ser cedido ou transferido; o outorgante
transferiu o que distintamente podia transferir: o direito de dispor; e atribuiu ao outorgado, desde logo, “todo o
proveito e dano”. A figura é inconfundível e não abrevia qualquer instituto dispositivo.
Outro ponto que se precisa esclarecer é o que concerne ao ato do procurador em causa própria. ,~,Pode o
procurador obrar em seu próprio nome? Quando o procurador que não é em causa própria pratica o ato em seu
próprio nome, o outorgante não tem ação contra o terceiro, nem o terceiro a tem contra o outorgante (Código
Civil, art. 1.307, alínea 1?). Se a procura é em causa própria, o obrar em nome do mandante é apenas alusivo à
existência da outorga. De certo modo se lembra, se historia, se faz comunicação de conhecimento. O obrar em
nome próprio e o obrar em causa própria não se identificam: nem seria possível confundir-se o ser o ato em
nome próprio com o ser em causa própria. Quem age em nome de outrem tanto pode fazê-lo em causa própria
como em causa alheia. Quem age em nome próprio se vincula se o negócio e seu ou se o não é. Daí dizer o art.
1.307, alínea 22-, que o procurador, que obra em nome próprio, fica obrigado “como se seu fôra o negócio”. Se
a procuração é em causa própria, quer o procurador diga que age em nome do outorgante, quer diga que age em
nome próprio, responde ao terceiro e tem ação contra o terceiro. Diante de ser indiferente o ter-se referido, ou
não, ao nome do procurado, houve controvérsia.
Em MANUEL GONÇALVES DA SILVA (Commentaria, 1, 192), que definiu o procurador in vem propriam, de
modo nenhum se alude a cessão ou transferência “ procurator in reín propriam dicitur ilIe, qui commodum
manda~íae actionis siM applicare debet, et ad propriam utilitatem negotium administrat”. A cláusula de cessão
ou de transferência, que seria outro negócio jurídico, podia aparecer (procuração em causa própria + cessão do
direito ou transferência da propriedade). Ficou êle com a opinião que considerava irrevogável a procuração em
causa própria, com a passagem do proveito e do dano ao procurador, sem, contudo, haver cessão implícita de
transferência implícita.
A discussão entre os doutôres (BÁRTOLO DE SAXOFERRATO, ANTÔNIO FABER, BALDO DE tJBALDIS,
CARLEVAL e tantos outros) era em tôrno de “ações” diretas e ações úteis e não conseguiu ferir o ponto
principal. A opinião dominante repelia a identificação da procuração em causa própria com a cessão. MANUEL
CONÇALVES DA SILVA pôs claro que havia a divergência (1, 189) : “Mandatum in rem propriam secundum
aliquos idem est, quod cessio. Secundum alios diversum est a cessione”.
COELHO DA ROCHA (Institiações, II, § 799, 625) aludiu a “cedência”, mas, logo adiante, disse que o
“procurador adquire direito ao objeto sobre que versa a procuração”. Andou perto da verdade CORREIA
TELES (Digesto Português, Iit, n. 651, 93). JOAQUIM INÁCIO RAMALHO (Praxe Brasileira, 86) repetiu a
COELHO DA ROCHA, mas omitiu o que, no trecho daquele, mais importava. Idem, M. E. PIRES FERRXO
(Guia prático e Formulário do Tabelião, 185).
CARLOS DE CARVALHO (Nova Consolidação das Leis Civis, art. 1.339, parágrafo único) admitiu que a
procuração in rem propriam “pode operar desde logo transmissão da propriedade”, o que supõe que se possa
adjectar o acôrdo de transmissão, outro negócio jurídico.

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LAFAIETE RODRIGUES PEREIRA (Parecer, O D., 87, 25), a 20 de maio de 1899, frisou: “A cláusula in vem
propriam (em causa própria), usada nos instrumentos de mandato, não induz, no direito moderno, a cessão ou
transferência do direito ou coisa, a que se refere o mandato, mas tão-somente a concessão ao mandatário de
poderes ilimitados”. A precisão da negativa foi passo à frente em comparação com o que dissera COELHO DA
ROCHA. Acrescentou LAFAIETE RODRIGUES PEREIRA:
“No direito moderno, a cláusula iv. vem propriam, sem especificar a cessão com os requisitos legais” entenda-
se, sem ser acompanhada do negócio jurídico de cessão (= cláusula de cessão) jamais pode operar cessão ou
transferência de direito ou coisa”. Posteriormente, a 9 de dezembro de 1905 (Pareceres, 1, 74 e 295), o
jurisconsulto, falando da cláusula in vem propriam, aludiu às duas espécies: “ou importa simplesmente a
concessão de poderes ilimitados, ou cessão de direito. Quando tal cláusula importa cessão, o cessionário se
torna dono do negócio . Não houve contradição, nem mudança de opiniões, como se acoimou. Ou a cláusula é
sôzinha, ou há os pressupostos da cessão de crédito ou de direito, ou os da transferência de propriedade ou da
posse, ou de ambas. Rui BARBOSA (Parecer,
OD., 87, 28) foi explícito: “O uso das procurações iv. vem propriam ou in rem suam não pode ter juridicamente
a aplicação que na espécie lhe querem dar. Seria desnaturar o mandato ou convertê-lo em meio dissimulatório
de outros contratos, a cessão gratuita ou a cessão onerosa, a liberalidade ou a venda, subtraindo-se às condições
peculiares (insinuação, escritura pública, estipulação de preço), a que a lei os submete como requisitos
substanciais ... Por esta espécie de procuração, o mandatário se afasta da regra geral do mandato, agenciando,
talvez, o seu próprio interesse, a sua própria utilidade, mas sempre em nome do mandante”. Sem razão a crítica
que se lhe fêz de ter considerado a procuração em causa própria como variante, meio dissímulatório, de outros
contratos. O que êle disse foi exprobrativo aos que queriam desnaturar o instituto, “convertê-lo em meio
dissimulatório”.

Se na procuração em causa própria se insere a cláusula (ou, melhor, o pacto de cessão de direito ou de
transferência da propriedade ou da posse, ou de ambas), é preciso que o outro negócio jurídico satisfaça os seus
pressupostos necessários. Dificilmente, na procuração, se pode pôr negócio jurídico que transfira ou ceda: a
procuração é negócio jurídico unilateral, se não é apenas o instrumento do mandato com o nome de procuração.
Para haver cessão, é de mister que se componham os pressupostos necessários da cessão. Para que haja
alienação da propriedade, é preciso que tenha havido a promessa de alienar e o acôrdo de transmissão, ou o
contrato real. Em suma: o outro negócio jurídico, qualquer que seja, é que cede ou transfere.
Certo, CLóvís BEVILÁQUA (Código Civil comentado, V, 64; Direito das Obrigações, 2.~ ed., 285).
Quanto à posse, a procuração em causa própria não a transfere. O que pode ocorrer é que seja anterior,
simultânea ou posterior à tradição, ou ao constituto possessório, ou à cessão da pretensão à restituição. Quando
o procurador exerce a procura, pode, em nome do outorgante, transferir a posse, porque êsse poder se inclui no
seu poder de disposição. Também pode exercer a procura a seu favor, e então êle transfere a si mesmo, em
nome do outorgante, a posse do outorgante, a respeito da qual tinha êle o poder de disposição.
Oque escreveram MARTINHO GARCEZ (Nulidades dos Atos Jurídicos, fl, 22- ed., 274) e J. GONÇAIvES
MAIA (Teoria e Prática das Procuracões, 22- ed., 233 e 237) não mereceria, sequer, exame.
Na jurisprudência, certos, a 22- Câmara Cível da Côrte de Apelação do Distrito Federal, a 11 de dezembro de
1906 (1?. de D., VIII, 123) e a 19 de maio de 1914 (36, 125), o Supremo Tribunal Federal, a 26 de jan6iro de
1918 (49, 72), a 1.a Câmara Cível da Côrte de Apelação do Distrito Federal, a 11 de setembro de 1919 (54,
511), a 22- Câmara Cível, a 13 de setembro de 1921 (63, 159), as Câmaras Cíveis ReUnidas, a 28 de dezembro
de 1922 (1?. do S. T. F., 54, 123), o Supremo Tribunal Federal, a 6 de dezembro de 1924 (77, 217), a 2~a
Câmara Cível da Côrte de Apelação do Distrito Federal, a 10 de maio de 1927 (A. J., II, 485), a g~a Câmara
Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 4 de maio de 1928 (12. dos T., 65, 330), e outros tribunaís.
Alguns julgados, raros, foram lamentáveis (e. g., pela transferência do domínio e da posse, a 1.a Câmara Cível
da Gôrte de Apelação do Distrito Federal, a 18 de junho de 1906 <12. de D., 1, 157), a 22- Câmara Cível, a 20
de julho de 1915 <37, 614), e o Supremo Tribunal Federal, a 20 de janeiro de 1914 (E. do S. T. F., III, 12- Parte,
183).
Com alusão explícita ou implícita ao outro negócio jurídico ou aos outros negócios jurídicos, o Supremo
Tribunal Federal, a 11 de dezembro de 1912 (12. de D., 30, 143), as Câmaras Cíveis ReUnidas da Côrte de
Apelação do Distrito Federal, a 7 de novembro de 1912 (27, 330) e a 19 de outubro de 1914 (38, 347), a 1.a
Câmara Cível, a 25 de janeiro de 1915 (38, 147), e o Supremo Tribunal Federal, a 2 de abril de 1924 <D. O. de
2 de julho de 1924).

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A propósito da procuração em causa própria ter, ou não, si eficácia de cessão de crédito, ou de direito, ou de
transferência do direito de propriedade, pode haver recurso extraordinário, com fundamento no art. 101, III, a)
ou d), da Constituição de 1946 (cf. Supremo Tribunal Federal, a 26 de novembro de 1942, 12. de D., 145, 53,
acórdão que não soube decidir a controvérsia, a despeito da crítica, sem razão, ao direitt escrito, que lhe
cumpria interpretar e não criticar).
A atribuição é de direito independente (selbstãndiges iRecht) a exercer o direito de disposição (e. g., o direito de
crédito). Não há a transmissão do direito de propriedade, ou de posse, nem a transmissão do direito de crédito.
No primeiro caso, o procurador pode fazer o ato de transmissão da propriedade, ou da posse, ou o ato de
transmissão da propriedade e o de transmissão da posse, ou de transferência do crédito (cessão de crédito) a
outrem, inclusive ao próprio outorgante, ou a si mesmo. Assim, se A passou procuração em causa própria a E
para vender e transferir a propriedade e a posse da loja, pode E vender e transferir a propriedade e a posse a C
(ou substabelecer a procuração em causa própria), ou a A <ou passar-lhe procuração em causa própria), ou a si
mesmo.

Em resumo:
Procuração em causa própria não transfere propriedade, nem transfere posse; nem é cessão de crédito (cf. Tomo
XXIII, § 2.827, 8).
Oprocurador em causa própria gere os seus próprios interesses, embora, no exercer os poderes, exerça procura,
pratique atos por outrem (cf. 4•a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 18 de junho de
1940, A. J., 55, 266 s.).
Frise-se, em nome de outrem.
A procuração em causa própria não importa cessão de crédito, ou de outro direito (cf. 33 Câmara Cível do
Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, 11 de setembro de 1941,
12. P., 88, 525), mas atribui direito à cessão ou a ceder (= direito a ceder a si mesmo ou a outrem). ~ isso que
significa procurar zn rem suam.
A procuração em causa própria não é título hábil para a transmissão da propriedade, ou da posse, ou da
propriedade e da posse. Tem-se de praticar o ato ou têm-se de praticar os atos de transmissão. Outrossim, se a
procuração em causa própria é para gravame. Má irrevogabilidade, em principio; e a incolumidade ao fato de
morrer o outorgante (cf. 83 Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 7 de abril de 1949, 12. dos 2’.,
180, 608; sem razão, o 1.0 Grupo de Câmaras Civis, a 13 de maio de 1946, 166, 617, a 13 Câmara Civil, a 15
de maio de 1944, 151, 240, e a 33 Câmara Civil, a E de fevereiro de 1947, 167, 260).
Se na procuração em causa própria se precisou haver transferência dó domínio ao procurador a quem logo se
transfere a posse, misturaram-se quatro negócios jurídicos, um unilateral, outro bilateral consensual e dois de
direito das coisas, os acôrdos de transmissão do domínio e da posse. O instrumento compósito e anômalo, se
obtém transcrição, por negligência do oficial do registo, transfere a propriedade (e. g., 13 Turma do Supremo
Tribunal Federal, a 8 de maio de 1941 A.J., 59, 445 e 446, e a 16 de dezembro de 1943, 12. 9., 100, 273). A
procuração em causa própria atribui direito ao procurador, porém não transfere propriedade <1.0 Grupo de
Câmaras Civis do Tribunal de Apelação de São Paulo, 20 de agôsto de 1940, 1?. dos 2’., 132, 143), nem posse,
nem cede crédito ou outros direitos.
A confusão, através de séculos, foi devida a não ter o direito romano a cessão de créditos e ter-se recorrido à
procuração in rem suam para se obter quase, frisemos a eficácia que o instituto da cessão de créditos veio,
depois, a ter.

4. RESPONSABILIDADE PELA EvICÇÃO. No tocante à responsabilidade pela evicção, cumpre que se parta
dos tempos antigos para se compreender o que concerne, hoje, à evicção se houve procuração em causa própria.
A responsabilidade pela evicção ligava-se à mancipação, e não à compra-e-venda consensual. Quem adquiriu o
bem por mancipação, advindo-lhe discussão judicial da sua posse por terceiro, podia litem denunciare, litem
laudare, de modo que o alienante ficava obrigado a defender a causa do denunciante, se a usucapião não se
consumou ou enquanto não se consumasse. No direito clássico, aparece, em lugar do expediente da laudatio
auctoris, que aliás já estava no direito grego (J. 1-1. Lipsíus, Das attische Recht und Rechtsverfahren, II, 746), a
outorga ao vendedor de procuraçáo em causa própria, para que assumisse os riscos do procedimento e da
decisão. Isso não impedia que, não tendo o comprador outorgado tal procuração, o vendedor interviesse no
processo, como interveniente adesivo.
Nas Ordenações Filipinas, Livro III, Título 45, § 7, dizia-se: “E se êsse nomeado por autor quer defender o réu

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principal, assi como procurador em coisa sua própria, a que pertence todo o proveito e dano da demanda, por
ser obrigado a compor o vencimento dela, em tal caso, se êle se obrigar, e der penhôres, ou fiadores em juízo,
que sendo a sentença dada contra êle, fará de maneira, que livremente será executada na coisa demandada, ou
pagará logo todo o interesse ao autor principal, poderá êle defendê-lo, ainda que seja contra vontade do autor, e
prosseguir a demanda até o fim”.

5 5. SUBSTABELECIMENTO DA PROCURAÇÃO EM CAUSA PRÓPRIA. Se à procuração em causa


própria se junta negócio jurídico de cessão de direito, inclusive de crédito, ou de transferência da propriedade
ou da posse, ou de ambas, é preciso distinguir-se do substabelecimento da procuração a cessão do direito que
foi cedido ao procurador ou a transferência da propriedade ou da posse, ou de ambas. Não há
substabelecimento do contrato de mandato, nem da cessão de crédito ou de outro direito, ou da transmissão da
propriedade ou da posse. Os pressupostos para se substabelecer procuração não são os mesmos que se exigem à
cessão do direito que se cedera ao procurador, ou da transferência do direito de propriedade ou de posse que se
transferira ao procurador. As regras jurídicas, ro tocante a terceiros, não são as mesmas para o
substabelecimento e para a cessão do que fora cedido ou para a transferência do que fôra transferido.

CAPÍTULO VIII

SUB ESTABELECIMENTO DA PROCURAÇÃO

~ 4.701. Conceito e natureza do substabelecimento

1.PESSOALIDADE DO CUMPRIMENTO DOS DEVERES DO MANDATÁRIO. Por sua origem e por seu
conceito, o mandato tem de ser executado pela pessoa que se incumbiu do que se quis com a dação da mão, do
manus -~- dare. Para que se possa admitir a substituição, é preciso que tenha havido manifestação de vontade
do mandante. Tal manifestação de vontade pode ser expressa ou tácita. Pode derivar de uso do tráfico, ou de
silêncio do mandante. Se alguma situação sobreveio que, se a conhecesse o mandante, consentiria na
substituição, o que se há de entender é que o mandatário, fazendo-se substituir, não cometeu ilícito relativo
(violação do contrato de mandato). Em todo o caso, tem o mandatário de comunicar ao mandante o que ocorreu
e de esperar a sua vontade, salvo se há perigo na dilação.
t de tôda a conveniência que se atente na função mesma do ato jurídico de substabelecimento, que de modo
nenhum se refere ao mandato. Substabelece-se a procuração, não o mandato. O mandatário, que pode fazer
substituir-se nas funções do mandato, implicitamente pode substabelecer a procuração, que é negócio jurídico
unilateral. O substabelecimento também o é, porque é procuração do procurador, mesmo se não há qualquer
reserva de poderes.

2.PODER DE SUBSTABELECER. Quanto ao poder de substabelecimento, é de assentar-se que, tendo sido


expresso, o substabelecente pode outorgar o mesmo poder ao substabelecido, mas êsse não o tem se não lhe foi
outorgado. Sem razão, a 3•~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 10 de agôsto de 1950 (R. dos
T., 189, 710).
No direito brasileiro, não há regra jurídica dispositiva segundo a qual o procurador se haja de considerar
investido tio poder de substabelecimento. O outorgante pode a) nada ter expresso, e o procurador ter
substabelecido, o que pode dar ensejo a invocação do art. 1.300 do Código Civil (verbis “a quem substabelecer,
sem autorização”) ; b) ter proibido o substabelecimento (Código Civil, art. 1.300, § 1.0) ; c) ter permitido o
substabelecimento a determinada pessoa; d) ter permitido o substabelecimento a pessóa da escolha do
procurador (cf. Código Civil, art. 1.300, § 2.0).
A falta de poderes para substabelecimento não significa que se vede, então, o substabelecimento. O procurador,
que não tem poderes para substabelecer, vincula-se e vincula quem, com algum ato, promete cumprir a procura.
Não há inexistência, nem nulidade do substabelecimento. O que há é ineficácia no tocante ao outorgante de
poderes. Muito bem, pôsto que sem a termologia científica, disse 5. DE M. (Manual prático do Procurador, 1,
107) “Não fica, porém, absolutamente vedado o substabelecimento, não dando a procurador poderes para êle;
mas é que então excede o mandatário as condições do mandato, e fica responsável pelos atos do procurador,

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em que substabeleceu os poderes, e por êles responde”.


Para o substabelecimento com reserva de poderes, não se pode dizer, de modo absoluto, que se lhe outorgue
substabelecer com reserva. Se tem poder para substabelecer sem reserva, tem-no para substabelecer com
reserva. Se há. dúvida, entenda se que o pode, de jeito que, para que só seja permitido o substabelecimento sem
reserva, é preciso que haja cláusula que não deixe dúvida.
Não se há de afirmar, como fazia ANTÔNIO VANGUERVE CABRAL (Prática Judicial, VI, 19), que se
presuma com reserva o substabelecimerto de procuração. Se não havia poderes de substabelecimento, sim; se os
havia, não .
Se o procurador somente pode outorgar poderes por instrumento público (e. g., o analfabeto), também por
instrumento público é que pode substabelecer, mesmo se a procuração foi
por instrumento particular (Ordem n. ‘74 do Ministério da Fazenda, de 11 de abril de 1859). Se o procurador
substabeletente pode passar procuração por instrumento particular, o ter sido por instrumento público, inclusive
apud acta, a procuração, não é óbice ao substabelecimento por instrumento particular (Aviso n. 20 do
Ministério da Justiça, de 13 de janeiro de 1876).
O poder de substabelecer não compreende o de substabelecer a alguém que trate com o substabelecente; salvo
se o outorgante da procuração deu ao procurador o poder de contratar consigo mesmo.

§ 4.702. Espécies e efeitos do substabelecimento

1.CONSIDERAÇÕES PRÉvIAS. A propósito do ato de substabelecimento, negócio jurídico unilateral, pois só


se refere à procura, cumpre que não se lancem proposições gerais, como se todos os substabelecimentos fôssem
iguais, com os mesmos pressupostos e a mesma eficácia. Daí a necessidade de se prestar tôda a atenção às
espécies e aos seus efeitos.

2.SUBSTABELECIMENTO E SUAS ESPÉCIES. Se houve substabelecimento da procuração, ou o


substabelecente saiu da relação jurídica de procura, dando-se por instaurada a relação jurídica direta entre o
procurado e o substabelecido, ou o subatabelecente permaneceu em relação jurídica de procura com o
procurado, devido a explícita ou implícita reserva de poderes, ou devido a ser parcial o substabelecimento,
objetiva ou espacíalmente, ou por determinado tempo.

3.SUBSTABELECIMENTO SEM RESERVA DE PODERES. Se o substabelecente, que era legitimado ativo,


substabeleceu os poderes, sem qualquer reserva, há a substituição integral do substabelecente pelo
substabelecido, dito substituto. A relação jurídica de procura cessou entre o procurado e o procurador
substabelecente.
Se o substabelecimento é sem reserva de poderes, opera-se a substituição: o procurador, que substabeleceu,
deixou de ser procurador, e o substabelecido passou a ser o único procurador.
Cf. g~a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 21 de junho de 1948 (R. dos 7’., 176, 204). Surge
aqui problema de relevância: antes da notificação do procurado, a que se refere o art. 1.820 do Código Civil, ~
pode o substabelecente revogar a procuração? Sim, pois que ainda não se tornou eficaz, em relação ao
procurado, a suboutorga. Se há razão para o substabelecido ir contra o substabelecente, há de estar em outra
negócio jurídico existente entre êles.

4.SIJESTABELECIMENTO COM RESERVA DE PODERES. Substabelecimento com reserva de poderes é o


substabelecimento em que o substabelecente outorga poderes sem que os perca. Os poderes passam a ser
cumulativos. Cada um os tem, qualquer dos dois pode exercê-los. O substabelecimento dos poderes a e b, sem a
suboutorga dos poderes c e d, não é, prôpriamente, substabelecimento com reserva, mas sim substabelecimento
parcial de poderes. Os poderes, que o substabelecente suboutorgou, êle os perde.
O substabelecimento com reserva de poderes pode ser feito e tem de ser feito pelo procurador que não pode
advogar, salvo em se tratando de vedação constante do art. 1.825, 1-VI, do Código Civil. Nas Ordenações
Filipinas, Livro 1, Título 48, § 28, dizia-se: “E tôdas estas pessoas, que não podem ser procuradores, poderão
antes de lhes ser posta a exceção da incapacidade, substabelecer outros, a que não seja defeso, tendo para elo
poder dos constituintes, ou sendo já feitos senhores da lide, por ser contestada; porque depois de lhes a dita
exceção verdadeiramente ser posta, não poderão em esses feitos substabelecer outros procuradores, ainda que a
lide seja com êles contestada, ou tenham procuração para substabelecer”. Mas o Código Civil não tem tal regra

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jurídica. Quem não pode ser procurador não pode substabelecer: quem pode ser procurador fora de juízo e não
em juízo, sim, pode substabelecer. É de repelir-se a solução contrária da 2•a Câmara Cível do Tribunal de
Apelação de Santa Catarina, a 22 de julho de 1941 (A. J., 64, 235), e o que escreveram alguns juristas.
Se o substabelecente não poderia, por exemplo, ser procurador em juízo, e substabeleceu com reserva de
poderes, o que se há de entender é que o substabelecente se reservou o poder de revogar e constituir outro ou
outros substabeleci.. mentos, ou substabelecer a outrem alguns dos poderes, o que implica curnulação ou
revogação parcial.
A reserva de poderes implica, de regra, a reserva do poder de revogar o substabelecimento, mesmo se o
procurado teve ciência ou se foi notificado do substabelecimento

5. RESPONSABILIDADE DO SUBSTABELECENTE. Diz o art. 1.328 do Código Civil: “O


substabelecimento, sem reserva de poderes, não sendo notificado ao constituinte, não isenta o procurador de
responder pelas obrigações do mandato”. Se o substabelecimento foi feito com reserva de poderes, o
substabelecente é responsável perante o procurado, salvo se na procuração se previram os poderes reserváveis e
se pré-exonerou o procurador da responsabilidade pelos atos do substabelecido. Porém aí e na espécie do art.
1.328 do Código Civil é necessária a notificação. Sem ela, não há eficácia contra o procurado. A notificação é
dispensável se o procurado se deu por ciente (cf. 2~a Turma do Supremo Tribunal Federal, 14 de julho de 1950,
A. J., 97, 85).
Ciente ou notificado o procurado, tem êle de tomar as providências que julgue necessárias, inclusive a de
revogação da procuração ao substituído.
No art. 1.800, § 2.0, do Código Civil, diz-se: “Havendo poderes de substabelecer, só serão imputáveis ao
mandatário os danos causados pelo substabelecido, se fôr notôriamente incapaz, ou insolvente”. No Código
Comercial, art. 146, diz-se que o mandatário não pode sub-rogar se o mandato não contém cláusula expressa
que autorize a delegação”.
6.CESSAÇÃO DOS PODÉRES DO SUBSTABELECIDO. Os poderes do substabelecido somente cessam com
a extinção dos poderes do substabelecente se não se estabeleceu relação jurídica direta entre o procurado e o
substituto. Se, com a morte do substabelecente, cessa a relação jurídica entre o procurado e o substabelecente,
também cessa entre êsse e o substituto, mas há o art. 1.308 do Código Civil (direito e dever do outorgado).

‘7. SUBSTABELECIMENTO E PROCURAÇÃO EM CAUSA PRÓPRIA.


A procuração em causa própria é, em principio, suscetível de substabelecimento. Se o direito que se atribuiu ao
procurador em causa própria é divisível, pode haver substabelecimento parcial. Se o procurador dá procuração a
alguém sobre o objeto da procura cujos poderes lhe foram outorgados, e tal procuração não é em causa própria,
não há, propriamente , substabelecimento: há procuração ordinária, passada pelo procurador, que permanece
com os poderes outorgados pelo procurado.

8. MORTE DO PROCURADOR SUBSTABELECENTE. Se houve substabelecimento da procuração, de jeito


que se retirou da relação jurídica o substabelecente, a morte dêsse é sem repercussão na relação jurídica que se
estabeleceu entre o procurado e o substituto. Aliter, se o procurador, de que se trata, não tinha poderes para
substabelecer.

§ 4.708. Honorários do substabelecido

1.PRECISÕES. A dívida de honorários nada tem com a procuração em si mesma, mas sim com o contrato de
locação de serviços, ou de obra, ou com o contrato de trabalho entre o procurado e o substabelecido, ou entre o
substabelecente e o substabelecido. Não se pode lançar princípio a priori e a espécie do substabelecimento, da
subprocura, apenas é indiciária do que se passa entre os interessados (procurado, substabelecente e
substabelecido).
Não somente no caso de ser proveitoso ao procurado o exercício dos poderes outorgados ao substabelecido se
faz devedor aquêle (sem razão, L. GUILLOUARD, Traités des Contrats aléatoires d du Mandat, 49) ; nem o
proveito é pressuposto suficiente. Nem é admissível que, devendo ao substabelecente, sem dever ao
substabelecido, o procurado se exonere com pagar a êsse o que àquele devia, ou vice-versa (aqui, sem razão, a
4•~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 29 de janeiro de 1942, 1?. dos T., 148, 241).
Seria generalização errada dizer-se que, se houve substabelecimento, o procurado não deve honorários ao

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substabelecido (inadmissível a atitude do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 11 de março de 1911, São Paulo
J., 27, 404), ou que não se dá se houve reserva (Tribunal de Justiça de São Paulo, 14 de maio de 1920 e 13 de
outubro de 1921, 1?. dos 7’., 34, 328, e 40, 472). Depois, pretendeu-se que, se houve poder de substabelecer, o
substabelecido é que é o procurador e pois o titular do direito a honorários contra o procurado (1.~ Câmara
Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 17 de novembro de 1941, 1?. dos 7’., 138, 200). Tudo isso é fora
da apreciação dos fatos. O negócio jurídico de que podem provir honorários não é o da procuração; mas sim o
que se concluiu sobre locação de serviços, ou de trabalho, ou de advocacia.
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2. SUSTABELECIMENTO TOTAL E DEFINITIVO. Se houve substabelecimento com a saída da relação
jurídica por parte do substabelecente, por ser permitido ou por ser, como havia de fazê-lo o substabelecente, a
remuneração ou os honorários do substabelecido são pagos pelo procurado, e não pelo substabelecente. Porém
tudo depende do negócio jurídico subjacente, justajacente ou sobrejacente entre o procurado e o
substabelecente, ou entre êles e entre aquêle e o substabelecido.

3.SUESTABELECIMENTO SEM SAIDA DA RELAÇÃO JURÍDICA.


Se o substabelecente não saiu da relação jurídica de procura, a remuneração ou os honorários do substabelecido
somente são pagos pelo procurado, se êsse assumiu o dever perante o substabelecente ou perante o
substabelecido.
Por se não ter partido dos princípios, como seria de fazer-se, há vacilações na doutrina e na jurisprudência. Não
há solução a priori. Aliás, nesse sentido, mas sem partir de exame das espécies, a 1.a Câmara Civil do Tribunal
de Apelação de São Paulo, a 17 de novembro de 1941 (E?. dos 2’., 138, 200), e a 43 Câmara Civil, a 29 de
janeiro de 1942 (143, 241).
No Decreto n. 22.478, de 20 de fevereiro de 1938, o art. 26, II, explicita ser dever dos advogados “observar os
princípios de ética profissional, nos têrmos do Código respectivo”. O Código de Ética Profissional foi,
conforme o Decreto n. 22.478, art. 84, III, votado e aprovado pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados,
a 25 de junho de 1984; e na Seção VIII, Inciso IV, estabelece que “o advogado substabelecido com reserva de
poderes deve ajustar sua remuneração com o colega que Ibos outorgou”. A 1.a Câmara Civil do Tribunal de
Apelação de São Paulo, a 17 de novembro de 1941 (E?. dos 7’., 138, 200), frisou que o dever referido no
Código de Ética Profissional é meramente moral.

0 substabelecido somente pode invocar direito a remuneração nos mesmos casos em que o substabelecente o
poderia. Isso não afasta, que em virtude de pacto, ou cláusula de algum contrato, como o de advogado, seja
remunerada a atividade do substabelecido sem que o tenha sido ou o seja a do. substabelecente.
A procuração não torna remunerada a atividade do procurador. Há de existir negócio jurídico subjacente,
justajacente ou sobrejacente de que derive a remunerabilidade.

Titula XXXII

GESTÃO DE NEGÓCIOS ALHEIOS SEM OUTORGA


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CAPÍTULO 1

CONCEITO E NATUREZA DA GESTÃO DE

NEGÓCIOS ALHEIOS SEM OUTORGA


§ 4.704. Conceito e precisões

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1.CONCEITO. De início, observemos que não há contrato quando se começa a gestionar negócios alheios.
Para os juristas romanos clássicos passou despercebido, a despeito de alusões implícitas, que a classificação das
fontes dos deveres e das obrigações em contratuais e delituais não as esgotava. Na época pós-clássica falou-se
de obligationes quasi ex contraotu, para se arrumarem todos os deveres e obrigações que se não irradiavam de
contratos, nem de atos ilícitos absolutos. Puseram-se aí, como variae causarum figurae, várias figuras
(espécies) de causas, por provirem de direito próprio (proprio iure), conforme está em GAIO (L. 1, pr., D., de
obligationibus et actionibus, 44, 7). Na sistemática pós-clássica também se prestou atenção a causas que não
eram delituais, pôsto que com elas se parecessem: quasi ex delicto. Eram actiones in factum, pretórias, que
derivavam dessas fontes não contratuais, nem delituais (pois faltava o elemento culpa do responsável), nem
quase-contratuais, O. enriquecimento sem causa, a gestão de negócios (negotiorum gestio), as obrigações
nascidas da tutela, o legado per damnationem e as ações divisórias eram tidas como quase-contratuais. Quanto
às obligationes quasi ex delicto, a que correspondiam actiones iii factum, eram o lado passivo dessas ações
(acUo de dejeetis vel effusis, ação contra o navegador, o hoteleiro ou albergueiro pelas subetrações e danos
causados pelos dependentes, a ação contra o judez qui litem suam fecit).

No direito romano clássico, a gestão de negócios alheios sem outorga era explicada à semelhança do mandato,
pôsto que GIOVANNL PACCUXONI (Deila Gestione degli aí fari altrui, •3•a ed., 6 s.) o atribuísse, sem razão,
aos glosadores a paralelização.
No Código Civil brasileiro e no Código Comercial não se cogita de quase-contratos. Não há contrato na gestão
de negócios alheios sem outorga, mas a parecença com o mandato levou o legislador a inserir nos contratos a
gestão de negócios sem outorga, logo após o mandato (Código Civil, arts. 1.881-1.345). O art. 1.348 é
expressivo: “A ratificação pura e simples do dono do negócio retroage ao dia do comêço da gestão e produz
todos os efeitos do mandato”. No art. 1.296, parágrafo único,
o Código Civil previu a ratificação no caso de o mandatário praticar atos para os quais não tinha poderes
suficientes; no ad. 1.297, a atividade com excesso, ou em divergência com os têrmos do mandato.
Nos tempos do direito romano, a negotiorum gestio tinha maior importância do que hoje. O telégrafo, o telefone
e os transportes aéreos permitiram contactos rápidos, outorga de poderes e cuidado dos interesses pelo próprio
donti nus, que outrora não eram possíveis.
Tivemos de fazer a classificação exaustiva dos fatos jurídicos (Tomos II, §§ 159-248, e III, §§ 249-831) e
frisamos que o conceito de quase-contratos foi superado e explicamos o que se passa com a negotiorum gestio
(Tomo II, § 248). Na Tabela inserta no fim do § 159 (Tomo II), pusemos a gestão de negócios alheios, se não é
contra a vontade presumível do dono do negócio, como ato jurídico siricto sensu e, se contra a vontade
presumível do dono do negócio, como ato-fato ilícito.
Ponto assaz importante é o que diz respeito à ilicitude ou licitude da gestão de negócios alheios sem outorga tal
como se rege no Código Civil, arts. 1.831-1.345. Juristas há que têm os atos gestórios, a que se referem os arts.
1.381-1.345, como atos ilícitos absolutos, isto é, atos ilícitos no sentido do art. 159 do Código Civil. Ainda em
1960, LUIGI ARU (DelIa Gestione di affari, Coinmentario dei Codice Civile, 224 s.: “La gestione nasce da un
fatto illecito, costituito daíla intromissione spontanea di un sogetto nella sfera giuridica di un terzo”).

A vinculação ex lege não é só no caso de ilicitude. Sempre que não se pode atribuir a negócio jurídico o ter-se
alguém vinculado, o caminho é a determinação ex lege. Se não só um dos titulares de interesses em causa há de
ter deveres, a lei protege o agente e protege o que sofre a intromissão na esfera jurídica.
O lugar, pela natureza da gestão de negócios alheios, não seria entre os contratos, mas é aconselhável que dela
se trate após o mandato. Há intromissão na esfera jurídica alheia (Tomo V, § 581), seguida, ou não, de
ratificação, que é exercicio de direito formativo gerador (Tomo XXII, § 2.680, 5).
Após essas considerações, cumpre que se conceitue a gestão de negócios alheios sem outorga.
No Edicto do Pretor ofereceu-se adio no caso de alguém, sem ter recebido qualquer incumbência, cuidar, em
juízo, da defesa de ausente ou continuar o processo iniciado por pessoa falecida. A ação in factum, chamada
adio negotiorum gestio, era para o dono do negócio exigir do gestor o que houvesse percebido e o
ressarcimento dos danos que a gestão de negócios lhe houvesse produzido. Posteriormente, a ação foi estendida
a outras gestões, que nada tinham com o processo. Nos fins da República, ao lado da fórmula in factum conte
pia introduziu-se outra, fórmula in jus conte pia, com a cláusula ex lide bona.
Somente havia a ação se o negócio era alheio. Que eram negócios alheios? Negotium alienum, para B.

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AARONS (Reitrdge zur Lehre vou der negotiorum gestio, 195), seria o ato cujo conteúdo era juntar ao
patrimônio de outrem objeto de direito ou de dever, de afastar ou modificar algo que no patrimônio já se acha,
ou impedir qualquer dêsses fatos. Um tanto vago. Negócio alheio era qualquer interesse de outrem (direito,
pretensão, ação, exceção, ou simples ato de resultados beréficos). Por exemplo: a compra de mercadoria para
favorecer a indústria de terceiro. Hoje, pode haver ato gestório de negócio alheio que consista: a) em fatos
jurídicos stricto sensu, como adjunção, mistura, confusão, percepção de frutos para aquisição, destruícão de
coisas, inclusive matança de animais (e. g., em caso de doenças contagiosas), ou retirada de mobiliário que está
em algum lugar; b) em atos-fatos jurídicos, como tradição da posse, tomada de posse, ocupação, especificação,
acabamento de livro, quadro, estátua ou música (por exemplo, na ausência do autor que deixou de terminar a
música que havia de entregar, a certa data, para festa ou comemoração), abandono da posse, ou pagamento; e)
em atos jurídicos stricto sensu, como restituição de penhor, ou quitação; cl) em negócios jurídicos.
Assim, tem-se de distinguir do ato da gestão de negócios alheios sem outorga o fato que constitui o negócio.
Não se tem prestado a devida atenção a êsse ponto, razão por que há confusões lamentáveis. A gestão, por parte
do estranho, é ato jurídico strieto sensu, não é negócio jurídico. Se a pessoa gere contra a vontade manifesta,
infastável, ou presumível, inafastável, do dominus negotii, há ato-fato ilícito. O “negócio”, êsse, pode não ser
negócio jurídico, nem, sequer, consistir em ato jurídico stricto sensu.
Qualquer que seja o ato de gestão, mesmo se consiste em nôvo fato stricto sensu, é envolto em manifestação de
vontade do gestor. Ninguém gere sem querer gerir. O art. 1.335 do Código Civil explicita ser dever do gestor a
continuação da gestão e levá-la ao têrmo, enquanto o dominus negotii não está em situação de tomá-la a si, ou
não o estão os sucessores ou sucessor do dominws negotii. O art. 1.835 fala de “herdeiros”, mas apenas por ser
o que mais acontece. Pode tratar-se de legatário, ou de sucessor entre vivos. Enquanto o gestor não sabe quem é
o nôvo dono, tem de manter a sua função voluntàriamente assumida.
Entre o gestor e o dono do negócio não há qualquer relação jurídica que imponha àquele, ou que àquele permita
a gestão do negócio. Se há, não se pode pensar em gestão de negócios alheios sem outorga.
:0 negócio há de ser alheio.
Não escasseiam os cases em que alguém, que não tem dever nem direito de gerir negócios alheios, cuide dêles.
As razões jurídicas para se atuar por outrem são muitas e diferentes. Pode ocorrer que não haja nenhuma, como
se apenas ocorre amizade, compaixão, amor ao homem ou às crianças. Quem dá comida ao cão alheio, como
quem chama o carro para conduzir ao hospital o conhecido ou o desconhecido que na rua perdera os sentidos, é
gestor de negócios alheios sem outorga. Nem sempre se configura o dever moral de ajuda ou de auxílio aos
semelhantes. Mas a técnica legislativa teve de introduzir no mundo jurídico os atos de gestão de negócios
alheios sem outorga, para que houvesse deveres e direitos previstos nas leis.
Dizem-se negócios objetivamente alheios aquêles cujo conteúdo é de interesse alheio (pagamento das contas de
outrem, recebimento de encomendas do ausente, apagamento do fôgo que o foguete lançou na plantação
alheia). Negócios subjetivamente alheios são aquêles que se percebe ou se supõe ou se crê que nêles teria
interesse alguém (e. g., A dá o sinal para a compra de apartamento, que E queira adquirir, sem que A tivesse
sido incumbido de tal contrato). Aí a intenção de praticar o ato para outro é de grande relevância. O ônus de
afirmar e provar que se praticou o ato para outrem incumbe ao gestor.
A gestão de negócios alheios sem outorga pode ser de negócio que algum mandatário, comissário, ou
procurador, teria de praticar, ou queria praticar.
Também o mandatário para os atos a, b e e, pode gestionar negócios alheios no caso, do mandante sem
outorga. Sempre que o faz, explicitamente, quanto aos atos cl e e.
Os atos, positivos ou negativos, que o gestor de negócios alheios sem outorga pode ter praticado, não são
apenas os de assuntos patrimoniais, nem, sequer, os que se prendem ao tráfico jurídico. A ajuda pode consistir
em afastamento de perigo para a vida do interessado, dito, em sentido geral, dominus negotíi, ou para a sua
saúde, ou de alguém da sua família, ou de animal que pertença ao interessado. A cooperação ou a operação na
extinção de incêndio, ou no evitamento das conseqúências de inundação, podem ser objeto de gestão de
negócios alheios sem outorga. Dá-se o mesmo em casos de salvamento em acidentes de mar ou de montanha.

2. PRECISÕES. (a) A expressão “gestão de negócios” é ambígua, porque há gestão de negócios alheios e
gestão de negócios próprios. Dizer-se gestão de negócios alheios não bastaria, porque tal gestão não poderia ser
em virtude de negócio jurídico (e. g., mandato ou de lei). Costuma-se dizer, mais explicitamente, gestão de
negócios alheios sem mandato, mas também não seria suficiente: o contrato de que se irradia o dever ou o
direito de gestionar pode não ser o de mandato. Daí preferirmos: gestão de negócios alheios sem outorga. Sem

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outorga de direito ou de poder; portanto, sem prévia relação jurídica entre o gestor de negócios e o dominus
negotii. No direito romano, dizia-se apenas negotiorum gestio, mas também naqueles tempos havia o duplo
sentido. Na L. 3, ~ 1, D., qui potk,res in pignore rei hxypotheca habeantur et de his qui in priorznn c ‘edi¶orum
locum suceedunt, 20, 4, é de PAPINIANO a passagem em que se fala de “negotium fuerat gestum” a prúpésito
de mandato (ex causa mandati). M. WLASSAK (Zur Geschichte der negotiorum gestio, 26 e 140) considerou
tal sentido como sentido básico, mesmo para o Edicto pretório.
(b) A expressão “negócios” é demasiado estreita. Conforme uissemos e adiante exporemos, não só negócios
podem ser objeto de gestão. Nem, sequer, somente atos jurídicos.

8. ELEMENTOS NEGATIVOS E ELEMENTO POSITIVO. A gestão há de ser de negócios alheios e sem


outorga de poderes para gerir. Deis elementos negativos. Há um elemento positivo: a atividade, positiva ou
negativa, por outrem.
Os poderes para a gestão poderiam ser oriundos de negócio jurídico ou da lei. E preciso, portanto, para que haja
gestão de negócios alheios sem outorga, que não exista dever ou direito de gerir que provenha de qualquer
fonte.
Se o dono do negócio permitiu a gestão dos seus negócios por outrem, a sua permissão foi oferta, e não
permissão, de modo que a gestão implica aceitação: há contrato de mandato, feita ao público, ou a algum
grupo, a oferta, ou de locação de serviços, ou de trabalho, com a mesma particularidade da oferta. Não se há de
pensar em gestão de negócios alheios sem outorga.
Muito diferente é o que se passa quando a gestão corresponde ao que se presumiria que fôsse a atitude
gestionante do próprio dono. Aí, há gestão de negócios alheios sem outorga. Presumir-se que a gestão por
outrem seria querida pelo dono do negócio se estivesse diante das mesmas circunstâncias não é presumir-se que
o dono do negócio quis a gestão. Quando se presume que o dono do negócio quis, afirma-se que houve
manifestação de vontade do dono do negócio, de que pode nascer, por exemplo, contrato de mandato, ou de
locação de serviços, ou de trabalho, com a conseqUência dú outorga de poderes.
A outorga pode ser feita a pessoa absolutamente incapaz, de jeito que também nessa espécie não há gestão de
negócios alheios sem outorga. Pode A dar poder ao menor de dezesseis anos, ou ao louco, para que abra o
chafariz, ou pague uma conta, ou entregue uma carta, ou, até, compre no armazém ou na loja de fazendas. A
gestão de negócios alheios sem outorga só existe se o gestor é capaz, ou naqueles casos em que a lei permite a
responsabilidade do relativamente incapaz. Se quem geriu foi o absolutamente incapaz, as regras jurídicas são
as que se referem à responsabilidade dos representantes legais dos absolutamente incapazes. Se o relativamente
incapaz poderia delinquir, pode haver a responsabilidade penal e a de direito privado pelo ato ilícito absoluto.
Em quaisquer casos há a responsabilidade pelo enriquecimento injustificado.

4. INTERESSE DO DONO DO NEGÓCIO. O interesse do dono do negócio é, quase sempre, determinável


objetivamente. Por exemplo, em todos os casos em que o gestor evita ou quer evitar danos. Mas pode resultar
de desejos ou hábitos do dono dos negócios, que sejam manifestáveis e suscetíveis de prova (interesse na
compra de livro raro, ou de outro objeto para coleção, interesse na aquisição de casa de campo em Teresópolis,
ou em Campos do Jordão, ou na praia de Boa Viagem). Nessas espécies, o interesse só é determinável
subjetivamente (JoSEP ESSER, Lehrbuch des Schuldrechts, 829; sem razão, FR. LEONHARD, Resonderes
Schuldrecht, 2~a ed., 442, que entende só haver interesse subjetivamente determinável, porque, mesmo em caso
de danos evitáveis, se tem de exigir que o dono do negócio os quisesse evitar). Se o dono do negócio proibiu,
expressamente, a gestão por parte de outrem (= não dêle, nem de algum outorgado), a gestão de negócios
alheios sem outorga é contra a vontade do dominus negotii, mas, ainda aí, é possível que as circunstâncias
sejam tais que se não possa interpretar como absoluta, a despeito dos seus têrmos, a proibição. O exemplo
melhor esclarece. Se A pôs nos portões da sua fazenda, ou da fábrica, o cartaz “proibida a entrada”, ou
“absolutamente proibida a entrada a pessoas estranhas à emprêsa”, não se pode entender que tenha havido
proibição para o caso de urgente penetração pelos portões, ou por salto do muro, ou por arrombamento no caso
de incêndio e que nao há indícios de ter havido início de salvamento.

5. VONTADE A FAVOR, MANIFESTA OU PRESUMIDA, E VONTADE CONTRÁRIA Ã GESTÃO POR


OUTREM SEM OUTORGA. A vontade do dono do negócio pode ser manifesta, sem que haja manifestação de
vontade outorgativa, que seria negocial. E o que ocorre com as espécies em que o dono do negócio nf2:ou
cartaz “Favor não deixar aberto o portão”. Se alguma pessoa passa e o deixa aberto, poderiam entrar os bois ou

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os cavalos ou os carneiros nas plantações de flôres, e quem os afasta a tempo e fecha o portão, é gestor de
negócios alheios sem outorga, embora haja a invitação ao público, que está na taboleta e contém, sem qualquer
dúvida, vontade manifesta de auxílio à correção dos descuidos, das desatenções, ou mesmo das maldades dos
passantes.
A vontade do dono do negócio pode ser presumida. Presume-se que o plantador de flôres queira que o
transeunte que lhe abre o portão o feche para que não penetrem no seu sítio os animais.
Algumas leis e juristas entendem que há de haver a vontade manifesta ou presumida, ou não haver vontade
contrária. Se se concebe a gestão de negócios alheios sem outorga somente se não há vontade contrária, tem-se
de admitir exceção para o caso de haver dever de origem legal, ou de interesse público. A melhor concepção é a
de considerar-se ocorrida a gestão de negócios alheios sem outorga em qualquer das circunstâncias em que não
haja vontade contrária, ou se a vontade contrária r.ao levaria à delituosidade. O sistema jurídico não pode deixar
de dar entrada a atos de gestão de negócios alheios sem outorga, nos casos em que a vontade contrária é, por
exemplo, contra regras jurídicas cogentes de interesse público.

6. CONCEITO DE DONO DO NEGÓCIO. O dono do negócio nem sempre é o dominus proprietatis. Pode ser
o enfiteuta, o usufrutuário, o usuário, o titular do direito real de habitação, o titular do direito de penhor, o
possuidor próprio ou e impróprio, o possuidor imediato ou o mediato, o próprio tenedor. O motorista que
deixou o carro na esquina e foi alinoçar, esquecendo-se da chave na porta, ou pendurada, é dono do negócio, em
relação a quem encontra o carro e, sem saber onde está o dono, o leva à garagem próxima, dando gorjeta a
alguém para que espere o motorista. A gestão de negócios, aí, foi no interesse do motorista e do dono. Nos
textos romanos, há alusão à gestão de negócios alheios sem outorga em que o dono é usufrutuário (L. 12, § 2,
D., de usu fruo tu et quemndmodum quis utatur fruatur, 7, 1) ou titular de direito de penhor (L. 15, pr., D., de
furtis, 47, 2). Não se há de dizer que a gestão é por conta do dominus negotii (êrro em que incorrera ElETRO
COGLIOLO, Tratt ato teorico e pratico deti’Administrazione degli affari altrui, 1, 367), a gestão é no interesse
de outrem.
Tem-se dito que, em se tratando de ias in re aliena, a gestão é sempre no interesse do titular do direito real
enquanto êsse existe. Se cessa, o dominus rei passa a ser o dominus negotii (e. g., GIoVANNI PACCHIONI,
Deita Gestione degli affari altrui, 33 ed., 117 5.; certo, LUIGI ARU, DeIla Gestione d’affari, Commentario dei
Codice Civile de ANTONIO SOTALOJA e 0w-SEPPE BRANCA, 215). Ora, durante o tempo do usufruto e o
tempo do penhor, há interesses do proprietário e interesses do usufrutuário ou do titular do direito de penhor. O
próprio usufrutuário, ou o titular do direito de penhor, como qualquer outro titular de direito real limitado, pode
gerir negócio do dominus proprietatis.

7. ENTIDADES ESTATAIS E SEUS ÓRGÃOS COMO GESTORES. As entidades estatais, sempre que
intervêm na esfera jurídica alheia para atos de gestão, sem que a lei ou negócio juridico lhes haja outorgado
poderes, são gestores de negócios alheios sem outorga, ou praticam atos ilícitos. Tem-se, portanto, de verificar,
em cada caso, o que ocorreu. Os pressupostos para que se dê gestão regida pelos arts. 1.331-1.845 do Código
Civil são os mesmos que se exigem aos atos gestórios das pessoas de direito privado, ou de direito público não-
-estatais.
Assim, a administração pública pode achar-se na situação de gestor de negócios alheios sem outorga, sem que
as decisões internas a respeito se imponham ao dominus negotii. Uma vez que o ato ou os atos foram praticados
pelo elemento da administração corno elemento, e não como pessoa de direito privado, os remédios jurídicos
processuais, inclusive o mandado de segurança, podem ser pedidos.

8.GESTÃO A FAVOR DE ENTIDADES PÚBLICAS. Em princípio, há proibição do Estado em que alguma


pessoa, estranha aos seus quadros, se intrometa nos serviços públicos. Se a gestão era início para acudir a
prejuízos iminentes, ou ofensa ao público, cabe a gestão de negócios alheios sem outorga. Se a entidade utiliza
o que foi feito como adequado a seus fins, ou se foi reconhecido, judicialmente, ou pela própria entidade
(mesmo tâcitamente), a utilidade da gestão, os princípios da vegotiorum gestio incidem.

§ 4.705. Natureza da gestão de negócios alheios sem outorga

1. ELEMENTOS COMPONENTES. O que constitui a figura jurídica da gestão de negócios alheios sem
outorga é a intervenção de alguém para ou no patrimônio de outrem, espontâneamente, isto é, sem que o tivesse

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determinado o dono do negócio, ou relação jurídica de dever perante o dono do negócio. Não é elemento
necessário a intenção de ser útil, ou eficiente, ou agradável, de ajudar, de preservar ou salvar algum bem. A
gestão de negócios alheios sem outorga pode ter sido com motivo do interesse do gestor, egoisticamente. O que
importa é que tenha havido gestão de negócio alheio e não tenha havido outorga de poder para isso. Está aí a
razão por que, a despeito de, a outros propósitos, ter outorga de poderes a pessoa, ser, a respeito dos atos que
praticou, tratado como gestor de negócios alheios sem outorga. Para o dono do negócio, a intervenção do gestor
pode ser desagradável, inoportuna e até danosa.
£ questão de fato saber-se ser a gestão de negócios alheios sem outorga foi com proveito para o dono do
negócio, ou se o não foi. O gestor pode ter querido o bem e ter feito o mal; ou vice-versa. Tudo isso é de
relevância quanto à eficácia da gestão de negócios sem outorga, no tocante à responsabilidade do gestor e a
direitos seus.
Da gestão de negócios jurídicos sem outorga não se irradia relação jurídica que corresponda à do mandato, à da
locação de serviços, ou à do contrato de trabalho.
A gestão de negócios alheios sem outorga é ato jurídico stricto sensu, não é negócio jurídico (Tomo II, § 159, in
fine). O ato jurídico strieto sensu é tratado como lícito ou ilícito, para a determinação das suas conseqdências
(direito à remuneração e a reembôlso de despesas, dever de prestar pelo enriquecimento injustificado, dever de
indenizar). Pode dar-se que o gestor se crera dono do negócio, isto é, que tenha praticado os atos como se o
negócio fôsse próprio; e em verdade apenas tenha sido gestor de negócios alheios sem outorga.
Os que reputam negócio jurídico a gestão de negócios alheios sem outorga são levados a isso por confundirem a
gestão, como tal, e os atos mediante os quais se gere o negócio. Ora, mesmo assim, não se justifica pensar-se
em negócio jurídico, pois o conteúdo da gestão pode não ser negócio jurídico, mas sim outro fato jurídico,
inclusive ato-fato jurídico, ou fato jurídico stricto sensu.
Fato-Juridico, pois o conteúdo da gestão pode não ser negócio jurídico, liepilamos que a gestão de negócios
alheios sem outorga seja representação” fingida (contrato fingido, P. L. RRTTZ, Das Fandektenreeht, 1, 1, 894;
H. DANKWARDT, fie negotiorum gestio, 26), ou verdadeiro contrato (A. OCONOWSKT, fie
Gesch.ãftsfiihrunq ohne Auftrag, 104>.
Se a gestão foi de acôrdo com a vontade do dono do negócio, mesmo presumida, a ratificação torna-a como se
fósse com outorga inicial; e. g., como se tivesse havido mandato (cf. L. SEUFFERT, fie Lekre von der
Ratihabitation der RechtsgeschÃ’ãf te, 50; MÂx BÕE, Geschdftsfuhrung gegen den Willen des Geschãftsherr,t
42 s.); não a identifica com o mandato (sem razão, B. W. LEIST, Das erlaubte ungerufene Eingreifen in fremde
Vermdgensangelegenheiten, 144; F. O. KÓLLNER, Die Grundziige der obligatio negotiorum gestorum, 119,
s.). Com a ratificação, o ratificante
o ratiabente insere-se na eficácia. Cf. E. CHAMBON (fie negotiorum gestio, 51 a.).

2.INTERESSE ALHEIO E GESTÃO POR OUTREM. O gestor de negócio alheios sem outorga pode não
saber que o negócio é seu, e não de outrem, como pode crer que seja seu e em verdade seja de outrem. Numa e
noutra espécie não há gestão de negócios alheios sem outorga: ali, porque o negócio não é alheio; aqui, porque
o gestor não gestiona por outrem. Donde ter-se de concluir que são pressupostos a atividade e o ser no interesse
de outrem (animus aliena negotia gerendi).
Se no negócio há interesse próprio e interesse alheio (concorrência de interesses), mesmo sendo aquêle superior
a êsse, configura-se, quanto ao interesse alheio, a gestão de negócios alheios sem outorga.
Se A sabe que E quer adquirir um quadro de Portinari e, encontrando-o numa cidade que está a visitar, o
compra, dizendo que o faz para si (ou nada dizendo), ou que o faz para o amigo A, pagando o preço ou
assumindo a dívida como procurador sem poder de procura, há gestão de negócios alheios sem outorga.
Se A, vizinho de E, vê que estão a chegar encomendas de E, ou remessas sem encomenda, e paga as despesas
de remessa, ou, até, o preço e as despesas de remessa, há gestão de negócios alheios sem outorga.
Se A, ao passar pela casa de E, observa que há fumaça que sai pela janela, ou pelo telhado, e entra (ou arrebenta
a porta e entra) para apagar o fogo, há gestão de negócios alheios sem outorga.
O comproprietário que faz a demolição da tôrre que ameaça cair, ou do muro que pode causar a destruição da
caixa de eletricidade, é gestor de negócios alheios sem outorga.
Se A, que atravessara a rua, percebeu que E, encarregado do sinal do tráfego, desmaiou, ou atendeu, quando não
o devia fazer, a quem o interrogava, e manejou o aparelho como E teria de fazer, A geriu negócio alheio sem
outorga.
Se E, que é o encarregado do tráfego, vê que alguém deixou na rua carro que a obstrui ou a torna de trânsito

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difícil. e o empurra, mesmo que êle tombe no despenhadeiro, há gestão de negócios alheios sem outorga. Se o
ato do gestor ce negócios alheios sem outorga foi lícito, ou se o não foi, é outra questão. Embora fôsse seu
dever vigiar a estrada, o interesse alheio consistia em retirar o carro que A deixara.
Muito discutido é o caso do automobilista que, para evitar que o carro apanhe a criança que a família ou a
empregada deixou atravessar a rua, o desvia e sofre danos ou os causa a outro carro. Não há, aí, gestão de
negócios alheios sem outorga. O dever era do chofer.
A gestão de negócios alheios sem outorga é a gestão para outrem no interesse e por conta de outrem.
Não é preciso, mesmo se se trata de gestão referente a negócio jurídico, que se mostre, desde o comêço, que se
manifestou a vontade de obrar para outrem, no interesse e por conta de outrem. O negócio jurídico ou outro fato
jurídico que se suscite, gerindo, não é o ato da gestão como instituto jurídico. Se A compra a máquina para E,
domin.us negotii, não precisa dizer a C, vendedor, que não tem outorga de podAres, nem, sequer, que compra
para E. O que pode ocorrer é que não haja efeitos contra E, como se A, em vez de comprar, vende bem de E, em
gestão de negócios alheios sem outorga: se E não ratifica, C, comprador, não pode exigir o bem que é de E.
(Para as doutrinas, antes de 1930, sobre o direito romano, a propósito da actio negotiorum gestorum, convém
ler HÂHNEMANN GUIMARÁES, Estudos sobre Gestão de Negócios, 19-71, principalmente quanto à
quadripartição justinianéia das fontes das obrigações e às tentativas francesas de explicação.)
O dominus negotii tem de provar o dano e terem sido arriscadas as operações feitas pelo gestor de negócios
(Código Civil, art. 1.888, 1.~ parte), ou ter o gestor de negócios preterido o interesse do doininus negotii por
amor dos seus interesses (Código Civil, art. 1.888, 2.8 parte).

3.VONTADE CONTRÁRIA INOPERANTE. A vontade contrária do dono do negócio não pesa se, sem a
gestão, o dono do negócio deixaria de cumprir dever de direito público, ou de direito privado mas de interesse
público o adimplemento. Se o interesse público, ou privado, só seria satisfeito se o dono do negócio
pessoalmente o houvesse cumprido, não há pensar-se em gestão de negócios alheios sem outorga. Daí dizer-se
que o gestor tem de mostrar que era de interesse público o adimplemento, mesmo se por atuação de outrem. Cf.
F. LENT (Wille und Interesse bei der Geschiiftsbesorgung, 29). Se o comproprietário ou o vizinho sabe que há
ameaça de desmoronamento do edifício e toma, por si, as medidas, uma vez que são urgentes e o risco não
permite que avise os comproprietários ou o proprietário, há gestão de negócios alheios sem outorga.
O problema do salvamento do suicida assume relevância excepcional, que justifica ser tratado especialmente.
Se A salva 13, que ia suicidar-se, ~, a) exerce A gestão de negócios alheios sem outorga, ou b) apenas cumpre
dever próprio perante a humanidade? Ainda poderíamos acrescentar a solução o) de se considerar
adimplemento cumulado: do dever moral (e religioso) de não se suicidar e do dever moral de quem salva. Com
a primeira solução, ERNST ZITELMANN (Ausschluss der Widerrechtlichkeit, Archiv fitr die civilistisofle
Praxis, 99, 113 s.; L. ENNECCERUS-H. LEI-IMANN, Lehrbueh, II, 542;
O.PALANDT, lihirgerliches Gesetzbuch, 14a ed., 667). Com a segunda, G. HILDEBRAND (Die auftraglose
Hilfeleistung nach geltendem und kiinftigem Recht, 1 s.). Certamente, o dever de não se suIcidar é só moral. O
que se tem de discutir é se há interesse público que dispense a vontade manifesta ou presumível do suicida de
ser salvo, o que, ex hupothesi, é de afastar-se, mas apenas como o que mais acontece.
Temos de focalizar o assunto perante o direito brasileiro e de modo adequado, sem preferências
extradoutrinárias.
‘O suicidio tem sempre suas causas. Não há, por certo, o direito à morte (Tomo VII, § 782, 2). O assassínio que,
após o ato de matar, se suicida não está nas mesmas circunstâncias de quem se mata por ter vergonha de ser-lhe
aberta a falência, ou de quem perdeu o filho na guerra, ou em acidente, menos ainda de quem apenas cria em
morte de pessoa querida que em verdade não ocorrera. Nos dois primeiros casos, a gestão de negócios alheios
seria contra a vontade do dono do negócio, do titular do direito à vida. No último, não: houve

o êrro, de modo que é evidente que a pessoa não se suicidaria se lhe chegasse antes a notícia com o desmentido.
Aí, há gestão de negócios alheios sem outorga, conforme a vontade presumível do dono do negócio.

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Também há gestão de negócios alheios sem outorga, mas coincidente com a vontade manifesta do dono do
negócio, se, no momento, quem tentou suicidar-se pede socorro, ou procede como quem quer salvar-se.
Não se pode, contudo (o que maior relevância tem em direito alemão), dizer que haja interésse público no
salvamento. O que pode existir é o serviço de salvamento, que mais se destina a salvar em casos de acidentes de
mar, de terra ou do ar.
Por outro lado, há argumento que escapou aos juristas. Se alguém salva o suicida, tem-se de supor que o
suicida, que volve à vida normal, deixou de querer matar-se, e isso é de interpretar-se como ratificação da
gestão de negócios alheios sem outorga.
O fato de haver dever moral, da parte do gestor, de jeito nenhum pode influir para que se não repute gestão de
negócios alheios o ato do gestor. Se houvesse dever jurídico, sim, porque haveria o dever e o direito de
gestionar. Quem tem direito de gestionar tem outorga, negocial ou legal, de poderes.
Quem gere negócios alheios sem outorga não precisa expor a razão íntima por que o fêz. O que importa é que
se hajam retinido os três pressupostos. O inimigo que salvou do incêndio a casa alheia é tratado com os mesmos
princípios jurídicos com que o amigo íntimo o seria. Se, no fundo, o inimigo se esforçou para mostrar a sua
superioridade moral sobre o dono da casa, que dias antes vira o ladrão que penetrara na casa daquele, não
importa.

CAPITULO II

PRESSUPOSTOS E EFICÁCIA DA GESTÃO DE NEGÓCIOS ALHEIOS


§ 4.706. Pressupostos da gestão de negócios alheios sem outorga

1.PRELIMINARES. E assaz relevante saber-se que a gestão de negócios alheios sem outorga exige três
requisitos, dois objetivos e um subjetivo. Os dois pressupostos objetivos são a falta de outorga de poder de gerir
(= de praticar o ato ou os atos gestórios> e a alienidade do negócio. Pressuposto subjetivo é o animus negotia
aliena gerendi, isto é, a volição do gestor quanto a gerir negócio alheio.

2.INEXISTÊNCIA DO DEVER DE GESTÃO. É elemento subjetivo da gestão a vontade de gerir (animus


negotia aliena gerendi), mas são elementos objetivos a não existência de re lação jurídica que dê ao gestor o
dever de gerir e a alienidade do negócio.
Se há relação jurídica, negocial ou ex lege, entre o gestor e o dono, de que resulte dever de gerir, não se trata de
gestão de negócios alheios sem outorga: quem tem o dever de gerir tem o poder de gerir. A outorga pode ter
sido negocial ou legal. O instituto da gestão de negócios nasce no espaço vazio que os outros institutos
deixaram, no tocante à gestão. Para que haja gestão de negócios alheios sem outorga, é preciso que o ato não
entre na classe daqueles em relação jurídica de que se irradia o dever de gerir. Por exemplo: se algum bem não
cabe nos que hão de ser administrados pelo titular do pátrio poder, os atos dêsse, no que se refere a gestão,
são atos de gestão de negócios alheios sem outorga, O que se exige é que o ato ou os atos sejam estranhos
àqueles de que emane o dever de gerir.
O empregado que pratica atos de administração, que escapam à sua atividade, mas de que êle conheceu a
praticabilidade, por seu cargo, apenas exerce gestào de negócios alheios sem outorga. Uma vez que o emprêgo
não abrange o ato que o empregado acha útil praticar, não atua como empregado, mas sim como gestor de
negócios alheios sem outorga. É o caso do motorista do automóvel que compra os pneus, por ter tido notícia da
alta próxima do preço, sem ter recebido dinheiro para isso. Ou o da empregada da cozinha que chama o
eletricista para consertar o lustre do salâo. Não dissemos “consertar o refrigerador”, porque é de uso outorgar-se
a empregada da cozinha telefonar para os fornecedores e os consertadores dos apareibos da cozinha. Quase
sempre, só se trata de nunciatura.
O depositário tem de restituir o bem recebido, e não tem de segurar o bem depositado. Se o bem estava seguro
e o depositante não o reformou, o depositário, que o faz, é gestor de negócios alheios sem outorga. Dá-se o
mesmo serião estava seguro e o depositário entende que as circunstâncias o exigem.
Ponto discutido é o de haver gestão de negócios alheios sem outorga, conforme os arts. 1.231-1.245 do Código

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Civil, se se a pessoa gestiona por dever ajurídico, de ordinário dever moral (pietas, humanitas, amicitia).
Negou-o GIOVANNT FACCHIONI (Dei quasi contratti, Diritto Civile italiano, Parte II, TU, 139 s.). Mas sem
razão. Quem intervém por amizade, humanidade ou amizade no negócio alheio, não intervém por dever
juridico. Só a outorga juridica e juridicamente feita pode obstar a que se repute gestão de negócios alheios sem
outorga a atividade do gestor.

8.PRESSUPOSTO DA ALIENIDADE 00 OBJETO DA GESTÃO .


O pressuposto é objetivo: o negócio é do gestor, ou não o é(id eM mm ejus qui gessit). Não importa se o gestor
também tem interesse ou é quem mais tem interesse na gestão. Mesmo se o negócio é de outrem e dêle, a
unicidade e a indivisibilidade ou divisibilidade difícil não afastam a gestáo de negócios alheios sem outorga. Ê
o que ocorre em se tratando de comuneiros de apartamentos, inclusive se o síndico não está presente para tomar
as providências urgentes.
Se o gestor de modo nenhum atendeu ao interesse do dono do negócio, mas o próprio, não há falar-se de gestão
de negócios alheios sem outorga, mas sim de invasão da esfera jurídica alheia, de usurpação, de esbulho, de
crime de apropriação ou de furto ou roubo. Rege a espécie, por analogia, o art. 1.382 do Código Civil. Se algum
despróveito adveio ao dono do negocio , a ação do gestor, diante da alienidade do interesse, é a ação de
enriquecimento injustificação , e não a acho negotiorum gesto-rum contraria.

4.VONTADE DE GERIR NEGOCIO ALHEIO. O pressuposto da volição é subjetivo. Além de se tratar de


negócio alheio (pressuposto objetivo da alienidade) e de não haver outorga de poderes (pressuposto objetivo da
falta de poderes), exige-se que tenha havido a vontade de gerir negócio alheio. A propósito, cumpre lembrar-se
que três teorias se digladiaram:
a)a teoria da gestão voluntária (ou teoria subjetiva da gestão), que se prende ao animus negotia aUena
gerendi; b) a teoria do entro ato (ou teoria objetiva da gestão, que abstrai do animus e só se interessa pelo ato
de gestão; e) a teoria mista (ou teoria objetivo-subjetiva), que separa a actio directa negotiorum gestorum, para
a qual basta ter havido a alienidade e a falta de outorga, e a acUo contraria negotiorum gestorum, que se ateve
à exigência do animus. Interessante é observar-se que nos textos romanos se poderiam encontrar arguinentos a
favor de qualquer delas. O animus ‘negotia aliena gerendi teria, segundo 3. PÂRTSCII (Studien zur
Negotiorum Gestio, 1 s.). obra de compiladores, do que discorda SALVÂTORE RICCOBoNo (Dai diritto
romano classico ai diritto moderno, Annali Universitâ Palermo, 8-4, 1917, 167 s., 247).
No direito brasileiro, não há referência explícita à vo1ição
fala-se de quem intervém na gestão de negócio alheio (Código Civil, art. 1.331) e de possível interessado contra
a manifesta ou presumível vontade do interessado (art. 1.332). Mas o pressuposto do animus existe. Se o gestor
pensa que o negócio é seu, não teve o anhinus. Nem há gestão de negócios alheios sem outorga se o gestor atua
para si, em seu próprio proveito (animo depraedendi), ou sem querer que o dono do negócio se são atos de
gestão de negócios alheios sem outorga. O que se exige é que o ato ou os atos sejam estranhos àqueles de que
emane o dever de gerir.
O empregado que pratica atos de administração, que escapam à sua atividade, mas de que êle conheceu a
praticabilidade, por seu cargo, apenas exerce gestão de negócios alheios sem outorga. Uma vez que o emprêgo
não abrange o ato que o empregado acha útil praticar, não atua como empregado, mas sim como gestor de
negócios alheios sem outorga. Ê o caso do motorista do automóvel que compra os pneus, por ter tido noticia da
alta próxima do preço, sem ter recebido dinheiro para isso. Ou o da empregada da cozinha que chama o
eletricista para consertar o lustre do salão. Não dissemos “consertar o refrigerador”, porque é de uso outorgar-se
a empregada da cozinha telefonar para os fornecedores e os consertadores dos aparelhos da cozinha. Quase
sempre, só se trata de nunciatura.
O depositário tem de restituir o bem recebido, e não tem de segurar o bem depositado. Se o bem estava seguro
e o depositante não o reformou, o depositário, que o faz, é gestor de negócios alheios sem outorga. Dá-se o
mesmo se não estava seguro e o depositário entende que as circunstâncias o exigem.
Ponto discutido é o de haver gestão de negócios alheios sem outorga, conforme os arts. 1.231-1.245 do Código
Civil, se se a pessoa gestiona por dever ajurídico, de ordinário dever moral (pietas, humanitas, amicitia).
Negou-o GIOvANNI FACCHIONI (Dei quasi contratti, Diritto Civile italiano, Parte II, III, 139 sj. Mas sem
razão. Quem intervém por amizade, humanidade ou amizade no negócio alheio, não intervém por dever
jurídico. Só a outorga jurídica e juridicamente feita pode obstar a que se repute gestão de negócios alheios sem
outorga a atividade do gestor.

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3.PRESSUPOSTO DA ALIENIDADE DO OBJETO DA GESTÃO.


O pressuposto é objetivo: o negócio é do gestor, ou não o é(id eM non eius qui gessit>. Não importa se o gestor
também tem interesse ou é quem mais tem interesse na gestão. Mesmo se o negócio é de outrem e dêle, a
unicidade e a indivisibilidade ou divisibilidade difícil não afastam a gestão de negócios alheios sem outorga. ~
o que ocorre em se tratando de comuneiros de apartamentos, inclusive se o síndico não está presente para tomar
as providências urgentes.
Se o gestor de modo nenhum atendeu ao interesse do dono do negócio, mas o próprio, não há falar-se de gestão
de negócios alheios sem outorga, mas sim de invasão da esfera jurídica alheia, de usurpação, de esbulho, de
crime de apropriação ou de furto ou roubo. Rege a espécie, por analogia, o art. 1.382 do Código Civil. Se algum
despróveito adveio ao dono do negócio, a ação do gestor, diante da alienidade do interesse, é a ação de
enriquecimento injustificado, e não a actio negotiorum gesto-rum contraria.

4.VONTADE DE GERIR NEGÓCIO ALHEIO. O pressuposto da volição é subjetivo. Além de se tratar de


negócio alheio (pressuposto objetivo da alienidade> e de não haver outorga de poderes (pressuposto objetivo da
falta de poderes), exige-se que tenha havido a vontade de gerir negócio alheio. A propósito, cumpre lembrar-se
que três teorias se digladiaram:
a>a teoria da gestão voluntária (ou teoria subjetiva da gestão), que se prende ao animus negotia aliena
gerendi; 14 a teoria do puro ato (ou teoria objetiva da gestão, que abstrai do animus e só se interessa pelo ato
de gestão; c) a teoria mista (ou teoria objetivo-subjetiva), que separa a actio directa negotiorum gestorum, para
a qual basta ter havido a alienidade e a falta de outorga, e a actio contraria negotiorum gestorum, que se ateve à
exigência do animus. Interessante é observar-se que nos textos romanos se poderiam encontrar argumentos a
favor de qualquer delas. O animus negotia aliena gerendi teria, segundo J. PARTSCH (Studien zur Negotiorum
Gestio, 1 s.), obra de compiladores, do que discorda SALVATORE RICCOBONO (Daí diritto romano classico
aí diritto moderno, Annali (Jniversità Palermo, 3-4, 1917, 167 s., 247).
No direito brasileiro, não há referência explícita à volição:
fala-se de quem intervém na gestão de negócio alheio (Código Civil, art. 1.331) e de possível interessado contra
a manifesta ou presumível vontade do interessado (art. 1.382). Mas o pressuposto do animus existe. Se o gestor
pensa que o negócio é seu, não teve o animus. Nem há gestão de negócios alheios sem outorga se o gestor atua
para si, em seu próprio proveito (animo depraedendi), ou sem querer que o dono do negócio se vincule (animo
donandi). Ali, há ato ilícito stricto sensu, Aqui, liberalidade.
No art. 1.334 do Código Civil dá-se ao gestor de negócios alheios sem outorga o dever de comunicar ao dono
do negócio a gestão. O gestor pode ignorar quem seja o dono do negócio. Não pode comunicar a gestão. Se o
caso é de grande importância, pode requerer editais, para que se apresente e comece de gerir quem é o dono. O
dever de continuar de gerir, mesmo se o gestor não descobre quem é o dono, subsiste enquanto o gestor não faz
a comunicação edital da gestão, fixado pelo juiz prazo para resposta, findo o qual se nomeia substituto, havendo
perigo em que fique sem gestão o negócio.
Os deveres do gestor existem se êle ignora quem é o dono, temo se cria ser de outra pessoa que o dono o
negócio. Na L. 5, § 1, D., de negotiis gestis, 3, 5, ULPIANO diz que, se eu pensava que os negócios, que geria,
eram de Tício, sendo de Semprônio, só Semprônio está vinculado pela ação de negócios; e na L. 40, PAULO
frisa que, se alguém defendeu o meu escravo em causa r,oxal, ignorando-o eu ou estando ausente, tem contra
mim a ação de gestão de negócios. Dá-se o mesmo se fôra o escravo. que pedira (L. 41).
O instituto da gestão de negócios alheios sem outorga não é instituto que regule tôdas as situações em que
alguém, sem outorga, geriu negócios de outrem. Quem geriu o negócio, crendo-o seu, não o geriu como negócio
alheio. Donde ser preciso que o gestor conheça a alienidade, embora não seja requisito essencial saber-se quem
é o dono. O bem não deixa de ser de outrem se o gestor lhe ignora o nome.

5.GEsTÃO DE NEGÓCIOS ALHEIOS SEM OUTORGA E AÇÃO PROPOSTA EM JUÍZO. Discute-se se o


gestor pode ingressar em juízo como gestor, sem precisar da caução de rato (Código de Processo Civil, art.
110), ou se, como gestor, pode exercer a pretensão à tutela jurídica. Há a resposta afirmativa e a negativa (cf. F.
O. LIPARI, Gestione di affari e rappresentanza processuale, Studi di Diritto processuale in o’nore di GIUsEPrE
CHIOvENDA, 500 s.). Todavia, cumpre distinguir-se da ação que se vai propor como ato de gestão de negócio
alheio sem outorga, como se alguém invade as terras de E e A quer propor a ação possessória ou a de
indenização, a ação que resultou da própria

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gestão (vendeu A frutos das terras de E, de que êle assumira, sem outorga, a administração). Aqui, A é
legitimado, age no próprio interesse, e não do dominus negotii, pois que lhe incumbe continuar a gestão
começada e levá-la a bom têrmo.
o dominus negotii pode intervir como litisconsorte porque também é interessado (cf. Código de Processo Civil,
arts. 88 e 90).
6. CAPACIDADE DO GESTOR DE NEGÓCIOS ALHEIOS SEM OUTORGA. Quanto à capacidade do
gestor de negócios alheios sem outorga, discute-se se há de ter a) a capacidade para contratar, ou b) não ser
incapaz no tocante a vinculação por ato ilícito absoluto. Se a), regem os arts. 59 e 6.0, 145, 1, 147, 1; se b), o
art. 156 (“O menor, entre dezesseis e vinte e um anos, equipara-se ao maior quanto às obrigações resultantes de
atos ilícitos, em que fôr culpado”). Não há, no direito brasileiro, regra jurídica que corresponda ao art. 2.029 do
Código Civil italiano: “II gestore deve avere la capacitâ di contrattare”.
Uma vez que o sistema jurídico afastou a ilicitude dos atos gestórios regidos pelo Código Civil, arts. 1.331-
1.845, seria contraditório que exigisse a capacidade delitual para os gestores de negócios alheios sem outorga.
Tal capacidade teria de ser a dos que gerissem negócios alheios ilicitamente. O gestor gere o negócio alheio
porque quer, e a lei lhe permite que o queira, regulando as conseqUências da entrada e da permanência da
gestão no mundo jurídico. A lei não pôs a gestão de negócios alheios sem outorga no Título VII, sobre
“obrigações por atos ilícitos”.
Se o gestor era absolutamente ou relativamente incapaz, há ação de enriquecimento injwstificado, com base no
art. 157 do Código Civil (Tomos 1, § 68, 6; IV, §§ 410, 2, 424, 18; XXIV, § 2.909, 2; XXVI, § 8.144, 2). Já
assim era no direito romano (L. 3, § 4, D., de negotiis gestis, 3, 5). Estaria dificultada a proteção dos incapazes
se pudessem êles ficar vinculados pela gestão de negócios alheios sem outorga.
Se algum dano resulta da gestão pelo incapaz, é preciso que se trate de ato ilícito absoluto e possa ser
responsabilizado por ilicitude do ato o incapaz, para que se permita a ação de indenização.

Se o dono do negócio auferiu lucro da gestão do incapaz, há a ação para que se preste ao gestor o que perdeu se
não alcança todo o proveito do dono do negócio.

7.GESTÃO A FAVOR DE INCAPAZES. Preliminarmente, advirtamos que a gestão de negócios alheios sem
outorga a favor de incapaz, de que se cogita, é a que satisfaz os pressupostos objetivos e o subjetivo. Se a
pessoa é absolutamente ou relativamente incapaz, a gestão é em nome do incapaz, e não do representante.
Devemos afastar a tese que vê ai gestão em nome e por conta do representante, que seria o dominus negotii. A
omissão do representante dá ao incapaz a ação contra êle.
Em todo o caso, pode acontecer que os atos tivessem de ser praticados em nome do representante, sem qualquer
alusão ao incapaz, e há atos de tal espécie. Aí, excepcionalmente, a gestão de negócios alheios sem outorga foi
em nome do representante, e não do incapaz.

8.GESTÃO EM NOME PRÓPRIO. O gestor pode ter gerido im nome do dono do negócio ou em seu nome
próprio. Na primeira espécie, se o gestor geriu útilmente, o dono fica vinculado aos terceiros e pode ir contra
êsses. Na segunda espécie, as relações jurídicas são apenas entre gestor e dono do negócio, e não entre dono do
negócio e terceiros. Dai ter êsse o direito ao reembôlso do que foi desembolsado por sua conta, com os juros
desde o desembôlso. (Aliás, é preciso que não se confundam os atos de gestão em nome do gestor com a gestão
em que não existiu o animus negotia aliena gerendi. Aquêles podem cxistir sem essa, como essa sem aquêles.)
Se a gestão foi como se o gestor fôsse o dominus negotii, falta o animus negotia aliena gerendi e os princípios
relativos à gestão de negócios alheios sem outorga não são invocáveis. Tem-se de examinar a posição jurídica
do gestor. Pode ser a de possuIdor em caminho de usucapir, pode ser a do ladrão, ou a do esbulhador, pode ser a
de possuidor com posse imprópria, imediata ou mediata, que se crê dono e, pois, possuidor próprio, pode ser a
de tenedor que se crê possuidor.

9.“PRoHIBITIO DOMINI”. A gestão que se iniciou contra manifesta vontade do dono do negócio é a gestão
infringente da prohibitio domini. Essa pode ser posterior ao comêço da gestão. Ali, a gestão ou foi ato ilícito ou
cabe no art. 1.332 do Código Civil, com as respectivas conseqUências. Se a gestão satisfez os pressupostos
objetivos e o subjetivo (alienidade, falta de outorga e animus negotia aliena gerendi), não foi ato ilícito, nem no
é. Se a prohibitio domini importaria violação de lei cogente, não se há de levar em consideração. Aliás, as
circunstâncias podem ter mudado e a vontade presumida do dono do negócio ser diferente da que êle externara.

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Se da gestão, ato infringente da proibição, resultou vautagem para o dono do negócio, não se pode falar de
ilicitude, porque, no art. 159 do Código Civil, se supõe o dano (“violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica
obrigado a reparar o dano”). Aí, o gestor não tem a actio negotiorum gestor-um, mas a ação de enriquecimento
injustificado. Não se lhe pode negar tal ação com o argumento de que foi o próprio gestor que procedeu contra a
proflibitio domini, e não se compreenderia que fôsse contra o dominus proflibens. O art. 971 do Código Civil
não atinge a espécie.
Se a prohibitio domini é contrária à lei, ao interesse público, à moral e aos bons costumes, a gestão nenhum
empecilho encontra. A ação, aí, é a actio negotiorum gestorum.

10.LIMITES OBJETIVOS DA GESTÃO. Os limites da gestão não são dado a pela vontade do dono do
negócio, salvo para a diferença de efeitos de que cogita o art. 1.382 do Código Civil. A vontade do gestor, a sua
atividade inicial, é que pode dizer até que ponto se estende a gestão. Quando o gestor procurou conhecer e
seguir “a vontade manifesta ou presumível” (arts. 1.331 e 1.832) do dominus negotii, já cogitou dos limites da
gestão; porém é o seu ato, em si, que verdadeiramente os traça. Não há limites contratuais à gestão, mas há os
limites que resultaram do que o gestor quis.

A gestão de negócios alheios sem outorga pode ser restrita a determinado negócio, ou a alguns negócios, ou a
classe de negócios, como as existentes em cidade, ou fazenda, ou a todos os negócios do dono. Pergunta-se:
apode haver gestão de negócios alheios sem outorga para atos d&alienação, inclusive de bens imóveis? O
gestor pode praticar atos de disposição, sem que a isso seja óbice exigir-se para tais atos forma especial
da procuração (Código Civil, art. 1.289 e §§ 1Y~8.o). As regras j uridicas de forma, concernentes à procuração,
nada têm com a representação ex lege.
O que se tem de investigar é a extensão que a volição do gestor deu, inicialmente, à gestão, sem que isso afaste
a superveniência de outros atos gestórios, que se hão de ter como outras gestões, e não como dilatações da
gestão que se iniciara.
A praticar alguns atos de disposição fica vinculado o gestor pelo próprio dever de continuação, pois, algumas
vêzes, o ato inútil ou os atos iniciais que puseram no mundo jurídico, como ato lícito, a gestão, implicam que
só possa ser continuada mediante atos de disposição, que nela se incluem ou lhe são conexos.
Pràticamente, é de perguntar: Se C quer gerir, sem outorga, os negócios de A, dentre os quais consta passar
escritura pública de compra-e-venda do edifício a B, porque, se A não ti faz, ou se algum não o faz por êle,
incorre êle em pena convencional considerável, ou tem de responder conforme o pré-contrato, ~pode C passar a
escritura pública de compra-e-venda e cc 1 :‘Qismissão da propriedade e da posse?
Suponhamos que C haja tomado posse do edifício, para simplificarmos a solução.
O tabelião não pode deixar de admitir que o gestor figure na escritura pública, desde que declare a qualidade em
que o faz. O fisco não pode recusar-se a receber os impostos, quer tenham de ser pagos pelo outorgante, o
dominus negotii, quer pelo outerçado. O que é essencial é que do instrumento público conste a individuação de
C e a explícita referência à sua qualidado de gestor de negócios alheios sem outorga.
Feita a escritura pública e transcrita, com as particularidades do caso, se advém a ratificação, a eficácia do
contrato de compra-e-venda e dos acôrdos de transmissão da propriedade o da posse é completa e definitiva. Se
há a desaprovação, os negócios urídicos têm de ser considerados inexistentes, porque a sua existência e a sua
eficácia dependiam da ratificação.

§ 4.707. Distinções quanto à responsabilidade do gestor

1. INICIO DA GESTÃO DE NEGÓCIOS SEM OUTORGA. Uma vez que compõe a figura da gestão de
negócios alheios sem outorga o ter-se alguém ocupado de negócio de outrem empregada, aí, a expressão
“negócio” em seu senso mais largo sem ter recebido poderes para isso, qualquer ato do estranho que atinja o
patrimônio, ou outro setor da esfera de interesses, mesmo que só entre no mundo jurídico como fato jurídico
stricto sensu, é início da gestão de negócios alheios sem outorga. Supõe-se que tenha havido espontaneidade,
embora não se exija que o ato do gestor não tenha excedido o que êsse queria. Quem fecha a chave da
eletricidade, para que não trabalhem as máquinas da emprêsa de A, que está ausente e sem empregados naquele
momento, iniciou gestão de negócios alheios sem outorga, mesmo que pare nesse ato. Quem apanha a chave do
edifício, que caíra no jardim, sem que o dono da casa o percebesse, não mostrou querer mais do que guardar a
chave. Mas isso não corresponde a todos os casos. Pode ser que, demorando o dono da casa, quem apanhou a

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chave entenda que há de verificar o que se passa dentro da casa.

2. VONTADE DO DONO DO NEGÓCIO. Pode haver interesse do dono do negócio sem que haja a sua
vontade, pode haver interesse do dono do negócio e haver a sua vontade. Os dois elementos hão de existir, para
que a gestão de negócios alheios não seja contra a vontade e o interesse do dono do negócio. Se, porém, a
gestão ocorreu contra a vontade manifesta ou presumida do dono do negócio, houve gestão para outrem,
embora as regras jurídicas sobre responsabilidade sejam especiais. Se sobrevém ratificação, o ato do dono do
negócio como que apaga, no passado, o que fôra vontade contrária do dono do negócio. Se o dono do negócio
não ratifica a gestão, então sim, incidem as regras jurídicas especiais à gestão de negócio contrária à vontade
do dono do negócio.
O Código Civil brasileiro não afasta a gestão de negócios alheios sem outorga se havia ou seria de presumir-se
haver vontade contrária do dono do negócio. O art. 1.382 cogita, precisamente, de tal gestão, e, seguido do art.
1.833, regula a responsabilidade do gestor. Por outro lado, há o art. 1.344 e o art. 1.340, que também supõem
gestões contra a vontade do dono do negócio.
3.GESTÃO CONTRA A VONTADE DO DONO DO NEGÓCIO. Lê-se no Código Civil, art. 1.332: “Se a
gestão fôr iniciada contra a vontade manifesta ou presumível do interessado, responderá o gestor até pelos casos
fortuitos, não provando que teriam sobrevindo, ainda quando se houvesse abstido”. Fala-se, aí, de vontade
manifesta ou presumível do interessado, contrária à gestão. Vontade manifesta em contrário é vontade que
proibe. Mas a própria proibição ex pressa nem sempre implica ser contrária a vontade do dono do negócio.
Circunstâncias podem ter surgido que possam fazer presumível a vontade de que se dê a gestão por outrem.
Presume-se, então, contra o que foi manifestado em declaração, porque, na proibição, só se levavam em
consideracão circunstâncias que a justificavam, e não as circunstâncias não previstas pelo ato vedativo.
Se se interpreta que a gestão se operou contra o que o dono do negócio exprimiu, ou seria de supor-se que o
proibiu, o art. 1.332 do Código Civil incide: há a responsabilidade pelos casos fortuitos, salvo se o gestor alega
e prova que êles teriam sobrevindo mesmo se a gestão não tivesse ocorrido. Se A não permitiria a E a
permanência na sua casa de veraneio e E para lá se foi, como gestor de negócios alheios sem outorga, responde
E mesmo pelo que aconteceu fortuitamente (por ter E ligado por exemplo a eletricidade). Não responde se a
eletricidade antes estava ligada (= o caso fortuito adviria mesmo se E não estivesse na casa de veraneio).

4. DEVERES DE INTERESSE PÚBLICO. O fato de não haver no Código Civil brasileiro regra jurídica
expressa sobre a gestão contra a vontade do dono do negócio, tal como existe no § 679, 1,a parte, do Código
Civil alemão, não é de pêso suficiente para que se afaste a invocação das regras jurídicas sobre a gestão de
negócios alheios sem outorga se se trata de dever moral do devedor no plano ético. Apenas não se pode
entender que o gestor possa impor o que pelos meios jurídicos a justiça não o poderia.
Há, porém, outro problema: o do tratamento da gestão de negócios alheios sem outorga, havendo, na espécie,
dever (jurídico) do dominus negotii. O Código Civil contém o art. 1.342, que somente estende ao entêrro a
obrigação legal de alimentos. Aqui, sim, é de interpretar-se a lei por analogia, com o que se põe o sistema
jurídico mais consentânea-. mente com o nível da cultura e da civilização, no tocante aos deveres de interesse
público.

§ 4.708. Deveres do gestor de negócios alheios sem outorga

1. DEVER DE AVISO. Trata-se de comunicação do fato jurídico de gestão de negócios alheios sem outorga.
Não seria acertado ter-se a comunicação como de vontade. Aí, a vontade do gestor foi fato, iniciou-se, e
prossegue a gestão, ou ainda não se iniciou, e vai iniciar-se, O aviso pode ser prévio, de jeito que a resposta é
manifestação de vontade não negocial. A previedade não negocializa o ato volitivo do gestor, nem a resposta
favorável se torna negocial. Se A percebe que o poste vai cair e avisa E, proprietário ou possuidor, quanto ao
seu propósito de assumir a gestão, e B não responde, ou responde favoràvelmente, não há contrato entre A e E.
O que se compõe é gestão de negócios alheios sem outorga, iniciada após manifestação de vontade não
negocial. Muito diferente seria se A apenas avisasse quanto ao fato do perigo. O aviso do gestor é aviso de fato
seu, passado, simultâneo ou posterior, e de modo nenhum se há de confundir com o aviso da ocorrêneta, mero
enunciado de fato estranho à pessoa que avisa, ou com o aviso seguido de oferta de contrato de mandato, ou de
locação de serviços, ou de trabalho, ou de outro contrato.
Se há perigo em se aguardar a resposta, ou, até, em se cogitar do aviso, a gestão não precisa ser iniciada antes

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de aviso ou com o aviso.


Lê-se no Código Civil, art. 1.384: “Tanto que ser possa, comunicará o gestor ao dono do negócio a gestão, que
assumiu, aguardando-lhe a resposta, se da espera não resultar perigo”. Aí, o que se aguarda é a resposta para se
continuar ou completar a gestão, “que (o gestor) assumiu O dono do negócio ou responde favoràvelmente, ou
responde contrâriamente ou não responde. A resposta favorável ratifica o que foi feito ou manifesta vontade
quanto à gestão, à sua continuação ou à sua terminação.
A gestão de negócios alheios sem outorga tem de cessar, se, após o aviso, ou tendo o dono do negócio sabido,
por outro meio, do que ocorreu, êsse se opóe à continuação, ou ao início.

§ 4.708. DEVER DO GESTOR DE NEGÓCIOS

De regra, não pode o gestor antepor-se à vontade do dono do negócio, salvo naqueles casos em que, mesmo
contra ela (manifestada ou presumida), poderia o estranho dar início à gestão. O gestor não mais pode pesar o
interesse do dono do negócio, porque há a manifestação contrária de vontade, O ono do negócio pode ratificar o
que foi feito e proibir a continuação, a qualquer momento.

2. DEVER DE DILIGÊNCIA. Diz o Código Civil, no art. 1.836: “O gestor envidará tôda a sua diligência
habitual na administração do negócio, ressarcindo ao dono todo o prejuízo resultante de qualquer culpa na
gestão”. O art. 1.386 refere-se ao dever de diligência e à responsabilidade em qualquer caso de culpa.

3.DEVER DE INFORMAÇÕES INTERCORRENTES. À medida que prossegue a gestão, tem o gestor o dever
de informações sobre o que ocorre durante ela, se o dono do negócio as recomenda ou exige, ou se o assunto
por si mesmo precisa ser conhecido pelo dono do negócio.
Não há precisão a priori sobre os casos em que o gestor pode deixar de comunicar e os em que a comunicação é
dispensável. A novidade da circunstância, que o dono do negócio ignora ou é de presumir-se que ignore, exige a
comunicação se há elevância para se saber se ao dono do negócio agradaria ou não.

4.DEVER DE CUIDADO PROVISÓRIO . Lê-se no Código Civil, art. 1.835: “Enquanto o dono não
providenciar, velará o gestor pelo negócio, até o levar a cabo, esperando, se aquêle falecer durante a gestão, as
instruções dos herdeiros, sem se descuidar, entretanto, das medidas que o caso reclame”. O gestor pode dar por
acabado o negócio. Tem de comunicá-lo ao dono do negócio, para que êsse tome as providências que lhe
pareçam necessárias. Enquanto isso não se dá, tem o gestor de esperar que se vença o prazo que foi marcado
para isso, desde que razoável. Se ainda não terminou o que se fazia mister, não pode o gestor interromper a
gestão, sem que o tenha decidido o dono do negócio, ou sem que tenha havido acôrdo a respeito. O dono do
negócio pode dizer quando se há de interromper a atividade do gestor, caso em que não pode o gestor antecipar
a interrupção.
Dono do negócio, herdeiros, ou outros sucessores podem dar instruções ao gestor, inclusive quanto à
permanência, à suspensão ou à interrupção.

a.DEVER DE CONTINUAR A GESTÃO. A gestão de negócios alheios sem outorga vincula antes de qualquer
manifestação de vontade do dominus negotil. Bastaria isso para se não pensar em já existir negocialidade com o
dono do negócio. A vinculação e esr lege. A lei estatuiu que o gestor, com os seus atos voluntários, se vinculou,
inclusive a continuá-la até “levar a cabo” o negócio (Código Civil, art. 1.335). Não há pensar-se, portanto, em
contratualidade ou quase-contratualidade.
A lei, com a atitude que tem, pré-exclui que se trate de ato ilícito absoluto. ~ ponto, êsse, digno de todo o
relêvo. Não há contacto com o dominus negotil, mas a lei distinguiu a gestão que é ato ilícito absoluto (Código
Civil, ad. 159) e a gestão que a lei regula nos arts. 1.331-1.345 do Código Civil, mesmo na espécie do art.
1.832, em que há os pressupostos do art. 1.331, mas em que se presume ou se sabe que o dominus negotii se
oporia à gestão.
A volição do gestor é, portanto, assaz importante. Se se começou de gerir cora animus negotia aliena gerendi,
imola-se situação jurídica que independe da vontade superveniente do gestor, vinculado, por rei, à continuação;
se não houve aquêle annnus, falta o elemento subjetivo, que livraria o ato de ser ato ilícito absoluto.
A continuação, a que alude a lei, é a da gestão que se estabeleceu com os pressupostos (falta de outorga,
alienidade, antmus nrgotia aliena gerendi) .A espécie do art. 1.832 do Código Civil é a espécie extrema,

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fronteiriça da gestão ato ilícito absoluto; em si, não é ato ilícito absoluto: apenas a responsabilidade do gestor é
agravada. (A técnica da lei corresponde à da mesma política jurídica que se encontra na vinculação a prestar o
enriquecimento injustificado, Código Civil, arts. 964-970, pôsto que, aí, a lei não exija o elemento subjetivo.)
A volição do gestor só é de considerar-se no momento em que começa de gerir. Depois, não. A lei exige a
continuidade, uma vez que foi o gestor quem quis a situação de gestão de negócios alheios sem outorga. A
pessoa, pela gestão, vincula-se,ao passo que, no enriquecimento injustificado, o vinculado não se quis vincular.
Pode ocorrer que a pessoa tenha iniciado a gestão como se o bem fôsse seu, e. g., se não sabia que adquiriria de
quem não era dono do bem móvel, mas, vindo a conhecer a titularidade alheia, haja entendido que seria
conveniente gerir o bem alheio, sem outorga, e como bem alheio.
Não se pode dizer que a gestão de negócios alheios sem outorga seja ato licito, que consiste na intromissão
voluntária de alguém na esfera jurídica de outrem. O sistema jurídico, desde cedo, atendeu à circunstância de
ser útil, às vêzes necessária, tal intromissão. Daí ter estabelecido a vinculação ex lege. Não se manteve o que
seria de esperar-se: a ilicitude. Nisso consistiu, no direito romano, a evolução. Em vez da repulsa, que o ato
ilícito determina, pôs o vínculo, de origem legal. O gestor quis, reconhecendo a alienidade, gerir o negócio
alheio, e a lei exige-lhe a continuação, para que êle não se possa soltar da gestão. A vontade do gestor,
manifesta no ato gestório, incrusta-se no mundo jurídico, sem ser preciso que permaneça. Não importa se o
gestor mudou de vontade, ou se não mudou de vontade. Quis, e isso foi o suficiente para ficar vinculado.
Em todo o caso, a vinculação à continuidade só se há de exigir se os pressupostos objetivos continuam. Se o
negócio deixou de ser de outrem, acabou-se a alienidade; portanto, não mais há falar-se de gestão de negócios
alheios e, pois, de vinculação do gestor a continuá-la e a levá-la a bom têrmo. Idem, se deixou de ser sem
outorga. A volição, elemento subjetivo, já não importa.
Há problema que precisa ser pôsto em têrmos claros:
~ a gestão pode cessar se o gestor crê que o dominus negotii está em situação de gerir, ou é de mister que
objetivamente esteja em tal situação? No sistema jurídico brasileiro, o gestor tem de comunicar e aguardar a
resposta. Assim, o negócio passa a não ser mais gerido inscio domino, de modo que o dono do negócio tem de
manifestar-se e pode ser empregada a ação da preceito cominatório.
Na ordinariedade dos casos, basta que o gestor exponha e que se passa, a necessidade de que o dono do
negócio, assuma a gestão e a dificuldade, se ocorre, em que se acha para continuar, e dizendo o prazo em que
espera a resposta. A falta de resposta põe em situação melindrosa o dono do negócio, porém não se pode ter a
fixação do prazo pelo gestor como acompanhado de eficácia de cominação. Essa dependeria do exame das
circunstâncias e da própria verdade das comunicações feitas. Daí, ser mais prudente o exercício da ação
cominatória.

§ 4.709. Responsabilidade do gestor de negócios alheios sem outorga

1.RESPONSABILIDADE DO GESTOR SE NA VONTADE MANIFESTA OU PRESUMIDA DO DONO DO


NEGÓCIO. Mais uma vez advirtamos que o dono do negócio pode não ter outorgado poderes, mesmo ao
público, e ter manifestado vontade de que alguém cuide do caso. Aqui, a manifestação de vontade não gera
negócio jurídico (mandato, locação de serviços, contrato de trabalho), nem, sequer, invitatio ad offerendum.
Donde poder-se falar de vontade manifesta ou presumida do dono do negócio.
Se o dono do negócio manifestou vontade, sem que se trate de oferta, isto é, sem que essa manifestação de
vontade seja negocial e possa levar a conclusão de contrato de custódia ou outra espécie de contrato, de modo
nenhum se há de falar de aceita ção pelo gestor de negócios alheios. (A propósito, cumpre notar, uma vez que é
muito difundida a tradução espanhola do livro de KARI LARENZ, Lehrbuch des Sehuldrechts, que o tradutor
pôs “aceitação” em lugar de tybernahme, confusão com Annahme, o que conspurca, profundamente, o
pensamento do autor, cf. II, 210, no texto alemão, e II, 370, na tradução espanhola. O gestor de negócios alheios
sem outorga não aceita, encarrega-se, iibernimmt. O êrro é repetido, muitas vêzes, na tradução.)
Se não houve oferta, da parte do gestor, ou do dono do negócio, não se pode pensar em contrato. O gestor
assume a gestão, a seu alvedrio, mesmo se houve vontade manifesta de que alguém cuidasse do interesse. O
conteúdo da relação jurídica corresponde em parte com o conteúdo da relação jurídica oriunda de mandato,
porém não se identifica com ela. Se a vontade manifestada previa conseqúências, não é, somente

por isso, negocial. Apenas o gestor que alega a vontade manifesta do dono do negócio sabe quais os seus
limites.

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O principal dever do gestor é o de dirigir o negócio alheio segundo o interesse e a vontade presumível (ou
manifesta, o que o Código Civil, art. 1.331, não previu) do dominus negotii. O gestor responde por tôda a culpa.
Se era de presumir-se a vontade contrária do dono do negócio, ou se tal vontade fôra manifestada, então sim
responde pelos casos fortuitos se não alega e prova que êles ocorreriam mesmo se não tivesse havido a gestão
(Código Civil, art. 1.882).

2.RESPONSABILIDADE DO GESTOR SEM OUTORGA E CONTRA


A VONTADE MANIFESTADA OU PRESUMIDA DO DONO DO NEGÓCIO.
Diz o Código Civil, no art. 1.333: “No caso do artigo antecedente, se os prejuízos da gestão excederem o seu
proveito, poderá o dono do negócio exigir que o gestor restitua as coisas ao estado anterior, ou o indenize da
diferença”.
A vontade do dono do negócio pode ser contrária, mas, se intervém, na espécie, interesse público, de que nasça
dever do dono do negócio, não se pode levar em consideração o que seria vontade ilícita. O problema torna-se
mais delicado se o dever é só moral. ~ Há gestão de negócios alheios sem outorga se A, que ouve conversa ou
lê notícia em jornal com referências a B, por faltar a dever moral (e. g., político, deixou de atender a comissão
de hospital que o procurou), ou dever de costumes sociais (como o de remeter cesta de flôres, no dia do
casamento da irmã), faz o que deixe bem a pessoa em falta? Se não ficaria bem, moralmente, a B deixar de
subscrever para determinada obra de caridade, ,há gestão de negócios alheios sem outorga se A por êle
subscreve? KARL LARENZ (Vertrag und Unreckt, II, 128; Lehrbuch des Schuld.. rech,ts, 209) e HANS
GRAMM (Palandt Phirgerliehes Gesetzbuch, 14.a ed., 664) admitem que se gestione o adimplemento de dever
moral; mas sem razão, diante da opinião contrária mais corrente (e. g., JOSEF ESSER, Lehrbuch des
Schuldrechts, 328). O argumento contrário de ser inconstrangível alguém em caso de dever só moral é decisivo,
porque, se o que importa, na gestão de negócios alheios sem outorga, é que o dominus negotii pudesse outorgar
poderes para a gestão e não haja outorgado, não pode o gestor impor o que a justiça não poderia.

Se qualquer pessoa que tenha dever moral de prestar pode encarregar mandatário, locador de serviços,
trabalhador ou núncio, de adimpli-lo, não se compreenderia que outrem não pudesse, sem outorga, fazê-lo. A
ratio legis é a mesma do art. 970 do Código Civil, salvo se incide o art. 1.332 (o art. 1.338 necessàriamente
incide) e não ocorre ratificação (art. 1.343).
Porém há a inconstrangibilidade na espécie, de jeito que não se pode interpretar o direito brasileiro como se
contivesse o § 679, 1.a parte, do Código Civil alemão.
O Código Civil brasileiro, nos arts. 1.382 e 1.388, de modo nenhum afasta que se possa gestionar negócio
alheio sem outorga se o dono do negócio se manifestou, expressa ou tâcitamente, ou mesmo presumidamente,
contra a gestão de negócios sem outorga. O arE 1.832 regula a responsabilidade do gestor; o art. 1.338 cogita do
equilíbrio entre prejuízos e proveitos oriundos da gestão.
A restituição ao estado anterior a que se refere o ad. 1.833 do Código Civil depende de ser possível, física e
juridicamente. Se não o é, a única via é a da indenização.
(Quando acima falamos de gestão para adimplemento de dever moral, apenas atendemos ao problema que
resulta de ter existido presumível ou manifesta vontade do dono do negócio e ser discutido se há de prevalecer
o dever moral. De modo nenhum se pense em que não haja gestão de negócios alheios se o dono do negócio
teria apenas dever moral ou mesmo de cortesia. Aí, se há ratificação, tudo se resolve. Se não há, regem
os princípios.)
3.REGRAS JURÍDICAS SOBRE A ATIVIDADE DO GESTOR. Lê-se no Código Civil, art. 1.331: “Aquêle
que, sem autorização do interessado, intervém na gestão de negócio alheio, dirigi-lo-á segundo o interesse e a
vontade presumível de seu dono, ficando responsável a êste e às pessoas com quem tratar”. A diligência exigida
é aquela que, presumivelmente, teria tido, tal como AUGUST STURM (Der Negotium utiliter gestum, 58 s.;
Das Grundprinzip der negotiorum gestio, 11) interpretava o direito romano, contra a opinião geral que aludia à
diligência do bom pai de família. Invocava êle a L. 18, § 1, D., de usuris et fructibus et causis et omnibus
accessionibus et mora, 22, 1, a L. 10 (11), D., de negotiis gestis, 3, 5 (contra, E. WIND
t

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SCI-IEID, Lehrbuch, J~, 9.~ ed., 915; PAUL KRtYGER, sobre olivro de AUGUST STURM, Archiv fiir die
civilistische Praxis, 62, 207).
4.OPERAÇÕES ARRISCADAS. Estatui o Código Civil, art. 1.338: “O gestor responde pelo caso fortuito,
quando fizer operações arriscadas, ainda que o dono costumasse fazê-las, ou quando preterir interesse dêste por
amor dos seus”. Aqui, o legislador pôs-se em frente do problema do risco. No direito romano, a L. 10 (11), D.,
de negotiis gestis, 3, 5, que é tirada de POMPÓNIO, mais atendeu à habitualidade, conforme PRÓCULO: se,
em nome do ausente, fazes negócio nôvo que êle não soía fazer, geres em teu nome. Se havia perda, era por
conta do gestor; o lucro, para o ausente. Se em algumas operações havia lucro e noutras perda, compensavam-
se os lucros com os danos.
No Esbôço de TEIxEIRA DE FREITAS, art. 8.431, inciso 1.0, dava-se a responsabilidade pelos casos fortuitos
se o negócio tratado fôsse de risco, que o dono não costumava fazer.
O Código Civil, art. 1.838, pôs fora a restrição e disse explicitamente: “ainda que o dono costumasse fazê-las”.
O Código Civil argentino, art. 2.294, 1~a parte, seguiu a TEIXEIRA DE FREITAS (“si ha hecho operaciones
arriesgadas, que el duefio dei negocio no tenia costumbre de hacer”). A eliminação, no texto brasileiro, foi obra
do Projeto Revisto, ad. 1.560.
A 2.~ parte do art. 1.388 do Código Civil alude àqueles casos em que o gestor pretere interesses do dono do
negócio, a favor dos seus (Código Civil argentino, art. 2.294, 2•a parte:
“si hubiese obrado más en interés propio que en interés deI duefio deI negocio”).
Ohábito dos negócios do dono há de ser observado pelo gestor, mas se as operações que êle fazia eram com
risco há de evitá-las o gestor. Se não eram de hábito do dono do negócio, a fortiori tem o gestor de delas abster-
se. Cumpre, porém, advertir-se que pode ocorrer que todo o âmbito pode ser que seja de risco, de álea. Então,
seria injustificável invocar-se o art. 1.338 do Código Civil. Ou o legislador teria de vedar a gestão de negócios
alheios arriscados, se não há outorga; ou permiti-la. A emprêsa de seguros pode ser objeto de gestão de
negócios alheios sem outorga, pôsto que dificilmente seja de conceber-se a repercussão da ausência ou da morte
a ponto de ser preciso que estranho cuide dela.
Quem tem interesses contrários ou em concorrência com os do dono do negócio e assume a gestão fica na
posição de pesar os seus atos, de modo que nenhum interesse seu passe à frente do interesse do dono do
negócio. Se o negócio é comum, que não haja contrariedade nem concorrência. Se, com bom êxito do negócio
gestionado, o gestor obtém atendimento aos seus interesses (e. g., se o gestor é o maior credor do dono do
negócio), não há a espécie do art. 1.838, 2~a parte, do Código Civil, salvo elemento a mais que componha a
figura. Acrescenta o Código Civil, no parágrafo único do art. 1.388: “Não obstante, querendo o dono aproveitar-
se da gestão, será obrigado a indenizar o gestor das despesas necessárias, que tiver feito, e dos prejuízos, que,
por causa da gestão, houver sofrido”. A solução é melhor do que a do direito romano. O dono do negócio ou
prefere aproveitar-se da gestão, a despeito do que se passou, ou deixa que incida o ad. 1.838 em tôdas as suas
conseqüências . As operações arriscadas podem ter sido proveitosas. A despeito de ter o gestor feito passar à
frente do interesse do dono do negócio o seu interesse, há casos em que mais importa ao dono do negócio
colhêr os resultados.
A propósito da expressão “despesas necessárias”, Ctóvis BEVILÁQUA (Código Civil comentado, V, 86) zurziu
o art. 1.338, parágrafo único, que procede do Projeto Revisto, art. 1.560, 2,a alínea, porque o dono do negócio,
aproveitando-se da gestão, deveria indenizar os prejuízos e as despesas, quer úteis quer necessárias. Melhor é
interpretar-se o art. 1.388, parágrafo unico. Se os prejuízos são compensados e são compensadas as despesas
que tiverem sido exigidas pela operação ou pelas operações, ou se lê o art. 1.338, parágrafo único, como se
dissesse “despesas necessárias” em vez de despesas que foram precisas, ou as despesas úteis foram retiradas ao
patrimônio do gestor e seriam prejuízos.

5. SUBSTITUIÇÃO NA GESTÃO. Pode ocorrer que o gestor de negócios alheios sem outorga se substitua na
gestão. 01 ato ou é dêle, sem qualquer interferência do dono do negócio, ou foi de acôrdo com as instruções.
Estatui o Código Civil, art. 1.337: “Se o gestor se fizer substituir por outrem, responderá pelas faltas do
substituto, ainda que seja pessoa idônea, sem prejuízo da ação, que a êle ou ao dono do negócio, contra ela
possa caber”. Aí, supõe-se que o gestor, a seu arbítrio, haja buscado quem o substituísse. A responsabilidade é
tôda sua. Não importa se concebeu a substituição, no todo ou em parte da gestão, definitivamente, ou por algum
tempo, ou em emergência, ou enquanto algo precisa ser feito por outrem, ou é conveniente que o seja.
Se o dono do negócio indica quem pode substituir o gestor, não há invocabilidade do Código Civil, art. 1.337. A
responsabilidade rege-se por outros princípios, como se o gestor sabia que sobreviera inidoneidade da pessoa

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indicada.
Diz o Código Civil, art. 1.387, parágrafo único: “Havendo mais de um gestor, será solidária a sua
responsabilidade”. A regra jurídica somente concerne à responsabilidade pelo substituto: se há dois ou mais
gestores, respondem solidária-mente pelas faltas do substituto. Se são dois ou mais os substitutos, a
responsabilidade é pelas faltas de qualquer dêles, ou de alguns, ou de todos.
6.INTERESSES E INVERSÕES. O gestor, que inverte frutuosamente as quantias recolhidas, tem de creditar
ao dono do negócio os interesses, juros ou lucros. Mesmo se foi no próprio interesse do gestor a inversão. Se
não há prova do que percebeu, os juros são os legais.

7.COMPENSAÇÃO E CONTAS DA GESTÃO. ~ Pode haver compensacão entre o que deve o dono do
negócio e o que deve o gestor? Não há razão para a negativa. A gestão de negócios alheios sem outorga, regida
pelo Código Civil, arts. 1.331-1.345, é lícita, e de modo nenhum se poderia considerar esbulho, furto ou roubo
o ato gestório inicial e, a fortiori, os atos continuativos, que se praticam por dever de continuação. Se há
diferentes gestões, a compensação há de ser interior a cada uma. Se a gestão abrange todo o patrimônio, a
compensação apanha todos os créditos e débitos compensáveis.

8.MORTE DO DONO DO NEGÓCIO. O gestor de negócios alheios sem outorga tem de continuar a gestão,
mesmo se falece o dono do negócio. Os sucessores ficam no seu lugar.
Não há distinguir-se da sucessão a causa de morte a sucessão entre vivos, nem dos herdeiros legítimos os
testamentários, on os legatários. Hão de ter tido conhecimento da comunicação que c’ falecido tivera, ou hão de
receber comunicação. Se há herança vaga, com a nomeação do curador, a comunicação é a êsse, salvo se consta
do processo a comunicacão ao falecido. Se ainda não foi nomeado o curador, o gestor de negócios alheios sem
outorja é legitimado a requerer a nomeação, como “interessado” (Código Civil, art. 463).

§ 4.710. Comunidade ou conexidade de interesse~

1.INTERESSES COMUNS. Os interesses podem ser só do dono do negócio e do gestor, ou conexos. Por isso
está no Código Civil, art. 1.345: “Se os negócios alheios forem conexos aos do gestor, de tal arte que se não
possam gerir separada-mente, haver-se-á o gestor por sócio daquele, cujos interesses agenciar de envolta com
os seus”. A lei refere-se à conexidade, mas havemos de entender comunhão ou conexidade. No Código
Comercial, art. 805, alínea 13, diz-se: “Presume-se que existe ou existiu sociedade, sempre que alguém exercita
atos próprios de sociedade, e que regularmente se não costumam praticar sem a qualidade social”. Na 23 alínea,
acrescenta-se:
“Desta natureza são especialmente: 1. Negociação promíscua c comum. 2. Aquisição, alheação, permutação, ou
pagamento comum ‘. O art. 1.345 já estava no direito não-escrito anterior ao Código Civil, como se pode ver
em COELHO DA ROCHA (Instituicêes, II, 626). Invocavam-se a L. 31, ~ 7, D., de negotiis gestis, 3, 5, e a L.
3, C., de negotiis gestis, 2, 18. Na L. 31, § 7, que é tirada de PAPINIANO, diz-se que, se alguém defende a
causa de água comum, se dá sentença ao prédio (= a favor do prédio), mas o que fêz na lide comum gastos
necessários e prováveis tem ação de gestão de negócios (Uno defendente causam communis aquae sententia
praedio datur:
sed qui sumptus necessarios ac probabiles in communi lite feeit, negotiorum geotorum actionem habet). Na L.
8, explica-se que, se pagaste dinheiro por teu irmão e co-herdeiro, podes exercer a ação dc gestão de negócios
(actio negotiorum tJCStorvm) e, se foste constringido a pagar a dívida inteira para liberar penhor, tens a mesma
ação, ou conseguirás a quantia por ocasião da partilha se já não foi feita.
Acrescenta-se no Código Civil, art. 1.345, parágrafo único:
“Neste caso aquêle em cujo benefício interveio o gestor, só é obrigado na razão das vantagens que lograr”.

2. SOCIEDADE E GESTÃO. O sócio pode ter de gerir negócio de outro sócio ou dos outros sócios. De gestão
de negócios alheios sem outorga somente se trata se a lei e os estatutos não se referem a poderes do sócio na
ausência ou na falta de outro sócio, ou de outros sócios, ou de todos os outros sócios. No que há gestão de
negócios alheios sem outorga, incidem os princípios concernentes a êsse instituto. E preciso, porém, que o ato
possa ser praticado por outrem. Se o sócio deixou no cofre da sociedade, ou no cofre do outro sócio, ações ao
portador, não é vedada, em principio, a gestão de negócios alheios sem outorga, no interesse do proprietário,
usufrutuário ou possuidor dos títulos, que se acha ausente ou faltou à reUnião ou assembléia. Se o título é

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nominativo ou à ordem, não.


O que acima se disse sobre as ações ao portador também se há de entender para os outros casos em que não haja
pessoalidade necessária do ato.

§ 4.711. Ratificação e não-ratificação pelo dono do negócio

1. RATIFICAÇÃO E ESPÉCIES. Os atos do gestor pode’m consistir em atos que levem a fatos jurídicos
stricto sensu, ou em atos que entrem no mundo jurídico como atos-fatos juridicos, ou como atos jurídicos
stricto sensu, ou como negocios jurídicos. Porém os atos do gestor, êsses, são atos jurídicos stricto sencu. A
ratificação como que faz do dono do negócio os atos que o gestor praticou, de modo que qualquer eficácia que
possa ter faltado aos atos objeto dos atos de gestão se perfaz. Não se pode confundir a atividade do gestor,
como se relação jurídica existisse entre êle e o dono do negócio, relação jurídica que, ex hypothesi, não existe, e
os fatos jurídicos, inclusive negócios jurídicos, nos quais se operou o que se operaria se outorga de poderes
tivesse havido.
(Acima não aludimos aos fatos jurídicos stricto sensu, por ser difícil ocorrer que o ato de gestão consista em
fato jurídico stricto sensu, fato em que o ato humano não entra no mundo jurídico sequer como ato-fato. Mas
pode haver.)
A ratificação pode ser condicional (e. g., “se a gestão fôr completada”), ou de algum ou alguns negócios. Pode
ser até o dia tal, ou até outro momento que se mencione, ou somente para os atos já praticados. Sobre a
ratificação pra tempore e qua solennitate fieri debeal, MELCHIOR FEBO (Decisiones Senatus Regni
Lusitaniae, dec. 170, ns. 15 e 16).
MIGUEL DE REINOSO (Observationes Practicae, 177) falou de Ratificatio aequipatur mandato, mas a
respeito de mandato que não tinha a mulher, para estar em juízo; e aí “mandatum” era em vez de “procuratio”
ou outorga de poderes ou dação de assentimento.
2.EFICÁCIA DA RATIFICAÇÃO. A ratificação vai ao passado, é retroeficaz. O que se passou entre o gestor e
o dono dos negócios alheios sem outorga gera relação jurídica parecida com a do mandato. No mandato, há a
oferta e há a aceitação, pois que se trata de negócio jurídico bilateral. Na procura, só o outorgante se manifesta.
O procurador exerce, ou não, a procura. Na gestão de negócios alheios sem outorga, o gestor de negócios
alheios sem outorga exerce, antes da ratificação, ou sem ela, o que o mandatário exerceria depois do contrato,
ou o procurador depois da outorga. A inversão faz haver intromissão no patrimônio alheio, sem haver permissão
do titular do patrimônio.
No art. 1.843, o Código Civil diz que a ratificação pura e simples pelo dono do negócio retroage ao dia do
comêço da gestão e produz todos os efeitos do mandato. O passado fica coberto pela vontade do dono do
negócio e tudo se passa como se tivesse havido outorga de poderes de mandatário. Outorga não havia, têm-se as
relações jurídicas como relações jurídicas oriundas de mandato. O gestor havia de dirigir o negócio alheio
“segundo o interesse e a vontade presumível de seu dono” (Código Civil, art. 1.381). No art. 1.300, relativo ao
mandato, fala-se de aplicar o mandatário “tôda a sua diligência habitual na execução do mandato”. Repete-se a
regra jurídica, a propósito da gestão (art. 1.336). O mandante escolheu, contou, em conseqúência, com essa
diligência habitual do mandatário. Não escolhera o gestor e êsse teve por norma seguir, no exercício da gestão,
o que seria o interesse e a vontade do dono do negócio, mas êle mesmo tem de observar o art. 1.336. Com a
ratificação, está confirmado que o gestor obedeceu ao art. 1.331 e o dono do negócio entende que o gestor
interpretou bem o que êle, dono, manifestara querer, ou era de presumir-se que êle queria.
Se a gestão de negócios alheios sem outorga foi contra a vontade, manifesta ou presumida, do dono do negócio,
há gestão de negócios alheios sem outorga. O que sobrevém é a diferença de eficácia. Dá-se o mesmo se a
gestão de negócios alheios sem outorga contradiz o interesse do dono do negócio. Numa e noutra espécie, o que
pode equiparar a eficácia da gestão à eficácia daquela que se iniciou, prosseguiu e se completou na
conformidade da vontade manifesta ou presumida do dono do negócio e do seu interesse, é a ratificação pura e
simples.
Aqui, convém afastar-se a interpretação que deu CLÓVIS BEVILÁQUA (Código Civil comentado, V, 93),
repetida, sem atenção, por outros juristas. Entendia êle que o dono do negócio, ratificando, pura e
simplesmente, a gestão, a “converte em mandato, e as relações entre êle e o gestor oficioso passam a se regular
como se, desde o início, foram de mandante e mandatário”. “Não há mais gestão, há mandato. Conhecido
embora posteriormente, retroage ao comêço da gestão”. Não e isso o que está no Código Civil, art. 1.343. Não é
isso o que está mesmo no Código Comercial, art. 168: “Quando um comerciante sem mandato, ou excedendo os

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limites dêste, conclui algum negócio para o seu correspondente, é gestor de negócios segundo as disposições da
lei geral; mas, se êste”
o ato da gestão sem outorga, explicite-se “fôr ratificado, toma o caráter de mandato, e entende-se feito no lugar
do gestor”.
A interpretação que deu CLóvís BEvILÁQUA foi de acôrdo com o livro de direito romano que êle lia: o de
PAUL FRÉDÉRIC GIRARD, a propósito da máxima Ratihabitio mandato com papecar. Convém maior
exatidão.
Na L. 60, D., de diversis regulis juris antiqui, 50, 17, tirada de TJLPIANO, diz-se: “Semper qui non prohibet
pro se intervenire, mandare creditur. sed et si quis ratum habuerit quod gestum est, obstringitur mandati
actione”. Sempre que a alguém não se proibe intervir por si, entende-se mandar. Mas, se ratificou o que foi
gestionado, está obstrito à ação de mandato (actio mandati).
Primeiramente, têm de ser postas de lado: a) a tese de que a máxima Ratihabitio mandato comparatur aluda à
transformação, ex post, da negotiorum gestio em mandato (que era a de P. E. GIRARD, Manuel élémentaire de
Droit romain, 4Y ed., 624>; lã’) a tese da ratihabitio geradora da adio mandati contraria, e não da acUo
mandati directa (K. AD. vON VANGEROW, Lekrbuch der Pandekten, III, 508 s., diante do choque dos textos
da L. 60, D., de diversis regulis juris antiqui, 50, 17, da L. 12, § 4, D., de sointionibus et liberationibus, 46, 3,
ambas de ULPIANO, e da L. 8 (9), D., de negotiis gestis, 3, 5, que éde CÉVOLA); c) a tese de GUInO
DONATUTI (Anuali dei Seminario Giuridico Catania, 1, 167 s.) ; d) a tese da “ficção de mandato”, bem como
a de que “mandatum”, na L. 60, D., de diversis regulis juris antiqui, 50, 17, está em senso largo, .atécnico
(opinião de C. COSENTINI, Aunali dei Seminario Giuridico Catania, 1, 240 s.).
Mandatum, na L. 60, está em senso técnico (sobre isso, VINCENZO ARANGIO-RUIZ, Ii Mandato in diritto
romano, 197-207). Não se cogita da gestão de negócios alheios sem outorga, mas de oferta de mandato, que o
dono do negócio aceita, razão por que a ação é a adio mandati, e não a negotiorum gestiorum.
Na L. 12, § 4, D., de solutionibus et liberationibus, 46, 3, alguém, que ia pagar, pagou a quem não era o
verdadeiro procurador, de jeito que, se o credor ratifica, se libera o devedor: a ratificação equipara-se (não é!)
mandato (Ratihabitio mandato comparatur). Já é muito traduzirmos “comparatur” por “equipara-se”.
Estatui o Código Civil, art. 1.343: “A ratificação pura e simples do dono do negócio retroage ao dia do comêço
da gestão, e produz todos os efeitos do mandato”. Não se disse que passa a haver mandato, o que seria
proposição quanto ao piano de existência, mas sim que a ratificação é retroeficaz “e produz todos os efeitos do
mandato”. Alude-se, exclusiva e claramente, à eficácia. Não há mandato; há, no plano de eficácia,
retroatividade, com a característica da coincidência com a eficácia do mandato.
Se o caso não era de gestão de negócios alheios sem outorga que pudesse ocorrer a despeito de ir contra a
vontade, manifesta ou presumida, do dono do negócio, ou do seu interesse, há ilicitude, que pode ser, também,
no plano do direito penal. Em conseqUência, a indenização dos danos que a gestão de negócios alheios sem
outorga causou ao dono do negócio e, eventualmente, a terceiros. Os arts. 1.332 e 1.833 do Código. Civil
incidem. Após a prática de algum ou de alguns atos ou de todos os atos da gestão, ou a) ocorre a ratificação, ou
b) o dono do negócio desaprova a gestão “por contrária a seus interesses” (Código Civil, art. 1.344), ou e) não
há ratificação, nem aprovação, e o de que se tem de cogitar é da invocação do Código Civil, arts. 1.836, 1.337 e
parágrafo único, 1.888 e parágrafo único, 1.839 e §§ 1.0 e 29, e 1.840; ou, por ser permitida. ex lege, a gestão
de negócios alheios sem outorga, os arts. 1.341 e 1.342.
O gestor de negócios alheios sem outorga, se obra contra a vontade manifesta ou presumida do dono do
negócio, fora dos casos excepcionais de que falamos, suporta os riscos da sua atividade. Se sobrevém a
ratificação pura e simples, há vontade ratificativa. A eficácia da ratificação é eficácia desde o primeiro ou os
primeiros atos da gestão e só diz respeito ao passado, aos atos que foram praticados. Pode bem ser que a
ratificacão o ato não coincida com a extinção da gestão de negócios sem outorga; isto é, que o gestor conttnua
gerindo. Se a gestão de negócios alheios sem outorga, com a ratificação, se transformasse em mandato, os atos
do gestor posteriores a. ratificação seriam atos de mandatário. E tal não se dá. O gestor ~iaa teve ratificados
todos os seus atos continua gestor de negócios alheios sem outorga para cada ato que pratique após a
ratificação. A ratificação apanha o hoje visível e o ontem; nada tem com o amanhã.
Cumpre que se distinga do ato-fato ilícito que gera a responsabilidade do gestor, conforme os arts. 1.832 e
1.833 do Código Civil, a gestão em negócio alheio, sem outorga, que não cabe no art. 1.331, nem no art. 1.332,
nem no art. 1.340, e apenas se há de tratar como ato ilícito (art. 159). Aqui, as regras jurídicas dos arts. 1.831-
1.345 não são invocáveis.
3.RATIFICAÇÃO ORDINÁRIA PELO “DOMINUS NEGOTII”. A lei, e não a vontade do dominus negotii, é

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que rege a entrada, no mundo jurídico, da gestão de negócios alheios sem outorga e a sua continuação. A lei diz
qual a juridicização e qual a eficácia da atitude do dono do negócio. No interesse dêsse, há de ter sido iniciada e
continuada a gestão. Todavia, mesmo se o gestor cria estar gerindo negócio próprio, a atitude do dono do
negócio, com a ratificação, é da maior relevância. Aí, faltou o elemento subjetivo (o animus negotia aliena
gerendi), mas a vontade superveniente do dono do negócio produz os mesmos efeitos que produziria se o
elemento subjetivo houvesse ocorrido. Se faltasse qualquer dos dois elementos objetivos da gestão (falta de
outorga, alienidade do negócio), a ratificação caIria no vácuo. Quanto à alienidade, se o negocio é do próprio
gestor, nenhuma função pode ter a ratificação. Se faltava o elemento subjetivo, a ratificação, com a mudança de
atitude do gestor, supre a falta da contemplatio dominz.
Quanto a ter sido, ou não, útílmente gerido o negócio, a ratificação tem a mesma eficácia, porque, no caso
afirmativo ou no caso negativo, o dono do negócio quis, e podia querer o tratamento da gestão como se
mandato tivesse existido.
A retroeficácia identifica o passado, pela abstração mesma da utilidade.
Se o dono do negócio não estava fisicamente ausente, mas se desinteressava do negócio, pode ter havido a
gestão, uma vez que o requisito da absentia domini é, no fundo, o do desinteresse do dono do negócio.
A ratificação somente pode ser pelo dono do negócio, ou pelo representante legal do absolutamente incapaz, ou
pelo próprio relativamente incapaz, com a assistência do pai, tutor ou curador, ou pelo representante voluntário.
Se o dono do negócio é pessoa jurídica, pelo órgão, ou quem represente a pessoa jurídica.
Surge o problema da ratificação por outro gestor de negócios alheios sem outorga que tenha feito seus os
próprios atos do gestor ou dos gestores anteriores. Aqui, há a assunção pelo gestor posterior de tôda a
responsabilidade do gestor ou anteriores, mas, perante o dono do negócio, o gestor posterior é responsável
solidário, porque a ratificação por êle não tornou irresponsável, perante o dono do negócio, o gestor anterior, ou
irresponsáveis os gestores anteriores.
Se o negócio foi gerido sem o elemento subjetivo, não houve gestão de negócios alheios sem outorga. A
ratificação não torna representativa a gestão que o não fôra. O que não tinha a eficácia que se esperava (e. g., o
comprador do bem imóvel não poderia fazer a transcrição, ou exigi-lo em ação) faz-se eficaz. Se havia nulidade
por defeito de forma, ou outro defeito, não: a ratificação só se refere, aí, à eficácia.
O terceiro, que vem a saber da falta do elemento subjetivo, ou em qualquer outro caso de gestão, pode
interpelar o dono do negócio para que se manifeste (= ratifique ou não ratifique). Por outro lado, é preciso que o
dono do negócio se insira nas relações jurídicas com os terceiros, porque o Código Civil, art. 1.307, incide. O
terceiro, pelo fato de ignorar que o negócio não era do gestor, não pode denunciar o negócio jurídico em que o
gestor e êle foram figurantes, sem ter havido, na gestão, o animus negotia aliena gerendi. Sem razão, Luíci
TARTUFARI (Delia Rappresentanza neila conclusione dei contratti, 422) e ANGELO NATTINI (La Dottrina
generale deila Procura, 189).

4.FALTA DE RATIFICAÇÃO E DESAPROVAÇÃO POR HAVER OU TER HAVIDO CONTRARIEDADE


AOS INTERESSES DO DONO DO NEGÓCIO.
Lê-se no Código Civil, art. 1.844: “Se o dono do negócio, ou da coisa, desaprovar a gestão, por contrária aos
seus interesses, vigorará o disposto nos arts. 1.382 e 1.838, salvo o estatuído no art. 1.840”.
No direito brasileiro, a desaprovação (= não-ratificação) da gestão, pelo dono do negócio, somente tem eficácia
de agravar a responsabilidade do gestor (pelos casos fortuitos, se teriam sobrevindo sem ter havido a gestão, art.
1.882; restituição ao estado anterior ou indenização de prejuízos, art. 1.883) se o dono do negócio alega e prova
que fôra contra os seus interesses, sem ter sido gestão incluída nas espécies do art. 1.340. A solução é diferente
das que se encontram noutros sistemas jurídicos e provém do Projeto Primitivo, art. 1.433, onde escreveu
Cióx’is BEVILÁQUA: “Se o dono desaprovar a gestão por contrária aos seus interesses, aplicar-se-á o disposto
no art. 1.472”. Com a solução feliz do jurista brasileiro, há três espécies: a) a gestão ratificada de negócios
alheios sem outorga (Código Civil, art. 1.348) ti) a gestão não-ratificada com o enunciado de fato (comunicação
de conhecimento) de ser ou ter sido contrária aos interesses do dono do negócio a gestão (art. 1.344) ; c) a falta
de ratificação, ou a desaprovação, sem o enunciado de fato, ou com enunciado falso de ser ou de ter sido contra
os seus interesses a gestão.
Se o gestor não está incluso no número daquelas pessoas a que é atinente o art. 1.882, ou o art. 1.888 do Código
Civil, ou se a sua gestão não foi contrária aos interesses do dono do negócio, ou não foi por isso que se negou a
ratificá-la, há as regras jurídicas do art. 1.339 e §§ 1.0 e 2.0 e do art. 1.340.
Não basta portanto que o dono do negócio desaprove. £ preciso que desaprove e alegue (e prove, ou possa

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provar) que a gestão foi contra os seus interesses. A ratificação sôzinha, é manifestação unilateral de vontade,
ao passo que a alegação tie ter sido contrária aos interesses do dono do negócio é comunicação de
conhecimento (enunciado de fato), que pode ser verdadeira ou falsa. Daí o ônus da prova, que toca ao dono do
negócio.

5.GESTÃO DE NEGÓCIO ALHEIO PARA SI. Pode dar-se que o gestor dirija o negócio alheio, ou pratique
atos sobre bens de interesse alheio, como se o negócio ou o interesse fôsse seu. Objetivamente, o negócio no
amplo sentido é alheio; mas, subjetivamente, é próprio, por ser tratado, ciente ou incientemente, como próprio.
O que o gestor espera é que os resultados da gestão sejam a seu favor, e não a favor do dono do negócio. S o
caso de quem apenas possui ou é simples tenedor e aliena a propriedade, ou vende o que pertence a outrem. Em
princípio, o gestor deve a indenização dos danos. Responde pelo enriquecimento injustificado e pela
indenização segundo as regras jurídicas sobre atos ilícitos absolutos.

O dono do negócio pode exigir do gestor dito impróprio que restitua o negócio ao seu estado anterior, ou no
estado em que estaria o negócio se a gestão tivesse sido para êle.
Se o dono do negócio não admite a gestão como se tivesse sido para êle, incidem os arts. 1.382 e 1.888 (salvo o
caso do art. 1.840, L~ parte) se admite, tudo se passa como se tivesse sido para êle a gestão. Todavia, se não
houve gestão para o dono do negócio e o gestor ignorava não ser seu o negócio, cabem as regras jurídicas do
enriquecimento injustificado (cf. E. VON CAEMMERER, Festschrift fiir ERNST RABEL, 1, 356 s.;
Festschrift fiir HÂNS LEWALD, 447 s.). Se a gestão foi com a posse do bem alheio, corpóreo ou incorpóreo,
são invocáveis os arts. 510-519 do Código Civil.

§ 4.712. Deveres do dono do negócio

1.VINCULAÇÃO DO DONO DO NEGÓCIO. É preciso atender-se, preliminarmente, a que o direito brasileiro


estabelece vinculação do dono do negócio, em certos casos, independentemente de qualquer vontade sua,
anterior, ou posterior à gestão. Daí a importância do exame das espécies.

2.NEGÓCIO ÚTILMENTE GERIDO. Diz o Código Civil, art. 1.339: “Se o negócio fôr útilmente
administrado, cumprirá o dono as obrigações contraídas em seu nome, reembolsando ao gestor as despesas
necessárias ou úteis que houver feito, com os juros legais, desde o desembôlso”. Acrescenta o § 1.0:
“A utilidade, ou necessidade, da despesa, apreciar-se-á não pelo resultado obtido, mas segundo as
circunstâncias da ocasião em que se fizeram”. Ainda o § 2.0: “Vigora o disposto neste artigo, ainda quando o
gestor, em êrro quanto ao dono do negócio, der a outra pessoa as contas da gestão”.
Não está em exame ter havido, ou não, a ratificação. Só se cogita da vinculação do dono do negócio a terceiros
e da sua responsabilidade perante o gestor. O dono do negócio pode ratificar a gestão que lhe não foi útil, como
pode deixar de ratificar o que foi. Por isso, não há contradição entre o art. 1.340 e o art. 1.844. No art. 1844 só
se aludiu à não-aprovação por ser contrária aos interesses do dono do negócio, e não a qualquer outra não-
aprovação.

4.712. DEVERES DO DONO DO NEGÓCIO221

Se o negócio, em senso lato, foi gestionado útilmente, utiliter gestum, é questão de fato. O ônus da prova
compete ao gestor. Para se saber se foi útil a gestão isto é, se foi proveitosa, pelo que acrescentou à esfera
jurídica do dono do negócio, ou pelo que evitou que se perdesse, ou diminuísse tem-se de examinar o bem ou o
ato em que tinha interesse o dono do negócio, as circunstâncias em que se entendeu iniciar a gestão e nela se
prosseguiu.
Adverte-se no Código Civil, art. 1.340: “Aplica-se, outrossim, a disposição do artigo antecedente, quando a
gestão se proponha acudir a prejuízos iminentes, ou redunde em proveito do dono do negócio, ou da coisa. Mas
nunca a indenização ao gestor excederá em importância as vantagens obtidas com a gestão”.
A utilidade da gestão ressalta sempre que o gestor se propõe a evitar ou diminuir prejuízo iminente ao dono do
negócio. Uma vez que, iminente o prejuízo, ou a perda ou diminuição parcial, mesmo de direito futuro, o gestor

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iniciou a gestão, a vontade do dono do negócio é presumida, mas, ainda se êle se manifesta contràriamente após
a gestão, o art. 1.340 do Código Civil incide.
A vontade contrária do dono do negócio, manifesta ou presumida, só é decisiva se anterior à gestão, salvo,
ainda assim, se o ato de gestão tem por fito evitar que recaia sobre o dono do negócio alguma penalidade ou se
o fato que adviria iria contra o interesse público.
O art. 1.840 do Código Civil não é remissivo ao ad. 1.889, §§ 12 e 2.0; e sim apenas ao ad. 1.339.
A utilidade da gestão é referida no art. 1.839 do Código Civil, como pressuposto para que o dono do negócio
fique ligado à gestão (verbis “cumprirá o dono as obrigaçóes contraídas em seu nome”). Os atos têm de ser em
nome dêle e úteis a êle. Temporalmente, o pressuposto da utilidade há de ser no momento inicial (utiliter coe
ptum) e nada tem com o interesse do gestor, e somente concerne ao interesse do dono.
Quanto ao critério para se apreciar a utilidade, não se há de levar em conta elemento subjetivo, por parte do
dono ou do gestor, exceto, por parte daquele, a prohibitio, se as circunstâncias são as mesmas.
O gestor tem de gerir tendo em vista o interesse e a vontade presumível do dono do negócio, envidando tôda a
sua diligência habitual. No que o gestor se afasta do interesse ou da vontade presumível do dono do negócio, ou
deixa de exercer a gestão com a sua diligência habitual, qualquer dano, que daí resulte, é ressarcível. Se êle
geriu, com a sua diligência habitual e conforme o interesse e a vontade presumível do dono do negócio, o mau
êxito não torna indenizável o dano.

3.DEVER “Ex LEGE” E GESTÃO DE NEGÓCIOS ALHEIOS SEM OUTORGA. Lê-se no Código Civil, art.
1.841: “Quando alguém, na ausência do individuo obrigado a alimentos, por êle os prestar a quem se devem,
poder-lhes-á reaver do devedor a importância , ainda que êste não ratifique o ato”. “Alimentos” está, ai, no
sentido de alimentação, casa, médicos e remédios, hospitalização, instrucão e demais objetos do dever, dito, em
sentido amplo, de alimentos. A gestão pede ser contra a vontade manifesta ou tresumida do dono do negócio.
Na interpretação do art. 1.341 do Código Civil, o juiz ou intérprete entende ou a) que a regra jurídica é siricti
iuris, ou b) que se trata de regra jurídica exemplificativa. Se a), não seria gestor de negócios jurídicos sem
outorga quem, vendo a andar pela estrada de rodagem, ou pelo caminho de ferro, ou nas proximidades de
aeroporto, algum animal, o pusesse fora do lugar de perigo, ou o prendesse no seu curral. Não seria gestor de
negócios sem outorga quem encontrasse, à noite, a criança, perdida nas ruas, e chamasse um automóvel para
entregá-la ao pai, à mãe, ao tutor ou ao curador.
A interpretação a) está superada.
Quando se fala de dever moral e se diz, como é acertado dizer-se, que outrem não pode assumir a gestão de
negócios alheios sem outorga se o dono do negócio só teria dever moral, isso não significa que não se possa
estabelecer situação tal que se reflita na esfera jurídica, a ponto de justificar a gestão. Por exemplo: E é
candidato a deputado e propala-se noticia falsa, que lhe diminuiria a votação, e A, por sabê-lo ausente, publica o
desmentido, fazendo as despesas.
Pode-se pagar o impôsto ou outro tributo que alguém deva (H.IsÂY, Die Geschãftsfúlzrung nach dem SOB.,
138; sem razão, H. DERNBURG, Das Bitrgerliche Recht, II, 2, 465, nota 12), como, em caso de urgência, um
hospital pode acolher o doente que ia para casa de beneficência (sobre isso, A. BRÚCKMANN, me Rechte dcc
Gescliàftsfãhrers ohne Auftrag, 160 s.).
0) problema da gestão em caso de inadimplemento de dever moral se houve manifesta ou presumida volicão
contrária do dono do negócio é outro problema. Antes, § 4.709, 2.
Quem faz pagamento, sem ser interessado (Código Civil, art. 980, parágrafo único), é gestor de negócios
alheios sem outorga, se não se vinculara a isso, ou não recebera poderes para fazê-lo.
Estatui o Código Civil, art. 1.342: “As despesas do entêrro, proporcionadas aos usos locais e à condição do
falecido, feitas por terceiro, podem ser cobradas da pessoa que teria a obrigação de alimentar a que veio a
falecer, ainda mesmo que esta não tenha deixado bens”. Não há qualquer regra jurídica do Código Civil, fora do
art. 1.342, sobre dever de prestei’ despesas de entêrro. Do art. 1.842 é que se há de extrair regra jurídica, a que
se pode dar a seguinte redação:
“Quem teria dever de alimentar tem dever de prover às despesas de entêrro, ainda mesmo quando o falecido
não tenha deixado bens”. Por isso, quem faz, sem dever de prover às despesas, as despesas de entêrro,
“proporcionadas aos usos locais e à condicão do falecido”, pode ser gestor de negócios alheios sem outorga.
Pode ser, dissemos; porque há cinco casos principais:
a)o do entêrro feito por conta da própria pessoa que assumiu a obrigação de pagamento; b) o do entêrro pelo
inventariante por conta da herança, ou pelo síndico da massa concursal (Código Civil, art. 1.569, 1); c) o do

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entêrro feito, sem outorga, por conta de quem tinha dever de alimentar (art. 1.342)

d)o do entêrro feito com outorga de poderes de pessoa não obrigada a fazê-lo, ou por conta dessa pessoa sem
outorga; e) o de entêrro que alguma instituição promete a seus sócios ou beneficiados.
Quem faz o entêrro, a que não é obrigado, por sua própria conta, ou obra como amigo, ou como pessoa
caridosa, ou como quem se julga com o dever moral de fazê-lo. A todos êsses casos, concerne, a despeito de só
a um dêles se referir o Código Civil, art. 1.842, parágrafo único: “Cessa o disposto neste artigo e no
antecedente, em se provando que o gestor fêz essas despesas, com o simples intento de bem fazer”.
Se C sabe que B teria interesse moral ou de amizade em fazer o entêrro de A, sem ter dever jurídico, C, que o
faz, por conta de B, é gestor de negócios jurídicos sem outorga, porém não pode invocar o art. 1.342 do Código
Civil. Invoca os princípios comuns sobre gestão de negócios jurídicos alheios sem outorga. Ou há ratificação,
ou não a há.
A obrigação de alimentar pode ser ex lege, ou de origem negocial. Pergunta-se: ,incide o art. 1.342 do Código
Civil se C faz o entêrro porque B, emprêsa de cooperativa ou de proteção à velhice, tinha o dever negocial de
alimentar?
A interpretação analógica impõe-se.

4. GESTÃO A TÍTULO DE DOAÇÃO. Não há indenização de gastos se o gestor, ao assumir a gestão, o fêz
sem qualquer intuito de cobrar as despesas. Há doação. O gestor obrou gratuitamente e não pode venire contra
factum pra prium. Em todo o caso, se o gestor errou quanto à pessoa do dono do negócio (era B, e não O), há
dever de indenização, por parte do dono do negócio.
Na dúvida, tem-se a gestão como sem pré-exclusão da pretensão à indenização.
A intenção de liberalidade é de supor-se existente se ascendente presta ajuda quanto a alimentos, no mais vasto
sentido, ao descendente, ou vice-versa. A regra jurídica, no direito brasileiro, é não-escrita e interpretativa.
Também é ius interpretativum, no Código Civil alemão, a do § 685, 2~a alínea.

5.IRREMUNERABILIDADE E REMUNERABILIDADE DA GESTÃO DE NEGÓCIOS ALHEIOS SEM


OUTORGA. De regra, o gestor de negócios alheios sem outorga não tem direito à remuneração. Todavia, é
remunerada a gestão do profissional, como a do advogado, do médico, do eletricista, do motorista, ou do
industrial, como o fabricante de ferros para pontes, que se encarrega da substituição urgente ou o consêrto
urgente da ponte que a inundação derrubou. A explicação da remuneração, em tais casos, é a de estar incluída
nas despesas.
Se o gestor não tem direito a remuneração, e negócio lhe presta algo pela atividade exercida, remuneratória
(Código Civil, art. 1.187, 1). o dono do há doação
§ 4.713. Extinção da gestão de negócios alheios sem outorga e suas conseqUências

1. CASOS DE CESSAÇÃO. A morte do gestor faz cessar a gestão de negócios alheios sem outorga, salvo se
êle operou como profissional e a atividade da emprêsa ou do escritório continua. Então há sucessão na gestão.
Se o advogado, cujos atos são ato do escritório de advogado, se fêz gestor de negócios alheios sem outorga, e
falece, os companheiros de escritório, sócios, ou em serviço percentual, ou ligados mediante outro contrato,
somente não têm o dever de continuação se o pré-excluiram. Na dúvida, tem-se por exístente o dever.
A morte do dono do negócio não faz cessar a gestão de negócios alheios sem outorga.
Tão-pouco, tem qualquer repercussão na gestão de negócios alheios sem outorga a interdição do dono do
negócio, salvo se o interdito perderia a titularidade ou se o bem foi arrecadado pelo curador ou outro
representante legal.
A gestão acaba se foi integralmente completada.
Também acaba a gestão de negócios alheios sem outorga se o dono do negócio, ou alguém que lhe suceda, por
si ou através de terceira pessoa com outorga, assume a gestão.

2. CONSEQÚÊNCIAS DA CESSAÇÃO DA GESTÃO. Os deveres e direitos são exercidos, de ordinário, após


a extinção da gestão.
Durante a atividade gestória, pode o dono do negócio, como o gestor, exercer a pretensão à tutela jurídica,
mediante a ação declaratória ou a ação cominatória.

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3.“AcTIo NEGOTIORUM GESTORUM DIRECTA”. Ao dono do negócio compete a ação direta de gestão de
negócios. O que se supóe é que se tenha iniciado, verdadeiramente, a gestão de negócios alheios sem outorga.

4.“ACTIO NEGOTIORUM GESTORUM CONTRARIA”. O gestor tem contra o dono do negócio a ação
contrária de gestão de negócios, ação contrária de atos gestórios. Ambas derivam de gestão de negócios alheios
sem outorga. Se não há a figura jurídica, o que o gestor pode ter é a ação de enriquecimento injustificado.
Pela adio negotiorum gestorum contraria podem ser pedidos o reembôlso de despesas necessárias e úteis, com
os respectivos interesses.
O gestor tem direito a compensação e direito à retenção. Não há razão para se exigir, como pressuposto da
retenção, serem conexas as dividas; o que é preciso é que a divida ao gestor seja concernente ao bem retendo.

Título XXXIII

CONCEITO E NATUREZA DO CONTRATO

DE MEDIAÇÃO

§ 4.714. Conceito de mediação

1.PRECISÕES PARA O CONCEITO DA MEDIAÇÃO. Quando se fala de mediação, ou de contrato de


mediação, à diferença do que se passa com os outros contratos para exercício de poder outorgado, alude-se à
atividade do mediador, e só depois ao suporte fáctico de que nasce o contrato de mediação. Em vez de
anteceder à atividade, como acontece com o contrato de mandato, ou com o contrato de comissão, ou qualquer
contrato de outorga, o contrato de mediação sucede a ela. ‘O mediador põe em contacto pessoas que querem ou
talvez queiram contratar, sem estar vinculado a qualquer delas como colaborador, ou como dependente, ou
como outorgado de poder de representação ou de outro puder.
Pode tão haver a esperada imparcialidade, pode o mediador não ser merecedor da confiança de todos os
interessados, porém não seria mediador se já estivesse vinculado a algum, ou a alguns dos interessados.
Não haveria necessidade de se cogitar do contrato de mediação se pudesse compreender os contratos em que o
mediador já está vinculado. Não há, certamente, alteração da figura jurídica, se, por exemplo, o mediador,
credor de um dos interessados, trabalha para que êsse, vendendo algum bem, lhe possa pagar (cf. Luici
CARRARO, La Mediazione, 123), ou se a retribuição só um dos interessados há de prestar, ou só alguns hão de
prestar.
Só se justifica falar-se de contrato de mediação se se pré-eliminam as espécies em que já se estabeleceu,
previamente, ou de inicio, relação jurídica que vincule o mediador a um dos interessados.
Na mediação, o que verdadeiramente se passa é que os interessados admitem, ainda e só no mundo fáctico, a
atividade do mediador. Se um dos interessados se opõe , mediação não há. A intervenção parcial, a atividade a
favor de um só lado, pré-exclui a figura da mediação. O “mediador’~ unilateral ou é mandatário, ou outorgado
de determinados poderes, ou intermediário locador de serviços ou locador de obra.
O agente de câmbio e o corretor não são mediadores. Falta-lhes a imparcialidade. Ajudam o cliente na aquisição
ou ra alieração dos valôres.
O fato de alguém ser parente ou dependente de algum dos interessados pode dificultar a aparição da figura do
mediador, porém não a pré-exclui. O irmão, o pai e o filho podem ser mediadores. A confiança de E em relação
a C, irmão de A, pode ser completa. O guarda-livros da firma D pode ser mediador entre D e E.
Após essas noções, sem as quais não se saberia qual o caminho exato que se está percorrendo, convém que
volvamos ao passado, às fontes históricas do contrato de mediação.
Na Grécia, o mediador existia, embora, para a afirmação, os dados sejam escassos. Aparece nos contratos entre
vendedores e compradores, com função externa, sem qualquer vinculação pessoal (E. EÚCHSENSCI-IÚTZ,
Der Resitz und Erwerb im qrieehischen Alterium, 463; E. CATLLEMER, Le Contrai de dépot, le Mandai ei Ia
Commigsion, le Cauiionnement sistendi
causa, 530). Muitas vêzes o intermediário era próxeno (no sentido largo). Definindo o comissionário, PoLLUx
(VII, 11) revela-o; e FILOSTRATO (Vila Apdil., IV, 32, 12) aproxima os têrmos 1tQO~8YOtÇ e xan9~otç (cf.

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BItANDTS, Les Sociétés commerciales à Athênes, Révue de I’Instruetion Publique en Relgique, 25, 118).
Para os casamentos, havia as wtInQtaL ou
(cf. KARL FRIEDRICH HERMANN, Privatalterihiimer, 261).
Na L. 3, D., de prozeneticis, 50, 14, ULPIANO diz que se conheciam as causas de mediação, de sórdido
(profissão baixa), e também nelas se havia de atender à proporção e à qualidade, como nos negócios em que
operaram intermediários (defuneti) e prestaram algum serviço. Poderiam pedir o que os Gregos chamaram
honorários de intérprete, ~QI1nVEUVLXôV. 1-lá, pois concluía ULPIANO proxenetas que se exibem como
úteis nas compras, nas vendas, nos negócios comerciais e em contratos lícitos, e não por mau costume
(improbabili more). Daí, ser lícito pedir os proxenéticos (Proxenetica iure licito íi*tuntur). Se alguém foi
mediador para algum crédito, como muitos fazem (ut multi solent), ULPIANO não admitia que tal pessoa se
vinculasse como se houvesse mandato.
Na L. 6, C., de sponsalibus ei arrkis sponsaliciis ei proxeneticis, 5, 1, admitiu-se o pacto com o mediador de
núpcias, mas precisou-se que não poderia receber mais do que a vigésima parte do dote e da doação
antenupcial, se o dote não excedesse de duzentas libras de ouro. Com a liberdade de receber menos.
Na Nov. 90, cap. 8, permitiu-se que o mediador prestasse testemunho, se as partes nisso consentissem.
Na Idade Média, o mediator teve função um tanto confusa, pela introdução de elemento, ocasional, de garantia:
cabia-lhe fírmare ou quindeniare os vínculos em que medeavam, para garantir in tractando. Por vêzes, eram
como juizes conciliadores. Segundo os glosadores, eram freqúentes as atividades dos mediadores. Acúasio, na
glosa às regras jurídicas do D., 50, 14, disse que o mediador se ocupava com “inquerere voluntates aliquorum
vel munera vel ad contractus vel ad amicitias faciendas, vel similae”.
JACÓ CujÃcio precisou: “Proxeneta non contrahit, nec elus intervento praebetur actio; quia non negotium ipse
gerit”. E.SIRACCA, no Tractatus de Proxenelis, deu definição:
“Proxenetae officium est in tractando non in concludendo nisi a partibus mandetur”.
A relação jurídica contratual do mandato era a que os juristas romanos consideravam verdadeiramente jurídica.
O que estava fora do mandato permanecia no mundo fáctico e somente leis especiais levavam em consideração,
com a extraordinaria cognitio. O contrato de mediação, êsse, apresentou as linhas que o caracterizavam e se
acentuaram: permanência da atividade no mundo fáctico, sem se poder cogitar de negociabilidade jurídica;
extraneidade ao negócio jurídico e nenhuma figuração por outrem; finalidade de servir à conclusão de negócios
juridicos, e não de os concluir; resultado final e vinculação pelos honorários ao mediador.
Em França, quis-se oficializar qualquer mediação, e a Lei francesa de 2-17 de março de 1791 arrebentou as
amarras estatais, permitindo a livre mediação.

2.ATIVIDADE DO MEDIADOR. A atividade do mediador desenvolve-se no mundo fáctico. Os seus atos não
são negócios jurídicos, nem atos jurídicos siricto sensu. Tem-se de frisar isso mais do que se costuma fazer (cf.
FRANCESCO FERRARA JUNIOR, Cli Imprenditori e la Societá, 2.~ ed., 107; ALESSÂNURO GPLAZIANI,
L’Impresa e l’Impreditore, 281). O mandatário e o comissionário, como o corretor, não são estranhos ao
contrato que os interessados concluem; o mediador o é. Os três atuam dentro do mundo jurídico, a respeito do
contrato que os interessados fecham; o mediador mantém-se no mundo fáctico:
oque entra no mundo jurídico são os seus atos, que podem ensejar a retribuição. Não toma parte no contrato,
pôsto que os seus atos hajam aproximado os interessados.
Por isso, devemos evitar, no sistema jurídico brasileiro, a confusão, que se percebe noutros sistemas, entre a
corretagem eu a emissão e a mediação, ou entre mediação e mandato (e. g., Código suíço das Obrigações, art.
412). O mandatário somente se há de preocupar com aquilo de que êle foi incumbido; e tem o dever de
desincumbir-se, conforme o contrato, já feito, entre êle e o mandante e conforme as instruções que êsse lhe deu.
Mesmo se não se chega a concluir o contrato entre o mandante, de que êle fêz as vêzes no contrato, e o terceiro,
o mandatário tem, se oneroso o mandato, direito à retribuição. O art. 1.318 do Código Civil rege a revogação do
mandato (cf. Código Comercial, arts. 157, inciso 1, e 159) ; e casos há em que o mandato é irrevogável (Código
Civil, art. 1.317). O interessado na mediação dela sai sem que precise, sequer, de retirada jurídica. de voz, de
revogação, pois nenhuma voz sua entrou no mundo jurídico. Solta-se, fàcticamente, do mediador, como queira
e quando queira, porque não há entre êles vinculação.

3~ EXPRESSÃO “MEDIAÇÃO”. A expressão “mediação”, empregada em sentido largo, assaz perturbou a


conceituação, assim do contrato de mediação como do contrato de corretagem. Algumas afirmações, por
inspiração de leituras de livros estrangeiros, se chocam com o conceito de corretor.

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O que é parecido, no corretor e no mediador, stricto sensu. é a atitude imparcial, que, na concepção do Código
Comercial, resulta para os corretores de sua função oficial, ou semi-oficial (corretores matriculados). Todavia, o
corretor não tem a imparcialidade que se espera do mediador. Foi procurado pelo interessado ou o procurou e, a
despeito da lisura e lealdade com que há de tratar com o outro interessado (ou com o outro corretor), exerce a
sua funcão de um lado.

§ 4.715. Natureza do contrato de mediação


v
1.PRECISÕES SOBRE A NATUREZA DA MEDIAÇÃO. Determinar a natureza da mediação é missão difícil
se não se precisam as divergências que surgiram através dos tempos, para que se possam afastar as tentativas de
explicação que conturbaram a doutrina. Primeiramente, há a afirmação de que não há contrato de mediação: há
a atividade do mediador de contratos, a que corresponde a remuneração, simples remuneração, como se
remunera o gestor de negócios alheios. Responde-se a isso com a advertência sobre ser o contrato de mediação,
em sua aparição, diferente dos outros contratos, que se concluem para que se adimplam, depois, os deveres. O
contrato de mediacão sobrevém ao resultado. O que se teria como adimplemento foi atividade de que não se
tinha dever.
Mais repelível ainda é a concepção do contrato de mediação como cláusula que se vai inserindo no contrato em
que o mediador atua. Com isso, raspar-se-ia, digamos assim, o que mais distingue o contrato de mediação, que é
a extraneidade em relação ao contrato que se conclui entre os interessados.
Também se há de afastar a teoria que só vê na mediação atos, que a lei e só a lei entendeu fazer remuneráveis.
Se assim fôsse, a mediação não seria negocial. Não haveria contrato de mediação. A remuneração seria
indenização. Tal construção aberra dos elementos históricos e da sistemática jurídica. Se é certo que os
interessados não começaram por negociar com o mediador, viram-no operar, ouviram-no operar, estiveram em
contacto fáctico com êle, fizeram-lhe perguntas e ouviram respostas, a que talvez replicaram, e responderam a
perguntas que êle lhes fêz.
Afastemos, portanto, inicialmente as três teorias: a teoria da mediação puramente fáctica ou teoria da
inexistência do contrato de mediação; a teoria da mediação em virtude de cláusula do negócio mediado; a
teoria da mediação eficaz “ex lege”.
A teoria que vê na mediação, desde o início da atividade mediatriz (teoria do contrato de mediação ao primeiro
contacto), não é de admitir-se, porque reduziria o contrato de mediação a mandato, corretagem ou comissão, ou
outro contrato.

2.NEGOCIABILIDADE DA MEDIAÇÃO. A negociabilidade da mediação é inegável. Apenas, ao contrário do


que ocorre com outros contratos, a atividade precede à conclusão do contrato. Se a atividade chega ã produção
do resultado e os interessados se portaram de modo que se estabeleceu a relação causal entre a ajuda fâctica e a
conclusão dos contratos que os interessados queriam, ou um dêles queria, e finalmente êles quiseram, a
conclusão dêsse contrato é expressão de vontade de contratar com quem prestou a mediação, se já não houve
manifestação de vontade nesse sentido. O contrato não está à base da prestação de ajuda. O contrato sobrevém,
ou, pelo menos, pode sobrevir. No momento em que o interessado admite ou pede atos do mundo fáctico a
ajuda, ainda não há contrato (assim, GIUSEPPE VALER!, Manuale di Diritto commerciale, II, 227;
ALESSANDRO GRAZIANI, L’Im presa e l’Imprendit ore, 241).
Considerar entrada no mundo jurídico a mediação, sem se lhe atribuir o efeito mínimo de vinculação, destoaria
de tOda a sistemática (sObre efeito mínimo, Tomo V, §§ 507 e 567, 3). A mediacão só se faz contrato quando
começa algum efeito, utesmo o efeito mínimo. A doação é contrato e só se conclui com o elemento real. A
mediação é contrato, mas só se conclui quando há o resultado. A instantaneidade do contrato de doação é no.
presente, pela convergência necessária de todos os elementos do suporte fâctico. 0 contrato de mediação é
instantâneo, no futuro, isto é, quando se alcança o resultado. Não há passado fáctico, na doação; a mediação
supõe o passado Láctico.
Convém que analisemos algumas teorias.
a) Não se pode admitir que o contrato de mediação se conclua quando os interessados acordam quanto à pessoa
do mediador e êsse aceita. Assim pensava, erradamente, LEONE BOLAFFIO.
b) Também é de pôr-se de lado que se conclua quando um dos interessados encarrega alguém da mediação e
êsse aceita, prometendo-lhe aquêle a remuneração para o caso de se eoncluir o negócio que se tem por fito. Era
o que entendia CESARE VIvANTI. Ora, o que êle conceituava como mediação era contrato de mandato, ou de

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locação de serviços. Por outro lado, o pacto “franca mediação” entre os interessados apenas se conclui entre
êles, e de modo nenhum serve de argumento para se reputar já concluído, a êsse tempo, o contrato de mediação.
É de tôda a relevância que se ponha de lado o que se passa entre os interessados, negocialmente, ou mesmo
durante as punctações, para que se possa ver e conceituar o que se vai ouerando entre os interessados, por atos
do mediador. Os atos do mediador são entre êle e cada um dos interessados. As relações jurídicas que vão surgir
são entre o mediador e os interessados.
3r.

c) Alguns vêem na mediação o contrato bilateral desde o início da atividade, ou da promessa (fáctica) de
atividade fáctica, suscetível de entrada no mundo jurídico (e. g., E. HEYMANN, Der Handelsmarkler, em V.
EI-IRENEERO, Handbuch des gesammten flandelsrechts, V, § 95). Outros, o contrato unilateral, por haver o
dever de remuneração, que têm os interessados, e ficar livre, a despeito disso, o mediador. Com pequenas
diferenças, FRANCESCO MESSINEO (Manuale di Diritto Civile e conzmetciale, ~ 83’ ed., 472), que pensou
em contrato unilateralmente vincuiante, mas bilateral. Por onde se vê como o propósito de não querer ver os
fatos, com as suas raízes históricas, conturba a exposicão sistemática. Apontou êle duas fases: urna, em que o
mediador é livre; outra, em que todos ficam vinculados. Qor que não reconheceu que a primeira fase e no
mundo Láctico?
d)ANTONIO )ARUNETTI (Corso di Diritto comnzerciale, 218) i-eduziu a mediação a promessa unilateral de
pav:ar a rernuneracão se se conclui o negócio jurídico. A remunerabilidade não precisa de promessa de qualquer
dos interessados. Os interessados é que podem pré-excluir a vinculação à remuneracão. Já aí há o pacto, que se
não confunde com o contrato de mediação.
Outros cogitaram de locatio opers sem conductio, mutilação que se bá de refutar, enêrgicamente.
e)(Is que invocam os direitos reais, para explicação. estão certos, uma vez que a tradição, nesses, com a
transferência da titularidade, é elemento componente do suporte fáctico. A conclusão do negócio é que se tem
em vista.
Conforme sempre dizemos, nada adianta enunciar-se que o contrato de mediação é contrato sui generis. Com
isso, a respeito de outras figuras jurídicas, apenas se foge às dificuldades de classificação. O que é mais grave é
afirmar-se isso, quando se confundem e são chamados sul generis o contrato de mediação e o de corretagem (e.
g., 4~& Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 14 de junho de 1939, R. dos T., 121, 188; .~ Câmara
Civil, 10 de março de 1947, 168, 294).
Não há necessàriamente contrato, desde logo, entre o mediador e qualquer dos interessados, ou entre êle e todos
os interessados. Cada interessado pode ter indicado mediador, e nenhum dêles ter contratado. A relação jurídica
entre o mediador e o interessado ou os interessados somente se irradia quando, concluíndo-se o contrato, se há
de ter o recebimento da ajuda como assunção de dívida. Advirta-se sempre que pode haver a admissão da
mediação por todos os interessados, sem que um ou alguns ou mesmo todos se vinculem à remuneração
(ressalva de não-vinculação). Se todos afastaram a vinculação a remunerar, a mediação, que chegou ao
resultado, fêz-se contrato, mas gratuito (contrato unilateral).
A expressão “incumbente”, que se emprega a propósito do contrato de corretagem, corresponde a oferente. Na
mediação, a permanência dos atos no mundo Láctico torna-a imprópria, salvo se se precisa que só fàcticamente
se pediu ou que só fàcticamente se admitiu.
Se na mediação se interessam os dois ou mais futuros contraentes (se a pedem, ou se a admitem), discute-se se
há um só contrato, ou se há dois, três ou mais contratos. Além do alcance teórico da questão, há o alcance
prático, como, por exemplo, o de se saber qual o fôro competente para o pedido de remuneração. Não pode
haver resposta a priori: um dos futuros contraentes pode ser o que se põe no mundo fáctico em ligação com o
mediador, ignorando-o, talvez, o outro ou os outros futuros contraentes; dois ou mais podem tratar
separadamente; e não é de afastar-se que todos ou alguns se façam o outro lado do mesmo contrato. Pela
pluralidade, a priori, por exemplo, TULLIO ASCARELLI (Assunti di Diritto commerciale, 1, 149) e
ALESSANDRO GRAZIANI (L’Imípresa e Illmprenditore, 240). Mas, conforme adiante frisaremos, não há,
nunca, pluralidade de contratos, se o caso é de mediação, nem mesmo a trilateralidade. Todos os interessados
estão de um lado, mesmo se são interessados no negócio jurídico, que se quer concluir, e expostos à função do
mediador. O que importa é que o interessado não se oponha à mediação. Pode admiti-la com a prévia
manifestação de vontade de que não se vincula à remuneração. Aí, entra do lado dos interessados, sem que o
atinja o dever de remuneração. Essa será devida pelos que não se eximiram, pôsto que e êsse é o ponto
principal se integrem na figura de interessado na mediação.
3. MOMENTO DA CONCLUSÃO DO NEGÓCIO DA MEDIAÇÃO. ~Qual o momento em que se conclui o

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contrato de mediação? Há a opinião que entende ser antes da conclusão do contrato a que se destina a
mediação, porque pode haver deveres e direitos antes de se concluir o contrato que se tem por fito, como o
dever de informação, que toca ao mediador, e o direito ao ressarcimento de despesas. Esse direito e aquêle
dever seriam ar volunt ate, e não ex lege. Ora, o mediador informa, se quer ir até a conclusão do contrato. Não
está no mundo jurídico a sua atividade, de modo que não há falar-se de revogabilidade, nem de
denunciabilidade. Sem razão, LEONE BOLAFFIO (Dei Mediatori, Codice di Commercio commentato de P.
AsCoLI, 6~a ed., 31 s.), LORENZO MOSSA (Trattato dei nuovo Diritto oommerciale secondo ii Codice civile
de 1942, 1, 584), GIUsEPPE VALERI (Manuale di Diritto cornmerciale, II, 228) e outros. Tais direitos e
deveres podem não existir. Só existem se o devedor assumiu os deveres, o que é estranho ao problema, porque
qualquer pessoa se pode vincular antecipadamente. O direito à retribuição, que é o que importa, êsse só exsurge
quanto há o resultado, ou se o resultado não ocorreu por culpa do interessado. A atividade do mediador exerce-
se no mundo Láctico. Quando ela entra, como determinante de manifestação de vontade do interessado, ou dos
interessados, é questão a posteriori. De regra, isso somente se dá quando se conclui o contrato que se buscava.
Tem-se dito que à diferença do que se passa com os outros contratos, salvo exceção explícita da lei a
manifestação de vontade do interessado pode ser revogada (e. g., VITTolhe SALANDRA, Manuale di Dirjito
commerciale, 1, 55; ALEsSANDRO GRAZIANI, L’fmpresa e Itlmprenditore, 234). Ora, de revogação só se
pode falar se houve manifestação de vontade, voz. Se ainda não houve, é prematuro falar-se de revogabilidade.
Se o interessado prometeu algo, tem de cumprir o prometido; mas, aí, não se está diante da natureza da
mediação, mas de pacto. Não se pode discutir a natureza de qualquer contrato com argumentos ligados aos
pactos que podem ocorrer. Se consideramos a revogação como puramente fáctica, mesmo assim revogar a
oferta revogável é retirar a voz, fâcticamente. que está por dentro da oferta, que entrara no mundo jurídico. Não
são o mesmo retirar a água que está correndo e retirar a água que está na garrafa.
Nas relações somente fácticas com o interessado, o mediador, embora já exerça atividade, ainda não contrateu,
e está livre de prosseguir, ou não, na mediação. Por seu lado, o interessado, salvo promessa em contrário, não se
vinculou a só concluir o contrato com a ajuda do mediador; nem, sequer, a concluí-lo. Não há pré-contrato no
pedido, ou na admissão da mediação; nem promessa de admitir, até a conclusão, a mediação, pôsto que tal pacto
possa ocorrer.
Mais uma vez frisemos: o pacto é à parte, só vincula quem pactou. Para a fui ura vinculação ao mediador, por
parte dos interessados, não se precisa de pacto: o que importa é que se haja admitido, fàcticamente, o mediador.
Ê isso o que distingue, o que caracteriza, o que define a mediação.

4.REFERÊNCIA ERRÔNEA A CONDIÇÃO. Os juristas que falam de condição, no tocante a prestar o


mediador a atividade que dêle se espera, não atendem a que, se de condição se tratasse, seria potestativa.
Porém, verdadeiramente, não há por onde se aludir a condição: quem vende e solve, presta; quem dá em mútuo,
presta; quem serve de mediador, presta. Dar o objeto vendido não é implir condição; nem o é dar em mútuo. O
prestar, para o mediador, não é objeto de dever; a fortiori, não é objeto de obrigação. O mediador não tem dever
de prestar o que ajudaria a chegar-se à conclusão do contrato, que se quer; êle presta sem vinculação. É isso o
que torna inconfundível com os outros contratos o contrato de mediação. A prestação antecede ao dever.

5. REFERÊNCIA À ACESSORIEDADE. Outro ponto que merece esclarecimento é o que concerne à


afirmativa de ser o contrato de mediação contrato acessório (assim, tJMBERTO AZZoLINA, La Mediazione,
Traltato di Dinho Civile italiano, VIII, 1, 33; e GIUSEFPE VALERI, Manuode di Diritto comnwrciale. II, 228).
Pactos acessórios, pactos adjectos, Nebeuventrâge, são negócios jurídicos que atingem, diminuem, alteiram, ou
aumentam o que fôra convencionado, sem que haja mudança da figura jurídica. Por exemplo, o pacto de
resolubilidade, ou de denunciabilidade, a lez commissoria, a in dUm adjictio, o jpactum displicentiae, o pacto
de ser necessário à perfeição (plano de eficácia) do contrato a manifestação de vontade de um dos figurantes. O
contrato de mandato, o de comissão, o de corretagem e o de mediação não são pactos adjectos, não são
contratos acessórios. O contrato de mediação pode existir, valer e ser eficaz, sem que se conclua o contrato para
cuja conclusão há a ajuda, como ocorre naqueles casos em que ~ mediador tem direito à remuneração, ou em
que há resolução do seu sem que repercuta no outro. Quanto à competência pelo domicílio, nada tem o contrato
de mediação com o contrato que se concluiu, ou que se ia concluir. A forma exigida no contrato que se quer
concluir não se refere ao contrate de mediação.
A mediação pode ser para negócio jurídico de forma oral, ou de forma escrita particular (cf. 4•a Câmara Civil da
Côrte de Apelação de São Paulo, 4 de agôsto de 1937).

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Afirmar-se que o contrato de mediação é acessório é fugir-se à noção mesma de acessoriedade dos contratos
(sem razão, portanto, J. X. CARVALHO DE MENDONÇA, Tratado de Direito Comercial, TI, 288; Luís
MACHADO GUIMARÃES , Comentários ao Código de Processo Civil, IV, 49; ANTÔNIo CARVALHO
NETO, Contrato de Mediação, 35).
Na jurisprudência há decisões no sentido de ser locação de serviços a mediação (e. g., 2~a Câmara Civil do
Tribunal de Apelação de São Paulo, 21 de novembro de 1944, 1?. dos T., 153, 629, com alusão explícita ao art.
1.217 do Código Civil; Sentença do Juiz NARCÉLIO DE QuEnlós, Distrito Federal, 5 de julho de 1943, J., 18,
227). Em verdade, porém, há a álea, a falta de proporção necessária entre a retribuxção e o serviço. Daí
jurisprudência que frisa a diferença (e. g., 4•a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 6 de
abril de 1945, R. de 13., 159, 411, contra a invocação dos arts. 1.216 e 1.217 do Código Civil; 6.~ Câmara
Cível, 5 de abril de 1946, R. F., 109, 119).
A favor de tratar-se de locação de obra (lo catio operis), ~ õ~a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do
Distrito Federal, a 12 de outubro de 1945.
Considerar-se contrato de mandato o contrato de mediação é velho êrro, de fundas raízes (e. g., Tribunal de
Justiça de São Paulo, 21 de fevereiro de 1915; Tribunal de Apelação de São Paulo, 29 de agôsto de 1946, 1?.
dos T., 166, 248), às vêzes devido a confusão com o contrato de corretagem. O mandatário atua por conta de
outrem (quase sempre em nome do mandante), o que não se passa com o mediador. O mandatário vincula o
mandante; o mediador, não. O mandatário decide, resolve, conclui; o mediador, não.
Os que pugnam pelo conceito de mediação como locatio operis sem conductio não viram que a bilateralidade
vem depois, à conclusão do negócio para o qual operou o mediador, mas operou no mundo Láctico, e não no
mundo jurídico. Daí a anomalia da locatio uperis sem conductio.
Os que constróem o contrato de mediação como iniciado (concluído) desde que os figurantes futuros se
vinculem à posição, à remuneração, fazem vinculativo o que ainda é ou pode ser só no mundo fáctico. ‘O
contrato, para êles, seria unilateral, sem qualquer vinculação do mediador (e. g., GIACOMO MARCORA, La
Mediazione, 1 s., 31 5.; FRANCESCO FERRARA junior, Gli ImprencUtori e te Societd, 67; NICOLA
PUCLIESE, Ii Contratto di Mediazione, 158). Por outro lado, se se promete prestar se outrem presta não se
conclui contrato unilateral. É preciso que se atenda a que a manifestação de vontade dos interessados fica de pé
enquanto não “revogada” (o que se passa no mundo Láctico) e gera, à conclusão do negócio a que a função
mediatriz se refere, o contrato. O que mereceria exame seria a natureza dessa manifestação de vontade para se
saber se entra logo no mundo jurídico, ou quando entra, se, depois de entrar, é revogável, ou se o não é. No
depósito, por exemplo, a entrada só se dá com a entrega do bem depositando.
Os que pretendem que o contrato é bilateral, pois que há provisão, pecam por antecipar a conclusão do
contrato. A bilateralidade do contrato não basta para se afirmar que os contactos iniciais já são elementos do
contrato de mediação. As atividades do mediador, no tocante ao pôr em contacto, ao afastar as dificuldades, ao
encontro de soluções que evitem desinteressamento, são relevantes, mas isso não importa que se consIderem já
no mundo jurídico.

6.MEDIAÇÃO E OUTROS CONTRATOS. O mediador não se confunde com o corretor, porque êsse não
perde a sua conceituação se aparece no negócio jurídico de que foi incumbido e se, em outros casos, a sua
presença é exigida. Não há matrícula de mediador. Há matrícula de corretor.
A mediação é inconfundível com a comissão. O comissionário atua no trato e na conclusão do negócio jurídico,
ao passo que o mediador é estranho ao negócio jurídico, ou a qualquer relação jurídica que dêle se irradie. O
fato de exercer as duas funções, ainda mesmo por profissão, a mesma pessoa 1 sem relevância.
O mediador profissional exerce profissão liberal. Não é necessãriamente comerciante, nem se pode considerar,
como o corretor, auxiliar do comércio. Para que a pessoa que também é mediador se registe como comerciante,
é preciso que também comercie, ou também seja corretor. Não há dizer-se comerciante, em qualquer caso, o
mediador, seja pequeno seja largo o seu campo de atividade, ou o importe das suas ajudas, como queriam
WALIER BIGIAVI (La Picota Impresa, 32), UMBERTO AzZOLINA (La Mediazione, no Trattato di Diritto
CivUe italiano de E. VASSALII, VIII, 1, 104) e REMO FRANCESCHELLI vCo’,so di Duritto Commerciale,
1. L’Jn’tprendit ore, 119). O mediador torna-se comerciante quando se faz corretor ou agente. Em tais casos,
não mais é mediador, deixou de sê-lo; ou é corretor, ou agente, ao lado de mediador, isto é, corretor ou agente
em determinados negócios jurídicos e mediador noutros.
Ocontrato de mediação distingue-se do contrato de agência, que é tão inconfundível com êsse como com o
contrato de corretagem. No contrato de agência, há estabilidade, permanência e duração intencional da

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atividade, por conta de outrem. Mesmo se a atividade do agente é só de intermediação, de indicar e aproximar,
o agente tem o dever de promover conclusões do contrato dentro de determinada cidade, Estado-
-membro, ou Município, ou zona. O agente é duradouramente ligado ã emprêsa. A imparcialidade, que se
apresenta como característica da mediação, não há na atividade do agente. O mediador ajuda ocasionalmente. O
agente é colaborador fixo. O mediador pode exigir remuneração aos dois ou mais interessados; o agente, só à
emprêsa de que êle é agente. O agente está, desde o início da atividade, no mundo jurídico e age dentro dêle.
Se o mediador, durante o tempo da sua atividade, se faz representante ou mandatário do interessado, para a
conclusão do contrato (não só para as punetações), a posição jurídica caracterizou-se, mas diferente da que se
previra. A figura é outra, e não mais a do simples mediador. Se a função, que passa a ter no suporte fáctico do
contrato, é exigência de lei,ou da natureza do negócio jurídico (sem razão, Lrnor LORDI, Jstituzione di Diritto
Commerciale, II, 250; ALESSANDRO GRAZIANI, L’Impresa e l’Irnprenditore, 245), nem por isso se
conserva mediador.
Não se pode admitir que se trate de “mediação social”, porque então se aludiria ao fato da conclusão desde o
início da atividade e não haveria razão para se corsiderar espécie: a mediação é negocial, caracteriza-a o tempo
que permanece no mundo fáctico a atividade do mediação a negocialidade estaria “antecipada”, e não se trataria
de mediação. (Tão-pouco, a intermediação é locatio operis.) Há na intermediação a parcialídade. O
intermediário está ou é de esmerar-se que esteja do lado de A. Perante A é que é responsável pelas informações
o intermediário.
O corretor é intermediário, não é mediador.
A construção que parte da afirmação de haver duas espécies de mediação (a imparcial e a parcial) é de repelir-
se. Na vida cori’ente há quem chame mediador ao intermediário, ao corretor, mas isso não pode pesar para que
se deforme, na sistemática jurídica, a figura do mediador. Mesmo se só um dos interessados bá de pagar a
remuneração, o mediador tem de ser tido como imparcial. O intermediário, inclusive e corretor, só se vincula
perante o interessado que a êle se vinculou. Não tem deveres perante o outro.
A atividade do mediador é única, não é figurante de dois ou mais contratos com os interessados.
A atividade do mandatário pode ser atividade de cooperação externa, como a de mediador (Lurni CARRARO,
La Mediazione, 3, 4, 50 e 62 s.) e a do agente (GUSTAVO MINERVINI, Ii Mandato, la Commissione, la
.Snrdizione, 10) ; mas é evidente a maior extermidade da mediação. O mandatário pode atuar, embora
externamente, a ponto de se pôr em lugar de figurantes. O mediador, não.
Atuando por conta de outrem, que é o mandante, o mandatário conclui aquilo de que se incumbiu. A sua
atuação não e externa: é interna, embora o mandatário não seja o titular, outorgante ou outorgado. É possível
que tenha praticado atos que seriam de mediação, mas atos que ficam dentro dos podêres que recebeu e talvez
indispensáveis ao exercício mesmo tios deveres de mandatário. O mandatário conclui; o mediador somente
trata, por fora: Prozenetae ofjicium esi in tractando, non en concludendo. O mandatário é parcial, apenas se
encarrega dos interesses do mandante. Fica, portanto, do lado de um sujeito. O mediador é imparcial, ou se
presume que o seja, porque o seu fito é a conclusão do negócio, no qual êle não entra (nem presenta, nem
representa, nem assiste, no sentido técnico).
O comissionário, o mandatário, o procurador e o agente opetam tn concluciendo, e não só in tractando. São
colaboradores dependentes, mesmo se há a cláusula in causa propria, pois continuam vinculados. O mediador é
independente, porque só opera tn tractando. O comissionário, além de intermediar, figura.
Se C se diz mediador de A e E e é procurador de B, com A vai contratar, ou C sugere que contrate, pode A, que
O ignorou, opor que não deve a remuneração, porque mediação não há se o mediador está vinculado a outra
atividade, que lhe pré-exclua a imparcialidade. Todavia, se A conhecia a situação e admitiu a mediação, como
B, não há óbice ao duplo papel de C.
O mediador não se confunde com o núncio. O núncio é locator operis, ou age por obséquio ou outra razão para
prestar o serviço, como o passeante que, vendo a velha senhora a buscar táxi, vai até à esquina e lhe traz um.
Quase sempre os nuncios são empregados, domésticos ou não, mas sempre sem poderes de representar. O
núncio transmite manifestações de vontade, ou manifestações de conhecimento, ou de sentimento, ou outras
manifestações, como instrumento intermediatriz, externo ao ato jurídico que se vai concluir. O mediador
também não se insere no ato jurídico que se tem em vista, mas não é mero instrumento, uma vez que tem
imparcialidade, não é adstrito ao que lhe ordena ou lhe roga o interessado. Nem a nunciatura nem a mediação
são negócios jurídicos acessórios; e também incorrem em êrro os que reputam negócio jurídico acessório a
mediação e não a nunciatura.
Pode dar-se que o mediador precise de atos de nunciatura, próprios ou de outrem, para exeqiilr a sua função

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mediatriz, mas isso não Ilia deturpa. Tais atos são inclusos, enucleados, nos atos de mediação. Se todo o
conteúdo da atividade do mediador foi composto de atos de nunciatio, nem por isso se teria tornado, a priori,
núncio o que esperava ser ou que se esperava fôsse mediador. Aí, o continente dá a estrutura; e depende do
exame dos fatos e das circunstâncias saber-se se o terceiro desempenhou a sua função, mesmo porque a própria
pessoa do terceiro, como mediador, pode ter levado o outro interessado ou os outros interessados a aceitar
oferta, ou a fazer’ oferta ou contra-oferta.
A propósito da gestão de negócios alheios sem outorga, também é de relêvo a diferença entre o gestor e o
mediador. O gestor de negócios alheios sem outorga pratica atos por conta de outrem. A despeito da falta de
outorga de poderes, êle atua dentro do negócio, como se mandatário ou procurador fôsse. O mediador, não. Ao
gestor falta a outorga e talvez sobrevenha a ratificação. Não há outorga de poderes ao mediador, nem lhe pode
sobrevir.

‘7. SE É BILATERAL OU UNILATERAL O CONTRATO DE MEDIAÇÃO. Quando se define o contrato de


mediação como o contrato mediante o qual o interessado promete ao mediador recompensa pela ajuda que dê
para a conclusão de determinado contrato, já se parte de figura mais complexa, que é a da mediação a que
precedeu pacto ou promessa unilateral de remuneração. Não há resposta a priori, porque essa somente poderia
concernir à mediação pura. Ora, a mediação pura desenvolve-se sem pactos, no mundo fáctico, até que o
interessado se dê por satisfeito com a atividade (de regra, com o resultado) e tenha de remunerar o mediador.
Em princípio e daí poder-se falar de mediação pura nem o interessado, nem o próprio mediador prometeram.
Durante o tempo em que a atividade mediatriz se desenvolve, dentro do mundo fáctico, o mediador apenas
procede como se dissesse: “Estou pronto a ser mediador, que se há de recompensar pelo resultado, sem me
obrigar a isso, e sem que o interessado se obrigue”; e o interessado, como se enunciasse: “Havendo o resultado,
devido à mediação, o que só se pode saber no momento da conclusão do contrato que desejo, a minha atitude há
de ser tida como manifestação de vontade geradora de contrato”. Não houve contrato unilateral, nem bilateral;
pode haver, no momento do resultado. O mediador prestou, e o interessado tem de prestar. Quem dá em mútuo,
presta; o mutuário passa a ter de restituir. O mediador presta, o interessado na conclusão do contrato desejado
passa a dever a remuneração.
Nem o mediador presta porque deve, nem o interessado, recebendo a prestação, recebe em pagamento. Nem
estava vinculado o mediador, nem está o interessado. O momento do resultado é que cria o vínculo, de jeito que
a prestação pelo mediador se faz prestação objeto de dever posterior, dando ensejo à pretensão à remuneração.
Não há pluralidade do negócio jurídico nem, sequer, trilateralidade no contrato de mediação. É tipicamente
negócio jurídico bilateral: C + (A + 13). Donde certa semelhança com a posição (somente com a posição) do
árbitro ou do arbitrador. Não deturpa a bilateralidade o fato eventual de se introduzirem sucessivamente na
relação fáctica os interessados. Em todo o caso, algum ou alguns interessados podem ficar indiferentes, a
despeito de se desenvolver entre todos a mediação. A prestação do mediador é a todos. Por isso, há a unicidade
de prestação. O fato de se vincular a prestar a um não o escusa de ter de prestar ao outro, ou aos outros, e
reciprocamente. O que importa é a conclusão do negócio jurídico.
Entre o mediador e o árbitro, ou o arbitrador, há distincão que merece ser considerada e posta em relêvo: o
árbitro, como o arbitrador, é indiferente e, por isso, imparcial; o mediador é atento à finalidade dos interessados,
colima o que é de mister à conclusão do negócio jurídico, é imparcial, sem ser indiferente. Os interessados
sabem que, embora imparcial, o mediador tem por fito a conclusão do negócio jurídico.
(LORENZO MOSSA, Trattato dei nuovo Diritto commerciale secondo ei Codice Civile de 1942, 1, 5S7, diz
que o contrato de mediação é bilateral, mas o que o mediador recebe é mais do que contraprestação, é prêmio.
Ora, o conceito de prêmio, em vez do conceito de contraprestação, seria impróprio; prêmio é prestação em
negócio jurídico unilateral, como a promessa unilateral de recompensa e o concurso.)
Frisou F. voN HAHN (Kommentar zum Allgemeinen fleutschen Handelsgesetzbuch, 1, 320 s.) só haver, nos
começos da atividade mediatriz, atividade fáctica. Só a conclusão do negócio jurídico é que determina a entrada
da mediação no mundo jurídico. As refutações a essa tese foram fragilimas. Distinguir, como Luíci
CALIRARO, a mediação típica, que seria geradora de obligatio ex lege, e a mediação negocial, é cair em teia
de artifícios. Não há, naquela, obligatio ex lege, porque só o resultado conta e assim mesmo se não foi afastado
tratar-se de mediação futuramente vinculante. Quanto à chamada mediação negocial, é contrato de mandato, ou
de locação de serviços, ou de corretagem; e não mediação. O que caracteriza a essa é a atividade mediatriz, que
entra no mundo jurídico com a conclusão do negócio jurídico a que estêve atento o mediador. Nela, não se
descobre qualquer vinculação antes disso.

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Quando se fala de revogação, no tocante à mediação, não há impropriedade de expressão, mas o seu emprêgo
exige explicação. Revogar é retirar a voz; mas, quando se retira a voz com que se concluiu negócio jurídico, o
ato vai do mundo fáctico ao extremo da linha onde se acha a voz, voz, demolindo, por baixo, o que entrou no
mundo jurídico. Ora, a revogação pelo interessado na mediação ou pelo mediador nada destrói que zeja
jurídico. Faz o mesmo caminho, mas onde está a voz ainda não se criou juridicidade.
Para maior claridade, focalizamos a espécie do Código Civil, art. 1.080, sobre vinculação do oferente. Quem
faz oferta de contrato vincula-se, enquanto não revogada. A oferta entra no mundo jurídico desde que se faz,
sendo a revogação, se cabe ou ainda cabe, já atingente do mundo jurídico: a revogação é ato do mundo fáctico
que atinge o mundo jurídico. À diferença do que ocorre com a oferta, a revogação da mediacão é no mundo
fáctico e fica no mundo fáctico.
Pôr-se a vinculação (futura) do mediador e do interessado ou dos interessados na classe das vínculações legais
por alimentos, ou por vizinhança, é absurdo. Não se pode, sequer, comparar o que se passa com a mediação e o
que vincula os gestores de negócios alheios sem outorga.

8.CONTRATO DE MEDIAÇÃO E CONTRATO DE OPÇÃO . fl preciso que se não confunda com o contrato
de mediação o contrato de opção, mesmo se entregue ao mediador. O mediador não representa, nem é
comitente, nem corretor. Se obteve de A contrato de opção a favor de E, somente se pode pensar em mediação
no que concerne a função típica do mediador. Pode ter acontecido que A tenha querido dar a opção a E, ou que
R a tenha querido. Se a pessoa que falou com A o fêz no interesse de 13, mediação não houve. Ou era
procurador, ou mandatário, ou mero núncio, ou mesmo intermediário. A classificação é de relevância para se
resolver o problema da remuneração. Se apenas houve mediação, não se pode pensar em contrato de opção, ou
autorização para venda, em que seja outorgado o mediador. Deturpar-se-ia, profundamente, a figura. Daí serem
lamentáveis os acórdãos do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 7 de fevereiro de 1928 (R. dos 71, 65, 403) e da
2~a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 10 de abril de 1984 (91, 827). No acórdão de 8 de
março de 1935, a Côrte de Apelação de São Paulo chama “agente de negócios” o mediador.
Se houve contrato de opção, o ato do interessado, diretamente com outrem, dentro do prazo, é infração de dever
de respeitar o que atribuiu (ofensa ao direito formativo gerador). Se o contrato de opção, ou a própria dação
unilateral de opção. foi devidamente registado, o titular do direito de opção pode exercê-lo. De qualquer modo,
a remuneração é devida a quem foi mediador, ou intermediário, ou corretor. Por vêzes. a redação do contrato
promete pensar-se em contrato de comissão, o que não é inconciliável com o contrato de opção a favor do
comissionário (foi o que ocorreu nos casos que julgaram a 2,a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São
Paulo, a 19 de julho de 1945 (1?. dos T., 159, 754), a 1.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a
16 de dezembro de 1946, e a 5•a Câmara Civil, a 15 de agôsto de 1947.
O Tribunal de Justiça de São Paulo, a ‘7 de agôsto de 1925 (1?. dos T., 55, 415), negou a remuneração do titular
de direito de opção, que lhe dera encarregado de venda com direito de opção, e haver concluído em dizer que o
segundo titular tinha quem quisesse adquirir. Deveria tê-la negado por não ter sido exercido o direito de opção e
caber, se o interessado na mediação vendera o bem, a ação de indenização por infra-cão do direito de opção.
Aliás, se o registo tivesse sido feito, poderia ir contra o próprio outorgado da venda.
fl para lamentar-se que a respeito do contrato de opção se invoque o art. 1.514 do Código Civil, como fêz o
Tribunal de Justica de São Paulo. a 11 de maio de 1926 (R. dos T., 58, 874). O art. 1.514 só se refere à promessa
unilateral de recompensa, pôsto que possa ser tido como princípio geral atinente a negécios jurídicos
unilaterais.
O acórdão da 2.~ Câmara do Tribunal de Alçada de São Paulo, a 6 de agôsto de 1952 (R. dos T., 204, 518),
também tratou como ato de corretagem a intermediação como contrato de opção.
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9.MEDIADORES, CORRETORES E OUTROS AGENTES. Os corretores, os leiloeiros e os despachantes das
alfândegas são agentes autônomos dos comerciantes. Praticam atos de ajuda, como os mediadores, que ficam
fora das exigências de nomeação e de matrícula; mas os atos dos corretores já são no mundo jurídico. Nas
Ordenações Afonsinas, Livro IV, Titulo 2, § 8. estava explícito: “Outro sy queremos, e outorgamos, e
mandamos que qualquer Tabelliam, que fezer tal contrauto de arrendamento, afforamento, ou emprazamento,
como suso dito he, ou o Corretor, que fezer a corretagem de tal contrauto como este a ouro sabudo, ou a prata,
que sejaô presos ataa nossa mercee, e percaô seus officios, e os nom possam mais aver”. Os seus ofícios, isto é,
o ofício do tabelião e o oficio do corretor. Tal a tradição lusa, a luso-brasileira e a brasileira.
A matrícula dos corretores investe-os de deveres e poderes que a lei lhes atribui. Não podem funcionar se os

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atos foram reservados a corretores oficiais, corretores de ofício, que são os corretores nomeados; mas êles
mesmos têm atribuições que não podem ser exercidas pelos corretores livres ou pelos mediadores. Quando se
chama corretor oficial ao que apenas se matriculou, apaga-se, arbitràriamente, a linha que separa os corretores
de ofício, corretores nomeados, e os corretores matriculados.

Quanto aos atos em que podem ajudar, os corretores matriculados podem exercer a sua atividade, ou se só êles
o poderiam, ou se é a respeito de atos em que qualquer mediador teria livre atuação.
No caso examinado pela 5,a Câmara Civil do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, a 14 de novembro de
1941, não havia mediação, mas sim intermediação. Decidiu-se que a mudança de estrutura do mesmo negócio
jurídico (alienação de uma fábrica) não afasta a conclusão do que se tinha por fito (e. g., venda das ações e das
debêntures, em vez de venda da fábrica). Não houve mediação, mas contrato de opção, no caso do acórdão da
2?’ Câmara do Tribunal de Alçada de São Paulo, a 6 de agôsto de 1952 (1?. dos T., 204, 518).
A propósito do contrato de corretagem volveremos a frisar a diferença entre êle e o contrato de mediação. O
mediador pode funcionar e de regra funciona antes de qualquer contrato de mediação. O corretor aceita ou
oferece a corretagem: após o contrato é que se pode cogitar da atividade do corretor. O seu dever de lealdade,
que implica certa imparcialidade, não o faz imparcial. Donde não se poder tratar o mediador como corretor, ou
vice-versa.
No sistema jurídico brasileiro, só se regularam em regras jurídicas escritas o contrata de corretagem, que é feito
pelos corretores matriculados, e o contrato de corretagem, que é feito pelos corretores oficiais, O contrato de
corretor de ofício era o único que o velho direito luso e o direito luso-brasileiro queriam, sem se fazer qualquer
confusão, encontradiça em outros sistemas jurídicos, entre mediação e corretagem.
O corretor corre entre os interessados, porém já dentro do mundo jurídico. A passagem, pelo meio, do
mediador, entre os interessados, é dentro do mundo fáctico.
O mediador mede ia; o corretor, não.

CAPITULO II

PRESSUPOSTOS, EFICÁCIA E EXTINÇÃO CONTRATO DE MEDIAÇÃO

§ 4.716. Pressupostos do contrato de mediação

1. LIBERDADE DE MEDIAÇÃO. Na composição do contrato de mediação parte-se do princípio da liberdade


de mediação, a que só a lei pode dar limites, respeitados os princípios constitucionais. É vulgar dizer-se que o
ofício de corretor de bôlsa por si só limita a liberdade de mediação. Mas, aí, há confusão. A lei pode estabelecer
a limitação da mediação a favor dos corretores de bôlsa, o que importaria em proibir-se a mediação, porque o
corretor faz corretagem, e não mediação, ou permitir-lhes a mediação, além da corretagem na bôlsa.
No direito brasileiro, não se disciplinam diferentemente a mediação civil e a comercial. Aliter, o Código Civil
alemão, §§ 652-656, no tocante à Vermittlung, e o Código Comercial alemão , § 93. Nos Protokolle (II, 342 s.),
apontou-se o mediador civil como fiduciário do cliente e o mediador comercial como titular de profissão de
utilidade pública, no interesse geral do comércio. Mas, aí, misturam-se mediadores e corretores. Demais, o
mediador, em negócios jurídicos civis e em negócios jurídicos comerciais, não precisa ser profissional. O que
importa, na mediação, é a obra que o mediador presta, e não a sua profissionalidade. Já assim NICOLA
PUGLIESE e LEONE BOLAFFIO.
A mediação, em seu conteúdo, não implica a conclusão do contrato; apenas a prepara. A conclusão do contrato
é afirmação de que a mediação se deu, com o êxito que se queria (Proxenetae officium eM in tractando, nou in
concludendo). A conclusão do contrato pode não ocorrer e concluir-se o contrato de mediação, se foi ela
realizada por outra solução; e. g., em vez da compra-e-venda, os interessados fizeram troca.
t.
2.ADMISSÃO DA MEDIAÇÃO E ADMISSÃO DA FUTURA VINCULAÇÃO A REMUNERAR. Antes de
qualquer trato dos problemas sobre a eficácia da mediação, temos de distinguir:
a)a composição dos pressupostos da mediação, antes da conclusão do contrato de mediação (a mediação
oferece a singularidade de haver mediação, atividade Láctica, antes de haver o contrato de mediação, o que não
poderia ocorrer, por exemplo, com o mandato) ; b) a admissão da mediação com a remunerabilidade por parte

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de quem a admitiu (pode admiti-la sem se vincular à remuneração futura) ; c) o contrato de mediação, que só se
conclui quando o ato, que os interessados queriam, se consuma (e. g., quando o contrato, para a conclusão do
qual o mediador ajudou, se concluiu), ou quando se consuma algo que o substituiu.
A tese de que, se o outro interessado ou os outros interessados, não quiseram vincular-se à remuneração do
mediador, não há mediação, mas intermediação dita fiduciária, ou locatio operis, é de repelir-se. A mediação
pode existir desde que se possa desenvolver a atividade mediatriz. O fato de algum ou alguns interessados não
quererem a futura vinculação à remuneração de modo nenhum concerne à existência da mediação.
O mediador tem de provar que a sua mediação foi admitida, e, se algum dos interessados alega que a pessoa não
foi mediador, mas agente ou outro atuante de outro interessado,
O ônus da prova é de quem alega (sem razão, a 43 Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 14 de
julho de 1989, que deu o ônus da prova ao mediador).

8.CONSENTIMENTO E vINCULAÇÃO DOS INTERESSADOS.


O consentimento do outro interessado, ou dos outros interessados, a que o mediador perceba a remuneração
não é, de modo nenhum, pressuposto de validade, a fortiori de existência, do contrato de mediação. O
interessado que teve contacto com o mediador e permitiu a sua função tem de ser considerado como futuro
vinculado. Para que não o seja, é preciso que
o interessado ou os interessados, prêviamente e a tempo, afastem a vinculação. Não há vinculação ex lege,
como alguns juristas entendem, do interessado ou dos interessados à mediação e ao pagamento. O que se dá é a
presunção de consentimento que estabelecia situação de futura vinculação. Por ocasião da conclusão do
contrato, por suas vontades antes manifestadas, expressa ou tâcitamente, inclusive pelo silêncio, ficam
vinculados os interessados. A função do mediador tem de ser, por isso, remunerada.
Há mediação, portanto, se nenhum dos interessados fêz objeção à vinculação futura. O mediador atua, sem que
todos os interessados permaneçam expostos ao dever futuro de remuneração. E isso acontece porque mediar
não é intermediar:
O mediador me dela, não é intermediário. Quem permite a remuneração pode ressalvar que a isso não se
vincula.
Daí ser de grande relevância, muito embora ocorrido no mundo Láctico, o ato positivo ou negativo, inclusive
silente do interessado em que já se pode presumir a sua manifestação de vontade de futura vinculação.
O fato de todos os interessados terem afastado a futura remuneração não pré-exclui que o contrato aí, unilateral
de mediação se consuma. Houve gratuidade, mas contrato houve. O que importa é que se tenha admitido a
mediacão. Isso não bastaria à intermediação, que opera em contactos com os interessados, e não apenas
suscitando contactos por entre os interessados. O mediador não intermedeia; apenas medeia. Uma coisa é nadar
pelo rio mostrando onde estão os paus para a ponte; outra coisa, pôr os paus para a ponte. Intermediário não só
medeja: intermedeia.
Uma vez que se dê a conclusão do ato que se queria e para o qual o mediador exerceu função mediatriz,
qualquer revogação pelos interessados, por alguns ou algum dêles, é inoperante. Antes, não se há de falar de
denúncia, porque ainda não há relação jurídica, ainda não há vinculação.
Se o outro interessado ou os outros interessados não admitiram a mediação, nem, portanto, a remuneração, que
a suporia levada a cabo, contrato de mediacão não houve. Em tal espécie, o outro interessado ou os outros
interessados não deixaram que rio mundo fáctico se viessem a satisfazer os pressupostos da mediação. O
interessado ou os interessados puseram-se em contacto, sózinhos, ou através de corretores ou representantes, ou
comíssionârios, ou com a ajuda de outro mediador.
4. MANIFESTAÇÃO PRE-ELIDENTE, TARDIA, DE VONTADE. À manifestacão de vontade, pela qual o
interessado se incolumizaà futura vinculação, pode ser intempestiva, por já se haver de presumir a manifestação
de vontade de futura vincuiacao. Tal manifestacão de vontade, que somente vincula no momento da conclusão
do ato que se quer, supõe anuência dos interessados à atividade do mediador. Por ter faltado exposição clara do
problema, há vacílações na jurisprudência e na doutrina estrangeiras. Quem admitiu a mediação, mas, antes da
atividade do mediador, se eximiu da futura vinculação a remunerar, ainda não se manifestou sobre êsse ponto.
Desde o momento em que a atividade mediatriz se iniciou sem qualquer ressalva por parte do interessado, há
presunção de manifestacão de vontade. Se a mediação prossegue e se chega à conclusão do que os interessados
queriam, vinculado está quem quer que haja anuído na atividade do mediador, sem, a tempo, ressalvar a sua
incolumidade à futura vinculação.
Por isso mesmo, se todos ressalvaram, a tempo, a irremunerabilidade da mediação, que foi até à conclusão do

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ato querido, eu a mediação não entrou no mundo jurídico, ou foi gratuita.

5.OCULTAÇÃO DO NOME DE FIGURANTE. O mediador pode ocultar o nome de um ou de alguns dos


contraentes a outro ou a outros. Uma vez que o futuro contraente anui, ou anuem os futuros contraentes, em que
se lhes encubra o nome de quem N’ai ser o outro figurante, ou das pessoas que vão ser os outros figurantes, a
mediação pode concluir-se. Se o mediador se vinculou, perante o futuro contraente, ou os futuros contraentes,. à
ocultação, o pacto de segrêdo é apenas adjecto ao futuro contrato de mediação.
Não se há de confundir tal figura jurídica com a da comissão, pôsto que seja freqúente o contrato de comissão
com ocultação do nome do comitente. A despeito do pacto de segrêdo, não se desnaturou a função do mediador,
que continua in tractando, e não in concludendo. Cf. LEONE BOLAFFIO (Tratti caracteristici delia
Mediazione, Studi in onore di II, 89; sem razão, Luící CARRARO, La Mediazione, 159, que pensou em
contrato por pessoa a ser nomeada).
O legislador teria de permitir o ocultar-se o nome do outro ou dos outros interessados, ou fazer dever do
mediador a revelação, desde que se lhe pedisse. Aquela atitude é mais acertada e a segunda, que alguns sistemas
jurídicos acolheram, foi posta de lado. Se o mediador oculta o nome, surge outro problema de técnica
legislativa: g o mediador há de responder se o interessado não nomínado ou os interessados não nominados
deixar concluir o negócio jurídico esperado? A resposta afirmativa deforma a figura da mediacão. Haveria
comissão, eu representação, com conclusão do negócio em nome próprio. Ora, o mediador não conclui,
somente trata. Tão-pouco se pode admitir que o mediador se faça o contraente, o que não pode lograr acolhida
(cf. ENRIco ENRIETTI, li Contratto da nomínare, 215).
Se o mediador obra ia concludendo, deixou de ser mediador, ou tem a atividade do mediador e outra atividade.
Só é mediador se apenas medeia. Como mediador, não responde a terceiros, nem tem direitos, pretensões, ações
ou exceções contra terceiros. Não foi figurante, nem fêz as vêzes de outrem, como comissionário ou
mandatário.
~ Pode o mediador ir contra o figurante incógnito que não adimpliu? A opinião que o afirma não procura
explicar o que em verdade se passa (e. g., U. AZZOLINA, La Mediazione, 51). Ornediador, que exerce a
pretensão do figurante não nomeado, é procurador com caução de rato, ou assume a posição de (aparente)
sucessor do figurante não nomeado. O mediador, êsse, não pode ir além da mediação. Sem razão, F.
SANTORO-PASSARELLI (Istituzioni, 1, 200). Se o figurante nomeado exige o adimplemento, há
responsabilidade da pessoa que foi o mediador, mas no momento da conclusão do contrato, se o nome não foi
revelado e o figurante não se apresenta o mediador deixou de apenas tratar, contratou. Qualquer ação contra
ele ou exercida por êle não é mais acão de mediador. O mediador nada tem com o que se inadimpla entre os
figurantes. Não se trata de substituição processual (sem razão, P. D’ONOFRIO, Un caso di sostituzione
processuale, Poro italiano, 1926, J, 475). Tem-se de inquirir como há de figurar a pessoa que foi mediador.

6.POSSIBILIDADE DA MEDIAÇÃO. A mediação tem de consistir em atos, positivos ou negativos, que sejam
possíveis. Se não há possibilidade de mediação, mediação não há, porque, sendo a mediação antes da conclusão
do contrato, se dá a particularidade de não entrar no mundo jurídico o que se operou, em vez de entrar e ser
nulo o contrato.

7. LíCíTUDE DA MEDIAÇÃO. A atividade mediatriz tem de ser lícita. Se lícita não é, nulo é o contrato de
mediação (cf. Código Civil, art. 82, 2•a parte; Código Comercial, art. 129, inciso 2). Se há imoralidade, ou
ofensa aos bons costumes, no ato que se colima com a mediação, nulo é o contrato de mediação. No sistema
jurídico brasileiro, existe, porém não vale. A mediação para se conseguir o que o Estado ou entidades
paraestatais prometem a todos que satisfaçam exigências legais e regulamentares é nula (e. g., para obtenção de
empréstimos nas Caixas Econômicas, 23 Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 22 de abril de
1941, R. dos 2’., 132, 234; 5.~ Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, 22 de junho de 1951; cf. 32 Grupo
de Câmaras Civis, 9 de março de 1950. 181, 107, que permitiu a mediação para empréstimos em autarquias).
A prestação do mediador, se o negócio jurídico ou outro ato ou fato, que os interessados querem, é ilícito,
também é ilícita. O mediador de negócio de boicotagem, ou de meretrício, ou de adultério, ou de usura, ou de
outro ato ou Lato, não vincula, nem se vincula. A mediação para matrimônio nem sempre é ilícita: só o é se
emprega meios coercitivos ou imorais, ou se a imoralidade se revela na remuneração (percentagem no dote, ou
na herança deixada a um dos futuros cônjuges). Caso concreto: A e E anuiram em pagar a C as despesas dos

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jantares em que C e a mulher convidarem A e B, para que haja o contacto social. Só há contrato de mediação se
êsse só se concluiu com o resultado, pôsto que resultado não signifique o ato do casamento, se. os dois
consentiriam e o casamento não se fêz por ter A retirado, depois de pronto todo o processo, a promessa de casar
com B.
~Pode a mediação ser para contrato matrimonial? Há os que consideram ilícito o objeto (Código Civil, art. 145,
II,1~a parte); e. g., LUIGI CARRARO (La Mediazione, 222). Há os que distinguem a mediação que não influa
na vontade dos nubentes, de modo que apenas se favorece encontro e se presta informação, e a que se exerce
com pressão ou emprega meios indignos. E. g., LUDovICO BARASSI (La Famiglia legittima nel nuovo
Codice Civile, 33 ed., 350) e UMEEIITO AZZOLINA (La Mediazione, 32).

8. FORMA DO CONTRATO DE MEDIAÇÃO. Nenhuma exigência há de forma especial. A manifestação de


vontade pode ser expressa, tácita ou pelo silêncio, conforme os princípios. A prova submete-se às regras
jurídicas comuns.
Se o contrato, para cuja conclusão se admitiu a mediação, somente se há de fazer por instrumento público, nada
obsta que nenhuma forma escrita se haja exigido para a mediação. Apenas a falta da forma escrita tem os
inconvenientes da dificuldade de prova.

9. MOMENTO DA CONCLUSÃO DO CONTRATO DE MEDIAÇÃO.


O momento conclusivo do contrato de mediação não é aquêle em que o último interessado anui em que o
mediador opere. Afirmá-lo é ver outro contrato em lugar do contrato de mediação. Não se pode confundir o
momento da conclusão do contrato de mediação com o momento em que, pela permissão dos interessados, ela
se fêz possível. Se C vai dizer a E que estêve com A e pode ser o mediador, para que A adquira o edifício de E,
e E lhe expõe as dificuldades que apareceram, ainda não se concluiu o contrato de mediação, que não é locação
de serviços, nem de obra. O que A e E permitiram foi o inicio da mediação, mas no mundo fáctico, o que
explica a “revogabilidade” por C, por A ou por E. Pode bem ser que E haja anuído na mediação, afastando, em
todo o caso, a remunerabilidade. O que se passa, antes de se completar mediação e se tornar irrevogável a
manifestação de vontade dos interessados (outro momento), é esquema fáctico do contrato de mediação.
Não se pode dizer, sequer, que houve autorização , no sentido do mundo jurídico. O que houve, no sentido do
mundo Láctico, foi permissão, como A ou E poderia permitir que O, que está com a chave do edifício de
apartamento, abra a porta, por A ou B ter saído sem chave. Melhor: como A ou E poderia
permitir que C tentasse fazer funcionar o seu automóvel cujo motor parara. O contrato, aqui, seria de obra, ou
gratuito, mas a imagem esclarece.
O contrato de mediação conclui-se no momento em que se conclui o negócio que os interessados queriam, ou
há culpa in contrahendo, por parte dos interessados, se há a evasão de algum ou de alguns ou de todos quando
não mais tinha razão de ser.

10.O QUE SE QUER E O NEGÓCIO JURÍDICO PARA SE OBTER O QUE SE QUER. As considerações que
aqui vamos fazer são essenciais à inteligência do contrato de mediação. Quando se busca ou se admite
mediador, há o querer de alguém cuja satisfação depende do querer de outrem. Na doutrina não se tem frisado
que o que se quer pode ser negócio jurídico bilateral, ou não, como pode ser ato jurídico stricto sensu, ou ato-
fato jurídico, ou fato jurídico stricto sensu (e. g., adjunção, mistura, confusão, retirada de coisas móveis que
guarnecem o prédio locado, cf. Tomo li, § 159, in fine), mas, para isso, é preciso o negócio jurídico bilateral,
escrito ou oral, por manifestações de vontade expressas ou tácitas, ou pelo silêncio.
O que é essencial é que haja duas ou mais pessoas, físicas ou jurídicas, de cujo acôrdo (negócio jurídico) resulte
o ato ou o fato que se quer. A conclusão é sempre dêsse negócio jurídico, e a essa conclusão é que se destina a
mediação.
Por vêzes, o ato que se quer, ou o fato que se quer, aparece como se não houvesse o negócio jurídico de que se
irradia o dever de prestá-lo, ou, se negócio jurídico real, a prestação simultânea; mas o negócio jurídico
necessàriamente existe. Não pode ser elidido. Ninguém é mediador sem ser para que duas ou mais vontades se
acordem. Se A quer o aval de E na duplicata mercantil, de que lhe advirá o dinheiro do desconto no banco, e o
mediador, •C, vai obtê-lo de E, ou E exige que A também lhe avalize título, ou lhe dê garantia fidejussória ou
real da divida (futura), ou E anui em avalizar sem qualquer contraprestação. De qualquer modo, há negócio
jurídico entre A e E, por mediação de O. O objeto do negócio jurídico bilateral é que é o ava1~ negócio jurídico
unilateral. preciso, portanto, que se não confunda com a contusão do negócio jurídico a prestação que A queda e

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a contraprestação que E exigiu, ou a manifestação de vontade de 13 sem exigência de contraprestação.


Se a mediação foi para que B desse em locação o prédio a terceiros, digamos ao filho de A, e E exigiu fiança de
A, houve negócio jurídico pouco perceptível entre A e 13, de que foram prestação a locação ao terceiro, filho
de A, e contraprestação a fiança. O negócio jurídico entre A e E é inconfundível com o negócio jurídico da
locação e com o negócio jurídico da fiança. Pode ocorrer que o mediador consiga de E dar em locação o prédio
a terceiro, sem exigir qualquer contra-prestação. O negócio jurídico bilateral se concluiu, gratuita-mente. Se E
exigiu que A avalizasse título subscrito por E, ou por outrem, ocorreu o negócio jurídico bilateral, com a
contraprestação em negócio jurídico unilateral.
O que se quer é a prestação. A contraprestação não é elemento necessário. O negócio jurídico bilateral, ou
plurilateral, oneroso ou gratuito, é ineliminável. Se A quer constituir sociedade e pede ao mediador que busque
interessados que perfaçam o capital necessário, a mediação vai ser entre A e E, ou entre A, E e C, ou entre A, E,
O e outras pessoas, cujas quotas, somadas, dêem o que é exigido por A. O negócio jurídico que se conclui é
plurilateral, sem que se afaste a hipótese de E ficar com tôdas as quotas, para posteriormente passá-las a outra
ou a outras pessoas.
Assim, a prestação pode ser negócio jurídico, ato jurídico stricto sensu (e. g., mediação para que o advogado
interpele), ato-fato jurídico (e. g., mediação para que E pague o que deve a A ou a terceiro), ou fato jurídico
stricto sensu. Para isso, é que haja o negócio jurídico entre A e E ou A, E e outra pessoa ou outras pessoas, para
cuja conclusão o mediador exerce a atividade típica.

11.QUE SE HÁ DE ENTENDER POR “CONCLUSÃO DE NEGÓCIO”.


O negócio, que os interessados têm por fito, é sempre negócio jurídico. O fim jurídico, em si e só por si, para
cujo atingimento se opera a mediação, é apenas o que mais acontece. Portanto, o que se quer pode não ser
negócio jurídico, nem, a fortiori, contrato. Se não há bilateralidade de ato, ou se o ato-fato ou o fato não
depende de outrem, ou se não há dois ou mais atos, dois ou mais atos-fatos, ou dois ou mais fatos,
não se deve cogitar de mediação. Assim, pode haver mediação em dação de aval à letra de câmbio, à nota
promissória ou outro título cambiário ou cambiariforme, e a garantia hipotecária pelo favorecido pelo aval
(houve, por fora, o negócio jurídico bilateral). Também pode haver mediação entre A, que deseja tirar terra do
rio que passa no sitio de E, e B, que talvez exija contraprestação, ou não a exija. Portanto, há de haver negócio
jurídico bilateral, ou plurilateral, não necessàriamente contrato bilateral.
Fala-se de mediação para se obter licença, federal, estadual ou municipal, ou autorização, ou concessão, mas é
êrro. A atividade, aí, não é de mediador, mas, se lícita, de locator operis, de despachante, de advogado, ou de
outro intermediário.

12.ATIvIDADE DO MEDIADOR, CONCAUSA DA CONCLUSÀO NEGÓCIO JURIDICO. A atividade


determinante da conclusão do negócio jurídico não precisa ser somente a do mediador. Basta que essa seja uma
das causas. A exigência é de a mediação ser concausa, mesmo porque não poderia ser a causa única. l?iscute-se
sobre ter de ser necessária e suficiente para que, na normalidade dos casos, se chegue à conclusão do negócio
jurídico (NICOLA PUGLIESE, Ii Contraito di Mediazione, 96 s.), ou se basta ter sido útil, de modo a haver
nexo causal (Luta CARRARO, La Mediazione, 242 s.). Não se exige nem se poderia exigir que a obra do
mediador fôsse a causa única, ou necessana, ou suficiente. Têm-se de afastar o pressuposto de neces3ariedade,
o da unicidade e o de suficiência.
Se o negócio jurídico seria concluído mesmo sem a atividade mediatriz, a utilidade não foi a de concausa; se a
atividade
-foi para se tornar mais presta a conclusão, pode-se falar de nexo causal (tempo é concausa).
Necessariedade há quando, sem a atividade, não se teria concluído o negócio jurídico, nem se poderia ter
concluído. Suficiência há quando a atividade mediatriz bastaria para %t conclusão. Tais conceitos não podem
ser empregados. Mas, se o negócio jurídico só se concluiu porque o mediador indicou o outro figurante, ou
afastou a desinteligência entre os figurantes, ou aplainou as dificuldades, a utilidade da atividade mediatriz foi
tal que, sem ela, não se teria, em concreto, concluído o negócio jurídico.
Há presunção hominis de que houve a relação de causalidade, de que a mediação foi concausa (G. PLANCK,
Kornment ar, II, 2, 4≥ cd., 1139). Em conseqUência, os figurantes do negócio jurídico têm o ónus de alegar e
provar que não houve o nexo de causalidade. Se os figurantes se cressem aptos a chegar à conclusão do negócio
jurídico sem a atividade do mediador, não o teriam chamado, ou não teriam admitido a mediação, ou, por terem
a mediação como sem importância. teriam afastado a remunerabilidade.

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Também incumbe aos figurantes o ônus de alegar e de provar que o mediador, em vez de ajudar, dificultou, de
boa fé ou de má fé. Ou o ônus de alegar e de provar que o negócio jurídico não foi aquêle para o qual se admitiu
a atividade mediatriz. Em todo o caso, pode o mediador alegar e provar que a mudanca do figura jurídica foi
com o aproveitamento da med2.ação, de jeito que não se apagou a linha de causação.
S≥ria dificultoso para o mediador ter de alegar e provar o nexo de causalidade entre a sua atividade e a
conclusão do negócio jurídico, tanto mais quanto é possível, mesmo provável, que alguns pontos em que os
figurantes hajam acordado posteriormente aos informes ao mediador e à sua própria missão, sejam ignorados,
no todo ou em pormenores, pelo mediador. Por outro lado, a atuação fáctica do mediador pode ter sido roiníma,
porem fundamental, decisiva, para a conclusão do negócio jurídico.
Os interessados podem proceder de má fé, para se furtarem à prestação da remuneracão. Deixar de concluir o
negócio jurídico por dolo é difícil de conceber-se. Demais, quem pode revogar, livremente, a permissão de
mediação, a fortiori pode deixar de concluir o negócio jurídico para o qual ela se destinava. A atitude de má fé
pode consistir em “revogação”, para os interessados se aproveitarem da atividade mediatriz e concluir o
negócio jurídico que se desejava. Outrossim, podem os interessados negar o nexo de causalidade entre a
mediação e a conclusão do negócio jurídico. Aqui, a presunção hominis, de que falamos, exerce o seu papel
acertado. Também pode ocorrer que façam um só negócio jurídico, em vez dos diferentes negócios jurídicos a
cuja conclusão ajudou o mediador, ou vice-versa, o que revela a má fé.

Se a atividade do mediador foi até onde devia e podia ir, se os interessados deram o negócio jurídico por
preparado, de modo que não mais se precisasse de mediação e um dos interessados ou alguns ou todos
resolvem não concluir o negócio jurídico, dc má fé, como se o comprador falta à assinatura da escritura pública
de compra-e-venda, o mediador tem ação contra êsse ou êsses interessados. Se há culpa in contra flendo,
quanto ao negócio jurídico que se ia concluir, também pode havê-la quanto ao contrato de mediação. Cf. Tomo
XXXVIII, §§ 4.242 e 4.243.

§ 4717. Eficácia da mediação no mundo láctico

1. PRECISÕES. Antes de se concluir o contrato de mediação, a atividade do mediador e a dos interessados se


desenrolam no mundo fáctico. Os deveres não se irradiam do contrato de mediação, porque êsse ainda não
existe. São deveres ajuridicos ou deveres que resultam de ter o mediador e terem os interessados de respeitar as
leis penais e os regulamentos. A judicidade de tais deveres, se os há, é extracontratual, salvo se houve, a
propósito, algum pacto.

2.DEVERES JURÍDICOS E AJURIDICOS. Na terminologia vulgar, os deveres ou são jurídicos, ou morais, ou


políticos, ou religiosos. Cada um dos processos sociais de adaptação a que êks correspondem têm a sua
imperatividade. Rigorosamente, a argüição é peculiar ao direito; donde: direitos, deveres; pretensões,
obrigações. Por vêzes, porém, há situações que se assemelham á dos direitos e deveres, que são típicos do
direito, que é processo social de adaptação.
A propósito da mediação, é de tôda a conveniência distinguir-se da fase em que a atividade mediatriz ainda não
entrou no mundo jurídico, pôsto que se espere que entre, aquela em que a penetração já se deu. ~ da máxima
importância apontar-se o que se chama “dever”, na primeira fase, e o que É dever, na segunda.
Enquanto a atividade do mediador se exerce (e ela só se exerce no mundo fáctíco), há a retirabilidade da
permissão, por parte dos interessados, como há a retirabilidade da atividade mesma, por parte do mediador. Não
se pode pensar em deveres jurídicos e em direitos, pretensões e ações. A chave para a mediação entrar no
mundo jurídico é a conclusão mesma do negócio jurídico.

3. PACTOS ADJECTOS OU NÃO Ã MEDIAÇÃO. Os pactos alusivos ao contrato de mediação são, de regra,
pactos adjectos ao futuro contrato de mediação, ou pactos que constituem negódos jurídicos bilaterais ou
plurilaterais à parte, sem adjecção.
(a) Os pactos sobre despesas atendem a que pode o mediador ter de fazer despesas extraordinárias, que não
entrem na atividade normal do mediador. Em tais casos, mesmo se os pactos resultaram de manifestações de
vontade tácitas ou silentes, o mediador assume o dever de fazê-las, se necessárias, e tem direito ao reembôlso,

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ainda que não se tenha chegado a concluir o negócio jurídico que se desejava. Êsses pactos não se inserem no
contrato de mediação, razão por que a reembolsabilidade independe da conclusão do negócio jurídico.
Se as despesas são as que entram na atividade regular, ordinária, do mediador, há a álea, e o mediador, para
exercer a sua atividade, tem de fazê-las, sem qualquer reembôlso.
(b) Se o mediador dá fiança pelo adimplemento por parte de algum dos interessados, tal pacto nada tem com a
atividade mediatriz. ~ fiança como qualquer outra. Mediador não é garante, não promete que os outros
interessados concluirão o negócio jurídico, nem, a fortiori, que adimplam os deveres irradiados do negócio
jurídico que concluírem.
(c) Pode ocorrer que algum dos interessados ou alguns dos interessados dêem poderes de mandatário, ou de
procurador, ao mediador, para que, além da atividade mediatriz, tenha êle a de mandatário, ou a de procurador,
quase sempre para representação em atos preliminares ou adimpletivos do negócio jurídico de que se cogita.
Nada obsta a que o mediador exerça, separadamente, as duas funções. Mediador não é representante: não é
mandatário, nem exerce procura. Se recebe poderes, há plus, sem que se possam misturar os atos, distintos e
típicos, que pratica.
‘Observe-se que êle não pode exercer mandato ou procuração no que é missão do mediador. Onde há
necessidade de informes imparciais e de afastamento de dificuldades em que tenha de atender à finalidade dos
interessados, não pode ser mandatário nem procurador.
A mediação não é negócio jurídico inserto no negócio jurídico que se tem em mira. O mandato o é. A
procuração o é. Não se diga, tão-pouco, que o mandato ou a procura são, aí, acessórios do contrato de mediação
(sem razão, CARLO VARELLI, La Mediazione, 105). Se o negócio jurídico foi concluído, o mandato ou a
procuração é para adimplemento, e não mais se cogita de atividade de mediador. Idem, se o mandato ou a
procuraçáo foi para algum ato preliminar, e. g., pagamento dos impostos, inclusive de transmissão da
propriedade e lucro imobiliário. No que exerceu poderes de mandatário ou de procurador, a pessoa que também
foi ou é mediador tem os deveres e os direitos, respectivamente, de mandatário ou de procurador.
(d) O pacto de eyclusividade da mediacão é aquêle em que algum ou alguns ou todos os interessados se
vinculam a não admitir outro mediador ou a não admitir outros mediadores. O pacto não torna irrevogável a
mediação, nem se insere no futuro contrato de mediação. Os interessados respondem pelo inadimplemento do
dever de não pluralizar a mediação.
(e) O pacto de irrevogabilidade pelos interessados, êsse, é pacto adjecto que não implica o de exclusividade.
Pràticamente, é conveniente concluírem-se os dois. O pacto de irrevogabilidade não torna irrevogâvel, pelos
interessados, a mediação; apenas dá ensejo à indenização dos danos causados ao mediador, inclusive no tocante
à remuneração a que teria direito o mediador se concluído o negócio jurídico. Não têm razão os que, como
LrncI CARRARO (La Mediazione, 194), vêem no pacto de irrevogabilidade, sempre, alteração à figura jurídica
da mediação, de jeito que advenha a irrevogabilidade objetiva.
(Já a respeito do mandato e da procura tratamos da irrevogabihdade objetiva: o mandato e a procura, se foi
inserta a cláusula de irrevogabilidade, não podem ser revogados; objetivamente, tornaram-se irrevogáveis. A
revogação, que ocorra, é ineficaz. O pacto de irrevogabilidade não faz objetivamente irrevogável a mediação:
apenas, quem revoga responde pelas perdas e danos. A irrevogabilidade aí, é somente subjetiva.)
(f) Quanto ao pacto de nunciatura, dificilmente se lhe poderia encontrar ensejo de ser útil. A transmissão de
informações e de pormenores sobre as futuras manifestações de vontade dos interessados entra na função do
mediador. Por isso mesmo, se dá informes ou faz comunicações erradas, causando dano aos interessados, a
alguns ou a algum dêles, responde pelo ato ilícito absoluto (ainda não há contrato de mediação), e não e:r
contraetu mediatzonís.
Se de algum ato de núncio foi encarregado o mediador, sem que tivesse de ser praticado por êle, então há
nunciatura, a: lado da mediacão.
(h) Qualquer pacto de parcialidade pré-exclui a mediação, mas, se foi feita a mediação sem que se rompesse
imparcialidade, conclui-se o contrato de mediação.
Se havia o pacto e. g., o interessado encarregou C de informar quem quer comprar a Fazenda E e depois,
cumprido o encargo, o encarregado iniciou a mediação, há dois momentos: o em que só A estava em contacto
com C e o em que A e E passam a ser os interessados na mediação.
Pode ocorrer que C seja mandatário, ou procurador, ou comissionário de A e, depois, se dê por terminada a
atividade de mandatário, ou de procurador, ou de comissionário, e se inicie a mediação. O que houve não obsta
ao que há.

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§ 4.718. Deveres ajurídicos do mediador

i. DEVER DE INFORMAÇÃO. O dever de informação, por parte do mediador, é dever morai, ainda não é
dever jurídico. Para obrar imparcialmente, tem êle de informar e de informar-se. Ainda não tem o dever
jurídico, porque falta a vinculação. Somente nos sistemas jurídicos e na doutrina que põem no mundo jurídico a
mediação, desde o primeiro contacto com um dos interessados, ou desde o contacto com todos, é que se pode
falar de dever jurídico de informação.
Qualquer pessoa, que está à esquina e a que se pergunta qual a rua R, tem dever de informar, se o sabe. Mas tal
dever não é jurídico. O amigo que leva a carta para o banco não pode, sem infração de dever, deixar de entregá-
la no tempo devido, que é aquêle a que se aludiu; mas tal dever não é jurídico. O mediador não opera por
amizade, nem por cortesia, mas com vista ao futuro contrato de mediação. Os seus deveres até lá não são
jurídicos, salvo se houve pacto, que ainda não é o contrato de mediação, se bem que a êle se refira.
(Não temos aqui de considerar os casos em que a infração do dever moral importa ato ilícito absoluto, às vêzes
penal, como se A entregou a C a carta em que A responde a E, dentro de prazo, e C não a entrega a tempo, para
causar dano a A.)
Uma vez que não há dever jurídico, obrigação não há, nem há ação.
O dever de informar consiste em dever de dar as informações favoráveis e as desfavoráveis. Se assim não
procede o mediador, não é imparcial. Não tem êle dever de pesquisas e de indagações profundas e técnicas. Há
de comunicar o que interessa ao que se tem por fito, uma vez que o conhece. Se alguma pergunta se lhe fêz e
êle tem meios normais para indagar, deve saber da verdade, e dizê-la.
Se um dos interessados está insolvente e o mediador tem notícia segura, não pode ocultá-lo ao outro interessado
ou aos outros interessados, uma vez que a insolvência possa atingir o que se quer ou os seus efeitos. Não há,
porém, o dever de garantir ou assegurar a solvência de qualquer dêles (sem razão, Luici CARRARO, La
Mediazione, 125; UMEERTO AZZOLINA, La Mecliazione, 57). O mediador não é garante, mesmo no sistema
jurídico italiano, a despeito dos arts. 1.764 e 1.759 do Código Civil italiano, aquêle só referente ao mediador
profissional.
2.ÓBICES AO QUE OS INTERESSADOS TÊM POR FITO. Pode dar-se que o mediador, em vez de ajudar,
impeça, ou complique, ou dificulte. As teorias que não vêem na mediação o tempo de ajuda antes de qualquer
vinculação têm de considerar ex contraem a responsabilidade do mediador pelos danos que cause. Se, porém, se
atende, como é de boa sistemática, ao tempo que somente se conta no mundo fáctico, tal responsabilidade é
pelo fato ilícito absoluto, e não contratual.
O mediador, que, por exemplo, deixa de ajudar aos interessados sem “revogar” a sua manifestação de vontade
ainda no mundo fáctico, para favorecer estranho, responde pelos danos, extracontratualmente. Dá-se o mesmo
se o mediador presta informações infiéis, ou por outro modo, culposamente, concorre para que o negócio
jurídico não seja concluído. A dificultação ou a impossibilitação pode ser mesmo após ter feito o mediador tudo
que entrava na sua função.
A responsabilidade pode ser após a revogação pelo mediador se só revogou para ajudar a outrem. A doutrina
tem deixado de considerar êsse ponto, que é sutil, certamente, mas de grande relevância.
Se a mediação se iniciou com a ressalva de não remuneração por parte de um, de alguns ou de todos os
interessados, nem por isso deixa de haver a responsabilidade nas espécies de que falamos. Uma vez que é pelo
ato ilícito absoluto a responsabilidade, não se há de pensar na contratualidade (bilateralidade da mediação),
nem, a fortiori, na bilateralidade do contrato. Ainda não se chegou ai.

3.“CULPA IN CONTRAIiENDO” E MEDIAÇÃO. Se A anuiu na mediação ou a pediu e o mediador C ainda


não a iniciou, por faltar a anuência de E, tem-se pensado em culpa in. co~i,trahendo se o mediador causa danos
a A, inclusive obstando ou dificultando a anuência de E (cf. ADRIANO DE Curís, Contributo alla Teoria dei
risarcirnento dei dano, 2; CARLO VARELLI, La lediaz.one, 57). Culpa in contraflendo existiria, por exempío,
se o mediador~ no momento em que a sua ajuda seria decisiva, deixou de prestá-la, e, por intervenção de
outrem, o negocio, que os interessados queriam, se concluiu, pôsto que se não tivesse concluído o contrato de
mediacão com o culpado in contiabendo.
Se o dano é por se não haver concluído ou se haver dificultado o que os interessados queriam, não há falar-se
em culpa in cmitrahendo, porque a função do mediador é iv. tractando, nou in concluclendo. Se o dano é
porque o contrato de mediacão não se concluiu, então sim, a espécie é de culpa lvi contrahendo. Por exemplo: o
mediador pactou com E operar a seu favor, portanto sem imparcialidade; o mediador, que tem remuneração

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percedual por parte de B e de quantia determinada por parte de A, faz aumentar-se e preço para ganhar reaxs; o
mediador tem remuneracão de E relativa ao preço acima de x. Não se pode afirmar, a priori, que o ter B de
eiftregar ao mediador o que recebeu, em pagamento de dívida ante-flor ao n~cd~ador. seja sempre quebra da
parcialidade (e. g., CAPtO VARaL!, La Médiúzione, 62; contra, UMBERTO AZZOLINA, La 3ft4~g~j~pr, 4.5
a) nem que sempre o não seja. Depende de fatos cue mostrem a causacao .

4.DEVER DE SiGILO. O dever de sigilo é dever jurídico, cm virtude do art. 196, § 1.0, XII, do Código Penal,
que considera crime divulgar ou explorar, sem autorização, quando a serviço de outrem, segrêdo de negócio,
que lhe foi confiado, eu de que teve conhecimento em razão do serviço. Mediação servi -~ e, cm senso lato.
Cabe “representação” penal para a ação pública (ad. 196, § 29). Não se precisa de regra juridica de direito
privado, como ocorre no Código Civil espanhol, art. 95, inciso 3. Cf. CARL CROME (0k partiari.schen
fleohtsgesúh.tífte, 416). O segrêdo é quanto a terceiros que sejam cstranhos às punetacões e aos quais não seja
prudente ou seja de vedar-se a comunicação. Não há segrêdo para os outros interessados, salvo se nada tem com
a conclusão do negócio, nem pesaria contra ela ou para ela. Os que negam o dever de sigilo porque, com êle, se
violaria a imparcialidade, que há de caracterizar a obra do mediador, e destoaria da sua situação entre os
interessados, deixam de atender a que o sigilo pode ser subjetivamente (para D, e não para E), ou objetivamente
limitado (e. g., só em parte revelável a D, ou só em parte para ser revelado, necessâriamente, a como ocorre
com os vicios que seriam redibitórios). Se o mediador tem de operar entre A, 13, C. D e E, mas é caso de outras
pessoas poderem entrar, corno ocorre com a constituição de sociedade de muitas quotas ou de sociedade por
ações, o mediador pode de regra dar ao plano a publicidade que seja eficiente.

5.PROPRIEDADE E AUTENTICIDADE. O mediador pode ter de entregar a E os bens que A prestou e a A o


que E contra-prestou (dinheiro, títulos). iQual o dever do mediador a respeito da propriedade e da
autenticidade? Pensou-se em garantia semelhante à da evicção (LuicI CÂRRÂRO, La Mediazione. 314 s4, em
responsabilidade objetiva por ser de ordem pábEca (?) a atividade (UMEERTO NAVARRINI, Trattato teorico
-c;úthco Jj Dij j~[c eofluJLerÚiale, III, 76; CAETANO FINOCHIARO, li Contratto di n edazione, 161;
NICOLA PUGLIESE, Ii Contratto di mectiazione, 25), e em responsabilidade por ser dever do mediador
adimplir com a diligência de bon’us pater famiUas (ainda hoje, UMBELtTO AzzOLINA, La Mediazione, 47).
Ora, ainda não está vinculado o mediador. N~io lhe incumbe receber p&o interessado, nem remeter. Se o
interessado o incumbe da entrega de documentos ou do objeto de prestação, tal atividade já é fora da atividade
mediatriz. (O ad. 1.759, ~1inea 2.¶ do Código Civil italiano é mais uma regra jurídica em que se revela a
lamentável confusão da mediação com outras atividades.)
Tem-se de ver qual a relação juridica que, em virtude de algum pacto, se estabeleceu entre o interessado e o
mediador. Se nenhuma existe, o mediador responde pelo ato ilícito absoluto, como se não viu o interessado
assinar o título e o entrega ao outro, como se estivesse certo da autenticidade. Se tem dúvida, bá o dever de
comunicar a sua indecisão.
O mediador que entrega ao interessado o bem de que a êsse foram outorgadas a propriedade e a posse, ou só a
propriedade, ou só a posse, também o faz em conseqüência de algum pacto entre êIe e o interessado, ou os
~interessados, fora da mediação . Mediador não é núncio, nem mandatário, nem agente. O mediador, como
mediador, não tem posse, que possa transmitir, nem tem outorga para a transmissão .

§ 4.719. Deveres dos interessados

1. DEVER DE COMUNICAÇÃO. Durante a fase da media-cão no mundo fáctico, o interessado que se quer
afastar da mediação tem de comunicá-lo imediatamente ao mediador para que êsse não perca tempo e não faça
despesas fúteis. A “revogação” pelo interessado é manifestação de vontade recepticia, mas também ela se passa
no mundo fáctico. Não há, no direito brasileiro, a regra juridica do § 324 do Código Civil alemão, que se
pudesse invocar para se dizer com direito à remuneração o mediador, a despeito da atitude revocatória do
interessado ou dos interessados que não ressalvaram a pré-exclusão da onerosidade.
Discute-se se, não havendo, como não há, tal regra jurídica, pode ter direito ao ressarcimento o mediador se a
atitude do interessado ou dos interessados lhe causou dano.
O mediador assumiu o risco. A situação dêle não corresponde à do locator operís. A mediação pode ser afastada
a nuto. O que se exige é o respeito à recepticiedade da manifestação de vontade revocatória.

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2.PLURALIDADE DE MEDIADORES SEPARADOS. Se o interessado ou os interessados têm dois ou mais


mediadores, operando separadamente, sem qualquer liame entre êles, a conclusão do negócio jurídico que
queriam por atividade de um mediador tem de ser comunicada imediatamente aos outros e tem as
conseqúências da revogação.

3.COMUNICAÇÃO PARA A REMUNERAÇÃO. Ao ser concluso o negócio, também têm os interessados o


dever já em sentido jurídico de comunicar o que se passou ao mediador que ajudou, com os dados suficientes
para o cálculo da remuneração e dos meios de adimplemento (E. I-IEYMANN, Der Handelsmarkler, V.
EHRENHEnC, Hanábuci,. des gesammten Handelsrechts, V, 1, 433).

4.DESPESAS FEITAS PELO MEDIADOR. Os interessados não têm de pagar as despesas que o mediador fêz,
salvo se houve pacto, o que as circunstâncias podem estabelecer tácitamente, conforme antes dissemos. Tem-se
de afastar a opinião de UMBERTO AZZOLINA (La Mediazione, 58), que quis sustentar a tese da
reembolsabilidade.

§ 4.720. Eficácia do contrato de mediação

1.MOMENTO DE IRRADIAÇÃO. Somente se pode falar de efeitos do contrato de mediação depois de haver
contrato. Antes, qualquer efeito é extracontratual, porque ainda não há contrato. Pela peculiaridade histórica do
instituto, a mediação, como atividade, teve de ser considerada antes, para exame, de qualquer vinculação.

2.EFICÁCIA E EFICIÊNCIA DA MEDIAÇÃO. A mediação, menos visível do que os outros meios de


contactação, tem grande relevância na vida contemporânea. Negócios jurídicos concluem-se, da mais alta
importância, sem que apareçam os mediadores. Noutros, talvez sem êles não se chegasse à conclusão, ou pelo
menos com tanta oportunidade. Afastaram êles incompreensões, removeram dificuldades para as
contraprestações, informaram, aconselharam, transmitiram intenções e propósitos. À função estimulante,
agregante, atenuadora de empecilhos, que tem a mediação, corresponde, caracteristicamente, a sua abstenção de
intervir, a vontade de quem medeia.
Os negócios jurídicos, a cuja conclusão ajudam os que exercem a atividade mediadora, exsurgem, com os
elementos volitivos dos figurantes e, talvez, dos seus procuradores, que exercendo a procura, representam. Não
há o elemento volitivo dos mediadores. No mundo fáctico, os negócios jurídicos foram planejados, mediante tal
atividade, que fica inteiramente estranha às manifestações de vontade negociais.
O mediador põe em contacto duas ou mais pessoas para que cheguem à conclusão de contrato. Evite-se dizer
“põe em relação”, para se não aludir a qualquer relação jurídica entre os que têm propósitos ou podem ter
propósito de concluir negocio jurídico (cf. Código Comercial alemão, § 93; cp. Código Civil italiano, art. 1.754,
verbis “colui che mette in relazione”).
A eficácia da mediação não é confundível com a sua eficiência. A atividade do mediador pode restringir-se à
apresentação de uma pessoa a outra ou a outras pessoas, como pode ajudar nas punctaçóes e nos entendimentos,
com a experiência e o conhecimento técnico das operações em exame. Se o mediador leva a sua atuação a ponto
de induzir algum dos interessados a concluir o negócio jurídico, tal ingerência persiste no mundo fáctico. ‘Os
figurantes permanecem independentes; e o mediador nenhum poder recebe. Em tudo isso, está a eficiência ou a
ineficiência do mediador. Concluído o negócio jurídico, inicia-se a eficácia do contrato de mediação, com o
qual nada tem o negócio jurídico que, mediante tal atividade específica, se concluiu.

O mediador não colabora juridicamente, não faz dependente a pessoa que vai concluir o negócio jurídico, nem
se faz dependente, nem presenta, nem representa.
Pode-se dizer que no mediador está a atividade mais livre, mais autônoma, mais neutra, mais imparcial, sem
que se possa afirmar que a imparcialidade que se passa no mundo fáctico seja elemento concretamente
essencial, tanto mais quanto o mediador pode ser ou ter sido encarregado por um só dos interessados.
3. PRESTAÇÕES. Se oneroso o contrato de mediação, a prestação do mediador foi a de atividade mediatriz,
imparcial, e a dos interessados a de remuneração. Nada obsta a que so um ou alguns tenham de remunerar. O
contrato de mediação é o mesmo, pôsto que a bilateralidade seja salteada: o contrato de mediação é bilateral

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para A, e não no é para E, ou vice-versa; o contrato de mediação é bilateral para dois ou mais, e não no é para
um, dois ou mais interessados.
Pretendeu-se que a prestação do mediador contém promessa de fato de terceiro (o outro interessado) ou de
terceiros (os outros interessados>. Sem razão tal concepção que apareceu em UMBERTO AZZOLINA
(L’Ogetto del contratto di mediazione, Rivista di Diritto Privato, 11, 242; La Mediazione, 34). O mediador não
prometeu a conclusão do contrato, ou, melhor, a aceitação, ou a própria oferta pelo outro, ou pelos outros
interessados. O mediador ajuda. A sua atividade não é, sequer, in concludendo.
Na mediação não se promete o resultado, busca-se, para os interessados, tal resultado. Como o médico, presta
sem prometer ao cliente que a doença desapareça: medica, talvez opere, ou promete medicar ou operar; não
promete que o cliente fique bom. Mas, A diferença do médico, o mediador nada promete, porque a sua
promessa, se existe, ainda não entrou no mundo jurídico. A conclusão do negócio não depende do mediador. flle
apenas fêz o que lhe tocava, para que se fizesse concluível o negócio. Daí a importância de se saber quando se
há de dar como concluso o contrato de mediação. Às vêzes é o momento da conclusão, se a ajuda do mediador
foi até êsse ponto, que é o da assinatura pelos interessados, ou pela aceitação por telegrama ou telefonema, ou
pelo acôrdo de transmissão seguido da tradição. Donde poder dizer-se, em princípio, como fêz
E. CARNELUTTI (La Prestazione dei rischio nelia Mediazione, Rivista dei Diritto Commerciale, 1911, 1, 19
s.), que o mediador não tem direito à remuneração se o negócio não foi concluído, uma vez que, sem a
conclusão, não foi feita a sua prestação. Tudo isso mostra que o instituto da mediação há de ser tratado com
tôda a atenção à sua estrutura particularíssima. Quer pelos legisladores, quer pelos intérpretes, para que não se
dilua noutro instituto.
4.REMUNERAÇÃO AO MEDIADOR. A falta de atenção ao que ocorre com a função, ezterna, do mediador,
levou alguns juristas a cogitarem de consenso onde ainda somente há anuência fáctica ou permissão fâctica. Se
C diz a A que E quer comprar o sítio que A quer vender e ajuda E em pormenores quanto à compra, após
conversas com A, e ajuda a A, quanto ao que pode retirar do sítio, C é, t’ipicamente, mediador. Não houve,
porém, conclusão de contrato entre A e C e entre E e C. Não se passou das punctações, mas, advindo o contrato
de compra-e-venda, tem C direito à remuneração, mesmo se o vendedor ou o comprador fêz ressalva contra tal
contraprestação. Concluiu-se o contrato de mediação.
O mediador é imparcial, mas obra interessadamente. Daí ter-se como bilateral o contrato de mediação, salvo em
relação ao figurante ou aos figurantes que desde o início repeliram a assunção do dever de remunerar. Os
figurantes têm o ônus de alegar e provar que foi gratuita a mediacão.
Depois de ter recusado a mediação onerosa, pode o interessado ou podem os interessados admitir a
remunerabilidade. O que não mais é possível é considerar-se gratuita a mediação que se iniciou com os
elementos tácticos para a onerosidade. -
Se o interessado ainda pode revogar, isto é, se ainda não está feita a mediação ou está feita, mas o contrato que
se tem por fito não se pode concluir, a revogação desfaz a situacão táctica de que, no momento da conclusão do
contrato, resultaria a conclusão do contrato de mediacão.
Se o que se queria se concluiu devido à mediação, isto e, se a mediação foi uma das causas da conclusão do
negócio, há o direito à remuneração, salvo se foi pré-excluido pelo interessado que anuiu em que fôsse exercida
a atividade mediatriz.

A remuneração é uma só, dividida entre os interessados~ salvo pacto que o altere. Se algum interessado ou
alguns interessados a pré-excluiram, devem-na os outros que não a afastaram, ou aquêle que não a afastou. A
remuneração é a contraprestação, correspectiva ao que fêz o mediador. Se o negócio não se conclui, o mediador
fica sem qualquer remuneração. Não há pensar-se, aí, em invocação de regras jurídicas concernentes à locatio
operis, onde não há a álea. Em todo o caso, pode haver a responsabilidade pela culpa in contra/tendo.
O contrato de mediação não é necessàriamente trilateral ou plurilateral. Noutros têrmos: cada interessado se
vincula à remuneração, salvo se o não quer. O que é necessário é que todos admitam a mediação, porque, se
algum ou alguns não admitissem, a mediação seria impraticável. Não há mediação se um dos interessados não a
admite, porém não é preciso que consinta em remunerar.
Por outro lado, se o mediador fêz ou concorreu para que se pudesse concluir o contrato, que os interessados
tinham em vista, concluiu-se o contrato de mediação. O ato ou os atos do mediador não precisam ir até o
penúltimo momento (o último momento é o da conclusão mesma do contrato que se colimou). O ato ou os atos
do mediador podem ter consistido em simples pôr em contacto os interessados. Na conclusão do contrato-fim
nenhum papel tem o mediador.

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O mediador tem de aplainar dificuldades, proporcionar entendimentos, porque, sem isso, perigaria a conclusão
do negócio, e com o afastamento da conclusão ficaria sem êxito e, pois, sem remuneração a atividade mediatriz.
A mediação pode só ser nos últimos momentos anteriores à conclusão do negócio de que cogitam os
interessados. Surgiu, por exemplo, quando já se ia fazer a escritura, ou mesmo quando já se ia assinar,
dificuldade que o mediador afasta.
No direito brasileiro, não se pode dizer que o mediador tem direito à remuneração por parte de todos os
contraentes, se o negócio se conclui em relação causal, fáctica, com a sua mediação. Deve quem se ligou,
fâcticamente, ao mediador e, com o resultado obtido, se vinculou.
Se não foi determinado o quanto da remuneração, nem há tarifa profissional, o que seria excepcional (aliter, em
se tratando de corretores), rege a espécie o uso local, ou se há de fazer arbitramento judicial.
‘Os figurantes não respondem solidâriamente pela remuneração, porque, se a prestação é única e os figurantes,
ou alguns dêles se submeteram a futura remuneração , u mediação, pelo próprio conceito, foi ajuda a todos,
mesmo se alguns resalvaram a gratuidade.
A retificacão do cálculo do negócio jurídico concluído tem de ser atendida na remuneração, se essa é percentual,
ou dependente, por outro modo, do quanto da prestação.
Dá-se o mesmo no caso de redução do preço, se havia algum vício oculto.
Qualquer interessado pode pactar que pela remuneração seja só êle o responsável, como ou mais podem pactar
a solidariedade.
Quanto aos usos que tenham de ser atendidos, no caso de não se ter pactado sobre o quanto da remuneração, são
os usos do lugar da mediação, e não os do lugar do negócio jurídico a cuja conclusão ela se destinou. A razão é
óbvia: a mediação não é negócio jurídico acessório. Se a mediacão foi em diferentes lugares, os usos do lugar
em que ela se iniciou. Se não há usos, cabe ao juiz determiná-la por arbitramento.
Não cabe a remuneração : se não houve a conclusão do negócio jurídico (Tribunal de Apelação do Distrito
Federal, 16 de outubro de 1942), a fortiori se a culpa foi do mediador (2.~ Câmara Civil do Tribunal de
Apelação de São Paulo, 12 de junho de 1943, R. dos T., 145, 704) ; se, pedida prorrogação ou renovação do
prazo, não foi atendido o mediador (Supremo Tribunal Federal, 12 de abril de 1944).
Se o negócio jurídico que se concluiu foi semelhante, por ter o interessado anuído na mudança, como se quem
seria o comprador consentiu em ser sócio, tem-se como ultimada a função mediatriz (õ.~ Câmara Civil da Côrte
de Apelação de São Paulo 13 de outubro de 1937, 1?. dos T., 111, 666).
A decisão da 4•~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 10 de fevereiro de 1947 (1?. 9., 112,
165), que entendeu, a priori, devida a remuneração do mediador mesmo se o negócio jurídico não se concluiu,
foi contra os princípios.

Tratando-se de negócio jurídico sobre bem imóvel, a mediação está finda no momento em que se faz a escritura
pública de compra-e-venda (4•~ Câmara da Côrte de Apelação de São Paulo, 22 de julho de 1936, 1?. dos 17.,
103, 659).

5.PLURALIDADE DE MEDIADORES E REMUNERAÇÃO. Se há dois ou mais mediadores, sem


independência, cada um tem direito à quota da remuneração. Não importa se iniciaram a ajuda simultâneamente
ou sucessivamente, conjunta ou separadamente. Se um mediador desconhece que haja outro, ou outros, é
mediador independente, e não se pode cogitar de quota na remuneração, salvo se os interessados alegam e
provam que, sem a atividade de todos, à conclusão do negócio jurídico não se teria chegado.

13. DESPESAS FEITAS PELO MEDIADOR. Em princípio, as despesas feitas pelo mediador não podem ser
pedidas em reembôlso. Estão inclusas na álea da função mediatriz. Para que o mediador possa exigi-lo, é
preciso que tenha havido pacto a reste te. ou que tal solução resulte da especificidade dos atos do mediador,
corno se a mediação foi por pessoa de poucos recursos, reconhecidamente, e as despesas consistiram em
telefonadas internacionais.

7. NULIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO. A atividade do mediador pode não ter levado à conclusão do
negócio jurídico. Ter sido inócua, ou contraproducente. Ter sido a atividade de outrem que fêz os interessados
se acordarem. Faltou a mediação. Não há pensar-se em remuneração.
Se o negócio jurídico se concluiu, zé preciso que valha? Se a nulidade do negócio jurídico resultou de
impossibilidado ou ilicitude (Código Civil, art. 145, II), não se há de entender que a mediação se tornou

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contrato. Idem, se a nulidade prorcio de infração de regra jurídica de forma (art. 145, III),
Quanto à incapacidade absoluta (Código Civil, art. 145, 1), a solução é a de não se reputar concluído o contrato
de mediação, por ser nulo o negócio jurídico que se havia de concluir e se concluiu nulamente. Aliás, se algum
dos interessados era absolutamente incapaz, a admissão, por parte dêle, da atividade mediatriz não podia ser
levada em consideração. Se foi posterior à admissão a incapacidade absoluta, desde o momento em que ela
ocorreu já a mediação cessou de ser mediação admitida por todos. Está-se no mundo fáctico, mas a conclusão
do negócio jurídico que ocorresse não seria válida, nem, pela mesma razão. a do próprio contrato de mediação.
O negócio jurídico nulo não produz efeitos. Portanto, não pode ser elemento do suporte fáctico do contrato de
mediação.
Se o negócio jurídico, a despeito de nulo, foi atendido, o contrato de mediação só se tem como concluído se não
há repetibilidade da prestação voluntária e o outro figurante pode exigir o que lhe toca, ou se já o recebeu. Aí,
outro negócio jurídico foi concluído, de jeito que se conclui o contrato de mediação.
Tratando-se de anulabilidade, o que importa é que o mediador não conhecesse a causa. Idem, no caso de
rescisão.
Quanto à simulação (Código Civil, art. 147, II), a remuneração é devida se o mediador a ignorava, ou sobre o
negócio jurídico dissimulado, pois que para isso houve a mediação (assim Luici CARRARO, La Mediazione,
225; contra, E. HEYMANN, Der Ilandelsmarkler, V. ERRENEERO, Handbuch des gesammten Handellsreehts,
V, 418, que somente admite a remuneração se o mediador ignorava a simulação>.
Tem-se de considerar que a anulabilidade pode nada ter com a mediação. Nem se hão de confundir nulidade e
ineficácia. Se A e B se acordaram, graças à mediação de C, mas B não registou no registo de imóveis a escritura
de transmissão da propriedade antes de terceiro, que também obtivera de A o acôrdo de transmissão, o mediador
nada tem com isso. Se A era insolvente, ou falido, ignorando-o o mediador, nada tem com isso e mediador. Se B
deixou de dizer que era casado e a mulher tinha de assentir (ou de consentir), sem que disso tivesse
conhecimento ou devesse ter conhecimento o mediador, nada tem Osse com o ocorrido.
A remuneração só é devida se há a acionabilidade para se reconhecer ter havido a conclusão do negócio
jurídico útilmente e se para isso concorreu a obra mediador. Em têrmos mais técnicos: se seria favorável a
decisão que, em ação declaratória,desse como concluído o negócio jurídico e exercida, com eficiência, a
mediação. Certamente, assim é, porque não há contrato de mediação sem ter havido a mediação, em principio, a
conclusão do negócio jurídico desejado.
Ocorre, porém, às vêzes, que entre A e B a mediação é para se concluir contrato, por exemplo, de compra-e-
venda de terras, e o que se concluiu foi contrato de opção, ou outro contrato de que resulte direito formativo
gerador. Então, não se tem por concluído o negócio jurídico que se desejava, salvo se a mediação era para a
alternativa de conclusão (negócio jurídico de compra-e-venda e acôrdo de transmissão ou contrato de opção). A
mesma solução havemos de assentar a propósito da oferta irrevogável (Tomo XXXVIII, ~§ 4.189-4.194;
Código Civil, art. 1.086, II).
Quanto ao pré-contrato, não se pode dizer o mesmo. Se um e o outro ou um e os outros pré-contraentes são
outorgados a exigir o contrato, ou outro negócio jurídico, a missão do mediador acabou e é-lhe devida a
remuneração. Discute-se se tal solução aproveita os pré-contratos que não podem ter execução específica, como
em caso de pactum de mutuo dando (negativamente, CARLO VARELLI, La Mediazione, 79 s.) - Mas a
afirmativa impõe-se.
Pode ocorrer culpa in contrahendo, por parte de algum dos interessados, o que de ordinário implica haver culpa
in contrahendo quanto ao contrato de mediação, e então há a indenizabilidade (cf. § 4.716, 7, 9, 11; Tomo
XXXVITI,*§ 4.242 e 4.243).
A 63 Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, a 31 de maio de 1946 (li. P., 107, 385 s.),
referiu-se à necessidade da relação de causalidade entre a mediação e a conclusão do contrato. A 43 Câmara
Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 20 de outubro de 1946, atribuiu, e em razão, a mediador que
parara a atividade mediatriz, que fôra aproveitada, depois, por outro, remuneração proporcional. A 83 Câmara
Civil da Côrte de Apelação de São Paulo, a 16 de novembro de 1934, aludiu a ter de prestar remuneração quem
“encarregou” o mediador, o que é deixar de atender à natureza da mediação.
§ 4.721. Extinção da mediação fáctica e extinção do contrato de mediação

1.REVOGAÇÃO PELOS INTERESSADOS. Se o mediador exequiu, completamente, a sua prestação, a


revogação por parte de algum interessado, ou de alguns interessados ou de todos, entra no mundo jurídico e
pode ser fraudulenta. Se se permitiu a mediação e se consumou, e a vinculação jurídica entre os interessados

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somente não se deu por dolo, há o ato ilícito absoluto, pôsto que possa ainda não haver o ato ilícito relativo. A
permissão é no mundo fáctico, a revogação é no mundo fáctico; mas não só entre pessoas vinculadas se exige
que não se cause dano. Observe-se, porém, que não basta ter o mediador exercido a atividade, porque o
interessado ou os interessados não estão adstritos a concluir o contrato com o outro ou entre si.
A propósito, cumpre advertir-se que utilizar a obra do mediador, apesar de se haver manifestado, sem exceção,
contra a mediação, não basta para que se tenha o interessado como vinculado. Aproveitar-se não é consentir.

2.REVOGAÇÃO PELO MEDIADOR. A revogação pelo mediador não é no mundo jurídico, porque a sua voz
ainda nêle não entrara. A revogação pelo interessado também não no é. O interessado ainda não se vinculou a
contratar, ou a qualquer negociação. Tem liberdade de concluir, ou não, o negócio jurídico. Antes disso,
qualquer vinculação jurídica há de decorrer de pacto, que se insere no contrato de mediação se êsse se conclui,
de modo que, sem isso, o mediador corre a álea.
A revogação da mediação é receptícia. Passa-se no mundo fáctico, quer parta do mediador, quer de qualquer
interessado.. Há a pariteticidade das situações.

3. PAGAMENTO E DISTRATO. :0 contrato de mediação extingue-se se, concluído o negócio jurídico, se paga
a remuneração.
Também se extingue pelo distrato.

4.MORTE DOS FIGURANTES DO NEGÓCIO JURÍDICO. A morte do figurante ou dos figurantes do


negócio jurídico não extingue o contrato de mediação. Dá-se a hereditariedade.

5. MORTE DO MEDIADOR. Se morre o mediador, tem-se cie inungar qual a sua atividade em contacto com
os interessacos: se morre o mediador que tem sucessores na atividade, há a sucessão. Bem assim, se foi prevista
expressamente, ou tàcitamente, ou pelo silêncio, a substituição.

6. RESCISÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO OBTIDO. A rescisão só atinge o contrato de mediação se o


mediador lhe conhecia a causa (e. g., em caso de vícios redibitórios, Código Civil, art. 1.101-1.104). Se o
figurante prefere o abatimento do preço (Código Civil, art. 1.105), o mediador, que conhecia a causa da
rescisão, fica exposto à mesma redução .

7.CONDIÇÃO INSERTA NO NEGÓCIO JURÍDICO OBTIDO. Se o negócio jurídico foi concebido sob
condição suspensiva, sem que se houvesse previsto ou querido, ao iniciar-se a mediação, que assim fôsse, só se
deve a remuneração quando a condição suspensiva se imple. Aliter, se foi prevista a condicionalidade
suspensiva, ou se foi isso o que desde o comêço da mediação se quis.
Se há condição resolutiva, ou resilitiva, essa não atinge o contrato de mediação, que já fôra concluído.
A resolução ou a resilição por inadimplemento é sem qual-. quer relevância para o mediador. Não é garante.

8.CONCURSO DE CREDORES. A ineficácia relativa e a revogação falencial não são tratadas como as
nulidades. O mediador não perde o direito à remuneração, pois que o negócio Jurídico é eficaz entre os
figurantes (Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945, arts. 52 e 53) - Assim, a ação de ineficácia relativa
(Tomo XXVIII, §§ 3.357-3.361) e a ação revocatória falencial (§ &362-31370) não atingem o contrato de
mediação.

Titulo XXXIV

COMISSÃO

CONCEITO E NATUREZA DO CONTRATO DE COMISSÃO

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§ 4.722. Conceito do contrato de comissão

1. CONCEITO. Contrato de comissão é aquêle em que o outorgado do poder ou dos poderes não tem o dever
de manifestar ou declarar o nome do outorgante (Código Comercial, art. 165: “A comissão mercantil é o
contrato do mandato relativo a negócios mercantis quando, pelo menos, o comissário é comerciante, sem que
nesta gestão seja necessário declarar ou mencionar o nome do comitente”, texto em que “mandato” está em
lugar de “outorga de poder”). Se os pressupostos se compõem, mas o comissionário melhor têrmo não é
comerciante, a comissão é comissão civil.
Ao comissionário comerciante pode ser decretada a abertura da falência, quer se haja matriculado quer não,
nem o impede a importância das suas operações.
A comissão não é espécie de mandato, pôsto que se tenha desenvolvido, histôricamente, do mandato. Há, nela,
outorga de poder, porém não de representação, nem o agir em nome do comitente. Se, nas relações entre
comitente e comissionário, incidem princípios que são comuns ao mandato e à comissão, é porque são
princípios comuns à outorga de poder. (O art. 190 do Código Comercial, onde se diz “As disposições do Título
IV
Do mandato mercantil são aplicáveis à comissão mercantil”, há de ser entendido com a explicitação: “no que
não distoem da natureza da comissão mercantil”.)”
“Commissionaire”, diz-se em francês; “commissionario”, em italiano; ‘¶Kommissionar”, em alemão. O
emprêgo da palavra “comissário”, em português, para exprimir o que exerce com~ssaríado e para o que é
figurante de contrato de comissão tem os inconvenientes que logo ressaltam. Nas Ordenacões Afonsinas, Livro
II, Título 128, § 7, “comissária” está corno adjetivo que corresponde ao da função do comissário (oficial ou
funcionário público) : “lhes algum conhecimento per via ordenaria, deleguada, ou comíssaria pertencer, ou per
qualquer guisa que seja, sem exceptando delio nenhuum nosso Official”. Para melhor terminologia jurídica,
devemos chamar “comissário” ao comissário preposto, auxiliar da polícia ou de bordo, pelo fato de a êle se
cometer, committere; e empregar “comis sionário”, “comissionar”, no que se prende ao contrato de comissao.
O comissionário contrata cm nome próprio: insere-se no suporte fáctico, manifestando a vontade e faz-se inserir
como figurante no próprio negócio jurídico. Daí o art. 166 do Código Comercial, que se refere ao plano da
eficácia; portanto, a depois da entrada do negócio no mundo jurídico, com as figuras do comissionário e do
outro contraente: “O comissário, contratando em seu próprio nome, ou no da firma ou razão social, fica
diretamente obrigado às pessoas com quem contratar, sem que estas tenham ação contra o comitente, nem êste
contra elas; salvo se o comissário fizer cessão dos seus direitos a favor de uma das partes”. A situação não é a
mesma que ocorre segundo o art. 1.807 do Código Civil, quando o mandatário, mesmo investido de poder de
representação, oculta o nome do representado, e se faz inserir como figurante do negócio jurídico. .0 que é
normal, para o comissionário, é anormal para o mandatário, que falta a deveres contratuais e é, às vêzes, comete
ato ilícito absoluto (Código Civil, art. 159) : faz-se comissionário sem no ser.
Se o comissionário manifesta ou declara o nome do comitente inserindo o nome do outorgante como figurante
do negócio jurídico, transforma em poder de representação o poder, que tinha, de operar. Se manifesta o nome
ou o declara, porém sem o inserir como figurante do negócio jurídico, não se afasta da categoria da comissão:
opera como simples comissionário, se bem que, fora do negócio jurídico, tivesse feito ao contraente tal
comunicação de conhecimento.

Definir-se a comissão como mandato deturpa-lhe a natureza. O comissionário opera por conta do comitente,
mas em nome próprio. Recebeu outorga de poder, porém nem tôda outorga de poder é mandato.
Resta saber-se como é que entra no mundo jurídico o negócio jurídico em que o comissionário se atribuiu poder
de representação e quais as consequências entre o comitente e o comíssionário. Houve, evidentemente, excesso
no exercício do poder. O negócio jurídico é como todos aquêles em que houve representação sem poder de
representação: o comitente ratifica-o, ou não o ratifica; em qualquer caso, pode exigir do comissionário perdas e
danos pelo não-cumprimento das suas ordens e instruções. Se o comissíonarlo, manifestando ou declarando o
nome do comitente, não fêz inserir o nome dêsse como figurante do negócio jurídico, o negócio jurídico é só
entre o comissionário e o terceiro, pôsto que, pela inobservância do sigilo, possa ter de prest2r perdas e danos o
comissionário (sem razão, 41. X. CARVALHO DE MENDONÇA, Tratado de Direito Comercial, VI, Livro IV,
Parte II, 329, que não atendeu à diferença entre quebra de sigilo e inserção do nome do comitente como
figurante).

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Se o comissionário contrata em nome do contitente, obriga-se pela culpa in contrahendo, e não obriga o
comitente, salvo ratificação: o comissiorário fica vinculado, se promete ratificação, ou se se responsabilizou
pessoalmente pelo contrato. O comitente não deu poder de representação; portanto, o comissionário representou
sem poder de representação (PONCIANO FERREIRA DE OLIVEIRA, Do Mandato e da Comissão mercantil,
122).
O que mais importa frisar-se é que a comissão se caracterza uor serem os atos do comtsslonário em seu nome,
êle é que figura no contrato, êle é que oferta ou aceita, êle é que promete ou recebe a promessa, êle é que dispõe
ou é beneficiado pelo ato de disposição praticado pelo terceiro. É na figura jurídica eo negócio jurídico que se
há de procurar o comissionário. Não fica dc fora, como mediador, nem fica em vez de outrem, como o
representante. É figurante. Tão-pouco se confunde com o corretor.
Na jurisprudência francesa, atribui-se a qualidade de comissionário, por vêzes, a quem opera em nome e por
contato do comitente, mas isso deturparia o instituto, reduzi-lo-ia ao negócio jurídico de mandato.
O negócio jurídico que o comissionário conclui é em nome próprio. Não precisa, sequer, mencionar o nome do
comitente. Não por conta própria, razão por que há a aquisição pelo comi-tente comprador- (cf. Supremo
Tribunal Federal, 28 de outubro de 1941, J. do 8. T. F., VII, 31). Se a comissão era de venda, o acôrdo de
transmissão da propriedade e da posse, em que figurou o comissionário, é eficaz para a transmissão ao terceiro,
e qualquer relação jurídica entre o terceiro e o comitente supõe pacto adjecto ou outro negócio jurídico (e. g.,
pacto para que o pagamento seja mediante aceite de duplicatas mercantis que o comitente subscrevera e emitira
contra o comissionário). Uma vez que há o contrato de comissão, as duplicatas mercantis subscritas pelo
comitente contra o terceiro seriam causadoras de confusão e como que borrariam o negócio jurídico de
comissão, razão por que se há de ter todo o cuidado na leitura do acórdão das Câmaras ReUnidas do Tribunal
de Justiça do Paraná, a 11 de outubro de 1935, 1?. de 13. C., VI, 174). No caso de pacto ou cláusula del
credere, se houve anuência em emissão de duplicatas, o mais regular é o aceite pelo comissionário. Se isso não
ocorreu, há a responsabilidade solidária, conforme o art. 179 do Código Comercial (Tribunal de Justiça de São
Paulo, 21 de dezembro de 1954, 1?. dos 77., 234, 221).
A aquisição, na comissão para compra ou outro negócio jurídico, é pelo comitente, e não pelo comissionário,
mesmo se o terceiro ignora o nome daquele (Supremo Tribunal Federal, 23 de outubro de 1941, 1?. de 12, 140,
117; 8.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 24 de agôsto de 1948, A. 1., 89, 866).
Devido a ter contratado em nome próprio, o comissionário é que é responsável pelos impostos e taxas (4.~
Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 18 de setembro de 1941, 1?. dos 77., 137, 525), salvo o de
transmissão da propriedade imobiliária, ou de cOnstituição de direito real, que se prende a adimplemento do
acOrdo de transmissão ou do acOrdo de constituição.
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Para o emprêgo e a frequência da comissão, em vez de outros contratos, concorreu (e ainda hoje, a despeito do
encurtamento temporal das distâncias, concorre) a ausência de confiança em compradores e vendedores de
terras longínquas. Daí as emprêsas de comissões que se encarregam de negócios jurídicos em que pessoas de
terras estranhas seriam os figurantes. Às vêzes não indicam, sequer, a origem ou o destino dos bens. Por outro
lado, a facilitação dos transportes não chega a ponto de tornar em contacto, menos ainda conhecidos, os
interessados em alienar e os interessados em adquirir.
Antes mesmo da penetração nas leis e nos códigos, a comissão era corrente na prática dos comerciantes.
A evolução do instituto da comissão fêz-se espacialmente:
primeiro, entre habitantes da mesma região; depois, do mesmo país; finalmente, entre interessados de negociar,
que habitam dois Estados. Com a proliferação dos agentes e dos representantes das emprêsas produtoras,
pensou-se no eclipse do contrato de comissão. Mas isso não aconteceu. O objeto mesmo do contrato de
comissão dilatou-a. O transporte, por exemplo> passou a ser objeto da atividade do comissionário.
Com o contrato de comissão, o produtor ou o comerciante pode tratar dos seus negócios longe do lugar em que
tem a emprêsa, com pessoas que não conhece, nem das quais tem, sequer, informações. O emprêgo do
representante ou do agente custaria mais caro, porque teria de ser remunerado mesmo se não concluísse os
negócios.
Além disso, o comissionário pode encontrar freguêses que a emprêsa não encontraria. Não raro, o
comissionário adianta quantias ao comitente, ou toma parte, com êle, em operações bancárias ou de crédito.
O privilégio especial que tem o comissionário e o direito de retenção que se lhe atribui mostram bem que não
se pode confundir o comissionário com o mandatário. O art. 95 (modificado pela Lei francesa de 23 de maio de
1863) do Código Comercial francês teve grande significação como revelador da natureza do contrato de

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comissão. 0. Código Comercial brasileiro (1850), art. 189, não lhe ficou atrás. Cf. Decreto-lei n. 7.661, de 21 de
junho de 1945, ad. 102, § 29, 1 e III, j~a parte.
3.FIGURANTES DE CONTRATO. No direito comercial brasileiro, tem-se discutido se o comissionário pode
contratar consigo mesmo (pela afirmativa, DESCARTES MAGALHÃES, Curso de Direito comercial, II, 247;
pela negativa: CLóvís BEVILÁQUA, Comissão mercantil, 1?. E, 44, 548; M. DE CARVALHO fORCES.
Comissão mercantil, 44, 551; J. X. CARVALHO DE MENDONÇA, Tratado de Direito Comercial, VI, Livro
IV, Parte II, 321, em evidente contradição) 1 A argumentação a fortiori, invocando-se o art. 1.133, II, do Código
Civil, generaliza a regra jurídica so referente à compra-e-venda, e deixa de discutir o problema da
admissibilidade como princípio a priori. Se consideramos
o Código Civil, o art. 1.133, li, não é suscetível de incidência analógica, porque o mandato pode conter poder
de representação, o que falta à comissão; o comissionário não representa. O negócio do comissionário consigo
mesmo não seria negócio do representante consigo mesmo.
A tradição é no sentido da permissão da contrapartida, isto é, em sentido especial da palavra, o lançamento do
negócio jurídico consigo mesmo (3. SAVARY, Le Par fait Négociant, II, 240). A doutrina de hoje tenta rompê-
la, mas o problema somente pode ser resolvido contra o negócio jurídico consigo mesmo, se há texto de lei
proibitiva. Não há razão para se reputar, a priori, nulo, ou ineficaz. Se é certo, como é, que o comissionário
pode ter interesse oposto ao do comitente, êsse interesse pode existir, também, se êle conclui com outrem o
negócio jurídico. Diz-se que o comitente quis contrato de comissão , e não, por exemplo, contrato de compra-e-
venda; mas o comissionário, que contrata com outrem, e. g., em caso de venda, também vende. Tão-pouco se
pode admitir que haja dolo. Se dolo existiu, outro é o problema: tanto poderia ocorrer no contrato com outrem
como no contrato consigo mesmo.
Se, devido a ser em contrapartida o negócio jurídico, houve danos ao comitente, há a ação de adimplemento
ruim, uma vez que seja de interpretar-se que não se permitiu o contrato consigo mesmo.
Feito o contrato consigo mesmo, o que houve foi exercício da atitude do comissionário em contrato em que êle
é o comissionario e é o outro figurante. A afirmativa de ter deixado de haver a atividade do comissionário é de
repelir-se. O contrato, que o comissionário havia de concluir com outrem, concluiu consigo mesmo, e êsse
contrato não mudou. Na doutrina francesa, há juristas que discutem se o contrato, que o comissionário
contrapartista conclui, é contrato de comissão, ou contrato, por exemplo, de compra-e-venda. Isso revela que
não se aprofundou o assunto. O contrato de comissão houve, ex hypoth,esi. Quando o comissionário conclui o
contrato de compra-e-venda com o cliente, nada tem êsse contrato com a comissão: é contrato de compra-e-
venda, como qualquer outro. Se o conclui consigo mesmo, também. (Para o direito alemão, WOLFGANG
I{EFERMEHL, Scklegelberger Handelsge.setzbucn, IV, 3a ed., 2024 5.; PAUL RATz, Kommentar zum
Handelsgesetzbuch, 1/, 2.~ ed., 89 s.)
O negócio jurídico consigo mesmo, por parte do comissionário, é espécie de adimplemento do contrato de
comissão. Para que seja adimplemento sem ruindade, é preciso que se conclua o negócio jurídico com os
pressupostos que lhe seriam exigidos se concluído com outrem (e. g., lugar, tempo, preço) e não ter sido
proYbido pelo comitente a entrada própria, a Seibsteintriti, do comissionário, o contrato consigo mesmo por
parte do comissionário. Se o comitente não o vedara, o adimplemento satisfaz. Se não o vedara ao concluir o
contrato de comissão, pode fazê-lo depois (SCHMIDT-RIMPLER, em V. EHRENBERG, Handbuch des
gesumnttcn Handclsreckts, V, 1, 997; WOLFGANG JIEPERMEHL, Schlegelberger Handelsgesetzbuch, IV, 2.~
ed., 2030 s.; PAUL RATZ, Kornmentar zum Handelsgesetzbuch, V, 2a ed, 94; sem
razão, H. LEHMANN, em A. DÍYRINGER-M. HACHENBURG, Das Handelsgesetzbuch, V, 2, g•a ed., nota
15 ao § 400>. Se, além do contrato de comissão para comprar, há outorga de poder de representação para a
compra, essa não exclui aquêle. O pacto dei eredere também não pré-exclui o contrato consigo mesmo.
Não importa se o negócio jurídico é a prazo, ou condicional (PAUL RATZ, Kommentar zum
Handetsgesetzbuch, V,2a ed., 95). Não é mais possível a entrada própria se o comissionário a afastara, ou se
expirou o prazo para a conclusão.
O comissionário tem de comunicar imediatamente que concluiu consigo mesmo o negócio jurídico.
De regra, o comissionário não revela o nome do comitente, vendedor ou comprador. Daí ter-se invocado contra
êle que haveria a presença da mesma pessoa, a ocultação da inserção de si mesmo, e ser difícil descobrir-se a
fraude nas especulações. A respeito das operações de bôlsa cresce de ponto a hostilidade aos negócios jurídicos
do comissionário consigo mesmo, acrescentando-se que, em tal mercado, os boatos e as informações
tendenciosas podem influir nos cursos. Opiniões menos extre madas admitem que o comissionário se possa
inserir como vendedor, ou como comprador, ficando responsável pelo ato ilícito absoluto (Código Civil, art.

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159), ou o que seria solução intermédia consideram que se pode alegar e provar o dolo, anulando-se o
contrato. As três atitudes são inconfundíveis.
O contrato consigo mesmo, a auto-entrada, Selbsteintritt, por vêzes ocorre quando o comissionário tem de
adquirir para um comitente determinado bem ou determinados bens, ou gênero de bem, e outro comitente quer
alienar o bem, ou os bens, ou gênero de bem, de que se trata. Então, o comissionário conclui os dois negócios
num só, em que êle é alienante, por parte de um, e adquirente por parte do outro. Com isso, o comissionário não
deixa de o ser, êle o é, duas vêzes, porque a auto-entrada é apenas um dos modos de se adimplir o contrato de
comissão. ‘Os direitos e deveres sk os mesmos. Há o privilégio especial e o direito de retenção. Tem o
comissionário direito às duas remunerações. Os preços hão de ser os correntes, s~ nao foram preestabelecidos,
sem se afastar que o alienante possa obter preço maior se o adquirente fixara aquêle pelo qual Só havia de
adquirir. Em todo o caso, o comissionário tem o dever de comunicar a auto-entrada.
O comissionário pratica os atos em nome próprio, mas por conta do comitente. Se, em vez disso, êle, que assim
deveria proceder, opera em nome do comitente, afastou-se do contrato, tal como a lei o define e tal como foi
concluído. ~, Faz-se, então, mandatário, e não comissionário? A resposta mais remota fôra nesse sentido (e. g.,
LOCRE, Ksprit du Code de Commerce, 1, 236). E continuou em muitos juristas. Contra ela se diz que o
mandatário pode ter autorização para obrar em próprio nome. Os que exigem a comercialidade, em nada servem
à discussão porque há o mandato mercantil. Bem assim, os que vêem a diferença somente no objeto dos
negócios jurídicos.
4.MANDATO PARA ATOS EM NOME PRÓPRIO E COMISSÃO.
O comissionário pode não ser comerciante, como pode não ser comerciante o comitente; por exemplo:
comissão para aquisição de gado, por conta de matadouros, ou alienação de gado, por conta de criadores;
comissão para aquisição ou alienação de obras de arte, ou de peças antigas. O que se exige, no art. 165 do
Código Comercial, apenas funciona como pressuposto da comercialidade da comissão.
Se a compra-e-venda é em nome do intermediário, e por conta do outorgante, mas os resultados, favoráveis ou
desfavoráveis, passam ao outorgante, não há contrato de comissão. Se não houve outorga, há gestão de
negócios alheios sem outorga.
Se o contrato é para compra ou para venda, ficando ao outorgado direito à diferença do preço para menos ou
para mais, não há comissão, e o negócio não é por conta do outorgante (ERwIN RIEZLER, Geschãfte des
Buch- und Kunsthandels, V. ETIRENUERO, Handbuch des gesammten Handelsrechts, V, 2, 97 s.). O terceiro
não precisa indagar qual o papel do vendedor ou do comprador, isto é, se há, ou não, contrato de comissão.

§ 4.723. Natureza e estrutura da comissão

1.SUPORTE FÁCTICO DO NEGÓCIO JURÍDICO. O comissionário insere-se no suporte fáctico e no negócio


jurídico como figurante, à diferença do representante, que se insere no suporte fâctico e não no negócio jurídico
para o qual foi investido de poder. Ç indiferente se revela, ou não, o nome do comitente, uma vez que não lho
insira no negócio jurídico. Tal revelação fica no mundo fáctico.
Se o comissionário é comerciante e comercial o negócio jurídico que se deseja, mercantil é a comissão. Se falta
um dêsses elementos, é civil.
À comissão de compra-e-venda de mercadorias dá-se, de ordinário, o nome de consignação. Consignação para
compra-e--venda, em que o comitente se diz consignante e o comissionário consignatário. A consignação é
contrato (negócio jurídico bilateral), consensual, causal; e distingue-se do poder conferido que é abstrato.
No contrato de comissão, há oferta e aceitação por um ou outro dos figurantes, e regem-se pelos princípios
comuns a oferta e a aceitacão. Presume-se a aceitação, se se trata de comissionário profissional. O principio de
execução prova a aceitacão. A aceitação pode ser tácita. Se mercantil, só se prova por testemunhas se o valor é
até quatrocentos cruzeiros (Reg. n. ‘737, de 25 de novembro de 1850, art. 182, § 1.0) se civil, até dez mil
cruzeiros (Código Civil, art. 141).
A capacidade é a comum; se o menor ou a mulher casada sao comerciantes, não precisam de assentimento do
pai, tutor, ou marido.
Pode-se fazer por escritura pública, ou particular, inclusive 4≥m correspondência epistolar ou telefônica. (O
nome de proatração que às vêzes lhe dão é impróprio, porque procura é poder de representação, e não qualquer
outorga de poder.)
O comissionário não é obrigado a aceitar a oferta de comissão, mas há de diligenciar, com tempo, para que o
oferente não sofra prejuízo, guardando em lugar seguro as mercadorias ou bens expedidos pelo comitente, por

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conta do comi-tente. Todavia, podem as circunstâncias ter criado para o comissionário dever de aceitar, como se
sempre aceitou em idênticas circunstâncias e não houve mudança da relação entre os interessados. A infração
do dever de aceitar pode dar ensejo à indenização por culpa in contra lendo.

2. COMISSÃO E MANDATO. No Código Civil italiano, art. 1.731, reduziu-se o contrato de comissão a
mandato, que tem por objeto a aquisição ou venda “aquisição ou alienação”?) por conta do comitente e em
nome do comissionário. Seria, portanto, subtipo qualificado de mandato. Todo mandato para exeqúir em nome
próprio seria comissão, e vice-versa, uma vez que se trate de compra ou de venda. É fácil imaginar-se quantas
confusões podem resultar de tais im”recisões conceptuais. Os negócios jurídicos, se a história e a sIstemática os
“isolaram”, no sentido da investigação científica, exigem que lhes mostremos o que os diferencia, o que os
separa dos outros que com êles se parecem, e não que nos preocupemos com a eliminação das diferenças, a
ponto de não vermos o passado e o presente.
O que mais çaracteriza o contrato de comissão é que o comíssionário opera em seu próprio nome, por conta do
comi-tente, com as conseqúências da figuração na relação jurídica.
Se o mandante permitiu ao mandatário que operasse em seu próprio nome, a figura somente permanece a do
mandato se o mandante obstou a que os efeitos entre os dois fôssem os da comissão. Na procuração em causa
própria (negócio jurídico unilateral), a procura é sempre em nome do procurado, e por conta do procurador.
De qualquer modo, não se há de confundir a comissão com o mandato, mesmo o mandato mercantil, como,
ainda recentemente, 41. HAMEL (Êtudcs sar la Commission, prefácio, 8). O mandato exercível no próprio
nome não é comissão. Se o terceiro sabe que o mandatário agiu em nome próprio, isto é, sabe que o figurante é
mandatário, e não comitente, a responsabilidade é do mandante, e não do mandatário. O mandatário coe
exerceu em nome próprio o mandato, se isso lhe foi permitido, seguiu instruções do mandante, instruções que
chegaram a esse ponto. Quem o fêz, sem lhe ser permitido, operou como gestor de negócios (alheios) sem
outorga.

Quem trata com os comissionários de ordinário sabe que o futuro figurante do negócio jurídico não é o
doqninus negotil, mas tem poder de dispor. Se não o sabe, não importa: o futuro figurante recebeu poderes para
figurar.

A despeito da referência do Código Comercial, art. 165, a ser “pelo menos” comerciante o comissionârio , há
comissão mercantil e comissão não mercantil. O que o ad. 165 teve por fito foi definir a mercantilidade da
comissão, isto é, dizer quando ela é mercantil. Proibir-se a comissão não mercantil fôra atitude violenta dos
legisladores, que iria pôr-se em choque com a prática. Cf. Código Comercial alemão, § 406.
Se o comissionârio opera em nome do comitente, não se faz mandatário. Para o comitente, responde pelo que
fêz, como comissionário, que é; e para os terceiros, como gestor de negócios alheios sem outorga de poder de
representação, com o plus, que assaz lhes interessa, de ser em verdade comissionario. (O tratamento indiferente
do exercício da comissão em nome próprio, ou no do comitente, o que ocorre no direito anglo-saxão, não é para
se censurar em todos os casos: se o terceiro conhece a verdade, no negócio jurídico o comissionário operou em
nome do comitente, mas vinculou-se.)
O ato isolado da comissão entra no mundo jurídico mesmo se o comissionário não é comerciante, nem é
comissionário por profissão .
Ao comissionário pode ser outorgado mandato. O comissionário pode ser mediador. Os serviços não se
confundem.
Se o comissionário faz habitual a atividade de comissão> torna-se comerciante.

3.CONTRATO CONSENSUAL. O contrato de comissão é contrato consensual. Os bens que hão de ser
entregues ao comissionario podem ser entregues após a conclusão do contrato. Se o comitente não os remete,
deve a remuneração e quaisquer reembolsos.
Alguns sistemas jurídicos limitam aos contratos de compra-e-venda a função da comissão. Mesmo no plano do
direito comercial, não são êsses contratos os únicos em que se pode exercer a atividade comissionária, de jeito
que é assaz larga essa emprêsa auxiliar. De fora, o comissionário é visto como figurante, é êle quem manifesta
vontade. Dentro do negócio jurídico de comissão, os efeitos do negócio jurídico que o comissionário conclui
são reservados ao comitente.
Pôsto que, hoje em dia, a comissão não tenha o papel vastíssimo que era o seu nos séculos passados, não se há

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de menosprezar a função que a comissão ainda desempenha, inclusive no comércio de títulos e nas operações
bancárias. Dez por cento das operações francesas de exportação fazem-se por meio de contrato de comissão.
O comissionário tem de ser discreto quanto às operações de que está incumbido. Se o comissionário opera para
bôlsa, a legislação especial é que é invocável. Não há, para o comissionário, dever de sigilo, de que pudesse
resultar sanção penal, e apenas se há de discutir se a divulgação do nome da pessoa, que o encarregou da
comissão, ou do cliente, que vai concluir ou concluiu o contrato, pode dar ensejo à responsabilidade pelos
danos que a divulgação causou. Mas pode haver o dever de sigilo.
Em princípio, o comissionário não deve divulgar o nome do comitente, pois que opera em nome próprio. Mas
pode ocorrer que haja interesse do comitente na publicidade, para que os prováveis contratantes procurem o
comissionário. Por outro lado, pode dar-se que a falta de sigilo prejudique o próprio comissionário, porque
ficam ou podem ficar os seus cliente≤ a par da origem dos bens que êles estavam adquirindo na emprêsa
comissionaria.
Se o comissionário diz qual o nome do comitente, não atinge isso a natureza do contrato de comissão. Aliás, as
marcas de fábrica e outros sinais podem revelar com interesse para o comitente a origem e a procedência do
produto.

5.REVELAÇÃO DO NOME DO COMITENTE E DOS CLIENTES.


Se o comissionário revela o nome do comitente, com isso não deixa de ser comissionário. O negócio jurídico
conclui-se em seu próprio nome, e não no nome do comitente. O terceiro sabe de que é que se trata, nas
relações entre comissionário e comitente, mas isso não o põe em contacto com êsse. Se o preço
a contraprestação que o comissionário recebe é maior do que a exigida pelo comitente, também isso não
deforma a figura urídica. Não importa se no próprio contrato de comissão se previu que o plus seria a favor do
comissionário. Dá-se o mesmo se a atividade do comissionário é para adquirir e êle adquire por menor preço,
que permita ficar com a diferença.
Se foi inserta a cláusula “salvo aprovação da emprêsa”, há oferta de contrato de comissão e não desde logo
comissão por parte do comissionário que submete à aprovação a punctação que tem, ou alguma oferta a respeito
da qual tenha de resolver (aceitar, ou recusar). Há, também, a cláusula “sa!vo mudança de rótulo”.
No tocante ao segrêdo quanto ao comitente, o que se há de levar em consideração é o interesse do
comissionário. Se êsse comunica o nome dos clientes, abre portas para entendimentos entre o comitente e os
clientes, tornando menos relevante a atividade do comissionário.
O comissionário não tem dever de ocultar aos clientes o nome do comitente, mas tem o direito de não revelar
ao comitente o~s nomes dos clientes. Pode renunciar a êsse direito. Em caso de ação entre o comissionário e o
comitente, pode ésse exigir exame de livros, porém o juiz pode atender ao requerimento de ser em segrêdo a
investigação. Por exemplo:
nomeação de perito, que se vincule ao sigilo (JEAN HÉMARO, Les Contrats commerciaux, TraiU théorique et
pratique de Droit Comrnerciai, II, 76).

6.MANDATO SEM REPRESENTAÇÃO, MANDATO ExERCIDO EM NOME PRÓPRIO E COMISSÃO. ~,


Há diferença entre o mandato sem representação ou o mandato exercido em nome próprio e a comissão? O
mandato sem representação é o mandato para atos em que o mandatário não precisa de compor atos jurídicos. O
mandato exercido em nome próprio é o mandato em que apenas se permitiu ao mandatário, ou êsse exerceu em
nome próprio, a seu líbito, o mandato, sem que o mandante o houvesse permitido. Ali, não houve qualquer
afastamento dos termos do mandato e das instruções; aqui, sim. Para essa espécie, há a regra jurídica do art.
1.807 do Código Civil, e a espécie é de algo que se parece, nos resultados, com a comissão, sem que seja
comissão. A comissão supõe outorga de poder para obrar em nome próprio. Na espécie prevista no art. 1.307 do
Código Civil o que ocorre é exatamente a atividade do mandatário sem ter permissão para obrar em nome
próprio.
O art. 164 do Código Comercial remete aos arts. 167, 168, 169, 170, 175, 180, 181, 182, 188, 184, 185, 187 e
188, concernentes à comissão mercantil, para os dizer invocáveis quanto ao mandato (= são aplicáveis ao
mandato).
Do que acima se disse é de concluir-se que tôda redução da comissão, mesmo a ocasional, a mandato sem
representação (e. g., ALuo PoRMiomNI, Commissione (contratto di), Enciclopedia dei Diritio, VII, 863), ou ao
mandato exercido em nome próprio, é atentatória da sistemática jurídica. ‘O mandato sem representação
somente é tal porque não cabe, in casu, representação, ou o mandante a pré-excluiu. O mandato exercido em

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nome próprio não deixa de ser mandato, porque, se tal exercício foi permitido, nem sequer o art. 1.307 do
Código Civil é invocável, e, se o mandante não o permitiu, haveria exercicio abusivo (= sem permissão).
Se a comissão fôsse mandato sem representação, confundir-se-ia com o mandato que o mandatário exerceu no
próprio nome (Código Civil, art. 1.807), com ou sem permissão. Nos dois últimos, ou houve mandato com
permissão de exercício em nome próprio, ou gestão de negócios alheios sem outorga. Ora, na comissão, há
outorga, sem haver mandato. As regras jurídicas dá comissão não podem ser invocadas, de ordinário, a
propósito do mandato em nome próprio.
A comissão faz do comissionário comerciante, se há a habitualidade; mas, pôsto que o Código Comercial, art.
165, preveja que um dos figurantes, pelo menos, seja comerciante, a disciplina é a mesma para a comissão,
atividade de quem habitualmente a assume, e para a comissão isolada ou acidental (cf. Tnm GUHL, Das
Schweizerische Obtigationenreeht, S.~ ed., 815).
O Código Comercial, art. 165, não disse só haver comissão se regida pelo direito comercial. Apenas se referiu a
comissão que é “relativa a negócios mercantis”, em que se exige a mercantilidade do negócio e, pelo menos, ser
comerciante o comissionário. Não pode o sistema jurídico ater-se ao texto para pré-excluir a comissão não
concernente a negócios mercantis. A comissão pode ser comercial ou não ser comercial. O agricultor pode
encarregar outro agricultor de vender as suas canas, ou o seu arroz, ou o seu milho, em nome próprio, embora
por conta do produtor. As regras jurídicas do Código Comercial, arts. 165-190, são invocáveis como regras
jurídicas subsidiárias do direito civil, regras jurídicas, aquelas e essas, já integradas no sistema jurídico. O
criador de cavalos ou de bois pode cometer a outro criador, ou a alguém que possa aceitar a oferta de comissão,
a venda dos cavalos ou dos bois.
O comissionário recebe a outorga, mas tem amplitude de atividade que o mandatário não tem. Não recebe
outorga o mediador: medeia, não conclui. Conclusão é extremidade; o mediador fica no meio.
Podemos pôr em gráficos a procuração, a comissão e a mediação:

PROCURAÇÃO A (C) B

COMISSÃO

A
MEDIAÇÃO

AE

(C)
O procurador e o comissionário podem exercer atos de mediação, porém como integrantes de sua função e sem
que se conclua contrato de mediação. O agente não é procurador nem comissionário. Se representa, há outorga
de poder, à parte ou contrato de agência.
a
§ 4.724. Espécies de comissão
1.DEVER DE CONCLUSÃO E ESPÉCIES DE COMISSÃO.
O comissionário tem, em princípio, o dever de se conformar com os têrmos do contrato de comissão e com as
instruções do comitente.
Há três espécies de comissão: a) a comissão imperativa, me é aquela em que nenhuma iniciativa se atribui ao
comissionário fora dos têrmos explícitos do contrato e das instruções, mas êsses têrmos hão de deixar incólume
a figura da comissão para que não a transformem em agência; b) a comissão indicativa, que vai de mínimo a
máximo de indicações, e supõe que o comitente permitiu interpretar as instruções diante das circunstâncias,
para melhor atender ao interesse do comitente; c) a comissão facultativa, na qual o comitente apenas apontou a
operação e assim deixou ao comissionário campo livre.

2.COMISSÃO IMPERATIVA. O comitente determinou todos os pressupostos essenciais do negócio jurídico


(e. g., preço, modo de pagamento). A imperatividade pode ser excepcional, como se o comitente pré-exclui que
se conclua o negócio jurídico com determinadas pessoas, ou em determinadas zonas (e. g., onde o comitente

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tem agência), ou que prefira certa classe de pessoas ou determinada espécie de adquirentes, ou entre A, B, C e
D.
No tocante ao preço, a fixação pode ter sido para que seja menor do que os preços da praça, ou porque não
convenha ao comitente que se conclua o negócio jurídico por menor preço. Se não há margem para aquela
interpretação ou para essa interpretação, o comissionário tem de ater-se ao preço que lhe foi fixado. Se o
comissionário se afasta do que o comitente estabeleceu, não se pode pensar em gestão de negócios alheios sem
outorga, pôsto que assim se pensasse no passado. Não se trata de ato fora da comissão, mas sim de
adimplemento talvez da comissão. Para o comitente, há a ação de indenizacão pelo adimplemento ruim, que
inadimplemento é. Possível , ao 1”de dúses danos, haja vantagens, que os cubram ou os cubram em parte. Cf.
Código Comercial alemão, § 886; Código suíço das Obrigações, art. 428.
Se o comitente estipulou que o preço seria pago de contado. cumpre verificar se o pagamento a prazo cabe, ou
não, no prazo que se deu ao comissionório para prestar as contas. Se cabe, prejuízo não houve. Se não cabe,
deve o comissionário a diferença, atendidos os juros que resultariam do pagamento à vista. No Código
Comercial alemão, § 394, cogita-se da assunção especial, da Delcredereprovision; se o comissionário não está
autorizado a operar a crédito, responde pelo preço de contado (§ 393). No Código Civil italiano, art. 1.732, 2,a
alínea, permite-se ao comitente exigir o pagamento de contado, ficando ao comissionário as vantagens que
decorrem do negócio jurídico a prazo. No Código Civil suíço das Obrigações, art. 429, os riscos e os perigos
são por conta do comissionario . Para o direito belga, LoUís FREDERICQ (Traité de Droit Commcrcial Reige,
1, 308).
Em se tratando de comissão para aquisição, se o comíssionário, fêz adiantamentos, sem que os houvesse
permitido o comitente, inclusive despesas de expedição, ou de alfândega, os riscos e perigos são por conta do
comissionário (A. WEínMANN, Das Kommissionsgeschãft, 119).
Se o respeito estrito do que lhe deu de instruções o comitente seria prejudicial a êsse, como se o comitente
precisa vender, urgentemente, e não aparecem outros compradores, ou não os há que aceitem as cláusulas que
satisfariam, rigorosamente, as instruções do comitente, não há gestão de negócios alheios sem outorga, e é
quaestio facti a de saber-se se o comissionário, que não poderia esperar resposta do comitente a consulta sua,
obrou bem, ou se obrou mal, conforme a apreciação exata das circunstâncias.

8.COMISSÃO INDICATIVA. A Comissão indicativa é mista, no sentido de haver, nos seus têrmos, elementos
de imperatividade e elementos de facultatividade. O comissionário tem margem para interpretação, apreciando
os interesses do comitente, e onde há imperatividade essa é menos forte, menos resistente. do que na comissão
imperativa. O comissionário tem de operar com prudência, devendo comunicar ao comitente o que tenciona
concluir e pedindo novas instruções, se há tempo.

4.COMISSÃO FACULTATIVA. Na comissão facultativa, o comitente diz o que essencialmente lhe interessa,
e talvez pouco ou nada exprima que restrinja a outorga de poder de dispor. Por exemplo: “Quero vender as
terras de Miguel Pereira”, “Quero comprar o automóvel marca M, de 1968”.
O comissionário tem de obrar como o comitente sabe que êle exerce a atividade de comissionário, ou como
comerciante ou comissionário cuidadoso. Responde o comissionário pelos danos que por culpa sua hajam
ocorrido. Não deve afastar-se dos usos da praça, porque tais usos são manifestações habituais de vontade e se
hão de considerar insertas no contrato de comissão. O preço há de ser o corrente, ou o que êle, com a sua
aptidão profissional, ou pessoal, teria oportunidade de obter. há sempre o dever de comunicação, se há tempo,
quando alguma cláusula do negócio que êle quer concluir não lhe parece fora de qualquer dúvida.
Se é de esperar-se alta do preço da mercadoria (= há grande probabilidade de alta do preço), não deve o
comissionário vender as mercadorias. Se o faz, tem de ressarcir os prejuízos causados ao comitente (Câmaras
Civis ReUnidas do Tribunal de Apelação de São Paulo, 8 de maio de 1944, 1?. dos T., 150, 150).

5. Usos DA PRAÇA. Se há usos da praça sobre prazos para os compradores, ou outros adquirentes, tem-se o
comissionário como outorgado de poder para os estipular ou aceitar, salvo se há cláusula que pré-elida a
invocabilidade dos usos, que sao, ai, usos no sentido do art. 259 do Código de Processo Civil. (O art. 176 do
Código Comercial emprega a expressão “presume-se”.)
Tem de fazer a comunicação ao comitente quanto aos prazos, quer êsses constem do contrato de comissão, quer
sejam de acôrdo com os usos. Se não a faz, é de considerar-se que o negócio jurídico foi a dinheiro de contado.
O art. 177 do Código Comercial fala de “presume-se” e pré-exclui a prova em contrário pelo comissionário.

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Está-se, então, diante de regra jurídica cogente. A comunicação sem os requisitos do art. 177, 1•a parte, equivale
à falta de comunicação. Assim, tem de dizer o nome e o domicílio do terceiro, ou dos terceiros, e os prazos em
que hão de ser feitos os pagamentos. A 5~a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, a 5 de
maio de 1955 (E. J., 17, 224), acertadamente decidiu que, se faltou a comunicação, ou se foi feita sem algum
dos requisitos, não aproveita ao comissionário a alegação de que, concluídos os seus negócios jurídicos com o
comitente, percorreu êsse os devedores e constituiu advogado para cobrar o que êles devessem.
OTribunal de Justiça de São Paulo, a 15 de agôsto de 1947 (R. de D. M., 1, 825), depois de declarar que o
contrato era de comissão, invocou usos da praça para que o financiador vende~se as mercadorias, sem prévia
consulta do comitente (idem, 3•a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 14 de março de 1943, E.
dos T., 157, 167). Ora, se não houve interpelacão, nem consulta, mas há uso da praça, tal venda é lícita, e os
usos da praça de Santos, quanto a cafés, se até aí, nao são ilegais . Cp. Tribunal de Justiça de S?~o Paulo, 1.0
de fevereiro de 1916 (E. dos T., 17, 29), acórdão em que ainda não se havia concluído, em verdade, o contrato
de comissão, e o destinatário da remessa pôs o remetente na situação de permitir a venda dos cafés, ou retirá-
los, pagando o que lhe fôra adiantado (certo, o voto, vencido nos embargos, do Desembargador URBANO
MAR-CONDES). Quem está de posse de bens alheios, sem ser depositário, não é obrigado a guardá-los,
indefinidamente. Se houve prazo e êle expirou, houve manifestação de vontade pelo silêncio (Tribunal de
Justiça de São Paulo, 18 de junho de 1916, R. dos T., 18, 281). O comissionário vendedor não pode, sem
cláusula contratual, ou pacto, empenhar conhecimentos das mercadorias que vai vender, porque seria dispor por
sua própria conta (cf. 5~a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 11 de maio de 1982, E. dos T., 85,
185). O pacto dc financiamento, segundo os usos da praça de Santos, no tocante ao café, contém dispensa da
consulta ao comitente para a venda e o reembôlso. Mas advirta-se que todo contrato de comissão contém
outorga de poder de dispor, ou de adquirir, e, no caso de não haver usos como os de Santos e mesmo que não
haja pacto de financiamento, o comissionário está investido do poder de dispor ou de adquirir. Assim, crendo
ser elemento especial o uso da praça de Santos, a 6•a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 15 de
agôsto de 1947 (E. dos 7., 169, 707). Não se confunda a comissão com o mandato.
7.CONTRATO DE COMISSÃO E CONTRATO ESTIMATÓRIO. Ereqúcutemente surgem confusões entre o
contrato de comissão e o contrato estimatório. As parecenças são muitas, porém quase tôdas na aparência
exterior.
No contrato estimatório, há outorga do poder de disposição, o outorgado há de prestar o preço conforme o que
se acordou, o adquirente é independente de qualquer relação jurídica com
o proprietário ou outorgante. Se o outorgado vende por preço maior do que aquêle que se fixara, a diferença é
sua. Se vende por menos, perde. Não há dever de comunicações para eventuais instruções novas. Ou volve a
mercadoria, ou paga o preço. Na verdade, a figura é entre o contrato de compra-e-venda e o de contrato de
comissão. Sobre o contrato estimatório, Tomo XXXIX, §§ 4.845-4.351.

8.CONTRATO DE COMISSÃO E CONTRATO DE OPÇÃO. O comissionário não opta, o comissionário


adimple ou não adimple os seus deveres. O negócio jurídico cumpre-se com o exercício da comissão; e não há
direito formativo à conclusão.
Também não se confunde o contrato de comissão com os negócios jurídicos pré-fixados, pelos quais alguém se
vincula a vender ou comprar pelo mesmo preço, em dias determinados, ou dentro de prazo.
6.CLÁUSULA “LIvLIE APÓS PRAZO”. ~ frequente estipular-se, no contrato de comissão, que o
comissionário, que teria de alienar com observância de determinado preço e outras cláusulas, após prazo
marcado, pode alienar pela maneira mais favorável, a fim de não ter de guardar os bens indefinidamente
(Tribunal de Justiça de São Paulo, 29 de maio de 1953, E. dos 7., 222, 168).

PRESSUPOSTOS E EFICÁCIA DO CONTRATO DE COMISSÃO

§ 4.125. Pressupostos do contrato de comissão

1. COMITENTE E COMISSIONÁRIO. Tôdas as pessoas físicas e jurídicas podem ser comitentes ou


comissionários. A capacidade para ser comerciante só se exige se o contrato de comissão é mercantil.
O comitente há de ter feito a oferta, ou de ter manifestado aceitação, se a oferta partiu do comissionário. Ali, o
contrato conclui-se com a aceitação pelo comissionário; aqui, com a aceitação pelo comitente. Se o comitente
tem feito negócios jurídicos com o comissionário, que foram sempre, ou de regra, contratos de comissão, a

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remessa de bens ao comissionário é de considerar-se para atos em comissão, salvo manifestação de vontade
expressa em contrário. Se a pessoa, que deseja concluir, como comitente, contrato de comissão, faz a oferta,
com os dados indispensáveis, rege o art. 1.084, lA parte, do Código Civil, ou o art. 1.298 (se o comissionário é
profissional (JEAN HÉMARD, Les Contrats commerciaux, Traité théorique et pratique de Droit Commercial,
II, 64; sem restrição, LOUIS FREDERICQ, Traité de Droit Commercial Belge, T, n. 168), e o comêço de
adimplemento pelo comissionário.
O comerciante, que não costuma fazer contratos de comissão, não fica exposto à invocação do art. 1.084, lA
parte, do Código Civil.
O oferente pode ter dispensado a aceitação expressa e aguardar que chegue, ou não, a aceitação, ou expire o
prazo, Observado o art. 1.084, 2.~ parte, ou o art. 1.086, II, do Código Civil.
O prazo para a resposta há de ser razoável, para o futuro esmissicrarto, a fim de que se lhe dê tempo para
decidir ou para remeter, e para o futuro comitente, pois pode precisar de oferecer a outro comissionário o
contrato de comissão.
O contrato de comissão é, de ordinário, entre ausentes, de jeito que só as circunstâncias podem mostrar quando
se concluiu o contrato de comissão.

2.CAPACIDADE PARA SER COMISSIONÁRIO. Quem pode ser comerciante pode ser comissionário. Como
a comissão pode não ser ato de comércio, levanta-se a questão de se saber se o art. 155 do Código Civil é
invocável, se falta o assentimento do titular do pátrio poder, do tutor do menor, entre dezesseis e vinte e um
anos. A resposta é afirmativa.

3.PROVA DO CONTRATO DE COMISSÃO. As provas são as dos contratos comerciais, se mercantil o


contrato de comissao; a dos contratos civis, se civil o contrato. O ônus da prova do contrato, incumbe a quem
alega a sua conclusão. Se comerciante o comissionário, tem êle o dever de escrituração. A correspondência dos
figurantes é a melhor prova.

§ 4.726. Eficácia quanto ao comissário

1.EFICÁCIA ENTRE CONTRAENTEs E ENTRE ÊLES E O TERGEmO. S preciso não se confundir com a
eficácia do negócio jurídico de comissão, que é entre o comitente e o comissionário, a eficácia do negócio
jurídico entre o comissionário e o terceno. Os deveres e obrigações do comissionário são, nas linhas gerais, os
do mandatário. Não pode substituir-se na execução cia comissao se foi expressarnente autorizado (Código
Comercial, arts. 190 e 146). Mas pode o comissionário servir-se dos 5e113 prepostos. auxiliares, colaboradores
e núncios para execatar o de que se lhe incumbiu, se não há, in casu, substituição do comissionário (isto é, se
não há mandato a outro, ou transmissão da atividade a que se refere o poder). Se o comissionário se faz
substituir, continua obrigado perante o comitente e não faz obrigado perante êsse o substituto (Relação da
Côrte, 17 de dezembro de 1875, O D., 18, 208).
Contudo, pode ser inserta e vale a cláusula de substituição integral, que permita ao comissionário transferiu a
outrem a sua posição jurídica, enquanto não exerce todo o seu poder.

2. CONTRATO DE COMISSÃO E NEGOCIO JURÍDICO CONCLUÍDO PELO COMISSIONÁRIO. Há os


direitos e deveres, pretensões e obrigações, ações e exceções que se irradiam do contrato de comissão, efeitos
entre conútente e comissionârio, e os direitos e deveres, pretensões e obrigações, ações e exceções que
promacam do negócio jurídico que o comissionário concluiu. O comissionário vincula-se perante terceiro ou
terceiros e vincula a si terceiro ou terceiros com que conclui o negócio jurídico objeto da comissão. Já a êsse
tempo está concluído entre êle e o comitente o contrato de comissão.
De ordinário, os terceiros nada têm com o comitente. As relações jurídicas entre o comitente e o comissionário
exsurgem som qualquer atividade dos terceiros e sem repercussão nas relações juridicas entre o comissionário e
os terceiros. O art. 166 do Código Comercial põe claro que o comissionário recebeu poder para se inserir nas
relações jurídicas, pois que o teve para figurar nos negócios juridicos com os terceiros.

8.AçÃo DO COMITENTE CONTRA O TERCEIRO OU OS TERCEIROS. No direito italiano admite-se hoje


ação do comitente contra o terceiro ou os terectros. O art. 1.705, 2•a alínea, do Código Civil italiano estatui: “1
terzi non hanno alcun rapporto col mandante. Tuttavia il mandante, sostituendosi aí mandatario, puõ esercitare i

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diritti di credito derivanti dell’esecuzione dcl mandato, salvo che ciô possa pregiudicare i diritti attribuiti :sl
mandatario daíle disposizioni degli articoli che seguono”. No direito brasileiro, para que haja ação do comi-~
h~nte contra o terceiro, é preciso que o comissionário haja feito cessar> dos 413 ei/os a que a ação
corresponderia: “O comissário, contratando em seu próprio nome, ou no nome de sua firma ou razão social, fica
diretamente obrigado ás pessoas com quem cor tratar sem que estas tenham ação contra o comitente, nem êste
contra elas; salvo se o comissário fizer cessão dos seus direitos a favor de uma das partes”, O comitente não
tem direito a se investir de titular na relação jurídica entre o comissionário e o terceiro ou terceiros. O
comissionário é que pode transferir-lhe a titularidade (de “cessão” fala a lei). Não há, ai, cessão lega? de
direitos (Tomo XXIII, §~ 2.842-2.846), nem direito formativo transíativo, nem pretensão à cessão. Há a
possibilidade da cessão dos direitos, pelo comissionário (cessão voluntária), e a eventual cessão dos direitos
(Tomo XXIII, §§ 2.847-2.851).
(A ação criada pelo Código Civil italiano, art. 1.707, é de natureza discutida na doutrina: efeito de transferência
ex lege dos créditos do comissionário ao comitente; ação direta para tutelar a titularidade económica, que é do
comitente, a despeito da titularidade formal do comissionário; ação inclusa no direito formativo à sub-rogação
pessoal. Respectivamente, FRANCESCO FERRARA junior, Gli Imprenditori e te Societá, g•a ed., n. 56;
GUSTAVO MINERVINI, Ii Mandato, la Commissione, la Spedizione, 106 s.; A. GIoRDÂNo, L’Azione del
mandante verso il terzo deUtore, Studi in onore di A. DE GREGORIO, II, 15 s.)
Resta saber-se se o comitente, se adimpliu todos os seus deveres, pode exercer a ação para que o comissionário
lhe ceda os direitos. A ação é a de condenação, ou a executiva, se satisfeito: os pressupostos. Não se tem, no
direito brasileiro, a ação a cessão judicial, em se tratando de comissão. Se se extinguiu o contrato de comissão,
pela conclusão do negócio jurídico, o comitente é um devedor.

§ 4.727. Deveres e obrigações dos comissionários

1. DEVERES EM GERAL. O comissionário tem dever e éo brigado a executar, em seu próprio nome, o poder,
que lhe conTenu o coniitente. e a observar as instruções, que dêle recebeu ou receba, se bem que por conta do
coniitente. As instruções podem ser alteradas, substituidas ou retiradas pelo comitente, enquanto vão haja
princípio de execução que fôsse prejudicado pela alteraceo, substituição ou retirada. Se há cláusula contrária, o
que ee ordinário se tem por matéria de instruções, foi estabelecido como concernente ao próprio poder. Se, para
atender a mudança quanto às instruções, o comissionário sofre prejuízo, tem de indenizar-lho o comitente. O
poder outorgado é aquêle que consta do negócio jurídico da comissão e fixa-se a sua extensão por interpretação
estrita; e. g., “vender pelo melhor preço, ainda a crédito” é vender pelo preço mais alto que encontre, salvo
se, a crédito, os juros para o maior preço não compensariam as vantagens do menor preço a melhores juros.
“Vender por qualquer preço’ é vender pelo que encontre; “vender pelo melhor preço, ainda que abaixo da
fatura” é vender pelo melhor que encontre, mas, se o não encontrar acima da fatura (fim do primeiro tempo),
por preço abaixo da fatura, que seja o melhor encontrado.
Se o comissionário infringe as instruções do comitente,
o negócio jurídico entre o comissionârio e o terceiro vale e é eficaz; tem o comissionârio de prestar perdas e
danos ao comi-tente. Aliter, se o comissionário excedeu os poderes, inclusive fazendo-se representante em vez
de comissionário. Ainda que se faça preciso o ato para o qual não há poder na comissão (e. g., vender, em vez
de trocar; vender antes da ordem de venda, cf. Tribunal de Justiça de São Paulo, 1.0 de fevereiro e 13 de junho
de 1916, R. dos T., 17, 81, e 18, 288). O exercicio do poder com vantagem para o com~tente e sem ofensa a
interesses gerais não é excesso de poder, porque se supõe que os nrzeis são de mínimo para as alienações e
máximo para as aquisições (e. g., ordem para vender por x e venda por .ordem para comprar por r e compra por
x 1). Se o comitente sofreria dano se o exercício do poder fôsse estrito, não se pode excluir figura do excesso
havido no exercicio de poder: o que se passa e que nasce ao comissionário situação pré-excludente da ilicitude
relativa (infração contratual), e não exceção à sua responsabilidade. Cabe aqui a invocação do estado de
necessidade. Diz o art. 169 do Código Comercial: “O comissário, que se afastar das instruções recebidas, ou, na
execução do mandato (?), não satisfizer ao que é de estilo e uso do comércio, responderá por perdas e danos ao
comitente. Será, porém, justificável o excesso da comissão:
12 quando resultar vantagem ao comitente; 2.0 não admitindo demora a operação cometida, ou podendo
resultar dano da sua expedição, uma vez que o comissário tenha obrado segundo
o costume geralmente praticado no comércio; 82 podendo presumir-se em boa fé que o comissário não teve
intenção de exceder os limites da comissão; 42 nos casos do art. 168”. O art. 168 refere-se à ratificação, o que

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supõe ter havido excesso ilícito. O art. 169, alínea 23, 2.0, fala de “resultar dano de sua expedição”, o que J. X.
CARVALHO DE MENDONÇA (Tratado de Direito Comercial, VI, Livro IV, Parte II, 271, nota 1) pretendeu
corrigir para “resultar dano do retardamento da expedição”; sem razão, porque o dano pode resultar do
retardamento ou de expedição desde já, de acôrdo com as instruções.

2. DEVER DE CONCLUIR O NEGÓCIO JURÍDICO. O comissionário busca os clientes, ou aguarda-os, se


costumam procurá-lo, para tratar da operação conforme a vontade do comi-tente. Tem de praticar todos os atos
que levam à finalidade contratual. Após o negócio jurídico, que se colimava, tem de entregar a contraprestação
ao comitente, que alienou, ou, em geral, dispôs, ou, se o comitente adquiriu, ou exigiu ato de outorga, de
entregar-lhe a prestação.
O comissionário opera independentemente, de modo que, se o comitente mantém preposto no escritório de
comissões e esse é quem, como preposto, resolve e, a fortiori, se é quem tem as próprias chaves do
estabelecimento (2~~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 18 de julho de 1944, E. fl, 108, 91),
não se trata de contrato de comissão. Ai, haveria representação, prepositura, ou mandato, e não comissão (cf.
5•a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 4 de maio de 1951, E. dos 2’., 254, 222).

8. DEVER DE GUARDA. Diz o art. 170 do Código Comercial: “O comissário é responsável pela boa guarda e
conservação dos efeitos de seus comitentes, quer lhe tenham sido ‘consignados, quer os tenha êle comprado ou
os recebesse como sem depósito, ou para os remeter para outro lugar; salvo caso fortuito ou de fôrça maior, ou
se a deterioração provier de vício inerente à natureza da coisa”. O dever de guarda e conservação é dever
durante a permanência dos bens sob a custódia do comissionário.
4.DEVER DE COMUNICAÇÃO. Tem o comissionario o dever de comunicar, no primeiro ensejo que se lhe
apresente, qualquer dano sofrido pelos bens em seu poder e a providenciar para a verificação da origem do
dano (Código Comercial, art. 171, cuja redação é pleonástica: “verificar a verdadeira” “origem de onde proveio
o dano”). A verificação há de ser tão cedo quanto possível. Faz-se por vistoria e arbitramento. ~ indispensável
para que nasça ao comissário o poder de vender os bens abaixo do preço mínimo, após a resposta do comitente,
ou novas instruções, ou, temendo deterioração, se nada respondeu o comi-tente. No art. 172, estatui o Código
Comercial: “Iguais diligências deve praticar o comissário tôdas as vêzes que, ao receber os efeitos consignados,
notar avaria, diminuição, ou estado diverso daquele que constar dos conhecimentos, fatura ou avisos de
remessa; se fôr omisso, o comitente terá ação para exigir dêle que responda pelos efeitos nos têrmos precisos
em que os conhecimentos, cautelas, faturas ou cartas de remessa os designarem, sem que ao comissário possa
admitir-se outra defesa que não seja a prova de ter praticado as diligências sobreditas”.
A prestação de contas e a própria comunicação imediata do resultado são após a conclusão do negócio jurídico
que se teve em vista com a comissão. Antes, há o dever de comunicação, cujo adimplemento permite que o
comitente se ponha ao corrente do que se está passando. O tempo intercalar pode ser longo e ter mudado a
situacão no comércio ou nos negócios. Talvez, nas comissões sucessivas ou por invitações do comissionário, o
comissionário tenha de pôr o comitente a par dos pedidos dos clientes, para que êsse aumente ou suspenda a
produção, ou para que os clientes do comissionário possam satisfazer os pedidos do comitente. Mesmo se a
comissão é imperativa, há momentos em que o comissionário tem de comunicar o que ocorre, para saber se o
comitente consente em que se faça o que o comissionário sugere, ou para que o comitente, sem sugestão do
comissionário, resolva. Se as circunstâncias impõem outra atitude e o comitente as Ignora, ou deve ignorar, tem
o comissionário o dever de comunicacão.

5. OUTROS DEVERES. O dever de cobrar as dividas dos terceiros com quem contratou nasce ao
comissionário com a existência de operações a crédito se não têm de ser consideradas à vista, ou de prazo
menor, para o comitente.
O comissionário tem de cobrar o que os adquirentes devem. Se o não faz, responde por inadimplemento, ou
adimplemento ruim. Portanto, pelas perdas e danos que daí resultem. Não pela ínsolvência dos devedores, pôsto
que pela insolvência posterior a infração do seu dever de cobrar (Código Comercial, art. 178)

tenha de indenizar os danos decorrentes da falta. Ai, não é responsável pela insolvência, mas pelos danos que
advieram do não adimplemento do dever de cobrar, eficientemente, antes de ficar insolvente o devedor.

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O comissionário somente tem o dever de segurar os bens cometidos se isso lhe foi estabelecido. Os usos e
costumes existentes não bastam para compor a regra jurídica dispositiva.
Se há alguma alteração nos bens cometidos, sem ser urgente a venda, cabe ao comissionário pedir instruções ao
comitente. Se é urgente a venda, isto é, se não há tempo para pedir instruções e aguardar resposta, ou se a
resposta tarda, tem o comissionário o dever de vendê-los, em leilão público, a benefício e por conta daquele a
quem pertencerem (Código Comercial, art. 173: “Acontecendo nos efeitos consignados alteração que torne
urgente a sua venda para salvar a parte possível do seu valor, o comissionário procederá à venda dos efeitos
danificados em basta pública, em beneficio e por conta de quem pertencer”.
No art. 174 do Código Comercial, diz-se: “O comissário encarregado de fazer expedir uma carregação de
mercadorias em pôrto ou lugar diferente, por via de comissário que êle haja de nomear, não responde pelos atos
dêsse, provando que lhe transmitiu fielmente as ordens do comitente, e que gozava de crédito entre
comerciantes”.

6.RESPONSABILIDADE DO COMISSIONÁRIO. “O comissário que distrair”, estatuiu o Código Comercial,


ad. 180, “. .. do destino ordenado os fundos do seu comitente, responderá pelos juros a datar do dia em que
recebeu os mesmos fundos, e pelos prejuízos resultantes do não cumprimento das ordens, sem prejuízo das
ações criminais a que possa dar lugar o dolo ou fraude”. E o art. 181: “O comissário é responsável pela perda
ou extravio de fundos de terceiro em dinheiro, metais preciosos, ou brilhantes existentes em seu poder, ainda
mesmo que o dano provenha de caso fortuito ou fôrça maior, se não provar que na sua guarda empregou a
diligência que em casos semelhantes empregam os comerciantes acautelados”. Ainda o art. 182: “Os riscos
ocorrentes na devolução de fundos do poder do comissário para a mão do comitente correm por conta dêste;
salvo se aquêle se desviar das ordens e instruções recebidas, ou dos meios usados no lugar da remessa, se
nenhuma houver recebido”.
O art. 180 do Código Comercial alude a juros a contar do dia em que o comissionário recebeu os fundos que
pertenciam ao comitente. No art. 188 do Código Comercial, diz-se que os efeitos da mora, não havendo
estipulação em contrário, come çam desde o dia em que o credor, depois do vencimento, exige judicialmente o
seu pagamento (cp. Código Civil, art. 960). Se o caso cabe no art. 130, o art. 138 não incide. Aliás, assim se há
de entender mesmo se não mercantil a comissão (cf. Código Civil, art. 1.803; Supremo Tribunal Federal, 25 de
outubro de 1929, R. de D., 94, 587).
Tem o comissionário de prestar contas ao comitente, ainda que tenha ocorrido o dei credere. Não se trata de
simples rol do recebido e do despendido; há de provar as contas, dando, a mais, as explicações que o comitente
pedir. Não pode lançar na conta do comitente preço superior ao da aquisição, nem preço inferior ao da
alienação, nem mudar datas aos prazos. A dupla fatura é prática condenável e pode compor a figura do crime.
Diz o art. 185 do Código Comercial: “O comitente é obrigado a satisfazer à vista, salvo convenção em
contrário, a importância de tôdas as despesas e desembolsos feitos no desempenho da comissão, com os juros
pelo tempo que mediar entre o desembôlso e o efetivo pagamento, e as comissões que forem devidas. As contas
dadas pelo comissário ao comitente devem concordar com os seus livros e assentos mercantis; e no caso de não
concordarem poderá ter lugar a ação criminal de furto”. As verbas da conta provam-se por documentos, contas,
faturas, duplicatas mercantis, títulos de crédito e recibos ou quitações. Aprovadas as contas pelo comitente; com
a quitação devida, nenhuma reclamação ou impugnação cabe ao comitente, salvo, se comercial a comissão, por
êrro de conta, ou dolo, ou fraude (Código Comercial, art. 485). Chama-se revisão de contas. Se a comissão é de
direito civil, são os princípios de direito civil que se aplicam, concernentes à anulabilidade da quitação. Note-se,
portanto, que a diferença entre a impugnabilidade da quitação, na comissão mercantil, e a anulabilidade da
quitação, na comissão de direito civil, é apenas superficial. A quitação de direito civil tem de ser dos-
constituída; bem assim, a quitação de direito comercial. Cf. Tornos II, § 159, in tine; IV, §§ 886, 7, e 496; e
XXIV, §§ 2.889, 5, 2.909, 3, 2.918-2.916.
O Código Comercial contém algumas explicitações de princípios: “O comissiário que fizer uma negociação a
preço e condições mais onerosas do que as correntes, ao tempo da transação, na praça onde ela se operou,
responderá pelo prejuízo, sem que o releve o haver feito iguais negociações por conta própria” (art. 188) ; “O
comissário que receber ordem para fazer algum seguro será responsável pelos prejuízos que resultarem se o não
efetuar, tendo na sua mão fundos suficientes do comitente para satisfazer o prêmio” (art. 184).

7.DEVER DE COMUNICAÇÃO E DE CONTABILIDADE O comissionário tem o dever de comunicação


ao comitente, quanto ao exercício do poder de comissão, à observância total ou parcial das instruções recebidas

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e aos têrmos em que foi concluído o negócio jurídico. Tem, ainda, de remeter-lhe a conta de comissão,
ordinàriamente conta de venda, na qual se escreve o resultado líquido, com as especificações do objeto sobre
que versou a comissão, preços e despesas, inclusive a comissão que se lhe pague (Código Comercial, art. 171:
“O comissário é obrigado a fazer aviso ao comitente, na primeira ocasião oportuna que se lhe oferecer, de
qualquer dano que sofrerem os efeitos dêste existentes em seu poder, e a verificar em forma legal a verdadeira
origem de onde proveio o dano”). Não tem êle dever de comunicar ao comitente o nome do terceiro com que
negociou, principalmente se ocorreu o dei credere; faz parte da sua profissão explorar as relações e
conhecimentos que tem e pode ter interesse em não pôr em contacto os seus fregueses. Em todo o caso, no
negócio jurídico da comissão pode ter sido acordado que se revelasse o nome ao comitente, nascendo, assim,
somente para êsse caso, o dever do comissionário. Se, porém, tiver o comissionário vendido a crédito, há de
revelar o nome e o domicílio do terceiro, ou terceiros com quem tratou (Código Comercial, ad. 177: “O
comissário que tiver vendido a pagamento deve declarar no aviso e conta que remeter ao comitente o nome e
domicílio dos compradores e os prazos estipulados; deixando de fazer esta declaração explícita, presume-se que
a venda foi efetuada a dinheiro de contado, e nao será admitida ao comissário prova em contrário”. Portanto, se
não fêz a comunicação, não mais pode pretender que a operação tenha sido a prazo, ainda que o tivesse sido, e o
comitente tem pretensão e ação para lhe ser pago desde o resultado liquido. Se houve o dei credere, nenhum
interesse tem o comitente em que haja sido à vista o negócio jurídico. Presunção inris tantum tem-se disso no
art. 177. A rigor, se o comissário omitir a referência ao prazo, a comunicação tem seus efeitos tal como foi feita,
de modo que, em verdade, tenha sido à vista, ou a prazo, a operação, o que importa, nas relações entre o
comitente e o comissionário, é a comunicação no aviso e na conta: não pode ser retificada, salvo se a retificação
chega ao comitente antes de terem chegado o aviso e a conta; nem, a fortiori, revogada.

8. SEGURO Do BEM CONSIGNADO. O comissionário somente é vinculado a segurar os bens recebidos se


foi isso estipulado no contrato de comissão, ou em pacto adjecto, ou em instruções, ou se, eventualmente, há
uso da praça a respeito do objeto que se consigna.
Surge a questão de se saber se, na falta de vinculação, pode o comissionário segurar o bem ou os bens e cobrar
do comitente o que para isso despendeu. No art. 184 do Código Comercial, apenas se alude à cláusula de
segurar (verbis, “receber ordem de segurar”). Todavia, havemos de entender que êle pode segurar contra
incêndio (Louis FREDERICQ, Traité de Droit Commerciai Relge, 1, 810; MLLE. UOIZEY, Les
Commissionaires en marchandises, 45). Em vez de se considerar ato de gestão de negócios alheios sem outorga,
acertado é que se repute ato que se inclui em cláusula implícita, dispositiva, do contrato de comissão. Em todo o
caso, a cláusula implícita é afastada se o comissionário não tem o hábito de segurar as suas mercadorias, ou as
dos outros comitentes, ou se o uso do comércio é em sentido contrário (cf. Código Comercial, art. 168, verbis
“como faria em negócio próprio’, “uso do comércio em casos semelhantes”). A natureza do objeto pode
determinar o dever de segurar.
Contra os outros riscos não há dever do comissionário, se não resulta de cláusula expressa. Em geral, só existe
tal dever, nos sistemas jurídicos, se o comitente o estabeleceu (Código Comercial alemão, § 390; Código suíço
das Obrigações, art. 426). Não há responsabilidade do comissionário se não fêz o seguro por não lhe ser exigido
pelo comitente, expressamente, ou pelos usos do comércio. Se houve cláusula de seguro, a cláusula há de ser
interpretada no sentido de se ter de segurar pelos riscos ordinários.
Se, posteriormente ao contrato de comissão, o comitente exigiu o seguro, o comissionário tem de atendê-lo,
pois a eficácia resulta de manifestação unilateral de vontade (= não se precisa do consentimento do
comissionário). O valor do seguro é o do valor real do bem, e não o do valor real mais o benefício <lo
comitente (E. FicK, no Commentctire du Code fédéral des Obligations de A. SORNEIDER e II. FICK, J, 4~
ed., 764). Se o comíssionário não tinha o dever de segurar, ou se não lhe fôra permitido segurar, a seu líbito,
então o ato de seguro é ato de gestão de negócios alheios sem outorga. O comissionário não é responsável pela
falta do seguro se as instruções do comi-tente não foram claras e precisas.

9. COMISSÃO “fIEL GREDERE”. O comissionário não responde pela solvência do terceiro com quem
negocia; mas a regra jurídica do Código Comercial, art. 175 é dis positiva: pode o co-missionário assumir êsse
risco, ou êsse risco e o da infração das obrigações pelo terceiro, ou os dois e o de falta sem culpa de solução. Na
última espécie tem-se a comissão dei credere, a respeito da qual diz o art. 179 do Código Comercial: “A
comissão dei credere constitui o comissário garante solidário ao comi-tente da solvabilidade e pontualidade
daqueles com quem tratar pôr conta dêste, sem que possa ser ouvido com reclamação alguma. Se o dei credere

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não houver sido ajustado por escrito, e todavia o comitente tiver aceitado ou consentido, mas impugnar o
quantitativo, será êste regulado pelo estilo da praça onde residir o comissário, e, na falta de estilo, por
arbitradores”. O comissionário, na comissão dei credere, assume (não garante; sem razão, 3. X. CARVALHO
DE MENDONÇA, Tratado de Direito Comercial, VI, Livro IV, Parte II, 833, que se deixou levar pelo adjetivo
“garante” na letra da lei) o risco pela insolvência, pela falta de pagamento com culpa e pela falta de pagamento
sem culpa (= ainda por fôrça maior, ou caso fortuito). O terceiro nada tem com o dei credere que se estabeleceu
entre o comitente e o comissionário. Não há dei credere sem acôrdo expresso ou tácito.
O dei credere não torna fiador ou garante o comissionário (teoria de ANSAIDO), nem segurador o faz (E.
VWAiRI, Corso, ~ 4.~ ed., 414) ou segurador-fiador (Cii. LYoN-CAEN ET L. RENAULT, Traité de Droit
Commerciaie, ~ 83 ed., 365 5.;
.1. X. CARVALHO DE MENDONÇA, Tratado de Direito Comerdai, VI, Livro IV, Parte II, 334). O dei credere
solidariza o comissionário: é devedor por eficácia do próprio contrato de comissão, e não do contrato de
garantia, ou de seguro. Em tudo mais, a comissão é a mesma (Supremo Tribunal de Justiça, 17 de fevereiro de
1877, O D., 12, 621-622; Relação do Maranhão, 5 de junho de 1877, 18, 718).
No sentido de não se tratar, na cláusula ou pacto dei ore-<fere, de fiança, de garantia acessória, e sim de
solidariedade, a 8Y~ Câmara Cível da Côrte de Apelação do Distrito Federal, 9 de junho de 1930 (R. de D.,
101, 494). A decretação de abertura tIa falência ou de outro concurso de credores estabelece a mora do terceiro
e, pois, a do comissionário (cf. 53 Câmara Cível, 17 de outubro de 1950, 1?. 9., 189, 222). Não importa se o
comitente inicia ação contra o terceiro ou os terceiros <4.a Câmara Cível, 16 de outubro de 1942, 1?. dos T.,
148, 715). O comissionário dei credere tem dever de prestar contas e, se sobrevém inadimplemento por parte do
comitente, não deixa de ter pelo que êsse lhe deve direito de retenção do que está em seu poder (5.~ Câmara
Civil do Tribunal de Justiça de São Pau1o 4 de maio de 1956, E. dos T., 254, 284).
Nada impede que o dei credere se refira a operações à vista (Código Comercial, art. 179).
O pacto dci e rodete não é de natureza fidejussória. Conseouêncla: o comissiorario nao tem o direito de
excussão (benefício de ordem, Código Civil, arts. 1.491 e 1.492; Código Comercial, art. 261). No art. 179 do
Código Comercial fala-se de “garante solidário”, e não de fiador, e isso basta para que se invoque o art. 1.492,
II, 23 parte, do Código Civil.
Lê-se no art. 179, alínea 13, do Código Comercial:
“A comissão dei credere constitui o comissário garante solidário ao comitente da solvabilidade e pontualidade
daqueles com quem tratar por conta dêste, sem que possa ser ouvido com reclamação alguma”. No art. 179, 2•a
alínea: “Se o det eredere não houver sido ajustado por escrito, e todavia o com:tente o tiver aceitado ou
consentido mas impugnar o quantita tivo, será êste regulado pelo estilo da praça onde residir o comissârio, e na
falta de estilo por arbitradores”.

10. OPERAÇÕES A CRÉDITO. O comissionârio pode opurar a crédito, exercendo o poder de comissão, se o
comitente não lhe restringiu o poder, ou não lhe deu instrucões contrárias:
“O comissário”, diz-se no Código Comercial, art. 176, “presume-se autorizado para conceder os prazos que
forem de uso da Praça, sempre que não tiver ordem em contrário do comitente’; “ordem” está aí por “restrição
ao poder ou instruções”. A regra jurídica do art. 176 é dispositiLa. Quanto aos gêneros de expor-tacão, não
incide: não é uso serem a prazo as operações. Quando :ncrne, o prazo não pode ser maior do que o do uso
(Tribunal de Justiça de São Paulo, 1» de julho de 1896, R. M., III, 246) entende-se feita a venda pelo prazo do
uso, ou pelo maior dêles, salvo se menor do que aquêle com que foi concluído o negócio jurídico; “findos os
prazos que é de uso conceder-se”, decidiu o Tribunal, “responde o comissário pela importância dos gêneros
cometidos”, entendendo-se que os vendeu e recebeu o preço; se a importância do saldo contra o comissionário
não está determinada, manda-se que seja liquidada na execução. Se o comissionário concede prazos, há o risco
da insolvência do terceiro. Por isso, ao avisar e remeter a nota ao comitente, tem o comissário de se referir aos
prazos, revelando o nome do terceiro e o seu domicílio. Se o omite, a operação foi, para o comitente, à vista; se
cumpre o dever de avisar e remeter a conta, sem qualquer risco para o comissionário. “O comissário não
responde pela solvência das pessoas com quem contratar em execução da comissão, se ao tempo do contrato
eram reputadas idôneas: salvo nos casos do art. 179, ou obrando com culpa ou dolo” (Código Comercial, art.
175). O art. 179 refere-se à comissão dei credere. Se o comitente pré-excluiu qualquer operação a prazo, ou se
fixou o prazo ou os prazos, a operação é, para o comitente, ~ vista ou com o prazo ou prazos máximos que
permitiu concederem-se. Não importa para êle o que se passou entre o comissionário e o terceiro, nem o que no
aviso e na nota se contém fora do poder que conferiu, ou das instruções.

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Vencida a dívida, ou vencidas as dívidas, tem o comissionário o dever de cobrar, dever que só existe se não é
êle responsável pela solvência. Diz o art. 178 do Código Comercial: “Vencidos os pagamentos das mercadorias
ou efeitos vendidos a prazo, o comissário é obrigado a procurar e fazer efetiva a sua cobrança; e se nesta se
portar com omissão ou negligência culpável, responderá ao comitente por perdas e danos supervenientes”. Se,
para o comitente, a operação foi à vista, não há o dever, porque o comissionário deve o quanto desde a data da
operação; bem assim se o prazo, para o comitente, foi menor do que aquêle que o comissionário concedeu.

11.EXCEÇÕES DO COMITENTE. Tôdas as exceções do comissionário são oponíveis pelo comitente. Lê-se
no Código Co merc:al, art. 167: “Competem ao comitente tôdas as exceções que pode opor o comissário; mas
não poderá alegar a incapacidade dêste, ainda quando se prove, para anular os efeitos da obrigação contraída
pelo mesmo comissário’~. <“Anular” está, ai, por ser decretada a nulidade ou a anulação do negócio jurídico.)
O comitente não pode alegar compensação contra o terceiro, por dívida dêsse ao comitente, nem o terceiro por
dívida do comitente a êle. O comissionário pode alegar compensação do que o terceiro lhe deva, e vice-versa;
não pode o terceiro alegar compensação entre o que lhe deve o comitente, nem vice-versa. Se houve excesso de
poder, por ter o comissionário inserto o nome do comitente como figurante e sobrevém ratificação por êsse,
incidem os arts. 1.296, 1.297 e 1.306 do Código Civil.

12. PRAZO PARA A OPERAÇÃO. Se o comissionário não operou dentro do prazo que lhe foi estipulado,
responde pelos danos que o inadimplemento haja causado ao comitente, salvo se a tempo comunica as
dificuldades que surgiram e adverte o comitente de que o prazo pode expirar sem que se faça a operação. Se,
pelas circunstâncias, seria o caso de o comissionário contratar subcomissionário (e. g., profissional mais
especializado), há responsabilidade do comissionário pelos danos que advierem.

Se, não respeitando as instruções do comitente, ou os usos, e comissionário causa dano ao comitente, responde
pela indenização. Outrossim, se há adimplemento ruim.

13.TERCEIROS, COMITENTE E COMISSIONÁRIO. Os terceiros têm de adimplir os seus deveres. Se o


comissionário excedeu os poderes, a ponto de não se poder pensar em adimplemento ruim do contrato de
comissão, o comitente pode propor ação de ineficácia dos atos praticados pelo comissionário (não se diga ação
de nulidade, como faz JEAN HÉMARD, Les Contrats commerciaux, Traité théorique et pratique de Droit
Coinntercial, II, 108).
O comissionário não responde pela solvência do terceiro ou dos terceiros, com quem concluiu o negócio
jurídico (Código Comercial, art. 175), se, no momento da conclusão, nada constava contra a idoneidade e sobre
a sua situação econômica. Para que a responsabilidade exista, é preciso que tenha ocorrido a cláusula ou o pacto
dei credere.

§ 4.728. Restituição dos bens e dos créditos em concurso de credores do comissionário

1.FALÊNCIA OU OUTRO CONCURSO DE CREDORES DO COMISSIONARIO E CESSAÇÃO DO


CONTRATO DE COMISSÃO. Se a matéria e comercial, extingue-se o contrato de comissão com a decretacão
de abertura da falência, ou de concurso de credores civil, ou de liquidação coativa, O que o comitente ia fazer
como comerciante, ou em assunto regido pelo direito comercial (~ atingível pelo concurso de credores
falencial), ou atingível pelo concurso de credores civil, ou pela liquidação coativa, não mais pode ser levado a
cabo. É o que resulta do art. 49, parágrafo único, do Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945.
O que ainda não foi objeto do contrato com o terceiro, ou com os terceiros, acha-se em poder do comissionário,
mas, extinto o contrato de comissão, tem de ser restituido ao comi-tente. Não há mais razão para permanecer na
posse do comissionário. Os sistemas jurídicos que aí falam de reivindicacão empregam expressão um tanto
forte, que não serve para todos os casos. O que ao comitente toca é a ação para que se lhe restituam os bens, ou
os créditos, pois tem o comissionária
o privilégio especial (Decreto-lei n. 7.661, art. 102, § 2.% 1).
Fala-se de reivindicação no direito belga (LoUís FREDERICQ, Traité de Droit Commercial Belqe, 1, 323), no
italiano e em outros sistemas jurídicos.

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2.COMPRA-E-VENDA E TRANSMISSÃO. Alguns juristas pensam na reivindicação do bem vendido se não


foi feita a transmissão da propriedade e da posse do terceiro, porque ainda é dono e possuidor mediato o
comitente. Tal solução não merece acolhida. Houve outorga para vender e alienar em nome próprio. O
comissionário vendeu, embora ainda não se haja feito a transmissão registária, ou mesmo que se não haja
concluído o acôrdo de transmissão, O comitente não pode ir contra o terceiro, que adquiriu direitos e é tutelado
pela lei. O terceiro entrou em caminho que o comitente abriu e não importa se ignorava quem fôsse. Comprou a
quem tinha poder de disposição, que o comitente, mesmo oculto, outorgara.

§ 4.729. Substituição do comissionário

1.OUTORGA PELO COMISSIONARIO. O comissionário pode fazer-se substituir por outra pessoa, sem ser
preciso que o comitente o haja permitido expressamente. O que pode ocorrer é que o comitente haja pré-
excluído a substituibilidade. Nada obsta a que, em vez de outorgar poderes de comissão a outrem, apenas
constitua mandato, ou corretagem. O comi-tente deve apenas uma remuneração, se houve conclusão de
subcomissão. Em todo o caso, em se tratando de bens para jierem transportados, estatui o Código Comercial,
art. 174:
“O comissário encarregado de fazer expedir uma carregação de mercadorias em pôsto ou lugar diferente, por
via de comissário que êle haja de nomear, não responde pelos atos dêste, provando que lhe transmitiu fielmente
as ordens do comitente, e que gozava de crédito entre comerciantes”

2.SUBsTITUiÇÃo E ADIÇÃO DE OUTRO COMISSIONÁRIo. Durante o tempo em que se há de adimplir o


contrato de comissão, o contrato do comitente com outro comissionário ou implica denúncia cheia, o que
depende de explicitude, ou escolha de outro comissionário, que opere com o que fôra encarregado.
tsse precisa consentir na solidariedade, se vão operar juntos.

§ 4.730. Eficácia quanto ao comitente

1.DEVERES DO COMITENTE. São deveres do comitente:


a)Pagar a remuneração devida ao comissionário (prOvisio, comissão), que é determinada segundo o uso do
lugar da execução, se não foi fixada, expressamente, no contrato (Código Comercial, art. 186: “Todo o
comissário tem direito para exigir do comitente uma comissão pelo seu trabalho, a qual, quando não tiver sido
expressamente convencionada, será regulada relo uso comercial do lugar onde se tiver executado o mandato
(art. 154)”, ou por arbitramento, se não há uso local (Tribunal de Justiça de São Paulo, 23 de fevereiro de 1912,
E. E., 1, 197). Se há dei credere, entende-se o duplo do que seria ordináriamente devido. Calcula-se sobre o
produto bruto, e não sobre o líquido. Nada obsta a que se preveja quantia certa. No art. 187 do Código
Comercial, diz-se: “A comissão deve-se por inteiro, tendo-se concluído a operação ou mandato; no caso de
morte ou despedida do comissário, é devida única-mente a quota correspondente aos atos por êste praticados”.
Isso só se entende se não continuou o contrato de comissão, por ser irrelevante a pessoa do comissionário. No
art. 188:
Quando, porém, o comitente retirar o mandato antes de concluído, sem causa justificada procedida de culpa do
comissário, nunca poderá pagar-se menos de meia comissão, ainda que esta não seja a que exatamente
corresponda aos trabalhos praticados”. Sobrevindo falência do comitente, tem o comissionário privilégio
especial (Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945, art. 102, § 2.~, III; Código Comercial, art. 189, que se
há de adaptar ao direito vigente: “No caso de falência do comitente, tem o comissário hipoteca e precedência
privilegiada nos efeitos do mesmo comitente, para indenização e embôlso de tôdas as despesas, adiantamentos
que tiver feito, comissões vencidas e juros respectivos, enquanto os mesmos efeitos se acharem à sua
disposição em seus armazéns, nas estaçóes públicas, ou em qualquer outro lugar, ou mesmo achando-se em
caminho para o poder do falido, se provar a remessa por conhecimentos oa cautelas competentes de data
anterior à declaração da quebra (art. 806)”).
O Tribunal do Comércio do Distrito Federal, a 24 de julho de 1909 (O D., 1, 62), teve de julgar caso de
percentagem, que alguém exigia, como comissionario. Quem se dizia comissionario tinha caixeiros nomeados e
recomendados pela pessoa que seria o contente; mas, amua assim, foi invocado o ad. ES do Código Comercial.
A comissão é deduzível da quantia que o comissionârio tem de entregar ao comitente; bem assim, qualquer

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despesa reembolsável (Supremo Tribunal Federal, 20 de junho de 1930, 1?. de D., 99, 333). Não é vinculado a
pagar a comissão o comprador (Supremo Tribunal Federal, 16 de outubro de 1952, A. J., 108, 61), salvo se em
pacto ou cláusula se vinculou.

2. REMESSA OU ENTREGA DO BEM AO COMISSIONÃRIO . Ao comissionârio , em geral, porém não


necessàriamente, o comitente, ou alguém por êle (e. g., o vendedor ao comissionário revendedor), tem de
remeter ou entregar desde logo o bem que é objeto do ato para que se concluiu o contrato de comissão. Se o
comitente quis adquirir, o comissionário ou tem consigo os bens, ou os há de receber para a operação.
É aqui que temos de referir-nos à expressão “consignação”. Consigna o comitente que quer alienar bens, quase
sempre mercadorias.
Lê-se em J. J. O. PEREIRA E SOUSA (EsbOço de um Dicionário Juridico, verbo Consignatário) :
“Consignatário se diz em geral aquêle que é encarregado por outro de fazer alguma coisa em seu nome, mas
particularmente se aplica àquele que é encarregado por um negociante da compra, ou venda de mercadorias,
paga, ou recebimento de letras de câmbio, descarga de fazendas que lhe foram remetidas e transporte delas ao
lugar do seu destino”. O sentido afasta-se, algum tanto, do étimo de consignare, pôr sinal, porque o que se
guardava em consignação era sob sinête, em caixa, mala, ou cartucho fechado e marcado.
A consignação, no sentido em que aqui se emprega, não é depósito, nem, a outros respeitos, o é, tanto que se
fala de depósito em consignação. Em todo o caso, nos arts. 972-984 do Código Civil, há a elipse “pagamento
por consignação”, em que há depósito (judicial) conforme a explicitude de algumas regras jurídicas (arts. 972,
976, 977, 978 e 979). O comissionário não é depositário.

O comissionârio tem de examinar os bens ao serem-lhe entregues diretamente, ou ao chegarem após expedição,
tendo de imediatamente comunicar ao comitente o estado ou as qualidades que não correspondem ao que se
menciona no contrato de comíssao, ou em informes constantes das intruções, para que não tenha a
responsabilidade prevista no Código Comercial, arts. 171 e 172, e possa alegar alterações de que não tem culpa.
A responsabilidade do comissionário foi explicitamente prevista na lei. Não é a de depositário, nem a de
mandatário.
Se a operação, pelo estado dos bens, não mais pode ser concluída, tem o comissionário o ônus de alegar e
provar que existe tal estado dos bens e que não proveio de culpa sua.
Se os bens podem depreciar-se pelo retardamento da operação, tem o comissionário de comunicá-lo ao
comitente e pedir instruções, pois que não é êle depositário.
Às vêzes, em virtude do contrato de comissão, ou de pacto adjecto, ou de instruções, o comissionário tem de ir
buscar na emprêsa comitente, ou em determinado lugar que o comitente indicou, o bem ou os bens objeto do
futuro negócio jurídico. Aí, quase sempre, a posse é transferida no momento mesmo em que o comissionário ou
alguém por êle apanha o bem ou os bens.
O contrato de comissão pode ser ligado a fabricação sucessiva ou contínua, de modo que o comitente se vincule
à remessa periódica ou continua do produto. A falta de remessa rege-se pelo art. 188 do Código Comercial (cf.
Tribunal de Justiça de São Paulo, 21 de dezembro de 1954, 1?. dos T., 234, 221).
O comissionário de aquisição tem o dever de entregar ao recomítente os bens adquiridos. A responsabilidade só
é pré-xcluída pelo caso fortuito ou fôrça maior. Não a pré-exclui a escolha de algum outro comissionário, que
então se encarregue da expedição.
3.COMITENTE E TERCEIROS. O comissionário trata e conclui em nome próprio. É figurante do negócio
jurídico, para o qual se fêz o contrato de comissão. A eficácia, que se irradia do negócio jurídico que se
concluiu, é entre êle, figurante, e o outro ou os outros figurantes. Operou por conta do comitente, mas em nome
próprio. Ai, surgem alguns problemas de grave interesse prático. Por exemplo: a) o comissionário, que se
encarregou de vender mercadorias de produtor estrangeiro, ou de comerciante estrangeiro, por preço fixado em
moeda estrangeira, não pode alegando que vai negociar em nome próprio pedir a decretação da nulidade da
cláusula; 19 se o produto revela o nome do comitente, ou se o diz a fatura, a ação do figurante, por falsidade, ou
vício do objeto, é contra o comissionário, ou pelo ato ilícito absoluto contra o comitente.
A falência do comitente não atinge os terceiros que contrataram com o comissionário.
Se o comitente interveio pessoalmente no negócio jurídico que se concluiu com o terceiro, há ação contra êle.
Mas é preciso que possa ser considerado co-figurante.

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Sempre que, excepcionalmente, o terceiro pode ir contra o comitente, exonerado não fica o comissionário
(Côrte de Cassação de França, 15 de fevereiro de 1893; divergências nas jurisdições comerciais, cf. B.
STARCK, Le Contrat de Commíssion, 162).

4.CESSÃO JUDICIAL DOS DIREITOS CONTRA TERCEIRO OU TERCEIROS. O comitente tem ação
contra o comissionário para que cumpra os seus deveres, ou preste a indenização, inclusive pela cessão
(judicial) dos seus direitos contra o terceiro ou os terceiros com quem concluiu o negócio jurídico. Tal solução é
a que se há de considerar compatível com o Código Comercial brasileiro, art. 166, o Código Comercial alemão,
§ 392, e a Lei sueca de 18 de abril de 1914, art. 56. No Código suíça das Obrigações, art. 401, 1a alínea, há a
cessão legal (sub-rogação pessoal) a favor do comitente que cumpriu os seus deveres perante o comissionário,
por se tratar de exercício de poder em nome próprio. Cp. Código Civil italiano, art. 1.705, 2.a alínea.

§ 4.731. Extinção do contrato de comissão

1. CAUSAS DE EXTINÇÃO. As causas de extinção são as comuns. Cumpre, porém, atender-se à


especificidade do contrato de comissão, para que se lhe apontem, a propósito da extinção, diferenças entre êle e
os outros contratos em que há outorga.
O comissionário e o comitente não podem revogar o contrato de comissão, como poderiam revogar mandato
revogável.
A retirada, a que se refere o art. 188 do Código Comercial,é denúncia cheia (verbis “causa justificada
precedida de culpa do comissário”>. A denúncia sem causa justificada dá ensejo a indenização e ao pagamento
da remuneração conforme se prevê na lei.
No Código Civil italiano, art. 1.734, faia-se de “revocare”, “fino a che il commissionario nou l’abbia concluso”.
Ora, o contrato de comissão é feito no interesse dos dois figurantes, o comissionário entra em contacto e os
clientes confiam nas situações criadas pelos entendimentos e punctaçóes. A revogação pelo comitente, mesmo
antes da conclusão do negócio juridico, pode ser prejudicial à reputação do comissionário. Por outro lado, o
caso seria de denúncia vazia, e não de revogação; e a regra jurídica que a permitisse seria desaconselhada.
Apesar do tempo em que se fêz (1850), o Código Comercial, art. 188, afastou a denúncia vazia e, a fortiori, a
revogação. Os juristas alemães falam de Kiindigung (denúncia), e não de revogação. A despeito disso,
tradutores espanhóis trocam os nomes. “Revogação” somente poderia ser em sentido atécnico (cf. KARL
LMtENZ, Lehrbueh des Schuldrechts, II, 189).

2.DENÚNCIA CHEIA E DENÚNCIA VAZIA DA COMISSÃO. A propósito da comissão, não há fundamento


suficiente para se falar de revogação da comissão. O Código Comercial, art. 188, fala de “retirar” o comitente a
comissão, que êle, sem boa terminologia, chama, aí, mandato, em vez de outorga. Em verdade, porém, o que
ocorre é denúncia cheia: o comitente denuncia o contrato, alegando justa causa, oriunda de culpa do
comissiorário; ou denúncia vazia: o comitente denuncia o contrato, sem justa causa, e tem de pagar, pelo
menos, a metade da comissão, mesmo se essa não é a quota que corresponderia aos serviços do comissionário.
É óbvio que não se pode cogitar de denúncia, vazia ou cheia, se o negócio jurídico já foi concluído, ou se foi
concluído pré-contrato que lhe corresponda.
Se a denúncia foi cheia (= com justa causa) e verdadeiro o enchimento, o comitente não deve remuneração.
Se o comitente denuncia vaziamente, por apenas não querer que determinado negócio jurídico se conclua, tem
de prestar a parte que corresponda aos serviços do comissionário, que fica adstrito a atender à atitude do
comitente.
§ 4.131. EXTINÇÃO DO CONTRATO DE COMISSÃO 327

Lê-se no Código Comercial, art. 188: “Quando, porém, o comitente retirar o mandato antes de concluído, sem
causa justificada procedida de culpa do comissário, nunca poderá pagar-se menos de meia comissão, ainda que
esta não seja a que exatamente corresponda aos trabalhos praticados”.
A denúncia pelo comissionário é permitida, mas responde ~le pelos prejuízos causados ao comitente, salvo se
maiores seriam os seus se cumprisse o contrato de comissão. E. g., se o dinheiro remetido para compras passou
a ser insuficiente, por alguma circunstância superveniente, como guerra (B. STÃRcK, Les Rapports du
commettant et du commissionaire avec les tiers, Le Contrat de commission, 147 s.) ou inflação.

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O contrato de comissão pode ter a cláusula de indenunciabilidade (1.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Rio Grande do Sul, 5 de agôsto de 1940, O D., VI, 195).

3. MORTE DO COMITENTE. A morte do comitente não extingue o contrato de comissão, nem o extingue a
interdição, se a comissão tem por objeto atividade de emprêsa.

4.MORTE DO COMISSIONÁRIO. A morte do comissionário extingue o contrato de comissão se não está


inserto na atividade da emprêsa, que continue a operar.
No Código Comercial, art. 187, ta parte, frisa-se que a comissão (a remuneração) é devida por inteiro se se
conclui o negócio jurídico objeto do contrato de comissão. “No caso de morte” do comissionário, diz o ad. 187,
2~a parte, que “é devida únicamente a quota correspondente aos atos por êste praticados”, o que poderia levar a
pensar-se que a morte do comissionário extingue sempre o contrato de comissão. Mas o que se supôe, no art.
~g7, 2.~ parte, é apenas o quad plerumque fiL

5.FALÊNCIA E OUTROS CONCURSOS DE CREDORES. A decretação de abertura da falência do


comitente não extingue o contrato de comissão em que é comitente o falido (Decreto
-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945, art. 43). O síndico pode denunciá-lo, de acôrdo com os princípios do
direito comercial comum (Código Comercial, art. 188). “No caso de falência do comitente”, diz o art. 189 do
Código Comercial, “tem o comissário hipoteca e procedência privilegiada nos efeitos do mesmo comitente,
para indenização e embôlso de tôdas as despesas, adiantamentos que tiver feito, comissões vencidas e juros
respectivos, enquanto os mesmos efeitos se acharem à sua disposição em seus armazéns, nas estações públicas,
ou em qualquer outro lugar ou mesmo achando-se em caminho para o poder tio falido, se provar a remessa por
conhecimentos ou cautelas competentes de data anterior à declaração da quebra (art. 806) “. Hoje, com a
legislação posterior e a sua integração no sistema jurídico, os créditos acima referidos têm privilégio especial
(Decreto-lei n. 7.661, art. 102, § 2.0, 1). A propósito dos armazéns gerais, que têm atividade de comissão,
estatui a Lei n. 1.102, de 21 de novembro de 1903, art. 14: “As emprêsas de armazens gerais têm o direito de
retenção para garantia de pagamento das armazenagens e despesas com a conservação e com as operações,
benefícios e serviços prestados às mercadorias, a pedido do dono; dos adiantamentos feitos com fretes e segulo,
e das comissões e juros, quando as mercadorias lhes tenham sido remetidas em consignação (Código
Comercial, art. 189). Esse direito de retenção pode ser oposto à massa falida do devedor. Também têm as
emprêsas de armazéns gerais direito de indenização pelos prejuízos que lhes venham por culpa ou dolo do
depositante”. Trata-se de atendimento, em lei especial, a princípios gerais concernentes à comissão.
“Para o falido, cessa o mandato ou comissão, que houver recebido antes da falência, salvo os que versem sobre
matéria estranha a comércio” (Decreto-lei n. 7.661, art. 49, parágrafo único).
O comissionário pode interpelar o síndico, para que, dentro de cinco dias, declare se cumpre, ou não, o contrato.
A declaração negativa ou o silêncio do síndico, findo êsse prazo, dá ao contraente o direito à indenização, cujo
valor, apurado em processo ordinário, constituirá crédito quirografário (Decreto-lei n. 7.661, art. 48, parágrafo
único). Cf. Tomo XXVIII, §§ 3.348, 8; 8.849, 2, 8, 5; 8.850, 2; 3.854, 8.
A concordata preventiva é sem qualquer repercussão no tocante aos poderes de comissão outorgados ao
concordatário, bem como quanto aos poderes que o concordatário havia outorgado. Ocorre o mesmo nos
próprios sistemas jurídicos em que, retardatàriamente, se estabelece a extinção do contrato de comissão se o
comitente cai em falência, ou outro concurso de credores, ou em liquidação coativa (cf. LEONE BOLAFFIO,
liConcordato preventivo, 2a ed., 85).

6.PRAZO RESOLUTIVO OU PRAZO RESILITIVO E CONDIÇÃO RESOLUTIVA OU CONDIÇÃO


RESILITIVA. No contrato de comissão é inserível cláusula de que resulte a resolução, ou resilição, em virtude
de expiração de prazo ou implemento de condição resolutiva ou resilitiva. Contratos de comissão há em que
atos ou circunstâncias fazem implícita a cláusula de resolução, ou de resilição. O contrato de comissão para
vender o prédio tal resolve-se se a venda teria de ser antes de findar o ano, ou se o comitente pré-afastou a
conclusão do contrato se, durante as conversações e punctações, adquirisse o prédio vizinho.

Título XXXV

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CONTRATO DE CORRETAGEM

CONCEITO E NATUREZA DO CONTRATO DE CORRETAGEM

§ 4.732. Conceito de contrato de corretagem

1.CONCEITO DE CORRETAGEM E DE CORRETOR. A corretagem é a atividade intermediatriz entre


pessoas que desejam contratar, ou praticar para outrem algum ato; é intermediação, em senso largo, assalariada,
nas negociações de caráter civil ou mercantil, mas, de ordinário, importa comercialidade dos atos de
corretagem, pela natureza dos negócios jurídicos visados. ii normal que se restrinja à recepção de ofertas e de
aceitações, transmitindo-as o corretor aos interessados. No direito comercial brasileiro, permite-se a intervenção
do corretor em todos os suportes fácticos de negócios jurídicos comerciais (Código Comercial, art. 45: “O
corretor pode intervir em tôdas as convenções, transações e operações mercantis: sendo todavia entendido que é
permitido a todos os comerciantes, e mesmo aos que o não forem, tratar imediatamente por si, seus agentes e
caixeiros as suas negociações e as dos seus comitentes e até inculcar e promover para outrem vendedores e
compradores, contanto que a intervenção seja gratuita”.
Com a leitura do art. 45 do Código Comercial poderia crer-se que o sistema jurídico brasileiro somente conhece
duas espécies de corretores, os corretores de oficio e os corretores
matriculados. O art. 45, in fine, exige que a corretagem pela pessoa que é comerciante seja com a matrícula. Se
matricula não houve, o comerciante não pode cobrar remuneração, pois que se pôs por princípio a gratuidade. O
que hoje havemos de entender é que o comerciante que acidentalmente faz corretagem. sem estar matriculado,
opera gratuitamente, salvo cláusula expressa de remuneração Assim, lê-se como ins dispositivum c que se
edictou como jus cogens, ou parece que tal aconteceu. Quanto à corretagem civil, por pessoa que não é
comerciante, não existe, sequer, a regra jurídica dispositiva. Supóe-se, porém, a remunerabilidade.
Qualquer corretor que pratique, habitual e profissional-mente, atos de intermediação, é comerciante (Código
Comercial, art. 4Y). Ao negócio jurídico de intermediação do corretor dá-se entrada no mundo jurídico desde
logo, como negócio jurídico bilateral, e dêle se tem instrumento. O negócio jurídico, que resulta do ato de
corretagem, é ato de comércio. Se, no interesse do ofertante, oculta o nome dêsse, ou se o oculta, a líbito seu, de
jeito a pensar-se que é êle o figurante, torna-se comissionário.
Neste Tomo XLIII somente se há de tratar do negócio jurídico de corretagem, do contrato entre incumbente e o
corretor. Não é aqui o lugar para cogitarmos dos negócios jurídicos que o incumbente e o terceiro concluem
através do corretor. Tal matéria é fora do contrato de corretagem e cabe nos negócios jurídicos bolsísticos ou
fora da Bôlsa, para os quais se lança mão da intermediariedade do corretor.
No direito brasileiro, a profissão comercial de corretor oficial é exclusiva: proibe-se ao corretor qualquer outro
negócio jurídico comercial, como ato de profissão, ainda que sob alheio nome (assim se há de entender o art. 59
do Código Comercial:
“~ proibido aos corretores: 1. Tôda a espécie de negociações e tráfico direto ou indireto, debaixo de seu ou
alheio nome, contrair sociedade de qualquer denominação ou classe que seja, e ter parte, ou quinhão em navios
ou na sua carga; pena de perdimento do ofício, e de nulidade do contrato”). A nomeação de corretores pelo
Estado não lhes tira o caráter de comerciantes; não os faz funcionários públicos; a nomeação não émais, ai, do
que verificação estatal de capacidade técnica e moral, ordinàriamente substitutiva da apreciação das juntas
comerciais. No Senado Federal, a 4 de dezembro de 1895, o senador SEVERINO VIEIRA caracterizou o
propósito do legislador, por ocasião da feitura da Lei n. 854, de 16 de dezembro de 1895:
... não se trata de criação de emprêgo público; define-se como ofício público a profissão, a ocupação do
corretor. O corretor, sendo, pela nova legislação, o intermediário, o auxiliar do comércio, principalmente para
concluir transações entre pessoas, que se não conhecem, precisa de dar a essas pessoas que são obrigadas a
procurá-lo, por efeito das necessidades comerciais, certas garantias que a lei define e regula. Não se trata,
portanto, da hipótese da criação ou supressão de empregos públicos; mas de definir como múnus público o
oficio de corretor”. Em relação à mediação, a corretagem implica relação jurídica inicial com os interessados no
negócio jurídico, ou com algum, ou com alguns dêles. Mas há outros elementos diferenciadores a que teremos

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de nos referir.
No art. 1.0 do Decreto n. 417, de 14 de junho de 1845, definiam-se os corretores: “Os corretores são agentes
intermediários para comprar por seus comitentes” aí, faltava a expressão própria “mercadorias, navios, fundos
públicos e outros efeitos e obrigações, letras de câmbio, bilhetes à ordem e quaisquer papéis comerciais, fazer
negociações por descontos, seguros, contratos em grosso, fretamentos, empréstimos sobre penhôres, ou de outro
qualquer modo”.
(Nas leis a cada momento aparece a expressão “comitente” para designar a pessoa que figura no contrato com o
corretor. Ora, comitente é quem comissiona, é quem trata com o comissionário. Sem terminologia exata, (não é
possível exposição científica. O cliente do corretor incumbe, não comissiona; é incumbente, não comitente.)
O corretor é intermediário independente, que, com outorga de duas pessoas para adquirir e alienar, em no-me
delas, verifica que quiseram o mesmo (acôrdo de vontades) e, sem que os interessados precisem estar presentes,
dá por concluído o negócio jurídico. Não representa, nem medeja; intermedeia, e como que põe juntos os
papéis, que correspondem aos dois ou mais clientes, para que os papéis se colem. As vontades passam através
do corretor, sem que êle figure, presente, ou represente, ou medeje. O mediador permanece no mundo fáctico,
até que se conclua o negócio jurídico. O corretor pratica os atos de corretagem já dentro do mundo jurídico.
Não há órgão, nem mandatário, nem procurador, no corretor. Intermediário independente, não é empregado de
qualquer dos interessados, e a função, em vez de ser entre êle e (A + E), é entre êle e A e entre ~le a E. Nas
Bôlsas ou mesmo fora das Bôlsas, o corretor trata com o outro corretor, mas os figurantes são o incumbente
daquele e o incumbente dêsse.

2. CORRETOR E ÉTIMO. Corretor é o que corre de interessado a interessado. A palavra precedeu a


corredor. “Corretor” não pode ter vindo de “courtier”, porque a palavra aparece, na língua francesa, em 1588, e
“corretor” já era vulgar, com alusões a longínquo passado, e. g., em meados do século XIV. No século XIII, há,
em França, “cour (r) atier”. Ambos, corretor e courtier (corretier), vêm de correr, porque o corretor corria de
comprador a vendedor, até que se fixasse. Depois, mais o buscaram do que êle buscava. As Ordenações
Afonsinas falam, com naturalidade que revela a frequência e antiguidade da função, de “corretagem” e de
“corretor”.
Na língua portuguêsa, há “corredor”, o que corre, mas corretor”, com o significativo t, mostra que “corretor”
estava em uso antes de se formar “corredor”. Corredor é o lugar por onde se corre, ou é quem corre. Na língua
espanhola, a função de corretor deve ter sido posterior à que houve em Portugal, ou pelo menos a sua
diferenciação do mediador, pois não se diz “corretor”, e sim “corredor”.
Não têm razão os que atribuem a corretor o étimo curator, curador. Nem se pode ligar corretor a corrector, de
que se cogita na L. 4, C., de juris et facti ignorantia, 1, 18: “corrector” era o corregedor. Cf. Novela 8, c. 1.
A corretagem facilitou, desde muitos séculos, as relações juridicas entre os comerciantes estrangeiros e os
nacionais. Punha em contacto os interessados, oficialmente lançava as cláusulas dos acôrdos e os certificava ou
testemunhava em justiça, se controvérsias surgiam. A princípio, eram livres os corretores, mas a própria função
específica que exerciam sugeriu a oficialização, pelo menos para certos contratos.
Na Idade Média, houve corretores; houve-os depois, livres ou não. A luta dos corretores pela monopolização
sempre existiu, c muitas vêzes a sua intromissão sacrificou a intensificação do comércio.
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Nas Ordenações Afonsinas, Livro 1, Titulo 18, § 16, negava-se ao corretor o procurar em juízo: não podia ser
procurador em juízo “homem, que seja dado por fiel antre partes, que deve dar testemunho por hufia parte e por
outra, assy como he o Corretor; e esto em aquelle feito, em que deve seer fiel”. Também o tabelião não o
poderia ser; mas a função dêsse era de escrever o que os figurantes acordavam ou o figurante declarava. A
função do corretor era externa, embora não tão externa como a do mediador.
Nas Ordenações Afonsinas, Livro III, Título 64, § 17, fala-se das “vendas das mercadorias, que forem feitas per
Corretores antre os Estrangeiros, e naturaes do Regno, assy das mercadorias, que os ditos Estrangeiros
venderem como das que comprarem per Corretores” (22 de maio de 1444).
O corretor testemunhava, com juramento, mesmo se não havia outras testemunhas, quanto ao preço, “alem do
juramento jeral, que fez ao tempo, que lhe foy dado o ‘Officio da corretagem”. t de notar-se que as Ordenações
Afonsinas distinguiram bem o juramento de investidura no ofício, que é geral, e o porte por fé que só se refere
a cada ato. O corretor não é figurante, nem presenta, nem representa, porém não poderia ter a sua atividade
conceptualmente reduzida à do mediador. LIe está presente, sem presentar, nem representar. Não só medeja,
intermedeia, fazendo mais do que fazem os intermediários que não são corretores. Um dos elementos a mais é o

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do porte por fé. Mas, para isso, é preciso que o corretor seja de ofício, ou matriculado. Assim, a função do
corretor livre, não oficial, nem, sequer, matriculado, sofre diminuição na sua atividade declarativa.
Nas Ordenações Afonsinas, Livro IV, Título 86, § 2, a propósito do sinal ou arras, diz-se que o estabelecido
para o arrependimento “se nom entenda nas compras e vendas, que se fazem per corretores antre algufis
mercadores, Estrangeiros ou vizinhos, sobre algumas mercadorias: ca em tal caso, ainda que o comprador dê
alguú dinheiro em signa! ao vendedor, nom leixará por tanto a dita venda de seer de todo firme, sem alguuá das
partes se poder mais arrepeender della sem consentimento da outra parte; porque achamos que d’antiguamente
assy foi sempre usado antre os mercadores”.

ANTONIO MENDES AROUCA (Allegationes furis, 233) falou da ação de mandato que não se dá ao
conselheiro (suaror), ao mediador ou ao proxeneta.
A diferenciação entre o mediador e o corretor estava feita, porque o testemunho do mediador não fazia fé, ao
passo que a fazia, como se vê das Ordenações Afonsinas, o testemunho do corretor. Sobre o testemunho do
mediador, GABRIEL PEREIRA DE CASTRO (Decisiones, 253: “proxenetae admittuntur ad testificandum”,
com citações das Ordenações Filipinas, Livro III, Título 59, § 19, Livro IV, Título 2, § 2, e Livro 1, Título 48, §
21). Distinguia êle “mediatores” e “proxenetae”; mais ainda:
“nuntium”. Cf. Senado Português, 3 de novembro de 1616.
3.FUNÇÃO DO CORRETOR. A função do corretor é mais intensa do que a do mediador. O corretor faz
comunicações de conhecimento aos clientes, quanto à conclusão do negócio jurídico. Não representa, nem
presenta, nem só medeia. Diante do acôrdo dos interessados, o oferente e o aceitante (oferente da venda, por
exemplo, e oferente da compra, que êle faz encontrarem-se em suas manifestações de vontade, de modo que um
passa a ser oferente e outro aceitante, somente pela posição no tempo), o corretor comunica o que se passou. Se
fôssem os dois interessados que estivessem em contacto corporal, com os olhos e os ouvidos, um teria de dizer
“Quero” (Ofereço) e o outro “Quero” (Aceito), ou, à distância, somente com os dedos e os olhos
(correspondência), ou somente com os ouvidos (telefone). Se havia procuradores, teriam de pôr-se em contacto
corporal, com os olhos e com os ouvidos, ou somente com os olhos ou somente com os ouvidos. Se há
corretagem, o contacto corporal é desnecessário: as duas vontades vão ao corretor; é êle quem percebe e
comunica a coincidência, o consensus. O corretor é instrumento social para se abstrair e dispensar a
corporalidade dos contactos. Tal dispensa não ocorre com o mediador, porque os interessados têm de concluir,
por si, ou por seus procuradores, o negócio jurídico. Por onde se vê quão superficial é a doutrina dos que,
mesmo hoje em dia, confundem mediação e corretagem.
A função do corretor é mais declaratoria do que institutiva. O mandatário constitui, em nome do mandante, ou,
excepcionalmente, em nome próprio, o que pode desnaturar a figura. O procurador constitui em nome do
procurado, talvez in rem suam, O comissionário constitui em nome próprio e por conta do comitente. O
mediador nem constitui, nem declara. O corretor intermedeja, o que pode ser fácticamente apreciável, por ser
elemento de constitutividade não essencial, e declara. Declara e comunica que houve o acôrdo de
manifestações de vontades. Os clientes é que contratam, podendo não haver a interferência do mandatário, ou
do procurador, ou a intercalação excludente do comissionário.
O elemento de declaratividade da função do corretor foi o que mais a diferenciou da função do mediador. É
possível, porém, que no direito grego êsse elemento fôsse anterior, pela natureza do próxeno.
Na jurisprudência estrangeira, há divergências mais locais do que doutrinárias quanto às funções eventuais, a
mais, dos corretores. Mas êsse plus é a latere.
O mediador não presta contas. O corretor presta-as. Tem êle de comunicar aos clientes que a sua função foi
cumprida, isto é, que êles se acordaram, o que êles provâvelmente não sabem. O corretor, que não figura no
negócio jurídico, sabe-o, e tem de declaração .
Temos assim que, para o mesmo negócio jurídico, pode haver a atividade de mediadores, que nem sequer se
têm como presentes, de procuradores, que representam os interessados, e do corretor, que está presente ao que
acordam, pelos representados, os procuradores.

4. CERTIDõES E ATESTADOS. Devido à sua função declarativa, o corretor dá certidão do que consta do seu
protocolo, referindo-se a êle. Certifica o que consta do seu protocolo, e do seu protocolo constam todos os
negócios jurídicos que o corretor, ou seu preposto, deu como concluídos. O corretor tem dois livros:
o)o caderno manual, no qual se lança o que se vai considerando como concluído; b) o protocolo, que é a cópia
do caderno manual, diàriamente feita, “por extenso e sem emendas, rasuras, entrelinhas, transposições e

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abreviaturas, guardada a ordem da numeração, sob a qual existirem as operações escrituradas no caderno
manual, e mencionando-se os nomes do comprador, do vendedor, a natureza, o preço, o prazo e tôdas as
condições das operações”. A propósito do caderno manual,apertas se exige a verdade sobre a declaração da
conclusão conforme a conheceu o corretor, ou seu preposto (no Decreto n. 2.475, de 18 de março de 1897, art.
52, referente aos corretores de fundos públicos, diz-se: “transações realizadas pelo corretor ou por seu
preposto”, o que é de má redação, porque corretor, ou preposto de corretor, não é procurador, nem é
comissionário). O Decreto n. 2.475, art. 52, exige “tôda a clareza e individuação, a fim de proporcionar noção
exata da operação realização
(Quanto aos livros, teremos de tratar, à parte, dos livros dos corretores oficiais.)
No Código Comercial, art. 47, diz-se: “O corretor é obrigado a fazer assento exato e metódico de tôdas as
operações em que intervier, tomando nota de cada uma, apenas fôr concluída, em um caderno manual
paginado”, O caderno manual é para o lançamento do que se passa, a cada momento, sem que se possa quebrar
a sucessividade; donde o que diz, logo após, o art. 48: “Os referidos assentos serão numerados seguidamente
í,ela ordem em que as transações forem celebradas, e deverão oca g” tr o nome das pessoas que nelas
intervierem, as qualidades, quantidade e preço dos efeitos que fizerem o objeto da negociação, os prazos e
condições dos pagamentos, e tôdas e quaisquer circunstâncias ocorrentes que possam servir para futuros
esclarecimentos”.
Ainda a respeito do caderno manual, diz o Código Comercial, art. 50: “Os assentos do caderno manual deverão
ser lançados diâriamente em um protocolo, por cópia literal, por extenso, e sem emendas nem interposições,
guardada a mesma numeração manual. O protocolo terá as formalidades exigidas para os livros dos
comerciantes no art. 13; sob pena de não terem fé os assentos que nêle se lançarem, e de uma multa
correspondente à metade da fiança prestada. O referido protocolo será exibível em Juízo, a requerimento de
qualquer interessado, para os exames necessários, e mesmo oficialmente por ordem dos juizes e Tribunais do
Comércio (arts. 19 e 20)”. São textos que se têm de ler com a necessária modernização.
Diz na Lei n. 2.116, de 29 de dezembro de 1953, o art. 42:
“Os corretores de valôres poderão ter dois protocolos, um para registo de títulos e outro para câmbio,
escrituráveis por cópia e ambos com fé pública, desde que revestidos das formalidades lega~5”.
As certidões são tiradas do protocolo, e não do caderno matinal. Diz o Código Comercial, art. 46: “Nenhum
corretor pode dar certidão senão do que constar do seu protocolo e com referência a êle (art. 52) ; e somente
poderá atestar o que viu ou ouviu relativamente aos negócios do seu ofício, por despacho de autoridade
competente; pena de uma multa correspondente a 10% da fiança prestada”. A 2,a parte do art. 46 não concerne à
certidão, porque só se certifica o que consta do escrito. O atestado, aí, é comunicação de conhecimento, que o
corretor, ou o seu preposto, pode fazer, quanto ao que viu ou ouviu relativamente aos negócios do seu ofício.
Não pode atestar quanto ao que viu ou ouviu no tocante aos negócios jurídicos que se concluíram, ou que não
se concluíram, inclusive quanto a pagamentos, se não há prévio despacho do juiz a que esteja entregue a
cognição da espécie.
Vê-se no art. 46 do Código Comercial quanto importa a distinção entre certidão e atestado.
Ainda se lê no Código Comercial, art. 49: “Nos assentos de negociações de letras de câmbio deverá o corretor
anotar as datas, têrmos e vencimentos, as praças onde e sobre que foram sacadas, os nomes do sacador,
endossadores e pagador, e as estipulações relativas ao câmbio, se algumas se fizerem (art. 885). Nos negócios
de seguros é obrigado a designar os nomes dos seguradores e do segurado (art. 667, n. 1), o objeto do seguro,
seu valor segundo a convenção, lugar da carga e descarga, o nome, nação e matrícula do navio e o seu porte, e o
nome do capitão ou mestre”.
Estatui o Código Comercial, art. 51: “O corretor, cujos livros forem achados sem as regularidades especificadas
no art. 50, ou com falta de declaração de alguma das individuações mencionadas nos arts. 48 e 49, será
obrigado a indenizar as partes dos prejuízos que daí lhes resultarem, multado na quantia correspondente à
quarta parte da fiança, e suspenso por tempo de três a seis meses; no caso de reincidência será punido com a
multa de metade da fiança, e perderá o oficio. No caso, porém, de se provar que obrou por dolo ou fraude, além
da indenização das partes.perderá tôda a fiança, e ficará sujeito á ação criminal que possa competir”.
Tem~se de ler o art. 51 do Código Comercial com a modernização que se impõe. Está em vigor e não só se
refere ao corretor oficial, mas sim ao corretor oficial e ao matriculado. Uma vez que há o dever de ter livros, há
a fé pública para as certidões e os atestados. Em conseqUência, incide, se há os pressupostos, o art. 51 do
Código Comercial.
5.ATOS COMERCIAIS DE CORRETAGEM. São atos de corretagem comercial: a) a intervenção em

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quaisquer negócios jurídicos comerciais e em operações mercantis; privativainente, em bôlsa de mercadorias


(Decreto n. 20.882, de 30 de dezembro de 1931, art. 3.0: “Os negócios em Bôlsa só poderão ser realizados por
intermédio dos corretores de mercadorias ou seus respectivos prepostos, e somente a êstes será permitido o
ingresso na parte do recinto destinado ao pregão de compra-e-venda”), ou quando se tratar de títulos cotados ou
suscetíveis de serem cotados em Bôlsa (Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1939, art. 1.0: “As operações
sobre títulos de Bôlsa serão efetuadas exclusivamente por intermédio dos corretores e em público pregão”; b) as
vendas públicas de gêneros e mercadorias em depósito nos armazéns gerais (Lei n. 1.102, de 21 de novembro
de 1903, art. 28, § 2.0: “É livre aos interessados escolher o agente de venda dentre os conetores ou leiloeiros da
respectiva praça”) ; e) a venda de mercadorias abandonadas nos armazéns gerais (Lei n. 1.102, art. 10, § 1.0,
alínea 2.a:
...... por corretor ou leiloeiro . . .“) ; d) a venda de mercado-
-rias se há warrant (Lei n. 1.102, ad. 23, § 19: “O portador tio warrant fará vender em leilão, por intermédio do
corretor, ou leiloeiro, que escolher, as mercadorias especificadas no titulo, independente de formalidades
judiciais”) ; e) a compra-e-venda e transferência de quaisquer fundos públicos nacionais ou estrangeiros (Lei n.
354, de 16 de dezembro de 1895, art. 39, a)
/) a negociação de empréstimos por meio de obrigações (Lei n. 354, art. 3.~, b e e) ; g) câmbio, salvo a
legislação especial, e a compra-e-venda de metais preciosos, amoedados ou em barra (Lei n. 354, art. 39, d),
conforme o que estabelece a legislação vigente; h) os fretamentos, respectivas cotações e engaJamentos
(Decreto n. 806, de 26 de julho de 1851, ad. 28,; Decreto n. 19.009, de 27 de novembro de 1929, art. 14, § 19) ;
i) a agência de seguros marítimos (Decreto n. 806, art. 28, § 39; Decreto n. 19.009, art. 14, § 2.0).
A intervenção dos corretores, sejam ou não comerciantes, em negócios jurídicos civis, não constitui sempre ato
de comércio; e. g., se servem de intermediários para alienação ou aquisição de imóveis, desde que não se trate
de negócio jurídico comercial. O negócio jurídico, que se tem por fito, é que, no direito brasileiro, de regra,
determina se é civil ou se é comercial o ato de corretagem. Isso não quer dizer que o corretor de imóveis que
exerça a atividade por profissão habitual não seja comerciante, tanto mais quanto é obsoleta a regra jurídica que
pré-excluia a comercialidade dos negócios jurídicos sobre imóveis, se os pressupostos subjetivos se compõem.

§ 4.733. Natureza do negócio jurídico de corretagem

1.UNILATERALIDADE OU BILATERALIDADE OU PLURILATERALIDADE. O contrato de corretagem


pode ser contrato unilateral (só o que outorga se faz devedor e obrigado), ou bilateral (outorgante e outorgado
devem e são obrigados), ou plurilateral. Por êle, o outorgante fica vinculado a pagar ao corretor remuneração
(dita comissão; melhor, corretagem) pela comunicação de quando e de como pode concluir contrato, ou de
como pode outorgar poder de intermediação, aí sem representação, ao corretor. O elemento de serviço ou de
obra que entra no contrato de corretagem não lhe tira a característica, se criados o dever e a obrigação de
desenvolver atividade e de comunicação, para se poder ter o ensejo de negociação: bilateraliza-se o contrato,
quebrando-se a unialteralidade, ou ao lado dessa (C. E. RIESENFELD, Der Civilmakler. Gruchots Reitrãge, 37,
277 e 847;
W.REULINO, Provisionsanspriicke, 40, 193; E. RIEZLER, Der Werkvertrag, 91; H. SIBEIt, Der Reehtszwang,
48 s.). Pela bilateralidade, sempre, mesmo se não ocorre dever e obrigação por parte do corretor: C. CROME
(fie partiarischen RechtsgesehÉtf te, 45; System, II, 709), F. SCHOLLMEYER (Recht der Schuldverhdltnisse,
118), PAUL OERTMANN (Das Recht der Schuldverhdltnisse, 759 s.) e OTTO voN GÍnKE (Deutsches
Privatrecht, III, 709). Se o corretor não assume o dever de desenvolver atividade, a fim de poder informar o
outorgante, a sua prestação de informar é que determina o direito a receber remuneração. Isso não quer dizer
que, sendo unilateral o contrato, fique vinculado, não pode praticar atos contrários aos interesses do outorgante,
tem dever de discrição, não pode, de má fé, com dano para o outorgante, suspender a atividade que
voluntariamente começou, nem pode usar essa atividade para informar a outrem, com dano para o outorgante.
Se o corretor assume o dever de desenvolver atividade necessária à obtenção do informe e de informar, ou a
prestar o informe que já tem, bilateraliza-se o contrato de corretagem. A opinião que sustenta desnaturar-se,
com a bilateralização, o contrato, tornando-se, apenas, contrato de serviços, parte de que: a) o contrato ou e de
corretagem ou é de serviço; 6) não se pode pensar em incidirem as regras jurídicas sobre corretagem e,
subsidjâriamente, as regras jurídicas sobre contrato de serviços.
A opinião que admite o contrato bilateral de corretagem redarguiu: a) a inserção do elemento contraprestacional
não é suficiente para desclassificar o contrato, tornando-o só de serviços; b) nenhum óbice existe para que se

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nâo atendam, em primeira plana, as regras jurídicas sobre corretagem. A opinião que somente vê bilateralidade
no contrato de corretagem tem o grave defeito inicial de não atender a que há, na teoria e na vida, corretagem
sem dever de contraprestação, pôsto que sejam raros s~o os contratos unilaterais de corretagem.
Dentre os que admitem a bi1atera1ização do negócio jurídico de corretagem, em vez da bilateralidade, está L.
ENNECCEmis (Lelzrbuch, g1•a~35•a ed., II, 515), que via na promessa de atividade, não de resultado, o
elemento contraprestaçâo, mas tal bilateralizacâo seria, segundo êle, desnaturadora, a despeito das
contraditórias concessões da nota 5. Contra, com tôda a razão, Oro VON GIERRE (Deutsehes Privatrechi, li,
709).

2.CONTRATO DE CORRETAGEM E ESPÉCIES AFINS. Se há negócio jurídico sobre comunicação de


algum negócio jurídico, que alguém tenha de concluir, há contrato de corretagem. Mas, se há prazo
indeterminado para essa atividade, o negócio jurídico é, de regra, contrato de agência, e nâo com-trato de
corretagem; tal contrato Agenturvertrag rege-se pelas regras jurídicas do contrato de serviços (KÂRL SaBER,
.7. v. Staudingers Kommentar, II, 2, 7.%.3.~ ed., 1222
OTTO WARNEYER, Komrnentar, 1, 1068). A corretagem supõe biforme a ser dado, ainda que na ocasião; não
se trata como corretor o que deu, nem ser incumbido, o informe de que resultou o negócio jurídico que se
desejava (DOERE, Der Mãklervertrag, Seufferts Bltitter, 70, 622) quem remunera informe já entregue, sem ter
havido, antes, corretagem, não constitui contrato de corretagem. Se o corretor assumiu o dever de informar, mas
para só ser pago após os resultados, o elemento que se insere ~o contrato é o de serviço, e não o de obra; se foi
prometida a atividade de informação sem se exigir o resultado, o contrato de serviços é evidente, sem se poder
pensar em corretagem (OTTO WALINEYER, Komment ar, 1, 1068), ou apenas houve mediação. Se se promete
atividade e resultado, o elemento que se insere é o de obra (Mdklerwerkvertrag, empreitada de intermediação),
de modo que são as regras jurídicas da empreitada que subsidiam.
O contrato entre o corretor e o subcorretor é contrato especial, que não se pode considerar de sociedade, nem de
serviço, nem de corretagem. O agente de teatros e de concertos é corretor, se atende a pedidos de informações
(KARL KOBER, 1. v. Staudingers Iommentctr, 1, 1069) e satisfaz os outros pressupostos.
As considerações que acima fizemos são em geral. Ao tratarmos dos corretores oficiais, teremos de mostrar que
a exciusividade e o múnus os tornaram espécie à parte, digna de exposição pormenorizada.
A confusão entre manifestar a vontade em nome próprio e não revelar o nome do figurante leva alguns juristas
à conclusão de que, devido ao dever de segrêdo profissional, o corretor negocia em nome próprio. De modo
nenhum.
A afirmação de se tratar de comissionário assaz difundida nos meios jurídicos (e. g., como se não houvesse
discussAo possível, R. CORnIER, Des Opérations sur titres dans les banques, 138) tem de ser repelida. O
figurante do negócio jurídico é o iuicumbente, e não éle. Pode-se figurar, sem que se saiba. Alguém sabe: o
corretor. Talvez, por ter tido necessidade de investigar, a Câmara Sindical. É grave êrro pensar-se que o
figurante tem de ser conhecido, ou de ter o nome no próprio recibo. A grande maioria dos negócios comerciais é
sem que se saiba quem compra. Não se pergunta. Pode ter sido o próprio comprador, pode ter sido o procurador,
o mandatário, o preposto, o núncio, o menor absolutamente incapaz. No negócio jurídico, dois figuram: o
comprador e o vendedor. Nas casas comerciais, sabe-se quem vende; pode não se saber quem compra e quase
sempre é o que ocorre. Na rua, com os vendedores ambulantes, por vêzes não se sabe quem compra, nem quem
vende. Mas os dois figurantes juridicamente existem.

§ 4.734. Contrato de corretagem e certos contratos

1. CORRETAGEM E MEDIAÇÃO . No sistema jurídico brasileiro, o contrato de corretagem é contrato


nominado (Código Comercial, arts. 36-67). O contrato de mediação é inominado.
Alguns acórdâos referem-se ao contrato de mediação, evitando o nome de corretagem (e. g., t~ Câmara Civil
do Tribunal de Apelação de São Paulo, 14 de junho de 1989, .1?. dos 2’., 121, 188; 1.~ Câmara Civil, 18 de
março de 1948, 176, 288; Tribunal de Justiça de São Paulo, 16 de março de 1954, 224, 186).
Quando se diz que o corretor não intervém, sempre, para o contrato, para o qual se lhe exige o trabalho técnico,
reduz-se-lhe a figura à do corretor-indicante, ou à do mediador. O mediador, sim; se há a sua inclusão no
suporte fáctico do contrato, não é mediador. Da! ter errado o Tribunal de Justiça de SAo Paulo, a 21 de
fevereiro de 1896 (G. .1., II, 229), quando disse aplicáveis à mediação que Ale chamou corretagem civil as
regras jurídicas sobre o mandato. As regras jurídicas do mandato não incidem em contrato de mediação, nem de

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corretagem civil. A referência do art. 88, in fine, do Código Comercial ao mandato é para a imposição da pena a
quem faz corretagem, depois de se matricular, se nâo presta a promessa de bem servir, antes de entrar em
exercício.

2.CONTRATO DE CORRETAGEM E COMISSÃO. O contrato de corretagem de modo nenhum se confunde


com o contrato de comissão. O comissionário é figurante; o corretor, mesmo quando intervém, sem que revele
o nome do figurante, ou os nomes dos figurantes, não.
3.CORRETAGEM E LOCAÇÃO. O corretor é remunerado pelo resultado. O locador de obra ou de serviço,
pela obra nu pelo serviço.

§ 4.735. Espécies de corretores e funções específicas

1.ESPÉCIES DE CORRETORES QUANDO LIGAÇÃO AO ESTADO.


O Estado ligou a si os corretores cujas funções entendeu que haviam de ser públicas, lato senso. A outros
apenas exigiu a matrícula. Terceira classe é a dos corretores livres, corretores que não são, sequer, matriculados.

2.CORRETORES PÚBLICOS. São oficiais os corretores, nomeados, a que se atribuem funções a respeito de
negócios jurídicos que o Estado considera de importância para o tráfico, no tocante ao interesse público,
inclusive, às vêzes, da próprio Estado. Tais são, por exemplo, os corretores de fundos públicos, os corretores de
navios e os corretores de certas mercadorias.

3.CORRETORES MATRICULADOS. Matriculados são os corretores que obtiveram a matrícula na Junta


Comercial. Sâo comerciantes, sem terem a oficialidade dos corretores nomeados pela autoridade estatal, que
são os de fundos públicos, os de navios (Decreto ri. 2.475, de 18 de março de 1897, ad. 3•O; cf. Código
Comercial, art. 67; Decreto n. 19.009, de 27 de novembro de 1929, art. 2.0; cf. Código Comercial, arts. 36 e 89)
e os ligados a Bôlsas.

4.CORRETORES LIVRES. Corretores livres sào os corretores que não se matricularam. Os seus atos s~o
objetivamente de corretagem, o que depende da classificação, que se faça, dos seus atos de intermediação.
Lê-se no acórdão da 3•a Câmara Civel do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, a 21 de junho de 1957 (1?.
J., 88, 302)
“Em face da nossa legislação pode exercer a corretagem livre de imóvel tôda pessoa maior e capaz, não se
exigindo outro requisito senão aquêles indispensáveis ao exercício do comércio, isto é, capacidade e
maioridade. O corretor de imóvel não está sujeito a registo, nem a despesas fiscais”.

5.FÉ PÚBLICA. O correto> matriculado do Código Comercial é comerciante matriculado, com os deveres e
os poderes do art. 52, 1a alínea, do Código Comercial: “Os livros dos corretores que se acharem sem vicio nem
defeito e regular-mente escriturados na forma determinada nos arts. 48, 49 e 50. terão fé pública”.
Acrescenta-se no ad. 52, alínea 2~a, do Código Comercial:
“As certidões extraídas dos mesmos livros com referência àfôlha em que se acharem escrituradas, sendo pelos
mesmos corretores subscritas e assinadas, terão fôrça de instrumento público para prova dos contratos
respectivos (art. 46), nos casos em que por êste Código se não exigir escritura pública, ou outro gênero de prova
especial”. Na alínea S.a: “O corretor que passar certidão contra o que constar dos seus livros incorrerá nas
penas do crime de falsidade, perderá a fiança por inteiro, e será destituído”. “Fiança”, diz-se; leia-se, hoje,
“caução”.
(No art. 52, alínea 2•a, do Código Comercial, de má redação, fala-se de certidões “escrituradas”, o que não se
poderia admitir. A certidão é do que está escriturado. Deve-se ler: “com referência à fôlha em que as operações
se achem escrituradas”.)
Os corretores livres prestam depoimentos, como testemunhas. Não passam certidões, nem atestados.

6.TRADUÇÕES PELOS CORRETORES DE NAVIOS. Lê-se no Código Comercial, ad. 62: “Aos corretores
de navios fica permitido traduzir os manifestos e documentos que os mestres de embarcações estrangeiras
tiverem de apresentar para despacho nas Alfândegas do Império. Estas traduções, bem como as que forem feitas

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por intérpretes nomeados pelos Tribunais do Comércio, terão fé pública; salvo às partes interessadas o direito
de impugnar a sua falta de exatidão”.
Acrescenta o art. 68: “Aos corretores de navios que nas traduções de que trata o artigo antecedente cometerem
êrro ou falsidade de que resulte dano às partes, são aplicáveis as disposições do art. 51”.
Estabeleceu o Código Comercial, art. 64: “Os Tribunais do Comércio, dentro dos primeiros seis meses da sua
instalação, organizarão uma tabela de emolumentos que aos corretores e intérpretes competem pelas certidões
que passarem. Tôda a corretagem, não havendo estipulação em contrário, será paga repartidamente por ambas
as partes”.
Há, hoje, tradutores públicos, cujas funções podem ir até ai. As referências a Tribunais do Comércio são
obsoletas. O assunto é versado a respeito dos corretores oficiais quando nos referirmos a cada espécie e às
Câmaras Sindicais.

CAPITULO II

PRESSUPOSTOs E EFICÁCIA DO CONTRATO DE CORRETAGEM

§ ‘L736. Pressupostos para o contrato de corretagem

1.CAPACIDADE PARA SER CORRETOR. Para ser corretor é de exigir-se maioridade, não bastando o
suplemento de idade. No Código Comercial, art. 36, exigia-se a idade de vinte e cinco anos, o que se repetiu no
art. 40, b), do Decreto n. 2.475, de 13 de março de 1897 (corretores de fundos públicos). No Decreto n. 19.009,
de 27 de novembro de 1929 (corretores de navios), o art. 3Y, inciso 1.0, falou de “maioridade”; portanto, vinte e
um anos. No Decreto n. 20.881, de 30 de dezembro de 1931, art. 20, a), diz-se ser necessário ter vinte e um
anos, no mínimo. Não há mais razão para se exigir a idade de vinte e cinco anos. O art. 86 do Código
Comercial, com o art. 4•O, b), do Decreto n. 2.475, tem de ser considerado obsoleto. Não se é de vinte e um
anos”. compreenderia que não pudesse ser corretor de títulos quem o pode ser de navios e de mercadorias. Dai a
regra jurídica da Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, art. 8.0, § 3.0:
“A idade mínima para a nomeação para o cargo de corretor Quanto à nacionalidade, para qualquer corretor
oficial é necessário ser Brasileiro (Decreto n. 2475, art. 4Y, a>; Decreto n. 20.881, arts. 20, § 1.0, e 21, a), ou,
em se tratando de corretor de navios, Brasileiro nato (Decreto n. 19.009, ad. 8.~, inciso 1.0).
O domicílio no lugar por mais de um ano é pressuposto necessário a todos os corretores oficiais e matriculados
(Código Comercial, art. 86, 2.a parte; Decreto n. 2.475, art. 6.0, b).

Se o corretor não é oficial, a nacionalidade brasileira não é exigida.


Em geral, não podem ser corretores os que não podem ser comerciantes, os corretores uma vez destituídos e os
falidos não reabilitados, afeiçoando-se o texto do Código Comercial, art. 37, incises 1, 3 e 4, ao direito vigente,
pois as mulheres não mais podem ser pré-excluídas (o art. 37, inciso 2, foi derrogado, por ofensa ao art. 141, §
19, da Constituição de 1946, cf. arts. 131, 138 e 184). Veja Comentários à Constituição de 1946, V, 3a ed., 413
s. Quanto à reabilitação do falido, leia-se o que escrevemos no Tomo XXX, § 3.545.
A Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, art. 3•0, § 39, estatui, a respeito de quaisquer corretores oficiais:
“A idade mínima para a nomeação para o cargo de corretor é de vinte e um anos”.
O art. 59, b), do Decreto n. 2.475, de 13 de março de 1897 (Regulamento dos Corretores de Fundos Públicos),
que pré-excluia as mulheres, era contrário à Constituição de 1946, art. 141, § 1.% como às de 1891, 1984 e
1987. Certos, o Decreto n. 20881, de 30 de dezembro de 1931 (corretores de mercadorias), art. 21, e o Decreto
n. 19.009, de 27 de novembro de 1929 (corretores de navios), art. 89.
2.MATRÍCULA E NOMEAÇÃO. No Código Comercial, art. 88, diz-se: “Todo o corretor é obrigado a
matricular-se no Tribunal do Comércio do seu domicílio; e antes de entrar no exercício do seu ofício prestará
juramento de bem cumprir os deveres perante o presidente, podendo ser admitidos a jurar por procurador os
corretores das praças distantes do lugar onde
o Tribunal residir: pena de uma multa correspondente a dez por cento da fiança que houver prestado, e de que a
sua gestão só produzirá o efeito de mandato”. A obsolência é evidente.

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Os corretores ou são os livres (não matriculados), ou os matriculados (que em verdade são corretores livres que
se matricularam), ou os oficiais, que são de nomeação governamental.
Os corretores que não são oficiais, nem matriculados, podem ser simples comerciantes. A atividade que
exercem escapa ao ao art. 59 do Código Comercial, onde se lê: ‘¶~ proibido aos conetores: 1. Tôda a espécie de
negociação e tráfico direto ou indireto, debaixo de seu ou alheio nome; contrair sociedade de qualquer
denominação ou classe que seja, e ter parte ou quinhão em navios ou na sua carga; pena de perdimento do
ofício, e de nulidade do contrato. 2. Encarregar-se de cobranças ou pagamentos por conta alheia; pena de
perdimento do ofício.
3. Adquirir para si ou para pessoa de sua família coisa cuja venda lhes fôr incumbida ou a algum outro corretor,
ainda mesmo que seja a pretexto do seu consumo particular; pena de suspensão ou perdimento do ofício, a
arbítrio do Tribunal, segundo a gravidade do negócio, e de uma multa correspondente ao dôbro do preço da
coisa comprada”.
(Acima dissemos “simples comerciantes”. t o que acontece se há profissionalidade habitual. ~ possível que se
tenha de classificar como de corretor a figura do intermediário a que faltam os pressupostos para ser tido como
comerciante.)
A respeito dos corretores matriculados, o texto do art. 59 do Código Comercial tem de ser entendido com as
variações concernentes aos corretores oficiais. Não se justificaria que aos corretores não-oficiais, matriculados,
mais se limitasse a atividade do que aos oficiais.
Preliminarmente, a vedação do art. 59, inciso 1, g~a parte do Código Comercial só se entende com os
corretores de navios (Decreto n. 19.009, de 27 de novembro de 1929, art. 15, inciso 1.0). Não se justifica que o
corretor não possa adquirir para si ou para sua família, se outro corretor é que opera (o Decreto n. 2.475, de 13
de março de 1897, art. 49, e) ; Decreto n. 19.009, de 27 de novembro de 1929, art. 15, onde aliás se proibe
“intervir em negociações entaboladas por outro correto?’, o que é outra coisa; Decreto n. 20.881, de 80 de
dezembro de 1931, art. 39, e).
Adverte o Código Comercial, art. 60: “Na disposição do nrtigo antecedente não se compreende a aquisição de
apólices da Dívida Pública, nem a de ações de sociedades anônimas, das quais, todavia, não poderão ser
diretores, administradores, ou gerentes, debaixo de qualquer título que seja”.A propósito dos corretores de
fundos públicos, diz o Código Comercial, art. 39: “A petição para matrícula deve declarar a naturalidade e
domicílio do impetrante, o gênero de comércio para que requer habilitar-se, e a Praça onde pretende servir de
corretor; e ser instruída com os seguintes documentos originais: 1. Certidão de idade. 2. Título de residência,
por onde mostre que se acha domiciliado há mais de um ano na Praça cm que pretende ser corretor. 3. Atestado
de haver praticado o comércio sobre si, ou em alguma casa de comércio de grosso trato, na qualidade de sócio-
gerente, ou pelo menos de guarda-livros ou primeiro agente, ou de algum corretor, com bom desempenho e
crédito. Passados cinco anos, a contar da data da publicação do presente Código, nenhum estrangeiro não
naturalizado poderá exercer o ofício de corretor, ainda que anteriormente tenha sido nomeado, e se ache
servindo”.
Acrescenta o art. 40: “Mostrando-se o impetrante nas circunstâncias de poder ser corretor, o Tribunal o admitirá
a prestar fiança idônea; e apresentando certidão autêntica de a ter prestado lhe mandará passar patente de
corretor, procedendo-se aos mais têrmos dispostos no art. 6.0 para matricula dos comerciantes”. Hoje, não há
mais a fiança. E dizia o ad. 41: “A fiança será prestada no cartório do escrivão do juiz do comércio do domicílio
do corretor. Os Tribunais do Comércio, logo que forem instalados, fixarão o quantitativo das fianças que devem
prestar os corretores, com relação ao giro das transações comerciais das respectivas praças; podendo alterar o
seu valor por uma nova fixação sempre que o julgarem conveniente”. Previa o art. 42: “Na falta de fiança, será
o habilitante admitido a depositar a sua importância em dinheiro ou apólices da Dívida Pública, pelo valor real
que estas tiverem ao tempo do depósito. Se no lugar onde deva prestar-se a fiança não houver giro de apólices
da Dívida Pública, poderá efetuar-se o depósito na Praça mais próxima onde elas girarem”. O Decreto n. 882,
de 18 de outubro de 1890, ad. 10, e o Decreto n. 2.475, de 13 de março de 1897, art. 89, revogaram o art. 42 do
Código Comercial. Lê-se no art. 8.0 do Decreto n. 2.475: “A caução do corretor só poderá consistir:
a) em dinheiro; b) em apólices da divida pública da União, dos Estados e da Municipalidade do Distrito
Federal; c) em letras do Tesouro Federal; d) em letras hipotecárias emitidas por bancos de crédito real com sede
no Distrito Federal”. No parágrafo único acrescenta-se: “As apólices da dívida pública federal serão recebidas
pelo valor nominal; as dos Estados, as da Municipalidade do Distrito Federal e as letras hipotecárias, pelo valor
médio das três últimas cotações oficiais. Ao Ministro da Fazenda compete determinar a espécie em que deve ser
prestada a caução”. Cf. Tribunal de Justiça da Bahia, 19 de maio de 1925 (E. de R, 79, 470). Estabelece o art.

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43: “A fiança será conservada efetivamente por inteiro, e por ela serão pagas as multas em que o corretor
incorrer, e as indenizações a que fôr obrigado, se as não satisfizer imediatamente quem nelas fôr condenado,
ficando suspenso enquanto a fiança não fôr preenchida”. Ainda o Código Comercial, art. 44: “No caso de
morte, falência ou ausência de algum dos fiadores, ou de se terem desonerado da fiança por forma legal (art.
262), cessará o ofício de corretor enquanto não prestar novos fiadores”.
Em todos êsses textos entenda-se “caução”, em vez de “fiança”.

3. FORMA DE CONTRATO. O contrato de corretagem não está sujeito a forma especial; ainda que se refira a
bens imóveis (Código Civil, art. 134, II; cf. L. ENNECCERUS, Lehrbuch, II, 516; O. WARNEYER,
Kommentar, 1, 1069). Pode ser tácita a conclusão do contrato de corretagem, como se o interessado vai ao
escritório do corretor, pede ao empregado as fichas de informação para ler e copiar uma delas e diz o que quer.

§ 4.737. Eficácia do contrato de corretagem quanto ao corretor

1.EFICÁCIA EM GERAL DO CONTRATO. a) Nos contratos de corretagem, unilaterais ou bilaterais, tem o


corretor o dever de pautar por princípios de boa fé a sua atividade, de modo a facilitar ou possibilitar a
conclusão do negócio jurídico, sem agravar a futura situação daquele que o incumbiu da corretagem. Daí
também resulta o seu dever de comunicação quanto ao que precise ser comunicado desde logo, ou às mudanças
de circunstâncias (e. g., insolvência, retraimento, doença grave, casamento, ou viUvez do terceiro, se êsses fatos
podem influir no andamento ou no bom êxito das confabulações) -Alguns juristas entendem que tais deveres
fazem bilateral, de si sós, o contrato de corretagem, sem atenderem a que não é isso contraprestação do corretor.
Contra tal opinião sustentada por E. RIEZLER (Der Werkvertrag, 91), estêve sempre L. ENNECCERUS
(Lehrbuch, II, 517).

A função do corretor contribui para a nivelação dos preços. Para os corretores confluem os clientes, de modo
que há concentração de ofertas, ofertas de adquirir e ofertas de alienar. Só o elemento tempo passa a diferenciar,
nos negócios jurídicos concluídos, o que é oferta e o que se há de considerar aceitação. O corretor entabula,
verifica o que é oferta de adquirir (ou de alienar) a que corresponde oferta de alienar (ou de adquirir). O seu
dever de custódia é quanto a amostras, a títulos, a elementos indispensáveis à liquidação das operações. Tem o
dever de informações verdadeiras e exatas. Assiste à assinatura dos negócios jurídicos, se é preciso. Se entrega
nota em branco com o nome de um figurante, o outro figurante, que com ela fica, procede como satisfeito com
a prova.
li>) Se o contrato impõe, com prazo ou não, atividade positiva, precisa, ao corretor, com o dever de informar, já
a figura <ia contraprestação aparece. Até onde se estende ela, di-lo e’ teor do contrato, ou o elemento
circunstancial, ou o uso do tráfico, que aliás se cifra na recepção e transmissão de ofertas dos terceiros.
Qualquer adendo há de resultar do teor do contrato ou do exame das circunstâncias. O dever de informar é,
então, conforme o de atividade, mas supõe exatidão e boa fé em comunicar. Responde pelas omissões quanto ao
dever de atividade e de informação. Se se substitui alguém na atividade ou na informação, o que, na dúvida, se
entende permitido, responde pela culpa dessa pessoa como da própria. (Note-se que, se se tratasse de contrato
de serviço, não se poderia, na dúvida, admitir a substituição.)
c)Discute-se se o corretor pode aceitar ser corretor do outro contraente, ou oferecer-se como tal. Não há
princípio que se oponha a isso; só a lex specialis pode estabelecer proibição, ou modo de pagamento da
comissão pelos dois interessados. Todavia, se há outorga de poder de comissão, ou de mandato, é de interpretar-
se que se pré-excluiu, negocialmente, no próprio contrato de corretagem, a dupla função. Se é o corretor que
contrata, não tem direito à corretagem (O. WARNEYER, Kom’inent ar, 1, 1070). Por onde se vê quanto pode
perturbar a figura jurídica do contrato de corretagem a inserção de elementos de outros contratos ou de outorgas
unilaterais de poder.
O corretor assume, profissionalmente, a intermediação. Tal é a regra, sem que se afaste a possibilidade de
corretagem ocasional (xxx sem habitualidade). Oferece atividade, ou invita o público, grupo, ou pessoa, a que
faça a oferta, para que ele atue até à conclusão do negócio jurídico, ou apenas informe e aproxime, o que faz da
figura simples mediador. É o Naehweísmakler do direito alemão, à diferença do que intercede, que é Termittler.
Pode ocorrer que se não haja exigido a atividade do corretor. Ésse é o contrato puro de corretagem, no qual só

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assume dever. Ésse tem de pagar a comissão ou corretagem quando o contrato, que se deseja, se conclua, em
conseqUência da atividade do corretor. Deve-se pensar, portanto, em condição suspensiva para o incumbente e
a seu favor:só fica obrigado a pagar a comissão ou corretagem se e quando o contrato, que se esperava, se
conclui, devido ã atividade mesma do corretor.
Os corretores oficiais exclusivos têm o dever de operar, No momento em que o interessado os procura, êles
somente se podem recusar a aceitar a incumbência se há razão séria que a sua posição de titular de múnus
público permita.
Com tudo isso, o incumbente não ficou sem liberdade de ação própria. Pode êle concluir o contrato sem ser
pelas vias que o corretor lhe apontou, inclusive, se em tempo, pedir a ajuda de outro corretor.
Se o incumbente conclui contrato sem a colaboração do corretor, ou se resolve não mais contratar, a retribuição
não é devida. Para que haja indenização de gastos que o corretor fêz, é preciso que se haja convencionado sobre
a indenização.
Noutros têrmos: o corretor suporta os riscos de não se concluir o contrato, isto é, de não se chegar ao resultado
quê o incumbente queria. Em todo o caso, as circunstâncias podem compor promessa tácita ou silente do
incumbente, no tocante ao ressarcimento, O que se entende convencionado (o contrato de corretagem já existe)
é ser devida a comissão ou corretagem se o resultado foi alcançado.
A fixação do quanto da comissão ou corretagem é feita de conformidade com as tarifas oficiais, ou, se não a há
na espécie, conforme o uso do lugar, ou o uso entre o corretor e o incumbente. Tem-se, porém, de distinguir do
corretor-indicante (Nachweisrn~akler) o corretor-intercedente ou corretor-atuante (Vermiltier), porque o
importe pode não ser o mesmo.
Desde o momento em que o corretor dá por feito o negócio jurídico, conforme as suas notas, o que
imediatamente há de ser comunicado, o incumbente não mais pode fugir ao negócio jurídico, no qual note-se
bem êle, e não o corretor, foi o figurante. De modo que a atitude do incumbente para que não mais se conclua o
negócio jurídico, ou para que outro corretor seza o incumbido, tem de ser comunicada ao corretor. Trata-se de
manifestação de vontade receptícia.

2. SEGRÊDO E CORRETAGEM. O corretor está adstrito, em princípio, a segrêdo profissional. Se revela o


nome de quem faz oferta, ou de quem aceita, assim procede porque o quer. Quase sempre êle somente diz quem
ofereceu ou quem aceitou, depois (e estabelecida a ligação, e não há inconveniente nisso, porque as operações
são, de regra, à vista, e os corretores não precisam do privilégio especial que têm os comissionários, pois a sua
função é mecânica, instrumental.
Se o corretor também opera como comissionário, tem de precisar a estrutura dos seus negócios, para que se
possam invocar, com exatidão e pertinência, as respectivas regras jurídicas que hão de incidir. Adiante,
falaremos do art. 61 do Código Comercial.
Lê-se no Código Comercial, ad. 56: “É dever dos corretores guardar inteiro segrêdo nas negociações de que se
encarregarem; e se da revelação resultar prejuízo, serão obrigados a sua indenização, e até condenados à perda
do ofício e da metade da fiança prestada, provando-se dolo ou fraude”.

3.RESPONSABILIDADE ORDINÁRIA DOS CORRETORES. A intermediariedade da função do corretor não


o faz penetrar no negócio jurídico em lugar de algum dos figurantes, ou representando-o. Fica de fora. A sua
responsabilidade consiste na intervenção externa, pondo em ligação os interessados, O mediador põe os
interessados apenas em contacto: êles se tocam, e o mediador afasta as dificuldades, O corretor é como quem
faz encontraremse dois fios elétricos, O que ocorreu não foi o corretor que determinou, pôsto que, de fora,
tenha êle sido o causador do encontro. A verdade está em que êle fêz a ligação.
A responsabilidade ordinária do corretor não vai além da função que especificamente lhe incumbe. Em todo
negócio jurídico bilateral ou plurilateral, há as duas ou mais manifestações de vontade que se acordam, O
corretor não é figurante.
Nenhuma manifestação de vontade parte do corretor, nem êle a lança em nome de outrem, como o procurador.
Éle apenas examina quais as manifestações de vontade que poderiam acordar-se e põe em ligação duas ou mais,
que concluam o negócio juridico. Nem representa, nem faz os interessados manifestarem-se. Os interessados já
se manifestaram. Se dois ou mais ofereceram e só um poderia ser tratado como aceitante, o corretor tem de
escolher qual a oferta que se tem como aceita:
só uma o pode ser. esse é o momento em que mais acontece a volição, na intermediação do corretor, tal como
ocorreria se um só tivesse feito a oferta e dois ou mais pudessem ser tidos como aceitantes.

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O corretor foi buscado por A para a possível ligação de A com o ignorado E, que quer vincular-se, como A quer
que E se vincule. Mas pode ser (e quase sempre assim é) que ao corretor cheguem as ofertas de A, E, C e D e as
ofertas (enantiomórficas) de E, F e G, qualquer das quais serviria ao acôrdo com A, com E, com C, ou com D.
Não se pode negar que o corretor pode fazer a ligação entre A e E, ou entre A e F, ou entre A e G, ou entre E e
E, ou E e E, ou E e G, e assim por diante. ~ aí que está a mais perceptível diferença entre a atividade do corretor
e a do mediador, que não escolhe ligações, a seu alvitre.
Quem vai ao corretor e exprime o que deseja, com os pormenores necessários, quer beneficiar-se do fato
material da sua atuação, mas também da sua experiência e dos seus conhecimentos de ordem econômica e
financeira. Se o corretor comunica que fêz a ligação portanto, que se concluiu o negócio jurídico e em verdade
não existe o outro figurante, ou retirou, antes de se concluir o negócio jurídico, a manifestação de vontade que
lhe trouxera, ou é insolvável, responde pelos danos que daí provierem. Porém não houve o negócio jurídico.

Sempre que resulta algum dano da falta de comunicação oportuna do corretor ao cliente, a sua responsabilidade
é hoje indiscutível (no passado, negativamente, sem razão, G. TURLIN, JJes Courtiers eu marchandises eu
droit français, 76).
Lê-se no Código Comercial, art. 55: “Ainda que em geral os corretores não respondam, nem possam constituir-
se responsáveis pela solvabilidade dos contraentes, serão contudo garantes nas referidas negociações da entrega
material do titulo ao tomador e do valor ao cedente, e responsáveis pela veracidade da última firma de todos e
quaisquer papéis de crédito por via dêles negociados, e pela identidade das pessoas que intervierem nos
contratos celebrados por sua intervenção”.
A expressão exata não é “garante”. O corretor há de exigir a tradição dos títulos ou dos preços, para que, na
ocasião, os entregue. É responsável, porque da sua função decorre o dever e a lei o explícita. Não pode dar
como incluído negócio jurídico à vista sem que haja a prestação.
O corretor é responsável se a algum dos figurantes era proibida a operação e êle a deu por feita, ou se alguém
era incapaz, ou não tinha a titularidade suficiente, ou se, por êrro de interpretação, não se há de ter como
concluído o negócio jurídico. Tem-se de examinar o negócio jurídico, que se concluiu, para se saber qual a
sanção que lhe corresponde: a nulidade, a anulabilidade ou a ineficácia. O contrato de corretagem nada tem
com isso: o que pode acontecer, e de regra acontece, é que tenha havido inadimplemento, uma de cujas espécies
frequentes é o inadimplemento ruim.
Diz-se no Código Comercial, art. 53: “Os corretores são obrigados a assistir à entrega das coisas vendidas por
sua intervenção, se alguma das partes o exigir; sob pena de uma multa correspondente a 5% da fiança, e de
responderem por perdas e danos
No momento da tradição, o figurante examina o que adquiriu. Há todo o interesse em que o corretor que deu
como concluído o negócio jurídico assista à tradição da posse própria, tanto mais quanto é possível que esteja
com êle a posse imprópria imediata.
Acrescenta o Código Comercial, art. 54: “Os corretores são igualmente obrigados em negociação de letras, ou
de outros quaisquer papéis de crédito endossáveis, ou apólices. da Dívida Pública, a havê-los do cedente e a
entregá-los ao tomador, bem como a receber e a entregar o preço”.
Estatui o Código Comercial, art. 57: “O corretor que no exercício do seu ofício usar de fraude, ou empregar
cavilação ou engano, será punido com as penas do art. 51”.

4.RESPONSABILIDADE EXTRAORDINÁRIA (LEGAL OU CONVENCIONAL). Além da responsabilidade


ordinária, há a extraordinária, por especialidade de ofício ou lex specialis (responsabilidade legal), ou por fôrça
de pacto. Primeiramente, observemos que o corretor pode encarregar-se de ligar es figurantes, ainda que não se
refira aos nomes, de jeito que responde “como se” representante ou comissionário fôsse. Também pode tomar a
si a verificação dos bens em seus vícios objetivos, assumindo a responsabilidade. (Não dissemos que responde
como representante, ou como comissionário; mas sim “como se” representante ou comissionário fôsse.)
Quanto à insolvabilidade do incumbente ou do outro interessado no negócio jurídico, o corretor tem dever de
comunicar o que sabe ou deve saber, e pode ter responsabilidade por ter sido a falta de comunicação a causa da
invalidade ou da ineficácia do negócio jurídico. Porém o corretor não responde pela insolvabilidade dos
figurantes do negócio jurídico que resultou da corretagem. É preciso que se não confunda responsabilidade pela
insolvabilidade e responsabilidade pela falta de comunicação do que o corretor sabia ou devia saber sobre a

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situação econômica de qualquer dos figurantes. Mais: não pode êle, sequer, assumir, em cláusula contratual, ou
por pacto adjecto, a responsabilidade pela insolvabilidade dos figurantes. Lê-se nó Código Comercial, art. 61:
“Tôda a fiança dada por corretor em contrato de negociação mercantil feita por sua intervenção, será nula”. O
corretor não pode entenda-se ser garante negocial do figurante do contrato a que se destina a corretagem. Nula
é a fiança, em senso técnico e estrito. Nulo é o acôrdo de constituição de penhor, de caução, de hipoteca, ou de
anticrese, ou outro qualquer acôrdo para a sua responsabilização. Se o corretor avaliza, ou endossa (para fins de
garantia) algum título cambiário ou cambíariforme, ao figurante e a pessoa com quem estêve em contacto pode
opor a nulidade. Não, porém, segundo os princípios, a terceiros de boa fé.

§ 4.738. Eficácia do contrato quanto ao incumbente

1.EFICÁCIA EM GERAL DO CONTRATO. Se é válido e eficaz o contrato de corretagem e se se chega a


concluir o contrato que se queria, é devida a corretagem, salvo se já surgiu a pretensão, segundo o contrato,
desde que foi prestada a informação. Se, em vez do contrato, que se tinha por fito, outro se concluiu, que, a
contento dos interessados, tem o mesmo ou quase o mesmo resultado econômico (e. g., troca, em vez de venda:
pagamento em dólares, em vez de pagamento em cruzeiros), a corretagem é devida. Se, em vez do mútuo, que
se desejava, se obtém promessa de mútuo (pré-contrato de mútuo), sustentou HANS REICHEL (Die
Mãkierprovision, 18 s.) que já estaria devida a corretagem, por ser consensual o mútuo o que não seria verdade
no direito brasileiro. Todavia, não se pode entender, como
L.ENNECCERUS (Lehrbuch, II, 517, nota 6), que não possa bastar: depende de se saber se, sem o informe,
poderia o incumbente ter chegado a êsse resultado econômico aproximado, com o mesmo contraente, e, no caso
contrário, se houve tal resultado econômico. Aliás, êsse é o princípio a que se há de obedecer sempre que, em
lugar do contrato que se desejava, outro se conclui. Se o contrato, que deve ser puro e sem têrmo, só se concluiu
sob condição suspensiva ou a têrmo, a corretagem só é devida quando se realizar a condição, ou se alcançar o
têrmo. Se foi inserta cláusula convencional de resolução a favor do incumbente, a corretagem é devida, e não se
devolve; aliter, se a favor do outro contraente e se deu a resolução, caso em que se devolve se não foi atingido o
fim econômico (sem distinguir, PAUL OERTMANN, Das Reeht der Schuidverhaitnisse, 768; C. CROME,
Sijstem, II, 712; KONRAD COSACK, Lehrbuch, ~, 6Y ed., 624, 7A ed., 615; KARL KoBER, J. v. Staudingers
Kommentar, II, .2, 1235; pelo pagamento e devolução, se se realiza a condição resolutiva, salvo se, ainda assim,
foi atingido o fim econômico, e. g., HANS REICHEL, Die Mãkierprovision, 48 e 54 s.; L. ENNECCERUS,
Lehrbuck, II, 518, que o seguiu; e Oro vON GIERKE, Deutsekes Privatrech,t, TIL 714).
Quanto à pretensão à resolução por mora ou culpa do incumbente, a corretagem devida e paga não pode ser
repetida, nem deixa de ser devida se ainda não foi paga; idem, se por mora ou por culpa do outro contraente.
Quanto ao direito comercial de resolução e o pacto de retrovenda, sustenta HANS REICHEL (Die
Mãklerprovision, 60 s.) que, resolvendo o contrato a outra parte, não é devida a corretagem, ou se devolve, mas
seria tornar o corretor responsável, sem cláusula dei credere, pelo adimplemento do contrato por parte do
terceiro, o que é contra os princípios (cf. G. PLANCK, Kommentar, II, 684; PAUL OERTMANN, Das Rech,t
der Sehuidverhãltnisse, 764; 1<. KOBER, J. v. Staudingers Ko’mmentar, II, 2. 1284). A resolução legal é sem
influxo (Oro voN GmRXE, Deutsches Privatrecht, III, 515).

2. DEVER DE COMUNICAÇÃO . Ao corretor é outorgado poder de intermediar. O poder de representação já


seria plus. O corretor vinculou-se à atividade de corretagem; o oferente a terceiro fêz a oferta, e expôs-se à
conclusão do negócio jurídico. O acôrdo entre os clientes é direto, a despeito das atividades intermediatrizes e
declarativas do corretor. O cliente tem de confirmar a oferta, enquanto se há de considerar a sua manifestação
de vontade como a título eventual, salvo, pois, se a outorga foi a título definitivo. Aliás, a definitividade é mais
no sentido de ser dispensada a consulta que suscitaria a confirmação. Se o corretor avisa que não encontrou
quem possa ser aceitante, somente nOvo ato do oferente pode repetir não digamos “manter” a situação de
oferta.
A confirmação pode ser manifestação de vontade pelo silêncio, como se o corretor envia a comunicação com
prazo para a resposta, explicitando que terá o silêncio como confirmativo. Se foi exigida a confirmação escrita,
não há pensar-se em confirmação pelo silêncio.
O recebimento da comunicação do corretor pode ser por empregado do cliente. Não se justificaria que a má ou
deficiente organização interna da emprêsa pudesse causar prejuízo a terceiros.
Se os preços são instáveis, o corretor deve comunicar ao cliente o que pode conseguir, informando-o de que não

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é de afastar-se o que supõe se há retardamento na resposta.

3.RESPONSABILIDADE PELOS ATOS DOS PREPOSTOS. O corretor responde solidâriamente pelos atos
do seu preposto, mesmo se está licenciado; a fortiori, se designado como substituto (5.a Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 10 de fevereiro de 1950, li. dos 1’., 185, 876).
4.REMUNERAÇÃO DO CORRETOR. A remuneração pode ser em dinheiro, ou qualquer outra prestação.
Nada obsta a que só seja devida se obtido preço mínimo, ou seja devida variando com o preço obtido. Se o
corretor é profissional, salvo circunstâncias especíalissimas, entende-se devida, segundo o uso local, ou, se há
taxa ou tarifa, segundo ela, ou, se não há uso local, nem taxa, nem tarifa, segundo o que fôr arbitrado.
Tratando-se de corretor, é preciso que o negócio jurídico se conclua (ir possa ser declarada a conclusão), para
que haja direito à remuneração (2.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 18 de julho de 1944,
1?. dos T., 151, 695). Mesmo se de bens imóveis a corretagem (4•~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação do
Distrito Federal, 21 de novembro de 1944, 204, 518 s.).
O corretor tem o ônus de alegar e provar que houve o nexo causal entre a sua atividade e a conclusão do
negócio jurídico que o incumbente desejava. Basta a prova de ter havido a atividade que bastaria à conclusão do
contrato, com ciência do incumbente; sem ser preciso provar que, sem ela, a conclusão do contrato nflo
ocorreria.
É preciso acordar-se em que a corretagem é devida desde que se dá a comunicação suficiente, ainda que não
chegue a concluir-se válida e eficazmente o contrato, por culpa do incumbente, ignorada pelo corretor. (Note-se
bem: o conetor deu o negócio jurídico como concluido, porque os fatos o levaram a isso, mas aqui vai apenas
exemplo o alienante nâo era o dono dos valôres, o que causou ineficácia.)
Quanto a poder, ou não, o corretor exigir comissão ou corretagem a ambos os contraentes, depende do negócio
jurídico que houve entre êle e cada contraente. O dever de fidelidade que tem o corretor é o mesmo, qualquer
que seja a classe dos corretores a que pertença.
O contrato de corretagem está cumprido pelo corretor no momento em que declara a conclusão do negócio
jurídico, mesmo se apenas nos seus livros. Nisso, há grande diferença entre o contrato de corretagem e outros.
Mesmo se houve culpa do interessado, como se entregou ao corretor documentos falsos, ou já sem eficácia,
tem-se como concluído o negócio jurídico que o corretor declarou, havendo contra o culpado a ação do outro
interessado e do corretor, por perdas e danos. A declaração do corretor foi de boa fé, e o negócio jurídico em
verdade se concluiu. Se o negócio jurídico não se concluiu, por culpa de um dos interessados, não há
remunerabilidade (cf. 4•a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 14 de setembro de 1944;
confusa, por falar de mediação, corretagem e intermediação, a 4•a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do
Dia-frito Federal, a 3 de março de 1945).
Tais os princípios.
Surge a questão, que não tem sido bem tratada pelos tribunais: se o incumbente e o outro interessado se
conluiaram para evitar o pagamento da corretagem ao corretor, deixando passar o prazo, há direito dêsse à
remuneração? Se o contrato fôsse de mediação, o ato ilícito absoluto daria a ação de indenização. Não haveria o
contrato de mediação, que se conclui com a conclusão do negócio jurídico que se tem em mira. Se de
intermediação, o ato ilícito seria relativo (infração contratual). No contrato de corretagem, o corretor que tivesse
duas ofertas enantiomórficas poderia dar como concluído o contrato. Se não as tinha, nada feito. Na
jurisprudência, o que mais tem perturbado a aplicação do direito está na mistura de argumentos e conceitos, ora
a respeito de contrato de opção, ora a respeito de contrato de corretagem. O corretor, a que se atribuiu direito de
opção, não opera, no caso, como corretor, e sim como titular de direito de opcào, com a remuneraçâo de
serviços que tenha sido combinada por ter exercido, a favor de outrem, o direito de opção. Por isso, devemos
evitar erros conceptuais de julgados, como o da 2•a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 15 de
setembro de 1947.
O contrato de opção é inconfundivel.
Nunca se poderia inserir no contrato de corretagem o contrato de opção, porque isso tornaria outro contrato o
contrato de corretagem, ou pelo menos profundamente o desfiguraria. Corretor não opta, porque o corretor não
é figurante, apenas intermedeja. Sem terminologia precisa, sem sistemática correta, não é possível boa
exposição científica.

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O próprio corretor, no contrato de correspondência, quer se trate do outorgante quer do outorgado, não se pde
como sujeito no negócio jurídico que se tem por fito. O incumbente incumbiu a um, que o outro fêz incumbido,
mas o figurante é sempre o incumbente, e não o primeiro ou o segundo ou outro posterior corretor.

§ 4.739. Princípios gerais sobre extincão do contrato do conetor

1.ESPÉCIES DE EXTINÇÃO. Extingue-se o contrato de corretagem, além do caso da conclusão do negócio


jurídico:
a)pela revogação por parte do incumbente, o que se dá à semelhança do mandato e da procuração; b) pela
denúncia cheia; e) pela expiração do prazo ou não-implemento de condição suspensiva (e. g., foi feito o
contrato para a compra de ações da emprêsa tal, se até determinado dia houver aumento de capital) ; cl) a morte
do corretor, se não há substituto que possa operar após o falecimento do corretor; e) incapacidade superveniente
do corretor, se não há substituto que possa operar depois disso; f) pela impossibilidade superveniente ou
ilicitude superveniente da operação; g) pelo distrato; h) pela decretação de nulidade, resolução ou resilição; i)
pela decretação de abertura da falência do corretor, ou do concurso civil de credores ou da liquidação coativa.
A cláusula de prazo pré-elimina a revogabilidade.
2.INADIMPLEMENTO E EXTINÇÃO. Nos casos em que a extinção resultaria de resolução ou de resilição
por inadimple mento, o figurante, que pede a decretação, pode pôr o dilema:
respeitar o contrato de corretagem ou prestar perdas e danos pelo inadimplemento, resolvido ou resilido o
contrato.

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§ 4.740. Análise das espécies

1.EXTINÇÃO VOLUNTÁRIA E EXTINÇÃO AUTOMÁTICA. Algumas causas de extinção são oriundas de


manifestações de vontade, de modo que a eficácia da manifestação de vontade é que determina a extinção. Às
vêzes, a manifestação de vontade supõe o exercício de pretensão como se passa com a resolução ou a resilição
por inadimplemento. Há causas que extinguem automâticamente o contrato de corretagem, como a
superveniente impossibilitação e a ilicitude superveniente.

2.REVOGAÇÃO. A manifestação de vontade do incumbente é revogável. A razão está em que, dependendo a


conclusão do contrato da vontade do incumbente, há de ser regra jurídica a da revogabilidade: mantém êle
liberdade de contratar com outrem, sem o auxílio do corretor, ou de simplesmente revogar a manifestação de
vontade, tornando insuficiente, assim, o suporte fâctico. Para a revogação, basta ser comunicada pelo
incumbente ou por outro corretor. Se de má fé a revogação, feita após início de atividade, responde por perdas e
danos o incumbente (O. WARNEYER, Kommentar, 1, 1073; G. PLANCK, Kommentar, II, 636).
(Mantemos a expressão “revogar”, por ser o que se fixou tradicionalmente. A figura é de denúncia vazia, em
vez de revogação. O incumbente “ofertou” a terceiro, e ao corretor ofertou e foi concluído o contrato de
corretagem, O contrato que êle queria não se fêz: era o que teria de advir da corretagem. Portanto: quanto à
oferta, que fêz o incumbente, e com a qual vai trabalhar, correr, o corretor, é revogável, conforme os princípios,
cf. Código Civil, art. 1.081, IV; quanto ao contrato de corretagem, a revogação da oferta é denúncia vazia do
contrato de corretagem. Há, evidentemente, elipse, quando se fala de revogação do contrato de corretagem.
Entenda-se: revogação [da oferta em que se há de operar para o bom êxito] da corretagem.)
O direito à revogar é renunciável, quanto a certo prazo ou não; da infração resulta dever de indenizar (culpa
contratual), se o corretor estava habilitado a chegar à comunicação de oferta ou de aceitação de contrato (tem
êle o ônus de alegar e provar).
O incumbente pode vincular-se a não revogar o pedido, dentro de certo prazo. Tal cláusula de modo nenhum
afasta a denunciabilidade cheia, por não haver mais razóes para confiança no corretor (KARL LARENZ,
Lehrbuch des Schuldrechts,
II, 189). Todavia, se, ao ser feita a revogação, ou ao ser denunciado o contrato, o contrato que se queria já foi
concluído, ou o incumbente, com a gestão anterior do corretor, o conclui, a remuneração é devida, O que
importa é a relação causal entre a atividade do corretor e a conclusão do contrato. Idem, se a culpa de não se
concluir foi do incumbente.

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3.DENÚNCIA CHEIA PELO CORRETOR E PELO INCUMBENTE.


Da revogação há-se de distinguir a denúncia cheia, que é a denúncia com a exposição de fundamento (motivos
graves). Se o contrato de corretagem tem elemento de contrato de obra, não há denunciabilidade, nem vazia,
nem cheia (L. ENNEÇCU.. flUs, Lehrbuck, II, 520, nota 22) ; se há elemento de contrato de serviços
(MÉtklerdienstvertrag), torna-se só denunciável pelo corretor segundo os arts. 1.226-1.227 do Código Civil o
contrato bilateral de corretagem (cf. PAUL OERTMANN, Das Recht der Schuldverhãltnisse, ‘761; OTTO
WARNEYER, Rommentar, 1, 1074). A lei que faz dever do corretor a operação pré-exclui si denúncia yazia
pelo corretor. Idem, pelo incumbente, quanto aos arts. 1.228 e 1.229 do Código Civil.
Se o corretor livre ou matriculado não se vinculou à realização do contrato, ou não afastou a denunciabilidade,
pode êle afastar-se quando queira. Se se vinculou ou afastou a denunciabilidade, pode denunciar por ter de
exercer função pública ou dever legal, que seja incompatível com a atividade de corretor, em geral, na espécie,
ou em caso, ou se ocorre a inabilitação por fôrça maior, se as instruções do incumbente contêm algo defeso por
lei, ou contrário à moral, ou estranho ao contrato, ou se o incumbente deixa de prestar o que prometeu ou devia
prestar, ou em caso de ofensa ao corretor que torne razoável .a sua recusa de prosseguir.

4.EXPIRAÇÃO DE PRAZO E IMPLEMENTO DE CONDIÇÃO RESOLUTIVA. Se o incumbente deu o


prazo para a operação, no momento em que o prazo expira não há mais manifestação de vontade do
incumbente. Se o prazo só se referia a uma ou algumas operações, dentre outras, as demais permanecem.
Quanto à contagem dos prazos, têm de ser observadas as regras Jurídicas gerais, pertinentes aos prazos
negociais.

A condição resolutiva também é de eficácia ex tunc e automática. Se ao corretor é que há de ser conhecido ou
mais fácil-mente conhecido o implemento, tem êle dever de comunicação. Qualquer resposta do incumbente no
sentido de prosseguir na corretagem é outra manifestação de vontade, para todos os efei-tos, inclusive para as
notas nos livros do corretor.

5. MORTE DO CORRETOR. A morte do corretor faz, de regra, o contrato de corretagem, unilateral ou


bilateral, salvo se o escritório de corretagem é de dois ou mais correteres, sendo o contrato com dois ou mais,
ou se a emprêsa é tal que não se faz relevante a pessoa do corretor (G. PLANCK, Kornrnentar, II, 631), ou não
no é para o negócio jurídico que se colima (L. ENNECCERUS, Lehrbuch, li, 520; PAUL OERTMANN, Das
Recht der Schutdverhiiltnisse, 761).
O problema da terminação do contrato de corretagem por morte do incumbente foi assaz discutido: pela
afirmativa, ou pela negativa, conforme os casos concretos, L. ENNECCERUS (Lehrbveh, II, 520, nota 23; E.
KOBER, J. v. Staudingers Rommentar, II, 2, 1224); pela negativa, O. WARNEYER (Komment ar, 1, 1074).
Com razão, no direito alemão, a última solução; no direito brasileiro, também, ainda que se trate de contrato
revogável de corretagem: os herdeiros podem revogar, se revogável, ou lançar denúncia cheia, conforme as
espécies, e o enchimento da denúncia consiste na alegação de não mais poder ser levado a cabo o contrato (e.
g., cláusula de inalienabilidade das legítimas, se a corretagem era para a venda do prédio), ou outra razão
comum aos casos de denúncia cheia.
Os herdeiros ou legatários do que é objeto da corretagem têm de comunicar ao corretor o que ocorreu e o que
querem.
A coincidência entre as causas de extinção da oferta pelo incumbente e as causas de extinção do contrato de
corretagem resulta de ser o contrato de corretagem contrato para que outras pessoas, e não o corretor,
contratem. Ora, se se afasta a oferta para o contrato que se tem por fito, necessàriamente se põe fora do mundo
jurídico o contrato-meio.

6.INCAPACIDADE SUPERVENIENTE DO CORRETOR. Se o coretor se tornou incapaz, tem-se de atender à


circunstância de }~aver, ou não, substituto. Se há substituto, o contrato continua,.
sem que haja responsabilidade por parte do incapaz. Se não há, termina o contrato.

7.IMPOSSIBILIDADE SUPERVENIENTE E ILICITUDE SUPERvENIENTE DA OPERAÇÃO. Se a

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operação se tornou impossível, como se a emprêsa, cujas ações se haviam de adquirir, se extinguiu, extingue-se
o contrato de corretagem. Dá-se o mesmo se passou a ser ilícita a operação, como se a lei proibiu determinada
operação de corretagem, ou qualquer negócio jurídico sobre o objeto.

8. DISTRATO. O incumbente e o corretor podem distratar o contrato de corretagem, no todo ou em parte (e.
g., no contrato cogitava-se de três lotes de ações de companhia e distrata-se quanto a um lote). A forma do
distrato rege-se pelo art. 1.093 do Código Civil, podendo-se fazer por escrito o que se fêz oralmente.

9. RESOLUÇÃO E RESILIÇÃO. O contrato de corretagem pode ser desconstituído em virtude de resolução


(que o atinge desde todo o início), ou de resilição (que apenas atinge as operações não concluídas).

10.FALÊNCIA 015 CONCURSO CIVIL DE CREDORES DO CORRETOR.


O corretor incorre em falência. Para que isso se dê, é preciso que se haja de ter como comerciante. Fora daí, o
concurso de credores é civil. Pode ser que a lei estabeleça tratar-se a espécie como de liquidação coativa.
A falência ou o concurso civil de credores ou a liquidação coativa do incumbente não extingue o contrato de
corretagem. Rege o art. 43 e parágrafo único do Decreto n. 7.661, de 21 de junho de 1945. Ê preciso que não se
tragam confusões de outros sistemas jurídicos, nem proposições que o sistema jurídico brasileiro não admite,
por fôrça do art. 43 e parágrafo único do Decreto n. 7.661.

11.CONCLUSÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO. Se o contrato de corretagem chegou a pleno adimplemento,


pela conclusão do negócio jurídico, que se tinha em vista, é óbvio que extinto está o contrato de corretagem. Se
o contrato de corretagem se refere a operações separadas, a expiração é parcial, mesma que se vão concluindo
os negócios jurídicos que lhes correspondem. Na mediação, o contrato nasce e extingue-se com a conclusão do
negócio jurídico, e nada mais se tem a fazer.

No contrato de corretagem, não há essa simultaneidade: à conclusão de um o outro se extingue. A razão disso
está em que o corretor tem função declaratória.
As pretensões do corretor oficial ou do matriculado, ou, a despeito da falta de matricula, comerciante, mesmo
quanto à remuneração, prescrevem conforme o Código Comercial, art. 442, ou art. 445, ou art. 446 (cf. 5•a
Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, ‘7 de março de 1940, R. dos 7’., 127, 204).

CAPÍTULO 1½

CORRETORES DE FUNDOS PÚBLICOS E OUTROS VALORES

§ 4.741. Conceito e natureza do corretor de valôres

1.FuNDOs PÚBLICOS E CORRETAGEM. Primeiro, havemos de prestar atenção à expressão “fundos


públicos”. Fundo dizia-se o capital em dinheiro, ou em outros bens. Fundos públicos são apenas os títulos em
que é subscritor o Estado (União, Estados-membros, Municípios), ou Estado estrangeiro. Todos os títulos em
que se promete ao público são títulos que podem ser objeto de corretagem, se a lei o estabelece ou permite; não
são, porém, fundos públicos. Quando se fala de corretor de fundos públicos alude-se a corretor que intermedeia
no tocante a fundos públicos e a outros títulos que podem, por lei, ou (levem, por lei, ser transferidos através de
corretores. Daí o art. 29 do Decreto n. 2.475, de 18 de março de 1897: “São da exclusiva competência dos
corretores de fundos públicos e somente por seu intermédio se poderão realizar: a) a compra-e-venda e a
transferência de quaisquer fundos públicos nacionais ou estrangeiros admitidos a cotação; b) a negociação de
letras de câmbio e de empréstimo por meio de obrigações; e) a de títulos suscetíveis de cotação na Bôlsa, de
acôrdo com o boletim da Câmara Sindical; d) a compra-ewenda de metais preciosos amoedados e em barra”.
É melhor a expressão “corretor de valôres”, como o é, a respeito de Bôlsa de Títulos, a expressão “Bôlsa de
Valôres”.

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2.PRIVACIDADE OFICIAL DAS OPERAÇõES. No art. 80 do Decreto n. 2.475 estatuía-se: “São nulas de
pleno direito as negociações dos títulos de que trata o artigo antecedente, quando realizadas por intermediários
estranhos à corporação dos corretores”. O pressuposto para a validade era o de que o corretor fôsse corretor de
fundos públicos. A sanção de nulidade atingia o negócio jurídico, e não só o contrato de corretagem. Mas
apenas se corretagem houve, sem ser de fundos públicos, com as exigências legais, o corretor que ligou os
interessados. No Decreto-lei n. 1.844, de 18 de junho de 1939 <Bôlsa de Valôres), art. 1.0, diz-se que “as
operações sobre títulos de Bôlsa serão efetuadas exclusivamente por intermédio dos corretores e em púl)lIcO
pregão”. É evidente que se excluiu qualquer contrato de corretagem a respeito de títulos de negociabilidade
bolsística s~ o corretor não pode funcionar na Bôlsa. Nenhum corretor de valôres que não seja nomeado pelo
Presidente da República ou pela autoridade estadual competente pode ser corretagem em negociações sobre
títulos que foram admitidos à Bôlsa. Pré-eliminou-se a corretagem dos corretores simplesmente matriculados e
dos corretores livres. A sanção é a da nulidade do contrato de corretagem e não a do negócio jurídico que o
corretor deu como concluído.
A Lei n. 354, de 16 de dezembro de 1895, art. 3•0, seguida pelo Decreto n. 2.475, de 13 de março de 1897, art.
35, pôs o princípio da corretagem oficial de fundos públicos, debêniuna, m tais preciosos amoedados ou em
barra e fundos de bOlsa. Só os corretores oficiais chamados de fundos públicos podem ser operantes tais
contratos de corretagem. O art. 32, § l.~, da Lei n. 354 e o art. 80 do Decreto n. 2.475 deram a sanção, que ia até
os negócios jurídicos para os quais êles foram os corretores.
A sanção era a nulidade dos negócios jurídicos, das “negociações , “quando realizadas por intermediários
estranhos à corporação dos corretores”. Assim, corretores apenas matriculados não podem intermediar em tais
negócios jurídicos. Se intermediassem, nulo seria o contrato de corretagem, por ilicitude, e nulo o proprio
negócio jurídico para o qual foi intermediário o corretor não o oficial de títulos.
Tal proibição e, pois, tal sanção não atingiam as operações diretas: inclusive por mediação, pois que mediador
não é intermedario. No art. 31 estabelece o Decreto n. 2.475: “A disposição do art. 30 não compreende as
negociações realizadas fora da Bôlsa e diretamente entre o comprador e o vendedor, as quais, todavia, deverão
ser comunicadas à Câmara Sindical pelos interessados”. Se houve mediação, e não intermediação, a operação
foi direta, no sentido de não ter havido intermediário. As tem invocabilidade o art. 31 do Decreto n. 2.475 se o
negócio jurídico se concluiu por procuração, ou comissão, ou ; aliter , se foi por corretor ou por outro
intermediário . Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1989, art. 12.

A sanção do art. 30 do Decreto n. 2.475 era dupla: nulidade do contrato de corretagem e, em conseqüência , dos
atos do corretor; nulidade do próprio negócio jurídico para o qual se operou a corretagem. A derrogação do art.
30 pelo Decreto-lei a. 1.344, art. 59, afasta a nulidade do negócio jurídico, uma vez que podia ser sem a
intermediação do corretor oficial.
O assunto merece que nêle se insista. Após a Lei n. 354, de 16 de dezembro de 1895, art. 32, e o Decreto n.
2.475, de 13 de março de 1897, arts. 80 e 81, houve a Lei n. 559, de 31 de dezembro de 1898, de má redação e
com evidente intuito de confusão, para satisfazer, com insuficiente explicitude, propósitos de interessados em
monopólio além dos limites admissíveis. Depois, o Decreto n. 4.985, de 3 de outubro de 1903, procurou a
interpretação verdadeira do texto legal e acertou no que fêz.
O Decreto n. 4.985, artigo único, precisou: “São permitidas e licitas tôdas as negociações referidas no art. 29 do
Decreto -n. 2.475, de 18 de março de 1897, quando realizadas fora da Bôlsa e diretamente entre o comprador e
o vendedor, exceto as que tiverem por objeto letras de câmbio de valor superior a £ 100, devendo, todavia,
aquelas negociações serem levadas ao conhecimento da Câmara Sindical pelos interessados”. Tinha tôda a
razão. O Decreto n. 2.475, art. 80, continha a dupla sanção de nulidade, salvante as operações diretas. A Lei n.
559, de 31 de dezembro de 1898, art. 18, tentou o golpe de extinguir a exceção à regra jurídica do art. 80 do
Decreto n. 2.475, contida no art. 31 do mesmo Decreto, mas a Lei n. 566, de 6 de janeiro de 1899, ab-rogou-lhe
a perigosa incursão no direito de propriedade. A propósito da referência do ad. 3•0, § 22, da Lei n. 354, a Lei n.
566 de modo nenhum o ab-rogou, só o derrogou a propósito da matéria de que estava tratando: as operações de
letras de câmbio.
Diz-se que o art. 1.0 do Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1939, ab-rogou o Decreto n. 4.985, de 3 de
outubro de 1903. que explicitou o alcance da “derrogação” que resultou do art. 12 da Lei n. 566, de 9 de janeiro
de 1899. Não é verdade. O art. 1.0 do Decreto-lei n. 1.344 só se refere às operações de Bôlsa feitas por
intermediários, isto é, quando o negócio jurídico não é concluído sem qualquer intermediação. Nenhum corretor
que não seja corretor oficial, nem qualquer outro intermediário, pode ser incumbido das operações de Bôlsa. O

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proprietário dos títulos e valôres de que cogita a legislação sobre operações bolsísticas pode alienar os seus
títulos em valôres, vendendo-os, doando-os, trocando-os. Não se compreenderia que tivesse de ir incumbir
corretor de vender o que êle quer que seja adquirido pela pessoa que com êle está em contacto direto. A fortiori,
que não pudesse doar, sem intermediação de corretor oficial.
Se houve infração do art. 1.0 do Decreto-lei n. 1.344, por ter funcionado corretor não oficial, ou intermediário
que não é corretor, a sanção não é a nulidade do negócio jurídico, pois o art. 30 do Decreto n. 2.475, de 13 de
março de 1897, está derrogado pelo Decreto-lei n. 1.344, art. 59. Assim decidiu
oSupremo Tribunal Federal (D. da .1. de 17 de novembro de 1958, 4100 sã.
A função do corretor não é a de figurante, como a do comissionário, nem a do mandatário, nem a do procurador.
Se êle funcionou, em negócio jurídico em que não podia funcionar, a sua função restringiu-se a intermediação
sem poder declarar a conclusão do negócio jurídico: os figurantes foram o alienante e o adquirente, sem
necessidade, portanto, de qualquer declaração. Se os figurantes não pudessem concluir tais negócios jurídicos,
sim: não valeriam os negócios jurídicos em que intermediasse corretor não oficial, ou outra espécie de
intermediário, mas porque a conclusão foi atingida pela sanção. Uma vez que não há a vedação aos titulares
dos direitos, a conclusão consuma-se, e é indiferente se houve, ou não, a intermediação.
Depois de mencionar, no art. 27, as operações privativas dos corretores oficiais de valôres, o Regimento Interno
da Bôlsa de Valôres e dos Corretores do Rio de Janeiro, disse, invocando o art. 3,0, ~ 12, da Lei n. 354, que
“são nulas de pleno direito as negociações de títulos e espécies e as operações de que trata o art. 27, quando não
realizadas por intermédio de corretor”. Mas a falta de exame das espécies ressalta de tal referência ao art. 3», §
12, da Lei n. 354, sem se aludir ao art. 32, § 2.0, da mesma Lei apenas derrogado pela Lei n. 566.
A propósito de emissões de títulos de crédito, de ações ou de quaisquer valôres, por subscrição pública, estatui
o art. 1.0, § 1.0, da Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1952:
“Nas emissões por subscrição pública interferirá sempre o corretor oficial de valôres, sob pena de nulidade de
pleno direito”. Invocando o Aviso do Ministro da Fazenda n. 94, de li de agôsto de 1898, o Regimento Interno
da Bôlsa de Valôres e dos Corretores de Mercadorias do Rio de Janeiro, art. 32, disse que “somente com a
intervenção de corretor, as companhias e sociedades anônimas poderão lançar e contrair empréstimos, sob pena
de nulidade”. Não é isso o que está na lei. A Lei n. 2.146, somente se refere a “emissões por subscrição
pública”.
t
No art. 12, § 2.0, da Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, estabelece-se: “As compras-e-vendas de títulos
particulares a prestação serão reguladas, no que couber, pelas disposições do Decreto-lei n. 3.545, de 22 de
agôsto de 1941”. E acrescenta o § 3.0: “Para a final observância do disposto neste artigo, as Câmaras Sindicais
das BOlsas de Valôres poderão credenciar agentes de corretores oficiais e de entidades para colocação de
emissões de títulos”.
Diz o ad. 11 do Decreto-lei n. 1.344: “Os títulos estaduais e municipais serão negociados e cotados, nas BOlsas
dos Estados, por decisão do Secretário de Estado competente, ouvidas as respectivas Câmaras Sindicais”.
Estabelece o art. 12 do Decreto-lei n. 1.844: “Os títulos estrangeiros serão negociados e cotados nas BOlsas dos
Estados por decisão do Secretário de Estado competente, fundada em parecer favorável do Ministério da
Fazenda”. Acrescenta o parágrafo único: “Êsse parecer será dispensável se os títulos já estiverem sendo
negociados e cotados na Bôlsa do Rio de Janeiro
Lê-se no art. 13 do Decreto-lei n. 1.344: “As decisões das Câmaras Sindicais que mandarem incluir títulos
particulares nos quadros de negociações e cotação, ou exclui-los, poderão ser reformadas pelo processo do Deo.
n. 21.854, de 21 de setembro de 1982”. Acrescenta o parágrafo único: “Nas Bôlsas dos Estados, os recursos
deverão ser interpostos para o secretário de Estado competente, ou para o Tribunal de Apelação, conforme o
caso”.
Diz o ad. 14 do Decreto-lei n. 1.344: “Das demais decisões das Câmaras Sindicais, caberá recurso: a) na Bôlsa
do Rio de Janeiro, para o Ministro da Fazenda; b) nas Bôlsas dos Estados, para o respectivo Secretário de
Estado”.
Estabelece o ad. 58 do Decreto-lei n. 1.844: “As penas estabelecidas para corretores e auxiliares serão aplicadas
pelas Câmaras Sindicais, depois de ouvido o acusado, que terá o prazo de cinco dias, contado da notificação,
para apresentar defesa escrita”. Acrescenta o parágrafo único: “Recusando-se o acusado a receber a notificação,
ou ausentando-se de má fé, será a pena aplicada à revelia”.
O art. 31 do Decreto n. 2.475 fala do dever de comunicação à Câmara Sindical, pelos interessados, se o
negócio jurídico foi diretamente concluído, isto é, sem corretagem ou intermediação. Não há sanção de

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invalidade; a fortiori, de inexistência, A comunicação é para que se saiba o que ocorre com os títulos
negociáveis em bôlsa e o adquirente fique incólume à possível eficácia de negócios jurídicos que se concluam
por intermédio dos corretores (notadamente, na espécie do art. 521, parágrafo unico, do Código Civil). O Ofício
da Diretoria do Expediente do Tesouro Federal, de 17 de junho de 1905, que falou em sanção de nulidade por
falta de comunicação, foi simplesmente absurdo (cp. Relatório da Câmara Sindical dos Corretores de fl’ndos
Públicos, 1907, 23).
Teremos ensejo de cogitar da Lei n. 566, de 9 de janeiro de 1899, e do Decreto n. 4.985, de 3 de outubro de
1908, que se referiram a letras de câmbio.
As pessoas que, sem a necessária investidura, exercerem as funções de corretor, incorrem nas penas do Código
Penal.
§ 4.741. CONCEITO DE CORRETOR DE VALORES art. 328. Cabe ao síndico remeter à autoridade
administrativa competente os documentos que possam instruir o processo, a fim de que se inicie.

8.AGENTES AUxILIARES DO COMÉRCIO. O corretor oficial mio é funcionário público. A nomeação é


apenas pressuposto para o exercício da profissão. Auxilia a circulação dos bens, sem estar ligado ao Estado. A
oficialidade não significa, aí, integração na organização estatal, O Estado exigiu-lhe requisitos especiais, para
proteção do público, dada a natureza das

suas funções, que não são as de órgão, nem as de representante, nem as de simples mediador. Pôsto que corretor
oficial, não deixa de ser agente auxiliar do comércio (Código Comercial , art. 35, inciso 1), empresário (cp.
CUIDO ZANOBINI, L’Ksercizio privato delle funzioni e dei servizi pubblici, 121 5.; Corso di Diritto
administrativo, V, 808; 2,a ed., 496). O argumento que aparece na doutrina de outros sistemas jurídicos sobre
não ser comerciante o corretor oficial, porque não se lhe pode decretar a abertura da falência (o que no sisteina
jurídico brasileiro não ocorre, ci Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945, art. 188, IX>, é irrisório: a
discriminação dos concursos de credores não altera a classificação das atividades econômicas.

4.PRESSUPOSTOS PARA A NOMEAÇÃO Do CORRETOR DE VALORES. A nomeação é feita após


informação da Câmara Sindical, instruída (Decreto n. 2.475, ad. 6.0> : a) com a certidão de idade do
pretendente; 14 com atestação da autoridade policial da circunscrição do domicílio do candidato, que declare ter
êsse residência por mais de um ano na praça em que pretende ser corretor (Código Comercial, art. 39, inciso 2;
Decreto n. 2.475, art. 6.0, b) ; c) com certificado, devidamente autenticado pelo reconhecimento da firma, de
haver o pretendente praticado, por tempo nunca menor de dois anos, em escritório de corretor de fundos
públicos, ou funcionado em casa bancária, ou comercial de grosso trato, na qualidade de guarda-livres, ou de
sócio gerente; á) com fôlha corrida.
O número de ofícios de corretores é fixado pelo poder público (Decreto n. 2.475, art. 2.0; Código Comercial,
ad. 22; Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, art. 1.0), que pode suprimir ofícios, quando o entender
conveniente (Decreto n. 2.475, art. ~•0, 2a alínea).
O simples fato de se imitar o número de corretores que podem operar na bôlsa não lhes cria função de direito
público. O direito público cria a Bôlsa, dá as normas jurídicas para a organização da Câmara Sindical e para a
nomeação dos corretores oficiais. São de direito público as regras jurídicas que dizem quais os pressupostos
para se ser corretor oficial.
Para ser corretor de fundos é exigido (Decreto n. 2.475, art. 4.0) a) ser cidadão brasileiro (Decreto n. 2.475, art.
42, a) ; b) ter mais de vinte e um anos (Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, art. 32, § 32) ; c) estar no gôzo
dos direitos civis e políticos (Decreto n. 2.475, art. 42, e) ; d) poder comerciar (Decreto n. 2.475, art. 52, a) ; e)
não ter sido destituído ter sido condenado em crime a que as leis penais imponham a pena de destituição do
emprêgo, ou outra de cuja imposição resulte a destituição (Decreto n. 2.475, art. 52, o) ; f) não ter sido
condenado em crimes de falência, estelionato, furto e roubo (Decreto n. 2.475, art. 52, ti) ; g) estar, se falira,
reabilitado (art. 52, e) ; f) os que forem parentes em linha reta e colateral e afins do segundo grau (Decreto-lei
n. 1.344, de 13 de janeiro de 1939, art. 54). O art. 52, 14, do Decreto n. 2.475, que se refere às mulheres, para as
excluir, é contrário à Constituição de 1946, como o era às anteriores. O Regimento Interno da Bôlsa de Valôres
e dos Corretores de Fundos Públicos do Rio de Janeiro (incidentemente observemos que cada Câmara Sindical
faz o Regimento Interno de cada região), no art. 52, o), refere-se a mulheres; mas outra não podia ser a sua
atitude porque não lhe fica a competência para apreciar inconstitucionalidades de regras jurídicas. No art. 52,
ti), diz-se: “os que estiverem sendo processados ... por crimes de peculato, falsidade, moeda falsa, contrabando,

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estelionato, roubo, furto e outros a que o Código Penal ou leis federais imponham, expressamente. a perda do
cargo”. Não se há de admitir que a simples existência de processo penal possa impedir nomeação. A lei, note-se
a lei, poderia reputar impediente a pronúncia, não o simples processo. A lei não fala de processo.

Quanto à nacionalidade, o que se exige é ser Brasileiro, e não Brasileiro nato, como pretende o Regimento
Interno da Bôlsa de Valôres, art. 52, a).
Lê-se r.o Regimento Interno da Bôlsa de Valôres e dos Corretores fie Fundos Públicos do Rio de Janeiro, art.
8.0:
..Q candidato ao cargo de corretor deverá juntar ao pedido de prorrogação os seguintes documentos: a) certidão
de nascimento extraída do registo civil ou prova equivalente; li’) prova de residência por mais de três anos no
Distrito Federal, atestada por autoridade policial; c) fôlha corrida; ti) atestado de haver o pretendente praticado,
por tempo nunca menor de dois anos, úm escritório de corretor de fundos públicos, exercido em casa bancária
ou comercial de grosso trato o emprêgo de guarda-livros ou o cargo de gerente; e) certidões limpas dos
distribuIdores das Varas de Fazenda Pública e Varas Cíveis do Distrito Federal, durante o lapso de anos; f)
certidões limpas tios distribuidores dos registos de títulos e documentos e protestos de títulos, durante o prazo
de anos; g) prova de quitação militar; li) atestado médico provando não sofrer de moléstia cc~1tauiosa e
atestado de vacina”. O Regimento Interno procurou atender à legislação existente e a regras jurídicas
Diz o Decreto-lei n. 1.344, no art. 50: “Os corretores dos Estados serão nomeados, licenciados, suspensos e
demitidos, na forma das respectivas leis estaduais vigentes, pelo Secretário de Estado que os superintender”. Os
corretores oficiais dos Estados-membros são nomeados pelo Secretário de Estado que os superintender, mas,
hoje, a lei que passa à frente é a lei federal, conforme o art. 92 da Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, que
mandou que incidissem, quanto aos conetores, Câmaras Sindicais, Juntas, Bôlsas de Mercadorias e Caixas de
Liquidação de todo o país a legislação que só se fizera para o Distrito Federal.
Lê-se no art. 54 do Decreto-lei n. 1344: “Na mesma Bôlsa de Valôres não podem ser corretores,
simultâneamente, parentes em linha direta e colaterais e afins até 22 grau”. Acrescenta o parágrafo único: “Esta
restrição não se refere aos auxiliares do corretor, nem se aplica aos casos atuais”.

(Não há parentes colaterais até o segundo grau. Os primeiros, os irmãos, já são do segundo grau.)
Lê-se no art. 72 do Regimento Interno da Bôlsa de Valores e dos Corretores de Fundos Públicos do Rio de
Janeiro:
“A vaga do ofício de corretor é tornada pública por ofício da Câmara Sindical, afixado no salão da Bôlsa e
publicado durante trinta dias, por dez vêzes, no Diário Oficial e num diário de grande circulação”.
Diz o art. 92 do Regimento Interno: “A Câmara Sindical, ao receber o requerimento do candidato, devidamente
instruído com os documentos mencionados no artigo anterior, nomeará uma comissão de sindicância, composta
de três corretores, para averiguar da veracidade e autenticidade dêsses mesmos documentos e, após examinar o
parecer que a comissão apresentará, dentro de dez dias, mandará fixar no salão da Bôlsa e publicar em edital, na
imprensa, durante dias consecutivos, o nome do pretendente ao cargo”. Acrescenta o parágrafo único: “As
despesas com a habitação correrão por conta do candidato”.
Estatui o art. 10: “Findo o prazo a que se refere o artigo anterior e em face das informações que tenha colhido, a
Câmara Sindical Julgará, a seu exclusivo critério, da idoneidade dos candidatos, podendo reunir a classe dos
corretores para escolha de dois nomes dentre os concorrentes, a fim de serem enviados, com o seu parecer, ao
Ministro da Fazenda”. Acrescenta o parágrafo único: “Não havendo candidato julgado idôneo, o cargo só
poderá ser preenchido, após o lapso de três meses e mediante habitação de novos candidatos”. Lê-se ainda no
ad. 12:
“Publicada a nomeação no Diário Oficial, o síndico notificará, imediatamente, o nomeado, mediante ofício,
enviando-lhe um exemplar do Regimento Interno, a fim de que: a) preste a caução de cinquenta mil cruzeiros,
em moeda nacional ou em títulos mencionados nas letras b, o e d do art. 82 do Decreto n. 2.475 de 18 de março
de 1897, no Tesouro Nacional, onde assinará o respectivo têrmo; lO efetue o pagamento do impôsto da patente
e providencie o do impôsto de indústrias e profissões; o) apresente o “protocolo” de corretor, devidamente
selado e rubricado pelo Departamento Nacional de Indústria e Comércio; d) apresente, na Secretaria da Câmara
Sindical, o caderno manual, para ser legalizado; e) exiba certidão passada pela Caixa de Garantia e Previdência,
do depósito de pecúlio equivalente ao do seu predecessor no ofício”.
Estabelece o Regimento Interno, art. 18: “O nomeado deverá satisfazer as exigências do artigo anterior e tomar

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posse e entrar no exercício do cargo, dentro de 60 dias, contados da data da publicação do decreto de nomeação,
no Diário Oficial”. Acrescenta o parágrafo único: “Findo êsse prazo, sem que o nomeado haja entrado em
exercício do cargo, considerar-se-á vago o ofício
Pôsto que o corretor oficial não seja funcionário público. há parecença derivada da oficialidade do cargo, por
motivo de interesse público. Isso faz estáveis os corretores oficiais, à semelhança dos funcionários públicos
estáveis. No Regimento Interno, art. 15, diz-se que “os corretores, uma vez empossados, serão vitalícios,
enquanto bem desempenham suas funções”. Com o conceito de vitaliciedade chocar-se-ia a posição jurídica do
corretor, uma vez que o sistema jurídico está encimado pela Constituicão de 1946, na qual há a distinção entre
vitaliciedade e estabilidade: Os corretores oficiais são estáveis, à imagem dos funcionários públicos
(Constituição de 1946, arts. 187-189).

5. CAUÇÃO . O depósito ou caução regula-se por lei (Código Comercial, art. 41; Decreto n. 2.475, de 13 de
março de 1897, art. 72). Não se expede o título antes de feito o depósito ou caução.
A caução do corretor responde: a) pela execução e liquidação das operações em que o mesmo tiver sido
intermediário, ou de que se tiver encarregado; b) pelas multas em que o corretor incorrer; o) pelas indenizações
que fôr condenado a prestar, em virtude de sentença do Poder Judiciário (Decreto n. 2.475, art. 10). Somente
após a liquidação de tôda a responsabilidade do corretor, pode o restante da importância da caueso ser objeto de
ações, sequestros e arrestos para a solução e garantia de dívidas particulares do corretor (Decreto n. 2.475, art.
11).
A caução somente pode ser levantada depois de seis meses, a contar da exoneração ou do falecimento do
corretor (Decreto n. 2.475, art. 12). No Regimento Interno, art. 23, fala-se “de penhoras, arrestos ou seqüestros
”, e o intuito de explicitude, em vez de estender restringiu o conteúdo do art. 11 do Decreto n. 2.475. O que se
há de entender é que nenhuma medida constritiva, seja executiva seja cautelar, pode incidir. Aliás, é o que
ocorre com tôdas as cauções, uma vez que se cria, cem elas, direito real de garantia. Tem de permanecer íntegra
a caução, de modo que, se se lhe retira algo, ou se há qualquer diminuição, por outra causa, tem de ser
completada. O art. 24 do Regimento Interno diz isso, mas em má terminologia, confundindo caucionante (que
pode ser o corretor ou outrem) com fiador. Não há fiança, há caução. Se o caucionante é terceiro e, por alguma
razão legal se exonera (qual a razão?), sem que o corretor faça a caução, ou outrem a faça, fica suspenso das
funções o corretor. A caução, prestada por terceiro, só se pode levantar depois de substituida (cf. Regimento
Interno, art. 25).
Findo o prazo de seis meses a que se refere o art. 12 do Decreto n. 2.475, nem reclamação ou oposição (art. 15),
ou se houve, já afastada definitivamente, a Câmara Sindical oficia ao Ministro da Fazenda, ou à autoridade
estadual competente, para que possa a caução ser entregue a quem de direito. Cf. Decreto n. 2.475, art. 15;
Regimento Interno, art. 26.

6.DEVERES ANTERIORES AO EXERCÍCIO. “Antes de entrar cm exercício”, diz o art. 92 do Decreto n.


2.475, de 18 de março de 1897, “deve o corretor: a) fazer-se inscrever na repartição competente para o
pagamento do impôsto de sua profissão; b) tomar perante o síndico o compromisso de desempenhar suas
funções com probidade e de acôrdo com as leis em vigor; o) fazer abrir, rubricar e encerrar pelo síndico o
caderno manual e apresentar o protocolo com as formalidades dos arts. 51 e 55 dêste regulamento”.

7.PREPOSTOS E ASSISTENTES-SUCESSORES. O art. 8.0, 1.» parte, da Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de


1953, estabeleceu que os corretores oficiais de valôres podem ter, na sede da respectiva Bôlsa, apenas um
preposto, além do seu eventual assistente-sucessor. Portanto, dois prepostos, um dos quais é o assistente-
sucessor. Dentro da mesma “jurisdição” (= dentro das linhas em que pode exercer a atividade de corretagem
judicial, o ali. 32, 2~a parte, permite a nomeação de mais um, ou dois eu três prepostos, para cidades diferentes
“poderão nominar até três prepostos , um em cada cidade”). O § 1.~ do “rt 32 ressalvou o direito dos corretores
de manter os seus “tua< prepostos e adjuntos.
Há auxiliares dos corretores de Bôlsa que são os bancos e os zângãos (remisiers), aquêles recebem e transmitem
as “ordens” aos corretores, além de informarem (e aconselharem) os seus clientes, e êsses, de regra
comerciantes, aconselham os clientes e exercem poderes de mandatários para a transmissão das incumbências
aos corretores. Os “remisiers” recebem parte do que percebem os corretores, a “renlise”, donde o nome, na
língua francesa. Animam a frequência dos clientes à Bôlsa, pelos informes aos seus clientes e pela confiança
que lhes merece. Não se confundem com os comissionáriOs dos corretores, que a êsses se ligam por contrato de

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obra e não são auxiliares das profissões bolsísticas.

.78. FALECIMENTO DO CORRETOR E OUTROS EVENTOS A morte do corretor somente interrompe a


atividade de corretagem se não há substituição do corretor. A Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, art. 32,
~ 22, previu: “No caso de vacância do ofício, o preposto assistente~Sucessor de corretor oficial continuará no
exercício do cargo, uma vez comprovadas as formalidades legais”.
O Decretei n. 2.475, art. 14, estatui: “A Câmara Sindical, quando ocorrer o falecimento ou tiver lugar a
exoneração de qualquer corretor, mandará dar publicidade à vaga durante trinta dias, nos boletins comerciais, e
afixar editais no recinto da Bólsa, chamando os interessados em transação em que houvesse intervindo o
corretor a virem liquidá-las no prazo de seis meses”. À Câmara Sindical, com a sua finalidade e a sua
organização, cabe conhecer do que se passa com os que operam na Bôlsa e procurar que tudo se resolva, quanto
aos negócios jurídicos que se concluíram, com tôda a exatidão e pontualidade. O chamamento, pela Câmara
Sindical, mostra que a ela é que incumbe a atividade externa coletiva. Não se deixou ao substituto do corretor,
ao assistente-sucessor, tomar as providências de publicidade e de notificação. À Câmara Sindical atribui-se essa
aptidão.
Acrescenta o Decreto n. 2.475, art. 15: “Findo o prazo, a Câmara Sindical expedirá em favor dos herdeiros do
corretor, dos representantes dos menores, ou de quaisquer interessados, requisitória ao Ministro da Fazenda
para o levantamento da fiança depositada no Tesouro”. Findo o prazo, e somente findo o prazo, pode a Câmara
Sindical expedir, em caso de falecimento, a carta de requisição, ou requisitória, ou carta de levantamento, ou
ofício de levantamento, a favor dos herdeiros, dos representantes legais dos absolutamente incapazes, dos
relativamente incapazes que hajam de ser assistidos, ou de quaisquer sucessores, ou outros interessados. Se
houve vaga sem ser por falecimento, a carta de requisição, ou carta de levantamento, é a favor da própria
pessoa que deixou de ser corretor oficial na Bôlsa, ou de quem se haja legitimado perante a Câmara Sindical. A
carta requisitória é dirigida à autoridade perante a qual se fêz a caução.
Diz o art. 16 do Decreto n. 2.745: “Ocorrendo vaga de ofício de corretor, o síndico procederá imediatamente à
arrecadação de todos os livros e papéis pertencentes ao mesmo e relativos ao ofício, e ao exame do estado em
que se acharem, na presença das partes interessadas e de duas testemunhas, e levará o fato ao conhecimento do
Ministro da Fazenda”. Qualquer que seja a causa de vaga, o síndico procede à arrecadação dos livros, papéis e
mais objetos concernentes ao ofício do corretor, como negativos, discos e filmes. Se não foi por morte, ou
incapacidade absoluta, ou por fuga, que se deu a vaga, é indispensável a presença da pessoa que fÔra corretor.
Interessados são, em caso de morte, o inventariante, os herdeiros, os legatários e o cônjuge meeiro. Em caso de
incapacidade absoluta, o representante legal, o cônjuge e o Curador de incapazes. Em caso de fuga, o cônjuge e
quaisquer pessoas que seriam, em caso de morte, herdeiros legítimos, além da autoridade policial ou judiciária.
Sempre é de exigir-se a presença de duas testemunhas, que processualmente o possam ser. O fato é levado ao
conhecimento da autoridade competente, em ofício com a narrativa.
Os terceiros interessados podem pedir certidões do que foi lavrado e assinado pelo síndico e pelas pessoas
presentes, inclusive pelas testemunhas. Tais documentos têm a fé pública que a lei confere às certidões passadas
pelos corretores oficiais. As certidões têm de ser pedidas à Câmara Sindical. Pedidas ao sindice, tem êiu de
enviar à Câmara Sindical os pedidos, para que e ~a ordene que se tirem.
Segundo o art. 22 da Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, “ascendentes e descendentes não poderão
exercer, concomitantemente, na mesma Bôlsa, o cargo de corretor oficial de valôres”.
Se o corretor tem assistente-sucessor, a substituição é para os casos que não sejam de vaga. Não é preciso
qualquer ato do síndico. Se há vaga, rege o art. 32, § 22, da Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953.
Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 17: “Os livros e papéis arrecadados pelo síndico, na hipótese do artigo
antecedente, serão examinados pela Câmara Sindical, na sua primeira relinião, a fim de verificar, por meio
dêles, o estado das operações que se achavam a cargo do corretor, se é caso de dar-se a interferência da referida
Câmara, para a completa execução da mesma, e para resguardar quaisquer interesses de terceiros, ou se deverão
ser recolhidos ao arquivo, para serem entregues ao corretor que fôr provido no ofício vago”. O síndico arrecada.
O exame é feito pela Câmara Sindical. A urgência das medidas não permitiria que se aguardasse a atividade de
corpo coletivo, como é a Câmara Sindical. Daí ter-se atribuído ao síndico o ato de arrecadação. Função, essa,
de tomada de posse e de arrolamento.
Acrescenta o art. 18: “Do exame a que proceder a Câmara Sindical nos papéis e livros pertencentes ao ofício de
corretor, em estado de vacância, far-se-á a declaração na ata da reUnião da Câmara, e bem assim do destino
dado aos mesmos”. Não se trata de auto de arrecadação, porque êsse é feito pelo síndico, mas sim de auto de

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exame, declaratório do que foi observado e do que se resolveu quanto ao destino dos livros e dos papéis, bem
como dos outros objetos ligados à atividade do ofício.
Quanto ao preenchimento das vagas, há o preenchimento provisório e o preenchimento definitivo. Quanto ao
primeiro, diz o Decreto n. 2.475, art. 19: “A vaga do ofício de corretor será preenchida temporàriamente por
um dos membros da corporação que o síndico designar; o nomeado terá competência para liquidar as operações
e expedir certidões das que houverem sido escrituradas pelo corretor demissionário, suspenso ou falecido. Há,
hoje, o assistente-sucessor.
Estabelece o art. 20 do Decreta n. 2.475: “Se a vaga ocorrer por moléstia incurável que inabilite o corretor para
o exercício cargo ou por falecimento do corretor, será permitido o Sindical propor, de preferência a outrem, um
filho do corretor para substitui-lo no ofício, dada a igualdade de circunstancia;. quarto à idoneidade”. Aqui, já
se cogita do preenchimento definitivo, e não do preenchimento temporário. A Câmara Sindical não está adstrita
a propor o filho do corretor falecido ou incurâvelmente doente. Apenas se lhe deu a possibilidade de propor. Em
todo o caso, há na regra jurídica a alusão à preferência, que torna recomendável o filho do corretor. A regra
jurídica do art. 20 cede diante da preferência que tem o assistente-sucessor, em virtude da Lei n. 2.146, de 29 de
dezembro de 1958, art. 82, § 22.

9. VEDAÇÕES AOS CORRETORES OFICIAIS. Estatui o art. 49 do Decreto n. 2.475: “~ vedado aos
corretores, sob as penas do art. 59 do Código Comercial: a> formarem entre si associação particular para
operação de sua profissão; 14 fazerem tôda a espécie de negociações e tráfico direto ou indireto, debaixo do seu
ou de alheio nome, e contraírem sociedade de qualquer denominação ou classe que seja; e) adquirirem para si,
ou para pessoa de sua família, coisa cuja venda lhes houver sido incumbida, e venderem as que lhe
pertencerem, quando tenham ordem de comprar da mesma espécie; d) exercerem cargos de administração ou
fiscalização de sociedades anônimas, exceção feita das disposições do art. 160; e) encarregarem-se de
cobranças ou pagamentos por conta alheia, salvo no caso de liquidação do seu contrato”. No Decreto-lei n.
1.344, de 13 de junho de 1939, art. 72, vedou-se mais: a) assinar ou referendar nota, confirmação ou proposta
de operação efetuada por outro corretor; LO lavrar nota ou confirmação de contrato sem as formalidades legais;
c) transferir contrato de operações a têrmo a outro corretor, antes de fazer os respectivos registos”.
a) Corretores oficiais, em princípio, não se podem reUnir em sociedade. A Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de
1958, art. 52, abriu exceção à regra jurídica do art. 49 do Decreto n. 2.475. Diz o art. 52 da Lei n. 2.146: “Os
corretores oficiais de valôres poderão associar-se entre si, exclusivamente para a constituIção e funcionamento
da Caixa de Liquidação e Câmara de Compensação, bem como para a construção e aquisição do prédio de
propriedade da respectiva Corporação”. Tal sociedade é personificável. No § 1.0, acrescenta-se: “As Caixas de
Liquidação e Câmaras de Compensação serão organizadas segundo as leis vigentes e as peculiaridades de cada
Bôlsa de Valôres”. A criação e a organização, compreende-se, têm de ser conforme as leis vigentes. Quanto às
particularidades de cada Bôlsa de Valôres, a regra jurídica do art. 52, § 12, da Lei n. 2.146 é regra programática,
que deixa certa liberdade aos estatutos de cada Caixa de Liquidação ou de cada Câmara de Compensação, sem
que lhes permita afastarem-se do que e ins cogens na legislação sobre Bôlsas de Valôres e sobre corretores
oficiais de valôres.
Já o Decreto-lei n. 1.844, de 13 de junho de 1989, art. 82, permitia a sociedade com os seus auxiliares, o que
continua em vigor, e há de ser conforme o art. 325 do Código Comercial (cf. Regimento Interno, art. 69, b).
b) O corretor oficial não pode ser figurante de qualquer negócio jurídico que a lei haja reservado à corretagem
oficial; isto é, o negócio jurídico que os clientes teriam de concluir por obra de corretagem oficial, e não por
obra de corretor não oficial, como, por exemplo, a venda ou a compra de metais preciosos amoedados ou em
barra, não pode ser feito pelo corretor oficial como vendedor ou comprador. O art. 49, 14, do Decreto n. 2.475
tem a finura de pôr em relêvo que o corretor não opera em seu nome, não é figurante (e. g., não compra nem
vende o que pertence aos incumbentes) ; e o art. 49, 14, proibe-lhe que o faça. Não pode mesmo pôr interposta
pessoa para adquirir para êle.

No art. 49, a), do Decreto n. 2.475 proibe-se ao corretor oficial de valôres fazer sociedade com outro corretor
oficial ou outros corretores oficiais. No art. 49, 14, 2Y parte, vai-se alem: veda-se-lhe ser sócio de qualquer
emprêsa, mesmo que os outros sócios não sejam corretores. Há, porém, exceção. Lê-se no art. 32 do Decreto-lei
n. 1.344, de 18 de junho de 1939:

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“O corretor pode fazer sociedade com os seus auxiliares”. Acrescenta o ~ 1.0: “A sociedade versará apenas
sobre a gestão do capital invertido e não sobre o cargo, e deverá constar de escritura pública que só produzirá os
efeitos legais depois de registada no Registo de Comércio e na Câmara Sindical”. E o § 2.0: “O corretor deve
concorrer, no mínimo, com a quarta parte da fiança e do pecúlio”.
O art. 62 e os §§ 12, 2.0 e 3•0 da Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, de modo nenhum derrogam o art.
49, a>, do Decreto n. 2.475. Somente há gestão social de capital, e não a da corretagem. O art. 6.~, § 1.0, da Lei
n. 2.146 é explícito.
Diz o art. 62 da Lei n. 2.146: “Os corretores oficiais de valôres poderão constituir sociedades financeiras,
especializadas em negócios mobiliários”. E o § 1.0: “Constará do contrato social que o ofício público e a sua
gestão são pessoais do corretor e indelegáveis ~ sociedade, podendo ser transferido apenas ao sucessor legal no
oficio, por morte ou desistência do referido titular”. E o § 2.0: ~O contrato social somente terá por objeto a
gestão do capital e não do cargo do corretor”. E o § 3.0: “O corretor responderá, com a garantia de sua fiança
pecúlio, bens particulares e capital social, perante a CÂMARA Sindical e seus comitentes, pela final liquidação
dos negócios em que interferir”.
c) Além de não poder operar como figurante de negócios jurídicos que, em caso de incumbência de corretagem,
teriam cc ser por intermédio de corretor oficial (Decreto n. 2.475, art. 49, 14, 1.~ parte), o corretor não pode
adquirir para si ou para pessoa de sua família entendendo-se como família o cônjuge e as pessoas que poderiam
ser herdeiros legítimos ou casadas com herdeiros legítimos o que como corretor teria de alienar ou de adquirir.
De outro modo, tal proibição já estaria no art. 49, 14, 1.~ parte. Porém a parte final do ad. 49, e). explicita a
ratio legis: se A incumbiu o corretor oficial de vender ações ns. 1, 2 e 3 da emprêsa E, não pode o corretor
oficial comprar para si ou para alguém da sua família ações ns. 4, 5 e 6 da mesma emprêsa, ou a ação n. 4, ou as
ações ns. 4 e 5, ou de quaisquer números. O membro da família pode fazê-lo, desde que não opere o corretor ou
não haja dissimulação de aquisição pelo corretor oficial.

Diz o Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1939, art. 27:


“O auxiliar de corretor que sonegar negócios realizados ao pregão ou registo será punido com suspensão até
trinta dias e multa de mil cruzeiros”.
Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 56: “Os livros dos corretores, que se acharem escriturados na forma do
regulamento, sem vicio ou defeito, terão fé pública”. A fé pública supóe que a escrituração seja regular, sem
rasuras, entrelinhas não ressalvadas e outros defeitos.
Acrescenta o art. 57 do Decreto n. 2.415: “Os livros não escriturados em forma regular e não revestidos das
formalidades legais não fazem prova em Juízo em favor do corretor”. Entendia J. X. CARVALHO DE
MENDONÇA (Tratado de Direito Comercial, II, 376) que os arts. 57 e 58 do Decreto n. 2.475 foram mal
redigidos e, a despeito da referência a Juízo, se referem à exibicão administrativa. Sem razão. A explicitude do
art. 57 afasta a interpretação que êle queria. O que ocorre é que, se não há a prova, em juízo, a favor do corretor,
não. pode haver tal prova, em processo administrativo.
Diz o art. 58 do Decreto n. 2.475: “O exame parcial dos livros do corretor terá lugar, por ordem da Câmara
Sindical, sempre que se originarem dúvidas ou ventilar-se questão sobre operações de Bôlsa em que o mesmo
corretor houver funcionado. O exame geral somente poderá ter lugar nos casos expressos no Código de
Comércio e neste decreto, e sempre que a Câmara Sindical julgar necessário tal exame para apurar fatos que
constituam em responsabilidade o corretor”. O que se estabelece, no art. 58, é que o corretor tem o dever de
apresentar os seus livros à Câmara Sindical para que essa os examine parcialmente, sempre que dos livros
conste ou haja dc constar operacão de bôlsa ou outra operação em que o corretor tenha funcionado. O exame
integral é cabivel sempre que se haja de apurar responsabilidade do corretor.
Acrescenta o Decreto n. 2.475, no art. 60: “A recusa de exibição dos livros, ordenada por autoridade
competente e nos casos do artigo anterior, sujeitará o corretor à aplicação do disposto no art. 20 do Código de
Comercio

Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 61: “Os livros do corretor, quando arrecadados pela Câmara Sindical, serão
guardados em seu arquivo, ou entregues ao sucessor no ofício nas hipóteses dos arts. 16, 17, 19 e 20 dêste
Decreto”.
No Regimento Interno da Bôlsa de Valôres e dos Corretores de Fundos Públicos do Rio de Janeiro, art. 79, diz-
se:
“Todo corretor deve ter os seguintes livros: a) um caderno manual numerado, aberto, encerrado e rubricado

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pelo síndico; b) um protocolo numerado, aberto, encerrado e rubricado pelo Departamento de Indústria e
Comércio”. Estabelece-se no art. 80: “Será facultado ao corretor o uso dos seguintes livros auxiliares: a)
copiador selado e numerado, aberto, encerrado e rubricado pelo síndico, onde serão transportadas as cartas,
telegramas, memoranda e contas concernentes aos negócios do oficio; b) livro para o lançamento de contas com
os comitentes, devendo a escrituração ser feita por partidas dobradas”. Acrescenta o parágrafo unico:
‘tstes livros obedecerão ao modêlo fornecido pela Câmara Sindical”. No caderno manual devem ser lançadas,
com clareza e individuação, logo que concluídas, tôdas as operações realizadas pelo corretor ou seu preposto
(Regimento Interno, art. 81). No protocolo devem ser lançados, diàriamente, os assentamentos do caderno
manual, por cópia literal, por extenso, sem emendas, rasuras, entrelinhas, transposições ou abreviaturas,
guardada a ordem da numeracão ( as operações escrituradas nesse caderno, mencionando-se os nomes do
comprador e do vendedor, a natureza, o preço, o prazo e tôdas as condições da operação (Regimento Interno,
art. 82). Êste livro terá as formalidades exigidas no art. 13 do Código Comercial, sob pena de não terem fé os
assentamentos nêle lançados (Regimento Interno, art. 82, parágrafo único). Os livros dos corretores que se
acharem revestidos das formalidades legais, escriturados em boa ordem, sem vícios ou defeitos, terão fé pública
(Regimento Interno, art. 83).

Os livros obrigatórios do corretor serão apresentados à Câmara Sindical de seis em seis meses, para verificação
do andamento da escrita e para efeito do “visto” do síndico (Decreto n. 22.422, de 1.0 de fevereiro de 1933,
artigo único; Regimento Interno, art. 92). A não apresentação dos livros, sujeitará o corretor a uma multa de
cinco mil cruzeiros e do dôbro na reincidência, sendo essa retirada da caução (Decreto n. 22.422, de 1.0 de
fevereiro de 1983, artigo único; Regimento Interno, art. 92, § 1.0). A Câmara Sindical remete ao Ministro da
Fazejida, durante o mês de janeiro do ano seguinte, a relação dos faltosos, determinando, desde logo, a retirada
da multa do pecúlio instituído pela Caixa de Garantia e Previdência (Regimento Interno, art. 92, § 2.0). Os
livros do corretor, quando arrecadados pela Câmara Sindical, serão guardados no seu arquivo por espaço de
vinte anos, ou entregues ao sucessor do ofício (Regimento Interno, art. 93). Findos os vinte anos, são os livros
incinerados (Regimento Interno, art. 93, parágrafo único). As certidões extraídas dos livros, com referência à
fôlha em que os atos se acharem escriturados, sendo subscritas e assinadas pelo corretor, têm fôrça de
instrumento público para prova dos contratos respectivos (Regimento Interno, art. 94). O corretor que passa
certidão contra o que constar dos seus livros, incorre nas penas do crime de falsidade e perde a metade da
caucão (Regimento Interno, art. 95). Incorre na multa igual àquarta parte da caução e em suspensão por dois
meses o corretor cujos livros são achados sem as formalidades e declarações exigidas na lei (Decreto n. 2.475,
art. 142; Regimento Interno, art. 96). Incorre na pena de suspensão de três meses o corretor que, já punido por
não ter os livros escriturados com as formalidades e declarações exigidas, reincide nessa falta, provado que o
fêz fraudulentamente. Presume-se a fraude sempre que nas operações de câmbio, de espécie metálica e de
fundos, não forem mencionados nos livros os nomes dos comitentes de idoneidade reconhecida ou quando tais
operações não estiverem escrituradas no protocolo (Regimento Interno, art. 97).

11. CERTIDÕES E ATESTADOS. A função declarativa e certificativa do corretor mostra que êle não é
figurante, nem representante, nem comissionário. Parece-se com a do tabelião, mas o tabelião instrumenta e
certifica, não declara a conclusão, porque lhe falta a função intermediatriz. A nomeação do corretor oficial,
como a do tabelião, é autorização e legitimação a função privativa. Daí nascem direitos e deveres.
Os negócios jurídicos que foram reservados aos corretores de valôres, sejam em bôlsa, sejam fora de bôlsa, de
contado ou a. têrmo, firmes, a prêmio, ou de reporte, somente admitem a intermediação que seja pelos
corretores oficiais.
Estatui o Decreto n. 2.475, no art. 62: “As certidões extraídas dos livros com referência à fôlha em que os atos
se acharem escriturados, sendo pelos corretores subscrita e assinada, terão fôrça de instrumento público para
prova dos contratos respectivos
Diz o art. 63 do Decreto n. 2.475: “O corretor, que passar a certidão contra o que constar dos seus livros,
incorrerá nas penas do crime de falsidade e perderá a metade da fiança”.
12. PROCURAÇÃO E FUNÇÃO DE CORRESPONDENTE. Diz o Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de
1939, art. 19: “O corretor poderá ser procurador dos seus clientes para a compra-e-venda de títulos de Bôlsa,
para recebimento dos seus juros e dividendos, para atos extrajudiciais a êles relativos”.
Acrescenta o art. 20: “Poderão ainda os corretores: a> incumbir-se de pagar juros e dividendos de títulos de
Bôlsa; li’) constituir-se correspondentes, uns dos outros nas diferentes praças nacionais; o) ter correspondentes

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no estrangeiro e ser correspondentes dêstes nas praças nacionais . Veja Tomo XLIV.
Corretor não é mandatário, nem procurador, nem comíssonario . O que o Decreto-lei n. 1.344, arts. 19 e 20,
permite. é que o corretor exerça procura não se disse mandato no tocante à compra e à venda de títulos de
Bôlsa. Sem tal procuração, o corretor apenas pode desincumbir-se do que o cliente lhe atribuiu, que é pura
função de corretagem: quem diz o que quer alienar ou adquirir é o incumbente; o negócio jurídico tem como
figurante o incumbente, de modo que não há qualquer representação. Com a procuração, o corretor oficial fica
com o poder de escolher o momento, a qualidade e a quantidade do que há de alienar ou de adquirir. Não se
interprete o ad. 19 do Decreto-lei n. 1.344 como se o negócio jurídico que concluiu, dentro da Bôlsa ou fora da
Bôlsa, fôsse com a interposta figura do corretor oficial, como procurador. A outorga de poderes não apaga a
atividade de corretagem em sua especificidade.
Na 2•a parte do art. 19 do Decreto-lei n. 1.344 fala-se de procurador para recebimento de juros e dividendos e
para atos extrajudiciais relativos aos títulos de Bôlsa. Aí, sim, há procura em tôda a extensão: o corretor tem, ex
hypothesi, poder para receber juros ou dividendos e para outros atos extrajudiciais concernentes aos títulos,
como recebimento de títulos dados em bonificação, prêmios de apólices, debêntures ou ações.
O art. 20, a), explicita que o corretor oficial pode ser incumbido de pagar juros e dividendos de títulos de Bôlsa.
Aí, há procura.
No art. 20, b) e e), claramente se permitiu a posição jurídica de correspondência entre corretores oficiais de
praças diferentes, inclusive se um dos figurantes do contrato de correspondência é corretor no estrangeiro.
O correspondente compreende incumbências de receber e de prestar, operando conforme o contrato de conta-
corrente, mediante remessas, saques, cartas de crédito e cambiais, O correspondente não é sucursal nem
agência. Veja Tomo XLIV.
13. LEGISLAÇÃO BRASILEIRA SOBRE CORRETORES. A Lei de 15 de novembro de 1827, art. 63, impôs
a presença do corretor para a transferência das apólices da dívida pública. Durante o Império, referiram-se aos
corretores o Decreto n. 417. de 14 de junho de 1845, o Decreto n. 648, de 10 de novembro de 1849, o Decreto
n. 806, de 26 de julho de 1851, o Decreto n. 2.733, de 23 de janeiro de 1861 e Decreto n. 6.132, de 4 de março
de 1876. Na República, a Lei n. 1.026, de 14 de outubro de 1890, o Decreto legislativo n. 882, de 18 de outubro
de 1890, o Decreto legislativo n. 1.359, de 20 de abril de 1893,o Decreto legislativo n. 149-E, de 28 de julho de
1893, o Decreto legislativo n. 354, de 16 de dezembro de 1895, o Decreto n. 2.475, de 13 de março de 1897, o
Decreto legislativo n. 566, de 9 de janeiro de 1899, o Decreto n. 4.985, de 3 de outubro de 1903, o Decreto n.
21.854, de 21 de setembro de 1932, o Decreto n. 22.422, de 1.0 de fevereiro de 1933, o Decreto n. 24,387, de
13 de junho de 1934, o Decreto n. 24.275, de 27 de junho de 1934, que pela primeira vez falou de bôlsas
estaduais e aumentou o prazo para os negócios a têrmo, de trinta para cento e oitenta dias, e a legislação de que
falaremos nos lugares próprios.

§ 4.742. Prepostos de corretor

1.PREPOSIÇÃO E SUBSTITUIÇÃO. (a) O corretor não poderia prescindir da colaboração de prepostos. Quer
o substituam nos pregões, quer fora da Bôlsa, os prepostos têm poderes para praticar os atos para os quais tem
poder o corretor. São intermediários, por conta do corretor, e os seus atos, como os do corretor, não são de
outorgados do incumbente. No que o corecor mesmo se vincularia, vinculam-no os prepostos. Quanto ao
incumbente, a sua vinculação é a mesma, quer tenha intermediado o corretor, quer o preposto. O Estado exerce
sobre o preposto, através da Câmara Sindical, o mesmo velamento que sobre o corretor. ‘O preposto, no tocante
à sua atividade, corretor não é, mas sim instrumento do corretor. Não é procurador, não representa (sem razão,
respectivamente,
N.GARLIONE, Le Rorse valori, 165, e Gumo ZANOBINI, Corso di Diritto amministrativo, V, 2~a ed., 497) ;
mas sim preposto, no sentido técnico, como o caixeiro. O empregado do banco não é representante do banco.
Ser preposto não é ser procurador. Apenas o Estado exerce contrôle sobre a prepositura como sobre a
corretagem. O corretor, para os atos não sujeitos à tutela publicística, pode constituir mandatários,
procuradores, comissionários e agentes; para os atos sujeitos àtutela publicística, de modo nenhum. Só o
corretor oficial e o preposto, nomeado e investido conforme as regras legais, podem entrar no recinto da Bôlsa e
praticar quaisquer atos que a lei reservou aos corretores oficiais.
Na lei, como quase sempre, não se presta atenção à extensão da figura do mandatário.
Estabelece o art. 26 do Decreto n. 2.475: “Os prepostos dos corretores são considerados mandatários (!) legais
dos me~mos para os efeitos: a) de praticarem os atos atinentes ao ofício de que forem encarregados pelos

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corretores; b) substituirem os corretores nos seus impedimentos. Sempre que houver de dar-se a substituTçáo,
terá a Câmara Sindical aviso prévio”. Quando o preposto é encarregado de praticar algum ato em que se precise
de mais do que o pregão ou a martelada, há outorga de poder de representação; portanto, procura, e não
mandato. A função permanente na Bôlsa, essa, é a de preposição. e não a de mandatário, nem mesmo a de
procurador.
Dizia o Decreto n. 2.475, art. 21: “Aos corretores de fundos é permitido terem como auxiliares um ou mais
prepostos, designados pelos mesmos corretores e aprovados pela Câmara Sindical”. Um ou mais; hoje, porém, a
própria lei que tornou a legislacão sobre corretores de valôres comum ao Distrito Federal, aos Estados-membros
e, se os pressupostos ocorrerem, aos Territórios, limitou o número, embora ressalvando as organização já
existentes. Lê-se na Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, art. 3.0: “Os corretores oficiais de valôres
poderão ter, na sede da respectiva Bôlsa, apenas um preposto, além de seu eventual assistente-sucessor; dentro
da mesma jurisdição, poderão nomear até três prepostos, em cada cidade”. Quanto aos corretores oficiais que
tenham mais de um preposto, foi estabelecido (art. 32, § 12) : ‘¶~ ressalvado o direito dos corretores de manter
os seus atuais prepostos e agentes”. “No caso de vacância”, continua o § 2.0, “o preposto assistente--sucessor
de corretor oficial continuará no exercício do cargo, uma vez comprovadas as formalidades legais”.
Diz o art. 22 do Decreto n. 2.475: “Tais prepostos devem reunir os requisitos exigidos para o ofício de corretor,
conquanto lhes seja vedado operar por conta própria”. Frisa-se na lei que o preposto opera por conta do
corretor, e nunca por conta própria. Penetra na Bôlsa porque a lei lho permite, como ao corretor, e porque está a
serviço do corretor. Não o substitui; opera como se fôsse o corretor que operasse, e por conta do corretor.
Nenhum ato de corretor êle pode praticar sem ser como simples instrumento, mão e bôca do corretor.
Lê-se no Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1939, art. 26: “Não será admitido a auxiliar de corretor aquêle
que tenha exercido igual ofício em qualquer das Bôlsas de Valôres do País, sem que apresente atestado de boa
conduta, fornecido pela última Bôlsa a que pertenceu”.
Lê-se no Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1939, ad. 21: “Cada corretor poderá ter como auxiliares até
dois
repostos, que poderão substitui-los nos pregões, e quatro adjuntos”. Acrescenta o parágrafo único: “O corretor
que presidir a sessão dos pregões poderá ser substituído nos atos de seu ofício, na mesma sessão, por um de
seus preposto?’. Hoje, um dos prepostos é o assistente-sucessor, conforme a Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de
1953, art. 39. Mantêm os torretores (art. 3•0, § 1.0) os prepostos e os adjuntos que ainda exercem os cargos. À
medida que vagarem os cargos, extinguem-se, pois apenas persistem dois prepostos, um dos quais é o
assistente-sucessor.
Diz o Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1939, ad. 22:
“Cada Câmara Sindical arbitrará a fiança que os auxiliares dos corretores deverão prestar na Tesouraria da
Bôlsa”. Os corretores não têm mais outros auxiliares que os existentes, salvo o preposto e o assistente-sucessor
e os três prepostos regionais, a que se refere o art. 3•0 da Lei n. 2.146. Os outros auxiliares são fora da
atividade corretriz: trabalham nos escritórios, quais empregados de emprêsa.
Estabelece o art. 28 do Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1939: “A fiança dos auxiliares de corretor
responde pelas indenizações, até que estejam liquidadas as negociações em que interferiu”. Leia-se “caução”
em vez de “fiança”.
Diz-se no art. 29: “Se a fiança estiver desfalcada ou esgolada, o auxiliar deverá completá-la ou renová-la,
ficando afastado das funções enquanto não o fizer”.
Quaisquer auxiliares dos corretores oficiais prestam caução. Nas operações em que funcionou o preposto ou o
assistente sucessor, ou qualquer auxiliar, que tenha de prestar caução, -as liquidações aliás os adimplementos
têm a segurança da garantia exigida pela lei e, qualquer que seja a diminuição, em virtude de liquidações, o
auxiliar não pode continuar a operar, até que se integre a quantia exigida para a caução.
Estatui o art. 23 do Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1939: “O preposto age em nome do corretor,
respondendo êste solidâriamente pelos atos praticados no exercício de suas funções”. ~ o corretor que opera,
com a atuação física e psíquica do preposto.
Acrescenta o art. 24: “Os auxiliares de corretor podem agenciar e iniciar operações, sendo imprescindível o
consenti

mento do corretor e a sua assinatura nos contratos escritos”y Podem agenciar e iniciar operações, com a outorga
do corretor. ~ão concluem negócios jurídicos.
Diz o art. 30: “O preposto ou adjunto deve declarar em todos os seus papéis e publicações o nome do corretor

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de quem é auxiliar, não lhe sendo permitido trabalhar em nome próprio; pena de susoensão até três meses, e
demissão na reincidência”.
Lê-se uo art. 31: “Nos salões de pregão das Bôlsas serão afixados quadros com os nomes e sobrenomes dos
prepostos e adjuntos, com indicação dos nomes e sede dos escritórios dos respectivos corretores”. Prepostos (e
adjuntos) podem operar na l3ôIsa.
A preposição supõe dependência e permanência. O preposto pratica os atos como instrumento do preponente.
Lê-se no art. 25 do Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1939: “Os prepostos do corretor, além de o ajudarem
na gestão de seu ofício, quando no exercício do cargo, substi-tuem-no em seus impedimentos, de acôrdo com o
que dispuser o Regimento Interno da Bôlsa”. A Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, art. 3•Q, limitou o
número de prepostos e falou do eventual assistentesucessor Há um preposto e o assistente
-sucessor, salvo no que a lei respeitou as situações já estabele-. cidas (art. 3•O, § 1.0). O Decreto-lei n. 1.344,
art. 25, e outros textos legais foram derrogados, com ressalva.
Se alguém pratica atos do corretor sem ser preposto, preposto não se faz, porque a lei exigiu pressupostos.
Todavia, se alguma pessoa, que não é preposto, trabalha com o corretor como se preposto fôsse, ú corretor
responde pelos atos de tal pessoa, a que se permitiu, na emprêsa de corretagem, parecer preposto. Cp. MAmo
CASANOVA (Le Imprese commerciali, 278).
(b) A substituição ocasional, temporária, do corretor, depende de haver ou não o assistente-sucessor, que
preposto é, mas de grau mais elevado.
2.PREPOSTO E GRANJEADOR OU ZANGÃO. O preposto é inconfundível com o remisier, o zângão, o
granjeador, que a praxe bolsística hodierna incorporou às figuras jurídicas. O remisier e pessoa fora do ofício do
corretor, auxilia de fora. Com as suas relações com capitalistas, industriais e especuladores angaria
incumbências para os corretores. Há relação jurídica con
tratual entre êle e o corretor, a quem presta os serviços com exclusividade, mediante percentagem sobre o que
vier a perceber o corretor. Não é simples mediador. Já vimos que o contrato de mediação só se conclui quando
se conclui o negócio jurídico que se tinha em vista. Não é mandatário. Trata-se de contrato de obra, de
empreitada de incumbências (REMO MAR-TINI, La Borsa, 110 s.; MORO, 1 “remisiers”, La Bor.sa vaiou.
1948, II, 57; LUIGI Lomtm, Suíla figura giuridica del “remisier” di borsa, Banca, Borsa e Titoli di credito,
1950, II, 122). Em todo o caso, pode a figura fazer-se a de agente de incumbêndas, como qualquer agente, o
Handiungsagent dos juristas alemães. O que se tem de afastar, enêrgicamente, é que se trate de comissionário,
como queria GEORGES RIPERT (Traité élémentaire de Droit Commercial, 2•a ed., 6.53). Se o zângão
épermanente, agente é. Se tem procuração para receber, em nome do corretor, incumbências, é procurador, mas
supóe-se subjacente o negócio jurídico de locação de obra. Aliás, é possível que a prestação não seja por
incumbência, e sim por mês, ou outro período, tendo-se, então, contrato de locação de servlços, talvez mesmo
de trabalho. Já é outra a figura.
A estabilidade e a continuidade da prestação do zângão, do granjeador, enche diferentemente, conforme a sua
intensidade, o contrato entre êle e o corretor.

3. DISCIPLINA DOS PREPOSTOS. Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 23: “Os prepostos dos corretores estão
sujeitos à ação disciplinar da Câmara Sindical, podem ser por esta suspensos ou destituídos ez off ido, e sê-lo-ão
sempre que o entender conveniente o corretor”. Os prepostos de corretores oficiais, pelo fato mesmo de ter
havido a ligacão às instituições para se~ satisfazer à técnica publicística das Bôlsas e das Câmaras Sindicais,
estão sujeitos à disciplina da Câmara Sindical, e não só à do corretor. Bastaria êsse fato de ser preposto do
corretor e poder ser suspenso ou destituído sem ser por êle para que ressaltasse o interesse público que se tutela.
O preposto tem a sua função, na Bôlsa, como sombra do corretor. É o corretor que por atos dêle opera. É
elemento da Bôlsa. Diz o Decreto n. 2.475, art. 25: “A Câmara Sindical terá um livro especialmente destinado
ao lançamento dos têrmos de aprovação dos prepostos dos corretores e fará afixar

em quadros próprios nos salões da Bôlsa os nomes, cognomes e apelidos dos prepostos em exercício, com
indicação dos correteres com que trabalham”.
Acrescenta o art. 24: “Os atos de nomeação, de suspensão e de demissão dos prepostos serão levados ao
conhecimento de tôda a corporação por meio de boletins afixados nos salões da Bôlsa pelo tempo de oito dias”.

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Também aqui se põe à mostra que a função do preposto, a despeito da sua dependência em relação ao corretor, é
de interesse público. Nem se compreenderia que pessoa que entra e funciona na Bôlsa pudesse ser nomeado,
suspenso ou demitido sem que o soubessem os que trabalham na Bôlsa e os que frequentam a Bôlsa, ou que são
informados, em seu interesse, do que se passa na Bôlsa. Não se exigiu a publicidade externa, que é facultativa.
A lei satisfaz-se com a publicidade interna, no âmbito bolsístico. Não há segrêdo. E pode ser pedida certidão.
4.ATIVIDADE DOS PREPOSTOS DO CORRETOR. Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 27: “Os prepostos dos
corretores possuirão um canhenho aberto, encerrado e rubricado em cada uma de suas páginas pelo presidente
da Câmara Sindical, no qual registrarão as operações logo que as contratarem (?). O canhenho será apresentado
na hora da Bôlsa para serem as operações nêle mencionadas transcritas nas cadernetas dos corretores e
devidamente cotadas, podendo ser as negociacões de cambiais comupicadas até a hora do encerramento do
câmbio. Os lançamentos deverão conter declaração explícita das quantidades e taxas a que operarem”. As
regras jurídicas do art. 27 mostram que o preposto é instrumento da atividade do corretor. Cérebro electrônico
poderia ter a mesma função. O fato de ter canhenho, onde se registam as operações, e de ser preciso que se
transcrevam as anotações na caderneta do corretor evidencia que o nome, que se lhe deu na língua portuguêsa, é
o nome exato. O preposto do corretor oficial preposto é, e a sua legitimação a operar pelo corretor a lei lha deu,
se o corretor “ordena”. Quem outorga poderes não ordena; pode ordenar quem pode fazer de outrem o seu
instrumento.
Estatui o art. 28 do Decreto n. 2.475: “Os corretores respondem solidàriamente por seus prepostos”. Tal
responsabilidade é estabelecida ex lege. O corretor que deixou ao preposto o campo de atividade, ou que lhe
deu ordem, responde pelos atos do seu instrumento, sem que se precise de invocar qualquer regra jurídica sobre
contrato de mandato, ou sobre procuração, ou sobre locação de obra. Se o ato exigia outorga de poderes de
representação, e o corretor lhos deu, não é o art. 28 do Decreto n. 2.475 que se tem de invocar.

§ 4.743. Câmara Sindical

1.CONCEITO E NATUREZA. A Câmara Sindical é órgâo da assembléia de corretores oficiaIs, enú so faz
instituicão autônoma, a respeito da qual se tem de precisar o conceito e de se apurar a natureza. O Estado, com
a sua intromissão publicística, não faz órgão estatal a Câmara Sindical, embora a enquadre, com a Bôlsa, no
sistema administrativo do Estado. Há interesse público nas operações bolsísticas e o Estado satisfaz-se com a
edicção de algumas regras jurídicas cogentes sobre organização e funcionamento e sobre disciplina.
A Bôlsa tem três órgãos principais: a Câmara Sindical, o síndico e os corretores oficiais. tsses, pessoas físicas,
criam, eletivamente, a Câmara Sindical, que a êles se superpóe.
a função da assembléia. A Câmara Sindical exerce poderes de fiscalização, de vigilância e de velamento. Não
tem poderes de árbitro, mas a sua autoridade moral e técnica permite-lhe que a invistam de poderes amigáveis,
no afastamento de controvérsias entre corretores, ou entre corretores e incumbentes ou interessados nas
operações.
Surge o problema de se saber se a Câmara Sindical tem personalidade juridica. Já dissemos que a Bôlsa não a
tem. Não se pode negar que é largo o âmbito de competência que se dá à Câmara Sindical, inclusive em funções
de direito público (cf. ARTURO CAPUTO, La Liquidazione coattiva dei contraiU di borsa valori, 72).
Todavia, argúi-se que apenas se trata de órgáo colegial dos corretores, sem qualquer personificação, pois que
não é titular de direitos e de deveres. Seria somente órgão dos corretores.
Focalizemos as duas soluções:
a)Solução negativa da personalidade juridica da Câmara Sindical. Nem a Bôlsa de Valôres nem a Câmara
Sindical têm personalidade jurídica. Os corretores é que elegem a Câmara Sindical e a Câmara Sindical exerce
as funções que se reputaram mais próprias ao corpo colegial do que à assembléia de corretores. A atribuícão não
se fêz acompanhar de personificação. Nem a submissão à disciplina pela Câmara Sindical, tal como o
preestabeleceu a lei, implica que o corpo colegial se personifique. Assim pensa RENATO CORRADO (1
Contratti di bossa, 16 s.).
b)Solução afirmativa da personalidade jurídica da Câmara. Sindical. A Câmara Sindical tem personalidade
jurídica. Não na tem a Bôlsa de Valôres. O síndico presenta a Câmara Sindical Alguns juristas que negaram a
personalidade jurídica da Câmara Sindical foram levados pela afirmação de que, para ser pessoa jurídica, a
entidade há de ser sujeito de direitos patrimoniais e de deveres patrimoníaís. Mas a afirmação e sem base: pode
ser pessoa jurídica entidade que não tem qualquer patrimônio.

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2.ELEIÇÃO DO SÍNDICO E DOS MEMBROS DA CÂMARA SINDICAL. Estatui o Decreto n. 2.475, art.
64: “Os corretores de fundos públicos da Capital Federal constituídos em assembléia geral, em número, pelo
menos, de dois terços, elegerão, anualmente, entre si, uma Câmara Sindical, composta de um síndico, como
presidente, e de três adjuntos”. Hoje, com a Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, o art. 64 apanha as
Câmaras Sindicais de tôdas as unidades estaduais e territoriais em que se criem Bôlsas. Aliás, tal lei deveria ter
sido feita desde o início, para se corrigir a limitação de jure condendo desaconselhável e de jure condito
contrária aos princípios constitucionais que se fêz com o Decreto n. 2.475. O síndico passou a ter o cargo por
dois anos, para melhor continuidade da administração (Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, ad. 70)
O art. 33 do Decreto-lei n. 3.344, de 13 de julho de 1939, marcou a data de 10 de janeiro de cada ano para a
eleição do síndico. Acrescenta o § 1.0: “A mesma assembléia elegerá a Câmara Sindical e a Comissão de
Contabilidade, e fixará o pecúlio da Caixa de Garantia e Previdência”. E o § 2.~: “Cada Câmara Sindical poderá
ter até seis membros”.
Ainda o § 3.0: “O decano da Bôlsa substituirá qualquer membro da Câmara Sindical, pela forma que o
regimento interno determinar
Diz o art. 65 do Decreto n. 2.475: “Da eleição, que será feita por escrutínio secreto e por maioria absoluta de
votos, lavrar-se-á uma ata em livro para êsse fim determinado; dela extrair urna copia autenticada, que será
enviada ao Ministro da Fazenda”. O art. 65 tem de ser atualizado, com a extensão de outras Bôlsas de Valôres
do país.
O síndico é órgão da Câmara Sindical e da Bôlsa. Presenta a Câmara Sindical, não presenta a Bôlsa, porque
essa não tem personalidade jurídica.
3.REUNIÕES ExTRAORDINÁRIAS E ASSEMBLÉIA GERAL EXTRAORDINÁRIA. Lê-se no Decreto n.
2.475, art. 66: “Os corretores não se poderão reúnir extraordinàriamente a não ser em virtude de convocação do
síndico”. A regra jurídica é tradicional nos sistemas jurídicos. Um dos elementos distintivos das Bôlsas é o
horário determinado, que se impõe aos corretores oficiais e aos interessados. Aliás, já assim se estabelecia nos
mercados, quer na antiguidade quer na Idade Média, pôsto que mais rígido fôsse, desde cedo, o regime das
Bôlsas.
Acrescenta o ad. 67 do Decreto n. 2.475: “Os corretores poderão solicitar a convocacão de uma assembléia
geral de sua corporação para deliberar sobre caso urgente e de justificada gravidade ocorrente no
funcionamento da Bôlsa e com referência à cotação do curso de títulos, das espécies e dos câmbios. O pedido
de convocação deve ser formulado por escrito e assinado por dois corretores em exercício ativo da profissão”.
Trata-se de assembléia geral cuja convocação se tem de pedir ao síndico, porque se há de considerar competente
para deferir a convocação quem poderia, a seu líbito, convocar. É preciso que haja os pressupostos de caso
urgente e grave, o de se tratar de curso de títulos, ou de espécies ou de câmbio, e o de ser escrito o pedido, com
a assinatura de dois corretores que estejam em função. Se o síndico o indefere, cabe recurso para a Câmara
Sindical e dessa para o Ministro da Fazenda (arg. ao Decreto n. 2.475, art. ‘73, Ir).
Diz o Decreto n. 2.475, art. 68: “A assembléia geral constituir-se-á com a maioria absoluta dos corretores e será
presidida pelo síndico; as suas deliberações constarão de atas lavradas em livro próprio confiado à guarda da
Câmara Sindical; servirá de secretário da reUnião o corretor que o síndico designar. As atas serão assinadas por
todos os corretores presentes, não sendo permissível delegação para êsse fim. Não se reUnindo corretores em
número suficiente para constituir maioria absoluta, o síndico convocará nova reUnião, com intervalo de vinte e
quatro horas, na qual se deliberará com qualquer número de corretores presentes”. Não há voto por procuração,
nem voto por assistente-sucessor, que não esteja substituindo, nem, a fortiori, por preposto.
Estabelece o art. 69 do Decreto n. 2.475: “Os membros da Câmara Sindical poderão ser reeleitos; ao síndico
compete designar o secretário e o tesoureiro da Câmara, os quais só poderão ser tirados dentre os membros
desta”. A eleição dos membros da Câmara Sindical é por um ano. A do síndico, por dois anos.
Acrescenta o Decreto n. 2.475, art. 70: “A nenhum corretor é lícito eximir-se de ser membro da Câmara
Sindical, salvo por moléstia grave e continuada, provada perante o Ministro da Fazenda, e, no caso de reeleição,
se não houver decorrido um ano entre a antecedente e a nova nomeação”. A lei é explícita e cogente. Se o
corretor tem de exercer alhures alguma comissão do Estado, somente é escusa suficiente o fato de não poder
tomar posse do cargo de membro da Câmara Sindical, ou de ser provàvelmente de mais de ano a comissão do
Estado. Se a comissão é da própria Câmara Sindical, há, então, a substituição temporária.

4.DELIBERAÇõES DA CÂMARA SINDICAL. Diz o art. 71 do Decreto n. 2.475: “A Câmara Sindical poderá
deliberar sempre que se acharem presentes metade e mais um de seus membros; os negócios serão decididos

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por maioria absoluta de votos; no caso de empate, o presidente terá o voto de qualidade”. Não há resolução sem
voto da maioria absoluta. Qualquer medida que provenha de metade ou menos de metade, é inexistente. Basta
ação declaratória para se pôr fora de qualquer dúvida a inexistência da deliberação.
Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 72: “Das deliberações da Câmara Sindical deverão ser lavradas atas em livro
aberto, numerado e rubricado pelo síndico e devidamente selado. As atas serão assinadas por todos os membros
da Câmara Sindical que houverem tomado parte na sessão”. Assinam todos os presentes, inclusive o síndico. A
ata fora do livro aberto, numerado e rubricado pelo síndico, é inexistente. Em todo o caso, se o livro foi furtado,
roubado, destruído ou perdido, pode ser aberto outro, com a declaração sobre a razão da abertura. Numerado e
rubricado pelo síndico, com o sêlo devido, pode ser lavrada a ata, mesmo se a ocorrência foi no momento da
reUnião, ou da lavratura.
Acrescenta o art. 73 do Decreto n. 2.475: “À Câmara Sindical compete: a) informar sobre a conveniência da
criação e da supressão de ofícios de corretores de fundos públicos; 14 propor a nomeação, a destituicão dos
mesmos e a sua suspensão por tempo maior de trinta dias; c) organizar o regimento interno da Bôlsa e da
corporação dos corretores e a tabela dos emolumentos que êles devem perceber, sujeitando-os à aprovação do
Ministro da Fazenda; d) autorizar, proibir e suspender a negociação e a cotação de qualquer valor, com excecão
dos títulos da dívida federal, estadual e municipal e dos estrangeiros, que só serão admitidos à cotação por ato
do Ministro da Fazenda. No uso desta atribuição poderá a Câmara Sindical exigir de tôdas as sociedades
emissoras de títulos negociáveis na Bôlsa os esclarecimentos e documentos que reputar precisos para a inclusão
de tais valôres no boletim das cotações; e) impor as multas decretadas neste regulamento, facultando de sua
decisão recurso para o Ministro da Fazenda dentro de cinco dias; 1) fixar a cotação oficial do câmbio, dos
valôres e das espécies, publicando o boletim diário, confeccionado após o encerramento dos trabalhos da Bôlsa
e em face das notas ou memorandos dos corretores e dos bancos; g) organizar a tabela das taxas a perceber
pelas declarações que forem publicadas no boletim oficial; li) velar para que os corretores se contenham nos
limites de suas funções legais, podendo ordenar-lhes a apresentação de seus livros e prescrever-lhes tôdas as
medidas de precaução que julgar necessárias; i> infligir censura aos atos dos corretores, quando irregulares, e,
segundo a gravidade do caso, interditar-lhes a entrada na Bôlsa durante um prazo não excedente de trinta dias e
suspendê-los por igual tempo; j) fiscalizar que nenhum indivíduo, sem título legal, exerça as funções de
corretor, promovendo, pelos meios competentes, a decretação da nulidade das operações por êle realizadas; te)
decidir as contestações que se suscitarem entre os corretores relativamente ao exercício de suas funções, com
recurso para o Ministro da Fazenda”.
O Decreto-lei n. 1.344, art. 16, diz: “À Câmara Sindical é facultado exigir do corretor a exibição dos livros e de
outros papéis de seu arquivo, para comprovar a verdade de qualquer operação em que tenha intervindo, ou
quando haja motivo justificado”.
Aqui, convém frisar-se que o Regimento Interno da Bôlsa de Valôres e dos Corretores de Fundos Públicos do
Rio de Janeiro, no art. 147, afastou-se dos textos legais, quando, no inciso a), pôs, em vez de “informar”,
“deliberar”, e, no inciso c), retirou a exigência da apresentação da tabela de emolumentos ao Ministro da
Fazenda. No inciso d), aludiu-se a “pareceres técnicos e jurídicos”, porque assim o estabelece o Decreto-lei n.
1.344, de 13 de junho de 1939, art. 51:
“As Câmaras Sindicais, para admitirem títulos à negociação e cotação das respectivas Bôlsas, além dos
documentos já apresentados pelos interessados, poderão pedir maiores esclarecimentos técnicos e jurídicos”. E
acrescentou por sua conta:
“Ésses esclarecimentos constarão de parecer emitido por jurisconsulto indicado pela Câmara Sindical e de
laudo de perito-contador apresentado pelos interessados e aprovado pela Câmara. As despesas correrão por
conta dos peticionários” -Essa inovação da escolha de jurisconsulto, sem ser pelo próprio interessado, é
absurda.
A Câmara Sindical pode delegar a um ou mais corretores, sob a designação de pre postos da Câmara Sindical,
atribuições de mantenedores de ordem e de polícia (Regimento Interno da Bôlsa de Valôres e dos Corretores de
Fundos Públicos do Rio de Janeiro, art. 149>.
No art. 73, 1), do Decreto n. 2.475 fala-se de “decretação da nulidade das operações” se “realizadas” por
“indivíduo sem título legal”, O caso não é de nulidade, mas de inexistência Pessoa sem o cargo oficial, ou sem
ser substituto legal, ou preposto, não pode exercer a função de ligar, que há nos negócios bolsísticos, nem,
portanto, de declarar. Não houve a conclusão do negócio jurídico, para a qual se há de exercer a atividade
tipicamente corretriz.
A Câmara Sindical informa sobre a conveniência da criação ou da suspensão dos ofícios de corretores de

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valôres. Não os cria, nem os suprime. Por outro lado, podem êles ser criados ou suprimidos sem a informação
da Câmara Sindical, ou contra a informação que ela deu, O interesse público tornou ato publicístico a criação
do ofício, a suspensão e a própria nomeação dos corretores. Idem, quanto à proposta de renovação, destituição
ou suspensão.
O Regimento interno da Bôlsa e o da corporação de corretores são feitos pela Câmara Sindical, com aprovação
da autoridade competente.
A Câmara Sindical é quem organiza a tabela de taxas que hão de ser pagas pelas declarações insertas no
boletim oficial. Isso nada tem com a tabela dos emolumentos que devem perceber os corretores, que é
submetida à aprovação pela autoridade competente.
O velamento e a fiscalização dos corretores são feitos pela Câmara Sindical. O síndico, a respeito dos
corretores, tem a fiscalização a que se refere o art. 74, e), do Decreto n. 2.475, por se tratar de atos da
administração do corpo coletivo e da Bôlsa. A apresentação (exibição) dos livros dos corretores só a Câmara
Sindical pode ordenar que se faça.
A Câmara Sindical pode censurar (~ repreender) atos irregulares dos corretores; se grave a irregularidade,
interditar-lhes a entrada na Bôlsa (não só na balaustrada, lugar em que se fazem os pregões) até trinta dias, ou
suspender-lhes as funções até trinta dias.
Tem de verificar a legitimação dos corretores oficiais e fazer respeitado o princípio de exclusividade das
operações . Só os corretores oficiais podem operar. Se alguma pessoa que não é corretor oficial, ou que o
deixou de ser, ou está suspensa das funções, intermediou na Bôlsa, ou, fora da Bôlsa, em negocio jurídico que
só os corretores podem intermediar, não se pode dizer que sejam sempre nulas as opera-coes. Se dentro da
Bôlsa há falsidade do agente de valores a sanção é a da inexistência do ato. Fora da Bôlsa, a sanção é & da
nulidade.
Quando surge discordância, ou controvérsia, entre correto-res, a propósito das suas funções ou do seu exercício,
à Câmara Sindical cabe resolver, com recurso para a autoridade estatal. competente, federal ou estadual.
Quanto aos valôres negociáveis e cotáveis, o art. 73, d), do Decreto n. 2.475 é explícito. Bem assim, quanto às
multas, o art. 73, e).
À Câmara Sindical é que compete fixar a cotação oficial do câmbio, a cotação oficial das espécies e a cotação
oficial dos outros valóres.
A respeito do Tesoureiro, lê-se no Regimento Interno da Bôlsa de Valôres, art. 157: “Incumbe ao tesoureiro: a)
receber e conservar em boa guarda os emolumentos e quaisquer quantias recolhidas à Câmara Sindical e à
Caixa de Garantia e Previdência; b) efetuar o pagamento ou restituições de depósitos, devidamente autorizados
pela Câmara Sindical ou pela Caixa de Garantia e Previdência; e) conservar em boa ordem a escrituração da
receita e despesa, apresentando, mensalmente, à Câmara Sindical, o respectivo balanço; d) tomar parte nas
reúniões da Caixa de Garantia e Previdência”.
Diz o Decreto n. 2.475, art. 74: “No caso de impedimento de adjuntos, de modo a não poder reúnir-se e
deliberar a CáInara Sindical, convidará o síndico dentro os membros da corporação os que forem necessários
para completar a Câmara Sindical. O síndico será, nesta hipótese, substituído em seus impedimentos pelo
corretor mais antigo ou pelo mais idoso, se houver mais de um de igual antiguidade”. Se o síndico foi
substituído, ao seu substituto é que toca a função de escolha.
Lê-se no art. 45 do Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1989: “As Câmaras Sindicais poderão encarregar-se
da incineração de títulos de Bôlsa, públicos e particulares”.
Diz o art. 46 do Decreto-lei n. 1.344: “Feito o resgate do empréstimo, o corretor intermediário, ou quem tiver
realizado o pagamento, requererá à Câmara Sindical de uma das Bôlsas do Pais a incineração dos títulos
resgatados e respectivos cupões”. No § 1.0: “Depois de feita, pela Câmara, a verificação dos títulos, a sociedade
emissora, exibindo certificado da mesma Câmara, requererá ao juiz competente o cancelamento da inscrição do
empréstimo. Recebendo o requerimento, o juiz ordenará sejam expedidos editais, que serão publicados três
vêzes, pelo menos, em jornal oficial e em outro de grande tirculação, notificando o ocorrido e marcando o prazo
de 60 dias para impugnação pelos interessados”. E no § 2.0: “Decorrido ~sse prazo, e não havendo impugnação,
o juiz ordenará o cancelamento, depois do que a parte promoverá a necessária comunicação à Câmara, que fará
a incineração, lavrando o respectivo têrmo”. E no § 3?: “Se houver impugnação, será esta processada
sumàriamente e julgada afinal, com recurso do agravo para o tribunal superior competente”.
No Decreto-lei n. 1.344, art. 52, estatui-se: “A Câmara Sindical de cada Bôlsa imporá pena de suspensão de
quinze dias e multa de mil e quinhentos cruzeiros ao corretor, ou seu substituto, que cobrar comissão, menor ou
maior que a legalmente estabelecida; na reincidência, trinta dias de suspensão e três mil cruzeiros de multa”. O

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quanto das multas está obsoleto.


A respeito dos livros, cumpre observar-se que a Câmara Sindical há de ter: a) o livro destinado ao registo dos
títulos ao portador; b) o livro para o registo das intimações judiciais. relativas a títulos destruidos,
desaparecidos, ou indevidamente retirados (Decreto-lei n. 1.344, art. 40) ; c) o livro para o registo do quadro
dos corretores de fundos públicos de outras bôlsas do país, com os nomes dos respectivos auxiliares e
correspondentes (Decreto-lei n. 1.344, art. 55) ; d) o livro destinado às atas de incineração de títulos; e) o livro
para registo das vendas a prestações, de títulos da Dívida Pública da União, dos Estados-membros e dos
Municípios, realizadas por estabelecimentos bancários (Decreto-lei n. 3.545, de 22 de agôsto de 1941, arts. 1.0,
21 e 27; Regimento Interno da flôlsa de Valôres e dos Corretores de Fundos Públicos do Rio de Janeiro, art.
150, e). Êsses livros são abertos, encerrados e rubricados pelo Síndico.

§ 4.744. Síndico
1.CONCEITO E NATUREZA. O síndico é o presidente da Câmara Sindical, que êle presenta, como órgào que
é. Os corretores, em conjunto, são corporação, que se manifesta por meio de reúniôes de assembléia geral; e a
essa corporação também êle presenta, não representa. Órgão da Câmara Sindical, êle o é, igualmente, da
corporação dos corretores.
Diz o Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1939, art. 33:
“O síndico de cada Bôlsa será eleito, dentre os corretores, em assembléia geral realizada a 10 de janeiro de cada
ano”. Acrescenta o ~ 4?: “Cada Bôlsa consignará ao seu síndico uma ajuda de custo mensal”.
2.DURAÇÃO DO CARGO. Acertadamente, a Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1952, art. 7•O, fêz de dois
anos os cargos dos síndicos das Câmaras Sindicais e das comissões de contabilidade.

3.FUNÇÕES. Estabelece o art. 75 do Decreto n. 2.475:


“Compete ao Síndico: a) representar a Câmara Sindical e a corporação dos corretores perante o govêrno,
autoridades constituídas e em Juizo; b) presidir às reuniões da Câmara Sindical, dirigir as discussões e apurar as
deliberações, votando em último lugar e para desempate, no caso ser necessário; c) executar as deliberações da
Câmara Sindical; d) promover reUniões diárias da Câmara Sindical para verificação do resultado das
operações, determinação do curso do câmbio e cotação dos fundos e valôres negociados pelos corretores; e)
fiscalizar a escrituração do livro dos preços correntes, em que deverão ser registados os boletins apresentados
pelos corretores, nos quais estiverem mencionadas as propostas e transações que se houverem realizado e
tiverem sido inscritas nas notas oferecidas no recinto da Bôlsa; f) assinar e remeter ao Ministro da Fazenda o
boletim da cotação dos fundos públicos e do câmbio”.
Mais completo e explícito o art. 154 do Regimento Interno da Bôlsa de Valôres e dos Corretores de Fundos
Públicos do Rio de Janeiro: “Compete ao Síndico: a) representar a Câmara Sindical, a corporação dos
corretores e a Caixa de Garantia e Previdência dos Corretores da Bôlsa de Valôres do Rio de Janeiro, perante o
Govêrno e demais autoridades constituídas, bem como em Juízo; b) presidir às sessões da Bôlsa, às reflniões da
Câmara Sindical e da Caixa de Garantia e Previdência,
dirigir as discussões e apurar as deliberações, votando sempre em último lugar e para o desempate, no caso de
ser necessário; e) executar as deliberações da Câmara Sindical e da Caixa de Garantia e Previdência; d) dirigir a
Bôlsa abrindo e encerrando o seu expediente, podendo, quando no exercício dessa atribuição, ser representado
nos pregões por um de seus prepostos (Decreto-lei n. 1.344, art. 21, parágrafo único)
e) fiscalizar a escrituração do livro em que são registados os boletins de transações realizadas pelos corretores,
durante os trabalhos da Bôlsa; f) assinar e remeter ao Ministro da Fazenda e ao Diário Oficial o boletim da
cotação dos fundos públicos e do câmbio; g) despachar o expediente da Câmara Sindical e da Caixa de Garantia
e Previdência; A) opinar sobre questões sujeitas à apreciação da Câmara Sindical e da Caixa de Garantia e
Previdência; i) assinar com o secretário da Câmara Sindical os lançamentos diários no livro de registo de
cotações e os mapas mensais do movimento da Bôlsa; 5) apresentar ao Ministro da Fazenda um relatório anual
do movImento da Bôlsa e dos trabalhos da Câmara Sindical; /r) nomear, exonerar, aposentar, suspender e dirigir
os funcionários e demais empregados da Câmara Sindical; 1) visar os livros dos corretores que, de acôrdo com
a lei, serão, de seis em seis meses, apresentados à Câmara Sindical; m) proceder imediatamente, quando vagar o
ofício de corretor, à arrecadação de todos os livros e papéis ao mesmo pertencentes, Ésse ato deverá ser
praticado na presença de, pelo menos, duas testemunhas”.
Antes de qualquer comentário aos incisos frisemos que o síndico é órgão, presenta; não representa, porque não
é procurador.

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Na presidência da Câmara Sindical, o síndico exerce as funções que o Decreto n. 2.475 lhe atribui e as que se
basearem no regimento interno da Bôlsa e da corporação dos corretores.
A propósito do Secretário, estabelece o Regimento Interno, art. 156: “São atribuições do Secretário: a) a guarda
do arquivo, papéis e documentos que transitam pela Secretaria:
b) subscrever, juntamente com o Síndico, os lançamentos no livro “Registo de Cotações” e mapas mensais do
movimenta da Bôlsa; e) subscrever as certidões e quaisquer documentos requeridos à Câmara Sindical; d)
redigir e subscrever as atas das sessões da Câmara Sindical; e) intimar, por determinação do Síndico, aos
interessados, sobre quaisquer decisões da Câmara Sindical e, especificamente, quando se tratar de reclamações
ou protestos, nos têrmos dêste Regimento; f) preparar os processos que se realizarem perante a Câmara
Sindical; .q) tomar parte nas reUniões da Caixa de Garantia e Previdência; Ii) dirigir o serviço da Secretaria e
fazer cumprir o seu regimento interno”.

§ 4.745. Bôlsas oficiais de Valôres

1. CONCEITO E NATUREZA. Na Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, art. 1.0, diz-se que “as Bôlsas
oficiais de Valôres são órgãos auxiliares dos poderes públicos, na fiscalização dos lançamentos de emissões de
títulos, por subscrição pública”. Preliminarmente, não há dúvida quanto a ser a Bôlsa de Valôres lugar de
direito público. Mas o art. 1.0 da Lei n. 2.146 fala de “órgão auxiliar dos poderes públicos”.
Sem os intermediários, principalmente sem os intermediários oficiais, localizados (a Bôlsa é, primacialmente,
local e tempo certo para os negócios), seria difícil a circulação dos valôres bens móveis. Por outro lado, sem a
segurança séria, permanente, da idoneidade da intermediação, que também investigasse os títulos da
propriedade mobiliária e dos assumidores das dívidas, não haveria grande confluência para os negócios
bolsísticos e, em geral, de corretagem, O mercado tinha de ser organizado com rigor, controlado e eficiente.
Com a Bôlsa, os possuidores de títulos e outros valôres sabem onde os podem alienar, sempre que precisam de
dinheiro. Têm informes prévios, estatistícos, sobre os preços e as suas variações. Os que querem adquirir sabem
onde os podem adquirir e a tempo de inverter os meios pecuniários de que dispõem.
A Bôlsa é o lugar, o edifício; é o próprio mercado, com os corretores, a balaustrada e as horas de reunião para
os pregões. Daí, abstratamente, ser o próprio conjunto das operações (queda da Bôlsa, alta da Bôlsa, Bôlsa
estável, Bôlsa instável).
Diz o Decreto n. 2.475, art. 76: “A Bôlsa é o lugar, no salão da Praça do Comércio, destinado às operações de
comvra-e-venda de títulos públicos, de ações de bancos e companhias, de valôres comerciais e de metais
preciosos”. Embora, à primeira vista, pareça que se materializou o ser da Bôlsa, a ponto de só se aludir ao
espaço (lugar, no salão da “Praça do Comércio”, quando se podia empregar essa expressão) e ao que lá se passa,
por destinação, o Decreto n. 2.475, art. 75, foi de grande exatidão; e serve para se evitarem vacilações e
afirnações tendenciosas da doutrina estrangeira. Há Bôlsa, como há (Palácio do) Congresso Nacional.
O Código Comercial, art. 32, refere-se a Praça do Comércio, e não a Bólsa. Praça do Comércio seria “não só o
loca], mas também a reúniáo dos comerciantes, capitães e mestres de navios, corretores e mais pessoas
empregadas no comércio” (alínea lA). O local e a reUnião “estão sujeitos à polícia e a inspecção das
autoridades competentes” (alínea 2•~). “O regulamento das Praças de Comércio marcará tudo quanto respeitar à
polícia interna das mesmas traças e mais objetos a elas concernentes”.
Ainda estabelece o art. 83 do Código Comercial: “O resulfado das negociações que se operem na Praça
determinará o curso do câmbio, e o preço corrente das mercadorias, seguros, fretes, transportes de terra e água”
hoje, teríamos de acrescentar: “e ar” “fundos públicos, nacionais e estrangeiros, e de outros quaisquer papéis de
crédito cujo curso possa ser anotado”. No art. 34, advertia-se: “Os comerciantes de qualquer Praça poderão
eleger dentre si uma comissão que represente o corpo do comércio da mesma Praça”. Não se pode dizer que os
arts. 82-34 do Código Comercial estão ab-rogados. Apenas, com a legislação posterior, estão em parte
obsoletos. No fundo, as Bôlsas foram precisões de localização e de reUnião. A evolução foi no sentido de maior
organização e eficiência. Bôlsa é apenas a forma mais desenvolvida, mais típica, mais funcionante, da Praça. As
reUniões eram em praça pública (J. J. C. PEREIRA E SousA, Esbôço de um Dicionário Jurídico, II, verbo
“Praça”) : “Também se chama Praça o lugar público estabelecido nas Cidades de Comércio, em que os
Negociantes, Banqueiros, Agentes de Câmbio, e outras pessoas que negoceiam, se acham em todos, e em certos
dias da semana, para aí falarem, e tratarem dos seus negócios. Praça é também o lugar público nas Vilas e
Cidades, onde se fazem feiras, mercados, etc.”. Adiante refere que, “pelo Aviso de 23 de novembro de 1775, se
participou ao Senado o Decreto da mesma data para a fatura de uma Praça de fruta e hortaliça, no terreno onde

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fôra o Hospital de Todos os Santos, transferido para o edifício do Colégio de Santo Antão dos proscritos
Jesuítas”.
A transformação das feiras e dos mercados em bôlsas atendeu a exigenclas de corretagem e de presteza, de
função declaratória dos corretores e de estatísticas e cálculos de preços correntes (de correr, como corretor).
Longe estão as Bôlsas, as feiras romanas e medievais, das lojas e mercados.
Por que dizer-se “bôlsa”? Fantasias não faltaram. Pensou-se até em certo comerciante, Van der Burse, que
adotava escudo com tres bolsas. Pensou-se em borga dei cittadini, porque, quando se tinham de escolher
chefes, se punham os votos em bôlsa. Pensou-se que se empregou o têrmo “bôlsa” por ter Mercúrio, na mão,
uma bôlsa. Em verdade, antes das bólsas de Bruges, de Antuérpia, de Londres, de Amesterdão, de Paris e das
outras, já se falava de bOlsa nos primeiros séculos da monarquia portuguêsa: bOlsa era o espaço e a reunião de
homens de negócios, que usavam uma caixa ou bôlsa, para a qual os homens de negócios contribuíam e dela
tiravam as despesas do comércio (JosÉ FERREIRA fORCES, Dicionário Juridico -Comercial, verbo Praça).
A Bôlsa concentra, permite a rapidez, as ofertas não têm destínatario determinado, são a quem der mais, ou a
quem vender por menos; servem à regulação dos preços. O telégrafo e o telefone permitiram às Bôlsas tornar
imediato o que estaria a longa distância, o que, sem os corretores, não seria possível na mesma extensão, porque
os oferentes de aquisição não sabem quais os oferentes de alienação.
ATem personalidade jurídica a Bôlsa de Valôres? Ao primeiro exame logo se diria que não, pois à Câmara
Sindical de Valôres é que incumbe quase tôda a atividade (Decreto n. 2.475, arts. 73 e 74). O argumenta para a
resposta positiva seria o de se ler no art. 1.0 da Lei n. 1.802, de 80 de dezembro de 1950:
“É reconhecido às Bôlsas de Valôres 6 direito de solicitar de suas congêneres, que, na conformidade do art. 19
do Decreto-lei n. 9.783, de 6 de setembro de 1946, houverem admitido à cotação ações e obrigações ao portador
(debêntures), a relação pormenorizada das sociedades emitentes, sediadas nas unidades da Federação, onde
funcionarem as solicitantes”. No art. 2.0 acrescenta-se: “O não atendimento do pedido, dentro do prazo de
sessenta dias, contados da data do seu recebimento pela destinatária, será, pela Bôlsa de Valôres interessada,
comunicado ao Ministério da Fazenda, que imporá à infratora a multa dia~’ia de mil cruzeiros pelo tempo que
exceder o prazo até ser cumprido o disposto no art. 1.0 desta lei”. E no art. 2.0, parágrafo único: “O produto
dessas multas, que serão recolhidas semanalmente, constituIrá receita da Câmara Sindical de Corretores da
Bôlsa que tiver direito às informações mencionadas nesta lei”.
As feiras, os mercados e outros lugares de especulação em comum, conglomerada, são periódicos ou diários.
As bOlsas são dentro de pouco tempo. Os mercados e as feiras supõem que o próprio interessado esteja
presente, ou alguém adquira por êle, ou aliene por êle. Não há qualquer limitação legal ou restrição a quem haja
de operar. A bôlsa supõe que intermediários, que fazem o pregão, e os que aceitam, não representem, e apenas
sejam como os instrumentos gesticulantes e falantes dos interessados. Desde cedo, assim é. Já no século XVII,
afluiam os interessados às bôlsas, para que se colhesse o melhor preço ou pelo melhor preço, no vaivém da
oferta e da procura. Se havia o jôgo da bôlsa, isso não preocupara o jurista.
A feira e o mercado concentram. A bôlsa concentra e tem os instrumentos de negociação que correm, com os
pregões e as aceitações pelos interessados. O Estado fêz públicas (de funções em que o Estado se interessa) as
bôlsas, como fizera mercados pi2blicos, que se diferenciaram dos mercados particulares. Porém isso, só por si,
não justificaria que se tenham as bôlsas como entidades públicas (sem razão, MARrO ROTONDI, La Bolsa
valori ed i suoi origini, Rivista dei finIto Commerciale, 47, 1, 429). Quando se examina o que acontece dentro
da BOlsa de ValOres, percebe-se que os podéres, os atos e as relações jurídicas que se irradiam não são poderes
da Bôlsa, atos da Bôlsa e relações jurídicas em que a Bôlsa se coloque, ou a prendam. Há os corretores, a
Câmara Sindical e o síndico; há a autoridade pública que nomeia os corretores: falta à Bôlsa ser sujeito, ativo
ou passivo. Não se pode atribuir subjetividade àBOlsa; a fortiori, não se pode dizer que a Bôlsa tenha
personalidade jurídica. Criam-se BOlsas, como se criam praças, feiras, mercados: há configuração jurídica, ou
pode havê-la; mas tal configuração não faz pessoa jurídica a Bôlsa.
A Bôlsa é instituto que a lei cria, não a Câmara Sindical, mas a BOlsa é apenas o elemento espacial, para
reUniões em dias certos (destinação temporal), para o qual os corretores oficiais elegem o síndico que somente
pode ser corretor oficial.
O Palácio Presidencial, ou os Palácios dos Governadores e dos Prefeitos têm a sua organização, mas seria
absurdo pensar-se em entidade jurídica, como elemento subjetivo. Pessoa é quem reside, como principal, no
Palácio Presidencial. Pessoas são os que residem, como principais, nos Palácios de Govêrno estadual ou
municipal. Por onde se vê quão fora de propósito é a opinião dos que pensam em entidade; a fortiori, em pessoa
jurídica. A palavra “ente” conduz a certas confusões. Ente é o que é. A pedra, a água e a nuvem, como o

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homem, são entes. Mas, se falamos de entes públicos, estamos a referir-nos ao que não fica no plano do objeto,
ao que não é coisa. Daí ser preciso dizer-se, prêviamente, o que é que se chama entidade, para que se nao
incorra em trocas conceptuais. Quando falamos de entes que administram, falamos de entes que poderiam ser
pessoas, embora não o sejam. Sem isso, não é possível qualquer rigor nas conclusões.
A intervenção do Estado na criação das Bôlsas e na edicção de regras jurídicas sêbre elas e suas atribuições de
modo nenhum torna de direito público as Bôlsas, ou as próprias Câmaras Sindicais ou os corretores oficiais. A
ingerência publicística não chega a publicizar o instituto da Bôlsa, ou da Câmara Sindical. A Bôlsa e a Câmara
Sindical desempenham o papel que o Estado quer e esperava que fôsse desempunham seus órgâos. Salvo se
admitimos que haja órgãos heterotéplcos, órgãos fora do organismo. A muleta seria Orgão. A cadeira de rodas
seria órgão. O patim seria órgáo, como o esqui. Há, na verdade, instituições e pessoas paraestatais: não são
órgáos. A autarquia, sim. A BOlsa não é autarquia, nem instituição paraestatal.
A Câmara Sindical é que é entidade (subjetiva). Quanto a ela é que se pode discutir se tem ou se não tem
personalidade. Quando se fala da Câmara Sindical de cada BOlsa (e. g., Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de
1989, art. 6.”), ou se alude a Bôlsas de ValOres e respectivas Câmaras Sindicais e Caixas de Garantia e
Previdência (Decreto-lei n. 1.344, art. 5.”), de modo nenhum se põem as Bôlsas acima das Câmaras Sindicais. A
Câmara dos Deputados está para os Deputados, como as assembléias de corretores oficiais para os corretores,
porém a BOlsa não está, para os corretores, como a Câmara dos Deputados para os deputados.
Na Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1958, diz-se: “As BOlsas oficiais de valOres são órgãos auxiliares dos
poderes públicos, na fiscalização dos lançamentos de emissões de títulos, por subscrição pública”. Com isso
não se personificou a BOlsa de Valôres, nem se tornou instituicão estatal ou paraestatal. Tratar-se-ia de órgão
heterotópico. Certamente, há mercados públicos e mercados particulares e poderia haver bôlsas particulares, se
a lei o permitisse. Mas o interesse público. quanto às BOlsas, não foi o ponto de fazê-las órgãos estatais, a
despeito do status de direito público que se deu à sua atividade, de instituição duradoura, que a lei cria.
A lei cria a BOlsa. Desde êsse momento nasce aos corretores nomeados o direito público subjetivo à eleição da
Câmara Sindical e à participação dos pregões (sem razão, por só ver situação objetiva no direito público, II.
GÓPPERT. Das Recht der Bôrse, 69; e ERNST RUDoLF HUBER, Wirtsc1zaftsverwaltungs~ recht, ~, 1Y ed.,
62, que mudou de opinião, ~, 2? ed., 618).

2.RECINTO E BALAUSTRADA DA BOLSA. Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 77: “Só aos corretores de
fundos é permitido o acesso dentro da balaustrada da Bolsa”. A BOlsa tem o recinto <salão e mais
dependências) e a balaustrada, que é a parte interna da figura geométrica, de regra circular, que é traçada pelos
balaustres, que são os colunelos que sustentam, espaçadamente, os corrimões. Na balaustrada, sOmente entram
corretores e prepostos ou assistentes-sucessores. Pode ser a a entrada aos próprios corretores oficiais, se houve
penalidade imposta pela Câmara Sindical.
Acrescenta o art. 78 do Decreto n. 2.475: “À Câmara Sindical compete tornar efetiva a disposição do artigo
antecedente,vedando às pessoas estranhas à classe dos corretores de fundos o ingresso no lugar reservado à
l3ôlsa, enquanto esta 1 unc ou ar’’.
Estatui o Decreto n. 2.475, art. 79: “Fora do lugar espedaí e das horas para o funcionamento da BOlsa, é
proibida qualquer reUnião, quer de corretores de fundos, quer de pessoas estranhas à profissão, para efetuar
operações de BOlsa”.
Diz o Decreto n. 2.475, art. 80: “Os corretores de fundos públicos reUnir-se-ão na BOlsa à hora marcada no
regimento interno e imediatamente começarão a propor em alta voz as transações que desejarem efetuar,
determinando as condicões em que devam ser baseadas”.

3.PREGÕES E OPERAÇÕES BOLSÍSTICAS. Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 81: “Logo que qualquer corretor
aceitar a proposta e as condições da negociação, reputar-se-á fechada a transação. Os corretores a inscreverão
em seus cadernos manuais e, ato contínuo, trocarão, entre si, um memorandum assinado, em que estejam
consignadas tOdas as condições da operação que acabarem de efetuar”.
Não •se pode dizer, sem se fugir à exatidão científica, que o corretor é comissionário, que o corretor opera em
nome próprio. Quando o corretor “diz” que oferece alienar a por x ou
que oferece adquirir b por y, não é o corretor que oferece, mesmo quando êle oculta o nome de quem faz a
oferta. Se êle adquirisse em nome próprio, ter-se-iam de pagar o impOsto de aquisição por êle e o impOsto de
aquisição pelo incumbente. Se êle alienasse em nome próprio, haveria duas alienações, simultâneas ou não:
pelo incumbente e por êle. Nas notas do corretor estão necessâriamente os nomes dos incumbentes. O segrêdo

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do corretor não vai até ao ponto de poder deixar de dizer, nas suas notas, quem aliena ou quem adquire.
O corretor é auxiliar do comércio, com funções publicísficas; não é funcionário público, nem agente estatal.
Não é comerciante de títulos e outros valOres; apenas intermedeia. De regra, recebe a incumbência e trata de
encontrar quem tenha nutra incumbência, que seja aceitação de sua oferta.
Estatui o Decreto n. 2.475, art. 82: “A operação ultimada será imediatamente inscrita em uma tábua colocada
próxima .à BOlsa e em lugar visível para todos”.
Acrescenta o Decreto n. 2.475, no art. 83: “O corretor, conquanto não obrigado a declarar a quantidade total dos
títulos e valôres que tenha de negociar, deverá determinar o número, que se proponha comprar e vender, no ato
do pregão”.
Estabelece o art. 84 do Decreto n. 2.475: “Encerrados os trabalhos da Bôlsa, reunir-se-á a Câmara Sindical e
procederá à fixação do curso do câmbio e da cotação dos fundos e valôres negociados, taxando os limites
máximo e mínimo”.

4.LIvRos, REGIMENTO INTERNO E TRABALHOS DA BOLSA.


No Decreto-lei n. 1.344, art. 55, está dito: “Cada Bôlsa terá livro especial para registo dos quadros dos
corretores de fundos públicos das outras BOlsas, com os nomes dos auxiliares e correspondentes de cada
corretor”. esse livro é incluso na organízacão da Bôlsa e não se há de confundir com os livros dos corretores,
nem com os livros da Câmara Sindical. Convém que no livro se diga quais os corretores que são
correspondentes de outros. Sobre correspondentes, veja Tomo XLIV.
Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 117: “A Câmara Sindical organizará um Regimento Interno da BOlsa e da
corporação de corretores, que, depois de aprovado pelo Ministro da Fazenda, fará parte integrante dêste decreto.
Nesse Regimento serão regulados os fatos referentes à organização e ao funcionamento da Bôlsa, da corporação
dos corretores e da Câmara Sindical”.
Estabelece o art. 56 do Decreto-lei n. 1.344: “As BOlsas ficam autorizadas a rever seus Regimentos Internos,
com a faculdade de cominar penas para os corretores e auxiliares até três meses de suspensão e multa de cinco
mil cruzeiros, que poderão ser impostas separada ou simultâneamente, a juízo da Câmara Sindical”. No § 1.0:
“No Regimento será regulada a entrada do público na BOlsa à hora dos pregões”. E no § 29 acrescenta-se que o
regimento interno revisto só entra em vigor depois de aprovado pelo Ministro da Fazenda ou pelo
Secretário de Estado, respectivamente para a Bôlsa de Valôres do Distrito Federal ou as dos Estados.
Lê-se no art. 57 do Decreto-lei n. 1.844: “A estatística das BOlsas referirseá ao período de cada ano civil”.
Diz o Decreto-lei n. 1.844, do art. 58: “Segundo suas possi bilidades, cada BOlsa dará assistência a seus
empregados que deverão ter pensão e aposentadoria”.
Lê-se no art. 40 do Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1939: “Em cada BOlsa haverá um livro para registo
de informações judiciais referentes a títulos destruidos, desaparecíc.os ou indêbitarnente retidos”. Acrescenta o
parágrafo único:
“A Câmara Sindical transmitirá a intimação, em notificação escrita e numerada, e depois de publicá-la em
boletim, aos seus corretores e às demais Bolsas, que, por sua vez, depois de a registarem, a publicação em
boletim e dela darão conhecimento, por escrito, aos corretores”.
“Encerradas os trabalhos da Bôlsa”, diz o art. 84 do Decreto n. 2.475, “reúnir-seá a Câmara Sindical e
procederá à fixação do curso do câmbio e da cotação dos fundos e valOres negociados, taxando os limites
máximos e mínimos”.
Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 85: “Para determinação do curso do câmbio e dos valOres, a que se refere o
artigo antecedente apresentarão os corretores à Câmara Sindical boletins, por êles assinados, contendo as notas
correspondentes às transações efetuadas nesse dia com menção dos limites máximo e mínimo das cotações”.
Diz o art. 86 do Decreto n. 2.475: “Com os elementos fornecidos pelos boletins dos corretores, que serão
registados em livro próprio, verificará a Câmara o resultado das operações do dia e fixará, de modo definitivo, o
curso do câmbio e da cotacão dos títulos e valOres negociados”~
Estatui o Decreto n. 2.475, art. 87: “Em livro próprio se lavrará, em forma de têrmo, a deliberação da Câmara
Sindical e se expedirá, de conformidade com ela, o boletim da cotação oficial e do curso do câmbio. Dêste
boletim serão enviadas cópias autenticadas pelo síndico ao Ministro da Fazenda ao Presidente da Associação
Comercial e ao Diário Oficial”.

5. TÍTULOS COTÂ.vEIS. Estabelece o art. 88 do Decreto n. 2.475: “Os títulos de empréstimos federais,
estaduais, municipais e estrangeiros só poderão ser cotados na Bôlsa mediante autorização do Ministro da

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Fazenda, concedida sob informação da Câmara Sindical”. A informação é de ordem técnica, quanto à
conveniência ou inconveniência da cotação. A inconveniência pode ser temporária.
Acrescenta o Decreto n. 2.475, art. 89: “Os títulos de em prêsas nacionais e estrangeiras sê-lo-ão sOmente com
consentimento da Câmara Sindical. Esta responderá civilmente pelos prejuízos resultantes da admissão à
cotação de títulos, debêntures irregularmente emitidas e ações de associações ilegalmente constituídas, ou que
não tenham realizado o capital exigido na lei reguladora do anonimato, para que as suas ações sejam
negociáveis, e de sociedade sem existência real e atividade efetiva, e organizadas no intuito exclusivo de tentar
a negociação de títulos e a exploração de operação sobre os mesmos Lê-se no art. 10 do Decreto-lei n. 1.344, de
18 de junho de 1939: “Os títulos federais serão negociados e cotados assim que a Câmara Sindical receber do
Ministério da Fazenda um exemplar do título definitivo, ou da cautela provisória, e do decreto de emissão e da
tabela de anuidades”.
Diz o Decreto n. 2.475, no art. 112: “As vendas de valOres negociáveis na Bôlsa, que houverem de ser feitas
por ordem de juiz competente, em execução de sentença proferida em Juízo contraditório, ou de ato de
jurisdição voluntária, serão executadas pela Câmara Sindical em leilão, depois de publicadas, por meio de aviso
ou edital afixados no recinto da BOlsa, e durante oito dias pela imprensa diária”.
Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 113: “No aviso far-se-ámenção dos títulos a negociar e de sua quantidade, da
decisão do juiz que houver ordenado a negociação e do nome do corretor dela incumbido”.
Estabelece o Decreto n. 2.475, art. 114: “Os valOres que não tiverem sido admitidos à cotação serão vendidos
em leilão, na Bôlsa, sob a responsabilidade do corretor e mediante as formalidades estabelecidas no regimento
interno
Diz o art. 115 do Decreto n. 2.475: “A Câmara Sindical pode resolver que se faça em leilão a venda de títulos
admitidos à cotação, sempre que esta não se der, por falta de negociações de tais valOres, ou pela ocorrência de
qualquer circunstância que torne prejudicial aquêle meio de transferência”.
O art. 116 do Decreto n. 2.475 estabelece: “A venda dos títulos que se acharem no caso do ad. 33 do Dec. n.
434, de 4 de julho de 1891, será levada a efeito pelo modo estabelecido nos artigos antecedentes”
Estatui o art. 1.0 do Decreto-lei n. 21.854, de 21 de setembro de 1932: “A decisão da Câmara Sindical dos
Corretores de Fundos Públicos, autorizando, proibindo ou suspendendo a cotação e a negociação de valOres na
Bôlsa será passível de recurso, sem efeito suspensivo, na forma dêste decreto, salvo quando se tratar de títulos
da dívida federal, estadual ou municipal, e dos estrangeiros, cuja admissão à cotação contínua sujeita à
aprovação exclusiva do Ministro da Fazenda”.
Lê-se no art. 2.0 do Decreto-lei n. 21.854: “A decisão do recurso a favor da parte não obsta o ulterior
cancelamento ou suspensão da autorização, por motivo superveniente ou por motivo que, mesmo preexistente,
não tenha sido controvertido no recurso”.
Estabelece o art. 3.~ do Decreto-lei n. 21.854: “O recurso caberá sempre que a decisão da Câmara Sindical,
denegando. suspendendo ou cassando a autorização, se fundar em preterição de formalidades legais na emissão
dos títulos, ou nos atos que a autorizarem, bem como na constituição das sociedades emitentes”. No § 1.~:
“Também caberá o recurso quando a decisão fOr motivada por falta de existência real e atividade efetiva da
sociedade organizada com o intuito exclusivo de tentar a negociação de títulos e a exploração de operações
sobre os mesmos (Dec. n. 2.475, de 13 de março de 1897, art. 89. in tine) “. E no § 2.0: “Na hipótese do
parágrafo anterior, o recurso se interporá para o Ministro da Fazenda, na forma das leis administrativas, dentro
do prazo de 15 dias da data da publicação do despacho da Câmara Sindical no Diário Oficial”.
Lê-se, ainda, no art. 4•0 do Decreto-lei n. 21.854: “Nos demais casos, o recurso será interposto para a COrte de
Apelação”, hoje, Tribunal de Justiça, “no mesmo prazo de 15 dias contados da referida publicação e seguirá o
processo estabelecido para a discussão e julgamento das apelações cíveis, e para os embargos oponíveis ao
acórdão”. No § 1.0: “A interposição do recurso será feita em requerimento ao Presidente da Corte de Apelação,
instruído com o Diário Oficial que houver publicado a decisão recorrida e com os documentos que o recorrente
entender úteis. Distribuído o efeito, será notificada á Cámara Sindical a interposicão do recurso e antes de
juntar aos autos a certidão dessa notificação o processo não terá andamento”. E no § 2.0: “Em todos os têrmos
do recurso, a Câmara Sindical será representada pelo Ministério Público, ao qual, logo que notificado nos
têrmos do parágrafo anterior, ela prestará todos os esclarecimentos e documentos úteis, sem prejuízo dos que
lhe forem pedidos”.

6.SESSÕES DA BOLSA E PREGOES. As operações por pregão fazem-se dentro da balaustrada. Há, assim, a
concentração oficial do mercado. Alguns corretores, com os gritos, conseguem maior número de operações do

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que muitos que estivessem em seus escritórios, ou mesmo num salão. Compreende-se, portanto, que se limite o
número de corretores oficiais, e se proiba a entrada a quem não tenha legitimação.
Além das conveniências de concentração e da poupança procura-se a especialização dos operadores, a par das
exigências de experiência técnica.
Durante o tempo em que opera, o corretor é órgão da BOlsa, como lugar para o esfôrço agitante.
Lê-se no art. 37 do Decreto-lei n. 1.344: “Os pregões podem ser feitos, sucessivamente, mediante toque de
campainha, na seguinte ordem: a) títulos federais; b) títulos estaduais; c) títulos municipais; d) ações; e)
debêntures; f) outros valOres”.
Lê-se no Decreto-lei n. 1.344, do art. 2.0, § 1.0: “Quando não se estipular no pregão prazo para a liquidação,
subentende-se o de 48 horas; mas as operações a que se refere a alínea a) serão liquidadas no mesmo dia”.
Estabelece o art. 39 do Decreto-lei n. 1.344: “Poderá haver diáriamente mais de urna sessão de pregões, com
negociações, conjuntas ou separadas, a juízo da Câmara Sindical”.
No Decreto-lei n. 1.344, de 18 de junho de 1939, art. 35:4’As sessões das BOlsas não poderão ser
interrompidas, e em nenhum caso o síndico dará a palavra a quem quer que seja antes, durante ou depois dos
pregões”.
Diz o Decreto-lei n. 1.344, art. 36: “Ao corretor é vedado, durante as horas de pregão, exigir explicações sObre
propostas apresentadas por outro corretor”.
Lê-se no ad. 88 do Decreto-lei n. 1.844: “Incorrerá em pena de suspensão, até trinta dias, e multa de cinco mil
cruzeiros, o corretor que: a) apregoar negócios de outro corretor ou assinar notas de operações que não haja
efetuado; b) sonegai do publico pregao negócios de títulos que tenha efetuado”.
Acrescenta o Decreto n. 2.475, art. 83: “O corretor, conquanto não obrigado a declarar a quantidade total dos
títulos e valores que tenha de negociar, deverá determinar o número, que se proponha comprar e vender, no ato
do pregão”.
Estatui o Decreto n. 2.475, art. 82: “A operação ultimada será imediatamente inscrita em uma tábua colocada
próxima à BOlsa e em lugar visível para todos”.
Estabelece o ad. 84 do Decreto n. 2.475: “Encerrados os trabalhos da Bôlsa, retininseá a Câmara Sindical e
procederá à fixação do curso do câmbio e da cotação dos fundos e valOres negociados, taxando os limites
máximo e mínimo

7. OPERAÇÕES FORA DA BOLSA. Diz o Decreto n. 2.475, parágrafo único: “fl facultado aos corretores,
fora da hora regimental da BOlsa, efetuar negociações sObre metais, cambiais, descontos e empréstimos
comerciais contanto que no mesmo dia e na hora oficial da BOlsa apresentem boletins assinados, mencionando
a quantidade, a natureza, o dia do vencimento e o preço dos títulos para a cotação”.

8.OPERAÇÕES FEITAS PELOS PRÓPRIOS FIGURANTES. Segundo a Lei n. 354, de 16 de dezembro de


1895, art. 30 e §§ 1.0 e 2.0, e o Decreto n. 2.475, arts. 29-31, estão fora da sanção de nulidade os negócios
jurídicos, de que se cogita no art. 32 da Lei n. 354, se tora da Rôlsa e sem intermediariedade de quem não é
corretor oficial de valOres.
A Lei n. 566, de 9 de janeiro de 1899, artigo único, estuiu: “A disposição do § 1.0 do art. 32 da Lei n. 354, de
16 de dezembro de 1895, não compreende as negociações de letras de câmbio até o máximo de £ 100 realizadas
fora da Bôlsa diretamente entre o comprador e o vendedor, as quais, todavia, deverão ser comunicadas à
Câmara Sindical, ficando derrogada a disposição do § 2.0 do art. 39 da mesma Lei”. A redação foi má e a
interpretação de que foi revogado o § 2.0 do art. 32 é de repelir-se. Não se disse revogado, mas derro gado, por
se ter confundido a regra jurídica do art. 32, § 29, com a do art. 32, § 1.0. A interpretação de J. X. CARVALHO
DE MENDONÇA (Tratado de Direito Comercial, II, 350 s.) foi certa; errada, a do Consultor Jurídico da BOlsa
de São Paulo, aliás aprovada pela Câmara Sindical a 2 de maio de 1928, com o propósito de cercear qualquer
negócio jurídico entre os interessados, a despeito da exigência da comunicação à Câmara Sindical. Já cogitamos
do assunto.

9. CÂMARA DE COMPENSAÇAO . Estabelece o art. 99, do Decreto-lei n. 1.344: “Cada Bôlsa de Valôres
poderá instituir uma Câmara de Compensação para promover, facultativamente, a liquidação e compensação de
operações de títulos”.

§ 4.746. Contacto inicial do corretor com o incumbente e conclusão do contrato de corretagem

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1. INCUMBÊNCIA. O cliente incumbe do negócio jurídico o corretor oficial, que assiste à conclusao do
negócio jurídico na Bôlsa ou fora da BOlsa. É sempre figurante o incumbente, e não o corretor.
No art. 32 do Decreto n. 2.475, de 13 de março de 1897, diz-se: “O corretor não poderá encarregar-se de
operação alguma sem ordem escrita do seu comitente”. No art. 49, e), do Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho
de 1939, reafirma-se que se nao aceitam para registo em caixas de liquidação ofertas de operações a têrmo não
assinadas pelos contraentes ou seus procuradores com poderes especiais. Na interpretação do art. 32 do Decreto
n. 2.475, o que mais importa é saber-se qual a sanção. Não é a de nulidade, pois o corretor, responsável como é,
operou como se tudo se houvesse feito regularmente. A sanção, quanto ao negócio jurídico, é a de ineficácia
quanto ao figurante, pOsto que ratificável o ato e, assim, tornado eficaz. Ineficácia relativa se e enquanto não há
a regularização dos papéis. No tocante às operações a têrmo, passar-se-ia o mesmo com o registo que se tivesse
feito com infração do art. 40, e), do Decreto-lei n. 1.844.

2.RETIRADA DA INCIJMBÉNCIA PELO INCUMBENTE. Lê-se no art. 38 do Decreto n. 2.475 que “a


ordem dada ao corretor tera vigor enquanto não fôr retirada, salvo a declaração de prazo fixado para o
cumprimento dela; o recebimento dessa ordem importa autorização ao correto? para operar em nome e por
conta do comitente”
No art. 43 do Decreto n. 2.475 estabelecese. “O comitente que retirar a ordem dada e aceita antes do prazo
convencionado para a operação pagará, integralmente a corretagem como se a ordem houvesse sido executada”.
Sobre contratos de opção, Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1939, art. S.o.
3. DEVER DE COMUNICAÇÃO. Diz o art. 84 do Decreto n. 2.475: “O corretor, enquanto não puder executar
a ordem recebida, dará ao seu comitente diàriamente os motivos da demora, a fim de receber do mesmo novas
instruções sObre o preço e outras condições da operação”.

4. ENTREGAS E GARANTIAS. Nem sempre os corretores conhecem os clientes que chegam. Daí terem de
exigir que entreguem os títulos, ou outros valOres que não sejam títulos, ou os depositem, ou o dinheiro com
que se hão de adquirir. Não e o corretor que adquire, são os clientes os que querem adquirir e vão adquirir. Não
é o corretor que os aliena; os alienantes são os clientes. Mas os corretores, intermediários de atividade
estritamente regulada, transmitem as ofertas e as aceitações. Há as oscilações de preço. Os clientes podem
tornar-se insolvaveis.
Pretendeu-se que, no curso das operações, o corretor não mais pode exigir cobertura (nem garantia nem refOrço
de garantia) ; mas tal opinião, que foi a de J. X. CARVALHO DE MENDONÇA (Tratado de Direito
Comercial, Tomo II, 355), tem de ser repelida. O que não se pode exigir é a garantia ou o refOrço na hora de
estar em função a bOlsa, ou se foi inserta a cláusula de cobertura definitiva.
Se não há a cláusula de cobertura definitiva pode o corretor avisar o cliente, com o dilema de refOrço ou
cancelamento da oferta, ou com dilema de refOrço ou conclusão do negócio jurídico apesar da falta de refOrço.
Tudo isso é a líbito do corretor, se não foi previsto no escrito inicial ou noutro escrito posterior.
O corretor há de exigir a cobertura, porque não é figurante, nem se justificaria que expusesse o seu patrimônio
para adimplemento em vez de outrem.
A cobertura sOmente concerne ao cliente e ao corretor, e nunca aos clientes ou futuros figurantes, ou aos
corretores entre si.
Discute-se se a cobertura é garantia, opinião que teria por si a letra da lei (e. g., Decreto n. 2.475, art. 92,
verbis “fornecer garantias”), ou se é antecipação da prestação. A primeira observação que se há de fazer é
quanto à confusão, em que se costuma incorrer, entre o que se entrega de títulos, valOres ou dinheiro para que
se conclua o negócio jurídico, e o que se entrega para riscos e mudanças eventuais de cotação, ou ocorrências
subjetivas que possam influir na oferta do cliente.
A cobertura pode consistir em bem que não é o que se vai alienar, ou o dinheiro com que se vai adquirir. Já aí
ressalta que não se trata de adiantamento ou adimplemento antecipado. No jogo da bOlsa, seria sem razão de
ser qualquer alusão a antecipação de pagamento.
Assente que se trata de garantia (sem razão, J. X. CARVALHO DE MENDONÇA, Tratado de Direito
Comercial, II, 355 s.), tem-se de verificar de que garantia se trata. Arras ou caução? De caução é que se trata.
5.GARANTIAS EXIGÍVEIS. “Antes de aceitarem a incumbência de qualquer negociação, têm os corretores
de fundos” diz o art. 42 do Decreto n. 2.475, “o direito de exigir dos comitentes” queria dizer: incumbentes
“as garantias que reputarem precisas para a efetividade das operações, proporcionando, por sua vez, aos

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comitentes as que êstes exigirem” (cf. Lei n. 854, de 16 de dezembro de 1895, art. 4•O, inciso 1). As operações
de bOlsa são cheias de riscos e os corretores de fundos não podem recusar os seus serviços. Daí terem de
resguardar-se quanto a possíveis situações em que êles ou outros corretores dêem como concluído o negócio
jurídico, sem que estejam com êles os valOres que o incumbente alienou, ou o preço dos que o incumbente
adquiriu. A garantia há de ser prestada no momento em que se recebe do incumbente a oferta de
alienar ou de adquirir. Há de constar de escrito em que o incumbente declare ter entregue ao corretor títulos ou
outros valôres, ou dinheiro, de modo que, em caso de riscos da operação ou diferença na cotação, se cubram
com o que foi entregue, ou o produto da alienação, se omisso o incumbente (Decreto n. 2.475, art. 100).
A exigência do escrito, do próprio punho do incumbente, na espécie do art. 100 do Decreto n. 2.475, que só se
refere à cobertura dos riscos e eventualidades de cotação e sub jetivas, e não às entregas de prestação e de
contraprestação, justifica-se diante da fé pública dos livros do corretor, porém o corretor tem de dar o recibo se
o depósito foi perante ele, e nau em estabelecimento bancário. De qualquer modo, tem êle de dar a nota do que
foi lançado sobre o ato de declaração do incumbente, ao fazer a cobertura. Com essa nota pode o incumbente ir
contra o que consta dos livros do corretor.
Em caso de falência do corretor, o que era para ser alie-nado há de ser entregue à pessoa que o adquiriu, se foi
inserto nos livros ou comunicado, por escrito, a conclusão do contrato; e providenciarseá para que o preço do
que foi adquirido seja pago. No tocante à cobertura, em senso estrito, isto 4, o que se depositou em
estabelecimento bancário, em garantia, tem destinação precisa, o que se há de respeitar. Se o depósito
•foi irregular em mãos do corretor, há a comunidade de destinação, sem que a lei preveja classificação pelas
datas, ou conforme o registo ou a falta de registo. Passa-se o mesmo quanto à caução do corretor.
Quando se entrega título, valor, ou metal a corretor, para operações, tem-se de determinar o objeto, para que se
afaste a fungibílidade e não se tenha de considerar com a mesma sorte o que foi entregue ao corretor. Desde que
se caracterize a posse imprópria imediata de coisa certa, não pode, a qualquer pretexto, ter-se o todo como em
comum, pela fungibilidade ou impossibilidade de distincão.
6. RESPONSABILIDADE DOS INCUMBENTES. A função do corretor é apenas de intermediário. Em todo o
caso, pode êle ter dado como concluído o negócio jurídico e o figurante não ter entregue ao corretor o bem ou o
preço que foi objeto da operação. Outrossim, alguém pode ter aceito a oferta que,.através do corretor, fêz o
incumbente, sem que possa haver o adimplemento. Em vez de apenas regular a pretensão do outro figurante
contra o figurante omisso, ou contra o corretor, a lei atribuiu ao corretor legitimação para alienar o que adquiriu
para o incumbente, ou o que fôr preciso alienar, a fim de se prestar o preço, ou para adquirir o que dê para ser
prestado ao adquirente. A responsabilidade do incumbente perante o corretor justifica, de si só, que possa êsse,
sempre, exigir garantias no momento mesmo do contrato de corretagem. Diz-se no art. 98, alíneas 1•a, 2~a e 33,
do Decreto n. 2.475:
“Deixando o comitente” sempre, na terminologia, a confusão com a comissão “de proporcionar ao corretor os
meios de fazer efetiva a operação, passará o corretor a vender os títulos que houver adquirido e pagará com o
produto o preço da compra, ou adquirirá os títulos cuja compra houver convencionado. Em qualquer destas
hipóteses, responderá o comitente pela diferença que, com a demora da operação, haja ocorrido na cotação dos
títulos. A ação executiva é o meio judicial de apuração dos direitos e da responsabilidade provenientes destas
disposições”.

7.NATUREZA DAS ENTREGAS E DAS COBERTURAS. As garantias são para adimplemento. A entrega dos
títulos, dos valôres e do dinheiro, dita cobertura, não tem sempre a mesuna razão de ser.
Cumpre observar-se que a entrega do que vai ser alienado e a entrega do preço consistem em transmissão da
posse imprópria imediata, porque o corretor não é alienante, nem adquirente. A sua posse é como a do
mandatário, sem que êle seja mandatário. Aí, não há garantia, nem, ainda, antecipação de prestação, ou de
contraprestação. Diferente é o que se passa quanto ao que se deposita para cobertura dos riscos e das variações
de cotação. Tem-se de evitar qualquer confusão de ordem conceptual e de ordem prática (cf. ROMANO-
PAvONI, Dubbi sul deposito di “copertura” per i contratti di borsa, Monitore dei Tribunali, 1958, 279 s.;
RENATO CORRADO, Sul e. d. deposito di “copertura” obbligatorio per i contratti di borsa, Ranca, Rorsa e
Titoli di credito, 1954, 1, 478 s.; 1 Contratti di borsa, 2.~ ed., 164). No direito brasileiro, não há obrigato
piedade da entrega prévia da prestação, nem da contrapresta ção, nem da cobertura.
Negócio jurídico, parecido com a chamada antecipação e (menos) com a cobertura, é o chamado direito de
desconto, pelo qual o adquirente, a prazo, de títulos pode exigir a entrega antecipada, com que se evita que o
alienante especule com os títulos (cf. N. GARRONE, Le Rorse valori, 559 s.).

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O corretor não pode exigir garantias que não sejam JUStificaveis. O remédio jurídico ou é a responsabilidade
civil (Decreto ~. 2.475, arts. 130, a), 181-133), ou a de medida administrativa (arts. 135 e 186).
Se o depósito de cobertura foi feito em estabelecimento bancário, êsse é que tem a posse imprópria imediata,
porém se pode negar que o corretor a recebe mediata, ficando ao depositante a posse própria mediata.
Não se pode dizer que haja apenas custódia, com fim de conservação; há depósito em garantia, há caução. O
corretor instrurnentalmente, e com o poder que recebeu ex lege, pode diispor, para se satisfazer, mas para
satisfazer o figurante que negociar, através dêle, com o seu cliente.

8.LIQUIDAÇÃO POR COMPENSAÇÃO. Diz o Decreto n. 2.475, art. 101: “As diversas operações efetuadas
pelo corretor, por ordem de um mesmo comitente, sào liquidáveis por compensação em dinheiro ou em titulos
da mesma espécie, conforme houver sido acordado”, O corretor pode ter sido incumbido de alienar cem ações
da emprêsa E e de adquirir cento e cinquenta ações da mesma emprésa E. Para a liquidação, o corretor entrega
cinqúenta ações e o preço das ações que alienou.
Está rio Decreto ri. 2.475, art. 102: “As operações realizadas por mais de um corretor e por ordem e conta de
um ou mais comitentes podem ser, do mesmo modo do artigo antecedente, liquidadas por compensação, se os
interessados nisso convierem”. A liquidação dita por compensação, se a espécie cabe no ad. 102, depende de ter
havido acôrdo dos interessados (cláusula da incumbência ou pacto).
Estatui o art. 1.0 do Decreto-lei ti. 1.844, de 18 de junho de 1939: “As operações sobre títulos da Bôlsa serão
efetuada a exclusivamente por intermédio dos corretores e em público pregão”.

9.CONSEQUÊNCIAS DA FALTA DE ENTREGA E DE COBERTURA.


No sistema jurídico brasileiro, a falta de entrega dos valôres ao corretor ou a falta da cobertura de modo
nenhum atinge o negócio jurídico que o corretor dê como concluído. Temos de prestar atenção a essa diferença
em relação a certos sistemas jurídicos, que têm, sem razão de jure condendo, a sanção de invalidade do negócio
jurídico. Desde séculos, a função do corretor é função de responsável perante o público e o Estado. Não
presenta, não representa; mas a sua intermediacào é fortalecida pelo elemento do múnus público, que tem,
evidentemente, o corretor oficial.

10.ADIMPLEMENTO E INADIMPLEMENTO PELO INCUMBENTE.


Os negócios juridicos feitos por intermédio de corretor são negócios jurídicos em que são figurantes o
incumbente e o outro interessado. O corretor tem função instrumental e declaratéria. Assemelha-se ao tabelião,
com a diferença de não haver no tabeIi~o qualquer atividade intermediatriz. Assemelha-se ao inisermediário,
em senso estrito, mas ao intermediário, em senso estrito, falta a funçáo declaratória e instrumental.
Figurante do negócio jurídico, a eficácia que se irradia é pró e contra o iiwumbente. Ao outro figurante vão os
respectivos efeitos.
A declaração da conclusão do negócio jurídico é imediata à conclusão, ou simultânea, se o negócio jurídico se
concluiu no recinto da Bôlsa.
A propésito, os arts. 44 e 45 do Decreto ri. 2.475, de 18 de março de 1897, precisam ser lides e entendidos com
terminologia científica e adequada. Diz o art. 44: “O comitente que, sem prévia retirada da ordem dada, já
tendo recebido do corretor encarregado da operação a nota de haver sido a mesma executada, deixar de fazer
boa a transação e realizá-la por intermédio de outro corretor, será obrigado a pagar a corretagem ao primeiro
corretor e responderá por perdas e danos perante a parte com quem o mesmo corretor houver tratado. A
requerimento do corretor, poder-se-á afixar na Bêlsa o nome do comitente omisso com um resumo da operação
.
Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 45: “O comitente que deixar de cumprir um contrato de corretor responderá
integralmente pela transação que, em virtude de sua ordem escrita e de conformidade com ela, houver realizado
o corretor, O corretor, em tal caso, revenderá os títulos que houver adquirido para o comitente e que êste não
tiver pago, ou adquirirá os que não houverem sido fornecidos pelo comitente cobrando dêste a diferença da
cotação que se der. Em todo caso, responderá o comi-tente pelos prejuízos que de sua falta resultarem”.

11.CORRETAGEM (REMUNERAÇÂO). A remuneração do corretor chama-se corretagem ou comissão. Há,


por lei, tarifa, para que se evitem a parcialidade do corretor e qualquer preferência originada do valor da
remuneração. É falta grave aumentar ou diminuir o corretor a taxa da corretagem. Isso não obsta a que o
incumbente e o corretor acordem quanto à indenização do tempo e esfôrço perdidos no serviço se não fOr

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concluído, sem culpa do corretor, o negócio jurídico.


Em princípio, a corretagem somente é devida após a conclusão do negócio jurídico. Não se espera a liquidação
ou adimplemento pelos contraentes. <Convém advertir-se que não cabem aqui, a respeito de corretores,
proposições que se firmaram ~a propósito de mediadores.)
Se há condição suspensiva, aguarda-se que se impla. Aliter, em caso de condição resolutiva.

12. RECIBO PELO CORRETOR. Tem o corretor o dever de dar recibo dos títulos, valOres e dinheiro que
recebe do incumbente, inclusive se para garantia da operação. Pode êsse preferir depositar em estabelecimento
bancário o suficiente para a liquidação da operação de que incumbiu o corretor (Decreto n. 2.475, arts. 42, SOe
92).
Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 50: “Os corretores são obrigadas a dar aos comitentes recibos dos fundos e dos
valOres que lhes forem confiados”.

13.DEVER DE SIGILO. Diz o Decreto n. 2.475, art. 47:


“O corretor deve guardar segrêdo sObre os nomes dos comi-tentes; para mencioná-los faz-se precisa
autorização dêstes por escrito, ou que a natureza da operação o exija”.
14.RESPONSABILIDADE DOS CORRETORES DE FUNDOS PÚBLICOS E OUTROS VALORES. (a) No
art. 35 do Decreto n. 2.475, de 13 de março de 1897, diz-se: “Os corretores de fundos públicos têm inteira
responsabilidade pela execução, até final liquidação, das operações em que interferirem por fOrça do privilégio
que lhes conferem o Decreto legislativo n. 354, de 16 de dezembro de 1895, e êste regulamento”. A
interpretação dêsse art. 35 tem sido má. O que nêle se enuncia é que o corretor oficial, a quem cabem,
exclusivamente, as operações apontadas no art. 29, é responsável “pela execução, até final liquidação, das
operações” em que forem intermediários. Quem compra ou vende apólices tem de receber apólices ou o preço,
Quem compra ou vende debêntures tem de receber debêntures ou o preço. Quem compra ou vende títulos
cotáveis na BOlsa tem de receber os títulos ou o preço. quem compra ou vende metais preciosos, amoedados ou
em barra, tem de receber os metais preciosos ou o preço. Já era princípio assente, porque o corretor tinha de ser
verídico e anotar tudo de que cogitaram os arts. 47-50 do Código Comercial. Mais: no art. 53 do Código
Comercial explicitamente já se estatuía que “os corretores são obrigados a assistir à entrega das coisas vendidas
por sua intervenção, se alguma das partes o exigir”. Sanção: multa e dever de indenizar. Não respondem pela
solvabilidade em caso de negócios jurídicos a prazo, ou sob condição. Tanto assim que. no art. 36, se explicita:
“O corretor é pessoalmente responsável, nas negociações à vista, para com o outro corretor com quem operar e
para o seu comitente, pela entrega dos títulos vendidos e pelo pagamento dos que houver comprado”. E no art.
37, que concerne às operações referidas no art. 35 e no art. 36, acrescenta-se: “A responsabilidade do corretor
éinteira e completa pela liquidação das operações feitas a prazo, sempre que no ato da transação não fOr
revelado, de modo regular, o nome do comitente. Essa responsabilidade é regida pelos princípios que regulam a
do comissário dei credere”. Assim é para qualquer corretor, que não revele o nome do incumbente, ou da outra
pessoa, com quem se concluiu o negócio jurídico. Não se fêz comissionário, porque, cx Ivypothesi, não operou
em nome próprio, mas omitiu o nome do figurante,

TRATADO DE DIREITO PRiVADO


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e a lei o faz responsável como seria responsável o comissionário dei credere.


Onegócio jurídico não deixa de ser entre os dois ou mais interessados. Se assim não fOsse, o corretor ter-se-ia
transformado em conhissionário. Apenas o corretor, se revela os nomes, tem de entregar ao figurante que
comprou aquilo que êsse adquiriu e ao que vendeu o preço. Se houve prazo, ou condição, o corretor tem de
entregar os bens e os documentos, ou os documentos de um figurante e do outro, ou dos outros. SOmente se nae
revelou o nome do figurante, ou os nomes dos figurantes, é que êle rusponde à semelhança do que ocorre com o
comissionário dcl credere. No fundo, há apenas remissão ao art. 179, alínea 1•a, do Código Comercial. O
corretor, que deixa de comunicar o nome, se solidariza com o figurante cujo nome ocultou, quer em caso de
impontualidade (inadimplemento), quer em caso de insolvabilidade.
<b) Tratando-se de títulos, inclusive letras de câmbio. o corretor, que foi o intermediário e pode ter sido a única
pessoa em contacto com os figurantes, que concluíram o contrato, tem de verificar a assinatura ou as

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assinaturas que se ligam ao negócio jurídico. Diz o ad. 39 do Decreto n. 2.475: “Os corretores são responsáveis
pela autenticidade da assinatura do último signatário das letras e dos títulos endossáveis que negociarem”. A
exigência da autenticidade da assinatura do último signatário é o que mais acontece. Isso não afasta que tenha o
corretor de responder pela autenticidade do aceite, do endOsso e do aval, ou do aceite e do endOsso, ou do
aceite e do aval, ou do endOsso e do aval, se tais manifestações unilaterais de vontade foram feitas em sua
presença, ou o deviam ter sido em sua presença.
No art. 38 do Decreto n. 2.475 (onde “fiança” está em vez de “caução”), diz-se: “A fiança do corretor responde
pela liquidação das operações, a qual será feita pela Câmara Sindical, de acOrdo com o regimento interno da
BOlsa e da corporação dos corretores”. A liquidação não é feita pela Câmara Sindical, mas sim pelo corretor. A
“liquidação” da responsabilidade do corretor, sim.
(Afastamos a afirmação do Ministro da Fazenda, em 1896, quando, em relatório, entendia que “a situação
jurídica do
corretor, não é do mandatário, mas a do comissionário dei credere”. Nem uma, nem outra.)
No negócio jurídico podem ter intermediado dois ou mais cori claras. Diz-se no art. 40 do Decreto n. 2.475:
“Na falta de ~iaaitacão ou de pagamento dos títulos pelo corretor comprader e da entrega pelo corretor
vendedor a revenda e a comrra dos valOres negociados podem ser a requerimento do corretur com o qual
houver sido feita a negociação realizada por 4nteím$dio do síndico, correndo todos os riscos por conta do
corretor omisso”. A redação não é correta. Não há corretor comprador, mas sim corretor através do qual alguém
compra. Não há corretor vendedor, mas sim corretor através do qual alguém vende. Se o corretor cujo
incumbente era o comprador se recusa a receber os valOres comprados, ou se o corretor cujo incumbente era o
vendedor se recusa a prestá-los, o corretor cujo incumbente seria prejudicado pode exigir do outro
adimplemento, exercendo a pretensão perante o síndico, que é quem fiscaliza a escrituração dos corretores. No
art. 40, parágrafo único, do Decreto n. 2.475 foi estabelecido: “Na revenda e na compra, o síndico regular-se-á
pelo regimento interno da BOlsa e da corporação dos corretores”. O que o corretor não fêz, fá-lo, não o síndico,
mas a Câmara Sindical.
Por vêzes, o corretor dá como concluído o negócio jurídico tendo sido incumbente de outro corretor a pessoa
que com o seu incumbente figura. A lei tinha de atribuir ao corretor a verificação de quanto se passa do outro
lado, pois o figurante, que o incumbiu da corretagem, nada tem com a relação de corretagem que existe entre o
outro figurante e o outro corretor. Aliás, se o corretor fOsse dos dois figurantes, a situação seria idêntica. O que
se quer é que o corretor responda pelos atos do outro corretor como responderia pelos seus. Dai o ad. 41 do
Decreto n. 2.475: “O corretor, salvo convenção em contrário, responde perante seu comitente pelo outro
corretor com o qual houver contratado quanto à liquidação da negociação”. A redação é defeituosa. O corretor,
se o negócio jurídico em que foi intermediário se faz com alguém, que tem como corretor outra pessoa,
responde ao seu incumbente pelo que resulte, no tocante à liquidação, do negócio jurídico, se houve corretagem
em que o outro titular foi figurante. Se C foi o corretor pela compra por A e D o corretor pela venda por E, 43
responde a A como seu corretor e pelo que D responderia se de A fOsse corretor D.
Estabelece o art. 41 do Decreto-lei n. 1.344, de 13 de junho de 1989: “O pecúlio das Caixas de Garantia e Previ
dência não responde por divida do corretor, a não ser pela que decorrer de sua responsabilidade funcional, e não
poderá, no todo ou em parte, ser objeto de cessão, transferência ou. penhora”. Acrescenta o § l.~: “O pecúlio
responderá pela dívida depois que se esgotarem a fiança e demais bens”. E o § 2.0:
“As multas impostas ao corretor pela Câmara Sindical serão por esta descontadas do pecúlio”. E o § 3.0:
“Desfalcado o pecúlio, ficará suspenso o corretor até que o complete”. E o § 42:
“O pecúlio será limitado a trezentos e cinqUenta mil cruzeiros
Diz o Decreto-lei n. 1.344, art. 42: “Prescreverá em favor da Caixa o pecúlio não reclamado até três anos depois
do falecimento do corretor, salvo quando devido a incapaz”.
Estatui o art. 43 do Decreto-lei n. 1.344: “O corretor solteiro, viúvo ou desquitado, que não tiver ascendente ou
descendente, poderá dar ao pecúlio, para depois de sua morte, o destino que entender”.
Estatui o art. 44 do Decreto-lei n. 1.344: “As assembléias das BOlsas de Valores, antes de passar os saldos
anuais para a Caixa de Garantia e Previdência, devem consignar verba para: a) pagamento do pessoal
administrativo e da ajuda de custo mensal do síndico; 1i9 conservação da sede; e) pagamento de aposentadoria
e pensão dos empregados das BOlsas que tenham assumido êsse encargo espontâneamente ou por fOrça de lei;
d) organização da estatística e publicidade de seu movimento; e) desenvolvimento dos departamentos legais e
técnicos; 1) manutenção dos serviços de contabilidade, de cotação de títulos e de câmbio; g) despesas gerais e
eventuais”. Acrescenta o parágrafo único: “O síndico autorizará a aplicação das verbas, prestando contas à

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Câmara”.

15.PRESCRIÇAO . Seis meses após a exoneração ou falecimento do corretor de valOres prescrevem tOdas as
pretensões contra êle que derivem da sua responsabilidade como corretor. Em todo o caso, há as regras jurídicas
de interrupção e de suspensão da prescrição (Código Civil, arts. 172-176, e arts. 168-171). Lê-se no art. 13 do
Decreto n. 2.475: “Findo êste prazo” o dos seis meses “haver-se-ápor prescrita a responsabilidade do corretor,
salvo o caso de protesto pelo não cumprimento e liquidação do contrato e aquêles em que, segundo decreto, não
corre o tempo para a prescrição”. Se a responsabilidade não deriva de atividade de corretor, não se pode invocar
o art. 13 do Decreto n. 2.475.
Lê-se no art. 130 do Decreto n. 2.475: “A responsabilidade civil dos corretores de fundos públicos resolve-se na
prestação de perdas e danos resultantes: a) da falta de execução da ordem aceita do comitente; b) da entrega, em
liquidação de operação, de titulo irregular, amortizado, embargado, perdido, furtado, ou incluído no boletim
oficial dos títulos cuja transferência estiver suspensa; e) de haver o corretor, para angariar bens para seu
comitente ou proventos para si próprio, negociado de má fé letras, títulos e valOres na época da operação
pertencentes a pessoas cujo estado de falência fOr notório; d) da irregularidade da escrituração de seus livros às
partes interessadas nas operações”.
O corretor oficial não pode deixar de adimplir os seus deveres. Não se lhe permite afastar-se do contrato de
corretagem, nem dos deveres e obrigações que assumiu. Tem de cumprir aquilo de que se lhe incumbiu e de
prestar o que com êle haveria de estar, ou o que tocava exigir, no tocante ao negócio jurídico que se concluiu.
A responsabilidade por atos, positivos ou negativos, de má fé, ou por atos-fatos, é em quaisquer casos. Não se
precisa de texto de lei para que tal responsabilidade se tenha por assente.
Além disso, enquanto os títulos ou outros valOres estio em poder do corretor, responde êle como possuidor
imediato. ou, se não deviam estar em seu poder, como o turbador ou o esbulhador.
As referências do art. 130, e) e d), atendem à especificidade da atividade de corretagem.
Diz o Decreto n. 2.475, art. 131: “Responderá o corretor pelos lucros cessantes e danos emergentes que
decorrerem de seu ato quando provar-se que a omissão em dar cumprimento à ordem recebida proveio de má fé,
ou que dela auferiu o corretor qualquer interesse”. A referência à má fé não elide a incidência do art. 130, a),
que não exige tal pressuposto. Dá-se o mesmo a propósito do art. 130, 6).
Diz ainda o art. 132 do Decreto n. 2.475: “Em qualquer dêstes casos, a ordem aceita e não cumprida será
executada pela Câmara Sindical, à vista da reclamação da parte interessada, com os fundos constitutivos da
fiança do corretor, operando-se o levantamento da quantia precisa para a final liquidação da operação, por meio
de requisitória dirigida ao Ministro da Fazenda”. O incumbente, ou quem concluiu com o incumbente, através
de corretor, o negócio jurídico, pode reclamar perante a Câmara Sindical, que tem o dever de cumprir o que
cabia ao corretor. A requisição dos fundos é feita à autoridade estatal competente.
Está no Decreto n. 2.475, art. 133: “A prestação de perdas e danos tornar-se-á efetiva em virtude de sentença
condenatória obtida pelos meios ordinários”. O art. 132 permitiu a liquidação, não a indenização de perdas e
danos, de jeito que, se o caso não é remediável pela prestação do objeto ou do preço, tem o interessado de
propor a ação condenatoria.
Estatui o Decreto n. 2.475, no art. 134: “Os corretores de fundos públicos além das penas em que possam
incorrer de acOrdo com as disposições do Código Penal, repressivas dos crimes de função são passíveis das
penas regimentais de suspensão até três meses e de multa até o valor da metade da fiança”.
Lê-se no Decreto n. 2.475, art. 135: “A pena de suspensão pode ser imposta: a) pela Câmara Sindical, com
recurso voluntário para o Ministro da Fazenda por tempo não excedente de um mês; 6) pelo Ministro da
Fazenda, sem recurso, até três meses”. Ministro da Fazenda, entenda-se, ou a autoridade competente, em se
tratando de corretor em algum Estado-membro.
Estabelece o Decreto n. 2.475, no art. 186: “A Câmara Sindical impõe a suspensão ex o/tido ou mediante
queixa. Esta só pode ser recebida quando devidamente instruída com documentos que demonstrem falta ou êrro
de ofício cometido pelo corretor. A justificação produzida perante autoridade
judiciária do domicílio do corretor, e com citação dêste, pode ser aceita como documento, instrutivo da queixa
Acrescenta o Decreto n. 2.475, art. 137: “A suspensão pode ser imposta ex o/titio: a) se o corretor não tiver em
estado de integridade a fiança depositada no Tesouro Federal; b) se estiver em mora na liquidação de
negociações que tenha realizado; e) se se achar em atraso no pagamento do impOsto de indústrias e profissões”.
Diz mais o parágrafo único: “Reputa-se em mora o corretor que não liquidar qualquer negociação dentro de
dois dias úteis do vencimento dêste”.

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Diz o Decreto n. 2.475, art. 138: “As multas estabelecidas neste Regulamento serão impostas
administrativamente pela Câmara Sindical, com recurso voluntário para o Ministro da Fazenda, ou por êste
quando cabível tal pena”. Para o Ministro da Fazenda, ou a autoridade competente, in casu.
Acrescenta o art. 139: “O recurso terá efeito suspensivo, deverá ser interposto dentro de cinco dias, a contar da
notificação pelo síndico, e será decidido dentro do prazo máximo de quinze dias; a falta de decisão dentro dêsse
prazo importa a confirmação do ato da Câmara Sindical”.
Finalmente, estatui o Decreto n. 2.475, art. 140: “O produto das multas será recolhido ao cofre da Câmara
Sindical, instituido no art. 16 do Decreto legislativo n. 854, de 16 de dezembro de 1895, e constituTrá um fundo
de beneficência dos corretores de fundos públicos da Capital Federal”.
Os arts. 141-155 só se referem a importes das multas.

CORRETORES DE MERCADORIAS E DE NAVIOS

§ 4.747. Conceito e natureza do corretor de mercadorias

1. CONCEITO. No direito brasileiro, o conceito de corretor de mercadorias não é diferente, salvo quanto ao
objeto dos negócios jurídicos de cuja corretagem é incumbido, do conceito de corretor de valôres. No Brasil, há
as Bolsas de Mercadorias, como há as BOlsas de Valores.
Os corretores de mercadorias são intermediários nas operações sObre bens destinados a alienação, ou a
transferência de uso e fruto (o que ainda não entrou em voga, mas pode surgir, com tOda a juridicidade). Fixam
êles, ou através de institutções dependentes dêles, os preços. Uma vez que se admita a mercantilidade dos
negócios jurídicos sObre imóveis, podem os corretores de imóveis ser considerados corretores oficiais. Já hoje
podem matricular-se.
Os corretores de mercadorias podem ser oficiais, matriculados, ou livres.
A disciplina jurídica mudou com a Lei n. 2.146, de 29 de dezembro de 1953, na qual se diz “manda aplicar aos
corretores, Câmaras Sindicais, Juntas, BOlsas de Mercadorias e Caixas de Liquidação de todo o país a
legislação anteriormente decretada para o Distrito Federal, e dá outras providências”. Os arts. 1.e~6.o só se
referem a corretores de valores; o art. 79, ao tempo de quaisquer síndicos de Câmaras Sindicais e das comissões
de contabilidade; o art. 8.0, aos corretores de navios.
O art. 99, com o enunciado geral, concerne a quaisquer corretores.
2.NATUREZA DO CORRETOR DE MERCADORIAS E O DE NAVIOS.
No sistema jurídico brasileiro, as diferenças de regramento entre os corretores de valôres e os de mercadorias
ou de navios não são tão acentuadas quanto nos outros sistemas jurídicos. Temos ensejo de apontá-las.

§ 4.748. Nomeação dos corretores oficiais e regras jurídicas sObre exercício do cargo
1.EXIGÊNCIAS. Lê-se no art. 19 da Lei n. 5.595, de 6 de dezembro de 1928: “Os corretores de mercadorias e
os de navios serão nomeados e demitidos pelo Presidente da República, continuando os de mercadorias sob a
jurisdição do Ministério da Agricultura e passando os de navios para a do Ministério da Fazenda, mantidos,
porém, para uns e outros, os direitos e obrigações da legislação vigente”. Com a extensão da Lei n. 5.595 aos
Estados-membros, a autoridade competente, nos Estados-membros, é estadual. No § Lo: “Além das condições
atualmente exigidas para o provimento dêsses cargos, é necessário, para os corretores de mercadorias, o
certificado de aprovação em exame de classificação das mercadorias negociáveis na BOlsa; e para os corretores
de navios o certificado de aprovação dos exames de francês, inglês e legislação aduaneira, em estabelecimento
oficial ou fiscalizado pelo govêrno”. Para a matrícula, em se tratando de corretores oficiais de mercadorias, para
a nomeação, é preciso que a pessoa seja Brasileira (Código Comercial, art. 39, última alínea; Decreto n. 20.881,
de 30 de dezembro de 1931, art. 29, § 1.0) e tenha vinte e um anos; seja domiciliada por mais de um ano na
praça onde pretende servir, provado pelo titulo de residência e atestado de autoridades (Código Comercial, arts.
86, 23 parte, e 39, inciso 2); tenha idoneidade para o desempenho do cargo, conforme atestado de emprêsas
comerciais, bancos ou comerciantes matriculados (Código Comercial. art. 89, inciso 3; Decreto n. 1.026, de 14
de novembro de 1890, art. 19. § 2.0) ; não lhe ter sido proibido exercer o comercio (Código Comercial, art. 87,

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inciso 1); não ter sido destituído de corretor (Código Comercial, ad. 87, inciso 3); se falira, ter sido reabilitado
(Código Comercial, ad. 87, inciso 4); ter prestado os exames a que se refere o art. 19, §§ 15’ e 29, da
Lei n. 5.595. Veja adiante o Decreto n. 20.881, de 30 de dezembro de 1931, art. 1.% §§ 19 e 29 E no § 2.0: “Os
exames a que se refere o parágrafo anterior no tocante aos candidatos ao cargo de corretor de mercadorias,
poderão também ser prestados a requerimento dos mesmos, perante uma comissão de dois examinadores,
escolhidos pelo Ministério da Agricultura, dentre os técnicos em classificação das mercadorias negociáveis na
BOlsa, e presidida pelo síndico; quanto aos candidatos ao cargo de corretor de navios, êstes poderão prestá-lo,
em idênticas condições, versando o exame sObre o conhecimento teórico e prático das línguas francesa e inglê
sa e de legislação aduaneira, perante mesa de três examinadores nomeados pelo Ministro da Fazenda e
presidida por pessoa também por êste designada”. Em vez de Ministério da Agricultura, entenda-se, para os
corretores das entidades estaduais, a Secretaria da Agricultura, ou outra repartição ou autoridade a que a lei
estadual haja atribuído a competência.
Lê-se no Decreto n. 20.881. de 30 de dezembro de 1981, art. 21: “Não podem ser corretores de mercadorias: a)
os estrangeiros; b) os menores de 21 anos; e) os que não podem ser negociantes; cl) os corretores destituídos,
enquanto não reabilitados pela cessação do motivo da destituição”.
Estatui o Decreto n. 20.881, de 30 de dezembro de 1981, art. 20: “Para nomeação de corretor~de mercadorias
faz-se preciso requerimento, assinado pelo pretendente ao cargo e instruído com os seguintes documentos: a)
prova de ter 21 anos de idade, no mínimo; b) certidão dos cartórios das varas federais e dos juizes de direito das
varas criminais do Distrito Federal, de que não se acha o requerente nem processado nem condenado por crime
cuja pena importe em destituição do cargo ou com a inabilitação para exercê-lo de acOrdo com êste decreto; e)
atestado da Junta Comercial, que prove não ter o pretendente falido ou, no caso de o ter sido, não reabilitado;
cl) prova de residência por mais de um ano no Distrito Federai; e) atestado, devidamente autenticado pelo
reconhecimento da firma, de haver o pretendente praticado por tempo nunca inferior a dois anos em escritório
de corretor ou comerciante; /) certificado de aprovação em exame de classificação de mercadorias negociáveis
em Bôlsa, prestado em estabelecimento oficial ou perante comissão presidida pelo síndico e composta de três
examinadores, um para classificação do café, outro para a do açúcar e outro para a do algodão, todos nomeados
pelo Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, dentre técnicos na classificação dessas mercadorias; g)
exibição de caderneta de reservista, ou certificado de alistamento nos têrmos da legislação em vigor”. E o § 1.0:
“Não sendo brasileiro nato, deverá o pretendente juntar prova de sua naturalização”. Ainda o § 29: “O
requerimento será entregue à Secretaria da Junta dos Corretores, devendo o síndico remelêlo, devidamente
informado, dentro do prazo de cinco dias, ao Ministro do Trabalho. Indústria e Comércio, por intermédio do
Departamento Nacional do Comercio

2.PROIBIÇões AOS CORRETORES DE MERCADORIAS E DE NAVIOS. Diz a Lei n. 5.595, art. 8.0:
“Além das proibições constantes do art. 17 e seus números do Decreto n. 9.264, de 28 de dezembro de 1911, é
vedado aos corretores de mercadorias ou de navios o exercício de qualquer outro oficio ou função pública, sob
pena de perda do cargo de corretor”. E o § 19: “Fica igualmente proibido aos despachantes aduaneiros o
desempenho dos encargos atribuidos aos conetores de navios”. E o § 2.0: “O cargo de síndico é incompatível
com o exercício da corretagem”. No Decreto n. 20.881, de 80 de dezembro de 1981, art. 29, insiste-se no
assunto.
O síndico é corretor, porém não pode exercer o cargo, pela função que lhe foi atribuida, uma das quais é
absorvente e de especial responsabilidade administrativa, que é a do art. 49 da Lei n. 5.595.
Diz o Decreto n. 20.881, de 80 de dezembro de 1981, ad. 22: “Para que possa o corretor nomeado entrar no
exercício do cargo deverá prêviamente: a) prestar fiança e tomar posse, dentro do prazo de 60 dias, contados da
data da respectiva nomeação; 19 inscrever-se na repartição competente dentro do referido prazo, para
pagamento do impôsto de indústria e profissões; o) registar o seu título de nomeação na Junta dos Corretores;
d) assinar o têrmo de compromisso; e) legalizar os seus livros exigidos por lei; f) pagar no Tesouro Nacional o
sêlo de sua nomeação”.

8. CAUÇÂO. Lê-se no art. 2.0 da Lei n. 5.595: “É fixada em trinta mil cruzeiros a fiança de corretor de
mercadorias e em dez mil cruzeiros a do de navios, as quais poderão ser prestadas em dinheiro ou em títulos da
Dívida Pública da União, recebidos pelo seu valor nominal”. Acrescenta o parágrafo único: “Aos atuais
corretores é concedido o prazo de seis meses, a contar da data desta lei, para completarem a respectiva fiança,

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nos têrmos dêste artigo, exceto para o síndico, que deverá fazê-lo no prazo de trinta dias”. A errOnia de
terminologia persistiu. Não se trata de fiança, mas de caução. O Código Comercial, art. 41, admitia a fiança,
mas foi excluida pela Lei n. 490, de 16 de dezembro de 1897, art. 29, § 29, 1 (cf. Tribunal do Comércio da
COrte, 12 de maio de 1872). A quantia já era demasiado pequena em 1928.
A caução é exigida ao corretor oficial e ao corretor matriculado.
Posteriormente, disse o Decreto n. 20.881, de 80 de dezembro de 1981, art. 23: “A fiança do corretor de
mercadorias é do valor de dez mil cruzeiros e será prestada ao Tesouro Nacional, em dinheiro ou em títulos da
dívida pública da Ijniáo”. E § 19: “A guia para o depósito da fiança no Tesouro Nacional será expedida pelo
Departamento Nacional do Comércio depois do julgamento do respectivo processo de habilitação”. E § 2.0:
“No caso de ser a fiança prestada em apólices nominativas, o Departamento Nacional de Comércio solicitará da
Junta Administrativa da Caixa de Amortização se façam nos seus livros os assentamentos e averbações sObre a
gravação dos ditos títulos”. E § 3.0: “Os juros das apólices dadas em garantia de fiança são pagos aos
respectivos possuidores”. E § 49: “Quando a fiança fOr passada por fiador, ocorrendo a morte, falência ou
desistência dêste, será o corretor intimado pelo síndico a prestar nova fiança dentro do prazo de 30 dias, a
contar da data de qualquer daquelas ocorrências, sob pena de, não cumprida a nova obrigação no decurso de 60
dias, ser o referido corretor destituído do cargo”.
E acrescenta o art. 24: “A fiança do corretor responde:
a) pelas multas em que incorrer; lO pelo cumprimento das obrigações que assumir no desempenho de suas
funções;
c) pelas indenizações que fOr obrigado a pagar em virtude de sentença do Poder Judiciário”.
Adverte o art. 25: “Desfalcada a fiança por qualquer dos motivos indicados no artigo anterior, o corretor será
considerado suspenso das suas funções até a efetiva integralização da mesma”.
O mesmo Decreto n. 20.881, art. 28, estatul: “O fiador do corretor poderá, em qualquer tempo, solicitar o
cancela. mento da fiança por êle prestada”. E no § 1.0: “O requerimento para cancelamento da fiança será
dirigido ao Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, e o seu processamento se fará na forma indicada no §
4~O do art. 23”. E o § 29: “Prestada a nova fiança, ficará cancelada a anterior que apenas responderá pela
responsabilidade do corretor até a data do cancelamento”.
Quanto ao falecimento do corretor, estabelece o Decreta n. 20.881, ad. 27: “Ocorrendo o falecimento, renúncia
ou destituição de qualquer corretor, o síndico, logo que tiver ciência do fato, fará as necessárias anotações nos
assentamentos que se lhe referirem, afixando em lugar próprio e publicando no Diário Oficial editais para
conhecimento dos interessados nas transações em que tiver havido a sua intervencão”.
E o ad. 28: “A fiança só poderá ser levantada, por ordem do Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, depois
de haverem decorrido 90 dias da data da renúncia, da destituição ou falecimento do corretor, ou em virtude de
cancelamento, diante da informação prestada pelo síndico de que não pende reclamação contra os atos
exercidos pelo respectivo corretor e de que já estão definitivamente solvidas tOdas as suas responsabilidades”.

4.REMUNERAÇÃO DOS CORRETORES DE MERCADORIAS. Estava na Lei n. 5.595, art. 79: “As atuais
tabelas de emolumentos da Junta dos Corretores, anexas ao Decreto n. 9.264, de 28 de dezembro de 1911,
podem ser elevadas, na parte das taxas fixas, até ao máximo de 50%, observadas as condições do mercado e
tendo-se em vista a justa remuneração da corretagem”. O Decreto n. 20.881, de 80 de dezembro de 1981, art.
66, estabeleceu: “Os corretores de mercadorias, como remuneração pela sua interferência nas operações que
realizarem, perceberão as corretagens e os emolumentos constantes da tabela anexa n. 2”. No parágrafo único,
acrescentowse:
“As corretagens e emolumentos referidos neste artigo não poderão ser aumentados, nem diminuídos, sob pena
de suspensão e multa do dObro do seu valor”. Explicita-se no art. 67:
“Para que possa caber ao corretor o direito à percepção de corretagem, é indispensável que a negociação de que
tiver sido incumbido esteja ultimada”. Cf. Decreto n. 20.881, de 30 de dezembro de 1931, ad. 36. Cabe aqui o
que expusemos a respeito da remuneração dos corretores oficiais de valOres. O art. 68 do Decreto n. 20.881
precisa: “Será tida como ultimada a negociação, para os efeitos de corretagem, desde que estejam visados pelos
comitentes os contratos, nas negociações à vista e nas operações a têrmo que não se destinarem a registo nas
Caixas de Liquidação”. Acrescenta o § 1.0: “Quando fOr convencionado ou obrigatório o registo do negócio em
qualquer das Caixas de Liquidação existentes na praça, só se reputará ultimada a negociação depois de feito o
registo”. E o § 2.0: “Se na negociação intervierem dois corretores, a corretagem será entre êles repartida”.
A propósito dos emolumentos da Junta dos Corretores, diz o art. 69 do Decreto n. 20.881: “Os emolumentos da

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Junta dos Corretores constantes da tabela anexa n. 8 serão cobrados em estampilhas pela Secretaria da Junta, de
acOrdo com a legislação em vigor”.

5.MORTE DO CORRETOR E DOCUMENTOS. Lê-se no Decreto n. 20.881, art. 29: “Quando falecer o
corretor, ou renunciar o cargo ou dêste fOr destituído, serão seus protocolos entregues à Junta dos Corretores
por quem de direito, e aí encerrados por têrmo assinado pelo síndico e pelo portador e duas testemunhas”. E no
§ 1.0: “Ésses protocolos serão examinados na primeira reUnião da Junta que verificará o estado das operações a
cargo do corretor e a possível necessidade de providências para resguardar interesses de terceiros”. E no § 2.0:
“Ésses livros serão recolhidos ao arquivo, consignando-se na ata da sessão da Junta declaração minuciosa dos
fatos ocorridos”.

§ 4.749. Junta dos Corretores

1.COMPOSIÇÃO E EXPEDIENTE. Lê-se na Lei n. 5.595, art. 5.0: “A Junta dos Corretores de Mercadorias
compor-se-áde um síndico e três adjuntos, escolhidos dentre os corretores, nomeados pelo Presidente da
República, devendo a escolha daquele recair em quem tenha mais de cinco anos de exercício efetivo no cargo e
notória competência para cabal desempenho das funções que lhe são inerentes”.
A nomeação, em se tratando de corretores de mercadorias do Distrito Federal, é feita pelo Presidente da
República. Nos Estados-membros, pelo Governador do Estado, ou outra autoridade que a Constituição estadual
ou lei estadual indique.
Insiste-se no art. 1.0 do Decreto n. 20.881, de 30 de dezembro de 1931 : “A Junta dos Corretores de
Mercadorias do Distrito Federal, diretamente subordinada ao Departamento Nacional do Comércio, nos têrmos
do Decreto n. 10.671, de 4 de fevereiro de 1931, compõe-se de um síndico e três adjuntos do síndico, nomeados
pelo Presidente da República dentre os corretores de mercadorias, só podendo recair a escolha, para o
desempenho do primeiro daqueles cargos, em corretor que estiver exercitando sua profissão há mais de cinco
anos E o § 1.0: “Não poderá ser nomeado síndico o corretor que tiver sido suspenso no período dos cinco anos
anteriormente decorridos”. E o § 2.0: “Não poderá ser nomeado adjunto do síndico o corretor que tiver sido
suspenso no período dos cinco anos anteriormente decorridos”.
Lê-se no Decreto n. 20.881, de 30 de dezembro de 1931, art. 3.0: “A posse dos membros da Junta dos
Corretores efetuar-se-á no Departamento Nacional do Comércio, observada a legislação em vigor, no que lhe
fOr aplicável”. Acrescenta o parágrafo único: “Na sua primeira refinião, a Junta escolherá o seu secretário
dentre os adjuntos do síndico”.
Está na Lei n. 5.595, art. 4.0: “Todo serviço de expediente da Junta das Corratores fica sob a jurisdição
exclusiva do síndico”.
Estatui o Decreto n. 20.881, de 30 de dezembro de 1931, art. 5.0: “Compete à Junta dos Corretores: a)
superintender os atos dos corretores de mercadorias, zelando pela boa ordem dos trabalhos respectivos e pela
fiel execução das leis e regulamentos a que estão sujeitos; b) formular parecer sObre o aumento ou diminuição
do número dos corretores de mercadorias; e) dirimir as dúvidas e contestações que entre êles se suscitarem; d)
conceder-lhes licença até três meses; e) censurar os seus atos irregulares, de que tiver conhecimento ex officio,
ou por intermédio de queixas formuladas pelas partes e, devida-mente justificadas, impor-lhes penas e
suspendê-los do exercício de suas funções, até três meses; 1) propor ao Ministro do Trabalho, Indústria e
Comércio, por intermédio do Departamento Nacional do Comércio, a aplicação de penas da atribuição daquela
autoridade, expondo circunstanciadamente os fatos que determinarem a falta a punir; g) informar, dentro do
prazo de cinco dias, os recursos interpostos para o Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, das decisões que
proferir, enunciando os fundamentos destas; /23 organizar a tabela de designação (nome, tipo e unidade) das
mercadorias negóciáveis em BOlsa, revendo-a anualmente, no mês de dezembro, para as modificações que se
tornarem necessárias; i) organizar os modelos de contratos, memoranda, notas de preços correntes e demais
fórmulas necessárias à uniformidade do serviço oficial; j) ordenar a guarda e conservação no arquivo da
Secretaria, dos livros e arquivos dos corretores de mercadorias que houverem falecido ou que, por qualquer
motivo, tiverem deixado o serviço da corretagem, para dêles serem extraidas as certidões que forem requeridas
pelos interessados ou requisitadas por autoridades competentes; k) fornecer às autoridades e tribunais as
informações que lhe forem diretamente pedidas, relativas à profissão do corretor de mercadorias; 1) exercer a

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necessária fiscalização para que ninguém desempenhe, sem título legal, as funções de corretor, promovendo o
competente processo judicial contra os que incidirem em semelhante delito; m) fiscalizar os trabalhos da BOlsa,
estabelecer o seu horário e zelar pelo exato cumprimento das respectivas disposições regulamentares; n)
uniformizar os usos e praxes comerciais em vigor no Distrito Federal; o) propor ao Ministro do Trabalho,
Indústria e Comércio, por intermédio do Departamento Nacional do Comércio, tudo quanto for conveniente à
boa execução dos serviços a seu cargo; p) fornecer atestados de qualidade e de classificação de qualquer espécie
de mercadoria
Diz o Decreto n. 20.881, ad. 62: “A fixação de praxes e usos comerciais poderá ser efetuada por iniciativa da
Junta dos Corretores ou mediante requerimento de interessado”.
Ainda o art. 72 do Decreto n. 20.881: “Para que possa a Junta dos Corretores adotar oficialmente praxes e usos
comerciais, torna-se necessário que não sejam contrários a qualquer disposição de lei e tenham sido satisfeitas
as exigênmas enumeradas nos itens seguintes: a) inquérito em que serão ouvidas 10 ou mais emprêsas ou firmas
industriais ou comerciais diretamente interessadas no ramo em causa; b) aprovagão, em sessão especial da
Junta, dos fundamentos justificativos da resolução a adotar; e) publicação no Diário Oficial, por três dias
consecutivos, da ata da sessão em que foi discutida a resolução; á) afixação dêsses documentos na Secretaria da
Junta e no salão da BOlsa de Mercadorias; e) aprovação em assembléia geral dos corretores, especialmente
convocada, de tua ata constem os votos vencidos e a justificação dêstes, se os houver; f) aprovação do
Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio; g) transcrição, em livros próprios, da resolução que tomará
número de ordem, e, bem assim, das atas supra-referidas e da aprovação exigida na alínea anterior; h>
publicação, no Diário Oficial, e afixação, na Secretaria da Junta e no salão da BOlsa, da resolução a adotar,
quando aprovada e transcrita, com o seu número de ordem e a data da trans-<Tição”. E o § 1.0: “As praxes e
usos comerciais adotados com as formalidades do presente artigo tornam-se obrigatórios desde a data da
transcrição e a prova respectiva será feita mediante certidão passada pela Secretaria da Junta dos Corretores,
com a indicação da data da transcrição. E o § 29:
“Quando a legalização da praxe e dos usos comerciais se fizer a requerimento de interessado, por conta dêste
correrá a respectiva despesa”.
Oart. 8.0 do Decreto n. 20.881 explicita: “Tratando-se de casos que, segundo o Código Comercial, são
regulados pelos usos comerciais, devem êstes ser provados pelos assentamentos feitos na Junta dos Corretores,
nos têrmos do artigo anterior, ou, na falta dêsses assentamentos, por atestado da mesma Junta expedido em
virtude de resolução tomada em sessão especial”. Acrescenta o parágrafo único: “Para que possa a Junta dos
Corretores passar atestados a respeito de praxes e usos comerciais, são necessárias informações pelo menos de
cinco emprêsas ou firmas comerciais ou industriais, que tenham relação direta com a espécie em causa,
prêviamente consultadas, mediante questionário formulado pelo síndico”. E o art. 99:
‘Contra o assento, regularmente feito na forma do art. 72, suas alíneas e parágrafos, é inadmissível qualquer
contestação que nao seja sObre a identidade do caso; contra o atestado, porém, é inadmissível qualquer prova

2.ATESTADOS. Diz o Decreto n. 20.881, art. 10: “Para que possa a Junta dos Corretores fornecer atestados de
qualidade e de classificação, faz-se preciso que o possuidor da mercadoria a classificar os requeira ao síndico e
pague, prêviamente, os respectivos emolumentos”. Acrescenta o parágrafo umco: “O exame e a classificação da
mercadoria serão efetuados pei uma comissão de três técnicos, corretores ou não, nomeada pelo síndico, dentre
pessoas de sua confiança”.

3.CLASSIFICAÇÃO DAS MERCADORIAS. Lê-se no Decreto n. 20.881, art. 11: “A classificação de


qualquer mercadoria será feita ou por tipo ou por confronto de amostras”. E o § 1.0:
“Na classificação por tipo, além da verificação do estado da mercadoria, proceder-se.á à contagem dos defeitos
de cada um dos tipos existentes; na classificação por confronto de amostras, alem da verificação do estado da
mercadoria, far-se-áo cotejo da mercadoria a classificar com as amostras oficiais arquivadas na Secretaria da
Junta dos Corretores”. E o § 2.0:
4’A classificação de algodão será sempre feita na Superintendência do Serviço do Algodão do Ministério da

Agricultura por técnicos designados pelo respectivo superintendente” E o § 89:


“Os laudos de exames e classificação, excetuados os do algodão, a que se refere o parágrafo anterior, serão
registados em livro especial na Secretaria da Junta dos Corretores

4.REUNIÃO DA JUNTA DOS CORRETORES Diz o Decreto li. 20.881, de 80 de dezembro de 1931, art. 4.0:

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“A Junta dos Corretores funcionará sempre que se acharem retinidos pelo menos três dos seus membros, sendo
tomadas as decisões por maioria de votos”. Acrescenta o parágrafo único: “Das reti nioca efetuadas lavrar-se-ão
em livro próprio atas que serão assinadas pelos membros presentes”.

a.COMPETÊNCIA DO SÍNDICO. Diz o Decreto n. 20.881, art. 12: “Compete ao Síndico da Junta dos
Corretores: a) representar a corporação dos corretores de mercadorias, ativa e pnssiY amente, em Juízo ou fora
dêle; b) convocar as assembléias gerais, quando a Junta julgar necessário, ou a requerimento de um têrço dos
corretores em exercício; e) presidir às assembléias gerais e, bem assim, às reúnióes da Junta, cumprindo e
fazendo cumprir as suas resoluções; á) usar o voto de desempate; e) cumprir e fazer cumprir as disposições
regulamentares da BOlsa de Corretores de Mercadorias providenciando para que os trabalhos desta não sejam
perturbados; f) executar e fazer executar as disposições das leis e regulamentos em vigor, exercendo sObre os
corretores e sObre todos os funcionários da Junta e da BOlsa a competente fiscalização e propondo àquela a
aplicação de quaisquer penas; g) dirigir os serviços da Secretaria da Junta, encerrando o ponto dos funcionários
e prorrogando as horas do expediente, quando assim se tornar conveniente; Ii) remeter, mensalmente, ao
Tesouro Nacional, as fOlhas de pagamento dos funcionários e, mediante as formalidades legais, providenciar
sObre a compra do material necessário ao expediente da Junta e funcionamento da BOlsa; i) fazer registar o
resultado das operações efetuadas em BOlsa ou fora dela, de acOrdo com as notas fornecidas pelos corretores;
j) organizar, semanalmente, os boletins de preços oficiais dos gêneros de primeira necessidade, fazendo-os
publicar no Diário Oficial; k) fazer preparar a correspondência oficial e rubricar as informações que tenham de
ser afixadas; 1) abrir, rubricar e encerrar os livros da Secretaria da Junta, velar pela conservação e boa ordem do
arquivo e mandar passar as certidões que forem requeridas, subscrevendo-as e rubricando as suas fOlhas; m)
propor ao Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, por intermédio do Departamento Nacional do Comércio,
a nomeação dos funcionários da Junta; n) encaminhar, devidamente informado, ao Ministro do Tra-~
balho, Indústria e Comércio, por intermédio do Departamento Nacional do Comércio, os pedidos de nomeação
ou exoneração dos corretores de mercadorias; o) dar posse aos funcionários da Secretaria da Junta e açs
prepostos de corretor, exigindo que os têrmos de promessa dêstes últimos sejam assinados também pelo
corretor responsável; p) receber as importâncias das multas que forem impostas aos corretores; q) apresentar,
trimestralmente, à Junta dos Corretores um balanço dos emoluinentos cobrados e das quantias arrecadadas e
que forem recolhidas ao Tesouro Nacional, dando do mesmo ciência ao Departamento Nacional do Comércio e
à Diretoria Geral de Expediente e Contabilidade do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio; r) apresentar,
até o dia 31 de janeiro de cada ano, ao Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, por intermédio do
Departamento Nacional do Comércio, re1atório círcunstanciado dos fatos ocorridos e do movimento dos
trabalhos da Junta e da BOlsa de Mercadorias durante o ano antenor; s) exercer, por si ou por técnico de
reconhecida competência e de sua imediata confiança, e sob sua responsabilidade, a fiscalização dos gêneros
alimentícios destinados à exportação para o estrangeiro, expedindo os respectivos certificados nos têrmos do
Dec. n. 12.982, de 24 de abril de 1918, e de acOrdo com as instruções que com êle baixaram; t) proceder à
arrecadação do impOsto sObre as operações a têrmo, de acOrdo com o art. 50 do regulamento que baixou com
o Decreto n. 17.537, de 10 de novembro de 1926”.
Acrescenta o art. 16: “As certidões passadas pela Secretaria da Junta dos Corretores são subscritas pelo
síndico”.

6.COMPETÊNCIA DO ADJUNTO-SECRETÁRIO. Lê-se no Decreto n. 20.881, art. 13: “Compete ao adjunto-


secretário:
a)substituir o síndico nos seus impedimentos ou faltas; 10 exercer as funções de secretário e escrutinador nas
assembléias gerais e nas sessões das Juntas dos Corretores, redigindo e lavrando, nos livros próprios, as
respectivas atas; o) auxiliar o síndico, sempre que necessário fOr, na fiscalização e trabalhos da BOlsa”.
E o art. 14: “Aos adjuntos do síndico compete: a) assistir às reUniões da Junta dos Corretores e tomar parte em
suas deliberações; b) substituir o secretário, na ordem da antiguidade da posse no cargo do corretor, e, em
igualdade de condições, na ordem de idade; e) desempenhar qualquer comissão de que forem encarregados”.

u FUNCIONÁRIOS DA SECRETARIA DA JUNTA DOS CORRETORES. Diz o Decreto n. 20.881, art. 17:
“Aos funcionários da Secretaria compete a execução das ordens que lhes forem dadas pelo síndico e a
escrituração dos livros de expediente da Junta dos Corretores e da BOlsa de Mercadorias”. E o art. 18:
“Os funcionários da Secretaria da Junta dos Corretores são de nomeação do Presidente da Repúblici e

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perceberão os vencimentos constantes da tabela anexa n. 1”. Entenda-se: do Presidente da República, tratando-
se de corretores do Distrito Federal ou dos Territórios, se alguma lei não estabelecer outra competência; ou da
autoridade estadual correspondente, se os corretores são de Estado-membro.
Ainda o art. 19: “Os corretores de mercadorias do Distrito Federal serão nomeados e demitidos pelo Presidente
da República e o seu número é fixado pelo Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, que o poderá alterar.
ouvida a Junta dos Corretores”. Acrescenta o parágrafo único:
“O aumento do quadro será determinado pelo desenvolvimento dos negócios na Praça do Rio de Janeiro e a sua
diminuição pelo não preenchimento das vagas que se verificarem”.
Quanto ao horário, estatui o Decreto n. 20.881, art. 15:

“O expediente da Secretaria da Junta dos Corretores começará às 9 horas e terminará às 16 horas, salvo o que
prescreve a alínea g do art. 12”.

8.REGULAMENTAÇÃO. Diz a Lei n. 5.595, art. 6.0:


“As multas a que estiverem sujeitos os corretores de mercadorias ou de navios podem ser elevadas até o
máximo de cinco mil cruzeiros”.
Finalmente, diz a Lei n. 5.595, art. 82: “Nos regulamentos que expedir, para os corretores de mercadorias e
respectiva Junta, para a BOlsa de Mercadorias e para os corretores de navios, o Poder Executivo consolidará as
disposições das leis, regulamentos e instruções em vigor, tendo igualmente em vista as disposições vigentes
sObre o impOsto de operações a têrmo, as Caixas de Liquidação e os serviços de inspeção e classificação de
algodão e adaptando a mesma consolidação às prescrições da presente lei”. Acrescenta o parágrafo único:
À presente lei entrará cm vigor independentemente da expedição dos regulamentos a que se refere êste artigo”.

9.DESTITUIÇÃO DOS CORRETORES DE MERCADORIAS. Lê-se no Decreto n. 20.881, de 30 de


dezembro de 1931, art. 30:
“Os corretores de mercadorias só poderão ser destituídos mediante processo administrativo em que fique
provada a falta prevista em disposições regulamentares, cuja penalidade importe em perda do cargo”. Os
corretores oficiais de mercadorias são tratados, quanto à destituição, à semelhança dos funcionários públicos
estáveis (Constituição de 1946, art. 189, II, 1•a e 3a partes), sem serem funcionários públicos. Gozam de plus,
que é o de não serem dispensáveis por extinção de cargo, porquanto, a seu favor, rege o art. 141, § 32, da
Constituição de 1946, que não sofre, a respeito de quaisquer corretores oficiais, a limitação do art. 189, ~J, 2Y
parte, da Constituição de 1946 (“no caso de se extinguir o cargo”).
-v.
~ad. 40 do Decreto n. 20.881 está dito: Nenhum cor-ator poderá deixar o exercício do seu cargo sem prévia
licença da Junta dos Corretores, até três meses, e do Departamento Nacional de Comércio, por mais longo
tempo, não excedente de um ano”. Acrescenta o parágrafo único: “Não se considera como tendo deixado o
exercício do cargo o corretor que se ausentar até um mês, desde que se faça substituir pelo seu preposto,
regularmente constituído”.

§ 4.750. Competência e deveres dos corretores de mercadorias

1.PRINCÍPIOS BÁSICOS. A corretagem sOmente é exigida para quaisquer operações se há lex specialis a
respeito. Outra matéria é a da limitação da corretagem aos corretores cficiais, ou aos matriculados. Então, em
vez de se vedar que se opere a conclusão do negucio jurídico sem corretor oficial, o que se proibe é que a
corretagem seja por outro conetor que o corretor oficial, ou por outro corretor oficial ou matriculado. Em
principio, não é de exigir-se a corretagem e a corretagem é livre. São dos pontos dignos de tOda a atenção: o da
liberdade de negociar sem a atividade do corretor e o da corretagem livre. SOmente textos legais podem
limitar uma ou outra liberdade.

2.CORRETORES OFICIAIS DE MERCADORIAS. Diz o Decreto n. 20.881, de 30 de dezembro de 1931, art.


31: “São da competência dos corretores de mercadorias as seguintes atribuições: a) a intervenção em tOdas as
convenções, transações e operações mercantis e, privativamente, em BOlsa, a compra e a venda das
mercadorias ai negociadas; b) a fixação das cotações dos preços das mercadorias compradas e vendidas; e) a
classificação e avaliação de mercadorias para sObre elas serem emitidos warrants ou bilhetes de mercadorias,

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bem como para entrega às Caixas de Registo e Liquidação, em solução dos negócios a têrmo, lavrando e
assinando os respectivos laudos; d) as vistorias em mercadorias, quer por nomeação judicial ou particular, quer
por designação do síndico da Junta dos Corretores; e) a venda pública nas salas anexas aos armazéns gerais,
concorrentemente com os leiloeiros, à escolha dos interessados”.
Quanto ao inciso a), há a limitação ao princípio da liberdade de corretagem, e não ao princípio da
negociabilidade sem corretagem: não se exige a atividade do corretor, salvo se se trata de operações em BOlsa,
caso em que só os corretores oficiais podem operar. Quanto ao inciso b), é óbvio que só os corretores nomeados
possam, através dos órgãos próprios, fixar as cotações. Quanto ao inciso c), trata-se de função de corretor
oficial. Bem assim, no de que se cogita nos incisos d) e e).

3.DEVERES DOS CORRETORES OFICIAIS DE MERCADORIAS. Estabelece o Decreto n. 20.881, art. 82:
“São deveres dos correteres: a) comparecer às assembléias gerais dos corretores~ b) comparecer aos trabalhos
da BOlsa ou fazer-se representar pelos prepostos, que os substituirem em seus impedimentos; c) dar certidões
de contratos quando requeridas pelas partes diretamente interessadas ou requisitadas por autoridade
competente; d) fornecer à Secretaria da Junta de Corretores, diretamente ou pelos prepostos, no último dia de
cada semana e à hora designada pelo síndico, as notas com os preços correntes das mercadorias negociadas em
BOlsa durante a semana, sendo nessas notas mencionados o preço, a qualidade, a unidade da venda e a
procedência de cada mercadoria e tOdas as informações necessárias para registo no livro competente e
organizaçáó do boletim de preços correntes oficiais; e) assistir àentrega das mercadorias vendidas por seu
intermédio, quando algumas das partes contratantes assim o exigir; f) possuir um caderno manual ou copiador e
um protocolo, devidamente aberto, rubricado e encerrado pela Junta Comercial; g) guardar segrêdo para com
terceiros sObre os nomes dos comitentes, só podendo divulgá-los com autorização por escrito, se assim exigir a
natureza da negociação; Ii) assegurar-se da identidade e da idoneidade das pessoas ou firmas de cujas
negociações forem encarregados; i) haver-se nas negociações, com exatidão, clareza e precisão, abstendo-se de
subterfúgios que possam induzir a êrro as partes contratantes; 5) entregar ao síndico nota devidamente
autenticada, relativa às operações que tiverem Sido efetuadas na BOlsa ou fora dela, a fim de ser registada na
Secretaria e servir de prova de fechamento dos negócios; Ai mencionar, em seu protocolo, a importância do
impOsto pago e a respectiva data, relativamente a cada contrato; 1) exibir os seus protocolos aos fiscais do
imposto do sêlo e das operações a têrmo, bem como por determinação judicial, da Junta ou do síndico, para os
exames a que se referem o art. 38, suas alíneas e parágrafos; m) promover, logo após a lavratura dos contratos, o
pagamento do impOsto de operações a têrmo. bem como o registo dos mesmos, na Caixa de Liquidação, no
prazo de 48 horas, quando tal registo tiVer sido convencionado, assistindo-lhe o direito de reclamar da Junta a
devolução dentro de igual prazo, dêsses contratos e dos recibos de pagamento do impOsto; n) promover o
registo imediato, nas Caixas de Liquidação, dos contratos que celebrarem, quando intimados pela Junta dos
Corretores; o) registar na Secretaria da Junta dos Corretores, nas épocas próprias,, o recibo do impOsto de
indústrias e profissões; p) assinar as cópias dos contratos e entregá-las aos operadores, para serem por êstes
visadas, no prazo de vinte e quatro horas, improrrogável”.

Os assuntos principais já foram versados a propósito dos corretores oficiais de valOres e não há razão para
repetir o que se disse.
Os livros referidos no art. 32, 1), do Decreto n. 20.881, são o caderno manual ou copiador e o protocolo. A
respeito do protocolo, diz o art. 34: “No protocolo serão transcritos, diàriamente, os assentamentos do caderno
manual, por cópia literal, por extenso e sem emendas, rasuras, entrelinhas e abreviaturas, guardada a mesma
numeração”.
Estabelece o art. 35 do Decreto n. 20.881: “‘Os livros dos corretores que se acharem escriturados na forma do
art. 52 do Código Comercial, sem vicio nem defeito, terão fé pública”. E o art. 36: “Não farão prova em favor
do corretor: a) os livros que não forem escriturados em português; b) os que não se acharem revestidos das
formalidades legais; c) os que não estiverem escriturados regularmente”,
A propósito da exibição de livros, estatui, de acOrdo com os princípios, o Decreto n. 20.881, art. 38: “A
exibição dos livros dos corretores será feita sob as penas dos arts. 19 e 20 do Código Comercial: a) por
determinação judicial; 6) por ordem da Junta dos Corretores, no caso de exame gera? dos livros ou do síndico,
se se tratar de exame parcial”. E o § 1.0: “O exame geral será ordenado nos casos expressos no Código
Comercial e sempre que a Junta dos Corretores o julgar necessário para apurar fatos que constituam o corretor
em responsabilidade”. Acrescenta o § 2.0: “O exame parcial será ordenado sempre que se originarem dúvidas

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ou se ventilarem questões sObre operações em que um mesmo corretor tenha intervindo”. E o § 39: “Nos
exames feitos nos livros dos corretores, quer por ordem da Junta dos Corretores, quer pela do síndico, será
guardado sigilo sObre os nomes dos comitentes de tOdas as operações nêles consignadas”.

4. CERTIDõES. Diz o art. 37 do Decreto n. 20.881:


“O corretor só pode dar certidão de contratos cingindo-se ao que constar do seu protocolo e diante da
autorização escrita do síndico, Só terão fOrça de instrumento público, para prova dos contratos, as certidões que
forem subscritas pelo corretor e fizerem referência às fOlhas em que se acharem escriturados os assentos
respectivos, salvo quando a escritura pública fOr da substância do contrato”. Acrescenta o § 1.0: ~ vedado aos
corretores fornecer certidões de contratos a terceiros, sem consentimento expresso e escrito das partes
contratantes”. E o § 2.0: “As certidões de cotações só poderão ser passadas pela Secretaria da Junta dos
Corretores”

5.PROiBIÇÕES AOS CORRETORES DE MERCADORIAS. Lê-se no Decreto n. 20.881, art. 39: ‘t proibido
aos corretores de mercadorias: a) formar entre si associações particulares para operações de sua profissão; 6)
constituir sociedade de qualquer denominação ou classe que seja, não se entendendo nesta proibição a simples
subscrição ou aquisição de ações de sociedades anônimas ou em comandita por ações; c) adquirir, para si ou
pessoa de sua família, mercadoria de cuja venda tiverem sido incumbidos, e vender o que lhes pertencer,
quando tenham ordem de comprar ou vender mercadorias da mesma espécie; d) exercer cargos de
administração ou de fiscalização de sociedades anônimas ou outras de qualquer denominação, cujos fins e
objetivos se relacionem com as operações sObre mercadorias negociáveis em Bolsa; e) assinar contratos de
operações não efetuadas por seu intermédio ou de seu preposto e aquêles que, por sua natureza, não devam ser
realizados por falta de conhecimento da idoneidade dos contratantes; >9 efetuar, em seu nome, operações de
compra e venda de mercadorias para revender; g) assinar contratos em que não haja declaração dos nomes dos
seus comitentes; Ii) comerciar por conta própria; i) exercer qualquer outro ofício ou função pública, sob pena de
perda do cargo”.

6.CARGOS DE CORRETOR E DE PREPOSTOS. Diz o Decreto n. 20.881, art. 41: “O cargo do corretor é
pessoal, podendo, entretanto, o corretor ter um preposto, por êle designado com aprovação da Junta dos
Corretores”. E o § 19: “O preposto deve reunir os requisitos exigidos para o ofício de corretor”. E o § 2.0: “O
preposto é considerado mandatário legal do corretor, com quem servir”. Ainda o § 8.0: “No caso de falecimento
do corretor que esteja sendo substituído em suas funções por seu preposto, terá êste preferência para
preenchimento do cargo vago”.

Acrescenta o art. 42 do Decreto n. 20.881: “Os têrmos de aprovação das nomeações dos prepostos de corretor
serão lanlançados em livro especial da Junta dos Corretores, que fará afixar, em quadros próprios, na sua
Secretaria e nos salões da BOlsa, os nomes dos prepostos em exercício, com a indicação dos nomes dos
corretores com os quais servirem”. Acrescenta o parágrafo único: “Quando o preposto fOr dispensado será o
seu nome eliminado do registo e dos quadros, diante da comunicação que fizer à Junta o corretor com quem
servir
No art. 43 do Decreto n. 20.881 estabelece-se: “Os prepostos de corretor estão sujeitos à ação disciplinar da
Junta dos Corretores, que os poderá suspender ou destruir”. Ainda o art. 44: “Os atos de nomeação, suspensão,
renúncia e destituíção dos prepostos de corretor serão conhecidos por afixação em quadros no salão da BOlsa e
na Secretaria da Junta, durante oito dias”. Quanto às substituições, diz o art. 45: “No caso de qualquer
impedimento do corretor, o seu preposto o substituirá no exercício de suas funções”.

7.RESPONSABILIDADE CIVIL E CRIMINAL. A responsabilidade é solidária (Decreto n. 20.881, art. 46) :


“Os corretores respondem, solidàriamente, pelos atos de seus prepostos, sendo vedado a êstes, sob pena de
nulidade, fazer operações por conta própria”.
Explicita o art. 47: “A responsabilidade civil dos corretores, que se liquida por perdas e danos, é a que resulta
das seguintes irregularidades: a) deixar, por culpa sua, de executar as ordens aceitas dos comitentes; lO deixar
de registar, nas Caixas de Liquidação, dentro do prazo de 48 horas, ou, quando não tenha sido satisfeita essa
exigência, logo após a intimação da Junta dos Corretores, os contratos em que fOr estipulada a formalidade do
registo; e) deixar de entregar aos seus comitentes, no prazo de 24 horas, os contratos devidamente visados, a

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fim de ser pago o respectivo impOsto, quando não houver sido convencionado o registo nas Caixas de
Liquidação; d) realizar, com intuito de obter bens para seus comitentes ou proventos para si próprio, operações
ou negócios de má fé com firmas ou pessoas cujo estado de falência fOr notório;
e) escriturar irregularmente os seus livros na parte relativa às operações, para fraudar os seus comitentes”.
Acrestenta o § 1.0: “A falta do “visto” dos contratantes compradores e vendedores nas cópias dos
assentamentos, relativos às operações a prazo, torna pessoalmente responsáveis, para todos os efeitos, os
corretores que intervierem na eperação”. E o § 22: “O corretor poderá recusar a execução das ordens das
pessoas que se negarem a dar prova quer da sua idoneidade, quer da sua identidade”.
Quanto às penas disciplinares, diz o art. 48: “Os corretores de mercadorias, além das penas em que possam
incorrer, de acOrdo com as disposições do Código Penal, repressivas dos crimes de função, são passíveis das
penas disciplinares de advertência, multa, suspensão e destituição”.

§ 4.751. Penalidades

1.PENAS E ESPÉCIES. No tocante à pena de adverérteia, lê-se no art. 49 do Decreto n. 20.881: “Será
aplicável a pena de advertência: a) ao corretor que faltar com a devida conside:açâo para com qualquer dos
membros da Junta dos Coretores, quando no exercício de suas funções; b) ao corretor que recusar as
informações que lhe sejam requisitadas pela Junta dos Corretores ou pelo síndico; e) ao corretor que deixar de
comparecer, sem causa justificada, a três reUniões consecutivas da Junta dos Corretores”. Os arts. 50 e 51 falam
das multas e das penas de suspensão. O art. 52 estabelece quanto à destituição: “Incorrerá na pena de
destituição do cargo:
a)o corretor que deixar de prestar nova fiança, dentro de sessenta dias, contados da data da intimação que o
síndico lhe fizer, em consequência do pedido formulado pelo fiador para cancelamento da fiança prestada; b) o
corretor que reincidir:
1.0,na prática de operações comerciais de compra e venda em seu nome para negociar; 2.0, na falta de
declaração do nome de seus comitentes nos contratos que assinar; o) o corretor que se ausentar sem licença; á)
o corretor que sofrer condenação por crime infamante; e) o corretor que sofrer por três vezes a pena de
suspensão”.

Lê-se no art. 53: “As penas disciplinares de advertência, -multa e suspensão até três meses, por infração do
disposto neste regulamento e na legislação em vigor, no que fOr aplicável, serão impostos pela Junta dos
Corretores”. E no art. 54:
“A pena de suspensão por mais de três meses será imposta pelo Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio,
diante de representação da Junta dos Corretores, feita por intermédio do Departamento Nacional do Comércio”.

2.PROCEDIMENTO Estabelece o art. 55 do Decreto n.20.SSi: “A Junta dos Corretores, quer para imposição
das penas de sua competência, quer para requisição das que cabem ao Ministro do Trabalho, Indústria e
Comércio, procederá ex officio ou mediante queixa”. E o § 1.0: “A queixa só poderá ser recebida quando estiver
devidamente documentada”. E o § 2.0: “Poderá constituir documento instrutivo da queixa a justificação
produzida perante a autoridade judiciária do domicílio do corretor, com citação dêste”. E o § 8.0:
“Antes de qualquer deliberação sObre aplicação de pena, dex era a Junta convidar o corretor indiciado a
apresentar sua defesa escrita, no prazo de cinco dias, prorrogável por mais dois por justo motivo, fornecendolhe
cópia da queixa e dos. documentos que a instruírem”. E o § 4Y: “Decorrido o prazo do parágrafo anterior sem
que o indiciado haja apresentado defesa, e lavrado têrmo desta ocorrência, passará a Junta a deliberar a sua
revelia”. E o § 5.0: “A defesa do corretor, com os documentos que a instruírem, será junta ao processo”. E o §
6.~: “As deliberações da Junta sObre imposição de penas serão sempre motivadas”.
Lê-se no art. 56 do Decreto n. 20.881: “A exposição que a Junta dos Corretores resolver apresentar ao Ministro
do Trabalho, Industria e Comércio para a imposição de pena da competência dêste será acompanhada de todos
os documentos de acusação e da defesa, ficando, porém, cópia de tudo na Secretaria da Junta”. Acrescenta o
parágrafo único: “O corretor acusado poderá apresentar, antes da remessa ao Ministro, ou, depois dela
diretamente a êste, novas alegações escritas em sua defesa”.
Diz o art. 57 do Decreto n. 20.881: “Das deliberações da Junta, que impuserem penas, caberá recurso voluntário
para o Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio com efeito suspensivo”. E o § 1.0: “O recurso deverá ser
interposto dentro de cinco dias, a contar da data da notificação da pena”. E o § 2.0: “Apresentadas pelo corretor

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as suas alegações escritas, a Junta tomará conhecimento delas na reUnião especialmente convocada”. E o § 8.0:
“Sendo procedentes as alegações do corretor, poderá a Junta reformar a sua deliberação”. E o § 4.0: “Se a Junta
mantiver a sua deliberação anterior ou se o corretor deixar de recorrer dentro do prazo estabelecido no § lA,
será o processo remetido em original ao Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, observada a providência
da última parte do art. 56”.
Acrescenta o art. 58 do Decreto n. 20.881: “Além do caso enumerado no artigo precedente, ainda caberá
recurso voluntário das deliberações da Junta: a) que julgar improcedente a queixa contra o corretor; b) que
reformar a deliberação tomada anteriormente, para declarar improcedente a queixa que lhe dera causa; o) que
recusar representar ao Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio sObre a imposição de penas da competência
dêste”. E o parágrafo único: “O recurso permitido neste artigo será interposto no prazo de cinco dias contados
da data da publicação do ato da Junta no Diário Oficial, e processado na conformidade do artigo anterior”.
Lê-se no art. 59 do Decreto n. 20.881: “A desistência da queixa, tomada por têrmo na Secretaria da Junta,
importará no cancelamento do processo em qualquer tempo, contanto que a imposição da pena não tenha ainda
passado em julgado”. E o art. 60: “Passada em julgado a pena imposta ao corretor, os seus efeitos correrão
desde a data da notificação que o síndico lhe fizer”. E o art. 61: “O produto das multas pagas diretamente pelo
corretor será recolhido ao Tesouro Nacional, mediante uma guia expedida pelo sindico”.

§ 4.752. Assembléias gerais

1.FUNÇÃO DAS ASSEMBLÉIAS. As assembléias gerais de corretores são comuns, em seus princípios gerais,
a todos os corretores. Corretores de valOres, corretores de mercadorias,e corretores de navios reUnem-se em
assembléias, ordinárias ou extraordinárias.

2.COMPETÊNCIA DAS ASSEMBLÉIAS. No Decreto n. 20.881, de 30 de dezembro de 1931, art. 7~O, e),
fala-se da aprovação, pela assembléia geral dos corretores de mercadorias, especialmen{e convocada, para
adoção oficial de praxes e usos comerciais’. No art. 62, diz-se: “As assembléias gerais dos corretores de
mercadorias, quer para o fim previsto no art. 7~0, letra e, quer para tratar de interesses gerais da classe, serão
realizadas por convocação feita em virtude de deliberação da Junta e ato do síndico, ou a requerimento de um
têrço, no mínimo, dos corretores em exercício, e em cada uma delas só se poderá tratar dos assuntos constantes
do edital de convocação, publicado no Diário Oficial por três dias consecutivos e, durante esse mesmo tempo,
afixado na Secretaria da Junta”. E no art. 63: “A assembléia geral só poderá funcionar, em primeira convocação,
com o comparecimento de mais de dois terços dos corretores de mercadorias em exercício, e a sua presidência
será sempre exercida pelo síndico da Junta dos Corretores, assistido do adjunto-secretário e de um corretor
escolhido por aquêle”. E o § 19: “Não se verificando número legal no dia designado, o síndico convocará,
dentro do prazo de três dias, nova reUnião para se realizar a assembléia geral com a presença dc qualquer
número de corretores em exercício”. E o § 29: “Os corretores de mercadorias só depois de empossacies em seus
cargos poderão tomar parte nas assembléias gerais”. Estabelece o art. 64 do Decreto n. 20.881: “O preposto que
estiver substituindo o corretor licenciado pode assistir à assembléia geral dos corretores, discutir os assuntos
ventilados, propor medidas e votar, mas não poderá ser votado para onalquer comissão”.
Diz o art. 65 do Decreto n. 20.881: “As atas das assembléias gerais dos corretores serão lavradas em livro
especial e asMnadas por todos os corretores presentes, e conterao a indicacão dos nomes dos que tiverem
deixado de comparecer com ou sem causa, devendo delas o síndico remeter cópias autênticas ao Departamento
Nacional do Comércio, para os fins convenientes ou aprovação, quando necessária~~.
3.PRIVATIVIDADE. As funções privativas dos corretores oficiais de mercadorias não podem ser exercidas
por pessoas qu4e não o forem, de modo que se tem de apurar se são privativas, isto é, sOmente pode haver
corretagem se oficial. Outra que são é a de só se permitirem os negócios jurídicos se por meio de corretagem. A
respeito cumpre reler-se o que escrevem quando tratamos dos corretores de fundos públicos, ou, melhor,
corretores de valOres. O art. ‘70 do Decreto n. 20.881 sOmente concerne à vedacão da corretagem não-oficial
se a lei só admitir-se a corretagem oficial. Nada tem com a limitação à liberdade de negociar diretamente. Diz o
art. 70: “As pessoas que, sem ~ necessária investidura exercitarem funções inerentes ao carg 0 de corretor de
mercadorias, incorrerão nas penas do art. 224 do Código Penal (ab-rogado)” (leia-se, hoje, art. 328 do Código
Penal). “Nessa hipótese”, acrescenta o art. 70, parágrafo Unico do Decreto n. 20.881, “o Síndico da Junta dos
Corretores remeterá ao Procurador Criminal da República os documento5 que possam instruir o processo para a
aplicação da pena respectiva no juízo competente”.

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§ 4.753. Corretores de navios

1.PRELIMINARES. A propósito dos corretores de navios, o mesmo, mutatis mutandis, que a respeito dos
corretores de valOres e dos corretores de mercadorias. Mais, em relação aos corretores de mercadorias. Não há,
porém, a BOlsa navios, nem a Câmara Sindical, nem corretores que não sejam os corretores oficiais, em
contacto direto com oMinistério da Fazenda ou outra autoridade que se haja de ter como a competente para os
nomear. Lê-se no art. 19 do Decreton. 19.009, de 27 de novembro de 1929: “Os cargos de corretores de navios
no Distrito Federal sOmente poderão ser exercidos por pessoas legalmente habilitadas, em número limitado,
que não excederá de 30, podendo, entretanto, ser aumentado 0u reduzido mediante proposta do Ministro da
Fazenda, ouvid0 prêviamente o inspetor da Alfândega do Rio de Janeiro, conforme esta alteração se tornar
conveniente aos interesses do comércio marítimo”. E o art. 29: “Êsses corretores, que ficam sob a jurisdição do
Ministério da Fazenda,por intermédio da Alfândega do Rio de Janeiro, serão nomeados e demitidos pelo
Presidente da República”.

2.NOMEAÇÃO. Diz o art. 82 do Decreto n. 19.009:


“Para nomeação de corretor de navio é necessário requerimento do candidato à autoridade competente,
instruído com os seguintes documentos: 1.0. prova de qualidade de cidadão brasileiro nato e de maioridade; 29,
certidão dos cartórios da Justiça Federal de se não achar criminalmente condenado, nem processado; 39,
atestado da Junta Comercial de não ser falido, não reabilitado; 49, prova de residência por mais de um ano no
Distrito Federal; 59, atestado de prática do serviço pelo tempo mínimo de dois anos, no escritório de corretor;
6.0, caderneta de reservista do Exército ou da Marinha, ou certidão do alistamento militar; 7.o, certificado dos
exames teórico e prático das línguas portuguêsa, francesa e inglêsa, prestados em algum estabelecimento
oficial, ou fiscalizado pelo govêrno e de legislação aduaneira, prestado especialmente na Alfândega do Rio de
Janeiro, perante mesa examinadora, constituída de três funcionários, designados pelo respectivo inspetor”. E o
art. 49: “Nomeado, o corretor não poderá entrar em exercicio sem satisfazer, prêviamente, às seguintes
exigências:
1a, prestar caução ou fiança, no prazo de 30 dias, da expedição de guia pelo Ministério da Fazenda; 2.~, assinar
o competente têrmo de compromisso; 89-, registar o título de nomeação na Alfândega do Rio de Janeiro; 49-,
legalizar os livros relativos ao exercício do ofício; 59-, inscrever-Se nas repartições competentes, dentro do
mesmo prazo, para o pagamento de impostos de indústrias e profissões e de renda”.

3.CAUÇÃO. Estabelece-se o art. 59 do Decreton.19.009: “A fiança ou caução dos corretores de navios é de


dez mil cruzeiros e deve ser prestada no Tesouro Nacional em dinheiro ou em títulos da Dívida Pública da
União recebidos pelo seu valor nominal provada a emissão e livres de quais quer Onus”. Acrescenta o parágrafo
único: “No caso de falecimento, desistência ou falência do fiador, a Inspetoria da Alfândega do Rio de Janeiro
intimará o corretor a prestar nova caução ou fiança dentro de 80 dias, sob pena de suspensão e de demissão, no
caso de ser exercido o dObro do prazo marcado”. E o art. 6.0: “A caução ou fiança do corretor responderá, em
caso de falta de pagamento no tempo devido:
19, pelas multas em que incorrer; 2.0, pelo cumprimento das obrigações assumidas no desempenho de suas
funções; 8.0, pela indenização a que fOr obrigado; 49, pelo pagamento dos impostos federais”. E o art. 79:
“Poderá o fiador, ou o afiançado, em qualquer tempo, pedir o cancelamento da fiança prestada, que será
substituida por outra no prazo de 30 dias, a qual so poderá ser levantada seis meses depois do mesmo
cancelamento”. E o art. 8.0: “Ocorrendo falecimento, renúncia ou destituição do corretor de navios, a Inspetoria
da Alfândega do Rio de Janeiro mandará publicar editais para conhecimento dos interessados, somente podendo
a caução ou fiança ser levantada, como no artigo anterior, no prazo mínimo de seis meses, se não houver
reclamações ou dúvidas sObre a liquidação”.

4.DESTITUIÇÃO. Fala-se no art. 99 do Decreto n. 19.009: “Os corretores de navios só poderão ser destituídos
de suas funções, mediante processo administrativo, por falta grave ou delito, previstos na legislação em vigor”.
E o art. 10:
“Nenhum corretor poderá afastar-se, por qualquer motivo, do exercício do seu cargo, por mais de um mês, sem
prévia participação à Inspetoria da Alfândega, sendo substituído pelo seu preposto, regularmente constituído, o
qual substituirá também no caso de falecimento, com preferência à nomeação para a vaga

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5.PREPOSTO. Estabelece o art. 11: do Decreto n. 19.009: “O lugar de preposto será de nomeação do Inspetor
da Alfândega mediante indicação do corretor instruída com documentos exigidos no art. 39”. Acrescenta o
parágrafo único: “Os prepostos, nomeados por lei anterior, serão dispensados das exigências do presente
artigo”. E o art. 12: “Os prepostos podem ser livremente dispensados pelos corretores, com a aprovação do
Inspetor da Alfândega, observadas as formalidades legais e publicados os competentes editais para
conhecimento dos interessados”. E o art. 18: “Os corretores respondem pelos seus prepostos, sendo vedado a
êstes, sob pena de responsabilidade, fazer operações por vontade própria”.

6. ATRIBUIÇÕES nos CORRETORES DE NAVIOS E PROIBIÇõES .


Lê-se no art. 14 do Decreto n. 19.009: “~ da competência dos corretores de navios: 1.0, intervir nos
fretamentos, respectivas cotações e engajamento de cargas; 29, agenciar seguros marítimos; 39, traduzir os
manifestos e outros documentos que lhes são relativos, como listas de sobressalentes, certidões consulares e
outros; 49, agenciar negócios concernentes a entradas, desembaraço e saídas das embarcações nas repartições
competentes. com livre entrada nos seus armazéns, depósitos e mais dependências; 59, fazer as diligências para
instruir a arqueação de vapores ou de navios; 69, desempenhar finalmente os trabalhos de que forem
encarregados; 79, dar certidões de contratos e atestados relativos aos negócios do seu ofício, quando requeridos
pelas partes diretamente interessadas ou requisitados por autoridade competente; guardar sigilo dos nomes dos
comi-tentes, só podendo mencioná-los com autorização dêstes, por escrito, no caso de exigir a natureza da
negociação, ou diante de requisição da autoridade competente; 99, assegurar-se da identidade e idoneidade das
pessoas ou sociedades de cujas negociações forem encarregados; 10, fazer tOdas as diligências necessárias para
o pagamento dos impostos e taxas devidos nas operações de que participar e especialmente remeter à autoridade
fiscal competente uma terceira via dos contratos de fretamento e engajamento de carga, a fim de serem
confrontados com os respectivos manifestos de saídas enviados à Alfândega pelas companhias e agências de
vapOres”. No parágrafo uníco:
“O contrato de engajamento de carga poderá ser retificado pelo corretor de acOrdo com os embarques
efetivamente realizados”. Diz, por sua vez, o art. 15: “~ proibido aos corretores de navios: 1.0, ter parte ou
quinhão em navios ou em sua carga; 2.0, contrair sociedade comercial de qualquer denominação ou classe, não
se entendendo nesta proibição a simples subscrição ou aquisição de ações de sociedades anônimas ou em
comandita por ações; , exercer cargos de administração ou de fiscalização de sociedades anônimas ou em
comandita por ações; , exercer cargos de administração ou de fiscalização de sociedades anônimas ou em
comandita por ações; 49, ser fiador em contrato ou negociação feita por seu intermédio; 59, exercer outro
qualquer ofício ou função pública, remunerada; 6.0, intervir em negociações entabuladas por outro corretor”.

7. LIVROS DOS CORRETORES DE NAVIOS. Diz o art. 16 do Decreto n. 19.009: “O corretor de navio terá
os livros necessários para a escrituração de todos os atos da sua profissão, devidamente legalizados, nos quais
se fará o lançamento das transações que realizar, declarando, nos negócios de seguro, o nome do segurador e do
segurando, o objeto do seguro, seu valor real, lugar da carga e da descarga, a denominação, nacionalidade e
matrícula do navio e seu pOrto e, finalmente, o nome do capitão ou mestre”. Acrescenta o parágrafo único: “As
cópias dêsses assentamentos, assinados pelo corretor ou pelo seu preposto, serão entregues, dentro de 24 horas,
a cada um dos contratantes ou embarcador e ao proprietário do navio ou vapor, cessando, desde então, a
responsabilidade do corretor para a execução do contrato”. Estabelece o art. 17: “Os livros dos corretores,
regularmente escriturados em português, sem vício ou defeito, terão fé pública, e as certidões que dêles se
extrairem terão fOrça de instrumento público para prova de contratos, nos casos em que se não exigir a
escritura pública ou outro gênero de prova especial”. Lê-se no art. 18: “O exame geral ou parcial dos livros dos
corretores, legal ou administrativamente, será feito quando fOr necessário para apurar fatos que constituam o
corretor em responsabilidade”. E no art. 19: “Êsses livros, em caso de vaga do corretor, serão arrecadados por
ordem da Inspetoria da Alfândega, em presença, pelo menos, de duas testemunhas e encerrados, lavrando-se de
tudo um têrmo que será assinado pelos arrecadadores, pelos interessados, se comparecerem, e pelas
testemunhas”. Acrescenta o parágrafo único: “Recolhidos à Alfândega, os livros serão examinados e
arquivados, dando-se imediato conhecimento ao Ministro da Fazenda de todo o ocorrido”.

8. RESPONSABILIDADE CIVIL. Estatui o Decreto n. 19.009, art. 21: “A responsabilidade civil dos

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corretores de navios resolve-se pela prestação de perdas e danos resultantes: 1.0, da falta de execução de ordem
aceita do comitente; 29, de haver o corretor, em proveito próprio, ou do seu comitente, realizado operações ou
negociado de má fé, com pessoa cujo estado de falência fOr notório; 39, de irregularidade de escrituração dos
seus livros, no que disser respeito à parte interessada nas operações; 49, de falta de entrega aos respectivos
contratantes da cópia fiel do assento das operações realizadas; 59, de êrro ou falsidade na tradução de manifesto
e documentos que lhes dizem respeito”.

9. PENAS DISCIPLINAS E EMOLUMENTOS. Das penas disciplinares cogita o Decreto n. 19.009, nos arts.
22-83. Dos emolumentos, os arts. 84-39.
As pessoas que exercerem ilegalmente as funções de corretor de navios incorrem nas penas do art. 328 do
Código Penal (Decreto n. 19.009, art. 38). Diz-se no art. 88, parágrafo único:
“Em tais casos, a Inspetoria da Alfândega remeterá à Procuradoria Seccional da República os instrumentos que
possam instruir o competente processo criminal”.

10.NOTA FINAL. No Título XXXV sObre corretagem, sOmente cogitamos dos corretores e do contrato de
corretagem, nas operações dos corretores, na BOlsa e fora da BOlsa. Tal assunto será versado no tomo dedicado
aos negócios jurídicos bancários e bolsísticos.
Alguns artigos do Código Comercial estão obsoletos~ como os arts. 65-67. Outras regras jurídicas são
implícitas, como o art. 29 do Decreto n. 20.881, que diz ser o cargo de síndico incompatível com o exercício de
corretagem.

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