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US
TITULARI
ITULARIDADE DE DIREITOS IMOBILIÁRIOS POR ENTES
DOS: PARADOXO NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO
DESPERSONALIZADOS
ESPERSONALIZAD
ESPERSONALIZA
ESPERSONALIZADOS
O
TITULARITY
ULARI Y OF REAL ESTATE RIGHTS BY DESPERSONALIZED:
PARADOX IN THE LEGAL BRAZILIAN SYSTEM
EX
RESUMO: Sistemas jurídicos são sistemas lógicos ABSTRACT: Legal systems are logical systems that
O
que objetivam manter a ordem social por meio aim to maintain social order through the esta-
do estabelecimento de normas que regulam as blishment of norms that regulate relationships
relações jurídicas e os fatos da vida. A atividade and facts of life. The notarial
notarial activity,, as a public
TJ
notarial, que é prestação de serviço público, de- service, must be able to respond to the challen-
ve estar apta a responder aos desafios de uma ges of a complex society, allowing political, social
sociedade complexa, permitindo o desenvol- and economic development, by providing choices
vimento político, social e econômico por meio end stabilizing expectations,, acting as a promo
promo-
DF
da viabilização de escolhas e da estabilização ter of legally assured rights. The theme discusdiscus-
de expectativas, atuando como promotora dos sed in this article is based on an everyday fact
direitos legalmente assegurados. O tema dis- in the Real Estate Registry Offices of the whole
cutido no presente artigo baseia-se num fato country: the impossibility of registration without
cotidiano nos Cartórios de Registros de Imóveis a unanimous decision of the condominial As- As-
T
de todo o país: a impossibilidade de registro sem sembly,, of the acquisition of condominial units
decisão unânime da Assembleia condominial, da adjudicated in auction by the condominium, in
aquisição de unidade condominial adjudicada case of lack of payment of construction price
em leilão pelo condomínio edilício, no caso de installments by such units (hypothesis of § 3º of
falta de pagamento das prestações do preço da article 63 of Law 4,591/64). This article presents
construção (hipótese do § 3º do artigo 63 da Lei a study about depersonalized entities (such as
4.591/64). O presente artigo apresenta um estu- the condominium) in Brazilian law, considering
do sobre os entes despersonalizados (entre eles o the practical difficulties related to the exercise
condomínio) no direito brasileiro, considerando of property rights by these entities, despite the
as dificuldades práticas relativas ao exercício do legal provisions that guarantee such rights.
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direito de propriedade por esses entes,, a despeito
do reconhecimento pelo ordenamento jurídico
de sua capacidade para titularizar direitos.
PALAVRAS-CHAVE: Entes despersonalizados – Con
Con- KEYWORDS: Despersonalized Entities – Condomi-
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domínio edilício – Unidade adjudicada em leilão – nium – Units adjudicated in auction – Authoriza-
Desnecessidade de autorização pela Assembleia. tion by the Assembly.
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SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Sujeito de direitos e pessoa jurídica: a necessária distinção.
3. Entes despersonalizados e capacidade jurídica. 3.1. A capacidade processual dos entes
despersonalizados e a sua implícita previsão legal. 4. O condomínio edilício e a adjudicação
de bens. 5. Considerações finais acerca dos entes despersonalizados e titularidade de direi
direi-
tos: paradoxo no ordenamento. 6. Referências.
CL
1. INTRODUÇÃO
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sária coerência interna. Sistemas jurídicos são sistemas lógicos que têm por
função procurar diminuir o arbitrário, as desordens sociais que possam decordecor-
rer da diferença de interesses entre os indivíduos.
TJ
que delas se faz e a apreensão dos conceitos jurídicos que norteiam todo o
ordenamento também são relevantes quando da regulação de situações fáticas.
Os sujeitos de direito, ou sujeitos de relações jurídicas, são os entes titula
titula-
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natureza jurídica.
No caso do condomínio edilício, argumenta-se que, por se tratar de bem de
propriedade conjunta de todos os condôminos, arrematado como pagamento
de dívida, não podem ser constrangidos a adquirir coisa imóvel, já que a pro- pro
IV
priedade é fonte também de deveres e obrigações, razão pela qual – para parte
majoritária da doutrina – exige-se a decisão da Assembleia sobre a adjudicação.
Assim, na ausência de uma regulamentação completa a esse respeito, ficam
O
1. Sílvio Rodrigues, Orlando Gomes, Caio Mário da Silva Pereira, Washington de Barros
Monteiro, Maria Helena Diniz, Sílvio de Salvo Venosa, Carlos Roberto Gonçalves,
Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho, entre outros.
2. SILVA, Claudio Henrique Ribeiro da. Apontamentos para uma teoria dos entes des-
personalizados. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 809, 20.09.2005. Disponí-
vel em: [https://jus.com.br/artigos/7312]. Acesso em: 24.07.2016.
uma teoria dos entes despersonalizados ou a autoriza, desde que, em tal teo- teo
ria, os entes despersonalizados não sejam alçados à qualidade de sujeitos de
direito”7.
DF
3. MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. Parte Geral. São Paulo:
Saraiva, 2003. v. I. p. 62.
T
4. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Parte Geral. São Paulo: Atlas, 2003. v. I.
p. 147.
5. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil.
Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 88.
6. MELO, Marcos Bernardes. Teoria do fato Jurídico. Plano da Eficácia. 1ª parte. 2. ed.
rev. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 125-126.
7. SILVA, obra citada.
Essas, a nosso ver, são hipóteses estéreis já que não encaminham a qualquer
solução o problema existente quanto à titularidade e exercício de direitos dos
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entes despersonalizados, especialmente dos dir direitos imobiliários.
Muito embora a concepção de sujeito de direito como pessoa tenha prevaleprevale-
cido na doutrina civilista durante bastante tempo, há corrente doutrinária a ela
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contrária, e não se trata propriamente de uma nova corrente: retomando a con con-
cepção de sujeito de Direito apresentada por Pontes de Miranda, Simone Eberle
informa que ser sujeito de direito não é atribuição apenas a quem é titular de
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direito, mas também a quem o seja de dever ou de qualquer situação jurídica8.
observa que só se deve tratar das pessoas depois de tra-
Pontes de Miranda observa
tar dos sujeitos de direito,
eito, ser pessoa é a possibilidade de ser sujeito de direito,
ter personalidade é a possibilidade de se encaixar em suportes fáticos, que,
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que somente se deveria falar desse após aquele10. Essa concepção, também,
remonta ao entendimento de Pontes de Miranda, para quem:
Ser pessoa é fato jurídico: com o nascimento com vida, o ser humano en- en
IV
8. EBERLE, Simone. A capacidade entre o fato e o direito.. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris,
T
2006. p. 56. A autora defende que ser sujeito de direito, em verdade, é figurar ativamente
na relação jurídica fundamental ou nas relações jurídicas que são efeitos ulteriores.
9. MIRANDA, Pontes de. Manual de Direito Constitucional. Coimbra: Coimbra, 1983.
t. 1. p. 129.
10. MELO, obra citada, p. 125.
11. MIRANDA, obra citada, p. 153.
12. MIRANDA, obra citada, p. 127.
3. ENTES DESPERSONALIZADOS
DOS E CAPACIDADE
C
CAPAC
CA JURÍDICA
Entes despersonalizados ou pessoas
pessoas formais são coletividades de seres hu hu-
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manos ou de bens que, conforme a doutrina majoritária, não possuem perso perso-
nalidade jurídica própria, porque não há a intenção de estar junto com objetivo
comum (affectio societatis), sendo que o seu objetivo seria atender, meramente,
às necessidades internas de organização dos seus integrantes (como o condo condo-
IV
mínio, o espólio, a massa falida, a herança jacente, por exemplo), fato altamen
altamen-
te controverso se consideradas as complexas relações jurídicas que tais entes
travam com terceiros, como se verá.
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A ordem jurídica dotou os sujeitos não apenas de personalidade mas tam tam-
bém de capacidade jurídica, que é a capacidade para a aquisição de direitos e
para o seu exercício. Jorge Miranda explicita que a capacidade de direito é a
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trabalhar
abalhar melhor a ideia dos entes despersonalizados, já que eles, embora não
tenham personalidade (como o próprio nome esclarece), possuem capacidade
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jurídica.
Simone Eberle16 elucida que, onde houver personalidade jurídica, necessa
necessa-
riamente haverá capacidade jurídica, mas o inverso, contudo, não é verdadei-
verdadei
O
ro: é possível haver capacidade, sem haver a personalidade jurídica. Os entes
despersonalizados, mesmo não registrados, possuem condições de estabelecer
relações jurídicas com quaisquer pessoas ou entes e, apesar de não configu-
configu
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rarem, sob um aspecto normativo-dogmático, pessoas de direito, são consi-
derados sujeitos de direito.
eito. Os entes não personificados detêm direitos que
são atribuídos pelo ordenamento jurídico, a fim de poder ingressar em juízo,
através da presentação ou representação de outras pessoas, mas ingressam em
CL
procuradores;
procurador
ocuradores;
II – o Estado e o Distrito Federal, por seus procuradores;
III – o Município, por seu prefeito ou procurador;
ocurador;
IV – a autarquia e a fundação de direito público, por quem a lei do ente federado
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designar;
V – a massa falida, pelo administrador judicial;
VI – a herança jacente ou vacante, por seu curador;
VII – o espólio, pelo inventariante;
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VIII – a pessoa jurídica, por quem os respectivos atos constitutivos designarem ou,
não havendo essa designação, por seus diretores;
IX – a sociedade e a associação irregulares e outros entes organizados sem personali
personali-
dade jurídica, pela pessoa a quem couber a administração de seus bens;
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co Filho define a capacidade de ser parte como a aptidão para figurar no polo,
ativo ou passivo, de uma relação jurídica de direito material, ou ter direitos.
Essa exigência refere-se à chamada capacidade de direito, isto é, a condição de
ser pessoa natural ou jurídica, porque
que toda pessoa é capaz de direitos. É capaz
que
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para as pessoas físicas, pessoas jurídicas, pessoas formais e para a maioria dos
tigo 75 do Código de Processo
entes despersonalizados (artigo ocesso Civil).
Civ
Cândido Rangel Dinamarco, considera que “capacidade de ser parte é a
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qualidade atribuída a todos os entes que possam tornar-se titulares das situasitua-
ções jurídicas integradas na relação jurídica” e afirma que:
A lei do processo vai além e confere mera personalidade processual a alguns
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outros entes que, sem serem pessoas físicas ou jurídicas em sentido integral,
são admitidas no processo como partes (...). O que há em comum entre as
T
19. Enunciado 58: “A sociedade em comum compreende as figuras doutrinárias da socie socie-
dade de fato e da irregular”. CFJ. Enunciado 58 da I Jornada de Direito Civil.. Disponí-
Disponí
vel em: [www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/763]. Acesso em: 18.07.2016.
20. GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2008.
v. I. p. 103.
21. NEVES, Daniel Amorim de Assunção. Manual de Direito Processual Civil. 2. ed.
rev. atual. e ampl. São Paulo: Método, 2010. p. 53.
tratar
nou acima, mas especialmente trataremos do condomínio edilício.
com prévia autorização da assembleia geral, que é seu órgão deliberativo, atua
na vida jurídica, podendo contratar serviços, celebrar contratos, contratar fun
fun-
cionários, não se confundindo com a pessoa dos condôminos. Essa equipa equipa-
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ração, contudo, não faz dos condôminos sócios, porque que o que existe é uma
propriedade especial, em que a propriedade é o fundamental e a copropriedade
meramente instrumental24.
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22. DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. São Paulo:
Malheiros, 2009. v. II. p. 287.
23. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Teoria Geral do
Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento. São Paulo: Forense, 2014.
24. VIANA, Marco Aurélio S. Manual do Condomínio Edilício. Rio de Janeiro: Forense,
2009. p. 5.
cados ao condomínio.
adjudica
impossibilidade do registro da transferência do domínio quando da adjudica-
ção de unidade pelo condomínio edilício (nas hipóteses do § 3º do artigo 63
da Lei 4.591/64), adquirida em leilão de unidade devedora das prestações do
preço da construção, fato que depende de decisão unânime da Assembleia pa pa-
DF
ficção em um sentido laico, e não em sentido jurídico, já que, até os dias atuais,
a tradicional doutrina não visualiza a personificação jurídica da comunidade
oprietários em condomínios em edificações26.
de proprietários
Consta, entree os enunciados do Conselho Federal de Justiça (CFJ), o enun-
enun
IV
jurídi-
ca da comunidade do condomínio.
Já em 1976, José Lamartine Correia de Oliveira28, em estudo realizado na Uni-
Uni
inti
versidade de Freiburg e no Instituto Max Planc de Droit Privé em Hamburgo, inti-
DF
25. LIMA, Frederico Henrique Viegas. Condomínio em Edificações. São Paulo: Saraiva,
2010. p. 41-42.
26. Idem.
27. LIMA, obra citada, p. 41-42.
28. OLIVEIRA, José Lamartine Correia de. A dupla crise da pessoa jurídica. São Paulo:
Saraiva, 1979.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
EX
FI AIS
FINAI
AIS ACERCA
ACERC DOS ENTES DESPERSONALIZADOS E
ACERC
REIITOS: PARADOXO
TITULARIDADE DE DIREITOS
RE
REITOS PA
PA
PAR NO ORDENAMENTO
Consoante demonstrado n no
o presente estudo, a tese que se pretende defen
defen-
CL
der é a de que, independentemente do reconhecimento da necessidade da per- per
sonificação do condomínio edilício enquanto um dos entes despersonalizados,
proprieda
que se soma à jovem ideia sobre uma nova modelação do direito de proprieda-
de, já haveria condições de se permitir a adjudicação de imóveis por parte do
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condomínio edilício com base em uma interpretação mais moderna e audacio audacio-
sa, muito embora sustentada em entendimentos tradicionalíssimos como o de
Pontes de Miranda.
As teorias hoje sustentadas pela doutrina, ainda que consideradas contro-
IV
legislação quanto por sua própria natureza. Tais entes, portanto, só podem ti ti-
tularizar direitos ou participar de relações jurídicas que o ordenamento expres
expres-
samente lhes autorize ou que se refiram diretamente à sua natureza e às suas
6. REFERÊNCIAS
EX
ASCENÇÃO, José de Oliveira. Direito Civil: teoria geral. 2. ed. Coimbra: Coim-
bra, 2000.
BRASIL. Lei n. 10.406 de 10 de janeiro de 2002
2002. Código Civil. Disponível em: [www.
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planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm]. Acesso em: 17.07.2016.
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edificações e as incorporações imobiliárias.
imobiliárias Disponível em: [www.planalto.
gov.br/ccivil_03/leis/L4591.htm].
.br/ccivil_03/leis/L4591.htm]. Acesso em: 17.07.2016.
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CFJ. Enunciado 58 da I Jornada de Direito Civil.
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O
GORDILHO, Heron José de Santana; SILVA, VA, Tagore Trajano de Almeida. Ani-
Ani
mais em juízo: direito, personalidade jurídica e capacidade processual. Revis-
Revis
ta de Direito Ambiental: RDA, v. 17, n. 65, jan./mar., 2012.
Saraiva,
GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva,
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LIMA, Frederico Henrique Viegas. Condomínio em Edificações.. São Paulo: Saraiva,
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MELO, Mar
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VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Parte Geral. São Paulo: Atlas, 2003. v. I.
VIANA, Marco Aurélio S. Manual do Condomínio Edilício. Rio, Forense, 2009.
IV
PESQUISAS DO EDITORIAL
ITORIAL
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1096 (DTR\2008\800).
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