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Sua Referência: Exmº Senhor

Procurador-Geral da República
Nossa Referência: FP 043/2009
Rua da Escola Politécnica, 140
Data: 11-03-2009
1269-269 LISBOA

Assunto: Pedido de declaração de ilegalidade

Senhor Procurador-Geral da Republica,

A Federação Nacional de Professores (FENPROF), dirige-se a Vª Ex.ª, ao abrigo


do artigo 73º nº 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, para lhe
solicitar que seja desencadeado, pelo Ministério Público, um pedido de
declaração de ilegalidade, com força obrigatória geral, dos artigos 3º, nºs 1 e 2,
6º nº2, 7º, 9º, nºs 1 e 3 e 10º nº 2 do Decreto Regulamentar nº 1-A/2009, de 5 de
Janeiro que complementa a regulamentação do processo de avaliação do pessoal
docente de educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, nos termos
dos nºs 4 e 5 do artigo 40º do Estatuto da Carreira Docente, aprovado pelo Decreto
Lei nº 139-A/90, de 28 de Abril, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto Lei nº
15/07, de 19 de Janeiro, o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:

1. O Decreto Regulamentar nº 1-A/2009, de 5 de Janeiro tem por objectivo, de


acordo com o seu artigo 1º, definir o regime transitório de avaliação de
desempenho do pessoal docente de educação pré-escolar e dos ensinos básico e
secundário, sem prejuízo da aplicação do disposto nos Decretos Regulamentares
nºs 2/2008, de 10 de Janeiro, e 11/2008, de 23 de Maio, naquilo em que não o
contrariem.

2. A regulamentação contida no citado Decreto Regulamentar nº 1-A/2009 é feita,


ao abrigo dos nºs 4 e 5 do artigo 40º do Estatuto da Carreira dos Educadores de
Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo
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Decreto Lei nº 139-A/90, de 28 de Abril, com a redacção que lhe foi dada pelo
Decreto Lei nº 15/07, de 19 de Janeiro.

3. Constata-se que os artigos 3º, nºs 1 e 2, 6º nº 2, 7º, 9º nºs 1 e 3 e 10º nº 2 do


Decreto Regulamentar nº 1-A/2009, de 5 de Janeiro, contrariam disposições legais
contidas no citado Estatuto da Carreira Docente, sendo que tal facto
consubstancia uma inconstitucionalidade, por violação do artigo 112º da
Constituição. Como se demonstrará:

a) Artigo 3º nº 1
Este normativo do Decreto Regulamentar em questão, vem dispensar da avaliação
a que se refere o artigo 18º do Decreto Regulamentar nº 2/08, de 10 de Janeiro
(efectuada pelo órgão de direcção executiva) os indicadores de classificação
constantes da c) do nº 1 daquele preceito legal relativas aos resultados e abandono
escolares.
Por sua vez, o nº 2 do mesmo artigo 3º do Decreto Regulamentar nº 1-A/09 vem
condicionar, ao pedido do interessado, a observação de aulas a que se refere o
artigo 17º do citado Decreto Regulamentar nº 2/08, no âmbito da avaliação a
cargo dos coordenadores de departamento.
Ora, a aplicação do nº 1 da referida norma contraria o disposto no artigo 45º, nº 1,
d) e nº 2 e) do Estatuto da Carreira Docente.
Com efeito, de acordo com o primeiro dos referidos preceitos legais, na avaliação
efectuada pelo coordenador de departamento curricular ou do conselho de
docentes, é ponderado o envolvimento e a qualidade científico-pedagógica do
docente, designadamente com base na apreciação do “processo de avaliação das
aprendizagens dos alunos” (sublinhado nosso).
Por outro lado, o nº 2 c) do mesmo preceito legal do ECD vem determinar que, na
avaliação efectuada pelo órgão de direcção executiva são ponderados, entre outros
indicadores, “O progresso dos resultados escolares esperados para os alunos e
taxas de abandono escolar tendo em atenção o contexto sócio-educativo”
(sublinhado nosso).
Posto isto, o artigo 3º, nº 1 do Decreto Regulamentar em apreço, ao determinar a
não aplicação dos indicadores de classificação constantes da alínea c) do nº 1 do
artigo 18º do Decreto Regulamentar nº 2/2008 (resultado escolar dos alunos e
abandono escolar) contraria expressamente os supra citados preceitos legais do
ECD que exigem a sua ponderação obrigatória na avaliação do pessoal docente.
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b) Artigo 3º, nº 2
Por sua vez, este preceito do mesmo Decreto Regulamentar nº 1-A/2009, também
contraria o disposto no artigo 45º nºs 3 c) e 4, do ECD.
Com efeito, estes normativos determinam que, com vista à classificação dos
parâmetros definidos para a avaliação de desempenho, deve atender-se, entre
outros elementos, à observação de aulas, devendo o órgão de direcção executiva
calendarizar para o efeito, a observação pelo avaliador de “… pelo menos, três
aulas leccionadas pelo docente por ano escolar”. (sublinhado nosso)
Decorre, portanto, do ECD que este elemento avaliativo é obrigatório para todos os
docentes sem excepção (não depende do requerimento do avaliado) e, ainda, que
é exigível, independentemente da menção qualitativa a aplicar, que a observação
não seja inferior a três aulas.
Posto isto, ao estipular que a observação de aulas fica dependente do
requerimento do docente avaliado só sendo obrigatória para efeitos de atribuição
das menções de “Muito Bom” e de “Excelente”, o disposto no nº 2 do artigo 3º do
DL nº 1-A/09 também se diverge do disposto no citado artigo 45º nº 3 c) e nº 4 do
ECD.

c) Artigo 6º, nº 2
Tal como as anteriores, este normativo também diverge do ECD, contrariando o
disposto no seu artigo 45º, nº 5.
Na verdade, esta disposição estatutária limita as acções de formação continua a
considerar para efeitos de avaliação de desempenho efectuada pelo órgão de
direcção executiva, às que incidam sobre conteúdos de natureza cientifico-
didáctica com ligação à matéria curricular leccionada e às relacionadas com
necessidades da escola definidas no respectivo projecto educativo ou plano de
actividades.
Contrariando o conteúdo desta norma, o Decreto Regulamentar nº 1-A/2009 vem,
em relação à matéria da formação, considerar, para efeitos de avaliação, todas as
acções de formação contínua acreditadas, independentemente do ano em que
tenham sido realizadas, apenas excepcionando as que tenham sido consideradas
em avaliações anteriores.
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d) Artigo 7º
Ao dispor que, na situação prevista no artigo 3º nº 2 é apenas calendarizada pelo
avaliador a observação de duas aulas leccionadas pelo avaliado, ficando
dependente de requerimento deste a observação de uma terceira, o artigo 7º do
Decreto Regulamentar em apreço, também contraria o já citado nº 4 do artigo 45º
do ECD, que determina a obrigatoriedade de observação de pelo menos três aulas
leccionadas pelo docente.
Por este facto também este normativo do Decreto Regulamentar nº 1-A/2009 é
ilegal por violação do disposto no ECD.

e) Artigo 9º, nºs 1 e 3


Estes preceitos do diploma legal em questão também contrariam o disposto no
artigo 44º, nº 1 e), do ECD na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº
15/2007, de 19 de Janeiro.
De facto, o referido preceito do diploma legal em apreço, atribui um carácter
facultativo à entrevista individual a que se referem a alínea d) do artigo 15º e o
artigo 23º do Decreto Regulamentar nº 2/2008, de 10 de Janeiro, visto que
determina que a mesma só tem lugar desde que haja requerimento do avaliado
nesse sentido.
Ora, o citado artigo 44º, nº1 e) do ECD, que nessa matéria foi acompanhado pelo
também citado Decreto Regulamentar nº 2/2008, atribui à referida entrevista
individual, entre avaliador e avaliado, um carácter obrigatório, enquanto fase do
processo de avaliação de desempenho.
Nesta medida, verifica-se também, neste caso, uma violação inequívoca do ECD
pelo Decreto Regulamentar nº1-A/2009.

f) Artigo 10º, nº 2
Finalmente, esta norma do mesmo Decreto Regulamentar nº 1-A/2009, também
diverge do artigo 43º, nº 2 do ECD, no que respeita à avaliação dos professores
titulares que exerçam competências de coordenadores de departamento curricular.
De facto, enquanto no primeiro destes diplomas legais tal competência é atribuída
a um Inspector da área departamental do avaliado, o ECD atribui tal competência
exclusivamente ao Conselho Directivo ou Director, nos termos do artigo 29º do
Decreto Regulamentar nº 11/2008, de 10 de Janeiro.
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4. Ora, a aplicação dos identificados preceitos legais do Decreto Regulamentar nº


1-A/2009, de 5 de Janeiro ao pessoal docente ou qualquer interpretação, que
permita que estas normas alterem ou revoguem normas do ECD são
inconstitucionais, por violação do artigo 112º da Constituição, isto,
independentemente da posição da FENPROF relativamente a cada um dos
aspectos em referência.

De facto, a esta disposição constitucional está subjacente o princípio da hierarquia


das normas que não permite que um diploma inferior (neste caso um Decreto
Regulamentar) altere, modifique ou revogue normas contidas num diploma
superior (neste caso um Decreto-Lei) ou seja, as normas do ECD só podem ser
contrariadas por normas contidas num diploma de valor idêntico ou superior.
Assim, a aplicação dos preceitos legais do Decreto Regulamentar nº 1-A/2009, de
5 de Janeiro supra identificados, é igual e inconstitucional por se encontrarem
contidos num diploma legal que não tem força jurídica para revogar o ECD.

Em face do exposto, a FENPROF solicita a Vossa Excelência que seja


desencadeado, pelo Ministério Público, um pedido de declaração de ilegalidade,
com força obrigatória geral dos artigos 3º, nºs 1 e 2, 6º nº 2, 7º, 9º, nºs 1 e 3 e 10º,
nº 2, do Decreto Regulamentar nº 1-A/2009, de 5 de Janeiro, que complementa a
regulamentação do processo de avaliação do pessoal docente de educação pré-
escolar e dos ensinos básico e secundário, nos termos dos nºs 4 e 5 do artigo 40º
do Estatuto da Carreira Docente aprovado pelo Decreto Lei nº 139-A/90, de 28 de
Abril na redacção que lhe foi dada pelo Decreto Lei nº 15/07, de 19 de Janeiro, na
medida em que violam o disposto no ECD e logo no artigo 112º da Constituição.
Receba, Senhor Procurador-Geral da República, os nossos melhores
cumprimentos.

O Secretariado Nacional

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