Você está na página 1de 2

Os melhores e os piores

Jorge Alberto Araujo


Juiz Titular da Vara do Trabalho de Rosário do Sul/RS

Um portal destinado à divulgação de notícias jurídicas com sede em Porto Alegre e


ligado a um advogado ativo da OAB/RS reproduz este ano enquete na qual se buscam
identificar as melhores e piores varas de Porto Alegre. A iniciativa já abordou varas da
Justiça Estadual, atualmente elege as varas federais e, fatalmente, encerrará com a
votação sobre as melhores e piores varas trabalhistas.
A idéia parece interessante. Afinal a prestação de Justiça é um serviço público,
suportado pelo imposto pago pelos contribuintes, e, por conseguinte, deve estar sujeito à
avaliação pelo seu público consumidor.
No entanto não se apresenta muito claro quem é, efetivamente, o público
consumidor da Justiça.
A página referida, embora hospedada na web, tem um público alvo bastante
selecionado, constituído, principalmente, por advogados. E, ainda que magistrados,
promotores e outros profissionais do Direito possam acessá-la, honestamente não se
encontrariam habilitados a votar, tendo em conta que não teriam o conhecimento do
universo das candidatas a ponto de as poder avaliar.
Neste quadro se pode afirmar que em grande percentual as varas de Porto Alegre
serão avaliadas por advogados. No entanto o que habilita a tais profissionais eleger as
melhores e piores unidades?
A mesma Constituição que cria e organiza os poderes do Estado também estabelece que os
advogados são essenciais à administração da Justiça. Situação que ninguém rejeita.
E a importância dos advogados na organização de cada unidade judiciária é
capitular como eu posso asseverar tendo, como juiz titular, atuado em comarcas do
interior, nas quais o número de advogados é exíguo e onde se podem verificar os
resultados imediatos da sua atuação, em benefício ou prejuízo da organização judiciária.
Afirmo isso porque atualmente atuo na Vara do Trabalho de Rosário do Sul na qual
o excelente relacionamento dos advogados entre si e destes com os juízes e servidores
reflete muito positivamente no andamento dos processos, resultando em uma prestação
jurisdicional muito mais rápida e efetiva, cujos méritos podem ser atribuídos a todos, não
apenas a uma ou outra classe.
Ademais a votação, como pude constatar, é imprecisa, permitindo, por exemplo,
que o "eleitor" vote, ao mesmo tempo na mesma vara tanto como pior como melhor (o
que eu fiz para poder verificar o processo de votação, sem influir no resultado final).
Admitir-se que os resultados de uma votação assim sejam sequer divulgados já se
trata de expor, desnecessariamente, um grupo individualizado de pessoas à execração
pública sem chance alguma de defesa ou contraditório, o que não seria de se esperar de
uma categoria que tanto preza o devido processo legal.
Por outro lado, na medida em que determinados sujeitos da Justiça se considerem
legitimados para avaliar os serviços de outros, eventualmente também estes podem
querer proceder na avaliação daqueles.
Por exemplo porque não se poderiam eleger os melhores e piores advogados que
atuam nos foros de Porto Alegre, com votação aberta a servidores e magistrados?
Afinal certas práticas de advogados podem trazer tantos malefícios para o
andamento processual quanto as dos magistrados ou serventuários, o que certamente
não é desconhecido. Embargos de declaração apresentados com intuito meramente
protelatórios, indicação de testemunhas para serem ouvidas desnecessariamente através
de cartas precatórias, a apresentação de prova oral contra fatos incontroversos... e outras
atitudes, algumas até praticadas de boa-fé, mas que entravam o andamento dos feitos
poderiam ser consideradas em uma avaliação meticulosa das más práticas processuais.
Claro que a sugestão é apenas uma provocação. No entanto apenas apontar
subjetivamente unidades judiciárias boas e ruins me parece tão nocivo quanto.

Você também pode gostar