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www.conjur.com.br ISSN 1809-2829 - 16 de janeiro de 2007

Artigos > Criminal

Direito ao aborto
Pretensão de controlar o corpo da gestante é ingênua

por Túlio Lima Vianna

O aborto é um crime no Brasil pelo qual ninguém vai preso. A pena mínima cominada em nosso Código Penal para o aborto
provocado pela gestante (artigo 124) e para o aborto provocado por terceiro (artigo 126) é de um ano de prisão, o que confere
ao réu primário e de bons antecedentes o direito à suspensão condicional do processo.

Quanto ao aborto provocado pela gestante, ainda que a pena fosse superior, uma condenação encontraria óbice na questão
probatória, pois dificilmente se conseguiria provar inequivocamente a intenção da acusada de provocar o aborto. Na dúvida se
o aborto foi uma fatalidade ou intencionalmente provocado, o tribunal acabaria optando pela absolvição.

A pretensão estatal de controlar o corpo da gestante por meio da imposição de uma sanção penal é no mínimo ingênua, para
não dizer burra. Em tese, a pena funcionaria como um elemento de dissuasão para que a gestante não cometesse o aborto.
Na prática, se a mulher está suficientemente desesperada para sacrificar a vida potencial de um filho, pouco temerá uma
hipotética e improvável prisão futura.

Por que então eleger 28 de setembro o Dia pela Descriminalização do Aborto na América Latina e Caribe, se a existência da
pena não evita o aborto e um processo judicial por este crime está fadado a terminar em pizza, ou melhor, em cesta básica?
Para garantir às brasileiras um direito fundamental que as mulheres da maioria absoluta dos países desenvolvidos — entre
eles Estados Unidos, Canadá e praticamente toda a Europa — já possuem: o direito de fazer o aborto com adequada
assistência médica.

É preciso que se entenda que a gestante que decidir interromper a gravidez abortará com ou sem auxílio médico. O Estado
não é senhor de seu corpo e jamais poderá vigiá-la 24 horas por dia. Por outro lado, informações sobre métodos abortivos
são fartamente conhecidas e os riscos que podem representar à saúde da mulher, na maioria das vezes, assim como a
sanção penal, não são suficientes para convencê-la a mudar de idéia.

“Entre os métodos mais comuns pode-se referir o uso de plantas abortivas como a arruda (Ruta graveolens),
erva-santa-maria (Senebiera pinnatifida), tanaceto (tanacetum vulgaris), sabina (Juniperus sabina) ou o fungo cravagem do
centeio (Claviceps purpúrea). Outros expedientes usados — e que resultam frequentemente em tragédia — são a introdução
de objetos no canal vaginal, como agulhas de tricô, tesouras ou antenas, que provocam a morte do feto. Um medicamento
usado no tratamento de úlceras gástricas, o Cytotec, com misoprostol como princípio ativo, é também vendido de forma ilegal
para provocar abortos.” (Wikipedia)

É claro que estes métodos só são usados pelas gestantes que não possuem condições financeiras para arcar com o alto
custo de um aborto clandestino em uma das muitas maternidades que oferecem o serviço com total sigilo e segurança. As
demais estão sujeitas a uma pena não escrita, pois vedada constitucionalmente, mas comum na prática da abortos
clandestinos: a morte. Na América Latina, 21% da mortalidade materna tem como causa as complicações do aborto feito de
forma insegura.

A criminalização do aborto para a mulher rica significa tão-somente um aumento no custo do procedimento cirúrgico que, por
sua clandestinidade, tende a se valorizar. A criminalização do aborto para a mulher pobre significa a negação do direito à
saúde garantido no artigo 6º da Constituição da República. É aqui que a criminalização do aborto exibe seu perverso caráter
classista, pois somente as mulheres pobres sentem seus efeitos.

A criminalização do aborto não evita o aborto, mas tão-somente obriga a mulher a realizá-lo na clandestinidade. A discussão
sobre a descriminalização do aborto não é uma discussão sobre o direito ou não de a gestante abortar, mas sobre o direito ou
não de a gestante ter auxílio médico para abortar. Com a descriminalização, os abortos continuarão a ser praticados, tal como
hoje o são, mas a mortalidade materna será substancialmente reduzida.

Para os homens, que sempre puderam escolher entre abandonar suas parceiras grávidas ou reconhecer o filho, e para as
mulheres ricas, que sempre tiveram o direito de escolha, a criminalização do aborto pode significar uma opção pró-vida. Já
para as mulheres pobres, a descriminalização do aborto não é uma garantia “pró-escolha”, pois o aborto em regra não lhes é
uma opção, mas uma necessidade. Para estas milhares de mulheres latino-americanas miseráveis, é a descriminalização do
aborto a verdadeira defesa pró-vida.
Revista Consultor Jurídico, 9 de outubro de 2006

Sobre o autor
Túlio Lima Vianna: é professor de Direito Penal da PUC-MG, doutorando pela UFPR e mestre pela UFMG.

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