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RECURSO ESPECIAL Nº 1965005 - RS (2021/0314831-3)

RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO


RECORRENTE : JULIANO SCHEER MANTOVANI
RECORRENTE : LEANDRO SCHEER MANTOVANI
ADVOGADOS : FERNANDO JOSÉ LOPES SCALZILLI - RS017230
MARCELO BAGGIO - RS056541
JOAO PEDRO DE SOUZA SCALZILLI - RS061716
AQUILES E SILVA MACIEL - RS109422
RECORRIDO : BANCO DO BRASIL SA
ADVOGADOS : NELSON PILLA FILHO - RS041666
MARCOS VALÉRIO SILVEIRA LESSA - RS042441

DECISÃO

Trata-se de recurso especial interposto por JULIANO SCHEER MANTOVANI e


OUTRO, com fundamento no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, em desafio a acórdão
proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul assim ementado:

AGRAVO INTERNO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE


EXECUÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 932 DO CPC. - PENHORA. VALOR
CIRCULANTE EM CONTA CORRENTE. REGRA DE
IMPENHORABILIDADE DA POUPANÇA. INAPLICABILIDADE. OS
GANHOS DO TRABALHO E OS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS SÃO
ABSOLUTAMENTE IMPENHORÁVEIS NA FONTE DE PAGAMENTO
QUANDO NÃO SE TRATA DE EXECUÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE
NATUREZA ALIMENTAR, OU NÃO EXCEDER A 50 SM, NOS TERMOS DO
ART. 833 DO CPC. OS VALORES DEPOSITADOS EM CONTA CORRENTE
CONSTITUEM VALOR CIRCULANTE SUJEITO AO BLOQUEIO JUDICIAL
INCUMBINDO AO EXECUTADO DEMONSTRAR QUE TENHAM ORIGEM
NAQUELAS FONTES E TRATAR-SE DA RECEITA DO MÊS NECESSÁRIA
À SUBSISTÊNCIA. O ART. 833, INC. X, DO CPC/15 (ASSIM COMO O
REVOGADO ART. 649 DO CPC/73) É EXPRESSO EM ASSEGURAR TÃO
SOMENTE A IMPENHORABILIDADE DE VALORES DEPOSITADOS EM
CADERNETA DE POUPANÇA, E O ART. 854 DO CPC/15 CLARO NO
SENTIDO DE QUE SÃO PASSÍVEIS DE BLOQUEIO OS VALORES EM
DEPÓSITO OU APLICAÇÃO FINANCEIRA CABENDO AO DEVEDOR
DEMONSTRAR QUE DE ACORDO COM A LEI SÃO
IMPENHORÁVEIS. CIRCUNSTÂNCIA DOS AUTOS EM QUE SE TRATA
DE BLOQUEIO DE VALORES EM CONTA CORRENTE; NÃO SE TRATA
DE VALORES ABRIGADOS PELA IMPENHORABILIDADE PREVISTA NA
LEI;
E SE IMPÕE NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO. RECURSO
DESPROVIDO.

Em suas razões recursais, a parte recorrente alegou violação dos art. 833, X, do

Edição nº 0 - Brasília, Publicação: quinta-feira, 28 de abril de 2022


Documento eletrônico VDA32205253 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006
Signatário(a): MINISTRO Raul Araújo Assinado em: 27/04/2022 01:27:17
Publicação no DJe/STJ nº 3380 de 28/04/2022. Código de Controle do Documento: c7e9bd72-b084-45ad-90e6-2027c5013f37
CPC/2015, defendendo a impenhorabilidade dos valores constritos, ao argumento de serem
inferiores a 40 (quarenta) salários mínimos, embora constantes de conta corrente.
Contrarrazões apresentadas às fls. 159-171 (e-STJ), nas quais, além da manutenção
do acórdão recorrido e da conformidade com a jurisprudência do STJ, é suscitada a incidência do
óbice recursal da Súmula 7/STJ.
É o relatório. Decido.
O recurso especial merece prosperar.
Inicialmente, embora o exame do mérito do recurso especial torne presumido o
atendimento dos pressupostos processuais, em atenção à argumentação expendida pela parte
contrária, consigna-se a desnecessidade de reexame fático-probatório para o conhecimento da
alegação sobre a impenhorabilidade de valor depositado em conta corrente, porque as
circunstâncias podem ser extraídas das decisões proferidas pelas instâncias ordinárias e das
peças processuais apresentadas por ambas as partes, como a seguir será indicado.
Segundo o atual entendimento jurisprudencial da Segunda Seção do STJ, é
impenhorável a quantia de até 40 (quarenta) salários mínimos, seja ela mantida em poupança, em
conta-corrente, em fundo de investimentos ou em espécie, salvo comprovação de abuso de
direito, má-fé ou fraude verificados no caso concreto (cf. REsp 1.230.060/PR, Rel. Ministra
Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, julgado em 13/8/2014, DJe 29/8/2014).
Nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL.


EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. VALORES DEPOSITADOS EM
CONTAS BANCÁRIAS. MONTANTE INFERIOR A QUARENTA SALÁRIOS
MÍNIMOS. IMPENHORABILIDADE.
1. Cuida-se, na origem, de execução de título extrajudicial.
2. São impenhoráveis os valores poupados pelo devedor, seja em caderneta
de poupança, conta-corrente, fundo de investimentos ou em papel-moeda, até
o limite de 40 salários mínimos. Precedente da 2ª Seção.
3. A simples movimentação atípica apurada pelas instâncias ordinárias, por
si só, não constitui má-fé ou fraude a ensejar a mitigação da
impenhorabilidade do art. 833, X, do NCPC.
4. Agravo interno no recurso especial não provido.
(AgInt no REsp 1.795.956/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA
TURMA, julgado em 13/5/2019, REPDJe 29/5/2019, DJe de 15/05/2019)

No caso dos autos, o Tribunal de origem negou provimento ao agravo de instrumento


interposto contra o bloqueio de valores inferiores a 40 (quarenta) salários mínimos em contas
correntes de titularidade da parte recorrente, motivado na possibilidade de penhora de ativos
existentes em conta corrente, em vez de poupança, quando não comprovado serem oriundos de
verbas impenhoráveis, além da não vinculação ao entendimento do STJ sobre a matéria, por não
ter sido firmado em precedente vinculante (e-STJ, fls. 76-79):

As constrições foram realizadas nas contas correntes das partes executadas;


o limite de quarenta salários mínimos aplica-se quando os valores são

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Publicação no DJe/STJ nº 3380 de 28/04/2022. Código de Controle do Documento: c7e9bd72-b084-45ad-90e6-2027c5013f37
bloqueados em conta poupança, o que não é o caso dos autos; os
precedentes do STJ de que a limitação é aplicada em casos de valores em
conta corrente não deve servir de parâmetro à aplicação se não for ditada
por enunciado sumular ou em julgamento representativo de controvérsia.
Cabe renovar da decisão que foi alvo do agravo de instrumento e confirmada
na decisão deste relator:
(...)
Naquela linha tem-se reiterado o entendimento de que os precedentes do
Egrégio Superior Tribunal de Justiça que admitem a impenhorabilidade de
outros investimentos ou de valores circulantes em conta corrente ou em
moeda papel, no limite de 40 SM (mesmo que excepcionando nos casos de
abuso de direito, má-fé ou fraude pelo devedor) decorrem de convencimento
que somente pode ser imposto se consolidado em súmula ou
julgamento representativo de controvérsia.
Assim, por qualquer aspecto que se analise, ratificando e aditando
fundamentos, não é caso de reparo na decisão de primeiro grau.
Com efeito, os ganhos do trabalho e os benefícios previdenciários são
absolutamente impenhoráveis na fonte de pagamento quando não se trata
de execução de obrigação de natureza alimentar, ou não exceder a 50 SM,
nos termos do art. 833 do CPC.
Os valores depositados em conta corrente constituem valor circulante sujeito
ao bloqueio judicial incumbindo ao executado demonstrar que tenham
origem naquelas fontes e tratar-se da receita do mês necessária à
subsistência. O art. 833, inc. X, do CPC/15 (assim como o revogado art. 649
do CPC/73) é expresso em assegurar tão somente a impenhorabilidade de
valores depositados em caderneta de poupança, e o art. 854 do CPC/15 claro
no sentido de que são passíveis de bloqueio os valores em depósito ou
aplicação financeira cabendo ao devedor demonstrar que de acordo com a lei
são impenhoráveis. Circunstância dos autos em que se trata de bloqueio de
valores em conta corrente; não se trata de valores abrigados pela
impenhorabilidade prevista na lei; e se impõe negar provimento ao recurso.
Portanto, o recurso não merece provimento. Ante o exposto, voto por NEGAR
PROVIMENTO ao recurso.

Desse modo, constatada a divergência com a jurisprudência desta Corte, nos termos
acima declinados, é impositivo o provimento do recurso especial.
Diante do exposto, dou provimento ao recurso especial, a fim de afastar a penhora
dos valores inferiores a 40 (quarenta) salários mínimos constantes das contas correntes objeto do
recurso.
Publique-se.
Brasília, 22 de abril de 2022.

Ministro RAUL ARAÚJO


Relator

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Publicação no DJe/STJ nº 3380 de 28/04/2022. Código de Controle do Documento: c7e9bd72-b084-45ad-90e6-2027c5013f37

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