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Disclaimer

Esta novela foi escrita com base nas mensagens do Play by email Fronteira Final (autores
incluem, além de mim, responsável por compilá-las, Júlia Morena, Alexandre Eleutério,
Rafael Hanges, Eduardo Zombini, Gabriela Baumgart, Luiz Rosa, Ayrton ‘Heavyside’,
Nuno Rosa). Algumas modificações foram feitas, porém a essência foi mantida.

O dia da caça usa o cenário do universo de Star Trek, criado por Gene Roddenberry, e
marca registrada dos CBS Studies. Este texto não busca lucro ou benefício pessoal, apenas
diversão e divulgar uma versão alternativa deste universo ficcional. Sua venda é proibida,
porém pode ser distribuído livremente desde quem esse disclaimer.

Tripulação:
CAPT. Theodore Spencer - Comandante da Nave. Paternal e protetor, está sempre
preocupado em manter a confiança de seus oficiais.

TNTE CMND T’Gar - Primeiro Oficial. Um híbrido klingon, T’Gar une em si a coragem
e o respeito a honra dos klingons e o bom senso humano.

TNTE Aaron Heavyside - O novo Oficial Chefe de Segurança da Endeavour. Apesar de


ser muito sério no seu trabalho, fora dele é extremamente simpático, até mesmo brincalhão.

TNTE Eduardo Zamblivinsk - Oficial Médico Chefe. Despreocupado, mas competente.


Acha que uma boa conversa cura tanto ou mais do que medicamentos.

TNTE Salek - Oficial Chefe de Engenharia. Um vulcano extremamente competente, com


um raciocínio lógico grande até mesmo para seus conterrâneos.

TNJR Chaz Hanges - Conselheiro. Jovial e confiante, um eterno pesquisador das


múltiplas personalidades que constituem o corpo de uma nave. Apesar de brincalhão, na
hora de falar sério sabe impor respeito.
TNJR Christie Williams - Oficial Chefe de Ciências. Uma humana criada em Vulcano,
Wills é inflexível. Age com a lógica e frieza que se esperariam de uma vulcana,
menosprezando seu lado humano. Também recém chegada, está se ambientando.

TNJR Tami Adachi - Oficial Chefe de Operações. Filha de um antigo Oficial da Frota,
essa jovem oriental de educação rígida permanece sempre calma, por mais tensa que a
situação fique. Toda essa segurança, no entanto, é uma maneira de reprimir seus
sentimentos e emoções.

ALFS Bannik - Oficial Assistente de Segurança. Membro de uma raça pouco comum na
Frota, vinda do planeta Tyrria, o recém chegado Oficial de Segurança é um homem severo
e corajoso, mas com amargura no coração.

ALFS Jonh Welker - Oficial Assistente de Engenharia. Apesar de novo, o jovem Welker é
um engenheiro promissor, tendo sido o primeiro de sua turma.

ALFS T’mir - Oficial Assistente de Operações. A jovem meio-vulcana, cansada de se


sentir uma pária em seu próprio mundo se juntou à Frota para encontrar seu lugar.
Sorridente e emotiva, paradoxalmente é uma estudiosa da rigorosa disciplina filosófica de
Surak.

Richard Davis - Barman e trambiqueiro. Davis acaba de conseguir sua primeira concessão
em uma nave, depois de três anos na Base 3, na órbita de Marte. Paquerador e
inescrupuloso, só tem um objetivo: se dar bem.
Capitulo 1

A Endeavour estava parada na Base 753 há dois dias. Reparos de pequeno porte
eram feitos nos motores de dobra, enquanto parte da tripulação era remanejada.
Theodore Spencer olhava pela escotilha de sua sala, vendo as estrelas lá fora e se sentindo
triste. Toda a vez que recebia ordens que implicavam em mudança de tripulação, se sentia
desconfortável. E essa o fazia se sentir mais do que o normal. Simplesmente dois dos seus
oficiais superiores iam ser remanejados, e isso exigiria um período de adaptação.
Spencer estava imerso em seus pensamentos, quando ouviu o intercomunicador
anunciar o seu Conselheiro. Ao comando dele, as portas se abriram e Chaz entrou. O
britânico vinha com uma expressão satisfeita no rosto, contrapondo-se ao aparente
desânimo do seu Capitão.
- Muito bem, senhor Chaz, o que o traz aqui tão satisfeito?
O Conselheiro se sentou na cadeira reservada aos interlocutores do Capitão e
esperou que este se sentasse.
- Terminei de examinar as fichas de nossos novos tripulantes e vim fazer meu
relatório pessoal o mais rápido possível.
O Capitão o olhou com um brilho de interesse nos olhos.
- Prossiga, Conselheiro.
Chaz retirou um disco de uma pequena caixa que carregava consigo e inseriu no
computador da mesa do Capitão.
- Computador, rode o programa “Consiglieri Endeavour”, arquivo „novos
tripulantes‟. - a tela mudou em segundos mostrando a foto de uma jovem humana.
- Comecemos pela Oficial Chefe de Ciências. Christie Williams. Humana, criada em
Vulcano, excelentes notas na Academia Vulcana de Ciências, serviu um ano como
assistente na USS Lisbonne, com o Capitão Maggelan, que a recomendou. Temperamento
totalmente estável. Eu diria que não poderíamos querer melhor. A seguir, - a tela mudou
novamente - o Oficial Chefe de Segurança, Aaron Heavyside. Serviu como oficial Tático e
de Segurança em pelo menos quatro naves diferentes. Em todas recebeu elogios.
Recomendado pelo Comando da Frota.
Spencer balançou a cabeça, mostrando admiração. Se esse era o perfil do novo
Oficial de Segurança Chefe, ele ficava bem mais tranqüilo.
- Agora os três novos assistentes. A Oficial de Operações Assistente, T‟mir,
também vem de Vulcano.
Spencer se controlou para não fazer uma careta de desgosto. A idéia de ter uma
vulcana na sua ponte não era nada agradável. Tinha tido experiências antes com vulcanos e
não tinha boas recordações desse período.
- Sua mãe é terráquea e seu pai é Sorel, um dos mais famosos e competentes
neurobiólogos de Vulcano. Cursou a Academia de Filosofia de ShiKahr, e na Academia da
Frota esteve sempre acima da média. Uma nota do Serviço de Psicologia Aplicada da Frota
diz que ela não segue as doutrinas vulcanas da maneira ortodoxa.
“Menos mal, então.” Mas a idéia continuou a desagradar-lhe.
- Agora o Oficial de Segurança Assistente, Bannik. Um tyrriano.
Spencer olhou admirado para seu Conselheiro. Tyrria era membro recente da
Federação e este provavelmente deveria ser o único tyrriano em toda a Frota.
- A ficha de serviço dele é impressionante. Antes mesmo de ser da Frota se
envolveu em um incidente em Deep Space Nine, que sem ele teria caminhado para uma
situação diplomática sem solução. Excelente aluno na Academia da Frota, serviu um ano
como auxiliar de segurança no Espaçoporto de Nova Aldebarã, um período em que o
número de incidentes se reduziu a zero.
O Conselheiro ia continuar a falar, mas foi interrompido pelo comunicador.
{Ponte para o Capitão}
- Spencer na escuta.
{A Base 753 informa que os novos tripulantes estão somente aguardando
permissão para vir a bordo.}
- Permissão concedida, Tenente Adachi. Informe a sala de transporte.
{Sim, senhor.}
- Bom, Conselheiro, parece que os demais eu terei que conhecer pessoalmente.
Acompanha-me até a sala de transporte para recepcionar os recém-chegados?
- Claro, Capitão.
Spencer ia saindo quando parou de repente.
- Não sei, senhor Chaz, mas não seria adequado que a Tenente Adachi nos
acompanhasse? Afinal, é a assistente dela.
Chaz acenou com a cabeça, concordando com seu Capitão, que bateu de leve no
seu comunicador.
- Spencer para Adachi.
{Pois não, senhor.}
- Poderia nos acompanhar até a sala de transporte? Gostaria que recepcionasse a
sua nova assistente.
{Claro, senhor, irei para lá.}
- Spencer desliga.
Virou-se para Chaz e os dois saíram juntos da sala, dirigindo-se ao turbolift mais
próximo.

***

T‟mir segurava sua mala com as duas mãos. Estava meio perdida na imensidão da
Base Estelar, e procurava encontrar de qualquer maneira a sala de transporte. Um rapaz
com uniforme de segurança lia um panfleto parado no meio do corredor. Ela respirou
fundo e se dirigiu a ele.
- Com licença, você saberia dizer onde fica a sala de transporte 16E?
O rapaz levantou os olhos do papel e olhou para ela. Ficou meio espantado, o que
para T‟mir estava se tornando perfeitamente normal, com suas feições vulcanas ao mesmo
tempo em que não via as típicas orelhas pontudas. Mas respondeu prontamente.
- Sei sim, e estou indo para lá. Vou embarcar na USS Endeavour, e você?
- Eu também! - ela apoiou a mala no chão e com um sorriso estendeu a mão -
Alferes T‟mir, futura Oficial de Operações Assistente da Endeavour.
Ele sorriu de volta, enquanto apertava a mão dela.
- Prazer, Alferes. Eu sou o Tenente Aaron Heavyside. Oficial de Segurança Chefe.
Bom, vamos logo, que temos pouco tempo para nos apresentarmos na nave. Se você me
permite... - o jovem se abaixou e pegou a mala dela, apesar dos protestos da meio-vulcana.
- Ora, não é nada, está leve. Vamos, que estamos perdendo tempo.
Foram conversando até a sala de transporte 16E, falando sobre notas e a Academia,
descobrindo até mesmo uma instrutora em comum.
A sala estava vazia. O jovem Alferes, que estava de serviço, pediu a eles que
esperassem mais alguns instantes, pois estavam adiantados. Sem se importar com a espera,
T‟mir e Heavyside continuaram a conversar, até que uns cinco minutos depois, uma voz
firme e cheia interrompeu, vinda da porta.
- Aqui é a sala de transporte 16E?
O alferes confirmou e fez o mesmo pedido que fizera aos dois Alferes. O recém-
chegado assentiu com a cabeça, e se recostou na parede oposta à em que os outros dois
oficiais estavam. T‟mir olhou discretamente para o recém chegado. Um pouco mais baixo e
forte do que Heavyside, pareceria com um humano, não fosse seus olhos. Eram totalmente
brancos, sem pupilas e com uma estranha tatuagem sobre o olho direito. Ele olhou na
direção dela, e T‟mir desviou o olhar. Quem seria?
Quando faltavam três minutos para o horário combinado, a última nova tripulante
chegou. Era uma humana alta, que tinha algo de muito familiar para T‟mir. Apesar de nunca
ter a visto antes, ela lhe parecia conhecida. Demorou alguns instantes para perceber o que
era: a jovem andava igual aos vulcanos. Mesmo porte, mesmo espaçamento entre passos.
“Interessante...”
Como todos já se encontravam ali, o oficial se comunicou com a Endeavour e
conseguiu autorização para que eles fossem logo transportados. T‟mir, junto com os
outros, se colocou corretamente sobre os discos de transporte e não pode evitar um certo
frio na barriga, quando o mundo ao seu redor desaparecia na explosão de luz do raio de
teletransporte.

***
Bannik de Tyrria desconhecia o significado da palavra medo. Mas nunca na vida
estivera tão nervoso quanto nesse momento. Ser o assistente de segurança de uma nave
era muita responsabilidade, ainda mais de uma nave como a Endeavour. Ele sabia que
poderia agüentar, mas mesmo assim sentia um frio na barriga.
Quando se materializou na USS Endeavour, três oficiais o esperavam e aos outros
recém chegados. O Capitão, de quem Bannik recordava ter visto a foto nos arquivos da
Frota, deu um passo a frente e os cumprimentou.
- Bem-vindos a USS Endeavour. Eu sou o Capitão Spencer, e estes, - disse, fazendo
um gesto com a mão para indicar os outros dois oficiais - são a Oficial Chefe de
Operações, Tenente Tami Adachi, e o nosso Conselheiro, Tenente Chaz Hanges.
Bannik retribuiu os cumprimentos com um aceno de cabeça. Tentava esconder seu
nervosismo falando o menos possível.
- É uma honra poder servir na USS Endeavour, senhor. Espero cumprir bem meu
trabalho.
- Fico grato em ouvir isso, Alferes Bannik. Tenho a mesma esperança em todos
vocês. O Tenente Heavyside, - o capitão se vira para o outro homem que foi trazido a
bordo - será seu chefe.
Bannik virou-se para trás para cumprimentar seu superior. Foi aí que reparou nos
que vieram a bordo com ele. O Tenente Heavyside era um humano de estatura média,
mas corpulento. O cumprimentou de volta com um ligeiro aceno de cabeça.
Os outros eram, na verdade, as outras. Uma estava com o uniforme da área de
ciências e olhava tudo com o ar de enfado e desinteresse que Bannik achava tão típico dos
vulcanos, apesar dela ser humana. Olhou na direção dele, e a única reação que ela esboçou
foi levantar uma sobrancelha. A outra usava um uniforme de operações e provavelmente
deveria ser a nova assistente da tenente Adachi. Seus traços eram definitivamente vulcanos,
mas não tinha as orelhas pontudas tão características. Bannik reparou que seus olhos
estavam arregalados, e se mexiam como se ela quisesse ver tudo ao mesmo tempo. Foi
nesse instante que os olhares se encontraram, e Bannik soube imediatamente o que ela
era: uma meio-vulcana. Nenhum vulcano poderia - ou se permitiria ter - o olhar tão
transparente, tão legível, não pelo que ele sabia. Quando a jovem percebeu que ele a
olhava, mudou rapidamente a direção que ela própria fitava, ficando um pouco ruborizada.
Bannik se virou novamente para seu superior.
- Será um prazer servir ao seu lado, Tenente.
- Obrigado, Bannik. Será um prazer para mim também. Capitão, permissão para ir
até a sala da segurança.
Spencer acenou com a cabeça.
- Claro, senhor Heavyside. O senhor está liberado. Alferes Bannik, acompanhe-o.
O jovem Tenente deu uma piscada para a meio-vulcana e acenou, saindo da sala de
transporte, sendo seguido por Bannik prontamente. “Bom, vamos ver o que eu posso fazer
consigo, senhor Heavyside.”

***

O Capitão voltou a sua sala, enquanto Tami levava T‟mir e Wills para uma volta pela
nave. Preferia voltar logo para seu posto, mas o Capitão, em sua maneira sutil, a
convencera. A meio-vulcana, que seria sua nova assistente, olhava tudo e todos com uma
expressão de interesse que agradou Tami. “Uma assistente interessada era o melhor que
podia me acontecer.”, pensou enquanto mostrava a área de engenharia para as recém-
chegadas.
Já a nova oficial de ciências parecia estar familiarizada com a nave, não fazendo
perguntas nem comentários. Olhou para os tubos Jeffries com desinteresse, como se aquilo
não fosse absolutamente nada de novo. Tami se sentiu um pouco irritada, afinal quem
estava perdendo tempo mostrando a nave era ela, que deveria estar na ponte, fazendo os
últimos acertos para a iminente partida da nave.
Quando se aproximaram do reator, um vulcano alto e magro se aproximou delas.
Era o engenheiro chefe Salek, que se aproximou das três fazendo a típica saudação vulcana.
- Tenente Adachi, a que devo essa visita?
Tami pensou antes de responder. Tinha por norma sempre refletir antes de
responder, e refletir duas vezes antes de responder um vulcano. Ela nunca saberia dizer se
o engenheiro estava sendo simpático ou irônico, ou simplesmente vulcano; e tinha certeza
de que ele sabia exatamente como ela se sentia.
- O Capitão me pediu para mostrar a nave a nossas duas novas tripulantes. T‟mir,
que vai ser minha nova oficial assistente, e...
Antes que Tami pudesse terminar de falar, a nova oficial de ciências deu um passo a
frente e fez a saudação vulcana.
- Vida longa e próspera, senhor Salek. Sou a Tenente Júnior Wills, e vou ser a nova
oficial de ciências da nave. Li alguns de seus relatórios na Academia, e os achei deveras
impressionantes.
O engenheiro ergueu uma sobrancelha e olhou para a humana. Ele tinha a
expressão típica de um vulcano que controlava suas emoções. Quando ele falou, Tami
poderia jurar que era com uma ponta de ironia.
- Realmente? Não me parece muito lógico, já que meus relatórios são
extremamente voltados para a área de engenharia.
A nova oficial de ciências não respondeu, tentando se recompor. Tami pode ver sua
assistente escondendo um sorriso, enquanto Salek se virava para ela.
- Tenente Adachi, eu posso ser o guia a partir de agora. Meus afazeres na
engenharia estão adiantados, e não me atrapalharia em nada. E como devem estar
atarefados na ponte, seria melhor para a senhorita.
Tami agradeceu ao vulcano que respondeu com a mesma frase que todos os
vulcanos usam quando alguém agradece uma ato de gentileza: “Não se agradece lógica.”
Sem ligar muito, se dirigiu ao turbolift mais próximo, revisando mentalmente todos os seus
afazeres.

***

As ordens já tinham chegado, e para a surpresa de Spencer eram bem simples.


Patrulhar o setor da estrela Janus, onde se situava uma extensa colônia de mineração de
pergium, já que havia relatos de naves ferengi rondando aquele setor.
Prometiam serem quatro meses tranqüilos, e, ao fim destes, outra nave viria rendê-
los e voltariam a Base 753 para reabastecer a nave. Falou com seu primeiro oficial sobre
suas expectativas de calmaria.
T‟Gar deu um meio sorriso, sem mostrar nenhum de seus dentes.
- Será, Capitão? Afinal, estamos falando de ferengi. Eles podem tentar algo.
- Não, T‟Gar... Não creio que iremos ter problemas. Janus é um sistema distante, e
somente naves comerciais ferengi de baixo poder de fogo foram detectadas. Iremos
simplesmente marcar território.
Levantou-se de sua mesa e foi até a escotilha. Podia ver a Base Estelar, com seu
movimento de cargueiros e naves de carreira. Pensou que mesmo que fosse apenas para
ficar rodando de um lado para outro em um sistema distante, era preferível estar dentro de
uma nave a servir em um lugar como a Base. Como qualquer Base.
- Bom, senhor T‟Gar, vamos até a ponte. Vamos levar a Endeavour para Janus.
Andaram pelos corredores vazios. A tripulação já estava de prontidão, todos em
seus postos, simplesmente esperando a ordem. Ao chegar na ponte, viu com satisfação que
todos os oficiais lá estavam, com a exceção do doutor Zamblivinsk, que não era necessário.
Por precaução, Spencer resolveu se comunicar com ele.
- Spencer para Enfermaria.
{Zamblivinsk na escuta, senhor.}
- A enfermaria está devidamente abastecida?
{Sim, senhor. Só falta o conhaque altariano que encomendei, mas parece que ainda
vai demorar uns dias.}
- Terá que ficar para uma próxima, Doutor.
{É a vida, Capitão, o que se vai fazer? Zamblivinsk desliga.}
Spencer dirigiu-se para cadeira de comando sorrindo. Realmente prometiam serem
os meses mais tranqüilos desde que fora comissionado para a Endeavour.
- Tenente Adachi, abra um canal de comunicação com a Capitã Glamis.
- Sim, senhor. Canal aberto, pronto para comunicação.
- Na tela.
Na tela principal da ponte de comando da nave surgiu a imagem de uma mulher de
pele clara e olhos castanhos. Tinha um rosto firme e sereno, e sorria.
- Olá, Comandante, soube que vai nos deixar por uma importante missão de
patrulhamento.
Spencer deixou transparecer um leve sorriso.
- Ordens são ordens. E além do mais, umas férias dentro da nave não caem tão mal.
Sempre temos os holodecks.
O sorriso da capitã se abriu mais um pouco.
- Divirta-se, então, Theodore. Glamis desliga.
A tela passou a mostrar novamente o exterior da Base Estelar 753. Spencer
suspirou e disse para a Oficial de Operações.
- Tenente, nos leve para Janus, dobra 4.
- Sim, senhor.
Em três minutos, a nave estava entrando em dobra, se dirigindo para o sistema Janus.

Capítulo 2

Davis arrumava os últimos detalhes. O antigo refeitório da Endeavour estava


completamente transformado em um cômodo bar e restaurante. Depois de cinco anos na
Base Estelar 3, tudo o que ele queria era trabalhar em uma nave espacial. Seu auxiliar, um
jovem japonês chamado Suzuki, colocava as mesas. Davis poderia usar o computador em
conjunto com um projetor holográfico e o Bar do Davis estaria pronto em segundos. Mas
ele era em muitas coisas um barman a moda antiga. Gostava de “bebidas com álcool,
cadeiras de verdade e mulheres com apenas um par de seios”, como dizia seu avô. Então,
tinha gasto uma boa parte de suas economias em mobílias e louças para poder dar àquele
pequeno espaço no deck 10 a aparência reconfortante que um bar deve ter, mesmo que
esteja no espaço, a milhares de quilômetros da Base mais próxima.
Estava nessa, carregando uma mesa para um dos cantos, quando Suzuki, esbaforido,
veio para junto dele.
- Chefe, tem um cara aí querendo falar com o senhor.
Davis limpou o suor da testa com as costas da mão e olhou com raiva.
- É? E quem é esse cara que não vê que eu estou arrumando o maldito Bar do
Davis, com dois dias de atraso? Deveria estar pronto ontem, antes de sairmos da Base...
Um homem corpulento surgiu por trás do jovem japonês.
- O cara, senhor, é o novo Oficial Assistente de Segurança. E o atraso no seu
cronograma não me interessa.
Davis se esforçou para dar um sorriso. O homem na sua frente não era bem um
“homem”... Pelo menos, não era humano. Era forte, e os olhos eram completamente
brancos, com uma tatuagem decorando o olho direito. Não conhecia a raça, mas se ele era
da Segurança, não seria com ele que Davis iria encrencar.
- Ora, me desculpe! É que muitos vêm aqui de curiosos, só para ver como está
ficando... E isso atrapalha. Mas sente-se, senhor, e diga em que posso ajudá-lo.
O outro recusou o oferecimento e permaneceu em pé.
- Não vim atrapalhar sua arrumação. Só vim marcar alguns pontos que eu e meu
Oficial superior queremos que fiquem bem claros, senhor.
Ele respondeu abrindo seu sorriso mais cativante.
- Pode me chamar de Davis, meu chapa. Afinal, vamos conviver um bom tempo,
não é mesmo? Aliás, eu ainda não sei seu nome!
Davis tremeu ante o olhar que recebeu de resposta do Oficial de Segurança.
- Como eu disse, senhor Davis, vamos marcar alguns pontos. Não quero confusões
na nave. Se eu considerar seu bar nocivo para a ordem e segurança, vou fechâ-lo. Bebidas
alcóolicas são proibidas em uma nave da Federação. Se eu tiver a mais leve suspeita, eu
prendo o senhor por contrabando. E por ultimo, não sou seu chapa, e meu nome é alferes
Bannik, entendeu?
Por mais que quisesse responder, o barman engoliu em seco. Teria que agüentar
calado e não contrariar.
- Claro, Alferes Bannik. Cumprirei suas recomendações.
- Espero que sim, senhor Davis. Com sua licença.
Enquanto Bannik se afastava, Davis ficou parado olhando. Apertou os punhos e
resmungou.
- Você ainda vai me implorar algo de joelhos.
E voltou para a sua arrumação.

***

As duas primeiras semanas de Wills na nave foram agitadas. Tentava arduamente se


adaptar. Sua experiência como assistente de ciências na USS Lisbonne tinha sido
maravilhosa, mas não lhe preparara para a Endeavour. A nave comandada por Fernan
Magellan era uma simples nave de pesquisa, onde todos eram cientistas e como tal se
portavam. Lá, Wills se sentira em casa. Mas quando veio o aviso de sua promoção, ela foi a
única a ficar triste. O velho Capitão a recomendara, e ficou feliz com seu sucesso.
E agora aqui estava ela, exercendo sua função, não mais como assistente em uma
nave de pesquisa, mas como Chefe de Ciências em uma das principais naves da Frota.
Estava sentada no console de sensores, fazendo uma vistoria de rotina. A ponte estava
vazia, até que de repente ela ouviu vozes. Ficou aborrecida, pois precisava de paz e
sossego para trabalhar.
Eram as oficiais de operações, Tami e T‟mir, conversando sobre rotas e
alinhamentos. Wills não gostava da jovem assistente. A meio-vulcana parecia desprezar
toda a cultura e filosofia de sua raça, se comportando como uma humana. A sua superior
era uma jovem séria e ponderada, com quem Wills simpatizava mais.
As duas se sentaram no console de operações e continuaram conversando. Pelo
que Wills entendeu, a conversa girava em torno de uma possível rota dos contrabandistas
ferengi para entrar e sair do sistema Janus. Wills voltou a se concentrar no trabalho, até
que o Conselheiro entrou na ponte, cumprimentando a todos. A cientista se limitou a
levantar a cabeça.
- Então, como vai indo nossa emocionante missão de patrulhamento?
T‟mir soltou uma leve risada.
- Conselheiro, se todas as minhas missões na Frota forem assim, vou voltar para
Vulcano e abrir um consultório de psicologia em Shikahr... Acho que não tenho duas
semanas tão paradas desde que entrei na Academia Vulcana de Filosofia.
Chaz riu da piada sobre Vulcanos. Era uma linha típica de todas as faculdades e
centros de ensino de psicologia na Federação: psicólogos em Vulcano morrem de fome e
tédio, pois se os Vulcanos não admitem emoções, como fazê-los falar sobre elas.
Wills fechou a cara. Realmente não simpatizava com ela. Como se atrevia a fazer
pouco de uma filosofia mais do que milenar? Tentou novamente se concentrar no trabalho,
mas eles continuaram a conversar.
- Mas como os ferengi conseguem entrar e sair de Janus, que é um sistema bem
interno da Federação?
- Justamente... É isso que estamos tentando descobrir, Conselheiro. - Tami olhou
para o console. - T‟mir e eu estamos durante as últimas semanas tentando descobrir as
rotas usadas por eles.
T‟mir ia adicionar alguma coisa, mas nesse momento, o Capitão entrou na ponte
junto com os Oficiais de Segurança. Spencer cumprimentou a todos, nisso sendo imitado
por Heavyside, que se juntou ao grupo que conversava. Enquanto isso, Bannik se dirigiu ao
seu lugar sem nem ao menos olhar para o lado. Sentou-se e começou a mexer no console
tático. Wills apreciava a seriedade de Bannik. Ele quase nunca falava e quando o fazia,
sempre se relacionava a serviço.
Foi quando o Conselheiro contou uma piada. O Capitão sorriu, Tami esboçou um
sorriso, Heavyside riu e T‟mir soltou uma risada alta e cristalina. Wills olhou com
reprovação, mas ela nem reparou. Mas quando Bannik se virou para ela de cara fechada, a
moça enrubesceu, abaixou o rosto e pediu licença a sua chefe, pois “precisava tomar
algo.”.
“Fascinante.” pensou Wills, “Eu não sabia que o Alferes Bannik tivesse tal poder
sobre a mestiça. Realmente intrigante.”

***

A hora de almoço na nave era sempre movimentada. E Davis na hora do almoço


era simplesmente o mais charmoso e irresistível atendente da Federação. Ia de mesa em
mesa, cumprimentando um, se apresentando a outro, anotando os pedidos. Suzuki, no
balcão, ia e vinha da cozinha, trazendo os pratos que eram pedidos. Davis fazia questão de
fazer ele mesmo a comida, que deixava pronta em porções individuais congeladas, que
esquentava na hora de servir. Isso era, na maior parte, o motivo do Bar do Davis estar
sempre cheio nas horas de refeição. E em um mês e meio, Davis servira mais do que em
seis meses na Base Estelar 3, onde tivera um restaurante.
Davis parou um pouco e viu o salão quase lotado. Todas as mesas estavam
ocupadas, e somente alguns lugares estavam vagos. Sorriu satisfeito ao pensar no lucro que
teria. Seu contrato com a Federação lhe reembolsaria por refeição servida, e nesse ritmo,
ele poderia se aposentar antes dos 30. Olhou para a porta que se abria e viu o Oficial de
Segurança Assistente, o “detestável Bannik” como o chamava em pensamento, entrar no
salão. Aproximou-se, com o sorriso mais respeitoso que conseguiu.
- Ora, se não é o Alferes Bannik que finalmente veio provar da minha comida.
- O meu sintetizador de alimentos quebrou. E esse é um bom motivo para poder
vigiar o senhor e ver se está agindo de acordo com os regulamentos. - Bannik olhou com
frieza para Davis.
- Regulamentos? Eu vivo pelos regulamentos da Frota, não respiro sem consultá-los.
- Se Davis sorria, mentalmente mandava o tyrriano para todos os infernos da Federação, e
mais alguns outros fora dela. - Bom, deixe-me procurar um bom lugar para o senhor sentar
e comer.
Davis procurou pelo salão e achou uma mesa que parecia adequada. O Engenheiro
Chefe Salek, um vulcano extremamente educado e até mesmo simpático se isso era
possível em um vulcano. Ao seu lado esquerdo, Johnny Welker, seu assistente, um
excelente jogador de pôquer, que passava algumas de suas horas de folga jogando com
Davis. Na frente do vulcano estava Heavyside, o superior de Bannik, outro companheiro
de pôquer. E do lado dele, estava o único Oficial da ponte que freqüentava com
assiduidade o Bar do Davis, o Conselheiro Chaz. Duas cadeiras vazias, uma de frente para
a outra completavam a mesa. Davis levou Bannik até lá, anotou seu pedido e saiu. “Eles que
o agüentem agora, eu tenho mais o que fazer.”
Bannik sentou-se a mesa e cumprimentou a todos de maneira seca. Heavyside o
cumprimentou com um alegre “Alô, Bannik.” e os outros acenaram com a cabeça. Welker
retomou o assunto.
- Bom, voltando ao assunto, ainda acho que a Oficial de Ciências é a melhor delas.
Heavyside fez um gesto de desdém.
- Aquela geladeira? Um beijo dela e você viraria picolé. Sou mais a vulcaninha de
Operações. - revira os olhos. - Ela é uma gracinha, e ainda por cima simpática.
O vulcano comeu uma colherada de um caldo avermelhado e cremoso e se dirigiu
ao Conselheiro.
- Um dia, Chaz, gostaria de saber por que os humanos têm o hábito de falar de
mulheres que obviamente não sabem que eles existem.
O Conselheiro sorriu.
- Uma das nossas peculiaridades, Salek. Não conseguimos evitar na maior parte das
vezes.
- Ah, fala sério, Chaz, que você nunca reparou em nenhuma delas. O senhor Salek
eu nem digo nada, ele deve estar longe do próximo pon-farr, mas você... - Heavyside olhou
acusadoramente para sua vítima. - Quer dizer que nem a japonesinha você olha?
Chaz foi salvo por Davis, que chegou com o pedido de Bannik e bebidas para os
demais. Chaz sempre se sentira atraído por Tami, mas nunca demonstrara. Como Aaron
percebera, ele não sabia.
- Calma, conselheiro. Eu estou brincando, não precisa fazer essa cara de nojo!!!
Chaz quase suspirou aliviado quando ouviu Welker resolveu inquirir o tyrriano.
- E você, Bannik? Já está de olho em alguém da nave? Na geladeira, na vulcana, na
japonesa, na deltana da sala de transportes, na trill de operações...
Bannik parou de comer e olhou com severidade para o Alferes.
- Alferes Welker, eu não me encontro nesta nave para fazer conquistas amorosas
ou viver um romance. Eu fui chamado para desempenhar uma função, e isso será o que
vou fazer enquanto estiver na Frota.
“Por que essa agressividade?” Pelo que Chaz sabia dos tyrrianos, eles eram calmos
e pacíficos, até mesmo bem humorados. E o comportamento de Bannik até esse momento
tinha provado isso, apesar da excessiva seriedade. “Deve ter algo nessa questão que o
incomoda.” Se preparava para perguntar algo que ajudaria a analisar melhor o outro,
quando Heavyside falou.
- Olhem, se não é a senhorita T‟mir de quem estávamos falando. Olhem, parece
que o Davis vai trazê-la para cá. - o Tenente ajeitou disfarçadamente o uniforme, enquanto
Welker passava as mãos no cabelo.
Realmente Davis trazia T‟mir até a mesa. Puxou a cadeira para que ela se sentasse.
Depois de anotar o pedido dela, olhou para os que estavam sentados na mesa e disse.
- Muito bem, senhores. Comportem-se, há uma dama presente. - e se retirou.
A jovem Alferes sorriu para os presentes. Chaz pensou no quanto ela deveria estar
se sentindo desconfortável. Mas para sua surpresa, ela virou para Heavyside.
- Bom, vocês podem continuar a conversar. Eu não ligo.
Salek levantou a sobrancelha.
- Não creio que gostaria de ouvir a nossa conversa.
- Por que vocês não tentam? - Davis chegou com o prato dela, uma salada verde
com pedaços de carne de polvo, e um copo de chá gelado. Ela bebeu um gole e sorriu para
todos.
Welker era o mais expansivo na mesa e resolveu “pagar para ver”.
- Estávamos comentando sobre a companhia feminina na nave, sobre quem seria a
nossa favorita. - Chaz pode ver a face de T‟mir revelar um interesse quase profissional ao
ouvir isso. “Hábitos antigos morrem devagar.”, pensou.
- Fascinante, John. E a que conclusão chegaram?
O vulcano parecia, para Chaz que o conhecia há algum tempo, quase divertido com
a curiosidade de T‟mir e o embaraço de Welker e Heavyside. Bannik comia de olhos
baixos, mas Chaz percebeu que às vezes, quando achava que não havia ninguém olhando,
ele levantava a cabeça e olhava fixamente a moça a sua frente. “Hum, curioso...”
- Parece-me, T‟mir, que meus jovens companheiros se encontravam divididos entre
a sua pessoa e a Oficial de Ciências. - o vulcano apontou os homens, que ficaram
constrangidos. - Mas por motivos de ética não irei dizer qual.
- E nem precisa, senhor Salek, já sei quem escolheu a quem. - T‟mir levantou as
sobrancelhas e olhou para Heavyside, que de repente achou seu prato muito interessante e
abaixou os olhos para ele. - Mas o senhor e o Conselheiro, não entraram na conversa?
- Como vulcano, acho mais interessante a mente feminina do que sua figura. Mas
devo admitir que a senhorita tem uma... estampa talvez seja o termo... extremamente
bonita. - T‟mir inclinou a cabeça de leve ao escutar o cumprimento. Sabia que não era uma
cantada ou coisa do tipo, apenas uma opinião sincera. - E ao Chaz foi impingida a Srta.
Adachi.
Chaz fez um gesto de “eu não sei do que ele está falando.” T‟mir sorriu.
- Ora, que curioso. - Ainda sorrindo, olhou para o homem a sua frente. - E você,
Alferes, o que tem a dizer?
O tyrriano olhou para ela com a mesma fúria que olhou para Welker. Chaz chegou
a pensar que ele seria grosso com a moça também. Mas quando ele reparou melhor, viu
que não era fúria, era algo muito intenso, mas não hostil. O tyrriano se limitou a olhá-la,
sem dizer nada. De repente, saiu, deixando o prato pela metade.
T‟mir olhou para os demais, que pareciam tão espantados quanto ela.
- Foi algo que eu disse?

***

A ponte de comando estava calma, como sempre nos últimos três meses. O único
incidente digno de menção foi um Alferes sonâmbulo que resolveu invadir a ponte em um
dos turnos noturnos e atacar T‟mir e Ix, a jovem trill que dividia o console com a meio-
vulcana. Mas Heavyside, que estava na ponte, rapidamente conseguiu retirá-lo sem mais
problemas. Isso lhe valeu a alcunha de “salvador de donzelas”, dada por Davis, juntamente
com um copo de cerveja romulana sintetizada e um tapinha nas costas.
Era hora da mudança de turno. Tami e T‟mir passavam coordenadas uma para a
outra, enquanto Bannik fazia seu relatório para Heavyside. T‟Gar entrou na ponte e se
juntou ao seu Comandante, assim como Chaz, que o acompanhava.
- Alguma novidade, Capitão?
- Não nos últimos três meses, T‟Gar. Ainda bem que agora só falta mais um.
Apresente seu relatório, Conselheiro.
Chaz se empertigou um pouco.
- O Alferes Anderson se sente envergonhado e culpado e insiste em pedir desculpas
pessoalmente à T‟mir e Ix. Para evitar mais esse constrangimento a elas, disse que ele não
deveria. Parece que consegui convencê-lo. Está indo a Enfermaria tomar uma hipospray de
calmante todas as noites, como confirmei com o Dr. Zamblivinsk. Fora isso, apenas queixas
comuns em situações... entediantes.
Spencer reprimiu um suspiro com custo.
- Essa é a palavra, Conselheiro. Entediante. Sr. T‟Gar, eu gostaria que...
A voz de Tami o interrompeu.
- Senhor, mensagem subespacial de emergência. Mas o código é ferengi.
- Na tela, Tenente.
- A mensagem é só de áudio, senhor. - Apertou alguns botões. A voz saiu, filtrada
pelo tradutor universal.
{Qualquer na#xiiiiiixtsy##ve que escu#ziiiiiisxte#te. Essa é a nave
Tl#chhhhhae#engar, estamos sobre ataque. Não conseguimos reconhecer nossos
atacantes. Por favor, rápido.}
O silêncio imperou na ponte depois que a mensagem terminara. Antes mesmo que
Spencer perguntasse, a meio-vulcana falou.
- A origem da mensagem é da borda do sistema. ETA em meia hora, em dobra 4.
- Dobra 4, Alferes? Não é possível ir mais rápido?
- Impossível senhor. - Antes que T‟mir completasse, a Oficial de Ciências se
intrometeu.
- Senhor, o sistema Janus é repleto de detritos e pequenos asteróides. Uma maior
velocidade implicaria em um maior risco de pequenos e múltiplos impactos, que poderiam
danificar o escudo, até mesmo penetrá-lo.
T‟mir dirigiu um olhar no mínimo glacial para a outra mulher.
- Obrigada, Tenente Williams. Era o que eu ia dizer.
Spencer pensou por segundos.
- Tenente Adachi, trace rota para as coordenadas definidas pela alferes. Dobra 4,
agora. Alferes T‟mir, mensagens em todas as freqüências possíveis.
Olhou para seu Chefe de Segurança, que se empertigara ao ouvir a palavra
“ferengi”.
- Senhor Heavyside, alerta amarelo. Quero escudos levantados ao chegarmos perto
da nave.
- Sim Capitão.
A meia hora seguinte se passou de maneira tensa. Nenhuma outra comunicação
fora recebida, e as mensagens enviadas não obtiveram resposta. Spencer podia sentir a
tensão de cada membro de sua tripulação. Via as luzes amarelas piscando, indicando o
alerta. Quando ouviu a meio-vulcana falar, despertou de seus pensamentos.
- Capitão, ETA em 5 minutos.
- Tenente Wills, quero sensores no máximo, círculo de um ano luz tendo como
centro a nave ferengi. Quero sinais de vida, sinais de energia, radiação... Tudo o que for
possível.
- Sim senhor.
Quando chegaram ao seu destino, uma nave ferengi meio destruída se encontrava a
deriva. Pequenos pedaços de metal flutuavam ao seu redor, e mais nada estava a vista.
- Tenente Adachi, freqüências abertas. Transmita pedido de identificação. Tenente
Wills, quais os resultados dos sensores?
- Pequenos resíduos de raios energéticos, e um outro tipo de traço residual

semelhante ao de um wormhole3.
- E a nave?
- Sistema de suporte de vida funcionando em 50% da capacidade. Integridade do
casco comprometida em três setores.
- E a tripulação?
A jovem ergueu o rosto, muito séria, para o Capitão.
- Nenhum sinal de vida. Estão todos mortos.
As palavras da Oficial de Ciências ficaram suspensas na ponte. T‟mir olhou para
Heavyside e engoliu em seco enquanto ele fez como se assobiasse. Bannik abaixou a
cabeça e Chaz abanava a sua se recusando a acreditar. T‟Gar foi o primeiro a quebrar o
silêncio.
- A senhorita tem certeza? Conferiu todos os sinais?
Wills respondeu em um tom glacial, dando a perceber que se sentira ofendida pela
colocação feita pelo meio-klingon.
- Todos os sinais foram conferidos duas vezes, senhor, e ainda chequei a calibragem
dos sensores. Não existem sinais de vida macrobiológica na nave.
T‟Gar franziu ainda mais a testa. O Capitão permaneceu quieto, refletindo. O que
poderia em meia hora ter destruído uma nave de comércio ferengi e sumido sem deixar
rastros? Levantou-se.
- T‟Gar, Hanges, Adachi e Heavyside na sala de reuniões. Agora. - se virou para a
Oficial de Ciências. - Tenente Wills, pegue todos os dados obtidos pelos sensores e leve
para a Engenharia. Analise juntamente com Salek.
Ela simplesmente assentiu com a cabeça, enquanto transferia os dados para um
PADD. Saiu da ponte, sem dizer mais nada. Spencer se virou para os dois Alferes.
- T‟mir e Bannik, a ponte está sobre seus cuidados. Qualquer problema, quero ser
contatado imediatamente, entendido?
- Sim capitão. - os dois responderam juntos. Heavyside falou de repente.
- Senhor, considero mais sensato que eu permaneça na ponte. Bannik tem minha
permissão para falar em meu lugar.
Spencer concordou após refletir um pouco.
- Entendido, Tenente. A ponte é sua, então.
E seguiu seus demais oficiais que já estavam na sala de reuniões.

***

Todos os chefes da ponte estavam sentados na mesa de reuniões. Tami se sentia


um pouco desconfortável, nunca quisera um cargo de chefia. Entrara na Frota apenas com
a intenção de servir e honrar a tradição de sua família. O Capitão entrou na sala e não
sentou. Apoiou as mãos na mesa e disse:
- Muito bem senhores, estamos com uma certa urgência. Alferes Bannik, nossa
situação.
O tyrriano se levantou e se empertigou antes de fazer seu relatório.
- Os phasers e os torpedos fotônicos estão armados e prontos, senhor. Só
aguardando ordens de disparar. Os escudos estão prontos e em perfeitas condições. Os
oficiais de tático e segurança em seus postos e aguardando. O que quer que tenha atingido
os ferengi, não nos atingirá desprevenidos.
- Muito bom. Temos que descobrir o que aconteceu naquela nave.
T‟Gar, sem pedir, levantou-se de súbito.
- Devemos então descer até lá, senhor. Vamos até lá e checamos os bancos de
dados da nave.
Tami viu Chaz balançar a cabeça negativamente. Ele começou a falar, no tom
pausado que usava quando tentava convencer alguém.
- Descer até lá é uma atitude temerária. Apesar dos sensores, não sabemos se o
que matou todos os tripulantes daquela nave ainda está ou não lá dentro.
O meio-klingon sorriu para o Conselheiro, mostrando os dentes. Tami sentiu um
arrepio. T‟Gar era um oficial respeitado e competente, mas sempre a incomodava quando
sorria daquele jeito, mostrando os dentes.
- Então, senhor Conselheiro, nós vamos ter que arriscar. Eu me ofereço para
liderar o grupo de descida.
Chaz ainda fez mais uma tentativa de tentar trazer o Primeiro Oficial a razão.
- E quem iria descer com o senhor?
Antes que T‟Gar pudesse falar, Bannik se ergueu.
- Pedindo permissão para me juntar ao grupo de descida.
Chaz fez um gesto de “eu desisto”. Spencer acenou com a cabeça afirmativamente.
- Permissão concedida, Alferes.
Ainda tentando ser o „cabeça fria da reunião‟, Chaz interveio novamente.
- Seria adequado alguém da equipe médica.
O Capitão concordou e abriu comunicação com a Enfermaria.
- Spencer para Zamblivinsk. Precisamos de um voluntário para o grupo de descida.
{O.k., Capitão. Mas não conte comigo. Eu mandarei um voluntário para a sala de
transporte 2 agora mesmo. Zamblivinsk desliga.}
- Resolvido. Mais alguma sugestão?
- Mais alguém da segurança, senhor. - T‟Gar olhou para Bannik. - O Tenente
Heavyside seria útil lá embaixo.
Bannik respondeu o olhar de T‟Gar com uma expressão de desafio. Tami resolveu
falar algo. Sentia-se oprimida pelo clima tenso que está na sala.
- Não seria recomendável um dos dois, ou Bannik ou Heavyside, ficarem no tático?
- Não se preocupe, Tenente Adachi. – Spencer falou. - Eu ficarei na ponte, e um
oficial tático menos graduado também. Mais alguém?
T‟Gar desviou o olhar de Bannik.
- Alguém que possa operar com precisão os painéis da nave. Alguma sugestão,
Adachi?
Ela pensou por alguns instantes.
- A minha assistente, T‟mir, é sensata e competente. Creio ser a melhor opção.
Tami se assustou com a resposta ríspida do tyrriano.
- Senhor, eu sou contra. Não sabemos o que vamos encontrar lá. Não podemos
garantir a segurança de ninguém.
Spencer demonstrou sua irritação encarando o Oficial de Segurança.
- Sr. Bannik. Se tiver algo contra a Alferes T‟mir, sugiro que guarde para outra
ocasião. Reunião encerrada.

***

T‟mir e Heavyside ficaram em silêncio quando os outros saíram da ponte. A meio


vulcana tentava não demonstrar seu nervosismo, mas estava quase perdendo o controle.
Uma nave ferengi, mesmo pequena, não era um alvo fácil. Se o que tivesse pego aqueles
ferengis resolvesse voltar, teriam sérios problemas. Heavyside deve ter notado seu
nervosismo, pois saiu do seu lugar como Chefe de Segurança e sentou ao lado de T‟mir.
- Nervosa, Alferes?
Ela conseguiu forçar um sorriso.
- Um pouco, Tenente. Não esperava encontrar uma ameaça tão cedo.
- Fique calma, tudo vai dar certo. É a sua primeira nave?
- É sim. Antes, servi quase um ano na Base Estelar 16.
- No sistema Épsilon Endi? Por que não continuou em Bases?
T‟mir suspirou. Começava a relaxar um pouco.
- Gosto de conhecer coisas novas. E em uma Base, eu não conseguia ver muito
disso.
Aaron sorriu para ela.
- Então. Para se conhecer coisas novas, é preciso passar por situações onde não se
sabe o que vai vir. - Ele coloca a mão no ombro direito dela. - E além do mais, eu estou
aqui para proteger você, esqueceu que eu sou o “salvador de donzelas”?
T‟mir sorriu e ia dizer algo. Mas a porta da sala de reuniões se abriu. Heavyside se
pôs de pé em um pulo. O Capitão veio até eles.
- Alferes T‟mir, Tenente Heavyside, vocês farão parte do grupo de descida, junto
com o Alferes Bannik e o Comandante T‟Gar. Boa sorte.
Durante alguns segundos, o coração de T‟mir pareceu ter parado. Ela não queria
descer, ainda mais com Bannik no grupo. Algo no jeito de olhar do tyrriano a incomodava,
e não era somente a ausência de pupilas. Heavyside percebeu o nervosismo de T‟mir
aumentar e olhou para ela, sorrindo, tentando lhe transmitir uma confiança que não sentia.
Ela abaixou os olhos e disse, a meia voz.
- Sim senhor. - e o grupo de descida se dirigiu ao elevador, para se encaminhar para
a sala de transportes.

***

Estavam na sala de transportes da nave ferengi. Com os sentidos apurados que seu
sangue meio-klingon lhe dava, T‟Gar podia sentir um cheiro acre e pungente no ar. O
recinto estava vazio e silencioso. “Como um túmulo”, pensou ele, se arrependendo em
seguida. Não era momento para esse tipo de pensamento. Os outros quatro integrantes do
grupo de descida estavam ali, parados, esperando ordens. T‟mir e o jovem Alferes médico
pareciam assustados e nervosos, enquanto que os dois oficiais de segurança pareciam até
mesmo ansiosos para prosseguir.
- Coloquem os phasers em tonteio. T‟mir e Durden, fiquem atrás de nós.
Bannik imediatamente falou.
- Comandante, não seria melhor que o senhor e o Tenente Heavyside fossem na
frente, seguidos pelo Alferes Durden, depois pela Alferes T‟mir, e que eu fechasse a nossa
retaguarda?
T‟Gar ficou algo surpreendido com a proposta de Bannik. Afinal, ele mesmo dissera
que não teriam como proteger ninguém. Uma olhada rápida para T‟mir lhe deu o motivo.
“Uma coisinha linda dessas, com essa cara de choro, até eu iria protegê-la.” Alto, ele disse:
- Boa idéia, Alferes. Muito bem, T‟mir, abra a porta.
A meio vulcana se dirigiu para os controles da porta. Em questão de segundos, a
porta escorregou para o lado, com um suave “vuuusch”. Seguiram pelo corredor, na
formação sugerida pelo tyrriano. O cheiro piorou e agora os demais também o sentiam.
Mas nem sinal de vida... ou de morte. T‟mir tinha restabelecido as luzes do corredor
principal onde se encontravam, mas tudo estava vazio.
Quando chegaram na porta da ponte de comando, T‟Gar fez com que Bannik e
Heavyside se postassem com os phasers armados a frente do grupo. Ele próprio se
colocou ligeiramente atrás deles. T‟mir e Durden ficaram de lado, na frente do painel. Ao
sinal de T‟Gar, ela acionou o comando da porta.
A cena que viram foi terrível até mesmo para T‟Gar, que desviou o olhar. Ele
escutou T‟mir soluçar e viu quando o tyrriano a virou de costas, murmurando algo como
“Você não precisa ver isso”. Heavyside abaixou a cabeça. O único menos abalado foi
Durden, que acostumado com a morte, só empalideceu um pouco. Pedaços de corpos
ferengi espalhados pelo chão e pelos consoles e até pelo teto da ponte. Sangue e vísceras
por todo o lado, e um cheiro acre se espalhava. “É daqui que vem o cheiro então.”
Pedaços de metal retorcido que antes haviam sido componentes de algo. Recuperando o
autocontrole, T‟Gar reassumiu a liderança.
- Vamos entrar logo. T‟mir, feche a porta assim que entrarmos, e bloqueie os
controles externos. - Ela demorou um pouco a reagir, ainda meio recostada no tyrriano.
Mas de repente ela ergueu a cabeça, disse “Sim, Comandante.” e foi até os consoles que
ainda estavam inteiros da nave. Quando as portas finalmente se fecharam, T‟Gar se sentiu
mais tranqüilo.
- Heavyside, Bannik, mantenham-se alertas. Usem os tricorders. T‟mir, veja se
consegue acender as luzes e acessar os registros de bordo da nave. - enquanto eles faziam
o que pedira, T‟Gar chegou perto de Durden que examinava um corpo mais ou menos
intacto.
- O que o senhor acha que pode ter sido, Alferes?
O jovem ruivo franziu a testa.
- Não posso dizer algo mais profundo sem um exame acurado, senhor, mas foi algo
cortante, como pode ver por esse talho aqui. - Aponta para um ferimento que varava o
tronco do ferengi. - Mas algumas lacerações parecem ter sido produzidas por dentes,
como essas, onde encontrei vestígios de matéria de origem desconhecida. Estou passando
os dados para a Endeavour através do meu tricorder. O Doutor Zamblivinsk irá analisá-los.
- Ótimo.
As luzes principais se acendem. T‟Gar pode ver Heavyside operando os terminais
de força, enquanto T‟mir tinha se sentado na cadeira de comunicações. Bannik operava
outro console, que pelo que o Primeiro Oficial podia ver era o console de Ciências.
Resolveu contatar a Endeavour.
- T‟Gar para Endeavour.
{Fala Spencer. O que está acontecendo aí, Comandante?}
- Confirmamos as leituras dos sensores, Capitão. Estão todos mortos. E de uma
maneira nada agradável.
Depois de uma pequena pausa, Spencer responde:
{Eu acho, Número Um, que devíamos env...////*****/////...}
De repente, as comunicações foram subitamente cortadas.
- Capitão? Capitão? Endeavour...
T‟Gar olhou para os demais. Estava com um péssimo pressentimento.
***

T‟mir mexeu nos consoles da nave tentando contatar a Endeavour novamente, mas
não obteve sucesso. Ela tentou mais uma vez, e nada. Controlando-se para não bater com
os punhos no console, ela virou-se para T‟Gar e disse:
- Nada senhor... O que quer que seja, além de bloquear o sinal de nossos
comunicadores, deve ter cortado os canais externos de comunicação.
Ela viu Bannik olhar para o console de ciências e sacudir a cabeça.
- Algo está mesmo bloqueando comunicações com nossa nave, pois não consigo
registrar nem um ruído de fundo. Pode ser algum tipo de pulso extremamente forte
atuando no campo subespacial.
Mal o tyrriano acabou de falar, escutaram um barulho alto, semelhante ao de
alguma coisa se esfregando no casco metálico da nave. Heavyside e Bannik prepararam
seus phasers.
- Seja lá o que for que fez isso com os ferengi, parece que está de volta. E pelo
estrago, creio que nosso encontro com ela não será nada agradável. – Heavyside falou,
parecendo estar preocupado.
O barulho aumentou cada vez mais até que parou. Mas o alivio deles durou pouco.
T‟mir concentrava-se em abrir comunicação com a Endeavour quando ouviu um ruído de
metal sendo rasgado. Não demorou muito para uma perfuração aparecer na porta.
Reprimiu um grito.
Uma espécie de garra negra forçou o metal da porta, abrindo-a de alto a baixo,
deixando um enorme buraco. Através desse buraco, passou um ser de mais ou menos 2
metros de altura, recoberto por uma couraça biomecânica formada por várias placas.
Possuía garras ao invés de braços e era bípede. T‟mir mal conseguiu respirar, se sentindo
tomada pelo pânico. Todo o autocontrole que seus professores vulcanos tentaram lhe
ensinar não servia de nada, tudo o que ela podia sentir era uma imensa sensação de medo
e impotência. Demorou até que ela percebesse que seu próprio medo se misturava ao
medo dos outros, mas principalmente do Alferes médico. “Claro, Heavyside e Bannik
foram treinados para controlarem seus medos, assim como T‟Gar. Ele não, é apenas um
cientista...”. De alguma maneira, o pensamento a acalmou. E mais ainda, quando viu
Heavyside e Bannik se colocarem na frente dela, com as mãos nos phasers.
O alienígena ficou parado, olhando para eles. Balançava a cabeça de forma
ameaçadora, mas não mexia mais nada. Parecia estar os examinando.
- Fiquem calmos, vamos ver se é pacífico. - T‟Gar dirigiu-se ao estranho ser. -
Saudações, eu sou o Tenente-comandante T‟Gar, Primeiro Oficial da nave da Federação
USS Endeavour. Viemos em paz. Quem é você?
“Pacífico? Ele fez picadinho da tripulação de uma nave ferengi e você ainda tem
dúvidas?” T‟mir permaneceu junto ao console da comunicação. Com os dois Oficiais de
Segurança na sua frente, podia tentar abrir novamente os canais para se comunicar com a
nave, enquanto T‟Gar se dirigia ao estranho ser. Conseguiu uma freqüência nova e
sussurrou para o comunicador da nave ferengi.
- Endeavour, estamos sendo atacados.
Mas quando ela ia receber a resposta da Endeavour, o alienígena pronunciou
algumas palavras incompreensíveis, que o tradutor universal não conseguiu identificar. Os
sons emitidos soaram apenas como grunhidos de um animal feroz e curioso. Assustada, ela
desligou o comunicador.
Um brilho se fez e, ao lado da criatura, outro ser semelhante apareceu teleportado.
O recém-chegado disse na língua da federação:
- Nós somos caçadores. Viemos aqui pelo Grande Portal. Esta nave e sua carga são
nossa propriedade, assim como vocês.
T‟mir estremeceu, pois até seus sentidos empáticos fracos se sobrecarregaram com
as emoções dos alienígenas. Ela viu Heavyside sinalizar para Bannik se manter em alerta,
enquanto T‟Gar respondia.
- Em nossa cultura, - continuou T‟Gar. - prezamos muito a liberdade individual. Não
vamos aceitar isso!
Definitivamente, não foi uma boa resposta. A criatura soltou um som parecido com
uma risada.
- Liberdade não existe para vocês nem para o seu povo! - respondeu a criatura. -
Vocês são apenas comida e substrato para nossas crias!
O meio-klingon sussurrou para seus companheiros
- Preparar phasers... Potência letal.
Ela não gostava da idéia de ver alguém matar uma coisa viva, mas no caso seria uma
questão de vida ou morte para os oficiais. Viu Heavyside ajustar seu phaser de forma ágil e
discreta, com os dedos e sem movimentar os braços. Bannik também ajeitou o seu.
Os alienígenas pareceram perceber a movimentação deles. Um deles,
provavelmente o líder, começou a mover uma de suas garras para cima com a ponta para
baixo, como alguém que segura uma faca para apunhalar. T‟mir sentiu arrepios, pois havia
visto o que aquelas garras tinham feito com os ferengi.
T‟Gar deu a ordem de apontar. Heavyside levantou o braço direito mirando o seu
phaser na altura média de um dos seres. Bannik mirou e T‟Gar saiu da linha de fogo.
Quando o meio-klingon gritou fogo, os três atiraram juntos. Por um breve instante,
ela quase pôde sentir o calor do pulso de energia emitido pelo phaser. O impacto foi direto
e certeiro. O caçador foi arremessado contra a parede. O cheiro, um misto de metal e
material orgânico queimados rapidamente misturou-se ao odor da matéria em
decomposição na ponte ferengi. Mas antes de qualquer outra ação, T‟mir se viu envolvida
por uma intensa luz azul, assim como T‟Gar e Durden. T‟mir se sentiu mais tranqüila, mas
segundos antes de sumir da nave ferengi, percebeu que Bannik e Heavyside ficaram. Gritou
para avisá-los, mas sua voz se perdeu.
Quando se viu na sala de transportes, na frente de um Alferes Johnson muito
aliviado, ela olhou para seus companheiros. Realmente os dois Oficiais de Segurança haviam
ficado. T‟Gar resmungou algo, enquanto o Alferes Durden saía para a Enfermaria.
“E agora, o que acontecerá com eles?”

***
Spencer podia sentir a tensão de todos na ponte. O grupo de descida já tinha ido há
mais de 15 minutos e não ainda entrara em contato ainda. Quando T‟Gar entrou em
contato, se sentiu aliviado.
{T‟Gar para Endeavour.}
- Fala Spencer. O que está acontecendo aí, Comandante?
Ele ouviu o breve relatório do meio-klingon e refletiu por alguns instantes.
- Eu acho, Número Um, que devíamos enviar uma...
Antes que ele completasse a frase, a tenente Adachi falou.
- Capitão, a comunicação com o grupo na nave ferengi foi interrompida. Estou
tentando todos os canais, mas não consigo contatá-los em nenhum.
- Continue tentando, Tenente.
Um comunicado da Engenharia chega até a ponte.
{Capitão, aqui é a Tenente Wills. Os níveis de neutrinos lá fora aumentaram em
proporção avassaladora.}
- Qual a explicação para isso, Tenente?
{No momento nenhuma, mas estamos trabalhando para isso.}
- Quando chegar em algo mais conclusivo, avise. Spencer desliga.
A Tenente Adachi estava parada a seu lado.
- Senhor, o Dr. Zamblivinsk informou que também perdeu contato com o grupo de
descida. Disse a ele que...
Spencer esperou que ela completasse a frase, mas ela ficou parada, boquiaberta,
olhando para a tela. Surpreso com aquela reação da sempre controlada Adachi, Spencer
olhou na mesma direção. E teve a mesma reação por alguns segundos. Um wormhole se
abrira e de lá saíra uma estranha nave. Era até menor que a Endeavour, mas não se parecia
em nada com as naves que Spencer já havia visto. Sua própria aparência era ameaçadora. O
assombro de Spencer durou apenas alguns segundos, e ele reassumiu a postura de capitão
da nave.
- Atenção, todos aos seus postos, alerta vermelho. Tenente Adachi, tente
comunicação em todos os canais. - a nave se aproximara da nave ferengi e parara.
- Nada, capitão, eles não respondem. Mas, parece que o grupo de descida
conseguiu entrar em contato. - a jovem aperta alguns botões.
{Ende*%%###ur , esta*%%###s sendo a*%#%#%cados .}
- T‟mir, quem está atacando vocês?
Mas a meio-vulcana não respondeu. Novamente as comunicações haviam sido
cortadas.
- Spencer para a sala de transportes. Traga-os de volta.
{Capitão, só consigo travar o sinal em três deles.}
Por mais que ele não quisesse fazer essa escolha, ela era inevitável.
- Então os traga.
Pareceu uma eternidade para Spencer, mas segundos se passaram até que
novamente a sala de transportes entrou em contato.
{Senhor, temos três integrantes do grupo de descida a bordo: Comandante T‟Gar,
Alferes T‟mir e Alferes Durden.}
- Peça para o Comandante T‟Gar e a Alferes T‟mir virem até a ponte, se estiverem
bem.
Nesse momento, a voz do Primeiro Oficial ecoa na ponte.
{Capitão, peço permissão para resgatar o restante do grupo de descida.}
- Permissão negada, Número Um. Venha até a ponte.
Spencer sabia que seu Primeiro Oficial iria querer voltar, mas ele seria necessário na
nave.
{Sim senhor, a Alferes T‟mir e eu estamos indo para aí. T‟Gar desliga.}
A nave recém chegada preenchia toda a tela. Não era uma visão nada agradável,
mas Spencer não conseguia tirar os olhos dela. “Quais serão suas intenções?”

***

Tami olhava para o seu console, cada vez mais preocupada. A presença do alarme
vermelho a incomodava demais. Quando T‟Gar e T‟mir entraram na ponte, e sua auxiliar
se sentou ao seu lado, no leme, se sentiu um pouco melhor. Mas continuava preocupada
pelos Oficiais de Segurança que ainda estavam na nave ferengi. A ameaçadora nave ainda
estava lá, parada, como se estivesse esperando algo... ou alguém. Cinco longos minutos se
passaram sem que nada acontecesse.
- Senhor, estamos sendo sondados. - comunicou de repente a fria Oficial de
Ciências, sem nenhuma emoção na voz.
O capitão olhou fixamente para a tela, como se estivesse vendo os tripulantes da
estranha nave.
- Sonde-os também, Tenente. Vasculhe igualmente a nave ferengi, veja se tem
alguém nosso lá, ou se eles os fizeram de prisioneiros.
- Sim senhor. - ela olhou seu console por alguns segundos, que pareceram
intermináveis para Tami. - Sondagem da nave ferengi concluída. Não há formas de vida
macrobiológica.
Tami viu o Capitão morder o lábio inferior. Sinal de que estava seriamente
preocupado.
- E a nave alienígena?
Novamente a impassível Tenente apenas demorou alguns segundos para responder.
- Não posso dar certeza, senhor, mas pelos nossos sensores, há 85 % de chance de
existir formas de vida humanas na nave. Para confirmar, é necessário recalibrar os
sensores, devido ao grande número de neutrinos.
- Faça isso, Tenente Wills. Tenente Adachi, tente abrir um canal de comunicação,
vasculhe todas as freqüências.
- Imediatamente, senhor. - Tami respondeu, tentando aparentar calma embora
estivesse tão nervosa quanto toda a tripulação. Quando ouviu a voz de sua assistente,
demorou para conseguir discernir o que ela dizia, e pediu para que repetisse.
- Perguntei se quer ajuda, Tenente. Posso tentar achar uma freqüência alternativa,
acho que já sei até como.
Tami acenou com a cabeça. Metade de sua atenção se encontrava no console, a
outra no que acontecia na ponte. O Capitão pedira uma análise do primeiro contato para
Chaz, que colocou a mão no queixo e pensava. Tami confiava muito no Conselheiro e em
sua sensatez. Por isso, prestou atenção quando ele falou:
- Realmente, Capitão, acho que ainda é um pouco cedo para tirarmos quaisquer
conclusões. Sabemos que as culturas dos outros quadrantes, como suponho que esta seja,
se aquilo foi um wormhole, são quase sempre bastante diferentes das nossas. E pelo que o
Comandante T‟Gar descreveu, eles não parecem estar aqui pacificamente, não aos nossos
olhos humanos. Sugiro que entremos em contato, para entendê-los e aos seus motivos.
Afinal, o que nós chamamos de crueldade, para outras culturas pode ser uma coisa
rotineira. E assim que derem uma brecha, precisamos de uma reunião para levantar o que
já temos.
Tami se empenhou cada vez mais arduamente em estabelecer contato com a nave
desconhecida. Olhou para o lado e viu sua assistente tentando também, a testa franzida. Ao
vê-la, lembrou-se de uma velha freqüência comercial vulcana, abandonada pela Federação
há alguns anos. Não custava tentar. Quando obteve resposta, quase sorriu. Mas se conteve.
- Senhor, consegui estabelecer contato com a nave desconhecida. - Tami informou
enquanto abria o canal. Na tela principal, uma imagem retorcida de uma das criaturas toma
o lugar da nave. Ele era pior do que imaginara, uma criatura saída das mais sombrias lendas
dos seus antepassados.
- Criaturas, - inicia o alienígena, em tom neutro - vocês estão invadindo nossa área
de domínio. Nosso território. Por esse motivo vocês serão agregados a nossa nave. Sua
tecnologia será analisada e seus tripulantes serão o substrato para nossa reprodução.
Deponham suas armas. Dois de seus tripulantes já se encontram em nosso poder.
- Eu sou o Capitão Theodore Spencer da USS Endeavour, representando a
Federação Unida de Planetas. Quem são vocês? Nós não tínhamos conhecimento deste ser
um território habitado por outras raças capazes de viagens estelares.
Tami percebeu que o Capitão propositadamente ignorou as ameaças do seu
interlocutor.
- Não interessa a você saber quem somos, apenas o que pretendemos com você e
sua nave. - a voz saia sem expressão, e Tami não podia dizer se era por causa do
comunicador, ou se a própria criatura era assim, apática.
- Nós não queremos lhe fazer nenhum mal ou mesmo guerrear, viemos apenas por
que recebemos um pedido de socorro. - O Capitão foi interrompido pelo „Caçador‟.
- O que vocês desejam ou o que vieram fazer também não é importante, gado.
Você invadiu nosso território de caça e por isso, sua nave e sua tripulação são nossas
presas. Entregue-se ou lute.
Tami sentiu um arrepio percorrer sua espinha, e pode ver T‟mir fazer um gesto,
como se estivesse se benzendo. A resposta de Spencer foi a altura da ameaça.
- Nós não vamos aceitar suas ameaças, e não queremos agredi-los, mas eu não vou
deixar nada de mal acontecer com a minha tripulação. Podemos encontrar uma solução
pacífica para tanto.
- A escolha foi sua, gado. Esteja pronto para a luta. - a transmissão foi cortada, e
Tami não conseguiu reabrir. O Capitão falou com Chaz em tom irônico.
- É, Sr. Chaz, isto está ficando cada vez mais interessante. - Tami sabia que era a
maneira dele pedir a opinião do Conselheiro. Prestando atenção no que Chaz dizia, não
percebeu quando T‟mir se levantou e foi até o posto de Ciências.
- Sim Capitão. Interessante e visivelmente perigoso. É obvio que a criatura não tem
intenção alguma de se entregar, ou ceder, assim como nós. E temos dois pontos que nos
colocam em uma desvantagem cruel. Eles não só tem membros de nossa tripulação a
bordo, como também nos conhecem. Talvez possam não conhecer tudo o que somos
capazes, mas certamente sabem sobre nós muito mais do que sabemos sobre eles. Afinal,
até agora não sabemos de praticamente nada. Precisamos reverter esta situação de
qualquer maneira. Os dois lados estão requerendo direitos de exploração e rendição, mas
no momento, infelizmente, estamos em desvantagem.
A Ponte ficou em completo silêncio, enquanto Spencer pensava. Tami viu o
Primeiro Oficial se postar ao lado do Capitão, provavelmente ansioso para a batalha. Foi
quando notou que T‟mir não estava do seu lado. Ao procurá-la, viu que estava junto da
Oficial de Ciências. As duas estavam de cabeça baixa, olhando para o console, e a tensão
era visível no rosto da meio-vulcana. De repente, ela sorriu.
- Tínhamos razão, Tenente Wills. - e voltou para seu lugar, enquanto a Oficial de
Ciências informava ao Capitão o que ambas haviam descoberto.
- Senhor, a Alferes T‟mir e eu conseguimos abrir um canal de desvio nas
comunicações deles utilizando os próprios neutrinos como fonte de energia. Com isso,
estou conseguindo captar nossos oficiais.
- No áudio.
Wills já havia passando as configurações para o console de T‟mir. Tami olhou e ficou
impressionada. T‟mir reparou e disse, sorrindo.
- Os cálculos foram dela, eu só entrei com a idéia. - Tami preparou-se para pegar as
coordenadas assim que possível, para poder teletransportar os dois de volta, enquanto sua
assistente abriu o canal de comunicação.
- Canal aberto, Capitão. - e a Alferes prosseguiu. - Heavyside, Bannik, aqui é a
Endeavour. Respondam.
Os segundos se passaram lentamente, até que pelo comunicador, cheia de estática
mas audível, chegou a voz do oficial de segurança.
{Endeavour? Nossa, estou feliz em ouvir vocês!}
A voz de Bannik também se ouviu, parecendo plena de alivio.
{ T‟mir, é bom ouvi-la. Mas tire-nos daqui.}
- Imediatamente. - Tami olhou para seu console. “Essa não, os neutrinos não me
deixam travar o sinal deles.” Parecendo ler seus pensamentos, o Capitão olhou em sua
direção.
- Tenente Adachi, consegue travar no sinal deles?
- Não, senhor. Os neutrinos estão interferindo. - e nesse momento a nave
alienígena pareceu se mover ainda mais na direção da Endeavour. T‟mir tentou contatar
novamente os dois oficiais prisioneiros, mas não conseguiu resposta. Tami a escutou
tentando diversas vezes.
- Heavyside, Bannik, aqui é a Endeavour, respondam por favor....
T‟Gar, que havia ido para o console tático, levantou a cabeça, muito preocupado.
- Senhor, a nave parece estar carreg... - não chegou a terminar, pois o Capitão
gritou antes, intuindo o que estava acontecendo. Tami também podia sentir que em breve
estariam sobre ataque.
- Potência máxima para os escudos! Carregar phasers! Armar torpedos! - Um raio
verde saiu da nave, atingindo a Endeavour em cheio, fazendo a nave sacudir, com a falha
dos amortecedores de inércia. Antes que o Capitão pedisse reportes, Tami se adiantou.
- Perdemos os escudos dianteiros, sistema de navegação, e transportes!
- T‟Gar, dispare todos os phasers!
- Os bancos de phaser não estão carregados, senhor, de alguma forma eles foram
drenados também! - respondeu o meio-klingon.
- Então, os carregue novamente! - ordenou Spencer. Tami pode perceber pela tela
que outro raio vindo da nave. Mais uma vez a Endeavour sacudiu bastante. O Capitão que
estava em pé se segurou na sua cadeira para não cair.
- Status?
- Fomos atingidos diretamente, decks 15 e 16 com casco rompido. - informou
Wills.
- Alferes T‟mir, reporte as baixas. - a meio-vulcana rapidamente fez um chamado
pelos setores.
- Estão faltando 16 tripulantes na Engenharia Principal, Capitão. E a Enfermaria
reporta 15 feridos graves em diversos setores.
O Capitão, preocupado, bateu em seu comunicador.
- Spencer para Salek.
{Engenharia aqui, Senhor. Aqui é o Alferes Welker, o Tenente Salek não está a
bordo. E mais 15 dos nossos sumiram de repente.}
Tami sentiu um calafrio, que logo controlou. A gravidade da situação não permitia
qualquer deslize emocional. O seu console registrou um aumento da energia nos motores
da outra nave.
- Senhor, a nave deles está energizando os motores! Eles vão entrar em dobra!
- Podemos ir atrás?
Tami olhou para T‟mir, que estavam checando os sistemas de dobra. Ela balançou a
cabeça e apontou para as leituras no seu console. Tami respondeu ao capitão.
- Não senhor, o motor de dobra está avariado.
- Droga! - gritou Spencer batendo no braço de sua cadeira e vendo a nave se afastar
na tela.
Tami quase podia ouvir o que todos na ponte pensavam. O que teria acontecido
com Heavyside e Bannik?

Capítulo 3

Após a ofensiva, Aaron percebeu que o transporte estava sendo ativado. Ficou
imóvel, esperando retornar a nave da Federação. Mas no instante seguinte percebeu que
ele e Bannik não haviam sido focalizados e continuaram na nave ferengi. Não conseguiu
controlar sua frustração.
- Maldição, Bannik! Nós ficamos! - olhando para o oficial. “São dois contra um, já
que conseguimos derrubar um deles.” Redobrou a atenção.
A criatura que ainda estava de pé caminhou até o companheiro atingido. Por alguns
instantes fitou o ser ainda em agonia e depois tocou alguns controles. Em seguida uma
suave luz verde envolveu o alienígena ferido, e este já não estava mais presente na ponte. A
criatura voltou-se na direção deles.
- Sua atitude foi inútil. Deponham suas armas. - a voz da criatura era
completamente sem emoção.
- Caçador, se nos quiser comer, esteja à vontade para tentar... mas não espere que
esta refeição espere calmamente a primeira dentada. - retrucou o Alferes, com o alienígena
na mira de seu phaser. Aaron admirou a coragem de seu assistente. Mas a criatura ficou
novamente em posição ereta, apontando a garra esquerda para Bannik. Um zunido suave,
que ia do grave para o agudo, partiu da prótese mecânica do estranho ser. Assemelhava-se
a um phaser em sobrecarga. “Parece que o Bannik irritou o bicho feio.” Olhou para o
alienígena, apontando o phaser, e disse para seu assistente:
- Bannik, vamos sair daqui!
E qual não foi sua surpresa quando Bannik, num gesto súbito, o agarrou pelo
pescoço, num “abraço” do qual não havia chance de sair. Aaron só sentiu o cano frio do
phaser em sua têmpora.
- O que você está fazendo, Alferes? Ficou maluco? - Aaron sussurrou entre dentes,
num misto de intrigado e assustado. Bannik o ignorou, e virou-se para o Caçador, dizendo
em voz alta.
- Muito bem, Caçador... Deixe-nos sair daqui vivos de volta à nossa nave senão eu
desintegro-nos a ambos, e você fica sem comida para a sua prole. Já!
“Esperto, muito esperto, Bannik. Tomara que eles caiam.”
A criatura olhou para o tyrriano e respondeu logo.
- Isso não importa... Há muita mais carne de onde vocês vieram. - de repente, o
Caçador, como Bannik o havia chamado, calou-se de repente, olhando fixamente o teto da
ponte de comando por segundos. Depois, sem dizer mais nada saiu da ponte, deixando
Bannik e Aaron a sós. Bannik soltou o pescoço de Aaron, que o esfregou. “Não sabia que
tyrrianos eram tão fortes.” Os dois oficiais olharam-se intrigados. Olhou o seu tricorder.
- Há uma nave de configuração estranha acoplada a esta. - disse. Bannik, olhando
para o monitor de leituras de sensores. - Oh-oh...
- Como assim, “oh-oh”?
- Se ela sai dali, ficamos com 30 segundos de ar antes do sistema de suporte de vida
falhar.
- “Oh-oh” é pouco, Bannik. - “Pense rápido, Aaron... Como iremos sair daqui?” De
repente uma saída apareceu em sua mente.
- Vamos embora daqui, Alferes. - disse. - Talvez as cápsulas de suporte de vida
estejam funcionando.
Ambos saíram correndo da ponte para o corredor, sem dar importância para as
substancias internas e partes ferengi em que pisavam. Aaron parou e olhou o esquema da
nave, pintado em uma das laterais do corredor.
- Maldição, tudo o que precisávamos... Não há cápsulas neste convés. - enquanto
Aaron olhava desesperado, tentando achar uma outra saída, sentiu-se sendo erguido do
chão. Bannik agarrou-o e continuou a correr pelos corredores até um orifício no teto
onde, colado ao metal da nave, se encontrava uma substância biomecânica, muito
semelhante à couraça que revestia os Caçadores. O orifício estava fechando devagar.
- Mas... Mas isso é... - ele olhou incrédulo para o Alferes.
O tyrriano acenou com a cabeça.
- É sim. Não há outra solução, senhor. Vamos, suba, antes que feche. - meio a
contragosto, Aaron concordou em subir. Depois que os dois passaram, a passagem se
fechou. “Agora não tem volta. Endeavour, não demore!”

***

Bannik e Aaron caminhavam devagar pelo corredor da estranha nave, tentando


investigar cada centímetro das paredes ao seu redor. Tudo era estranhamente silencioso, e
o tyrriano começava a se sentir angustiado. E o fato de estar preso na nave de uma raça
estranha e hostil não ajudava. Tentou quebrar o silêncio, falando com seu companheiro.
- E agora, o que faremos, senhor? - nesse instante, atravessaram um portal,
entrando em um novo corredor. Aaron simplesmente balançou a cabeça, e prosseguiram
no mesmo silêncio angustiante de antes.
Nesse corredor, as paredes laterais formavam apêndices paralelos à direção do
corredor, dois metros à frente e atrás dos oficiais, que ficaram parados, perplexos.
Enquanto tentavam entender aonde tinham chegado, os prolongamentos se juntaram,
unindo-se, e se expandiram, formando um recinto hermeticamente fechado. Bannik passou
as mãos pelas paredes, tentando achar um ponto fraco, mas sem sucesso. Estavam em um
beco sem saída, e Bannik tinha a sensação que estava em uma ratoeira.
- Estamos presos! - exclamou Aaron, soando tão frustrado quanto o próprio Bannik
se sentia.
- Parece que estas paredes têm olhos e ouvidos, senhor - respondeu.
- Sim. - o Chefe de Segurança olhou para cima, analisando o teto, procurando
alguma falha. - O sistema de segurança desta nave parece agir como um organismo vivo, e
ao perceber nossa presença, nos isolou como uma possível ameaça.
- Irá nos eliminar? - um arrepio subiu pela coluna de Bannik ao fazer essa pergunta.
- Ou assimilar. Mais provável que só esteja nos retendo aqui até que alguém, ou
algo, venha ver o que está acontecendo.
Perderam alguns minutos analisando com seus tricorders. Nada de conclusivo,
apenas leituras confusas de sinais tecnorgânicos. Para tentar afastar o silêncio que cobria o
corredor, Bannik puxou conversa.
- Bem, sempre poderia ser pior.
Heavyside fez um grunhido, sem levantar a cabeça do seu tricorder. Interpretando
isso como sinal para continuar a conversa, Bannik prosseguiu.
- A T‟mir poderia ter ficado também, aí teríamos que nos preocupar com ela.
O outro homem levantou a cabeça e olhou na direção do Alferes.
- Uma coisa que você vai ter que me explicar quando voltarmos é por que essa
implicância com ela. Não dá para entender. A Alferes é boa pessoa, nem parece que tem
sangue vulcano. Além de ser bem bonita. E que eu saiba nunca fez nada contra você... -
Bannik virou a cabeça para o outro lado e voltou a olhar para o seu tricorder. Também não
saberia explicar ao seu superior o porquê da meio-vulcana o afetar tanto. Ficaram em
silêncio, até que passado um tempo, Heavyside falou.
- Por causa do tipo de ruído que detectamos na nave ferengi, é bem provável que
aquele corte nas comunicações tenha sido causado pela abertura de um wormhole. E
como wormholes tendem a estabilização ou fechamento, talvez possamos restabelecer
contato com nossa nave...
- É uma idéia, senhor.
O humano tentou, batendo no seu comunicador.
- Aaron para Endeavour.
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Ele olhou desolado para Bannik, balançando a cabeça.
- Apenas estática...
Mas mal ele terminara de falar, as paredes do recinto recém-formado começaram a
desprender um líquido com brilho e consistência semelhante ao mercúrio. Formava-se
vagarosamente, escorrendo para o chão. Imediatamente, ambos verificaram os tricorders.
Era algum tipo de substância formada por nanoestruturas.
- Temos que sair daqui logo, não gostaria de ter contato com... essa coisa. -
exclamou Aaron.
Bannik concordava plenamente e ajustou seu rifle phaser. Apontou para uma das
paredes recém formadas e atirou persistentemente por um minuto. Conseguiu abrir uma
abertura que não se fechou, porém era pequena demais para a fuga. Sentiam o calor da
energia desprendida pelo phaser no ambiente e Bannik sentiu-se perder as esperanças. No
mesmo instante, ambos receberam um fraco sinal em seus comunicadores.
{Heavyside, Bannik, aqui é a Endeavour. Respondam.}
Os dois se entreolharam. Bannik sentia a esperança ressurgir. Reconheceu a voz
como sendo da meio-vulcana. Heavyside sorriu.
- Endeavour? Nossa, estou feliz em ouvir vocês!
Bannik, a voz expressando todo o alívio que sentia, também respondeu.
- T‟mir, é bom ouvi-la. Mas tire-nos daqui. - naquela situação, ouvir qualquer voz
conhecida seria um alívio, mas Bannik mal disfarçara o quanto havia sido reconfortante a
voz preocupada da jovem oficial de Operações. Os dois ficaram imóveis por algum tempo,
esperando pelo teletransporte. Mas nada aconteceu. Bannik tentou, então, entrar
novamente em contato com a nave.
- T‟mir, aqui é Bannik... Responda. Vamos, T‟mir, por favor... - mas não teve
resposta. “Não conseguiram travar no nosso sinal.”
Foi quando o buraco feito por Bannik começou a fechar. O Alferes pegou o rifle e
atirou, mantendo o diâmetro. Mas passados alguns minutos, percebeu que não adiantaria
manter por mais tempo o phaser disparando contra a parede. Até porque a arma já estava
quase descarregada. De repente, as paredes cederam por completo. Bannik olhou para
Heavyside, mostrando um sorriso de vitória. Estavam saindo pelo corredor quando se
depararam com um grupo de cinco criaturas iguais às que haviam encontrado na nave
ferengi.
- Criaturas... - iniciou a maior delas, que deveria ser o líder do grupo. - Baixem suas
armas e acompanhem-nos. Vocês estão sob nossa custódia.
Bannik tentava mostrar uma cara impassível para não demostrar o terror que sentia
das criaturas. Nem olhou para Aaron para que a fina linha do seu autocontrole não
quebrasse. “Tenho de ser firme, tenho de ser corajoso, tenho de... lembrar-me que tinha
um bom emprego em Tyrria e estaria muito melhor lá,... hey hey hey: lembre-se onde
está, homem. Você já foi um embaixador, um diplomata. Use as suas habilidades como se
isto fosse um primeiro contato.” Ele respirou fundo e começou a falar.
- Caçador... Bem-vindo ao Quadrante Alfa. Em nome da Federação Unida de
Planetas, a qual esta região está aliada, quero dizer que estamos aqui em paz e sem alguma
intenção de sermos hostis para convosco.
O Caçador olhou-o de alto a baixo. Bannik não podia dizer com certeza, mas algo
no gesto indicava desprezo.
- Hostis? Humano, nós somos...
- Hum, perdão... Humano não... Humano é o Tenente Heavyside, aqui ao meu
lado. Eu sou tyrriano, por favor.
Agora o Caçador parecia quase irritado.
- Que seja, tyrriano. Nós praticamente destruímos a sua nave. Quão hostis vocês
poderão ser?
Bannik olhou Aaron e disse-lhe, ignorando a pergunta do Caçador:
- Estratégia Cinco. Bem pensado da parte do Capitão. - Aaron olhou Bannik com
espanto. Temendo que seu superior pudesse dizer algo que estragasse o seu plano, Bannik
deu lhe um pisão no pé.
- AAAAAAHHHHH... Claro, a estratégia número 5... com certeza. Quer dizer que
agora vem o... - Heavyside olhou para Bannik, dando a deixa para que ele continuasse.
- Exato.
O Caçador observou esta troca de impressões em silêncio. Depois falou.
- O que é a estratégia número 5?
- A manobra da Corbomite. - respondeu Bannik.
O Caçador olhou-os fixamente por alguns instantes, e acabou por falar.
- Acompanhem-nos. Esta conversa já durou tempo demais.
- Também acho... Tempo suficiente para o Capitão ativar a Corbomite, Caçador.
Você e os seus irão destruir naves ferengi no que quer que passe por uma vida além da
morte para vocês...
- Isso é uma ameaça... tyrriano? - o Caçador parecia ter saído de sua apatia, e ficado
realmente irritado. Bannik pode ouvir Heavyside murmurar algo como “Agora ferrou”, mas
se manteve impassível.
- Não, um aviso. Há mais... A não ser que você nos mate, claro. Aí não diga que não
avisei...
O Caçador olhou-os e arrancou os comunicadores dos dois, atirando-os ao chão.
Agarrando o phaser de Bannik, apontou para os pequenos dispositivos e disparou. Os
comunicadores eram agora algo negro e derretido no chão. A criatura olhou para Bannik,
visivelmente satisfeita.
- Nada de truques, tyrriano. Acompanhem-nos agora!
E assim, enquanto Bannik e Aaron caminhavam pelo corredor, à frente dos
Caçadores, Bannik sorria para si mesmo, pensando que no Caçador fizera: os
comunicadores padrão da Frota Estelar eram programados para emitir um sinal fortíssimo
quando destruídos, para facilitar a localização dos corpos dos oficiais por eventuais equipes
de salvamento. O sinal conjunto dos dois comunicadores seria mais que suficiente para que
a Endeavour captasse, e seguisse a nave dos Caçadores. Agora, era só esperar que desse
certo. E foi com essa esperança que o tyrriano seguiu a criatura.

***

Spencer olhava o monte de detritos que um dia foi uma nave ferengi. Assim que a
nave desatracara, a compressão havia feito o resto. Com seus oficiais de segurança lá
dentro. Sentia-se frustado e impotente. A ponte estava em silêncio desde que a nave
sumira. O único som era o do trabalho contínuo dos sistemas da nave.
- Senhor, alguns dos tripulantes faltantes se encontram na nave alienígena. - falou a
Tenente Wills. Se a Oficial de Ciências não fosse tão fria, Spencer poderia dizer que ela
gostava de cortar o silêncio com notícias ruins. Antes mesmo que o Capitão pudesse
responder, ouviu Adachi reportar, visivelmente triste e preocupada, por trás de sua
fachada séria:
- Senhor, acabo de receber um sinal fortíssimo proveniente dos comunicadores do
Tenente Aaron e do Alferes Bannik. - a jovem oriental encarou o capitão com tristeza no
olhar. - Eles foram destruídos.
A raiva e a frustração dele só aumentaram. Nos últimos três meses, aprendera a
confiar nos dois oficiais. O simpático Aaron e o sério Bannik, agora mortos. Ouviu
novamente a voz de Wills, que o tirou de seus pensamentos.
- Senhor, a informação da Tenente está confirmada. Realmente o sinal é
proveniente dos comunicadores de ambos. - Wills rapidamente pressionou uma dúzia de
botões em seu painel. - Também confirmo o sinal de vida de ambos, senhor.
O Capitão, muito tenso, voltou-se para Wills em um tom muito sério.
- Baseada em que informações pode afirmar algo assim, Tenente?
- Analisando o espectro normal do comunicador quando destruído e comparando
com o acréscimo dos espectros biológicos de cada um deles, utilizando informações das
fichas médicas, senhor.
- Impressionante! - disse T‟mir. A meio-vulcana se virou para Spencer. - Senhor, eu
posso fazer uma sugestão?
- Sim, Alferes T‟mir, diga. - Spencer olhou para a meio-vulcana.
- Se rastrearmos o sinal dos comunicadores, mais os vestígios deixados pela dobra,
talvez consigamos localizar os...
A Oficial de Ciências a interrompeu bruscamente.
- Nossos sensores não têm essa capacidade, Alferes. - a voz era fria e incisiva. -
Qualquer cadete saberia disso. O sinal dos comunicadores só chegou até nós porque foram
programados para isso.
Mas a mestiça não se deixou abater. Spencer simpatizava com a moça, justamente
por isso. Ela não ligava para a opinião dos outros, ainda mais quando sabia que estava certa.
- Mas e se calibrássemos novamente os sensores? Temos uma boa chance de
conseguir... E assim poderíamos resgatar os tripulantes, o que, como qualquer cadete do
primeiro ano sabe, é uma das prioridades de uma nave da Frota. - Wills não respondeu,
mas o Primeiro Oficial se intrometeu.
- Senhor, permissão para ajudar na Engenharia. Possuo alguns conhecimentos que
podem ser úteis na recuperação da nave, e eles vão precisar de mais gente, quando
redirecionarem uma parte da equipe para recalibrar os sensores.
Spencer se virou para seu primeiro oficial, sorrindo. T‟Gar resolvera o impasse do
jeito dele
- Permissão concedida, Número Um. Veja o que pode fazer por lá. - o meio-
klingon se virou a caminho do turbolift, mas Spencer lhe dirigiu mais algumas palavras.
- Ah, Número Um, veja se nos coloca com capacidade de dobra o mais rápido
possível. Depois de encontrá-los, ainda precisaremos resgatá-los.

Capítulo 5

Tami não se sentia muito bem. Tentava ficar concentrada em seu trabalho, mas
aquela dor de cabeça estava se tornando insuportável. “Droga... Acho que o balanço da
nave não me caiu bem... Não Tami. Você não tem nada. Concentre-se em seu trabalho...”
Como sempre, Tami estava sendo muito exigente consigo. Seus pensamentos e sua
tentativa de concentração foram quebrados pela voz do Capitão, que estava
acompanhando os reparos ali mesmo na ponte.
- Srta. Adachi, como estão os reparos?
- O Comandante T‟Gar está progredindo, Capitão. Mas ainda é muito cedo.
Acredito que dentro de meia hora poderemos ter uma maior certeza. Mas os sensores já
foram recalibrados e estamos fixos no sinal de Bannik e Heavyside.
- Muito bem, continue monitorando. - disse o Capitão, tornando sua atenção para a
oficial de ciências. Enquanto falava com a oficial, o comunicador de Spencer foi acionado.
{T‟Gar para Spencer!}
- O que foi, Número Um?
{Consegui traçar um plano contra os Caçadores, junto com o Alferes Welker.}
Tami tentou se concentrar no que T‟Gar e o Capitão diziam, mas não conseguia. A
dor de cabeça aumentava. Olhou para o lado e viu a face de T‟mir, preocupada, a olhando.
Tentou não transparecer mais o seu incômodo.
Não mais que quinze minutos se passaram quando o Capitão se dirigiu a ela.
- Tenente Adachi, eu vou para a minha sala. Continue monitorando os reparos e me
informe qualquer mudança.
- Sim, senhor.
Tami continuava a não se sentir bem. Tentava ao máximo manter os olhos nos
controles, mas sentia-se cada vez mais fraca. Quando estava prestes a apagar, sentiu uma
mão em seus ombros, e uma voz calma e conhecida falou.
- Senhorita Tami? Não me parece nada bem. - disse Chaz, visivelmente
preocupado. A oficial tentou se recompor.
- Não, Conselheiro. Eu estou bem. Não há com o que se preocupar. - disse isso
levando uma mão à testa.
- Não, Tenente. Você não está bem. Você vai para a Enfermaria por vontade
própria, ou serei obrigado a reportar ao Capitão e arrastar um enfermeiro até aqui? -
apesar de estar sorrindo, os olhos do Conselheiro mostravam a seriedade das suas
palavras.
- Não acredito que será necessário, Conselheiro. Obrigada. - Tami estava no
comando da ponte. O Primeiro Oficial estava na engenharia, ajudando com os reparos, e o
Capitão estava em sua sala. Ela precisava ficar.
- Tenente. Se o seu problema é o comando da ponte, eu chamo o Capitão e me
entendo com ele. Por favor. Precisa ver o que tem... Por favor?
Tami olhou impassivelmente para Chaz durante os segundos que se passaram. Mas
baixou os olhos, e sem dizer absolutamente nada, tocou em seu comunicador.
- Capitão.
{Spencer falando.}
- Não me estou me sentindo muito bem. Poderia ficar, mas o senhor Chaz acha
melhor que eu faça uma visita à Enfermaria.
{Ele tem toda a razão. Precisamos aproveitar esse momento de espera para fazer
qualquer reparo, seja físico ou material. Dispensada, Tenente. Estarei indo para ponte em
alguns minutos. O Conselheiro está aí?}
- Sim, Capitão.
{O comando é dele até a minha volta. Estarei ai logo. Spencer desliga}
- Ouviu o Capitão, Tenente. Enfermaria.
- Alferes T‟mir. O leme é seu. - disse Tami para sua assistente. E batendo em seu
comunicador, comunicou ao Alferes Möller para voltar ao posto que ela estava deixando.
- Vejo você mais tarde, Tenente Adachi.
- Obrigado conselheiro. Mas não devo demorar.
- Demore o tempo que precisar. Dispensada.
Tami sabia que Chaz nunca diria “dispensada” para ela. Mas ele provavelmente
havia dito isso para manter o protocolo, e seguir aquilo que tinham combinado, desde que
se reencontraram a bordo da Endeavour. Tami gostava disso, e Chaz sabia que estava
agradando sua velha amiga de Academia. Tami se retirou da ponte, seguindo para a
Enfermaria.

***

Chaz viu Tami sair da ponte, e se sentiu satisfeito por ter conseguido convencê-la a
fazer algo sensato.
- É uma pessoa difícil e forte... Duvido que se eu falasse, ela iria para a Enfermaria
por vontade própria. - disse o Conselheiro, sorrindo pela vitória, para T‟mir.
- Realmente, é uma pessoa forte, Conselheiro. - Chaz viu T‟mir dar um pequeno
sorriso. Na psicologia, aprendeu o quanto a mente pode se libertar de um vínculo, não
importando o quão profundo ele fosse, mesmo que fosse genético. Sempre que via a
Alferes T‟mir sorrindo, era a prova de que quaisquer vínculos podiam ser realmente
quebrados. - Senhor, quando tempo ainda ficaremos nessa situação?
- Estamos numa situação bastante complicada, Alferes. Qualquer especulação agora
seria inútil. Só nos resta esperar. Eu só espero que os Caçadores também esperem por
nós...
- Não sei... Quando eu encarei um deles na nave ferengi, senti uma sensação tão
estranha... De fome e ódio.
Chaz viu T‟mir voltar ao seu console, enquanto a ponte permanecia em silêncio.
Mentalmente, tomou nota das palavras da Alferes. Apenas o barulho dos computadores
funcionando, sendo recolocados em ordem, quebrava o estranho silêncio da ponte.
Foi quando se deu conta da situação. Ele estava no comando. Na USS Algol tinha
ficado no comando por diversas vezes. Recebera ótimo treinamento de comando de seu
grande mestre, o Capitão Steve Harris. Mas desta vez, ele estava no comando da USS
Endeavour. Sabia que a situação de comando era temporária. Mas naquele momento, Chaz
começou a realmente se sentir em casa. Sabia que tinha a confiança e as habilidades
necessárias para exercer aquela tarefa, mesmo naquela situação. Não se entrega o
comando de uma nave estelar, em situação alguma, as mãos de qualquer um. E Chaz
recebia este privilégio. Olhando para o profundo espaço a sua frente, com seus milhões de
estrelas, sentiu que ali era o lugar onde sempre quisera estar, mesmo perseguindo
„caçadores‟ alienígenas. Sorriu.
Segundos depois, acordou. Não podia ficar parado, perdido em devaneios. Dirigiu-
se a Oficial de Ciências Wills:
- Alferes Williams. Como está o sinal dos nossos oficiais?
- Estou conseguindo manter um bom contato, senhor. Mas eu realmente não sei
por quanto tempo.
Chaz pensou por instantes antes de falar.
- Faça registros periódicos da última posição, de dez em dez minutos. Caso
percamos o sinal, vamos precisar de qualquer rastro dele.
A jovem ergueu uma sobrancelha e respondeu, no tom seco que Chaz já conhecia
como característico dela.
- Isso está sendo feito desde o primeiro sinal recebido, senhor.
Neste momento, antes que Chaz pudesse respondê-la, o Alferes Möller chegou à
ponte. Ele parecia um pouco desorientado e sem rumo. Chaz foi até seu encontro, aliviado
por não ter que responder a Oficial de Ciências.
- Assuma seu posto, Alferes Möller. Auxilie a Alferes T‟mir no que for necessário.
- Sim, senhor Conselheiro, senhor. - respondeu o gorducho Alferes. Chaz voltou
para o meio da ponte mais uma vez. Após poucos minutos, o Capitão Spencer retornou à
ponte e se dirigiu a ele.
- Conselheiro, preciso que elabore um plano de ação para lidarmos com os
Caçadores quando os encontrarmos novamente. E não creio que possamos contar com a
diplomacia.
Chaz pensou por alguns instantes.
- Capitão, esta caçada parece ser algo natural deles. E pelo tom de voz com que o
Caçador se manifestava, ele parecia gostar do que estava fazendo. São como os nobres da
Terra da época medieval. Os senhores na frente caçando pelo puro prazer. Mas atrás
deles, vem os soldados e os cachorros, pegando carne fresca para alimentar toda a corte.
Ou como um leopardo caçando um coelho, não é só instinto, é prazer. Estamos no
território deles. E como tal, somos como alces ou coelhos para eles, somente esperando
para sermos devorados... E qual era a única coisa que os coelhos podiam fazer quando
encontravam um leopardo?
- Fugir? - respondeu um atencioso e intrigado Capitão.
- Não, precisamos usar de esperteza. Falar com eles não pareceu adiantar muito. E
lutar, muito menos. Já vimos o que as armas deles nos causam. Precisamos de uma
estratégia “fazer e fugir”. Como brincar de “polícia e ladrão”. Se eles não puderem nos
pegar, não poderão fazer nada. Se conseguirmos restituir os motores de dobra, e se os
sensores de transporte estiverem em ordem, podemos despistá-los até que ganhemos
tempo para alguma outra atitude. É um plano arriscado, eu sei, mas fazer o jogo de caça e
caçador me parece ser nossa única saída.
O Capitão ficou calado por alguns instantes, antes de dar sua opinião.
- Muito bem, Sr. Chaz, acho que entendo sua idéia. Vamos ver se conseguimos
implementar.
Chaz sorriu mais uma vez, vendo sua opinião ser aceita tão facilmente.
- Capitão...
- Sim Conselheiro?
- Gostaria de ir até a Enfermaria para ver como está a Tenente Adachi.
Erguendo uma sobrancelha entre intrigado e divertido, Spencer liberou o seu
Conselheiro.
- Fique a vontade, Conselheiro.
- Obrigado Capitão - Chaz se retirou em direção a Enfermaria.

***

Os dois tripulantes da USS Endeavour foram conduzidos em silêncio até uma ala da
nave onde sentiram um forte cheiro de material orgânico no ar. No caminho, Bannik e
Aaron observavam os corredores da nave. Ao contrário dos corredores das naves Borg,
esses eram muito bem acabados, com paredes perfeitamente lisas, de linhas quase
orgânicas. Arcos em distância regular pareciam compor uma estrutura de corredores.
Aaron anotava mentalmente o caminho, para saber em que direção estavam indo. Ainda
não perdera as esperanças de fugir.
- Prisioneiros, estes são os seus alojamentos. - o alienígena apontava para algo que
se parecia com uma cela. Ele se virou para o responsável pela cela - Prepare os outros para
a retirada.
“Retirada”. O tom de voz do Caçador dizia a Bannik e Aaron que algo não estava
bem. Bannik olhou com atenção para dentro da cela, e percebeu alguns rostos conhecidos.
- Aaron, olhe! É o Tenente Salek, e outros tripulantes da Endeavour! - o tyrriano
parecia contente em rever os oficiais. Aaron olhou com atenção e realmente viu os seus
companheiros de nave.
- Silêncio, gado. Vocês não devem ficar contentes com esse reencontro. - o
Caçador que parecia ser o responsável pela seção disse em um tom quase sarcástico. Mal
acabou de dizer essa frase, entrou na cela para sair logo depois, puxando o engenheiro
vulcano pelo braço. Ao passarem por ele, Aaron percebeu que tanto Salek parecia estar
estranhamente dopado. Os dois oficiais de segurança foram colocados junto com os
restantes, que também pareciam sedados, mas não houve tempo para conversas. Logo em
seguida, apareceram mais dois caçadores e levaram os outros tripulantes, deixando-os a
sós. Seguiram-se minutos de silêncio e agonia para Aaron, que via Bannik tão agoniado
quanto. De repente, ouviram um grito seco e curto, originado por uma voz bem conhecida
deles.
“Salek... Meu Deus, o que estará acontecendo?” Aaron olhou assustado para
Bannik. Logo em seguida, ouviram-se mais gritos, todos iguais. Todos cheios de uma agonia
dopada, para não sentir os horrores da morte. E no fim, nada mais, só o silêncio. Depois de
longos minutos naquela atmosfera opressora e sufocante, surgiu uma criatura, igual às
outras, apenas com a garra levemente modificada. Segurava algo parecido com uma seringa
hipodérmica, cheia com um líquido de cor amarelada, espesso e de aparência
assustadoramente letal.
- Nós somos “caçadores”, porém somos piedosos para com nossas presas... - disse
a criatura que entrava na cela. - Isto irá reduzir o nível de consciência de vocês, para que
sintam menos dor. Assim, sua dor não atrapalhará o processo de assimilação.
Bannik e Aaron se entreolharam. Aaron tomou coragem e perguntou à criatura:
- O que é isto? Se vamos morrer, pelo menos gostaria de saber o que estão me
aplicando.
- O que vamos lhe aplicar é uma mistura de um sedativo regular, com o que vocês
chamariam de “nano-probes”, programadas para desativação e purificação de seus órgãos
internos. Nós retiraremos todos os órgãos internos, pele e queratina para provisão de
nossos próprios corpos. O restante será reciclado e transformado em ração para nossas
crias. Alguns corpos iram ser reservados vivos para dar suporte de vida às larvas. -
ignorando os protestos e a relutância dos dois, como se fosse meros insetos, injetou o
líquido amarelo em ambos.
- Descansem, gado. Em breve estarão na sala de reciclagem. - a criatura olhou pela
última vez para os dois, antes de seguir seu caminho. Seu olhar era frio e desprovido de
qualquer sentimento pelo que iria ser feito dos dois. Depois que ela saiu, Aaron se ajoelhou
no chão, sentindo o desespero se abater sobre ele, juntamente com os “nano-probes”
começando a agir. A mão de Bannik pousou em seu ombro, e antes que o tyrriano dissesse
qualquer coisa, ele ergueu a cabeça e encarou os estranhos olhos, inteiramente brancos, de
seu assistente.
- Nós vamos morrer, Bannik. Nós vamos morrer. - o outro não disse nada, apenas
deixou a mão no ombro de seu chefe. Aaron continuou.
- Se eu não voltar e você sim, prometa que irá tomar conta da Endeavour, como se
ela fosse o tesouro mais precioso do mundo. - o tyrriano assentiu com a cabeça. Aaron
abaixou a sua e deixou correr uma lágrima, filha do desespero de um homem que sabia
estar inexoravelmente condenado.

***

Enquanto andava pelo corredor que ia levá-lo até o turbolift, Chaz entrou em
contato com a Enfermaria.
- Chaz para Doutor Zamblivinsk.
(Zamblivinsk. Pode falar, Conselheiro)
- Como está a Tenente Adachi?
Mesmo pelos filtros do sistema de intercomunicação, Chaz pode perceber o tom
divertido da voz do médico.
(Ela está na minha frente neste momento. E teimando em dizer que está bem, e
que precisa voltar. Mas não a deixarei voltar ao trabalho, até que ela coma um bom prato
de comida!)
- Como assim? Estou indo para aí agora.
(Venha Conselheiro. Acho que o senhor poderá resolver isso. Leonardo desliga)
Chaz apressou o passo. Ao entrar na enfermaria, viu o Doutor, ainda com um
tricorder na mão, fazendo alguns últimos exames, insistindo para que Tami continuasse na
cama.
- Conselheiro, que bom que veio.
A expressão do médico era a mesma de sempre, jovial e despreocupada.
- Qual o problema, Doutor ? O que ela teve?
Com um gesto que lembrava um professor repreendendo um aluno travesso, o
médico olhou desaprovadoramente para Tami.
- Não o que ela teve. Mas o que ela não teve. Ela não fez uma refeição sequer o dia
todo!
O Conselheiro deixou transparecer todo o alívio que sentia, ao saber que era
somente falta de comida.
- Ela não foi a única, Doutor. Eu estava agora mesmo indo para o Bar do Davis. -
sorriu para o médico que balançou a cabeça.
- Pois a leve junto com o senhor. E não saiam até que ambos comam o suficiente.
Não quero mais gente caindo de fome na minha Enfermaria! - disse o doutor, com um tom
irônico, porém descontraído.
- Sim, Doutor. Sem problemas. Tenente Adachi? Me dá a honra deste almoço? -
disse o Conselheiro, estendendo a mão.
- É... Parece que eu não tenho escolha... - a Tenente respondeu em tom irônico,
enquanto levantava da cama tendo a mão do Conselheiro como apoio. Assim, os dois
saíram em direção ao Bar do Davis, onde este os recebeu com a habitual festa.
- Ora, mas quanta honra para meu pobre Bar! Tenente Adachi! O que posso trazer
para a senhorita?
Antes que ela pudesse abrir a boca para responder, Chaz começou a enumerar
uma lista de pratos japoneses. Davis anotou tudo em um PADD, e depois os levou até uma
mesa.
Enquanto a comida não chegava, os dois ficaram calados. Mas em cinco minutos, o
barman apareceu com mais de oito pratos diferentes, pedindo desculpas pela comida ser
do replicador.
- Mas vocês sabem como é difícil ter um bom peixe a bordo de uma nave, só
congelado. E aí não tem graça.
Depois que o tagarela Davis se afastou, Chaz olhou impassível para ela, esperando
que Tami começasse a comer a quantidade absurda de pratos que haviam sido colocados
na frente dela.
- Chaz... eu acho que você exagerou... Um só bastaria...
- Dois. No mínimo. - respondeu em um tom misto de repreensão e brincadeira -
Pelo que o Doutor falou você não tomou café. E para ser sincero, eu não vi você aqui de
manhã.
O Conselheiro percebeu que sua amiga ficou sem graça.
- Na verdade, eu nem jantei ontem. Estava tão cansada que fui dormir direto. Hoje
queria chegar cedo na ponte e acordei um pouco atrasada, então não tomei café para dar

tempo de chegar na hora certa... – falou, encarando um prato de udon3. Sentia-se um


pouco enjoada, por isso respirou profundamente algumas vezes.

- Itadakimasu4! - disse por fim tomando coragem e começando a comer. Chaz


sorriu.

- Muito bem! - disse ele enquanto pegava um prato de tori no mizutaki5 - Vamos
ver que gosto tem isso aqui!
Ele fez uma careta, e Tami sorriu de leve, deixando-o satisfeito. Começaram a
conversar sobre coisas banais, cuidadosamente evitando falar sobre o que estava
acontecendo na nave.
O almoço continuou por mais algum tempo. Logo depois, Tami seguiu para seu
alojamento, mais por imposição de Chaz do que por vontade própria. Chaz se dirigiu para
a ponte, onde continuaria de vigília, aguardando com os outros.

Um caçador trazia Bannik, o arrastando pelo chão. O Oficial de Segurança já estava


praticamente inconsciente, pois o efeito da droga que fora injetada já era bem avançado.
Não sabia onde estava Heavyside, só se lembrava que ele havia sido levado na mesma
direção dos outros.
Bannik foi jogado no meio de uma sala. O Caçador levou sua garra com um líquido
verde nela, até o corpo de Bannik, e injetou o conteúdo. Alguns minutos depois, o Oficial
da Frota começava a retomar a consciência. A câmara de regeneração tinha um formato
circular, e nas paredes, que tinham a mesma aparência orgânica do resto da nave, havia
quatro casulos. Três deles estavam vazios, mas no quarto havia uma criatura parecida com
os Caçadores que já ele havia visto. Ela parecia estar morta e tinha o rosto mutilado, talvez
por um tiro de um disruptor. Um dos braços parecia ter sido de um Borg pois possuía
vários implantes típicos da espécie. Contudo, o outro braço parecia ser de um Vorta.
Found‟tzar – o tyrriano ouvira outro Caçador se referir a ele dessa forma – retirou Bannik
do chão e o colocou em um dos casulos vazios. As paredes do casulo se moldaram ao
corpo dele e o envolveram totalmente. Depois que o viu “acomodado”, o caçador saiu da
sala. Sentiu os membros tomados por uma estranha dormência. Os olhos se tornaram cada
vez mais pesados e se fecharam, praticamente sozinhos.
Bannik abriu os olhos, olhando em volta. O cenário era todo branco. Não havia
mais nada, senão uma imensa vastidão de branco. Um espaço. Um vazio. Um... vácuo? Não
estava mais deitado, mas sim de pé... sobre todo aquele branco. Bannik abaixou-se para
tocar o chão branco, se é que realmente havia chão, e reparou que também as suas roupas,
o uniforme da Frota Estelar, que estava rasgado, ensangüentado e sujo, estavam
novamente intactas e também brancas. Somente o seu corpo mantinha a sua cor. Bannik
sorriu de maneira triste. “Estou morto. Os monstros me mataram e me deram de comer
para sua prole. Tudo o que fiz, tudo pelo que lutei... foi em vão...”
- Não está não, Bannik - voltou-se para trás e olhou o homem de meia-idade que o
olhava, vestido de túnica branca. Outro tyrriano, como ele. Reconheceu-o.
- Karrig... Embaixador Karrig... mas você está...
- Morto? Sim, estou, de certa forma... mas Embaixador não sou mais, não aqui, pelo
menos.
- Mas eu vi o que restava do seu corpo em Deep Space Nine. Eu descobri quem o
assassinou... Eu resolvi o problema com os Scythianos, e...
- ...ingressou na Frota. Sim, eu sei. - interrompeu Karrig sorrindo. - Boa escolha,
Bannik.
Uma outra figura apareceu, também sorrindo. Vestia um uniforme da Frota, mas
totalmente branco. Sua expressão era de serenidade.
- Tenente Heavyside?
- Sim, Alferes, sou eu.
Karrig se aproximou mais ainda do tyrriano.
- Você tem um brilhante futuro pela frente.
Bannik fez um gesto com a mão, mostrando a amplidão branca que se espalhava até
o infinito. Heavyside respondeu.
- Não, Bannik, seu lugar ainda não é aqui. Lembre-se, você prometeu para mim que
iria cuidar da Endeavour.
Karrig assentiu.
- Isso, Bannik, você não pertence ainda a este lugar, seu futuro não é esse, não aqui,
não por enquanto... Mais tarde, talvez... muito mais tarde... Mas agora não...- tendo dito
isto, Karrig empurrou Bannik com força, o projetando para trás e para cima, para o ar,
enquanto dizia:
- Mas... Eu não quero ir...
- Você voltará, Bannik... - ouviu a voz de Karrig ao longe - ...e eu estarei cá.
Esperando...
A voz de Heavyside era quase um sussurro.
- Lembre-se da promessa...
Bannik sentiu-se levado pelo ar, pelo ar esverdeado... esverdeado? Onde estava o
branco? Ele reconhecera aquele esverdeado, era a cor das paredes da nave dos Caçadores.
“Estou de volta...” pensou, antes de fechar os olhos e se perder novamente na
inconsciência...

***

O caçador entrou na câmara de regeneração para encontrar Bannik já acordado,


porém ainda preso dentro do casulo. Ao perceber a entrada do Caçador, o oficial se
agitou.
- O que vocês fizeram comigo? Onde estou? - indagou furiosamente.
- Acalme-se tyrriano, apenas restabelecemos seus sistemas. Você ainda é o mesmo,
talvez até melhorado.
Aproximou-se do oficial e passou sua garra pelo casulo. Imediatamente o casulo se
abriu e Bannik caiu no chão enfraquecido.
- Você ainda deve estar um pouco fraco mas logo deve melhorar.
Bannik o olhou, tentando imaginar o que ele queria.
- Porque não virei comida para vocês se deliciarem?
- Bem, parece que seu conhecimento é mais importante. – a criatura encostou sua
garra no chão, e dois assentos como os da ponte surgiram, sendo formados pelo material
orgânico. Caminhou e com apenas um braço colocou Bannik sentado. Ele se virou e
sentou-se em frente.
- Vamos, diga-me o que vocês sabem... da espécie 8472 como você s os chamam...
Bannik refletia no que havia de dizer. Tinha que ganhar tempo, isso era indiscutível,
mas também tinha de revelar somente o necessário sem pôr em risco a segurança da
Federação... E sobretudo tinha de cativar o interesse destes seres para que eles ficassem
realmente interessados no que ele dissesse... como um contador de histórias com crianças
em seu redor. “Imagine se os Caçadores decidem mesmo ir atrás da espécie 8472... isso
não pode acontecer. Tenho de levá-los até aos 8472 por uma pista falsa, de qualquer
modo...”
- Bem, para começar seria bom saber o seu nome... de outra forma, como me
dirijo a você? - “Canalha seria uma boa...”, pensou.
- O meu nome é irrelevante, tyrriano. Fale.
- Ora, ora, que desvantagem lhe traria isso? Quer dizer, vejamos: estou na sua nave,
na sua cela, com o seu fluido sei-lá-o-quê a curar-me e sob a mira dos seus guardas... O
que é que dizer-me o seu nome poderia trazer de vantagem para mim? - “Vamos a ver se
psicologia reversiva resulta.” Pensou se daria certo, e desejou ter alguém com treinamento
adequado ao seu lado. “Conselheiro Hanges, estás fazendo falta...”
- ... ... ... Gaum‟tzar.
- Muito prazer. O meu você já sabe.
- Agora fale, tyrriano.
- Espécie 8472... vejamos... cabeça e tronco humanóide (bem, a cabeça nem por
isso), Três membros inferiores ou pés. São oriundos de uma dimensão acima da nossa
onde o espaço é fluido, líquido. Não há vácuo como no nosso. São também a única espécie
a habitar essa dimensão líquida, e segundo creio, nem sequer conheciam outras espécies
até os Borg invadirem a sua dimensão. Presumo que... saiba quem são os Borg?
- Os Borg não são páreo para nós, tyrriano. Prossiga.
- Bannik. Chame-me Bannik. Por favor, Gaum‟tzar.
A criatura hesitou por instante como ponderando o pedido.
- Continue... Bannik. – o tyrriano sorriu no seu íntimo. Era uma vitória pequena,
mas conseguira que o Caçador o tratasse pelo nome.
- Bem, deixa ver mais... Têm um sistema de defesa imunitária impressionantemente
denso, resistente a várias formas de energia projetada tais como phasers e raios de
transporte. A sua matéria orgânica resiste ás nano-sondas Borg, por isso não conseguem
ser assimilados, também. Ah, e a sua característica mais importante: São telepatas.
Conseguem ver o que vamos fazer na nossa mente antes de o fazermos. - Bannik
aproximou a sua cara da de Gaum‟tzar e abriu muito os olhos.- ...Adivinham os nossos
segredos, forças e defesas antes de podermos reagir.
Gaum‟tzar ficou silencioso e parecia refletir nas palavras do oficial. Bannik decidira-
se a explorar a dúvida crescente no Caçador, a abrir cada vez mais essa brecha de dúvida e
, quem sabe, temor.
- Uma única célula de um 8472 possui mais de cem vezes o D.N.A. que uma célula
minha - e possivelmente sua - tem. Regeneram-se muito rápido. Provavelmente, de uma
única célula deles, consegue-se fazer aí uns cem clones... suficientes para alimentar muitas
das suas crias, não?
- Como é que vocês tiveram conhecimento desta espécie? - Bannik fingiu que não
ouviu e continuou.
- Eles são feitos da mesma estrutura biomecânica que as suas naves, que são
poderosíssimas, incapazes de serem sondadas por naves Borg. Quando três ou mais naves
se juntam e se ligam umas ás outras, criam um canhão de plasma capaz de destruir planetas
inteiros, e...
- Como é que vocês tiveram conhecimento desta espécie? - o tom de voz do
Caçador subiu. Bannik ignorou-o e continuou.
-...regeneram-se a si mesmas sem precisar de reparações nem nada que se pareça.
São praticamente invulneráveis e...
- COMO É QUE VOCÊS SOUBERAM DELES ??? - o Caçador levantou-se da
cadeira e fitava Bannik nos olhos fixamente. Bannik ignorou-o e acabou de falar, gritando
tanto como o Caçador:
- ...E VOCÊS SÃO CARNE PARA CANHÃO QUANDO ELES VOS
ENCONTRAREM! VOCÊS VÃO SER MASSACRADOS, CHACINADOS,
ESPEZINHADOS, EXTINTOS, ENTENDEU? E TUDO PORQUE QUISERAM TOMAR O
QUE NÃO É VOSSO EM NOME DA PRESERVAÇÃO DA SUA ESPÉCIE SEM SEQUER SE
DAREM AO TRABALHO DE PEDIREM AJUDA! ORGULHO! TUDO POR CAUSA DE
ORGULHO BESTA! EU ODEIO VOCÊS!!! ODEIO!!!
Bannik recostou-se na cadeira arfando. Queria descontrolar o Caçador, mas
acabara por se descontrolar. Dissera tudo o que pensava da sua raça. E agora o Caçador
fitava-o, uma expressão que parecia ser de surpresa. Com certeza não pensara que o
tyrriano pudesse ser capaz daquele ato de fúria. Uma raça de seres cordatos e pacíficos, os
habitantes de Tyrria I eram conhecidos por toda a Frota por sua temperança. Mas Bannik
não era exatamente um tyrriano típico. Tomou fôlego e falou, desta vez calma e
pausadamente, como se nada daquilo tivesse acontecido.
- Gaum‟Tzar... se vocês precisavam de comida... Por que é que não pediram a
nossa ajuda? A Federação de boa vontade vos ajudaria, sem brigas, sem conflitos. Todas as
espécies já enfrentaram o espectro da extinção alguma vez na sua existência e sabemos o
que isso é: é algo que nunca desejaríamos ao nosso pior inimigo, por mais cruel que fosse. -
Bannik posou a mão no ombro do Caçador para dar ênfase e continuou - Está em suas
mãos agora, Gaum... continuar a proceder erradamente como está e passar o resto da vida
a contar os dias até a sua espécie extinguir-se... isto é, se os 8472 não chegarem e
abreviarem a vossa extinção... ou engolir o orgulho, pedirem ajuda à Federação, e
preservarem a vossa espécie sem recorrer a conflitos. Lembre-se: uma mão aberta pode
agarrar... uma mão fechada num punho, não agarra nada. Está nas suas mãos o futuro da
sua espécie, Gaum‟Tzar...
Terminou de falar e recostou-se na cadeira. O Caçador fez o mesmo, imerso em
seus pensamentos e nas palavras de Bannik. De súbito um outro Caçador entrou e falou-
lhe.
- Gaum‟Tzar, a nave da Federação está dentro do alcance dos sensores... estará ao
alcance das nossas armas em 36 segundos... Atacamos?
O tyrriano olhou Gaum‟Tzar e disse:
- 36 segundos é quanto você tem, Gaum‟Tzar, para decidir qual dos caminhos a sua
espécie inteira vai percorrer: o da extinção... ou o da proliferação?
Bannik jogava tudo nesta frase. Se Gaum‟Tzar ordenasse o ataque, tudo o que ele
fizera tinha sido em vão e... bom, pelo menos veria Karrig de novo... Bannik rezava para
que o Caçador ordenasse abrir as freqüências de saudação: assim saberia que o seu
estratagema dera resultado.

***

“Diário pessoal do Primeiro - Oficial. Data estelar 23790206.1715. Mais de quatro


horas se passaram desde o nosso primeiro encontro com a nave hostil. Foi um golpe de
sorte eles terem nos deixado para trás. Talvez tenham feito isso pela emoção da caçada.
Talvez...Junto com a equipe de Engenharia, conseguimos determinar que a freqüência de
transmissão de energia dos condutores EPS pudesse ser variada aleatoriamente. Os testes
foram um sucesso. Além disso, recuperamos 90% da capacidade de dobra. Em nosso
próximo encontro com eles, creio que a história será diferente! Fim do diário”
T‟Gar fechou seu PADD e bateu em seu comunicador. Queria dar logo as boas
notícias a seu Capitão.
- T‟Gar para Capitão.
{Fala Spencer.}
- Estou indo para a ponte, senhor. Tenho boas notícias.
E se dirigiu para lá o mais rápido possível. Ao entrar na ponte, o Capitão lhe disse:
- E então, Número Um?
T‟Gar se empertigou antes de fazer seu relatório.
- Conseguimos variar a freqüência dos EPS com sucesso, senhor. Teremos dez
minutos de “proteção” contra a drenagem. Também recuperamos 90% da capacidade de
dobra.
- Muito bem, Comandante, já era hora.
- Capitão, também analisei as gravações de nossa batalha e determinei o ponto de
emissão do raio de drenagem. Ele aparenta ser o único existente naquela nave. Sugiro que,
em nosso próximo encontro com eles, ataquemos tal emissor para destruí-lo. Desta forma,
eles não terão como aplicar a mesma tática.
Spencer pareceu refletir sobre a estratégia apresentada por seu Primeiro Oficial.
- Me parece adequado... vamos até eles então. Tenente Williams, forneça a
localização do sinal da nave para a Alferes T‟mir. Curso de interceptação, dobra máxima.
Ele viu a fria humana assentir com a cabeça, antes de responder ao Capitão.
- Informações sendo transferidas para o console da Alferes T‟mir agora, senhor. -
enquanto a meio-vulcana recebia as informações e se preparava para seguir suas ordens,
Wills voltou-se ao Capitão e disse:
- Senhor, as coordenadas enviadas a Alferes T‟mir são a origem mais precisa
possível do sinal de destruição dos comunicadores. A margem de erro está em 0,1%.
Porém não há como garantir que a nave alienígena esteja nesta localização neste momento.
“Arrogante como um vulcano.” Pensou T‟Gar. T‟mir sorriu e falou, em tom de
gracejo.
- Se eles não estiverem lá, Capitão, é porque provavelmente evaporaram. Acho que
foi um dos melhores cálculos que já vi.
Spencer sorriu de leve ao ouvir a brincadeira de T‟mir, e deu o sinal para T‟Gar.
Aproveitando a deixa, o Primeiro Oficial deu as ordens.
- Alerta Amarelo, todos em seus postos! Muito bem, Alferes T‟mir! Marque o curso
289 marco 4. Prepare para sairmos com dobra máxima.
- Aguardando comando, senhor.
T‟Gar bateu em seu comunicador.
- Engenharia! Quero força máxima nos motores. Dez segundos antes de sairmos de
dobra quero os escudos levantados e todos os sistemas EPS da nave prontos para oscilar
conforme as simulações!
{Sim Comandante.}
T´Gar olhou para o Capitão que disse, com a voz firme e cheia de alguém
acostumado a liderar uma nave da Federação.
- Acionar!
Os dedos de T‟mir dançaram no console, e as estrelas que se viam na tela viraram
borrões. A Endeavour estava caçando os Caçadores.

***

A tensão era visível no rosto de todos. Bem, quase todos. A Alferes Wills e o
Comandante T‟Gar estavam impassíveis, como se estivessem se dirigindo a uma base da
Frota para uma licença. “Quanto dessa impassividade será fachada?” T‟mir se sentia
absolutamente exausta. Assim que tudo terminasse, iria para seus aposentos e tomaria uma
boa e demorada ducha, sem se importar com a água reciclada. A Tenente Adachi parecia
bem melhor depois que comera, e já estava de volta, no console de operações. T‟mir
olhou para o seu próprio console e informou:
- Dez segundos para sairmos de dobra, senhor.
- Muito bem. - respondeu o meio-klingon. - Engenharia! Preparem os EPS agora!
Quero todos os sistemas defensivos com oferta máxima de energia!
Todos os olhares na ponte se viraram para o Capitão, esperando a sua resposta.
Levantando de sua cadeira, Spencer falou:
- Vamos para meio impulso. - enquanto T‟mir reduzia a velocidade da nave, o
Capitão se voltou para Wills. - Srta. Williams, sensores ao máximo quero varredura
completa da área.
- Fazendo varredura agora, Capitão. - depois de alguns instantes, continuou. -
Senhor, os sensores mostram traços de partículas de dobra na área. Esse tipo de partícula
de dobra é a mesma que a nave dos alienígenas expele. Os sensores também detectaram a
seqüência em que foram dispersadas, senhor. Como pegadas em uma trilha.
Spencer se virou para Adachi.
- Você confirma, Tenente?
A jovem confirmou.
- Sim senhor, a definição da Tenente é absolutamente precisa, podemos seguir o
rastro deles como se fossem mesmo pegadas: o caminho está todo aqui.
T‟mir se sentia intranqüila. Um arrepio percorreu sua espinha. Estavam cada vez
mais próximos da nave alienígena. Como se tivesse lido seus pensamentos, a Oficial de
Ciências falou.
- Senhor! Localizei a nave alienígena!
A tensão dos tripulantes era quase palpável.
- Eles já nos localizaram, senhor - acrescentou Adachi. - E estão voltando a nave em
nossa direção.
Instintivamente, T‟mir voltou-se para o Capitão, esperando sua decisão. Confiava
nele. Tinha que confiar.

***

Desde que ouvira a Oficial de Ciências anunciar a nave alienígena, Spencer se sentia
tenso, na eminência dos acontecimentos. Era finalmente chegado o momento do
confronto.
- Estão em alcance visual?
Ele quase podia sentir todos os olhares na ponte virados para ele. Não podia
decepcionar sua tripulação.
- Em cinco segundos, senhor.
- Tenente Adachi, tente contatá-los em todas as freqüências! Srta. T‟mir, curso de
interceptação, máximo impulso. - Spencer se virou para o console de segurança. - Alferes
Pepe, carregue os phasers.
As duas Oficiais de Operações executaram um silencioso balé sobre seus consoles.
A tensão aumentava, e Spencer se levantou, caminhando até próximo os consoles a frente.
Viu as costas de Adachi, tão controlada, e as de T‟mir, tão emotiva, e pôde ver que ambas
estavam igualmente tensas. “Elas confiam em mim, todos confiam. Não posso decepcioná-
los.”
- Alcance visual! - Wills anunciou.
- Na tela.
A imagem da nave dos Caçadores apareceu na tela principal. Spencer olhava para a
tela. A nave dos caçadores se aproximava. Era pequena, mas mostrou que podia destruí-los
facilmente. “Será que a idéia de T‟Gar vai funcionar?”
- Senhor, eles estão respondendo a nossa comunicação.
Spencer se forçou a sorrir e olhou para Chaz e T‟Gar.
- Hora da diplomacia! - voltou-se para a oficial de operações - Abra o canal,
Tenente.
Respirou fundo e começou.
- Aqui é o Capitão Spencer da USS Endeavour. Vocês estão com nossos tripulantes
a bordo, pedimos que vocês os devolvam.
{Humano. Diga o que tem a oferecer em troca.}
Spencer ouviu aquilo e imediatamente fez o gesto para Adachi interromper a
comunicação.
- Canal interrompido.
Virando-se para Chaz, Spencer indagou.
- Troca? Mas o que é isto? O que você me diz, Conselheiro?
- Capitão. Parece que para eles somos somente mercadoria. Talvez nós não
sejamos uma mercadoria tão valiosa... Talvez tenhamos algo melhor para eles do que nós
mesmos...Espero.
Spencer refletiu sobre essas palavras por alguns breves instantes.
- Concordo, vamos ver até onde eles vão... Abra novamente o canal.
Novamente a figura hedionda do Caçador apareceu na tela.
- No que você estaria interessado?
{Queremos informações.}
Spencer sinalizou de novo e o canal foi interrompido.
- Informações? Alferes Pepe, como estão os phasers?
O jovem Alferes respondeu prontamente. Parecia ansioso em mostrar serviço.
- Prontos para disparo, Capitão...
- Não faça isso! - interveio Chaz rapidamente - Atirar neles só ia causar um conflito
prematuro! Vamos ver exatamente o que eles querem. Temos uma chance de sair disso
sem um combate estelar!
- Muito bem, Conselheiro. Vou continuar com isso... Tenente Wills, algum sinal dos
nossos?
- Sim senhor. - afirmou Wills, no seu tom de voz usual, logo após ter pressionado
alguns botões rapidamente seu console de ciências. - Há um sinal bem forte do Alferes
Bannik, Capitão.
- E os demais, Wills? - “Será que os perdemos?”
- Consigo somente sinais fracos e espaçados dos demais tripulantes seqüestrados...
Estão mesclados. - respirou e prosseguiu. - Posso somente afirmar um sinal fraco do
Tenente Salek, Capitão.
- Menos mal. - Spencer sinalizou para Adachi que abriu o canal novamente.
- Que tipo de informações?
{Informações sobre a espécie 8472... como vocês os chamam.}
Spencer cortou novamente as comunicações.
- 8472? Como eles sabem...
Num rápido flashback, Chaz lembrou-se de todos os relatórios que já recebeu
sobre raças desde a sua época de burocrata da Frota.
- É isso, Capitão ! Se o que eles querem é “carne”, ou melhor, matéria orgânica, o
que melhor que do que matéria orgânica regenerativa? Talvez algum de nossos tripulantes
tenha entendido o real sentido da existência deles, e tenha jogado a idéia de que nós
conhecemos uma espécie que é mais interessante para eles do que nós mesmos ! Esta é a
troca. Talvez a nossa raça para eles seja somente alimento pequeno... Eles imaginam que
os 8472 sejam mais úteis para eles. Acho que algumas informações como localização, ou
algo assim, não irá fazer mal a ninguém. Além do mais, sabemos o quão poderosas ambas
as raças são.
Sentindo um novo alento, uma esperança de conseguir sair dali com sua nave e sua
tripulação quase inteiras, Spencer quase sorriu.
- Certo Conselheiro. Vou dar o que eles querem, mas vamos nos concentrar em
recuperar nosso pessoal. - sinalizou para Adachi.
- Podemos lhe dar essas informações, mas queremos nossos tripulantes de volta.
{Primeiro as informações.}
Mais uma vez Spencer interrompeu.
- O que ele acha que somos? Ferengis?
- Eles se acham uma raça superior. É de imaginar que eles tentem estar sempre um
passo a nossa frente. Mas isso é apenas uma ilusão de grandeza. Eles já mostraram que tem
real interesse pelas nossas informações. Eles sabem que se nos destruírem, a Frota Estelar
inteira estará aqui amanhã para ficar no pé deles, e que não irão conseguir as informações
que desejam.
- Certo, vamos fazer o jogo dele. Srta. T‟mir, temos o transporte funcional?
A meio-vulcana executou alguns comandos, entrando em contato com a
Engenharia, para depois responder ao Capitão.
- Não senhor. Toda a energia disponível está focalizada nos sistemas de defesa da
nave, e disponibilizá-la para os transportes demoraria tempo demais.
Desanimado, Spencer sinalizou.
- Como você quer que entreguemos essas informações? Nossos sistemas não são
compatíveis.
{Vocês nos trarão as informações.}
Ele sentiu os olhares de seus oficiais. Parecia que seus ombros sustentavam o peso
da nave.
- Muito bem, enviaremos uma nave pequena até vocês.
{Aceito. Quando chegarem perto, os traremos para dentro de nossa nave.}
- Endeavour desliga. - depois que a imagem da criatura desapareceu da tela,
Spencer se virou para os oficiais, que esperavam ansiosos. - Conselheiro, prepare um
pequeno dossiê sobre os 8472, obviamente tirando as partes mais interessantes.
- Sim, Capitão. - Chaz se dirigiu ao turbolift.
- Número Um, vá com a Alferes Wills, Pepe e um médico. T‟mir, você irá pilotar a
nave auxiliar. Mantenha contato no sinal deles, qualquer problema nos contate. Como você
estará mais perto, a distorção que a nave dos caçadores causa será menor...
Impressão sua, ou os olhos da meio-vulcana se arregalaram? Por um momento,
pensou que T‟mir ia pedir para ficar, mas a jovem não disse nada, somente assentiu. Todos
se movimentaram, seguindo suas ordens.

***

Found‟tzar estava em pé, observando Bannik. O oficial da Frota estava sentado,


parecia estar se recuperando ainda. Fazia apenas alguns minutos que havia saído da
inconsciência causada pela droga que o alienígena havia lhe injetado. Por uns instantes, o
Caçador apenas piscou seus olhos rapidamente. Em seguida, quando achou que já havia
esperado demais, caminhou em direção a Bannik.
- Venha comigo, tyrriano. - pegou Bannik pelo braço e o forçou a caminhar.
Quando iam saindo da sala, ouviram um barulho, vindo do casulo que continha um caçador.
O casulo se abriu. O ser começou a caminhar em direção aos dois.
- Seja bem-vinda de volta, Vrumi‟tzar. - disse Found‟tzar fazendo um gesto de
reverência. Algo no jeito da criatura e de como Found‟tzar a tratava fazia Bannik achar que
era uma fêmea, e superior a ele.
- É bom estar de volta. - respondeu Vrumi‟tzar com uma voz familiar a Bannik. Ele a
encarou e se espantou ao ver o rosto de Salek na face daquela Caçadora.
- Vamos à ponte, Gaum‟tzar precisa lhe falar. - Found‟tzar caminhou em direção ao
corredor, arrastando Bannik, e sendo seguido por Vrumi‟tzar. O tyrriano ainda estava
tonto, mas a lucidez voltava aos poucos. O que aqueles monstros haviam feito com o
vulcano?

***
Leonard Zamblivinsk estava debruçado sobre uma interessante amostra de tecido
coletado por Durden na nave ferengi quando o seu comunicador tocou.
- Zamblivinsk na escuta.
Ouviu a voz do Primeiro Oficial.
{Doutor, precisamos de um Oficial Médico para acompanhar um grupo de Oficiais
na nave dos Caçadores.}
- Entendido, vou ver se arranjo um “voluntário”. Zamblivinsk desliga. - refletiu
alguns instantes sobre quem poderia ir, sem correr riscos demais. Foi quando se lembrou
de um de sus assistente, o Alferes Durden. Ele tinha tido sérios problemas no passado e
havia recebido “nanotechs”. Era muito provável que isso o resguardasse dos seres, de
acordo com as leituras e os dados que o próprio Durden havia conseguido na nave ferengi.
Chamou-o .
- Alferes Durden.
Ele veio rapidamente. O Doutor o olhou com ar paternal.
- O Capitão precisa de um oficial médico para acompanhar o grupo de oficiais a
bordo da nave dos Caçadores. E eu pensei em você.
O Alferes concordou e saiu rapidamente. Leonard olhou para a porta por onde seu
assistente acabara de sair. Não gostava de mandar seus subordinados em missões
perigosas, mas eram oficiais como ele, e sabiam dos riscos e sacrifícios da profissão.
Resignado, voltou para a sua amostra.

***

Welker caminhava apressado em direção ao hangar. Precisava entregar um


tricorder melhorado ao grupo avançado. Por ele, teria ficado na Engenharia, mas ninguém
mais havia se voluntariado para o encargo. E o motivo para isso era simples: o tricorder
deveria ser entregue à Oficial Chefe de Ciências. E a opinião na Engenharia sobre Wills era
unânime: “brrrrrr”.
Quando chegou ao hangar, encontrou um oficial médico, Alferes como ele.
- Olá. - estendeu a mão. - Sou Johnny Welker, Engenheiro Chefe Interino.
O médico apertou a mão que lhe foi estendida.
- Sou o Alferes Tyler Durden, Oficial Médico Assistente.
Welker puxou assunto com o médico, e conversaram amenidades, sobre a
Academia, sobre a nave e seus tripulantes.
Quatro oficiais chegaram por um tuboelevador. Welker reconheceu o Primeiro
Oficial, a Oficial Chefe de Ciências e a meio-vulcana de Operações. O quarto oficial era um
Alferes da Segurança.
- Comandante. - apresentou-se e depois se voltou aos demais - Tenente... - deu um
passo a frente em direção à bela moça vestida com uniforme azul.
- Tenente Wills, acrescentamos neste tricorder uma maior capacidade de
localização dos tripulantes que estão na nave alienígena, espero que seja bem útil. -
estendeu o tricorder para ela, enquanto sorria.
A resposta de Wills foi calorosa como o inverno de Plutão.
- Obrigada, senhor Welker, mas não é necessário. Eu fiz o mesmo com este
tricorder aqui. - Welker se sentiu um pouco constrangido com a frieza da mulher, e não
conseguiu pensar em nenhuma resposta.
Foi quando a Alferes T‟mir se aproximou deles, depois de ter se dirigido a um
console de computador na entrada do hangar.
- Wills, se você já tiver terminado a sua paquera, podemos ir.
Welker não conseguiu segurar o riso, principalmente ao ver a cara de Wills.
Despediu-se dos demais, e voltou para a Engenharia. Mas no íntimo, torcia para seus
colegas voltarem logo, inteiros e bem.

***

O caçador que levava Bannik foi saudado pelos demais Caçadores na ponte com um
leve aceno de cabeça. Vrumi‟tzar surgiu por detrás dele e os dois voltaram a sua atenção
para ela.
- Bom vê-la inteira novamente.
A fêmea pareceu considerar a afirmação de Gaum‟tzar e, meio rosnando, meio
sorrindo, disse:
- Ilógico, Gaum‟tzar. Nunca estive em pedaços. Somente ferida.
Bannik voltou-se para ela. A face de Salek estava estampada no corpo da Caçadora.
Teve uma idéia, mas tinha que agir rápido e pegá-los de surpresa. Correu para a caçadora e
abraçou-a, quase chorando.
- Salek... Meu Deus... eu não vou deixar você ir com estes animais... você está me
ouvindo aí dentro?
Bannik agarrava a cabeça da Caçadora em suas mãos com força, parecendo
dominado pela emoção triste que lhe crispava o rosto. A Caçadora agarrou a sua cabeça
com ambas as mãos também e procurava afastá-lo.
- Afaste-se de mim, gado!
De repente, o mundo ao redor do tyrriano se dissolveu.
... ... ... E Bannik agora estava num espaço largo, um templo com colunas de arenito
vermelho no alto de uma montanha. O oficial reconheceria aquela montanha e aquele
planeta de olhos fechados, mesmo sem nunca ter estado lá: Vulcano. “Mas... ainda agora
estava na nave dos...”
- Bannik?
Bannik voltou-se e encarou Salek, de pé e vestido com o uniforme da Frota...inteiro
e de volta ao normal. E, para seu maior assombro, sorrindo.
- Mas... ainda agora você estava... e eu estava...
- Não há tempo para perguntas. A minha mente não irá durar muito mais tempo
neste corpo alienígena, pois a mente da Caçadora vai aos poucos tomando o controle.
Assim, todos os segundos são preciosos. Aproveitei esta sua explosão emocional para
estabelecer uma fusão mental entre nós para... para lhe pedir um favor e esclarecer o meu
plano.
Bannik sorriu. Sua idéia dera certo.
- Na verdade, eu estava contando com isso. Sabia que a mente de um vulcanóide
era forte demais para ser subjugada assim tão fácil. Só tinha de lhe tocar para ver se você
estabelecia contato.
- Ouça agora. Em outras circunstâncias, lhe pediria que tomasse o meu Katra no
seu corpo e o levasse a Vulcano, onde seria depositado. Contudo, fiquei ciente que os
Caçadores não pretendem a paz, mas sim aniquilá-los. Mesmo depois de conseguirem o
que querem. Portanto, o lógico é ficar aqui, tentar tomar o controle desta Caçadora e
sabotá-los por dentro. Tentarei explodir as naves, assim que for possível. Era isso que
queria esclarecer. Diga ao Capitão Spencer ou ao Primeiro Oficial T‟Gar que não têm que
se preocupar mais com os Caçadores.
Bannik percebeu a extensão dos planos do Engenheiro.
- Mas... assim você sacrifica-se para que eles morram. Isso não é lógico.
- As necessidades de muitos sobrepujam a necessidade de uma minoria... Ou de um
só. E já estou morto, de qualquer modo. Peço-lhe que viaje até Vulcano, se puder, e
transmita aos meus pais e à minha prometida que... os amo muito. Deixe-os fazer uma
fusão mental, se possível... eles saberão tudo, então.
Mesmo triste, Bannik se conformou em abandonar o companheiro. Ele tinha razão.
- Boa sorte, Salek. Farei o que você pede.
O vulcano sorriu, e ergueu a mão na saudação vulcana.
- Vida longa e próspera.
... ... ...Bannik abriu os olhos e viu a cara de Vrumi‟tzar sobre a sua. Estava deitado
no chão.
- Estes seres são demasiados frágeis, Gaum‟tzar. Arremessei-o com o mínimo de
força e ele desmaiou assim que caiu.
Bannik ergueu-se e encarou Vrumi‟tzar e depois Gaum‟tzar. Este he falou.
- Os seus... colegas... estão a caminho daqui. Chegaram agora e vêm trazer a
informação sobre os 8472 em troca de sua vida.
Bannik tremeu por dentro. O que iria acontecer agora?

***

Estavam entrando na pequena nave auxiliar. T‟mir e T‟Gar, como iriam na frente,
entravam por último. Foi quando o Conselheiro chegou esbaforido com o dossiê em suas
mãos. O entregou para T‟Gar e saiu do hangar, não sem antes desejar “boa sorte” para
eles. T‟mir entrou e se sentou na cadeira do piloto. Olhou para o meio-klingon ao seu lado
e invejou sua frieza. Rezou mentalmente uma pequena oração terráquea que sua mãe lhe
havia ensinado e suspirou fundo.
- Muito bem, senhores e senhorita. Esta é sua comandante falando. Vôo sem escalas
com destino à nave dos Caçadores alienígenas. Por favor, apertem os cintos e mantenham
seus phasers à mão caso haja alguma eventualidade.
T‟mir sorriu. “Aqueles filmes terrestres antigos sobre desastres aéreos que vi
durante a Academia não me fizeram bem.” Depois da piadinha, T‟mir começou a trabalhar
sério. Ajustou os níveis de energia e calibrou os sensores. Checou o sistema de suporte de
vida e o teletransporte. “Tudo OK”
- Comando do hangar, Alferes T‟mir no comando da Hawking pedindo autorização
para decolagem.
{Aqui é o Alferes Jonhson. Autorização concedida, T‟mir. Boa sorte e tragam
nossos rapazes de volta.}
- Faremos o possível, Jonhson, obrigado. Hawking desliga.
T‟Gar estava “distribuindo tarefas” aos demais. O alarme de abertura das portas
externas soou e T‟mir pode ver o brilho das estrelas contornando a silhueta da nave
alienígena quando elas abriram totalmente. Manobrou a nave com perfeição. Os próximos
momentos foram de tensão. Era algo quase palpável. Até mesmo no Primeiro Oficial.
T‟Gar parecia impassível, mas T‟mir podia sentir ondas de tensão também nele.
- Leve-nos para a distância de 5 km da nave, T‟mir.
- Sim, senhor. - manobrou até o limite imposto. Ao chegar lá, a nave abriu
comunicações.
{Atenção nave da Federação. Preparem-se para transporte.}
Logo se viu um brilho estranho quando o teletransporte era acionado. Vendo seus
colegas sumirem, T‟mir se virou preocupada com eles.
- Boa sorte, pessoal. Se cuidem. - “E voltem todos, por favor...”

***
O grupo fora transportado para uma sala de transporte de paredes em uma cor
verde musgo. Pepe ficou visivelmente enojado com a aparência e o cheiro do lugar,
enquanto Wills quase que imediatamente sacou seu tricorder e começou a fazer leituras.
T‟Gar ia falar algo para seus companheiros, quando ouviu um som gutural.
Virou-se, e arregalou os olhos ao ver um dos Caçadores em posição bem
ameaçadora. Sabia o que um deles era capaz de fazer. Mantendo a frieza e o autocontrole,
ergueu a voz de maneira nada cordial.
- Onde estão nossos amigos, Caçador?
A resposta do alienígena foi automática.
- Venham comigo.
A nave era composta de uma espécie de tecido tecnorgânico. Um misto de metal e
tecido vivo. Inclusive, em alguns pontos, ela parecia pulsar. O ambiente era um pouco mais
escuro e sombrio que um cubo Borg. Quando entraram na ponte de comando, viram
Gaum‟tzar, Found‟tzar e Bannik, que lhes falou em um tom um tanto descontraído para a
situação.
- A pizza chegou?
T´Gar teve vontade de rir, mas conseguiu se conter.
- Como você está, Bannik?
- Esfomeado, mas bem, diante das circunstâncias. Eu comeria até mesmo a comida
do Davis com prazer.
T‟Gar se sentiu aliviado ao ver que o tyrriano mantivera o bom humor. Um dos
Caçadores se impacientou.
- Nos dêem as informações, klingon! - ordenou Gaum‟tzar.
Se havia algo que T‟Gar odiava, era que lhe chamassem de klingon. Ele era humano
demais para isso. Respondeu ao caçador calmamente.
- Primeiro eu tenho que saber onde estão os outros.
- Estão bem, mas você só os verá quando tivermos as informações.
Insatisfeito com a resposta, T´Gar voltou-se para Pepe, quando um dos Caçadores
que estava de costas se virou. Ele possuía o rosto de Salek.
- Salek?
Bannik aproximou-se de T‟Gar e falou-lhe em voz baixa.
- Senhor, esse não é mais o Salek. Eu sou o único sobrevivente de todos os
seqüestrados. Parece que eles tomam os corpos de outros seres vivos e vão assimilando os
tecidos para os seus aos poucos.
Bannik olhou T‟Gar nos olhos e agarrou-lhe o antebraço, como que mandando uma
mensagem só com o olhar. T‟Gar olhou por alguns instantes os estranhos olhos sem pupila
do Oficial de Segurança. “Ele quer que saiamos daqui o mais depressa possível.”
- Vamos embora, senhor. Não temos nada a fazer aqui.
T‟Gar concordou com um aceno de cabeça.
- Certo, Alferes Bannik.
Entregou a informação a Gaum‟tzar, que os ignorou completamente, voltando a sua
atenção para os monitores, ficando de costas para eles. Decerto queria checar a
informação. Quando teve certeza que nenhuma das criaturas estava prestando atenção
nele, T‟Gar pressionou o seu comunicador.
- T‟Gar para a Hawking: cinco para transportar.
A visão da ponte da nave dos Caçadores foi substituída pelo interior da Hawking.
T‟mir ergueu-se da cadeira. Olhou-os, visivelmente aliviada, e caminhou até Bannik.
- Você está bem, Bannik?
- Bem, eu... - Bannik foi abraçado por T‟mir e não falou mais. T‟Gar queria sair dali
o mais depressa possível, mas não disse nada. O tyrriano havia passado momentos difíceis,
e provavelmente estava precisando ser reconfortado.

****

Assim que eles sumiram, T‟mir abriu comunicação com a Endeavour.


- Endeavour, Alferes T‟mir falando. O grupo acaba de ser transportado para a nave
alienígena. Alguma ordem?
{Não, Alferes. Mantenha a sua posição e esteja preparada para transportá-los assim
que puder.}
- Entendido, Endeavour. T‟mir desliga.
Fazia quinze minutos e nada de sinal dos outros. “Calma T‟mir, onde é que já se viu
uma meio-vulcana ansiosa? Bom, você sempre está... Eles estão bem, você sabe
disso...Todos eles. Aaron, Salek...Bannik...” Mal acabara de pensar isso quando ouve um
sinal no comunicador.
{T‟Gar para a Hawking: cinco para transportar.}
T‟mir sorriu aliviada. Eles conseguiram. Tranportou-os de volta. Quando os viu se
ergueu da cadeira e foi até Bannik.
- Você está bem, Bannik?
- Bem, eu... - Não esperou que ele respondesse. Podia sentir a solidão e a
necessidade de contato do tyrriano mesmo através de seus sentidos empáticos tão fracos.
Era quase como se fossem seus próprios sentimentos. Abraçou-o forte, o apertando contra
si, e lhe pareceu que os outros haviam sumido da pequena nave. Sentiu o calor do corpo
dele, seu cheiro. Queria ficar nos braços dele para sempre. Sentia-se tonta e leve ao
mesmo tempo. E nunca havia se sentido assim antes. Não soube dizer quanto tempo havia
passado, quando se deu conta do que estava fazendo.
- Minha nossa, como eu estava preocupada. - largou-o, sorrindo, um pouco
constrangida. Mas segurou as mãos dele entre as suas. Por algum motivo, não conseguia se
afastar dele. - E Aaron e os outros? O que houve?
A tristeza dele era visível ao responder.
- Os outros... morreram. Sou o único sobrevivente. Salek... bem, Salek é uma outra
história, algo que você, como meio-vulcana vai entender quando eu lhe contar, T‟mir.
Ela apertou as mãos dele, tentando confortá-lo.
- Sim, você irá me contar o que houve com Salek. - quase desejou que estivessem
em outro lugar, a sós, onde ela pudesse tirar aquela tristeza dos olhos dele, tão estranhos e
tão fascinantes. Por que a tristeza dele a incomodava tanto? - Bom, já que estamos juntos
de novo, acho que devemos sair de perto desses caras o mais rápido possível, não
concordam?
Reparou que os outros os olhavam. Tentando disfarçar seu constrangimento,
sentou-se na cadeira de piloto e ligou o comunicador.
- Endeavour, aqui é a Hawking comunicando que estamos voltando.
T‟mir manobrava tranqüilamente para chegar a Endeavour, tentando recuperar a
calma, quando um dos sensores do console lhe indicou que a nave havia levantado seus
escudos. Pensou rápido. “Os Caçadores devem estar para atacar.”
- É bom se segurarem, por que tenho que sair da linha de fogo. Apertem os cintos
que lá vamos nós!
Fez uma manobra repentina, jogando a pequena nave toda para a esquerda. Mas foi
tarde demais. T‟mir só sentiu o impacto, antes mesmo de perceber que haviam sido
atingidos. Um gemido veio dos assentos atrás.
- Todos bem?
Uma voz desconhecida respondeu, e T‟mir demorou a perceber que se tratava do
Alferes médico.
- Não, o Alferes Pepe foi atingido. E está morto.
T‟mir segurou a respiração. Só agora sentia medo. Olhou novamente os consoles a
sua frente. A fuselagem ainda estava inteira mas no ponto de rompimento. Mais um tiro e
estariam perdidos. Tentou se comunicar com a Endeavour.
- Endeavour, aqui Alferes T‟mir falando. Responda.
Silêncio. “Droga, teve ter avariado o nosso sistema de comunicações.” T‟mir levou
a nave para fora do alcance dos Caçadores. Podiam ver a Endeavour e a nave alienígena
brigando. Silenciosamente T‟mir disse uma prece, esperando que tudo desse certo.
A nave da Frota estava resistindo bravamente, e parecia levar até certa vantagem,
quando, de repente, um portal se abriu, e os Caçadores fugiram por ele. T‟mir suspirou
aliviada quando os sensores mostraram que a Endeavour levantara os escudos.
- Senhores, estamos voltando.

***

T‟mir manobrou e os levou para longe daquela ameaça. Quando todos saíram da
navezinha, deixou-se ficar ali e suspirou aliviada. Bannik sentou-se na cadeira atrás dela e
encostou a cabeça, ainda digerindo os pormenores da sua estada na nave dos Caçadores...
o que vira... os colegas que tinham morrido... a sua experiência de quase “pós-
morte”...“Tenho de falar com o Conselheiro assim que fizer um relatório preliminar ao
Capitão, tomar um banho e dormir uma semana...”
Foi quando a meio-vulcana se ergueu e o viu ali.
- Bannik? Não percebi que você havia ficado. Está tudo bem?
Ela sentou do lado dele e o encarou com aqueles imensos e doces olhos castanhos
que lhe haviam chamado a atenção desde a primeira vez que a vira. A sensação do corpo
dela ainda estava em seus braços e ele estava se sentindo estranhamente embaraçado na
presença da meio-vulcana.
- Sim, T‟mir, está... Só estava a pensar em algumas coisas que ocorreram comigo.
Mas está tudo bem.
Ela sorriu, e colocou sua mão sobre a dele.
- Se precisar conversar com alguém, eu estarei aqui. É só chamar. - ela se levantou
e saiu da nave auxiliar. Bannik a observou se dirigir para um console na parede e digitar
alguma coisa. Lembrou-se de Heavyside perguntando sobre a implicância que ele tinha com
T‟mir, e que ele não pudera responder.

********

Spencer estava sentado em sua cadeira, aguardando ansiosamente por notícias do


grupo avançado. A espera era inquietante. Às vezes, aquilo parecia ser a pior parte de ser
um Capitão.
A Tenente Adachi virou-se para Spencer e comunicou.
- Capitão, a Hawking nos informou que está retornando.
- Muito bem, Tenente. Quantos a bordo?
Tami pressionou alguns botões.
- O grupo avançado e o Alferes Bannik.
“E os outros? Mortos?” Pensou Spencer.
O Alferes que ocupava o console de ciências informou:
- Capitão, estou detectando um aumento de energia na nave dos Caçadores.
Spencer se levantou e bateu em seu comunicador.
- Ponte para Engenharia.
{Engenharia, aqui Welker falando.}
- Sr. Welker, o sistema do EPS está pronto?
{Sim, Capitão.}
- Acione imediatamente. Spencer desliga.
Spencer se voltou para a Tenente Adachi.
- Escudos levantados!
- Mas Capitão, eles não vão poder entrar na nave...
- Do jeito que estamos, Tenente, eles estariam com muita sorte se sequer
chegassem aqui. - Spencer esperava que T‟mir fosse a piloto que sua ficha na Academia
dizia ser.
Nesse mesmo instante, a nave dos Caçadores atirou.
- Um quarto de impulso à frente! Travar phaser na nave dos Caçadores! -
Esbravejou Spencer. Mas não era a Endeavour o alvo dos Caçadores. O raio havia atingido
a nave auxiliar. O Capitão resolveu aproveitar a vulnerabilidade dos inimigos.
- Fogo!
Os phasers da Endeavour dispararam na nave dos Caçadores.
- Relatório, Tenente Adachi!
A jovem digitou algo em seu console, e relatou ao Capitão.
- Atingimos um setor da Engenharia deles, senhor, mas não causamos dano algum.
Não consigo entrar em contato com a Hawking.
- Tenente Adachi, temos transportes?
- Sim e não senhor...
- Como?
- O alcance é muito baixo, eles vão ter que chegar mais perto.
Spencer socou a sua cadeira, tentando dar vazão a sua frustração.
- Vamos chegar mais perto deles, então! - “Porque eles não revidam?”

***
Vrumi‟tzar segurava Gaum‟tzar pelo pescoço. Como ela era maior, ele estava sendo
sufocado enquanto tentava atingir o chão. Os outros dois olhavam perplexos.
- O q-que... v-você... t-tá.. fa...endo!?! - Gaum‟tzar tentava falar.
- Você não vai destruí-los!!! - Respondeu Vrumi‟tzar. O seu tom de voz era
estranho para eles. Gaum‟tzar fazia sinais para Found‟tzar, de modo que ele o libertasse.
Mas Found‟tzar relutava em atacar a fêmea, afinal ela era sua superior, os dominava.
- Va-vamos! N-não é e-ela!!! - Gritou Gaum‟tzar.
Found‟tzar finalmente entendeu que havia algo de errado. Levantou-se e enfiou sua
garra no torso de Vrumi‟tzar, dilacerando seus órgãos internos. Ela imediatamente soltou
Gaum‟tzar, e agonizando de dor, foi ao chão. Gaum‟tzar esfregava a sua garganta.
- Ela ia me matar... Helm‟tzar, status?
Helm‟tzar retornou sua atenção para seu console.
- A nave grande nos atacou, mas seu raio não nos afetou. Nosso raio apenas
conseguiu avariar a nave pequena, e não conseguimos trazer nenhum deles.
- O portal? - indagou Gaum‟tzar.
- Em 25 mol‟rocs estará aqui. - respondeu Found‟tzar. Gaum‟tzar refletiu.
- Vamos atacar a nave grande.
- Para que? Eles não são compatíveis... você viu como ficou Vrumi? - retrucou
Found‟tzar.
- Oras, deve haver algum compatível! Não há raça que não conseguíssemos
incorporar até hoje.
- O raio está preparado. - informou Helm‟tzar.
Gaum‟tzar olhou fixo para o corpo de Vrumi‟tzar... A raiva que sentia daquele que a
destruíra se dirigia também aos seus congêneres.
- Disparar!

***
Spencer se levantou de sua cadeira e caminhava até o console de operações,
quando a nave sacudiu com um forte impacto.
- Fomos atingidos pelo raio deles! - anunciou Tami.
- Danos?
- Foram mínimos, os escudos estão agüentando.
Spencer sorriu. “A modificação do EPS funcionou...”
- Preparar torpedo quantum. Disparar assim que estiver pronto.
Segundos depois, veio o anúncio do Alferes que estava no console tático.
- Torpedo disparado!
Spencer olhou fixo para a tela, esperando o resultado de seu ataque.

***

A nave sacudiu bastante. O cheiro de material orgânico queimado era forte.


Alarmes soavam.
- Gaum‟tzar, o casco está rompido! Fomos atingidos em cheio! - disse Helm‟tzar.
- Eles parecem ter boas armas. - disse Found‟tzar.
- O portal?! - gritou Gaum‟tzar.
- Já está nos nossos sensores.
Gaumt‟zar olhou para a tela. Viu a nave da Federação brilhando, resplandecente.
Mas por mais que quisesse lutar, sabia que tinha que fugir. Os dados que obtivera deles
talvez garantissem o futuro de seu povo. A vingança poderia ficar para outro dia.
- Disparem mais uma vez e vamos a toda velocidade para lá!
Os outros apenas acenaram com a cabeça.

***

Spencer havia observado o torpedo atingir a nave dos Caçadores. Parecia que eles
não estavam preparados para um ataque da nave da Federação.
- Senhor, parece que eles... - Tami foi interrompida antes que completasse a frase
pelos solavancos na nave. Outro raio vindo da nave dos Caçadores atingiu a Endeavour.
- Relatório! - indagou Spencer.
- Escudos em 35% mas agüentando. - disse o Alferes no console de segurança.
“Estamos conseguindo.” Pensou o Capitão.
- Preparem outro torpedo! Disparar ao meu comando. - ordenou o capitão.
O Alferes apertou vários botões rapidamente.
- Torpedo pronto!
- Travar no alvo e... - Spencer interrompeu sua fala, boquiaberto. Na tela principal
aparecia a imagem da nave se deslocando para longe da Endeavour. De repente, surgiu nas
proximidades da nave alienigéna algo que lembrava um wormhole. A nave desapareceu
dentro dele, que em seguida também sumiu dos sensores.
- Mas que diabos foi aquilo?
- Um wormhole, senhor?
Spencer nem respondeu o Alferes da Segurança, se limitando a olhá-lo feio.
Retornou sua atenção para a Tenente Adachi.
- Tenente, escudos abaixados, vamos receber nosso grupo avançado.
- Sim, senhor.
Spencer retornou para sua cadeira. Ficou lá sentado, observando a tela que
mostrava as estrelas e refletindo sobre os últimos eventos. “Uma raça que domina a
tecnologia de wormholes artificiais? Será que teremos como resistir a eles na próxima vez?”
A voz da Tenente Adachi interrompeu seus pensamentos.
- Senhor, o grupo avançado já está a bordo.
- Relatório?
- A Alferes T‟mir relata que os danos estruturais na nave foram grandes, mas
reparáveis. Infelizmente o Alferes Pepe morreu.
Spencer suspirou.
- Muito bem, Tenente. Podemos sair de alerta vermelho. Marque curso para a base
estelar mais próxima. Velocidade de cruzeiro. A ponte é sua até T‟Gar voltar... Estarei em
minha sala. - ordenou Spencer, levantando-se e caminhando para sua sala. Quando chegou
lá, caminhou até sua cadeira, e praticamente jogou seu corpo nela.
- Computador, gravar entrada no diário.

< Acessando... programa iniciado. >6


- Data estelar 23790206.1954. Parece que nosso conflito com os alienígenas se
encerrou com a fuga deles. Infelizmente, dos tripulantes seqüestrados somente
conseguimos resgatar o Oficial de Segurança Assistente, Alferes Bannik. Estamos nos
dirigindo para a Base 25, onde iremos efetuar reparos. A raça que encontramos pareceu
possuir grande conhecimento de tecnologia de viagem estelar, assim como de sistemas de
ataque e defesa. Nossas armas pouco surtiram efeito. Talvez tenhamos encontrado mais
um povo que não se importa com diplomacia, nem coexistência... apenas a conquista os
interessa. Parece-me ser mais uma longa jornada a galgarmos... e mais vidas a serem
perdidas...
Spencer fez uma pausa.
- Computador, apagar último trecho do diário e gravar.
< Processando... >
Pode-se ouvir os sons típicos do computador mostrando que a tarefa havia sido
completada. Spencer se levantou e saiu do seu escritório a caminho de seus aposentos.
Necessitava de um bom banho.

Epílogo

Davis limpava tranqüilamente o balcão do Bar do Davis. Já era tarde da noite nos
cronômetros oficiais da nave, e quem não estava de serviço, descansava em seus
dormitórios. Estava pensando em, sinceramente, acabar de limpar e também ir dormir.
Aquela bagunça com os aliens feios tinha deixado a nave em polvorosa, e afastado todos do
Bar do Davis. Para piorar, o Tenente Heavyside tinha morrido na mão dos caçadores... E o
desagradável tyrriano iria assumir o posto. “Nem sempre se ganha.” Lavou as mãos, e
quando ia apagar as luzes, o Conselheiro entrou. Qualquer outra pessoa teria sido
dispensada, mas Davis gostava muito de Chaz, então o saudou animadamente.
- Olá, Conselheiro! Quer beber alguma coisa? - Chaz acena com a cabeça. - Hum,
que desânimo... Algo bem forte, mas sem álcool?
Davis se meteu no estoque e saiu de lá com uma garrafa empoeirada e um sorriso
satisfeito no rosto.
- Pronto, conhaque rigeliano sintetizado, safra de 2365! A melhor dos últimos 200
anos!
Colocou um copo para o Conselheiro, enquanto ele mesmo se servia.
- Bom, quer conversar? Quer dizer, você parece chateado...
O Conselheiro começou a relatar a missão para Davis. Do choque em ver uma raça
que não pensava em mais nada a não ser a sobrevivência, ignorando os interesses de
outros, até a tristeza pela morte dos tripulantes. Literalmente, desabafou. Davis percebeu
como deveria ser difícil ser o Conselheiro da nave. Quer dizer, os outros podiam contar as
coisas para você, mas para quem você contaria?
Por isso, o barman escutou com atenção. E quando Chaz terminou, a única coisa
que pode dizer, enquanto enchia novamente os copos, foi:
- Bem, Conselheiro, é como diz um velho ditado lá da Terra. “Um dia é da caça...”
Chaz o interrompeu.
- Mas e nós quem somos? A caça ou os caçadores? Somos hegemônicos só até
encontrarmos alguém mais forte e poderoso?
Davis não respondeu. Ergueu seu copo, sacudindo a cabeça. Virou a bebida em um
trago só, e completou seu ditado.
- “... o outro é do caçador.”

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