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Metodologia da Investigação I – 2004/2005 1

DEFCUL

ANÁLISE DE DOCUMENTOS: MÉTODO DE RECOLHA E ANÁLISE DE DADOS

Sílvia dos Santos Calado


Sílvia Cristina dos Reis Ferreira
Mestrado em Educação – Didáctica das Ciências

Com este trabalho pretende-se compreender em que consiste a “análise de documentos”, que
cuidados o investigador deve ter na recolha e análise desses documentos e que vantagens e
limitações este método apresenta. De modo a alcançar os objectivos definidos, estruturámos o
trabalho em cinco partes: (1) Introdução, onde é contextualizado este método nos paradigmas em
investigação educacional e são esclarecidos alguns termos relacionados com a análise de
documentos; (2) Recolha de documentos, na qual se discute aspectos como a localização, a
natureza, a selecção e a análise crítica dos documentos; (3) Análise de conteúdo, onde se aborda um
conjunto de procedimentos para a análise dos documentos recolhidos; (4) Vantagens e limitações
deste método; e (5) Conclusão.

1. Introdução

Existem, segundo Bogdan e Byklen (1994), Tuckman (2002) e Quivy e Campenhoudt


(2003), três grandes grupos de métodos de recolha de dados que se podem utilizar como fontes de
informação nas investigações qualitativas: (a) a observação; (b) o inquérito, o qual pode ser oral –
entrevista – ou escrito – questionário; e (c) a análise de documentos. A relação complexa que existe
entre estes três métodos está esquematizada na Figura 1 (Igea, et al., 1995). Relativamente ao
método abordado neste trabalho, a análise de documentos, este pode enquadrar-se também em
investigações de natureza positivista e crítica, diferenciando-se nos procedimentos adoptados para
essa análise.
O facto do investigador utilizar diversos métodos para a recolha de dados, permite-lhe
recorrer a várias perspectivas sobre a mesma situação, bem como obter informação de diferente
natureza e proceder, posteriormente, a comparações entre as diversas informações, efectuando
assim a triangulação da informação obtida (Igea, et al., 1995). Deste modo, a triangulação é um
processo que permite evitar ameaças à validade interna inerente à forma como os dados de uma
investigação são recolhidos. Chagas (1993) e Machado (2004), por exemplo, nas investigações que
efectuaram, recorreram em simultâneo a estes métodos de recolha de dados: questionários,
entrevistas, observação e análise de documentos.

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Figura 1. Utilização conjunta de métodos


de recolha de dados. (Adaptado de Igea et
al., 1995).

A análise de documentos, seguida na maioria das investigações educacionais, pode ser usada
segundo duas perspectivas:
− servir para complementar a informação obtida por outros métodos, esperando encontrar-
se nos documentos informações úteis para o objecto em estudo;
− ser o método de pesquisa central, ou mesmo exclusivo, de um projecto e, neste caso, os
documentos são o alvo de estudo por si próprios (Bell, 1993).

Para se abordar a “análise documental” importa clarificar alguns conceitos como dado,
documento e análise:
− Dado – “Um dado suporta uma informação sobre a realidade, implica uma elaboração
conceptual dessa informação e o modo de expressá-la que possibilite a sua conservação e
comunicação” (Flores, 1994, p.16). Esta definição de dado pode ser representada através
do esquema da Figura 2.
− Documento – impressão deixada num objecto físico por um ser humano e pode
apresentar-se sob a forma de fotografias, de filmes, de diapositivos, de endereços
electrónicos, impressa (a forma mais comum), entre outras (Bell, 1993).
− Análise – em investigação educativa, de uma forma geral, consiste na detecção de
unidades de significado num texto e no estudo das relações entre elas e em relação ao
todo (Flores, 1994).

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Relacionando os três conceitos, num contexto de investigação educacional, pode afirmar-se


que os documentos são fontes de dados brutos para o investigador e a sua análise implica um
conjunto de transformações, operações e verificações realizadas a partir dos mesmos com a
finalidade de se lhes ser atribuído um significado relevante em relação a um problema de
investigação (Flores, 1994).

Figura 2. Elementos incluídos no


conceito de dado (Fonte: Flores,
1994).

A análise de documentos pode, então, ser interpretada como sendo constituída por duas
etapas: uma primeira de recolha de documentos e uma segunda de análise, como a análise de
conteúdo.

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2. Recolha de Documentos

2.1. Localização dos Documentos

A localização dos documentos é muito variada e, geralmente, é a própria natureza do estudo


que orienta o investigador para determinadas fontes, como institutos nacionais de estatística,
bibliotecas, arquivos e bancos de dados, actas de reuniões entre os organismos em estudo, jornais de
escola, documentos produzidos pelo professor e pelos alunos, e muitas mais. Deste modo, torna-se
importante conhecer o tipo de registos e informações que existe numa determinada
organização/instituição. Acontece com alguma frequência as instituições, sobretudo oficiais,
destruírem documentos que mais tarde revelam-se necessários. Por outro lado, nem todos os
documentos que existem estão disponíveis para consulta, estes podem ser confidenciais. É, pois,
importante que o investigador tenha estas informações a priori. Convém ainda referir que alguns
dados documentais podem estar incluídos em fontes do país do investigador mas também em fontes
estrangeiras (Bell, 1993).

2.2. Natureza dos Dados Documentais

Quanto à natureza dos documentos estes podem ser classificados em fontes primárias ou em
fontes secundárias.
− Fontes primárias - produção de documentos efectuada durante o período a ser
investigado, como por exemplo manuscritos, leis, actas de reuniões, memorandos,
biografias, filmes, pinturas, entre outros (Cohen & Manion, 1994).
− Fontes deliberadas – foram produzidas com o intuito de servir a futuras investigações,
podendo ter a função de esclarecimento de suspeitas ou de reputação (Lehmann &
Mehrens, 1971, citado em Bell, 1993). Exemplos de fontes deliberadas são as
autobiografias, documentos de autojustificação e memórias de políticos ou pessoas
ligadas à educação (Elton, 1967, citato em Bell, 1993).
− Fontes inadvertidas – tipo de fontes primárias mais comum e, geralmente, mais valioso,
resultante do normal funcionamento do sistema em estudo, são usadas pelo investigador
com uma finalidade diferente daquela com que foram criadas. São exemplos as actas de
conselhos de turma, os números de estatísticas nacionais, os manuais e folhetos
informativos e os relatórios de inspecções escolares (Bell, 1993).
− Fontes secundárias – interpretações de eventos do período em estudo, baseadas nas
fontes primárias, como por exemplo enciclopédias, réplicas de objectos de arte, manuais
escolares, ou mesmo a história de uma escola escrita a partir de actas de reuniões gerais
(Bell, 1993). Best (1970, citado em Cohen & Manion, 1994) previne para o facto de as
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fontes secundárias terem um carácter limitativo uma vez que resultam da passagem de
informação de uma pessoa a outra, ou de interpretações de várias pessoas.

A distinção entre fontes primárias e secundárias pode ser complicada uma vez que,
consoante o contexto ou ponto de vista, o mesmo documento pode ser entendido ora como fonte
primária ora secundária (Marwick, 1989, citado em Bell, 1993).
A questão da natureza dos dados documentais prende-se, ainda, a duas variantes mais
frequentemente utilizadas em investigação: a recolha de dados estatísticos e de documentos de
forma textual (Quivy & Campenhoudt, 2003). Cada uma destas variantes implica diferentes
processos de validação de dados que serão discutidos mais à frente.

2.3. Selecção dos Documentos

A selecção dos documentos é influenciada por um factor da investigação muito importante,


o tempo disponível. Frequentemente a quantidade de material documental é excessiva para o tempo
que o investigador dispõe nesta fase do projecto e, deste modo, ele é obrigado a escolher o que
recolher e analisar. O investigador terá, então, de adoptar uma estratégia de selecção que deverá ser
adequada à finalidade do seu trabalho e justificável. Bell (1993) refere algumas sugestões para se
proceder a uma “selecção controlada”:
− “não incluir demasiadas fontes deliberadas;
− não seleccionar documentos com base na forma como estes apoiam os seus pontos de
vista;
− procurar uma selecção equilibrada com atenção ao tempo disponível; e
− verificar periodicamente se se está a cumprir as datas do plano” (p.107).

Para Lofland e Lofland (1984, citado em Flores, 1994) uma forma de tornar a fase de
recolha de dados mais produtiva é proceder, em simultâneo, a uma “pré-análise” destes. É que estas
duas tarefas, a recolha de dados e a “pré-análise” destes, condicionam-se mutuamente, pois a
informação recolhida e a conceptualização resultante da sua análise orientam uma nova recolha de
dados. Ao longo do processo de investigação a tarefa da “pré-análise” vai ocupando uma posição
predominante, até que se entre na fase de análise propriamente dita (Figura 3).

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Figura 3. relação improdutiva e produtiva


entre a recolha de dados e análise (Fonte:
Flores, 1994).

2.4. Análise Crítica dos Documentos

A análise crítica dos documentos é fundamental no sentido de ser necessário controlar a


credibilidade e o valor dos documentos e informações a recolher e dos já recolhidos, bem como a
adequação destes às finalidades do projecto. Esta análise crítica pode ser empreendida em duas
etapas, uma relativa à avaliação da autenticidade das fontes – crítica externa – e outra à avaliação da
exactidão ou valor dos dados – crítica interna (Cohen & Manion, 1994).
“A crítica externa procura saber se um documento é genuíno, isto é, se não foi forjado, e se é
autêntico, isto é, se é o que pretende ser e se é verdade o que diz” (Bell, 1993, p.108). Segundo
Cohen e Manion (1994) para averiguar se um determinado documento não sofreu fraude importa
realizar algumas verificações como a assinatura, a caligrafia, o período em que foi produzido, ou
mesmo, testes químicos à tinta e a outros materiais. Bell (1993) refere que, necessário mesmo, é
saber se o autor esteve na origem do documento. Um investigador também deve ter ciente que um
documento genuíno não é necessariamente autêntico.
A crítica interna é a fase mais complicada, em que o investigador procura a credibilidade do
autor do documento. Bell (1993) listou um conjunto de questões que devem ser colocadas, tais
como: de que tipo de documento se trata? que diz de facto o documento? quem o produziu? qual foi
a finalidade? quando e em que circunstâncias foi produzido? será completo?. Deverão ainda ser
colocadas questões sobre o próprio autor do documento, como: que se sabe da sua origem social e
das suas tendências políticas? o autor costuma dizer a verdade, exagerar, distorcer ou emitir
aspectos do que descreve? (Bell, 1993).
Ao recorrer à crítica externa e à crítica interna para procurar conferir credibilidade à sua
análise documental, o investigador deve impor a si próprio a necessidade de assumir uma
determinada postura. Por exemplo, é preciso ter grandes cuidados perante documentos inadvertidos
e averiguar se estes não foram alterados, forjados de forma a enganar outras pessoas. Perante dados

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estatísticos deve-se avaliar a credibilidade do organismos responsável e dos métodos de cálculo


seguidos (Quivy & Campenhoudt, 2003). É igualmente importante verificar se o objecto principal
do documento são factos ou os pontos de vista do autor (Barzun & Graff, 1977, citado em Bell,
1993), sendo necessário estar atento a expressões que possam revelar as tendências e tomadas de
partido deste. Geralmente, quando um documento vai contra os próprios interesses do autor,
aumenta a probabilidade de este estar a dizer a verdade. Mais difícil, mas necessário também, é o
próprio investigador estar atento e reconhecer as distorções que o próprio imprime ao documento. O
investigador deve colocar-se na posição do autor e procurar dados que contrariem uma primeira
impressão para testar a validade do documento (Bell, 1993).
Procurar a validade e a fiabilidade na análise documental passa por perceber que tudo é
questionável e que se devem colocar questões como “fiável para quê?”. Segundo Marwick (1989,
citado em Bell, 1993) o método crítico vai permitir “espremer cada documento até à última gota”
(p.113).
A recolha de documentos é uma etapa no método de análise de documentos. Estes não
oferecem suficiente informação para os complexos problemas das investigações se não forem
organizados e manipulados. O que fazer com todo esse material? Como se manipulam os
documentos depois de terem sido recolhidos? Qual o método de análise a seguir?

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3. Análise de Conteúdo

A análise de conteúdo pode considerar-se como um conjunto de procedimentos que têm


como objectivo a produção de um texto analítico no qual se apresenta o corpo textual dos
documentos recolhidos de um modo transformado. Essa transformação do corpo textual pode
ocorrer de acordo com regras definidas e deve ser teoricamente justificada pelo investigador através
de uma interpretação adequada (Delgado & Gutiérrez, 1995). Os autores realçam que a análise de
conteúdo pode encarar-se como um procedimento destinado a destabilizar a integridade imediata da
superfície textual, evidenciando os seus aspectos que não são directamente intuitivos, mas estão
presentes.
É assim possível estabelecer um conjunto de tarefas que constituem o processo analítico
básico, o qual é comum à maioria dos estudos em que é necessário trabalhar com documentos,
havendo vários métodos de análise de conteúdo (Quivy & Campenhoudt, 2003). Miles e Huberman
(1984, citados em Flores, 1994) dividem a análise de conteúdo em três conjuntos de tarefas:
a. Redução dos dados
b. Apresentação dos dados
c. Conclusões

3.1. Redução dos Dados

A análise pressupõe um processo de redução de dados – parte-se de um conjunto amplo e


complexo de dados para chegar a elementos manipuláveis que permitam estabelecer relações e
obter conclusões – sendo a categorização e a codificação os processos mais representativos (Bogdan
& Byklen, 1994; Flores, 1994).
Uma das primeiras tarefas a que o investigador deve submeter os dados é efectuar a sua
separação em unidades relevantes e significativas, a unidade de análise pode ser, por exemplo, uma
frase ou um parágrafo (Cohen & Manion, 1994). Esta divisão da informação em unidades pode
realizar-se de acordo com diferentes critérios, sendo o mais frequente considerar as unidades em
função do tema abordado (Flores, 1994).
A identificação e classificação das unidades consiste em examinar as unidades de dados de
modo a encontrar nelas determinadas componentes temáticas que permitam ao investigador
classificá-las numa determinada categoria de conteúdo. Assim, a categorização torna possível
classificar conceptualmente as unidades que abordam o mesmo tópico. As categorias podem referir-
se a situações e contextos, actividades e acontecimentos, relações entre pessoas, comportamentos,
opiniões, perspectivas sobre um problema, métodos e estratégias, processos (Flores, 1994).

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As categorias utilizadas num estudo podem definir-se a priori, de acordo com as questões e
hipóteses que orientam a investigação, geralmente enquadrando-se numa investigação de natureza
positivista, ou então podem definir-se a posteriori, a partir dos próprios dados obtidos,
enquadrando-se numa investigação de natureza interpretativa. Bogdan e Byklen (1994) apresentam
vários exemplos de categorias que podem ser estabelecidas. A afirmação que se apresenta de
seguida é de uma professora e foi codificada na categoria “Percepções do professor acerca do seu
trabalho”:

Para mim, o ensino é a minha vida. Não separo ambos. Muitas vezes no duche penso:
“E se eu apresentasse o material desta maneira e não da maneira que apresentei o ano
passado?”. Por vezes, passam-se vinte minutos no duche sem eu dar por isso. O meu
marido pensa que eu sou louca, mas ele é exactamente como eu. Não somos fãs de
festas, nem de férias; o trabalho é realmente a razão de ser das nossas vidas. (Bogdan
& Byklen, 1994, p.223).

Após a categorização, segue-se o processo de codificação, que não é mais do que o processo
físico mediante o qual se realiza a categorização. Assim, é uma operação concreta na qual se coloca
em cada unidade estabelecida um determinado código próprio da categoria em que o investigador a
considera incluída. Os códigos que representam as categorias podem ser números com os quais se
marca cada unidade dos dados, ou então podem ser abreviaturas de palavras dos respectivos nomes
das categorias (Flores, 1994).
Deste modo, ambos os processos de categorização e codificação estão relacionados com
uma operação fundamental: a decisão sobre a associação de cada unidade a uma determinada
categoria (Flores, 1994). Assim, ao efectuar a codificação, o investigador está necessariamente a
agrupar as diferentes unidades de dados de acordo com as diferentes categorias estabelecidas.
Todo este conjunto de tarefas – separação em unidades, categorização/codificação e
agrupamento – constituem modos de contribuir para a redução de dados, fundamental para a análise
de conteúdo.

3.2. Apresentação dos Dados

Os processos de redução dos dados permitem simplificar a informação, mas esta deve ser
apresentada de algum modo que possibilite o seu posterior processamento e que facilite a obtenção
de conclusões. Os procedimentos para a apresentação dos dados dependem se a análise recorre à
quantificação ou se é uma análise qualitativa (Flores, 1994).

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A apresentação dos dados na análise que recorre à quantificação pode fazer-se na forma de
uma matriz numérica onde os valores de cada célula correspondem às frequências alcançadas nas
diferentes categorias de cada unidade considerada para o estudo, sendo essencial o uso de
programas informáticos. Um exemplo são as tabelas léxicas, onde é apresentada informação sobre a
ocorrência de determinadas palavras de acordo com as categorias estabelecidas. A apresentação de
dados na análise qualitativa também pode recorrer a vários procedimentos, como diagramas,
matrizes e sistemas de rede (Flores, 1994).
Deste modo, a apresentação de um conjunto de dados pode fazer-se de múltiplas formas,
tudo depende do objectivo que o investigador pretenda com eles. Por vezes, o interesse é
unicamente descritivo, apresentando-se a análise da informação disponível e fornecendo-se uma
visão de conjunto (Flores, 1994).

3.3. Conclusões

As conclusões não devem limitar-se à apresentação ordenada dos dados devidamente


reduzidos, já que implicam maiores níveis de inferência. As conclusões são obtidas pelo
investigador durante todo o processo de recolha de dados e durante a análise de conteúdo dos
mesmos. As tarefas de redução e apresentação dos dados permitem fazer afirmações que
progressivamente avançam desde o descritivo ao explicativo e desde o concreto ao abstracto
(Flores, 1994).
Flores (1994) refere ainda que as categorias obtidas no processo de redução dos dados são
em si mesmas conclusões do estudo. Também a apresentação dos dados numa matriz, quadro,
figura, entre outros, pressupõe algum tipo de conclusões sobre a sua estrutura.
Neves e Morais (2000) realizaram uma investigação onde efectuaram uma análise
qualitativa do conteúdo de documentos educativos, nomeadamente constituições, lei de bases e
programas de Ciências Naturais, e consideraram a frase como unidade de análise. Nesta
investigação, as autoras estabeleceram as categorias de acordo com a teoria subjacente ao estudo.

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4. Vantagens e Limitações da Análise de Documentos

Segundo vários autores, a análise de documentos apresenta várias vantagens:


− permite evitar o recurso abusivo às sondagens e aos inquéritos por questionário (Quivy
& Campenhoudt, 2003);
− os documentos, geralmente, podem obter-se gratuitamente e a baixo custo (Igea et al.,
1995);
− os documentos proporcionam informações sobre ocorrências passadas que não se
observaram ou assistiram (Igea et al., 1995).

As principais limitações prendem-se com o facto de:


− nem sempre ser possível o acesso aos documentos (Quivy & Campenhoudt, 2003);
− os documentos podem não conter toda a informação detalhada (Igea et al., 1995);
− os documentos podem ter sido forjados, alterados, falseados (Igea et al., 1995);
− muitas vezes os investigadores não explicitam as ferramentas conceptuais e lógicas que
usaram para chegar a determinadas conclusões sobre a realidade educativa estudada
(Flores, 1994).

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4. Conclusão

Durante a realização deste trabalho sentimos algumas dificuldades que se prenderam,


sobretudo, com a pesquisa bibliográfica sobre o método de recolha e análise de dados em estudo,
bem como com o tratamento da informação recolhida. Dificuldades estas que consideramos estarem
relacionadas com a própria natureza da análise de documentos. Para tentar superar as dificuldades
sentidas procurámos responder a questões que foram surgindo ao longo do processo, tais como “o
que é um documento?”, “quais os cuidados a ter na recolha e análise dos documentos?”.
Compreendemos que a análise de documentos, tal como qualquer outro método de recolha e
análise de dados em investigação, tem as suas vantagens e desvantagens e implica um conjunto de
pressupostos que deveremos ter presente e respeitar. Numa primeira fase, devemos proceder à
recolha dos documentos, em que precisamos de localizar as fontes, recorrer a uma selecção
adequada e procurar averiguar a credibilidade destes. Numa segunda fase teremos de recorrer ao
tratamento da informação que recolhemos, isto é, à sua análise, de forma a que esta se torne
significativa para a nossa investigação. Para poder aplicar um determinado método de recolha de
dados o investigador terá de procurar conhecê-lo mas, sobretudo, compreendê-lo.

Tal como referem Quivy e Campenhoudt (2003), apenas conhecemos um método de recolha
e análise de dados “depois de o termos experimentado por nós próprios. Antes de escolhermos um
é, portanto, indispensável assegurarmo-nos, junto de investigadores que o dominem bem, da sua
pertinência em relação aos objectivos específicos de cada trabalho, às suas hipóteses e aos recursos
de que dispomos” (p.186).

Cristina Calado, Cristina Ferreira


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5. Referências Bibliográficas

Bell, J. (1993). Como Realizar um projecto de Investigação (3ª ed.). Lisboa: Gradiva.

Bogdan, R.; & Biklen, S. (1994). Investigação qualitativa em educação – Uma introdução à teoria
e aos métodos. Porto: Porto Editora.

Chagas, I. (1993). Teachers as innovators: A case study of implementing the interactive videodisc in
middle school science program. Tese de Doutoramento, Boston University.

Cohen, L.; & Manion, L. (1994). Research methods in education (4ª ed.). London: Routledge.

Delgado, J.; & Gutiérrez, J. (1995). Métodos y técnicos cualitativos de investigación en ciencias
sociales. Madrid: Editorial Síntesis.

Flores, J. (1994). Análisis de datos cualitativos – Aplicaciones a la investigación educativa.


Barcelona: PPU.

Igea, D.; Agustín, J.; Beltrán, A.; & Martín, A. (1995). Técnicas de investigación en ciencias
sociales. Madrid: Dykinson.

Machado, C. (2004). Actividades práticas e literacia científica – Um estudo com alunos do 5º ano
de escolaridade. Tese de Mestrado, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (não
publicada).

Neves, I,; & Morais, A. (2000). Política educativa e orientações programáticas: Análise da educação
científica em dois períodos socio-políticos. Revista de Educação, IX (1), 93-109.

Quivy, R.; & Campenhoudt, L. (2003). Manual de investigação em ciências sociais (3ª ed.). Lisboa:
Gradiva.

Tuckman, B. (2002). Manual de investigação em educação – Como conceber e realizar o processo


de investigação em educação (2ª ed.). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

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