Você está na página 1de 20

Caminhos entre a literatura

e a história
ALFREDO BOSI *

REIO QUE a certa altura de nossa vida a memória pessoal nos transcende;

C assim, o que dissermos poderá ter algum significado na esfera da história


e da cultura. De resto, só essa esperança nos redime do pecado de falar de
nós mesmos, hábito inveterado que tantas vezes cultivamos, e que é, nas palavras
de Umberto Eco, a essência mesma do mau gosto.
Por onde começar? Pelo caderno em que o adolescente copiava os seus
poemas prediletos misturando sonetos de Camões e Sá de Miranda – O sol é
grande, caem com a calma as aves – e a Berceuse das rimas riquíssimas, de Guilher-
me de Almeida, que rimava lágrimas com milagre mas... Mas nesta antologia
íntima havia também poemas feitos para chorar, poemas que eu lia secretamente,
em voz baixa, comovido até o ponto crítico do nó na garganta. E era O pequenino
morto de Vicente de Carvalho e eram Os cisnes, de Júlio Salusse, colhido em
alguma revista literária dos anos de 1950. Os tercetos ficaram ecoando até hoje
em minha memória:

Um dia um cisne morrerá por certo;


Quando chegar esse momento incerto,
No lago, onde talvez a água se tisne,

Que o cisne vivo, cheio de saudade,


Nunca mais cante, nem sozinho nade,
Nem nade nunca ao lado de outro cisne.

Folheando hoje, tantos anos depois, este caderno, procuro o nome de


algum poeta contemporâneo que me tivesse despertado o desejo de trazê-lo para
a companhia dos clássicos, românticos, paranasianos e simbolistas que mereciam
então o cuidado da cópia manuscrita e a emoção do leitor solitário. E encontro
um soneto de Drummond,‘“Legado” (que começa com uma interrogação per-
plexa: Que lembrança darei ao país que me deu / tudo que lembro e sei, tudo quan-
to senti? / Na noite do sem-fim, já o tempo esqueceu/ minha incerta medalha, e o
meu nome se ri. E duas folhas adiante, a “Oração da noite” de Cecília Meireles.

* Depoimento dado durante o III Ciclo de Conferências “Caminhos do Crítico”,


na Academia Brasileira de Letras, em 10 de maio de 2005 .

ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005 315


Como poderia então o adolescente ensimesmado imaginar que, meio século de-
pois, convidado a dar uma conferência por ocasião do centenário de Cecília
Meireles, iria discorrer sobre o sentimento de ausência do mundo que é o tema
daqueles catorze versos transcritos no seu caderno? Tudo obra do acaso ou coe-
rência secreta armada por uma vocação que se ignorava a si mesma?
Mas, consciente ou não, o chamado às Letras era forte, tão forte que, na
hora de escolher a profissão, não hesitei um só momento: queria ser professor de
Português, e segui o caminho direto, que era fazer o curso de Letras Neolatinas
na Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo. Permitam-me relembrar
a primeira aula a que assisti, dada pelo saudoso professor Ítalo Bettarello, que
regia a disciplina de Literatura Italiana. Digo relembrar, porque já evoquei essa
passagem na introdução que escrevi para a coletânea de ensaios Leitura de Poe-
sia. Foi assim:
“A aula era de literatura italiana. Todos calouros, e a maioria inexperta no
idioma do bel paese là dove il sì suona”. A São Paulo do segundo pós-guerra já
não era aquela cidade ítalo-brasileira dos anos de 1920 que os modernistas can-
taram e contaram. Mas, desprezando solenemente as cautelas didáticas e apos-
tando tudo na palavra do filósofo e na força maior da nossa ânsia de aprender, o
professor Ítalo Bettarello abria o seu curso lendo o período inicial da Aesthetica
in nuce de Benedetto Croce:
Se si prende a considerare qualsiasi poema per determinare che cosa lo faccia
giudicar tale, si discernono allá prima, costanti e necessari, due elementi: un complesso
d’immagini e un sentimento che lo anima.
Traduzindo: “Se nos dispomos a considerar qualquer poema para determi-
nar o que nos faça julgá-lo como tal, discernimos ao primeiro olhar, constantes e
necessários, dois elementos: um complexo de imagens e um sentimento que o
anima”.
Tudo o mais pendia dessa visada ao mesmo tempo simples e profunda.
O exemplo que ilustrava a doutrina era tirado de Virgílio. Croce analisa o
Canto Terceiro da Eneida, em que Enéias conta como aportara no Epiro, onde
reinava o troiano Heleno com Andrômaca. Desejoso de ver aqueles seus
concidadãos escapos ao desastre, Enéias vai ao encontro da rainha fora dos mu-
ros da cidade, em um bosque sagrado junto às águas de um arroio a que tinham
dado o nome de Simoente em lembrança do rio que banha Tróia. Andrômaca
está celebrando ritos fúnebres diante de um túmulo vazio onde erguera dois
altares, um para Heitor, seu primeiro esposo, e o outro para o filho Astíanax. Ao
vê-lo, é tomada de pasmo e desfalece. Enéias recorda as palavras truncadas com
que, retornando a si, Andrômaca o interpelara querendo saber se ele era homem
ou sombra. Vem depois a resposta não menos conturbada de Enéias que, por sua
vez, lhe pede que rememore o passado. E a evocação dolorosa e pudica de
Andrômaca que revisita o seu destino de sobrevivente ao massacre, de escrava
tirada em sorteio e feita concubina de Pirro, que, no entanto, a rejeitara e a dera

316 ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005


como escrava a Heleno; e a morte de Pirro por mão de Orestes, e a libertação de
Heleno que se tornou rei. Segue-se ao relato a procissão de Enéias com os seus
pela cidade que, pequenina, em tudo imita a Tróia gloriosa e derruída dos ante-
passados comuns (Canto III, 295-355).
Finda a leitura do episódio, o que temos? Imagens de pessoas, imagens de
coisas, de gestos, de atitudes, não importa se historicamente reais ou apenas
vigentes na fantasia do poeta. (Esta última constatação pesaria bastante em meu
futuro modo de ver as relações entre figuras poéticas e fatos historicamente atesta-
dos). Não imagens soltas nem avulsas, pois
através de toda elas corre o sentimento, um sentimento que não é mais do
poeta que nosso, um humano sentimento de pungentes memórias, de arre-
piante horror, de melancolia, de nostalgia, de enternecimento, e até de algo
que é pueril e ao mesmo tempo piedoso, como aquela vã restauração das
coisas perdidas, aqueles brinquedos forjados por religiosa piedade, da parva
Tróia: algo de inefável em termos lógicos, e que só a poesia, a seu modo,
sabe dizer plenamente1.
De certo modo, a doutrina crociana da poesia como figuração de um de-
terminado pathos, como intuição de um movimento da alma, dava estatuto teó-
rico à minha ingênua mas intensa fruição do poema capaz de me levar a transcre-
ver no caderno textos que me comoviam e encantavam. Olhando hoje em
retrospecto a passagem do leitor apaixonado ao estudioso munido de uma teoria
estética, eu diria que sem aquela primeira disposição de ânimo em direção ao
poético, de muito pouco me serviria o instrumental aprendido nos bancos da
faculdade. A paixão não é suficiente para interpretar o poema, mas é absoluta-
mente necessária, e os professores de Literatura que amadureceram antes da fase
estruturalista da crítica literária sabem que só os que dispunham de seiva própria
puderam atravessar o areal dos esquemas lingüísticos sem estiolar-se na mais
triste aridez.
Como se sabe, a doutrina crociana dava pistas notáveis para entender o
nexo entre imagem ficcional e movimentos subjetivos, o que é o saldo positivo
do legado do filósofo italiano e uma das matrizes professadas pela Estilística
espanhola. Mas, na medida em que Croce negava drasticamente a pertinência
estética das outras relações da poesia (com o discurso histórico, com a filosofia,
com a moral, com a religião, com o saber científico...) criava sérios impasses para
o intérprete que pretendesse fazer uma leitura histórico-social do texto literário.
Tive consciência desses limites quando, terminado o curso de Letras, rece-
bi uma bolsa de estudos para estudar literatura e filosofia italiana na Faculdade
de Letras de Florença, no ano letivo 1961-1962. A hegemonia do pensamento
crociano, evidente até os anos de 1950, já estava sendo substituída por outras
fontes teóricas, basicamente o existencialismo e o marxismo.
O existencialismo não separava os móveis afetivos do eu lírico e as suas
opções filosóficas e políticas. Para o pensador da existência, o ser humano que

ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005 317


cria uma obra de arte pensa a própria vida subjetiva e, ao mesmo tempo, vive
dramaticamente o seu pensamento e o seu engajamento. Fazer literatura era,
para Camus, uma escolha vital que incluía emoção, teoria e projeto político. A
mesma exigência percorria toda a obra de Sartre.
Quanto ao marxismo, é necessário lembrar que, na Itália do começo dos
anos de 1960, a figura central era a de Antonio Gramsci, cujos densos textos de
polêmica contra o idealismo crociano eram lidos com reverência pela aguerrida
intelectualidade de esquerda espalhada por todas as universidades. Um exemplo
que ilustra bem a diferença das abordagens crociana e gramsciana encontra-se no
modo de analisar a obra de Dante, em particular a Divina Comédia. Croce dis-
tinguia claramente, na obra, o que significava poesia, isto é, momentos de alta
expressão lírica e imagística (os episódios de Paolo e Francesca, de Ulisses e de
Ugolino, por exemplo), e o que seria não-poesia, isto é, os passos de reflexão
teológica ou política, numerosos sobretudo no Purgatório e no Paraíso. Para
Gramsci e para os marxistas, no entanto, parecia arbitrário separar lírica e fundo
doutrinário, lírica e convicção ideológica. De todo modo, Croce sempre reafir-
mou, até seus últimos escritos, o estatuto imaginário da obra de arte, que pode
cobrir todo o reino do possível, ao passo que as ciências devem ater-se ao univer-
so do real que se pode atestar e constatar. O possível inclui tudo o que é real mais
o que pode vir a sê-lo, e neste último sentido, o possível é também objeto do desejo e da
fantasia, que, por sua vez, estão em casa na hora de se criar uma obra de arte.
Essas distinções de Croce ainda me parecem válidas e aproveitáveis na hora
de pensar as múltiplas relações entre a história literária e a historiografia propria-
mente dita.
Voltando ao Brasil, em 1962, cumpriu-me lecionar Literatura Italiana, ati-
vidade que me ocupou intensamente até 1970, quando passei a ministrar a disci-
plina de Literatura Brasileira. Quem viveu aqueles anos turbulentos da história
brasileira convirá comigo que não é fácil ordenar didaticamente a riqueza con-
traditória de correntes e contracorrentes culturais que caracterizou tanto o perío-
do anterior ao golpe militar de 1964 quanto os chamados anos de chumbo, que
avançaram pelo decênio seguinte. As tendências superpunham-se ou baralha-
vam-se. O existencialismo cedia ao marxismo (era o caminho de Sartre, então o
guru dos intelectuais inconformistas), ou então refluía para suas origens
fenomenológicas, pela ação de Ricoeur e de Gadamer, mestres da hermenêutica,
aqui representada pelas propostas da revista Tempo Brasileiro dirigida por Eduar-
do Portella. No campo da análise literária, a Estilística, que dependia, em parte,
da estética crociana da expressão, era descartada pelo estruturalismo ou, mais
genericamente, pelo formalismo. Este, tangido pela censura estalinista, se deslo-
cara do mundo eslavo para a França, e tinha como figura inspiradora o grande
lingüista Roman Jakobson, que teorizara as funções da linguagem.

318 ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005


Estudo do itinerário narrativo de Pirandello
Em 1964, defendi tese de doutorado sobre o itinerário narrativo de Luigi
Pirandello. Estudei seus contos e romances que, com raras exceções, antecede-
ram a sua obra teatral. A rigor, minha abordagem distanciava-se tanto da socio-
logia da literatura como da análise estrutural da narrativa, então em plena moda.
O que me atraía na obra de Pirandello era o conflito entre a vida subjetiva das
personagens e as máscaras que estas deviam afivelar para sobreviver em socieda-
de. É o tema pirandelliano por excelência, que os seus dramas encenariam obses-
sivamente. Interessava-me flagrar o mesmo contraste nos seus romances
regionalistas, sicilianos, em O falecido Mattia Pascal, sua obra-prima, e nos enre-
dos das Novelle per um anno, alguns dos quais dariam matéria para os dramas da
sua fase madura.
Não me parecia, então, que o marxismo ortodoxo ou o estruturalismo
dispusessem de instrumentos de sondagem capazes de apreender a qualidade do
pathos que pulsava nas situações pirandellianas. O existencialismo, sob a forma
do personalismo, que se inspirava em Max Scheler, e tinha sido trabalhado por
filósofos cristãos franceses e italianos (Lavelle, Le Senne, Mounier, Pareyson),
aprofundava as relações da pessoa com o outro, o que poderia ser um ponto de
partida para estudar a narrativa de Pirandello. No fundo, porém, o que esta trazia
a lume não era o sentimento da comunhão, mas era precisamente a ruptura, a
impossibilidade de convívio do sujeito com o seu contexto familiar e, tragicamente,
a impossibilidade efetiva de libertar-se desse mesmo contexto. Uma situação existen-
cial que, rigorosamente falando, deriva da emergência do sujeito romântico, que a
sociologia marxista identifica com o eu burguês, usando, a meu ver, o termo “bur-
guês” de modo excessivamente genérico.

Tese sobre mito e poesia em Leopardi


Ainda dentro da disciplina de Literatura Italiana, defendi tese de livre-
docência, em 1970, intitulada Mito e poesia em Leopardi. Como o trabalho sobre
Pirandello, essa tese ficou inédita e talvez fique assim por muito tempo, pois nela
há questões ainda não resolvidas. A hipótese central era ambiciosa e derivava,
agora sim, da ênfase que o estruturalismo de Lévi-Strauss dava ao mito como
forma narrativa matriz. Mas, em vez de analisar a obra de Leopardi como combi-
nação de mitemas básicos (o que seria seguir o modelo estruturalista, que é
sintático), preferi reconhecer nos temas fundamentais do poeta a reinterpretação
lírica de alguns mitos da nossa cultura judaico-cristã ou greco-romana, como o
mito da natureza edênica, o mito do paraíso perdido ou da queda e o mito
prometeico da resistência do homem à força dos deuses, isto é, à força do desti-
no; o que resultou em dar à análise um modelo semântico. Esse enfoque não está
em Lévi-Strauss, que, aliás, preferia os mitos indígenas aos temas permanentes
da tradição ocidental. Quem se abeira da tradição greco-romana ou judaico-
cristã é Paul Ricoeur, cuja obra La symbolique du mal foi um de meus apoios

ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005 319


teóricos. Definitivamente, o estruturalismo não seria o meu caminho, pois, mes-
mo tratando de um tema ligado ao corpus dessa corrente, como é o caso do mito,
acabei batendo às portas do método hermenêutico.
Paul Ricoeur trata o mito como um complexo de significados inerente à
nossa tradição e, como tal, suscetível de compreensão por parte do pensador que
vive em um regime de familiaridade e quase co-naturalidade com figuras e senti-
mentos próprios da sua herança cultural.
No entanto, o fato de reconhecer alguns mitos bíblicos ou gregos na obra
de Leopardi não me dispensava de historicizar a sua reconstrução, feita por um
poeta das primeiras décadas do século XIX que vivia na Itália, então dividida em
ducados, principados, reinos estrangeiros e domínios pontifícios, ainda à mar-
gem da corrente romântica que dominava na França, na Inglaterra e na Alema-
nha. Daí, a necessidade de entender as condições culturais que levaram o poeta a
polemizar com Madame de Staël e a defender ardorosamente a beleza insuperá-
vel da Antigüidade em oposição às modas neogóticas do Romantismo germânico
ou celta. Leopardi, ainda adolescente, traduzira de modo admirável o Segundo
Canto da Eneida além de numerosos poemas gregos. Um clássico em pleno
século XIX? Na realidade, um poeta filósofo que não acreditava no progresso
linear cantado pelos liberais. Não por acaso o seu pessimismo foi louvado por
outro pessimista radical, Schopenhauer, o melhor leitor alemão de Leopardi.
Mas havia no coração de sua amargura o desejo de resistir, o que o seu último
poema, La ginestra, exprime admiravelmente, pois a giesta é a flor que resiste às
lavas que descem pelas encostas áridas do Vesúvio. Tratava-se de uma contra-
ideologia, que não se alimentava de esperanças forjadas pela política dos parti-
dos. Um pessimismo que pede a solidariedade dos homens contra os males que
advêm da própria natureza, antes madrasta que mãe. Tampouco terá sido por
acaso, Leopardi inspirou o capítulo do delírio de Brás Cubas, como luminosa-
mente apontou Otto Maria Carpeaux em um artigo revelador.
Em resumo, recorri à hermenêutica dos mitos, mas não pude ignorar a
situação política e cultural da Itália de Leopardi. Caminhos diferentes do pensa-
mento crítico começavam a cruzar-se e davam um tom de perplexidade a minhas
tentativas de interpretar textos literários.

A história literária e a historiografia


O que minhas teses me deixaram como legado intelectual, nesse fim dos
anos de 1960, era e é um problema agudo e fundamental. O problema da relação
entre poesia e história, e, portanto, da relação entre o discurso da história literá-
ria e o da historiografia tomada na sua acepção ampla, que engloba a história
social, a história econômica e a história política. E foi justamente nesses anos
que, graças à indicação generosa do poeta e amigo José Paulo Paes, fui convida-
do a escrever uma história literária, a História concisa da literatura brasileira,
que publiquei em 1970.

320 ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005


Uma das dificuldades maiores que a história literária vem enfrentando, des-
de o período romântico em que se começou a postular a identidade literária dos
povos e nações, é precisamente escolher o seu objeto prioritário. A matéria-prima do
historiador literário é tudo o que se escreveu e que pode ser considerado repre-
sentativo de uma certa cultura? Responder afirmativamente significa tomar a
palavra “literatura” no seu amplo sentido de material escrito sobre uma grande
variedade de temas. Ou a sua matéria é o texto literário em sentido estrito, o que
vem a dar prioridade à poesia, à narrativa ficcional, à tragédia, à comédia, ao
drama, em suma, aos gêneros textuais em que predomina a imaginação ou o
sentimento, sem relação obrigatória com a verdade atestável dos atos representa-
dos? Note-se que este dilema já estava formulado na oposição que Croce fazia
entre poesia e não-poesia, englobando nesta última todos os elementos didáti-
cos, políticos, científicos, religiosos etc., que formariam a estrutura cultural de
uma obra, mas não lhe dariam a identidade poética e artística, constituída da
síntese de imagem e sentimento, intuição e afetividade.

Os dois modelos de história literária no Brasil


Eu tinha à minha disposição dois modelos mutuamente exclusivos, e que
marcavam a tradição da história literária brasileira desde fins do século XIX: o
modelo sociológico representado pela História da literatura brasileira de Sílvio
Romero e o modelo histórico-estético representado pela História da literatura
brasileira de José Veríssimo. Basta ler com atenção as introduções que cada um
desses historiadores da literatura escreveu para as suas respectivas obras para per-
ceber o quanto eram diferentes e, mesmo, polemicamente opostas. Em outro
contexto, que me era mais familiar e próximo, a oposição repontava na polêmica
que Afrânio Coutinho, nos anos de 1950 e 1960, assumiu ao postular uma abor-
dagem estético-estilística para a historiografia literária, contrapondo-a à crítica
historicista ou sociologizante, que vinha da tradição romeriana, e que continua-
ria vigente em boa parte das universidades brasileiras.
Na Universidade de São Paulo, ao lado do historicismo tradicional e da
tradição filológica, a interpretação sociológica era mediada, no magistério de um
crítico da envergadura de Antonio Candido, por uma atenção às peculiaridades
de cada autor e, sobretudo, às estruturas propriamente literárias das obras estu-
dadas, como se pode facilmente verificar lendo as finas análises de texto que
integram os capítulos da Formação da literatura brasileira. Trata-se de uma obra
capital que desde o momento de sua publicação vem fecundando os estudos
universitários de nossa literatura.
No Rio de Janeiro, independentemente das práticas acadêmicas, a crítica
vinha, desde os anos de 1930 e 1940, dando mostras de excepcional vigor, sen-
do de estrita justiça destacar ao menos dois nomes que honraram esta casa, mui-
to me ensinaram e continuam a ensinar-me, Augusto Meyer e Álvaro Lins. Aos
quais acrescento o nome de uma estudiosa que me é particularmente cara, Lúcia
Miguel Pereira.

ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005 321


Embora eu compreendesse as razões daqueles dois lados (que, diga-se de
passagem, na altura dos anos de 1970, pareciam descartadas pelo discurso estru-
turalista, que não era nem historicista nem estético), a minha formação teórica
me deixava em um lugar um tanto atípico. Eu aderia intimamente à estética de
Croce, que conferia uma identidade à poesia e à arte, em geral, como forma in-
tuitiva, figural e expressiva de conhecimento, mantendo, como vimos, uma distin-
ção de fundo entre o ato poético e as outras práticas discursivas. Mas (e há muita
força nessa conjunção adversativa...), mas a leitura de Gramsci e particularmente
a resistência moral e cultural que marcara a mim e a minha geração ao logo dos
anos de chumbo levavam-me a inserir decididamente o texto literário na trama
da história ideológica em que fora concebido. Ambas as instâncias eram exigen-
tes e faziam-se presentes na hora da escolha dos autores e no ajuizamento das
obras, que ora valiam como representativas de uma certa mentalidade, ora valiam
por si mesmas como criações estéticas bem realizadas.
Embora ninguém deva ser juiz em causa própria, parece-me que, na elabo-
ração da História concisa, consegui respeitar ambas as exigências sem perder a
consciência de que eram perspectivas diferentes a ponto de não permitirem um
cômodo ecletismo. Em outras palavras: um poema ou um romance podem ser
significativos do ponto de vista sociológico ou político, mas essas suas qualidades
não os elevam, por si mesmas, ao estatuto de obras de arte. De todo modo, as
melhores obras de todas as literaturas valem sempre pelos dois critérios, o repre-
sentativo e o estético.
Passando a um exemplo para sair de um discurso que se arrisca a cair na
armadilha da abstração, lembro que, ao estudar o romance nordestino dos anos
de 1930 e 1940, um dos períodos mais ricos da história de nossa narrativa realis-
ta, vali-me do conceito de tensão entre o narrador e a sua matéria; conceito
finamente elaborado por Lucien Goldmann em seus ensaios de sociologia do
romance. Detive-me então nas obras de Jorge Amado, Érico Veríssimo, Mar-
ques Rebelo, José Lins do Rego e Graciliano Ramos, que me facultaram a refle-
xão sobre romances de tensão mínima e de tensão máxima. Uma abordagem
dialética na sua relação entre obra e sociedade, mas que tomava sempre como
pressuposto o valor literário do corpus a ser interpretado.

Entre o historicismo e o método dialético


Analisando e interpretando textos em sala de aula, eu suspeitava cada vez
mais que o reconhecimento da diferença entre os níveis estético e social, embora
necessário, não era suficiente. Era preciso cavar mais fundo no campo da teoria
literária e da teoria da historiografia para compreender aquelas relações que não
deveriam permanecer em um regime de mera exterioridade.
Em primeiro lugar, era necessário mapear semelhanças ou analogias. Tanto
a história literária como a historiografia geral lidam com fenômenos únicos e, a
rigor, irrepetíveis. Uma obra de arte não é igual a outra, por mais que guardem

322 ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005


ambas características comuns de forma ou significado. O mesmo acontece com
um fato histórico. O evento é aquilo que não voltará, tal e qual, no espaço e no
tempo, seja uma batalha, seja uma revolução, seja uma eleição, seja um golpe de
estado. A unicidade ou irrepetibilidade de uma obra e de um evento histórico
exige do historiador literário ou social a capacidade de selecionar obras ou even-
tos significativos, operação indispensável em virtude do número crescente e cumu-
lativo de obras e eventos. Para operar seletivamente, ambos devem orientar-se
por uma certa perspectiva, que definirá os seus critérios de significação. Pois só
fica ou, em princípio, só deve ficar o que significa. Unicidade ou irrepetibilidade,
da parte do objeto; seletividade e perspectiva, da parte do estudioso – eis algumas
características comuns que aproximam o crítico literário e o historiador.
Onde começariam as zonas de diferenciação? Na linha do historicismo ale-
mão ainda haveria um campo de analogias considerável. O culturalistas, herdei-
ros de Dilthey, e, mais remotamente, de Vico, reconheciam na história da civili-
zação amplos movimentos culturais que correspondiam a determinados perío-
dos históricos bem demarcados. Daí provém a admissão de grandes estilos de
época em que se inserem atos, fatos e obras: o Renascimento, o Maneirismo, o
Barroco, o Rococó, o Arcadismo, o Neoclassicismo, o Romantismo, o Realismo,
o Naturalismo, o Simbolismo, para ficar só com as denominações de movimen-
tos mapeados até o fim do século XIX. O conhecimento desses estilos seria,
portanto, um primeiro passo para agrupar personalidades e obras discriminando
o que estas teriam de comum entre si no bojo das tendências ideológicas do seu
tempo. Burkhardt, por exemplo, já falava, antes de Dilthey, no homem do
Renascimento, portador de certos atributos constantes, como o culto do indiví-
duo, e sabe-se quanto Nietzsche bebeu nessa fonte ao criar a figura do super-
homem. O Barroco e o Romantismo propiciaram descrições semelhantes, a tal
ponto que às vezes o historiador literário caía na petição de princípio de conside-
rar uma obra como barroca porque composta no período barroco, o qual, por sua
vez, era barroco porque havia produzido obras com características... barrocas.
Um dos resultados menos felizes do historicismo à outrance era e é, preci-
samente, o de subestimar a unicidade e a irrepetibilidade da obra de arte, na
medida em que parte de categorias de estilo comuns a um certo período e tende
a apagar as diferenças que estremam um texto de outro, um poeta de outro, um
narrador de outro. Igualmente, certas semelhanças ou coincidências temáticas
ou estilísticas entre obras de tempos diferentes convidam o historicismo puro a
ver cadeias apertadas de influências, chegando às vezes ao extremo de acreditar
que uma certa obra gerou outra escrita muito tempo depois, transformando a
intertextualidade em paternidade à distância. Lembro-me de um professor de
Literatura Brasileira que afirmava, sem qualquer sombra de dúvida, que São
Bernardo, de Graciliano Ramos, só se tornou possível porque, antes dele, Ma-
chado de Assis tinha escrito Dom Casmurro: a prova era que ambos os narrado-
res eram muito ciumentos... Não sei como Graciliano, que não primava pelo
bom humor, teria reagido a essa especulação.

ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005 323


A admissão dos estilos históricos mantinha, de todo modo, a sua coerência
e validade, e não me furtei a ela ao ordenar minha história literária. Mas, como
disse, eu suspeitava que não bastavam as semelhanças nem muito menos a subordi-
nação de experiências individuais a um fundo comum cultural ou ideológico.
Onde começariam as diferenças efetivas? Como ressalvar, no discurso histórico-
literário, o caráter singular da obra de arte? Como mostrar que o ato estético
nasce de uma vivência afetiva ou cognitiva ou lúdica peculiar, a qual foi estilizada
de um certo modo, e não de outro, com ressonâncias subjetivas próprias, que a
forma lingüística tornou mais ou menos comunicáveis a outros seres humanos?
De resto, nem sempre perfeitamente comunicáveis, pois nem sempre a linguagem
do poema ou da prosa é transparente, necessitando do esforço da interpretação.
Para responder a essa questão difícil, mas incontornável, a crítica sociológi-
ca de estrita observância não tinha instrumentos afinados, pois ela trabalhava e
trabalha com grandes categorias unificadoras como a classe social e o tipo históri-
co-social, categorias que contêm a priori o elenco de marcas definidoras dos au-
tores e das suas personagens. Para a crítica determinista, dizer que uma obra foi
produzida por um aristocrata ou para um público aristocrata dá a chave para
entender o caráter das personagens ou as metáforas do poema. A pergunta fica
em pé: o que individualiza um texto poético e o diferencia de outro se ambos
foram produzidos no interior da mesma classe social e para serem lidos por um
público pertencente a essa classe? Esta era uma das questões cruciais que preten-
di enfrentar ao longo dos anos de 1970, em plena maré objetivista, representada
tanto pelo estruturalismo como pelo marxismo, duas abordagens sistêmicas e
classificatórias dos fenômenos simbólicos. Um dilema sem saída à vista, ou um
problema a ser equacionado?
Embora marcado por leituras existencialistas e hermenêuticas, que tendiam
a aprofundar as instâncias subjetivas do escritor e a reconhecer a margem de li-
berdade de suas opções estilísticas, devo dizer que a compreensão histórico-social
dos textos literários se me afigurava não só uma necessidade epistemológica, mas
um imperativo ético-político, afastando-me, ainda que parcialmente, da órbita
crociana, de inspiração idealista. Lembro minhas leituras de Goldmann, que se
somavam a leituras anteriores de Gramsci, e se somariam, nos mesmos anos de
1970, a leituras de Hegel, Adorno, Benjamin e Simone Weil. Eram todos filóso-
fos que abriam no corpo compacto das ideologias dominantes a brecha do espí-
rito crítico, e acendiam a luz da consciência ética e estética na opacidade das
determinações econômicas e das opressões políticas.
A lição de Otto Maria Carpeaux
E, nesta altura, é a hora de fazer justiça a um historiador da cultura ociden-
tal a quem eu já dedicara minha História concisa da literatura brasileira, Otto
Maria Carpeaux, cuja História da Literatura Ocidental se transformara em meu
livro de cabeceira. E o que me ensinava Carpeaux junto com a sua imensa erudi-
ção?

324 ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005


Biblioteca do Instituto de Estudos Brasileiros – USP
Carpeaux ensinava, entre tan-
tas outras coisas fundamentais, a
meia verdade do determinismo so-
ciológico. Maquiavel já estimara as
proporções da vontade humana e
da força do destino quando falava
em metà virtù metà fortuna, acres-
centando com seu implacável rea-
lismo que provavelmente à fortuna
se deveria conceder um pouco mais
do que a metade das causas dos atos
praticados pelo ser humano. Trans-
pondo para a análise dos fatores da
obra literária a proporção aponta-
da pelo secretário florentino e passan-
do-a pelo crivo do historicismo dia-
lético de Carpeaux, o que teríamos?
Um renovado conceito de tensão en-
tre os pólos do determinismo e da li-
berdade criadora, um difícil equilí-
brio entre as categorias sócio-históri-
cas e a individuação autoral, um re-
novado e difícil equilíbrio entre as
ideologias dominantes e as contra-
ideologias articuladas ao longo da
Carpeaux em bico-de-pena de Luís Jardim. criação artística.
Reconheço agora, olhando em retrospecto, que trabalhava em meu espíri-
to um propósito de superar conservando (no sentido hegeliano do termo dialética)
a drástica oposição de poesia e não-poesia, arte e ideologia.
O cerne da dialética de Carpeaux na elaboração da História da Literatura
Ocidental encontra-se precisamente na sua capacidade de identificar nos grandes
textos literários não só a mimesis da cultura hegemônica, mas também o seu
contraponto que assinala o momento da viragem, o gesto resistente da diferença
e da contradição. Este olhar arguto, que reconhece tanto a ortodoxia como as
suas necessárias heresias, discerne até mesmo na escrita dos antigos, tão cristali-
zados pela tradição escolar, as formas múltiplas do dissenso. Leia-se o que Carpeaux
escreveu sobre o poeta Lucano, que foi levado ao suicídio por ter conspirado
contra Nero (65 d.C.). A sua epopéia Pharsalia, foi considerada pelo erudito
latinista Gaston Boissier o poema da opposition sous les Césars. Lucano, que era
estóico, assim como o seu contemporâneo Sêneca, também suicida no mesmo
ano de 65, não idealizava os detentores do poder imperial. À diferença de Virgílio,
que inventou uma genealogia divina para nobilitar a figura de Augusto, Lucano

ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005 325


prefere a todos o grande vencido, Catão – Victrix causa diis placuit, sed victa
Catoni – “A causa vencedora agradou aos deuses, mas a Catão a dos vencidos”.
Escolhi esse exemplo, verdadeiro paradigma, como poderia ter escolhido
centenas de outros em que Carpeaux apreende o sentido de resistência de um
autor em face do discurso hegemônico de sua época. Quase sempre a fonte dessa
consciência crítica vem da memória de tempos passados tidos por melhores, a
Idade de Ouro. É a austera simplicidade da República, anterior à corrupção do
Império na história de Roma. Será, mais tarde, a pureza da Igreja primitiva con-
trastada com a decadência do papado, na mente dos reformadores e dos movi-
mentos neo-evangélicos da Idade Média. Às vezes, não é a memória de um paraí-
so terreno mítico, mas a utopia do Reino, da sociedade igualitária ou do comu-
nismo universal que leva o escritor a afrontar os seus contemporâneos e, com os
olhos postos no dia que há de vir, desmascarar as trampas da ideologia corrente2.
Do espelho à resistência – a elaboração de O ser e o tempo da poesia
Creio que nos meados dos anos de 1970 os tacteios que eu vivia entre as
exigências estéticas e as ideológicas conseguiram afinal ceder lugar a uma intui-
ção da rota que era necessário trilhar sem cair em um emperrado maniqueísmo.
O caminho era o da análise e da interpretação de poemas cuja força e beleza se
impunham à minha sensibilidade, buscando neles as duas relações fundamentais
que podiam entreter com a ideologia dominante no seu contexto. A relação de
espelhamento e a relação de resistência.
Para flagrar a primeira relação, que se pode chamar de especular, a história
social e cultural que condicionou a obra escolhida para análise dá os dados de
base. O historicismo sempre foi pródigo na colheita de materiais contemporâneos
do autor e de sua atividade literária, informando-se sobre o seu meio familiar, a
sua educação básica e superior, os livros que lia, os intelectuais que freqüentava,
os grupos literários ou políticos e as modas culturais do seu tempo e, na vertente
marxista, a classe a que pertencia, ou a que aspirava pertencer, bem como a classe
dos seus leitores. Poderíamos chamar essa operação de trabalho de reconhecimen-
to do terreno, o que dá ao discurso do historiador literário um caráter fortemente
remissivo na medida em que a obra remete ao contexto, e este, por sua vez,
determina, ou, numa linguagem mais branda, condiciona a obra.
Mas a relação de espelhamento não é a única. A perspectiva do narrador ou
do poeta pode ver ou entrever o que a ideologia encobre ou falsifica. Nesse
enfrentamento entre o processo ficcional e as racionalizações do pensamento
hegemônico encontramos o cerne vital da literatura de resistência. O conceito e
as suas formas básicas me ocuparam longamente desde que redigi, por volta de
1976, o ensaio “Poesia resistência”, capítulo de O ser e o tempo da poesia, que saiu
no ano seguinte, até a coletânea Literatura e resistência, publicada recentemente.
O ensaio mapeava algumas formas de poesia de resistência: poesia-
metalinguagem, poesia-mito, poesia-biografia, poesia-sátira e poesia-utopia, e
terminava com uma análise do poema longo de Leopardi, “La ginestra”.

326 ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005


Forças e formas de resistência na literatura e na história do Brasil
Muito do que venho especulando e escrevendo, dos anos de 1980 até hoje,
tanto no campo da interpretação literária como em ensaios de história cultural,
está marcado pela percepção dos movimentos de contraste no interior dos estilos
de época (movimentos de contradição que o método dialético de Carpeaux aponta
na sua grande História).Ou no interior das próprias obras que entram em tensão
com as ideologias dominantes no seu tempo ou, ainda mais dramaticamente, en-
tram em tensão consigo mesmas.
É possível, mas não posso asseverar com toda certeza, que a escolha que
tenho feito de obras que me atraem particularmente recaia na representação de
situações existenciais permeadas de contrastes e conflitos quer sociais quer psico-
lógicos. De todo modo, as contradições existem, e delas vem um senso de viva-
cidade intelectual que lhes concede uma recorrente atualidade, ainda que os
conflitos sejam devedores de ideologias e contra-ideologias de outros tempos. O
discurso pede exemplos.
Antonio Vieira – Que forças sociais levaram os colonos do Pará e do Ma-
ranhão a expulsar o padre Vieira dessas terras de missão, e que forças sociais e
culturais levaram a Inquisição portuguesa a encarcerá-lo por dois anos moven-
do-lhe um processo que resultou em proibir-lhe o ministério da pregação em sua
pátria?
Em ambos os casos o jesuíta temerário agira em função de projetos que
contrariavam abertamente o poder estabelecido. Defendendo os índios do Nor-
te em nome de um plano de evangelização que obstava a escravização pura e
simples da mão-de-obra, Vieira embaraçava o caminho dos colonos apresadores
cujas incursões no interior tinham precisamente esse objetivo. Defendendo o
direito de os cristãos-novos permanecerem em Portugal, onde os seus capitais
seriam indispensáveis para o financiamento da Companhia das Índias Ociden-
tais, Vieira se tornava suspeito à Inquisição que se aproveitou prontamente das
brechas que os seus escritos proféticos abriam ao fazer coincidir o estabelecimen-
to do Quinto Império com a reunificação das tribos de Israel e o seu retorno à
Terra Prometida. Tanto a liberdade tutelada dos índios como a pregação desse
tempo messiânico eram componentes contra-ideológicos alimentados por este
sonhador impenitente, que pagou duramente o preço das suas utopias. Mas se a
obra de Vieira fosse mero espelho da ideologia colonial ou da ortodoxia do
Santo Ofício, de que nos valeria a sua eloqüência? Teria virado apenas pasto e
repasto de gramáticos puristas.
Basílio da Gama – O Uraguai – Ainda no contexto do Brasil Colônia,
veja-se a fecunda contradição ideológica que permeia o belo poema de Basílio da
Gama, O Uraguai, tão justamente admirado por Machado de Assis. Ao estudá-
lo julguei que o ensaio que lhe iria dedicar não poderia ter outro título que não
fosse “As sombras das luzes na condição colonial”.

ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005 327


As Luzes, que vinham do Portugal pombalino em um momento de aliança
tática com a Espanha, pelo Tratado de Madri, consideravam racional e útil ex-
pulsar os missioneiros dos Sete Povos para submeter a região ao domínio portu-
guês em troca da Colônia do Sacramento, que passaria à Coroa espanhola. Essa
era a razão das Luzes, explicitada pela ação e pelo discurso de Gomes Freire de
Andrada, que encabeça as tropas coloniais, invade a região dos Sete Povos e
procura persuadir os chefes indígenas a ceder as terras da missão. Eco da vontade
do Marquês de Pombal é a proposta assumida por Basílio da Gama que almeja
dar a seu protetor mais uma e definitiva prova da abjuração do seu passado de
noviço da Companhia de Jesus. Ocorre, porém, que para sorte dos leitores
dialéticos do poema, Basílio era mais do que um adulador em versos opacamente
laudatórios do poder: era um artista e um homem sensível à integridade e à
beleza dos guaranis acossados pelas forças tão superiores do exército colonial.
O Segundo Canto do poema é exemplar como ponto e contraponto de
um duo desconcertado em que a voz heróica, resistente à morte, será a dos
rebelados povos. Sepé Tiaraju, que se tornaria figura de lenda no cancioneiro
gaúcho, vem desarmado e só, sem arcos e aljavas nem quaisquer gestos de defe-
rência, sem mostras nem sinal de cortesia, para com a suprema autoridade militar.
Essa imagem dá a medida do homem americano, ao mesmo tempo livre e capaz
de razões, pois é de razão que falará ao general o seu companheiro Cacambo:

Ó General famoso,
..........
Bem que nossos avós fossem despojo
Da perfídia de Europa, e daqui mesmo
Com os não vingados ossos dos parentes
Se vejam branquejar ao longe os vales,
Eu, desarmado e só, buscar-te venho,
Tanto espero de ti. E ENQUANTO AS ARMAS
DÃO LUGAR Á RAZÃO, SENHOR, VEJAMOS
SE SE PODE SALVAR A VIDA E O SANGUE
DE TANTOS DESGRAÇADOS (II, 48-59).

A fala do missioneiro vem sustentada por uma proposta arrazoada de paz.


O índio mostra confiança na vigência da razão humana que a todos aproximaria:
ENQUANTO AS ARMAS DÃO LUGAR À RAZÃO... Mas o desfecho do encon-
tro dos guaranis com o general deixa claro que há duas razões em conflito: a do
direito natural, ou jus gentium, alegada pela teologia escolástica e postulada pe-
los missionários; e a razão de Estado, nada menos que o direito da força, que, em
nome do “sossego da Europa”, alegado por Gomes Freire de Andrada, expulsará
os missioneiros e arrasará os Sete Povos, que hoje são majestosas e melancólicas
ruínas.

328 ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005


Biblioteca do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

Folha de rosto da
1ª edição de O Uraguai

No mesmo poema convivem a ideologia colonial do adulador do Marquês


de Pombal e a voz dos vencidos, aos quais o poeta concede o timbre do heroísmo
massacrado.
Outras figuras de resistência
A direção do olhar estabelece a perspectiva. A história literária tende a
selecionar os seus objetos e o faz com um critério mais rigoroso, com um
peneiramento mais fino do que a historiografia social e política, cujo corpus de
referência precisa ser o mais aberto e inclusivo possível para evitar o risco das
generalizações feitas a partir de um número diminuto e preescolhido de exem-
plos.
A história literária lida com objetos únicos e altamente individualizados, as
obras poéticas e narrativas, que podem ser agrupadas segundo grandes estilos de

ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005 329


época ou, na operação que vimos tentando, segundo acentuadas tendências de
cunho existencial ou ético. Assim pude, depois de ter escrito Poesia resistência,
buscar relações assemelhadas no campo do romance e expô-las no texto Narrati-
va e resistência, que integra a coletânea mencionada. A releitura de narradores
poderosamente críticos como Raul Pompéia, Lima Barreto e Graciliano Ramos
abriu-me novas perspectivas para detectar as diferenças internas latentes no con-
ceito de narrativa resistente.
Saindo da órbita da literatura brasileira, mas não da experiência brasileira,
tive a grata surpresa de achar, em um livro de contos de Albert Camus, L’exil et
le royaume, uma narrativa cujo tema é a metáfora perfeita do conceito de resis-
tência, o mito de Sísifo, a pedra que rola e que o herói grego tenta em vão levar
ao alto da montanha. O conto chama-se “La pierre qui pousse”, “A pedra que bro-
ta”. Para encanto do leitor brasileiro, a pedra, no caso, jaz no centro de uma pra-
ça diante da Igreja de Bom Jesus, em Iguape, cidade colonial e caiçara que Albert
Camus visitou, levado por Oswald de Andrade por ocasião da sua vinda ao Brasil.
O autor de La peste imaginou o encontro entre um engenheiro francês,
que está trabalhando em Iguape, e um Sísifo negro, um marinheiro que fizera
promessa ao Bom Jesus em um momento de perigo no mar: prometera carregar
na cabeça uma pedra de cinqüenta quilos e depô-la no altar do padroeiro no dia
de sua festa. No entanto, o nosso devoto marinheiro dançara a noite anterior
numa longa sessão de macumba, o que o deixara exausto. Não consegue carre-
gar a pedra e cai no meio do caminho. Quem vai substituí-lo no cumprimento da
promessa será o engenheiro francês, contrastando assim a idéia da vida como um
peso absurdo graças a um gesto inesperado de solidariedade. A vida continuará
sem sentido, mas, mesmo assim, ou por isso mesmo, é preciso que nos demos as
mãos uns aos outros.

Vontando à órbita da literatura brasileira


O marinheiro negro de Camus carregou o quanto pôde uma pedra exces-
sivamente pesada, mas não aguentou levá-la até o altar do Bom Jesus. Se voltar-
mos no tempo e nos detivermos na sorte infeliz de um grande poeta negro
brasileiro que morreu meio século antes da vinda de Camus ao Brasil, Cruz e
Sousa, veremos a mesma imagem da pedra, mas sobreposta a outras pedras er-
guendo um muro atrás do qual o poeta se diz emparedado.
Cruz e Sousa viveu e morreu em um período da história brasileira e oci-
dental em que imperava, na ciência e na ideologia corrente, a tese da existência
de raças superiores e inferiores. Colonialismo e eurocentrismo uniam-se para
estigmatizar o negro como representante de uma etapa arcaica e, portanto, infe-
rior na escala evolutiva do ser humano. Mesmo cientistas idôneos e atentos à
riqueza da cultura afro-brasileira, como Nina Rodrigues, consideravam o negro
incapaz de um desempenho intelectual semelhante ao do branco, além de porta-
dor de sentimentos violentos, moralmente aquém das exigências da civilização

330 ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005


européia. Este era o contexto das idéias e dos preconceitos que Cruz e Sousa
teve de enfrentar ao longo de sua existência breve e sofrida. E como ele exprimiu
a sua revolta como homem e artista cuja pele era vista como um estigma?
Leia-se o seu poema em prosa intitulado “O emparedado”. O poeta vê-se
a si mesmo entre quatro muros altos de pedra levantados pelo preconceito; mas
o que mais o espanta e o indigna é flagrar o homem de ciência trazendo com as
suas próprias mãos pedras e mais pedras para emparedá-lo e impedir que ele
denuncie a ignomínia da sua condição. Não conheço na literatura brasileira pas-
sagens mais lúcidas e vibrantes do que o desafio que o Dante negro lança à peça
forte da ideologia dominante, a antropologia racista. Ele interpela a ciência cha-
mando-a de “ditadora de hipóteses”, o que é admirável, porque o que era ciên-
cia no fim do século XIX já não o seria no século XX, sobretudo a partir dos
estudos iluminadores de Franz Boas, que tanto influíram no pensamento antro-
pológico de Gilberto Freyre. Mas, quando Cruz e Sousa, inconformado, per-
guntava qual era a cor de seus sentimentos, de sua imaginação, dos seus sonhos,
das suas formas poéticas, mostrando com veemência que o mundo dos símbolos
e da criação artística não tem nada a ver com a química da epiderme, ele estava
só, sem o apoio dos sábios do seu país e do seu tempo. Que melhor exemplo de
tensão entre poesia e ideologia, a ponto de a poesia ser a própria resistência anti-
ideológica?
É compreensível que a sociologia determinista prefira colecionar casos em
que a literatura nada mais seja do que representação das ideologias dominantes.
O velho historicismo já seguia, a seu modo, essa trilha provando por a + b que
toda obra literária reproduz os traços fundamentais da cultura do seu tempo. Os
positivistas, que, como se sabe, criaram a Sociologia (desde Comte, que batizou
a nova ciência, até Durkheim, o seu grande mestre entre fins do século XIX e
começo do XX) não tinham dúvidas a respeito do fator “meio” como princípio
causador da obra literária. E, nesse sentido, retomavam o dogma do Conde De
Bonald, patriarca do pensamento conservador francês, que definia a Literatura,
tout court, como “expressão da sociedade”.
O que a teoria crítica da cultura, de Benjamin a Adorno, veio descobrindo,
a partir dos anos de 1920 e 1930, foi precisamente o avesso dessa fórmula gené-
rica. A melhor literatura não acolhe passivamente a imagem da sociedade que lhe
dá o cotidiano anestesiado pelos discursos assentados sobre o que aí está. O que
já era o embrião da hipótese das tensões formulada por Goldmann. E quem leu,
como tive o privilégio de fazê-lo, os numerosos exemplos de contra-ideologia
que povoam a História da literatura ocidental de Otto Maria Carpeaux, apren-
deu uma lição de resistência que marca para a vida inteira.

Rumo à história das ideologias como história cultural


Nos meados dos anos de 1980, tendo já ministrado vários cursos sobre
literatura colonial, senti a necessidade de aprofundar o conhecimento das fontes

ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005 331


culturais dos textos que eu interpretava nas salas de aula. Tive então a oportuni-
dade de pesquisar nos arquivos romanos da Casa dos Escritores Jesuítas e no
vasto acervo dos processos da Inquisição portuguesa que se conservam na bibli-
oteca da Torre do Tombo instalada na Assembléia Nacional em Lisboa. Dessas
pesquisas nasceram os ensaios sobre Anchieta, Vieira e Antonil que integrariam a
Dialética da colonização, só publicada em 1992.
Não me deterei, por brevidade, na reconstituição das várias hipóteses de
trabalho que procurei reunir nesta obra. O objetivo central era detectar as múl-
tiplas relações que entretêm entre si a colonização, o culto e a cultura.
Os três conceitos são expressos por palavras que têm a mesma raiz latina, o
verbo colo. Entre as suas várias acepções, colo significa cultivar a terra, ocupar e
dominar a terra alheia, isto é, a colônia, evocar e invocar os mortos e os deuses, pelo
culto transferido da matriz para a terra conquistada, e, finalmente, construir um
universo de saber e um projeto intelectual, que o termo cultura exprime cabalmen-
te. Colônia = cultivo + culto + cultura. Mas, apesar dessa afinidade etimológica,
o que a história me ia revelando era um campo de tensões raramente bem resol-
vidas entre o projeto material de colonização e os valores ideais do culto ou da
cultura. Se às vezes os interesses do colonizador encontraram eco na palavra do
nosso primeiro economista, o sagaz jesuíta Antonil, conselheiro dos senhores de
engenho, ou então as incursões dos bandeirantes foram exalçadas pelos forjadores
de nobiliarquias, outras vezes os agentes do processo de conquista seriam julga-
dos pela palavra ardente do maior dos oradores sacros da nossa língua, o padre
Antônio Vieira.
No contexto do Segundo Reinado, José de Alencar, patriarca do romance
brasileiro, votava no Senado contra a Lei do Ventre Livre, seguindo os passos
dos conservadores Bernardo Pereira de Vasconcelos, já desaparecido naquela
altura, e do Marquês de Olinda, ainda ativo e ferrenho escravista. A cultura ro-
mântica passadista de Alencar dava um aval ao status quo; mas a mesma cultura
romântica inspirava palavras de deprecação e julgamento na pena de Gonçalves
Dias, patriarca da poesia indianista e autor de uma prosa notável, “Meditação”,
precoce libelo emancipacionista. Dois escritores românticos indianistas: um en-
dossava com a sua palavra as práticas mercantis e desumanas da colonização; o
outro denunciava, com as armas do culto ou da cultura, as iniqüidades de um
processo que dizimava os indígenas e escravizava os africanos. A este jogo de sim
e de não atribuí o termo “dialética”, consciente de que o conceito mesmo já não
desfrutava, naqueles anos de 1980 e 1990, do mesmo prestígio que o aureolara
nos decênios anteriores.
O livro contempla outras situações em que os conflitos ideológicos vêm à
tona. Em uma República Velha liberal, incrusta-se uma província regida por uma
constituição própria, de fundo positivista, antiliberal, entre progressista e cen-
tralizadora, o Rio Grande do Sul. O contraste não será só feito de idéias, mas de
projetos políticos, o que a Revolução de 1930 mostrou cabalmente. No positi-

332 ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005


vismo social assumido pelos políticos gauchos vitoriosos em 1930 encontra-se a
arqueologia do nosso estado-providência.
Outro exemplo que toca a tantos de nossa geração: no ano de 1956, o
presidente Juscelino Kubitschek lança o seu plano de modernização que culmi-
nará com a fundação de Brasília; no mesmo ano, um correligionário de JK lança
uma obra-prima que é toda fundada na revalorização e no aprofundamento das
matrizes arcaicas do sertão mineiro – Guimarães Rosa publica Grande sertão:
veredas.
Enfim, para não dizerem que ignorei o presente, o que é ser pós-moderno?
Romper com a racionalidade moderna, ou levar às últimas conseqüências os
procesos técnicos e os pressupostos ideológicos da modernidade capitalista? Pós-
moderno é antimoderno ou ultramoderno? Se nada é simples no conceito de
colonização, tampouco as faces da civilização contemporânea são uniformes.
Tirei alguma lição deste itinerário que já dura meio século? Certamente a
suspeita de que a cultura é um encontro tenso de espelhamentos e resistências,
transparências e opacidades, o que às vezes lhe dá a figura de enigma. Voltando-
me ultimamente para a obra do bruxo que habita esta casa e a todos nós, foi a
palavra “enigma” que me ocorreu quando me dispus a decifrar o seu olhar, no
qual me pareceu entrever um misto de crítica implacável e estóica resignação.
Relendo Machado de Assis, tem sido este o caminho que venho percorrendo, e
só Deus sabe se será o último.

Notas
1 Em Leitura de poesia (org. de Alfredo Bosi), São Paulo, Ática, 1996, pp. 7-9.
2 Otto Maria Carpeaux dá, em sua História da literatura ocidental, numerosos exemplos
de resistência da literatura à ideologia dominante. Comentei alguns casos significativos
em Literatura e resistência, São Paulo, Cia. das Letras, 2002, pp. 36-40.

RESUMO – O ARTIGO resume o itinerário do autor como historiador da Literatura Brasilei-


ra, teórico de poesia e estudioso de nossa formação cultural. Os momentos iniciais desse
percurso recebem particular atenção: o estudo da Estética de Croce, o conhecimento
da filosofia marxista de Gramsci, a influência do existencialismo cristão no final dos anos
de 1950 e o engajamento na política de esquerda no Brasil dos anos de 1960 e 1970.
Como docente de Literatura Italiana, o autor escreveu teses sobre Pirandello e Leopardi,
ambas inéditas. Trabalhando no campo da história literária, na esteira da obra de Otto
Maria Carpeaux, examinou as relações dialéticas entre ideologia e poesia e ideologia e
narrativa, o que lhe abriu caminho para o seu conceito de literatura como resistência.
Ao elaborar a Dialética da Colonização, dedicou-se ao estudo das tensões que marcam
a história das ideologias no Brasil.
PALAVRAS- CHAVE : História da Literatura; Crítica da Cultura; Dialética da Colonização.

ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005 333


ABSTRACT – This essay summarizes the author’s itinerary as historian of Brazilian literature,
theoretician of poetry and scholar of our cultural heritage. The initial moments of this
career merit special attention: the study of Croce’s aesthetics, the first acquaintance
with Gramsci’s Marxist philosophy, the influence of Christian Existentialism in the late
1950s, and the political engagement in leftist politics in Brazil in the 1960s and 70s.
As professor of Italian Literature, the author has written theses on Pirandello and
Leopardi, which remain unpublished. As a student of literary history, in the wake Otto
Maria Carpeaux’s work, the author examines the dialectic relationships between ideology
and poetry, and ideology and prose, which led to his concept of literature as resistance.
When writing the Dialectics of Colonization, he immersed himself in the study of the
tensions that distinguish the history of ideologies in Brazil.
KEY-WORDS : History of Literature, Criticism of Culture, Dialectics of Colonization.

Alfredo Bosi é professor de Literatura Brasileira na Universidade de São Paulo e autor,


entre outras obras, de História concisa da literatura brasileira, O ser e o tempo da
poesia, Dialética da colonização, Machado de Assis: o enigma do olhar e Literatura e
resistência. É editor da revista ESTUDOS AVANÇADOS e membro da Academia Brasileira de
Letras. @ – abosi@usp.br
Recebido em 23.8.05 e aceito em 30.8.05.

334 ESTUDOS AVANÇADOS 19 (55), 2005

Você também pode gostar