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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE

MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIA E LETRAS

CÂMPUS DE ASSIS

LETRAS

BIANCA GONÇALVES DA SILVA

TRABALHO DE ROMANTISMO: ANÁLISE DE POEMAS

DE ÁLVARES DE AZEVEDO

DISCIPLINA DE AFIRMAÇÃO DA LITERATURA NACIONAL: O

ROMANTISMO, PROFESSOR FABIANO RODRIGO DA SILVA

SANTOS

Assis

2021
Álvares de Azevedo, poeta conhecido por cantar a dor do ser vivente, a
mulher inalcançável, o grotesco, o chocante e o macabro fez parte da segunda geração
romântica, sendo uma das maiores figuras desta fase por explorar mais a fundo uma das
características do espírito romântico, o individualismo. Segundo Candido (2000),
Álvares não foi tão elegante e marcante como Gonçalves Dias e nem intenso e fervoroso
como Castro Alves, se destacou apenas na complexidade do “eu”, aspecto que estava
em voga entre os românticos da época, por isso, foi o menos original. Deste modo, é
partir das características gerais do fenômeno artístico e do autor que se examinará o
poema “O poeta moribundo” e compará-lo com outro “Lembrança de morrer”.

Candido (2000), ao se referir ao romantismo no Brasil, diz que ele se


assemelha ao movimento de um adolescente em conflito, não ajustado ao mundo,
ambíguo e perto do dilaceramento; e é desta mesma forma que Álvares se demonstrou
nas suas obras, cansado de viver, idealizando a morte e contrariando as convenções
morais, contradição esta muito notável em seus escritos. É por este motivo que Candido
descreve os poetas da segunda geração como aqueles que são entendidos por meio de
máscaras, por terem duas faces, já que aderiram o conceito do contraste, a “filosofia do
belo-horrível” (2000, p.133).

Com relação às características gerais da segunda fase romântica, elas


basicamente são o egocentrismo, sentimentalismo, a melancolia, ingenuidade, nostalgia,
ironia, culto da fantasia, humor negro e flexibilidade formal. Além destes aspectos que
se fazem presentes nas produções do poeta, há temas que são destaque em seu trabalho,
como o eterno feminino (mulher almejada inatingível que representa tudo aquilo que é
ideal), lembrança de morrer (autodepreciação, em que há o prenúncio da morte) e a
melancolia e fantasia (o conflito entre a realidade triste e a imaginação, o sonho, como
refúgio temporário). Devido ao aproveitamento da filosofia do contraste por Álvares,
estes mesmos temas que caracterizam a sua personalidade sofrem variações, revelando
um outro lado romântico, o rebelde.

Ao partir para o poema de análise “O poeta moribundo”, há de se levar em


conta que a obra “Lira dos vinte anos” apresenta dois prefácios, os quais evidenciam de
modo mais claro as duas facetas do poeta. No primeiro o que se tem é a apresentação
geral dos poemas, que assim como Álvares antecipou, tratam da mais profunda dor do
poeta, do seu desajuste ao mundo e que prediz a própria morte:
São os primeiros cantos de um pobre poeta. Desculpai-os. As primeiras vozes
do sabiá não têm a doçura dos seus cânticos de amor. É uma lira, mas sem
cordas; uma primavera, mas sem flores; uma coroa de folhas, mas sem viço
(AZEVEDO, 1996, p.1).

No segundo prefácio é o contrário, não são representados a realidade e o


mundo idealizado, senão a fantasia, pelo medonho, macabro e tudo aquilo que choca e
causa repulsa:

Cuidado, leitor, ao voltar esta página! Aqui dissipa-se o mundo visionário e


platônico. Vamos entrar num mundo novo, terra fantástica, verdadeira ilha
Baratária de D. Quixote [...]. A razão é simples. É que a unidade deste livro
funda-se numa binomia: — duas almas que moram nas cavernas de um
cérebro pouco mais ou menos de poeta escreveram este livro, verdadeira
medalha de duas faces. (1996, p.50).

Dito isto, o poema que servirá de análise se encontra no segundo prefácio.


Neste poema o que há é um poeta que anuncia a sua morte, que acontecerá no dia
seguinte, o seu fim é retratado com um tom zombador, pois o eu lírico ao invés de ter
um final digno, serve para que de suas tripas se formem cordas para o instrumento
musical soar e cantar a vida que nada de bom trouxe para o poeta:”[...] Poetas! amanhã
ao meu cadáver/ Minha tripa cortai mais sonorosa!.../ Façam dela uma corda e cantem
nela/ Os amores da vida esperançosa!”(1996, p. 96). Nele tudo o que se poderia utilizar
para a idealização da morte, como um lugar transcendente não é feito, é até perceptível
a semelhança com o procedimento da idealização, mas nele tudo é ao avesso, como
forma de ironizar um dos temas comuns do romantismo.

Os elementos que comprovam esse mesmo processo são o lugar que o eu


lírico vivia, que em vez de ser nostálgico é descrito com aspecto asqueroso: “Cantem
esse verão que me alentava... / O aroma dos currais, o bezerrinho / As aves que na
sombra suspiravam / E os sapos que cantavam no caminho!” (1996, p. 96). Este mesmo
fragmento expressa também uma natureza que não se associa à melancolia da morte,
mas que manifesta um caráter nojento. Além disso, segundo a explicação do docente
Fabiano dada em aula, um outro componente que contribui para a quebra do idealizado
é a imagem do cisne equiparada ao do marreco, pois neste texto não é o cisne que canta
antes do passamento, mas sim o ganso. Finalmente, a mais visível de todas, é o
casamento com a morte, a qual é retratada como uma noiva “lazarenta e desdentada”
(1996, p. 97), ou seja, representa uma união torturante, que custa muito ao eu lírico, mas
que no final ele acaba preferindo ao experenciar o amor eterno, em outras palavras, tudo
o que é sublime e bom de acordo com a moral.

Neste ponto é que se consegue visualizar de forma mais concreta a


discordância de Álvares em suas obras, pois, assim como demonstra o poema em
questão, o eu lírico termina por preferir a união angustiante com a morte ao amor
idealizado. É o que justamente o autor constrói em seus escritos, ele reproduz o conflito
entre a fantasia e a realidade diferente da imagem convencional, explorando o que a
fantasia pode oferecer de profundo e exibindo não só o belo e o melancólico, mas
também o medonho, o satânico e o macabro. Como forma de elucidação, Álvares (1996)
em seu poema “Lembrança de morrer” localizado no primeiro prefácio, trata a morte
com muita melancolia, como um lugar melhor do que a própria vida, da qual de nada
sentirá saudade, senão de sua família e da virgem inatingível com quem sonhara, em
outros termos, representa a própria depreciação do eu.

Ademais, esta filosofia do contraste também se evidencia na comparação


entre o céu e inferno, entendido como uma tentativa de crítica aos valores morais e
religiosos, já que no inferno há mulheres bonitas onde se pode namorar “Cleópatras,
Helenas, Eleonoras” (1996, p. 97) e no céu tudo é uma chatice onde só se canta
ladainha, ajuda na missa e sacrifica ao Deus - Preguiça.

Sendo assim, pode-se finalizar a análise identificando as principais


características da segunda geração nos seus dois poemas, como o egocentrismo,
melancolia da morte e sentimentalismo no segundo, e a ironia, o humor negro, o culto
da fantasia e a filosofia do contraste no primeiro, a qual nada mais é do que a
manifestação da face rebelde romântica. Ademais, é possível depreender que em ambos
os textos retratam a imagem de um adolescente em conflito, assim como citou Candido,
seja pelo seu sofrimento, desejo antecipado da morte, ou pelo não aceitamento e
rebeldia das convenções sociais.

REFERÊNCIAS

AZEVEDO, A. Lira dos vinte ano. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

CANDIDO, A. Formação da Literatura Brasileira – momentos decisivos, 1750-


1880.
6a. ed. Belo Horizonte: Editora Itataia, 2000.

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