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O precoce jornalista Julio de Castilhos

Prof. Dr. Antonio Hohlfeldt1

Precocemente, aos 17 anos de idade, Julio Prates de Castilhos entrou na

Faculdade de Direito de São Paulo, em 1877 2, de onde regressaria aos 21 anos, já

formado3. Aos 19 anos, participa da criação de um primeiro jornal acadêmico para a

difusão dos ideais republicanos, sob o título de A evolução, onde escreve seus

primeiros artigos. Esse jornal foi criado por três sul-rio-grandenses que lá estavam

então estudando: além de Júlio de Castilhos, participam do mesmo Assis Brasil e

Joaquim Pereira da Costa4.

Helga Piccolo afirma que, além de A evolução, Júlio de Castilhos chegou

a escrever também em A república, jornal que igualmente se editava na Faculdade de

Direito do Largo de São Francisco, enquanto órgão oficial do Partido Republicano

Acadêmico, jornal que, aliás, já circulava quando Castilhos chegou à capital

bandeirante5. Sua participação neste periódico ocorreu entre junho e agosto de 1880,

segundo a mesma autora.

Para Helga Piccolo, a produção do jovem jornalista Julio de Castilhos

tinha “objetivos políticos bem definidos” e as conseqüências dessa militância inicial

1
Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul; Presidente da INTERCOM –
Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação; membro do Conselho Consultivo da
SBPJor – Sociedade Brasileira de Pesquisadores de Jornalismo; pesquisador do CNPq; Professor do
Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da PUCRS.
2
FLORES, Moacyr – “Cronologia de Julio Prates de Castilhos” in CIPEL – A era castilhista, Porto Alegre,
Círculo de Pesquisas Literárias. 2009, p. 7.
3
SOARES, Mozart Pereira – Júlio de Castilhos, Porto Alegre, Instituto Estadual do Livro.1991, p. 10.
4
SOARES, Mozart Pereira – Júlio de Castilhos, op. cit., p. 25.
5
PICCOLO, Helga I. L. – “Júlio de Castilhos, redator na imprensa acadêmica em São Paulo” in AXT, Gunter;
SEELIG, Ricardo Vaz; GEDOZ, Sirlei Teresinha; BARROS FILHO, Omar Liz de; et MENEGHETTI, Sylvia
Bojunga (Orgs.) – Julio de Castilhos e o paradoxo republicano, Porto Alegre, Memorial do Ministério
Público do Rio Grande do Sul. 2005, p. 85.
seria decisiva para o aprofundamento de seu sentimento republicano (p. 86). Para a

mesma historiadora, ainda, esta fase antecipa os caracteres mais tarde presentes em

todo o jornalismo castilhista, como a perspectiva crítica; o pendor polemista; certa

tendência autoritária e o voluntarismo que marcou toda a sua vida.

Como polemista, destacou-se no combate eficiente que travou com os

monarquistas e os que, na própria academia, defendiam o catolicismo (p. 86).

Nesta fase, contudo, não chegaria, ainda segundo a mesma historiadora,

a sistematizar suas idéias num sistema coerente, o que só viria a fazer mais tarde,

quando responsável por A federação (p. 86).

É de se observar, contudo, pelas referências feitas pela historiadora a

alguns dos artigos que estuda, que as principais idéias que articulariam centralmente

todo o futuro discurso castilhista ali já se encontravam presentes, como a identidade

entre democracia e República; a refutação ao argumento monarquista de que os

brasileiros ainda não estariam preparados para o sistema republicano; ou que não

havia lideranças capazes de assumirem e liderarem o novo regime. Esses argumentos

ele vai retomar, na forma de falsos sofismas, como os denomina, nos primeiros artigos

de fundo que produz para A federação, conforme já registrei e estudei ainda

recentemente6.

O próprio Julio de Castilhos destacaria, mais tarde, a importância de sua

participação naquela publicação:

6
HOHLFELDT, Antonio et RAUSCH, Fábio Flores – “Júlio de Castilhos jornalista em combate aos sofismas
liberais”, trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho 7, “Estudos de Jornalismo”, do XV Encontro da
COMPÓS, na Unesp, Bauro, SP, em junho de 2006.
[Aquele jornal] resume tudo o que pudesse dizer nestas duas palavras
que a Sociologia erigiu em divisa: Ordem e Progresso.

Ordem e Progresso – eis o dogma sociológico.

Ordem e Progresso – eis a República.

Ordem e Progresso – eis o objetivo para o qual deve trabalhar aquela


parte da geração contemporânea que não quiser consumir-se em uma vida de inércia e
de esterilidade, sem haver colaborado para a obra comum” 7.

A partir de 1º. de janeiro de 1884, participa ativamente da edição de A

federação, jornal do Partido Republicano Riograndense, que ajudara a criar, e cuja

direção assumiria logo depois, até 1888, numa primeira fase, e após agosto de 1889,

num segundo momento. A este jornal ele dedicaria praticamente toda a sua vida 8,

influindo decisivamente para a constituição de uma imprensa partidária forte e

influente na sociedade, sobretudo depois que substituiu Venâncio Aires na direção do

mesmo, ainda em meados daquele mesmo ano de 1884.

Por isso, “durante os anos finais do império, o jornal A federação foi o

grande agitador político do Clube Republicano”9 e seria o grande sustentáculo de toda

a administração castilhista no estado. Na avaliação posterior, “Julio de Castilhos

destacou-se, através de A federação, pelo pioneirismo em fazer uma imprensa sem

literatura, mais comedida na terminologia, e pela introdução do cientificismo

positivista na propaganda política jornalística”10, 11.

7
PICCOLO, Helga I. L. – “Júlio de Castilhos, redator na imprensa acadêmica em São Paulo”, op. cit., p. 93.
8
SOARES, Mozart Pereira – Júlio de Castilhos, op. cit., p. 13.
9
ROSSINI, Miriam de Souza – “O jornal A federação e seu papel político”, in AXT, Gunter; SEELIG, Ricardo
Vaz; GEDOZ, Sirlei Teresinha; BARROS FILHO, Omar Liz de; et MENEGHETTI, Sylvia Bojunga (Orgs.) – Julio
de Castilhos e o paradoxo republicano, Porto Alegre, Memorial do Ministério Público do Rio Grande do
Sul. 2005, p. 233.
10
BAKOS, Margaret – Julio de Castilhos: Positivismo, abolição e república, Porto Alegre, IEL-EDIPUCRS.
2006, p. 15.
11
Pode-se ler parte dos artigos de fundo produzidos por Julio de Castilhos para A federação, dentre
outras obras, em FRANCO, Sérgio da Costa – O pensamento político de Julio de Castilhos, Porto Alegre,
Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul/Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do
Sul/Martins. 2003.
Em síntese, eis as bases que justificam a oportuna publicação do

IHGRGS. Através destes textos, bem menos conhecidos que aqueles de A federação,

melhor poderemos avaliar não apenas as idéias ainda nascentes de Julio de Castilhos a

respeito da República e do positivismo, quanto compreender o modo pelo qual tais

idéias evoluem até atingirem a forma madura com que se apresentam nas páginas de A

federação, vindo, depois, a amparar toda a ação militante e partidária do líder

republicano.

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