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transportes

É só ligar na
tomada e rodar
Um empresário israelense planeja montar
redes de abastecimento para dar autonomia aos
carros elétricos. Será o automóvel do futuro?
Ricardo Neves, de Tel-Aviv
em mercados em desenvolvimento.” O pri-

S
hai Agassi, o vice-presidente da SAP, meiro modelo foi apresentado em janeiro.
uma das maiores multinacionais ale- A estratégia de Agassi inclui criar, a
mãs, produtora de software para em- partir do ano que vem, a infra-estrutura
presas, fez o equivalente empresarial a uma de apoio ao carro elétrico. Ele prevê uma além do carro Agassi com o primeiro modelo elétri
guinada brusca sem dar o sinal de seta. Até rede de postos de serviços capaz de formar
meados do ano passado, Agassi, um israe- uma grade que dará sempre cobertura no
lense de 39 anos, era visto como o candidato caminho de carros, para recarga ou troca partir de sonhos visionários. Formado em
natural a ocupar em um ou dois anos a am- da bateria. O sistema tem analogias com Computação pela Technion Universidade
bicionada cadeira de presidente mundial da os sistemas de telefonia móvel. Assim de Tecnologia de Israel, fundou aos 21 anos
SAP. No entanto, em meio a suas atividades como o celular tem serviço garantido em sua primeira empresa de software em Israel
no Fórum Econômico Mundial, a ONG de uma rede de células de transmissores, o e em seguida abriu outras três empresas.
empresários que realiza anualmente o en- carro elétrico terá pontos para o motorista Duas delas foram vendidas à SAP. Agassi
contro em Davos, na Suíça, Shai acabou se ligar sua bateria na tomada. O projeto pi- já conseguiu atrair investidores de peso. O
envolvendo com um dos grupos dedicados loto será em Copenhague, na Dinamarca. capital inicial é de US$ 200 milhões. Metade
a questões ambientais. E isso mudou sua No início do mês, em uma audiência no veio do conglomerado Israel Corporation e
carreira. A empresa que Agassi constitui tem Congresso americano, Agassi apresentou de um grupo que inclui a firma de investi-
um nome que lembra mais uma ONG am- um plano para uma rede que cubra o país. mento Morgan Stanley, além de investido-
bientalista que uma multinacional: Projeto “Pelo preço de dois meses de abastecimen- res privados, entre os quais o ex-presidente
Um Lugar Melhor (Project Better Place). to de petróleo, cerca de US$ 100 bilhões, do Banco Mundial James Wolfensohn.
Seu plano aparenta ser o lançamento de podemos instalar a infra-estrutura ne-
carros elétricos. Mas vai além. A ambição cessária para carregar os carros do país Carros elétricos foram concebidos no
dele é montar uma rede mundial de infra- com eletricidade”, disse. “E acabar com a fim do século XIX, quase simultaneamente
estrutura para manutenção e abastecimento dependência de petróleo.” aos carros movidos por motor a combus-
de uma frota de veículos elétricos. Soa ambicioso. Mas Agassi não foi sempre tão interna gerada a partir de combustível
Para a fabricação do primeiro modelo de executivo de grande empresa. Está também líquido. Os motores a bateria não poluem
carro, Agassi conseguiu sensibilizar a Re- acostumado a erguer empresas do zero, a o ar, não fazem barulho e desgastam me-
nault-Nissan. Seu presidente, o brasileiro nos que os de combustão. Quando freiam,
Carlos Ghosn, diz: “Para o automóvel ur- eles recuperam energia, recarregando suas
bano, achamos que o futuro está no motor baterias, e por isso são mais eficientes. Se o
elétrico”. Segundo Ghosn, os motoristas carro elétrico é tão bom, por que existem
desse tipo de veículo querem um carro que Agassi garante que pode menos de 90 mil deles no mundo, ante os 65
funcione bem dentro de cidades, de casa montar uma rede de postos milhões de automóveis a combustão produ-
para o trabalho, para o restaurante, para para carros elétricos nos zidos por ano? Por causa do petróleo. Essa
compras etc. “E esse é o público-alvo do fonte de energia começou a ser usada no
carro elétrico, particularmente nos países Estados Unidos. Diz que só fim do século XIX e se mostrou abundan-
desenvolvidos, mas também e aos poucos precisa de... US$ 100 bilhões te e barata quando o mercado consumidor

68 > época , 7 de julho de 2008 Foto: Ariel Schalit/AP

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era ainda pequeno. Acabou por consolidar ral Motors. Eram oferecidos na forma de
grupos econômicos que passaram a dar as leasing. Surpreendentemente, os veículos
cartas nos investimentos em transportes agradaram aos primeiros clientes. Listas de
desde então. Mesmo a poderosa indústria espera de interessados em novos veículos
automobilística é, de certa forma, refém da elétricos começaram a ser formadas nas
indústria do petróleo. Cada carro que sai concessionárias. Mas, em uma manobra
de uma montadora é cliente de uma rede sem maiores explicações, os fabricantes
de serviços e produtos ligados direta ou resolveram tomar de volta os veículos. Os
indiretamente a ela. Apenas nos Estados carros foram destruídos. As empresas ainda
Unidos, há 180 mil postos de combustíveis. entraram na Justiça estadual para cancelar
As montadoras faturam US$ 1,5 trilhão. a Lei do Ar Limpo.
Mas as seguradoras, empresas de combus- O cineasta e ativista ambiental Chris
tíveis, de autopeças e de serviços automo- Paine fez um documentário dessa história.
tivos ganham US$ 6 trilhões. Os analistas consultados por ele sugerem
Uma experiência da década de 90 aju- que os fabricantes intencionalmente sabo-
da a entender as dificuldades enfrentadas taram seus próprios esforços de marketing
pelo carro elétrico. No começo da década, em favor do carro elétrico, temerosos de
o Senado americano aprovou a Lei do Ar que o sucesso prejudicasse o faturamento
Limpo, que visava controlar a poluição atmos- de seus produtos tradicionais, com motor
férica. O Estado da Califórnia estabeleceu a combustão. No documentário, os fabri-
cotas compulsórias e progressivas para as cantes negam essa versão. O mundo não é
montadoras passarem a vender veículos mais o mesmo daquela época. Hoje, o pre-
de emissão zero, e aí nasceu uma grande ço do petróleo e o medo do aquecimento
chance para os elétricos. Em 1996, alguns global (causado também pela queima de
fabricantes lançaram os primeiros carros combustíveis) incentivam a busca por opções
elétricos em larga escala, o RV4 da Toyota, energéticas. Será que há uma nova chance
odelo elétrico. O negócio é a rede para recarregá-lo o Ranger EV da Ford e o EV1 da Gene- para o carro elétrico?  u

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