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ISSN 1413-389X Trends in Psychology / Temas em Psicologia – 2016, Vol.

24, nº 3, 791-804
DOI: 10.9788/TP2016.3-01

Coaching de Carreira e Psicologia Social Comunitária:


Análise de uma Intervenção

Mariana Stachiu1
Potencial Desenvolvimento Humano, Curitiba, PR, Brasil
Grazielle Tagliamento
Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social Comunitária
da Universidade Tuiuti do Paraná, Curitiba, PR, Brasil

Resumo
Esta pesquisa teve como objetivo desenvolver e investigar uma intervenção de coaching de carreira em
grupo, com alunos de uma instituição de ensino superior de Curitiba/PR. Foram realizadas 8 sessões de
coaching em grupo com os alunos, que tiveram como objetivo auxiliar o desenvolvimento da emprega-
bilidade dos participantes e realizar um plano de carreira. Antes e após a intervenção, foram realizadas
entrevistas semiestruturadas. Os dados das entrevistas, assim como a própria intervenção, foram anali-
sados por meio da análise de conteúdo. Para a análise, foram elencadas as seguintes categorias após uma
primeira leitura do material obtido: coaching de carreira em grupo; mercado de trabalho; e carreira. A
partir da análise, observou-se que a intervenção proposta facilitou maior conhecimento sobre o mercado
de trabalho e oportunizou novas formas de pensar a respeito da profissão. Notou-se que o processo de
coaching de carreira em grupo mostrou-se útil, uma vez que contribuiu para ampliar o autoconhecimen-
to dos participantes, bem como para proporcionar conscientização e reflexão sobre os fenômenos que
envolvem a carreira profissional. Os princípios utilizados e que permeiam a psicologia social comunitá-
ria favoreceram o processo grupal, o autoconhecimento, a conscientização, a harmonia e a solidariedade
dos membros, contribuindo para os resultados apresentados.
Palavras-chave: Coaching grupal, carreira, alunos de graduação, psicologia social comunitária.

Career Coaching and Community Social Psychology:


Analysis of an Intervention

Abstract
This research aimed to develop and investigate a career coaching intervention group, with students of
an institution of higher education in Curitiba/PR. Eight coaching group sessions were conducted with
the students, aimed to develop the employability of participants and make a career plan. Before and
after the intervention, semi-structured interviews were conducted. Data from the interviews, as well
as the intervention itself, were analyzed and will be presented in this article. The proposed interven-
tion facilitated greater knowledge about the labor market, providing an opportunity and new ways of
thinking about profession. It was noted that the process of group career coaching proved useful, since
it helped to broaden the participants’ self-knowledge as well as to provide awareness and reflection on
the phenomena that involve professional career. The principles used, which permeate community social

1
Endereço para correspondência: Av. República Argentina, 665, sala 606, Água Verde, Curitiba, PR, Brasil
80240 210. E-mail: maristachiu@hotmail.com e tgrazielle@hotmail.com
792 Stachiu, M., Tagliamento, G.

psychology, favored the group process, self-knowledge, awareness, harmony and solidarity of members,
contributing to the ending results.
Keywords: Coaching group, career, undergraduates, community social psychology.

Coaching de Carrera y Psicología Social Comunitaria:


Análisis de una Intervención

Resumen
Esta investigación tenía por objeto desarrollar e investigar una intervención de coaching de carrera en
grupo, con estudiantes de una institución de educación superior de la ciudad de Curitiba/PR. Se llevaron
a cabo 8 sesiones de coaching en grupo con los estudiantes, que teníam la intención de apoyar el desar-
rollo de la empleabilidad de los participantes y realizar un plan de carrera profesional. Antes y después
de la intervención, se realizaron entrevistas semi-estructuradas. Los datos de las entrevistas, así como
la intervención en sí, fueron analizados a través del análisis de contenido. Para el análisis, las siguientes
categorías se enumeran después de una primera lectura del material: coaching de carrera de grupo; el
mercado de trabajo; y su carrera. A partir del análisis, se observó que la intervención propuesta facilitó
un mayor conocimiento sobre el mercado de trabajo y oportunizou nuevas formas de pensar sobre la
profesión. Se observó que el proceso de coaching de carrera en grupo fue útil, una vez que contribuyó a
ampliar el conocimiento de sí mismo de los participantes, así como para proporcionar la conciencia y la
reflexión sobre los fenómenos que involucran a la carrera profesional.
Palabras clave: Coaching en grupo, carrera, estudiantes de la graduación, psicología social
comunitaria.

Nas últimas décadas, o Brasil passou por di- carreira auxilia na tomada de decisão em dife-
versas transformações, apresentando diferentes rentes contextos: na passagem de um ciclo edu-
níveis de desenvolvimento e modernização em- cativo para outro, na transição dos estudos para
presarial e industrial. Segundo Robbins (2010), o mundo do trabalho, na mudança de profissão
o cenário empresarial apresenta grandes desafios ou emprego ou até mesmo na adaptação para a
em decorrência da globalização, diversidade da aposentadoria. Sendo assim, conforme apontam
força de trabalho, aumento da qualidade e produ- Silva et al. (2004), essa intervenção pode ocorrer
tividade de serviços e produtos, desenvolvimen- principalmente em momentos críticos da trajetó-
to de habilidades técnicas e comportamentais, ria profissional de pessoas e de grupos.
entre outros. Essas ocorrências proporcionaram Como uma das formas de trabalhar a orien-
a abertura de diferentes arranjos e formas de tra- tação de carreira e oportunizar o conhecimento,
balho, gerando maior diversidade de serviços e escolha, planejamento e construção da trajetória
ocupações. profissional desejada, encontra-se o serviço de
Como forma de lidar com essas questões, coaching de carreira. O coaching caracteriza-se
estudantes e profissionais buscam por serviços por auxiliar as pessoas a atingir seus objetivos
de orientação de carreira que lhes tragam mais tanto pessoais quanto profissionais. Dessa forma,
informações, apoio e subsídios para enfrentar o o coaching oferece a oportunidade de assessorar
mundo do trabalho que se apresenta em constan- indivíduos a enfrentarem diferentes desafios em
te mudança. todos os níveis de suas vidas e, consequentemen-
A orientação de carreira ou orientação te, em suas carreiras.
profissional, segundo Silva, Lassance e Soares O processo de coaching pode ser realizado
(2004), tem como objetivo auxiliar pessoas a individual ou coletivamente. O trabalho indi-
tomarem decisões mais assertivas sobre o tra- vidual configura-se pela abordagem em que
balho, a formação e o estudo. A orientação de existem duas pessoas envolvidas no processo:
Coaching de Carreira e Psicologia Social Comunitária: Análise de uma Intervenção. 793

o coach (pessoa que emprega o coaching) coaching de carreira em grupo, que foi realizado
e o cochee (pessoa que recebe o coaching). com alunos de graduação, a fim de responder à
O coaching em grupo caracteriza-se pela seguinte questão: quais os possíveis resultados
participação do coach e de um grupo de pessoas da intervenção do trabalho de coaching de car-
que possuem metas e objetivos comuns no reira para os participantes?
grupo. O grupo age principalmente na troca
de experiências, em que cada participante atua Coaching de Carreira em Grupo
como coautor do processo. Para Downey (2010,
p. 121), “o coaching de equipes tem uma função A chegada da tecnologia e a globalização
muito específica: assegurar que a equipe atinja transformaram o ambiente organizacional, al-
suas metas”. terando o sistema de produção e exigindo mais
Mill (1970, p. 13) define grupo como “uni- qualidade das pessoas nas empresas. Além dis-
dades compostas de duas ou mais pessoas que so, abriu diferentes oportunidades de trabalho
entram em contato para determinado objetivo, nas mais variadas profissões em todo o planeta
e que consideram significativo o contato e re- e oportunizou, consequentemente, o desenvolvi-
presentam não apenas micro-sistemas, mas são mento de carreira. Dessa forma, observa-se que
também, fundamentalmente, microcosmos de as maneiras de trabalhar adquirem novos perfis
sociedades mais amplas”. e o emprego passa por redefinições. Repensar
Nascem, portanto, grupos com diferentes sobre a carreira e a empregabilidade tornou-se
propostas, inclusive para se apoiar e se autoaju- primordial, pois o vínculo empregatício está
dar dentro de processos, com o objetivo de atin- abrindo espaço para novos modelos de relacio-
girem um objetivo comum. Nesse contexto gru- namento profissional.
pal, destaca-se a psicologia social comunitária, A empregabilidade ganha força nesse con-
que, segundo Sawaia (2007), tem como objetivo texto e sua compreensão é dada como uma con-
integrar indivíduos e grupos a partir da transfor- dição para a preparação das demandas imediatas
mação de atitudes. Busca desenvolver potencia- ou futuras do mercado de trabalho, sendo apre-
lidades individuais, grupais e coletivas, atuando sentada através dos recursos técnicos e compor-
com intenção educativa e preventiva. “O predi- tamentais dos trabalhadores e sua capacidade de
cado comunitário contém valores específicos que usá-los em seu trabalho (Rentería-Pérez & Mal-
permitem o amadurecimento e desenvolvimento vezzi, 2008).
das potencialidades humanas nos espaços parti- Diante dessas modificações, cabe ressal-
culares do cotidiano, portanto, não antagônico à tar a intervenção da orientação de carreira, que
individualidade” (Sawaia, 2007, p. 37). busca integrar, apoiar e instruir estudantes e
Freitas (2007, p. 59) aponta que “a Psico- profissionais ao mundo contemporâneo do tra-
logia Social Comunitária compreende o homem balho e das profissões. A orientação de carreira,
como sendo sócio historicamente construído e segundo Silva (2010), tem como diferencial sua
ao mesmo tempo construindo as concepções a conexão com o processo de facilitação da esco-
respeito de si mesmo, dos outros homens e do lha, tomada de decisão e preparação de projetos
contexto social”. A psicologia social comunitá- de vida.
ria compreende o ser humano em suas relações, Escolher o que se quer ser no futuro implica
e atua no intuito de conscientizar e facilitar a re- reconhecer o que fomos, as influências so-
lação das pessoas inseridas em uma comunidade fridas na infância, os fatos mais marcantes
ou grupo social. em nossa vida até o momento e a definição
Sendo o coaching de carreira uma estratégia do estado de vida, pois o trabalho escolhido
possível para maior conscientização, autoper- vai possibilitar ou não realizar estas expec-
cepção e desenvolvimento de um plano de vida tativas. (Soares, 2002, p. 24)
profissional, buscou-se nesta pesquisa coletar Para Soares (2002), ter consciência daquilo
dados qualitativos referentes a um programa de que nos determina será a possibilidade mais viá-
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vel para se trabalhar em orientação profissional. emoções próprias. Tem sua dinâmica específica
Através do processo de conscientização, o indi- e deve ser entendida para ser melhor dominada.
víduo fará escolhas mais assertivas em sua vida e Frequentemente os profissionais se deparam
carreira, possibilitando maior satisfação pessoal com eventos que refletem conquistas, com-
e profissional. petições, desafios e fracassos. Ao enfrentar
Como uma forma de trabalhar a conscienti- estes eventos observa-se que quando o in-
zação e o processo de escolha, destaca-se o pro- divíduo conhece seus objetivos e decide-
cesso de coaching. O coaching é uma metodo- -se por opções que respeitam seus valores,
logia que busca ampliar o conhecimento que o suas características pessoais e vocacionais,
sujeito tem de si e construir um plano que viabi- a evolução da carreira se faz mais fácil e
lize atingir suas metas tanto pessoais quanto pro- prazerosa, contribuindo para o constante
fissionais. Marques e Carli (2012, p. 22) afirmam aprendizado. (Oliveira, Guimarães, & Cole-
que o coaching “é um processo de aprendizagem ta, 2006, p. 12)
e desenvolvimento de competências comporta- O coaching de carreira contém, em si mes-
mentais, psicológicas e emocionais, direcionado mo, uma caminhada de análise, reflexão, desafio
à conquista de objetivos e obtenção de resulta- e operacionalização. Ao potencializar a visão, a
dos planejados”. tomada de decisão e a concretização, o coaching
“A palavra ‘coach’ vem da Hungria do sé- acentua a mudança. Conforme apontam Lages e
culo XV, referindo-se à aldeia de Kocs, onde O’Connor (2004, p. 3), “coaching é sobre mu-
eram construídas finas carruagens de transporte. dança, sobre efetuar mudanças”.
O propósito de uma carruagem era transportar Trabalha-se na superação de obstáculos que
pessoas de onde elas estavam para onde quises- possam prejudicar o desempenho dos partici-
sem ir” (Underhill, McAnally, & Koriath, 2010, pantes do processo de coaching de carreira. Os
p. 35). Da mesma maneira, os coaches facilitam participantes têm a oportunidade de visualizar
o transporte de pessoas de um lugar para o outro, e clarear conceitos e procedimentos, checando
favorecendo maior autoconhecimento, escolhas conhecimentos sobre mercado, carreira e sobre
assertivas e atingimento de objetivos previamen- eles mesmos.
te elaborados ou que serão delineados no decor- O coaching de grupo ou coaching grupal é
rer do processo. uma modalidade de trabalho que visa à solução
Segundo Wolk (2010), no processo de coa- de situações conflituosas, através da interação
ching, utiliza-se a escuta ativa e perguntas para grupal. “No coaching grupal é produzido um
incentivar uma nova maneira de pensar, trazen- processo que age com grande profundidade e se
do o aumento da consciência, maiores reflexões, potencializa precisamente através da multiplica-
novas percepções, mudança de comportamento ção grupal” (Wolk, 2010, p. 25).
e desenvolvimento. Junto com o sujeito parti- Wolk (2010, p. 26) defende que “o coaching
cipante do processo, busca-se obter soluções grupal, através da identificação, possibilita a
estratégicas, pois se parte da premissa de que o tomada de consciência sobre aspectos próprios
participante é um ser criativo. desconhecidos, mas que agem em nós e nos quais
O coaching de carreira é uma abordagem podemos agir quando os vemos em outro”. Para
que se caracteriza pela aplicação de distintas Guareschi (1996), nos grupos e/ou comunidades,
ferramentas, que visam a auxiliar os participan- as pessoas têm voz e vez, podem colocar em ação
tes no desenvolvimento de sua carreira. O ato suas iniciativas, desenvolvem sua criatividade e
de planejar a carreira propicia e facilita maior se completam – exercitando sua plena vocação
reflexão, promovendo o conhecimento e o au- de animal político, social. Sawaia (2007)
toconhecimento, fundamentais para o desenvol- acrescenta que todos os membros que possuem
vimento de atividades em qualquer ramo do co- relação com outros devem ter legitimidade para
nhecimento humano. A carreira tem seu ciclo de se fazerem ouvir e a capacidade argumentativa
vida. Cada fase tem sua constituição e desperta para participarem da construção do consenso
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democrático, para que uns não se alienem em curso. Ao todo, 12 alunos, de ambos os sexos,
um outro, considerado o dono do saber. É um se dispuseram a participar voluntariamente da
exercício de sensibilização e reflexão, para que o pesquisa.2
sujeito sinta-se convalidado, enquanto membro Foram agendadas, então, entrevistas in-
do processo dialógico-democrático. dividuais com os discentes, com o intuito de
Além do processo de identificação que se apresentar os objetivos da pesquisa, o Termo
destaca no contexto de grupos, cabe enfatizar de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE),
que é no processo comunitário, na relação com os princípios do coaching e realizar a entrevista
o outro, que o indivíduo desenvolve consciên- inicial, que se constituiu de um questionário se-
cia, identificação, significados e sentidos com miestruturado (Tabela 1), contendo 19 perguntas
relação aos processos vivenciados. Lane (1996) envolvendo temas como profissão, empregabili-
destaca que é no contexto grupal que as pessoas dade, planejamento de carreira, objetivos profis-
se aproximam e identificam-se com os outros e é sionais, escolhas e expectativas.
nele que se diferenciam deste, e assim constroem Após as entrevistas, iniciou-se o grupo de
uma identidade, sendo o grupo condição para a coaching de carreira, composto por 8 sessões se-
sua manutenção ou transformação. Com esse in- manais, com duração de uma hora e trinta minu-
tento, destaca-se a atuação da psicologia social tos cada sessão.
comunitária, permeada por valores comunitários A pesquisa-ação desempenhada nesta in-
e de grupo. vestigação é uma metodologia de pesquisa qua-
Montero (2004) afirma que a psicologia litativa que, segundo Barbier (2007), está mais
social comunitária é uma ciência aplicada, que interessada no conhecimento prático do que no
produz intervenções sociais, predominantemen- conhecimento teórico, tendo os participantes do
te preventivas, produzindo reflexão, crítica e grupo mais condições de entender sua realida-
teoria. A psicologia comunitária abarca os pro- de do que as pessoas que não participam dele.
cessos de caráter comunitário, em que são consi- “Na pesquisa-ação, os dados são retransmitidos
derados os fenômenos psicossociais de determi- à coletividade a fim de conhecer sua percepção
nado grupo, tendo em vista o contexto cultural e da realidade e de orientá-la de modo a permitir
social em que surgem. Tem uma orientação para uma avaliação mais apropriada dos problemas
a mudança social que vise ao desenvolvimento detectados” (Barbier, 2007, p. 55). Dessa forma,
da comunidade, incluindo a orientação para a os resultados estão estritamente ligados à situa-
mudança pessoal, na relação entre indivíduos e ção e ao contexto em que o grupo está inserido.
grupos. Para Barbier (2007), a pesquisa-ação reconhe-
Diante desse contexto, esta pesquisa buscou ce que o problema nasce num contexto conciso
desenvolver e analisar – através da epistemolo- de um grupo em colapso. O pesquisador não o
gia da psicologia social comunitária – uma in- gera, mas percebe o conflito. Seu papel incide
tervenção em um grupo, realizada com alunos em auxiliar o grupo a determinar todos os deta-
de graduação através da utilização de práticas e lhes importantes ligados ao problema, por uma
teorias do coaching de carreira em grupo. tomada de consciência dos participantes do gru-
po numa ação coletiva. Em resumo, a pesquisa-
Método -ação é uma forma de investigação social que é
elaborada e realizada em estreita associação com
Foi encaminhada, inicialmente, uma carta uma ação ou resolução de um problema coletivo
de solicitação à instituição de ensino superior (Minayo, 1994).
onde a pesquisa foi realizada. Após a autoriza- Durante os encontros em grupo, foram utili-
ção da instituição, os alunos foram convidados zados ferramentas e instrumentos específicos do
a participar do programa de coaching de carrei-
ra em grupo através da página do Facebook da 2
Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética
instituição e do convite dos coordenadores de em Pesquisa com Seres Humanos.
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coaching, levando-se em consideração a deman- fase de organização e sistematização das ideias;


da verificada nas entrevistas iniciais. a exploração do material – fase em que os dados
Ao final do programa de coaching de carrei- brutos foram codificados; e a etapa de tratamento
ra em grupo, a entrevista semiestruturada apli- dos resultados e interpretação. Para essa análise
cada no início foi empregada novamente, com de conteúdo, foram elencadas três categorias de
pequenas alterações (Tabela 1), para a análise da análise após a exploração do material: coaching
intervenção proposta. de carreira em grupo; mercado de trabalho; e
Os dados coletados por meio das entrevistas carreira. A fim de analisar a intervenção propos-
com os participantes e das observações realiza- ta a partir dessas categorias, os dados das entre-
das durante as sessões de coaching de carreira vistas iniciais foram comparados com os dados
foram tratados por meio da análise de conteú- das entrevistas realizadas no final das sessões de
do, passando pelas seguintes fases: pré-análise – coaching em grupo de carreira.

Tabela 1
Roteiros de Entrevista Inicial e Final

Entrevista inicial Entrevista final

1. O que lhe fez escolher por este Curso de 1. Qual sua situação atual profissional?
Graduação? 2. O que você faz, além de cursar a Faculdade?
2. Qual sua situação atual profissional? 3. O que você conhece da sua futura profissão?
3. O que você faz, além de cursar a Faculdade? 4. Como se imagina daqui a 5 anos? E 10 anos?
4. O que você conhece da sua futura profissão? 5. Você conhece alguém da sua área de atuação?
5. Como se imagina daqui a 5 anos? E 10 anos? 6. O que você conhece sobre empregabilidade?
6. Você conhece alguém da sua área de atuação? 7. O que você faz hoje para melhorar sua
7. O que você conhece sobre empregabilidade? empregabilidade?
8. O que você faz hoje para melhorar sua 8. De 0 a 10, que nota você daria para sua
empregabilidade? empregabilidade hoje?
9. Você possui objetivos profissionais? Quais são? 9. Você possui objetivos profissionais? Quais são?
10. O que imagina precisar fazer para chegar nos seus 10. O que imagina precisar fazer para chegar nos seus
objetivos profissionais? objetivos profissionais?
11. Quais recursos pessoais precisa utilizar para 11. Quais recursos pessoais precisa utilizar para
chegar em seus objetivos profissionais? chegar em seus objetivos profissionais?
12. Como você descreveria o mercado de trabalho 12. Como você descreveria o mercado de trabalho
atual na sua futura profissão? atual na sua futura profissão?
13. Você sabia como era o mercado de trabalho, antes 13. Você se sente preparado para atuar na sua futura
de escolher a sua profissão? profissão?
14. Você se sente preparado para atuar na sua futura 14. Que experiências acredita ser importante que lhe
profissão? ajudariam na preparação para sua futura profissão?
15. Que experiências acredita ser importante que lhe 15. Como você se sente quando pensa no seu futuro
ajudariam na preparação para sua futura profissão? profissional?
16. Como você se sente quando pensa no seu futuro 16. Quantas pessoas que você conhece, que lhe
profissional? indicariam futuros clientes na sua profissão? E
17. Quantas pessoas que você conhece, que lhe professores?
indicariam futuros clientes na sua profissão? E 17. O que achou do Programa de Coaching de
professores? Carreira em Grupo?
18. O que espera do Programa de Coaching de
Carreira em Grupo?
19. Gostaria de acrescentar alguma coisa que eu não
perguntei?
Coaching de Carreira e Psicologia Social Comunitária: Análise de uma Intervenção. 797

Participantes contrato psicológico de grupo e iniciou-se uma


Participaram inicialmente das entrevistas 12 reflexão sobre “o que o mercado de trabalho bus-
alunos matriculados nos cursos de administra- ca atualmente nos profissionais”.
ção, ciências contábeis, psicologia e fisioterapia Ao final dessa sessão, a pesquisadora ex-
de diferentes períodos e idades. Para preservar a plicou que, a cada encontro, seriam realizadas
privacidade de cada aluno respondente, os nomes ações de acompanhamento (tarefas), que deve-
dos sujeitos foram substituídos por símbolos. riam ser executadas durante a semana e apre-
Desses 12 alunos, 8 relataram trabalhar (E1, sentadas no início de cada sessão do grupo. As
E2, E4, E5, E8, E10, E11 e E12) e, destes, meta- ações de acompanhamento visaram a identificar
de atua na área em que faz o curso de graduação aspectos relevantes para a realização do plano
(E1, E2, E4 e E10). No decorrer dos encontros e de desenvolvimento de carreira de cada partici-
em virtude da disponibilidade de agenda de de- pante, bem como assessorar os discentes quanto
terminadas pessoas, alguns alunos não puderam à evolução do processo de coaching em grupo.
mais participar das sessões de coaching, restan- As ações foram definidas e programadas durante
do ao final do processo 6 participantes (E1, E2, todo o programa de coaching a partir das condi-
E6, E7, E8 e E12). ções e necessidades apresentadas por cada parti-
cipante e pelo grupo.
Resultados e Discussão A segunda sessão de coaching foi organiza-
da em dois momentos: (a) trabalhou-se o tema de
Descrição das Sessões de Coaching interesse dos participantes – “como elaborar um
A pesquisadora iniciou o processo de coa- currículo” e (b) foi utilizada uma ferramenta, de-
ching de carreira em grupo com uma atividade nominada SWOT, que visa a identificar pontos
de apresentação, para que todos os discentes pu- fortes e oportunidades de melhoria. De origem
dessem se conhecer. Posteriormente, foi conver- inglesa, o SWOT significa: forças (strenghts),
sado sobre as expectativas do grupo com relação fraquezas (weaknesses), oportunidades (oppor-
ao processo de coaching: tunities) e ameaças (threats). Observou-se com
“Eu quero com este grupo maior autoco- essa atividade que alguns discentes tiveram di-
nhecimento, desenvolvimento pessoal e percep- ficuldades em refletir sobre suas forças, o que
ção” (E2). pode ser em virtude da falta de conhecimento
“Espero agregar conhecimento à carreira que possuíam sobre si e de seus talentos. Ao
profissional e melhorar a visão de futuro” (E6). final, cada integrante do grupo teve a oportuni-
“Busco ‘afunilar’ os objetivos profissionais, dade de elaborar um plano de ação que pudesse
compartilhar momentos com os participantes do ampliar suas forças e amenizar fraquezas e ame-
grupo, identificar deficiências e/ou potenciais aças em sua carreira.
intrapessoais e interpessoais” (E1). Na sessão 3, os participantes tiveram o ensejo
Nota-se, através do relato dos discentes, que de refletir sobre suas metas e objetivos de vida.
os alunos buscam por maior conhecimento pes- Foi entregue a cada discente uma folha contendo
soal e profissional, anseiam em traçar metas e a atividade denominada ‘dreamlist’, onde cada
objetivos para o futuro, bem como compartilhar integrante deveria refletir e escrever sobre seus
experiências com o grupo. Para Sampaio (2011), sonhos e metas de vida pessoal e profissional.
o levantamento de expectativas é uma das eta- Catalão e Penim (2009, p. 7) apontam que
pas mais importantes do processo de coaching, apoiar o cliente a determinar a situação onde
pois nesse momento o coach irá entender a real se encontra e a situação desejada/sonhada,
necessidade dos participantes e poderá, de uma definindo-a como uma meta a atingir, para
forma mais assertiva, planejar uma possível es- a qual vai trabalhar com empenho, é a
tratégia para as próximas sessões. essência do coaching, no sentido em que
Na primeira sessão foi realizada também este é um processo centrado no futuro e na
uma atividade de integração, foi consolidado um mudança.
798 Stachiu, M., Tagliamento, G.

Para Marques e Carli (2012), as diretrizes ou levando-o a acreditar que não é capaz de
pessoal e profissional são a base de um projeto obtê-las. (Lages & O’Connor, 2004, p. 111)
de carreira, pois “somente será prazerosa e bem- Nessa sessão, a pesquisadora expôs o signi-
-sucedida a pessoa que conseguir alinhar as duas ficado do tema da sessão (crenças), como eram
de forma harmônica de tal maneira que se con- formadas e a importância dos indivíduos possu-
fundam” (p. 179). írem crenças positivas na vida. Através de uma
A sessão 4 teve como foco especificar e de- atividade prática, o grupo teve a oportunidade
talhar os objetivos de carreira de cada integran- de identificar as suas crenças fortalecedoras e
te. Em duplas, os discentes escreveram qual era limitantes. Observou-se que grande parte dos
especificamente seu objetivo, o que o motiva- membros do grupo possuía crenças limitantes a
va a buscá-lo, quais poderiam ser suas maiores respeito de sua futura profissão e a respeito de
dificuldades, quais valores pessoais envolviam si. Frases como: “é difícil, esta profissão não dá
esse objetivo, quais estratégias e ações preci- dinheiro”, “as pessoas não colaboram”, “exige
savam realizar para atingi-lo e quais recursos muito”, foram frequentes nos relatos dessa ati-
(pessoais/financeiros/materiais) iriam precisar. vidade.
Observou-se, através do relato dos integrantes, Na sessão 7, foi abordado o tema entrevis-
que essa ferramenta oportunizou maior esclare- ta de emprego. Os alunos sortearam perguntas
cimento sobre os aspectos relacionados à carrei- previamente elaboradas pela pesquisadora e de-
ra e pôde proporcionar maior conhecimento so- veriam, em pares, responder às perguntas, em
bre as ações necessárias para alcançar seu plano forma de dramatização. Observou-se que havia
de carreira. muitas dúvidas a respeito do que o entrevistador
Na sessão 5, os participantes foram convi- realmente busca em uma entrevista de emprego.
dados a imaginarem-se 2 anos adiante e com seu Esses questionamentos transformaram-se em
plano de carreira já alcançado. Posteriormente, uma discussão e análise do grupo referentes às
eles desenharam sua visão em uma folha de flip principais competências e habilidades requeri-
chart e compartilharam com os demais integran- das pelo mercado de trabalho atual.
tes do grupo. Essa atividade proporcionou ao A sessão 8 teve como intuito trabalhar o
grupo maior conhecimento dos objetivos gru- tema sucesso profissional. Para tanto, cada in-
pais, estabelecendo uma relação mais próxima tegrante foi convidado a realizar a leitura do
entre os membros. Os integrantes do grupo apre- texto As leis do triunfo, do autor Napoleon Hill
sentaram empatia, colaboração e apoio recípro- (2008). Durante a sessão, os participantes expu-
co para auxiliar os membros a atingir o plano de seram suas ideias e debateram sobre os conceitos
carreira. de sucesso profissional apresentados pelo autor.
A sessão 6 teve como objetivo identificar Relataram ser de grande importância que todas
crenças. É fundamental, em um processo de as pessoas pudessem conhecer esses princípios e
coaching que os participantes reconheçam as que pudessem atuar conforme estes.
suas crenças, uma vez que elas se transformam Ao final do encontro, e sendo a última ses-
“frequentemente numa verdade absoluta, num são do processo de coaching de carreira, os par-
mandamento, dogma ou credo. Pode, como tal, ticipantes expuseram suas impressões sobre o
balizar e ditar atitudes, escolhas e decisões” processo de coaching em grupo e relataram inte-
(Sampaio, 2011, p. 81). resse em continuar com as atividades, narrando
Crenças são as regras da vida, as regras que o grupo foi de grande importância em sua
pelas quais você vive. Estas regras podem vida pessoal e profissional.
ser libertadoras ou positivas, e lhe conferir Observou-se durante o processo de coa-
permissão para atingir suas metas e viver ching que os alunos mobilizaram-se frente à sua
seus valores. Elas, também, podem ser im- carreira profissional e conseguiram aplicar na
pedimentos, tornando as metas impossíveis sua vida cotidiana o que havia sido trabalho nas
Coaching de Carreira e Psicologia Social Comunitária: Análise de uma Intervenção. 799

sessões. Isso porque, dos alunos que participa- profissão. Eu acho que agregou muita coisa,
ram até o final do processo de coaching, todos as atividades que a gente fez... que a gente
os alunos finalizaram as sessões atuando no mer- fez em casa e tal... Acho que eu aprendi a
cado de trabalho (diferentemente do início, em ter confiança em mim, foco. Eu que direcio-
que, desses alunos, os participantes E6 e E7 não no a luz para onde eu quero. (E7)
estavam trabalhando e/ou estagiando). Os relatos dos alunos E6 e E7 apontam que
Pôde-se observar que as reflexões e ações esses discentes vivenciaram emoções positivas
propostas entre os encontros puderam auxiliar sobre si e sobre a futura profissão, favorecendo
a proporcionar diferentes ações e impulsionar maior realização pessoal e profissional.
esses discentes a desenvolverem sua emprega- A aluna E8, através do seu relato, demons-
bilidade. trou a relevância do trabalho em grupo:
A experiência em compartilhar... volta e
Coaching de Carreira em Grupo meia vem a voz da colega E6 “foco, foco”.
Buscou-se, por meio das atividades escolhi- Da colega E7... aquela ideia [que dizia]
das, abordar as principais categorias da psico- preciso ser otimista, otimista. Então assim,
logia social comunitária, tais como linguagem, o grupo também enriqueceu e contribuiu.
pensamento, consciência, alienação, atividade e Aquele outro menino... que um dia comen-
identidade, contemporizar o processo grupal e tou uma coisa que pra mim marcou muito...
observar os resultados das relações estabelecidas era sobre a qualidade de vida dentro da
nesse grupo. vida profissional... Eu quero ter qualidade
Quando interrogados sobre o que acharam de vida na minha vida profissional. Então
do programa de coaching de carreira em grupo, a realização profissional que era o que ele
os alunos relataram que o processo lhes agre- tava falando, pra mim também marcou e
gou maior autoconhecimento, conscientização, tudo que eu fui aprendendo ali, as experi-
autoconfiança, esclarecimento sobre a carreira, ências, os vídeos, eu comentei em casa, pas-
profissão e mercado de trabalho e ainda ampliou sei pra frente algumas pessoas me pediram,
o conhecimento sobre empregabilidade. Afirma- então foi bem aquecedor. Gostei muito, foi
ram que gostaram principalmente de conhecer uma experiência muito gratificante.
novas pessoas, compartilhar experiências em A troca de experiências entre as pessoas
grupo, conhecer melhor sobre a profissão, ter do grupo proporcionou maior conscientização,
objetivos claros e mais foco, delimitar um plano apoio, sentimento de pertencimento, e permitiu
de carreira e refletir sobre seus sonhos: ampliar práticas de relacionamento interpessoal
Nossa, eu fiquei muito feliz. Eu não tinha e solidariedade. Conforme aponta Lane (2006,
ideia do que era coaching... e eu fiquei mui- p. 16),
to contente por poder participar... queria o viver em grupos permite o confronto entre
aproveitar ao máximo... e eu fiquei extrema- as pessoas e cada um vai construindo o seu
mente contente em poder conhecer pessoas “eu” neste processo de interação, através de
novas, em poder compartilhar opiniões e constatações de diferenças e semelhanças
situações né... do mercado de trabalho em entre nós e os outros. É neste processo que
que a vivência de um é o sucesso do outro. desenvolvemos a individualidade, a nossa
Eu acredito assim, que a experiência que identidade social e a consciência-de-si-
um pôde passar, eu nossa, isso eu faria, isso mesmo.
eu não faria, discutir, debater. (E6) Dessa forma, o grupo mostra-se como facili-
Eu me conheci muito melhor como pessoa e tador para os processos de identificação pessoal,
me empolgo muito mais com a minha pro- apoio e ajuda no âmbito pessoal e profissional.
fissão e eu me tornei uma pessoa que me Essa interação gerou uma experiência positiva e
conhece mais e que conhece mais a minha trouxe ganhos primários e secundários para todos.
800 Stachiu, M., Tagliamento, G.

O Mercado de Trabalho mercado de trabalho. Segundo Minarelli (2010),


A partir das entrevistas realizadas, pode-se para aumentar a empregabilidade, é necessário
observar um discurso diferente sobre o merca- que os profissionais estejam preparados do ponto
do de trabalho e sobre a própria profissão, como de vista técnico, gerencial, intelectual, humano e
mostra a aluna E7, que na entrevista inicial co- social para resolver com agilidade dificuldades e
menta: problemas cada vez mais sofisticados e especí-
Acho que é um campo difícil... [a profissão ficos. De acordo com esse mesmo autor, conhe-
que escolhi] é difícil. Muita gente fala que cimento e informação são primordiais – confor-
é bem recompensado, muita gente fala que me demonstraram as falas dos discentes. Além
não. Tem gente que fala só na felicidade disso, o autor sugere que existem alguns pilares
com os pacientes, mas não fala bem finan- importantes para manter a empregabilidade, os
ceiramente. Eu não sei, eu acredito que não quais precisam estar coesos e articulados. São
é, financeiramente não é uma área tão boa. eles: adequação vocacional, competência pro-
Posteriormente, relata que: fissional, idoneidade, saúde física e mental, re-
Tem gente que diz que é ruim, tem gente que serva financeira e relacionamentos. A união de
diz que é bom. Eu acho que é um merca- todos eles dará maior segurança ao profissional,
do de trabalho legal, muito bom. Não que oportunizando a ele maior capacidade de gerar
você vai ficar mendigando ou que você vai trabalho e renda. Em suma, ter uma sólida em-
ficar milionário. Isso é você que faz. A tua pregabilidade significa ir além de apenas cursar
profissão é você que faz. Mas eu acho que uma faculdade.
essa coisa de ter esse contato com pessoa e O próprio conceito sobre empregabilidade
fazer ela melhorar é a melhor parte dessa foi ampliou após as sessões do grupo de coa-
profissão. (E7) ching, conforme aponta o comparativo do relato
Nesse relato, observa-se que a participante da discente E8:
saiu de uma visão financeira relacionada ao tra- Antes: “Eu conheço muito pouco sobre em-
balho e à profissão para uma visão mais huma- pregabilidade. Não tenho muito o que falar, que
na, percebendo também o prazer que a profissão é uma área nova para mim... O pouco que eu
e seu ofício podem lhe oferecer. Isso sugere que vejo é aqui na própria faculdade, essa palavra
conhecer mais sobre a profissão, e buscar inte- vem sendo comentada, pela própria organiza-
ragir com o mercado de trabalho, com colegas ção mesmo...”.
e com profissionais da área podem contribuir Depois: “Ah eu, o que eu entendo é o prepa-
para expandir a percepção do futuro profissio- ro que a pessoa tem... tanto na vida acadêmica
nal, de forma que o sujeito possa não apenas ter como depois... pra manter uma formação e uma
um olhar de sucesso financeiro sobre a carreira, atualização de cursos, congressos. Se capaci-
mas também possa observar os outros aspectos tando pra ser alguém com um currículo bom...”.
de sucesso que o trabalho pode lhe oferecer. O conceito de empregabilidade pode ter
Na atividade proposta no grupo, os parti- sido ampliado em virtude do maior conhecimen-
cipantes relataram que o mercado de trabalho to sobre a própria carreira, profissão e sobre o
busca por “qualificação, agilidade, iniciativa, mercado de trabalho. A conscientização dos pro-
interesse, educação e saúde emocional”. “Pro- cessos que envolvem o tema expandiu não só seu
cura profissionais que queiram crescer profis- conceito, como também a aplicabilidade do con-
sionalmente, pessoas proativas, que possuam ceito na trajetória profissional dos participantes.
responsabilidade, maturidade, humildade, co- Após as atividades propostas, quando interroga-
nhecimento, experiência, comprometida com o dos sobre que nota dariam à sua empregabilida-
que faz”. de antes e depois do processo de coaching, eles
Diante dessas colocações, observa-se que os relataram:
pesquisados possuem uma visão clara das neces- “Antes do coaching uns 4... hoje eu acredito
sidades requeridas para o profissional inserido no que em torno de 6 e 7” (E1).
Coaching de Carreira e Psicologia Social Comunitária: Análise de uma Intervenção. 801

“Nossa muito menos, 4... hoje, olha... acho sujeito a agir ou a adotar um estilo de vida que
que uns 7 ou 8” (E2). mascara a ansiedade e predispõe a uma angústia
Acho que o coaching ajudou muito, tanto na subsequente mais destrutiva. Para Sánchez Vi-
visão mais ampla como afunilar essa ques- dal (1991), isso traz aos integrantes do grupo a
tão do que você quer e trabalhar as minhas sensação de pertencer e fazer parte significativa-
qualidade e o que eu não tenho de tão bom mente de uma comunidade maior. Fazer parte de
assim, mas pra agregar tudo e compreender um grupo e perceber que existem pessoas com
esse contexto... hoje daria 8... (E6) as quais o sujeito possa compartilhar suas angus-
Ah eu acho que... eu dava uns 5, no máxi- tias, alegrias, descobertas e conquistas, torna o
mo 5, não mais que isso... hoje eu acho que indivíduo mais autoconfiante. Sair de uma visão
cresci um pouco depois do coaching que individualista, para uma visão mais coletiva dá
a gente fez... eu acho que uns 7 ou 8... Eu forças ao indivíduo para enfrentar os obstáculos
acho que falta eu fazer uns cursos, me aper- que a vida oferece. Dessa forma, diante desse
feiçoar mais, mas isso também quando eu contexto, sugere-se que é através da relação com
terminar a faculdade, né. (E7) o outro que nos sentimos mais confiantes e am-
“Antes acho que 7... agora... hum... 10” (E8). parados, pois temos com quem compartilhar e
“Ah, muda muito. Eu imagino 3 ou 4 a nota dividir nossos anseios.
que eu daria antes... hoje 9” (E12).
Quanto aos sentimentos em relação ao mer- A Carreira Profissional
cado de trabalho, pode-se observar que os alunos Com relação aos objetivos e ao plano de
sentem-se um pouco mais confiantes, conforme carreira, observa-se que os alunos participantes
apontou o relato do aluno E12: puderam obter maior clareza do que queriam
Antes: “É um misto né, um misto de é... eu construir ao longo de sua vida profissional:
acabo sendo otimista e incerto, né... É um misto Tudo o que eu aprendi no coaching assim...
disso”. imaginar sempre, fazer o plano de negó-
Depois: “Sinto motivado, mas é... bom en- cios, deixar esse sonho mais próximo pos-
fim... não me lembro a palavra... Mas eu me sin- sível da minha realidade, trabalhando em
to muito bem, eu tenho uma visão muito positiva cima dele... Ah o que eu preciso fazer? Pre-
do meu futuro, meu futuro profissional. Eu me ciso me dedicar aos estudos, mas eu tam-
dedico então acho que vai ser muito bom”. bém preciso ter um contato maior com as
A pesquisa sugere que, através de uma maior pessoas. (E6)
compreensão e conhecimento sobre os processos Observa-se também um plano de carreira
que envolvem o mercado de trabalho e a empre- mais consistente, específico e realista. Para Mi-
gabilidade, é possível uma maior conscientiza- narelli (2010), em qualquer momento da trajetó-
ção do sujeito, o que irá favorecer sua percep- ria profissional, é necessário avaliar o passado,
ção, autoconfiança e ação mais efetiva frente aos analisar o presente e desenhar o futuro. Desse
fenômenos encarados na sociedade. A questão modo, cada indivíduo terá maiores oportunida-
da confiança, identificada posteriormente à in- des de planejar o seu futuro e, consequentemen-
tervenção, pode ter sido conquistada pelo conhe- te, terá maiores chances de chegar aos objetivos
cimento adquirido e também pelo coleguismo estipulados. Acredita-se que refletir sobre o futu-
identificado no grupo. Referente a esse contexto, ro profissional, sobre sonhos e metas, pode trazer
Sánchez Vidal (1991) traz o conceito de “comu- maior conhecimento do que é necessário fazer
nidade psicológica”, que confere aos membros para chegar ao objetivo almejado. Isso pode ser
do grupo o sentimento de fazer parte de uma rede percebido e exemplificado com o relato do alu-
de relações de apoio mútuo que pode ser confiá- no E1, que quando questionado com a pergunta
vel e, como resultado, que não experimenta sen- durante a entrevista “Como se imagina daqui a 5
timentos de solidão – que podem impulsionar o anos e 10 anos?”, respondeu:
802 Stachiu, M., Tagliamento, G.

Antes: Com as intervenções sociais realizadas,


daqui a 5 anos... talvez [estarei] em outra o grupo teve a oportunidade de construir uma
empresa, talvez com outro cargo acima já aliança grupal, que encorajou os participantes na
numa empresa... nunca fecho oportunida- busca de seus objetivos. Esse processo facilitou
des né, sempre deixo uma porta aberta para aos sujeitos da pesquisa maior conhecimento so-
futuras conversas, futuras negociações. Da- bre o mercado de trabalho, oportunizando novas
qui a 10 anos... eu me imagino... talvez com formas de pensar a respeito da profissão à qual
a minha própria empresa... é só um pensa- estão inseridos. Os sujeitos puderam analisar sua
mento, porque... tem muita coisa que eu es- situação atual e construir planos futuros para o
tou aprendendo... estou avaliando... que eu desenvolvimento de suas carreiras.
posso mais para frente aprimorar né. Diante disso, observa-se que o processo de
Depois: coaching de carreia em grupo mostrou-se útil, na
Bom, daqui 5 anos eu vou estar começan- medida em que contribuiu, através de ferramen-
do minha empresa... minha intenção é tra- tas específicas, para ampliar o autoconhecimento
balhar com consultoria mesmo né... Talvez dos participantes, bem como para proporcionar
não começando a empresa... mas já traba- conscientização e reflexão sobre os fenômenos
lhar nesse sentido... tenho um projeto de que envolvem uma carreira profissional. Os
abrir uma empresa de Home Car com mi- princípios da psicologia social comunitária, que
nha namorada... daqui a 5 anos já estarão favorece o processo grupal, o autoconhecimen-
todos formados... todo mundo pronto pra to, a conscientização, harmonia e solidariedade
trabalhar né... a ideia é começar isso um dos membros, contribuíram eficazmente com os
pouco antes, logo depois que se formar, co- resultados verificados. Conforme aponta Lane
meçar isso. (1989, p. 81),
Fica claro, no relato desse integrante do gru- a função do grupo é definir papéis e, conse-
po, que com uma maior reflexão sobre a profis- quentemente, a identidade social dos indiví-
são, sobre seu passado, presente e futuro, o plano duos; é garantir a sua produtividade social...
de carreira ganha maior consistência. Analisar a única perspectiva histórica se refere... à
os fenômenos internos e externos amplia a visão história da aprendizagem de cada indivíduo
de realidade e contribui para um efetivo plane- com os outros que constituem o grupo.
jamento, que será concretizado através de ações O papel do psicólogo nas intervenções so-
específicas de cada sujeito. “O êxito de um pro- ciais, bem como na busca de objetivos grupais
jeto depende muito da crença inicial profissional mostra-se de grande relevância. A pesquisa apon-
e das ações mercadológicas que vier a desenvol- tou que atuar com grupos, e neste caso, objeti-
ver” (Minarelli, 2010, p. 199). A intervenção vando o progresso da empregabilidade dos par-
em grupo, portanto, apresentou consequências ticipantes, contribuiu para proporcionar a essa
positivas, que viabilizaram a busca de objetivos comunidade acadêmica maior aprendizagem dos
comuns e partilhados, e que foram acentuados processos de construção de uma carreira e de
através do contato e troca entre os membros do maior conhecimento do mercado de trabalho, isto
grupo. é, possibilitou ampliar o saber do ambiente socio-
cultural onde esses discentes estão inseridos.
Conclusão Os relatos dos membros do grupo mostra-
ram que eles puderam ampliar o autoconheci-
Os relatos apresentados pelos discentes par- mento, intensificar as relações sociais e adquirir
ticipantes desta pesquisa revelaram que, através maior entendimento sobre suas próprias crenças
da intervenção grupal, da troca de experiências e e valores. Os sujeitos pesquisados puderam co-
da relação de colaboração e coleguismo entre os nhecer com maior intensidade o próprio obje-
membros de um grupo, é possível alcançar resul- tivo de vida pessoal e profissional, bem como
tados positivos. puderam perceber os fatores emocionais que
Coaching de Carreira e Psicologia Social Comunitária: Análise de uma Intervenção. 803

poderiam auxiliar e/ou interferir no processo da ching foi realizado pela autora da pesquisa. Su-
carreira, tornando-os agentes transformadores da gere-se que em futuras pesquisas sobre coaching
realidade. de carreira em grupo o processo de coaching
Com relação à metodologia empregada – o seja conduzido por outro profissional para sua
coaching –, cabe ressaltar que os estudos sobre melhor avaliação.
seus resultados ainda são escassos. Conforme
aponta Wolk (2010, p. 2), “o coaching ainda é Referências
uma disciplina incompleta, em pleno processo
Barbier, R. (2007). A pesquisa-ação. Brasília, DF:
de desenvolvimento. Tem limites e tem enormes
Liber Livro.
espaços de possibilidades”. Diante dessas obser-
vações, configura-se que o coaching de carrei- Catalão, J. A., & Penim, A. T. (2009). Ferramentas
de coaching. Lisboa: Lidel.
ra em grupo é um campo de investigação a ser
explorado no âmbito acadêmico, especialmente Downey, M. (2010). Coaching eficaz. São Paulo, SP:
no da psicologia social comunitária, já que pode Cengage Learning.
ser uma ferramenta a ser utilizada por psicólogos Freitas, M. F. Q. (2007). Psicologia na comunidade,
nos processos grupais. psicologia da comunidade e psicologia (social)
comunitária – Práticas da psicologia em comuni-
A psicologia social comunitária visa, assim
dade nas décadas de 60 a 90, no Brasil. In R. H.
como o processo de coaching, ao desenvolvi- F. Campos (Ed.), Psicologia social comunitária:
mento de maior autonomia, conscientização, Da solidariedade à autonomia (13. ed., pp. 54-
escolhas assertivas, planejamento e auxílio nos 79). Petrópolis, RJ: Vozes.
grupos. Góis (1993) sugere que a psicologia co- Góis, C. W. L. (1993). Noções de psicologia comu-
munitária é uma área da psicologia social que nitária. Fortaleza, CE: Editora da Universidade
estuda a atividade do psiquismo que se constrói Federal do Ceará.
através da maneira como as pessoas vivem em Guareschi, P. (1996). Relações comunitárias relações
uma determinada comunidade, abordando suas de dominação. In R. H. F. Campos (Ed.), Psi-
relações e representações, identidade, níveis de cologia social comunitária: Da solidariedade à
consciência e identificações. Busca ressignificar autonomia (11. ed., pp. 81-99). Petrópolis, RJ:
a identidade, fortalecendo o vínculo grupal e o Vozes.
projeto de vida. Desse modo, o estudo do coa- Hill, N. (2008). A Lei do Triunfo: Curso prático em
ching em grupo à luz da psicologia social comu- 16 lições: Ensinando pela primeira vez na histó-
nitária é de relevância para a área. ria do mundo a verdadeira filosofia sobre a qual
repousa todo o triunfo pessoal (30. ed.). Rio de
Os grupos são muito mais do que a soma
Janeiro, RJ: José Olímpio.
de pessoas que o compõem. O espaço grupal é
repleto de sentidos individuais e significados co- Lages, A., & O’Connor, J. (2004). Coaching com
PNL. Rio de Janeiro, RJ: Qualitymark.
letivos. É nesse campo que o psicólogo comu-
nitário deverá dirigir seu olhar, para aquilo que Lane, S. (1989). O processo grupal. In S. Lane & W.
Codo (Eds.), Psicologia social: O homem em
é subjetivo, particular de cada contexto grupal.
movimento (8. ed., pp. 78-83). São Paulo, SP:
Assim, o psicólogo pode ampliar o campo de
Brasiliense.
pesquisas e intervenções da psicologia social co-
Lane, S. (1996). Histórico e Fundamentos da Psico-
munitária e contribuir para uma ação efetiva da
logia Comunitária no Brasil. In R. H. F. Campos
mesma em grupos orientados à carreira. (Ed.), Psicologia social comunitária: Da solida-
Com base nos resultados apresentados, riedade à autonomia (11. ed., pp. 17-34). Petró-
pode-se afirmar que a intervenção de coaching polis, RJ: Vozes.
de carreira no grupo aqui pesquisada ampliou o Lane, S. (2006). O que é psicologia social. São Paulo,
conhecimento dos participantes sobre suas atitu- SP: Brasiliense.
des, escolhas profissionais e responsabilidades.
Marques, J. R., & Carli, E. (2012). Coaching de
Cabe, no entanto, ressaltar que o estudo re- carreira: Construindo profissionais de sucesso.
alizado contém limites, pois o processo de coa- São Paulo, SP: Ser Mais.
804 Stachiu, M., Tagliamento, G.

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