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Resumo: Objetivou-se investigar a percepção dos jovens rurais filhos de famílias associadas
da Cooperativa Agropecuária de Patrocínio (COOPA/MG) sobre o incentivo das instituições
(cooperativa e família) para sua permanência no meio rural e na atividade agropecuária, em um
estudo de caso com cunho qualitativo do tipo exploratório. Os jovens têm interesse em permanecer
no rural e na atividade familiar. Comparando com o estímulo da família, o estímulo da cooperativa
é menor.
Palavras-chave: juventude rural; reprodução social; instituições sociais.
Abstract: This study aimed to investigate the perception of rural young children of families
associated to Patrocínio’s Agricultural Cooperative (COOPA/MG) on encouraging institutions
(cooperative and family) for their stay in the countryside and agricultural activity, in a case study
with qualitative and exploratory nature. Young people are interested in staying in rural and family
activity. Compared to the family stimulus, the stimulation of cooperative is less.
Key words: rural youth; social reproduction; social institutions.
Résumé: Cette étude a visé à étudier la perception des jeunes enfants dans les zones rurale de
familles associés de la Coopérative Agricole de Patrocínio (COOPA/MG) à encourager les institu-
tions (coopératives et de la famille) pour leur séjour dans la campagne et l’activité agricole, dans
une étude de cas avec la nature qualitative et exploratoire. Les jeunes sont intéressés à rester dans
l’activité rurale et familier. Par rapport à la relance de la famille, le stimulus de la coopérative est
moins intéressant.
Mots-clés: jeunes ruraux; reproduction sociale; institutions sociales.
Resumen: Este estudio tiene como objetivo investigar la percepción de los jóvenes rurales hijos de
familias asociadas a la Cooperativa Agropecuária de Patrocínio (COOPA/MG) sobre el incentivo
de las instituciones (cooperativa y familia) para su permanencia en el medio rural y en la actividad
agropecuaria, en un estudio de caso de naturaleza cualitativa y tipo exploratorio. Los jóvenes se
interesan en permanecer en el medio rural y en la actividad familiar. En comparación con el estí-
mulo de la familia, el estímulo de la cooperativa es menor.
Palabras clave: juventud rural; reproducción social; instituciones sociales.
* Este artigo é oriundo da dissertação de mestrado da primeira autora sob orientação da segunda autora.
A dissertação foi defendida em 2015, no Programa de Pós-graduação em Extensão Rural da Universidade
Federal de Viçosa (UFV/MG). A pesquisa teve apoio financeiro do Convênio do Observatório Mineiro
do Cooperativismo, junto com a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais
(SEDE) e do CNPq.
** Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil.
*** Universidade Federal de Viçosa (UFV), Viçosa, Minas Gerais, Brasil.
Estado e instituições para a vida privada, young people and women”1 (FAO, 2012).
como por exemplo, a família. Os autores Inserindo a juventude como agenda prio-
destacam que cada instituição é respon- ritária, a FAO elaborou um mapeamento
sável por um ou mais valor social. das cooperativas que trabalham com e
Souza (2013) considera instituições para os jovens, identificando no Brasil a
sociais tudo o que for indispensável ao Cooperativa Agropecuária Regional de
funcionamento da sociedade, sendo por Palmeira dos Índios Ltda. (CARPIL), no
meio dessa organização que os indivídu- estado de Alagoas.
os se inserem no mundo da linguagem, A FAO define que seja papel das co-
da cultura e da produção. Para a autora, operativas agroalimentares a intermedia-
o fato de as instituições sociais ocidentais ção e promoção dos interesses gerais da
atualmente terem suas bases fundamen- sociedade, como a segurança alimentar,
talmente mantidas pelo predomínio da o combate à fome e à pobreza, a geração
lógica capitalista, faz com que seja ne- de empregos no campo e o desenvolvi-
cessária a existência de complexas insti- mento rural sustentável. Especificamente
tuições formadoras dos sujeitos sociais, em relação aos membros agricultores,
mas elas nem sempre estão em equilí- sua importância na esfera produtiva
brio, ao contrário do que havia proposto reside na oferta de serviços, incluindo
Durkheim. o acesso a mercados, recursos naturais,
Para os interesses deste artigo, im- informação, comunicação, tecnologias,
porta entender conceitualmente as orga- crédito, formação e capacitação, preços
nizações cooperativas como instituições mais baixos para insumos agrícolas (como
sociais. De acordo com Valadares (1999, sementes, fertilizantes e equipamentos) e
p. 17), “a organização cooperativa é um condições de armazenamento. Na esfera
sistema impulsionado por metas indi- política, as cooperativas devem facilitar a
viduais, metas organizacionais e metas participação dos pequenos produtores na
do marco institucional da sociedade em tomada de decisões em todos os níveis,
geral”. No entendimento de Schmidt e apoiá-los na obtenção de direitos de uso
Perius (2003, p. 63), “as cooperativas são da terra e negociar melhores condições
associações autônomas de pessoas que se em contratos agrícolas e preços nos mer-
unem voluntariamente e constituem uma cados locais, nacionais e internacionais ”
empresa, de propriedade comum, para (FAO, 2012).
satisfazer aspirações econômicas, sociais Como exposto por Presno Amodeo
e culturais”. (1999), nos valores sociais que funda-
Segundo a Food and Agriculture mentam as cooperativas, fica evidente
Organization (FAO), as cooperativas estão o compromisso que essas organizações
presentes em países desenvolvidos e em assumem com seus cooperados e também
desenvolvimento e, mundialmente, abar- com a coletividade onde estas se desen-
cam cerca de um bilhão de membros, em volvem. Para a autora, dois princípios
grande parte provenientes do setor agro- recebem destaque: Educação, forma-
alimentar. A importância das cooperati- ção e informação e Preocupação com a
vas agroalimentares foi particularmente Comunidade. Nessa mesma linha, como
reconhecida em 2012, quando a organi- exposto por Freitas e Freitas (2013), em
zação instituiu o Ano Internacional das pesquisa realizada em uma cooperativa
Cooperativas. No âmbito dessa comemo-
ração, a organização considera que “ag-
1
ricultural cooperatives play an important “Cooperativas agrícolas desempenham papel
role in supporting small agricultural pro- importante no apoio a pequenos produtores
agrícolas e a grupos marginalizados, como de
ducers and marginalized groups such as jovens e mulheres” (tradução da revisora).
e capacitação, o que por sua vez oportu- conciliam tal função com as atividades
niza a inserção dos jovens no mercado na unidade produtiva. Ao considerar o
de trabalho com melhor qualificação. No tempo de moradia, os respondentes que
Instituto Federal presente no município residem no meio rural desde que nasce-
são oferecidos os cursos técnicos em ram totalizam 15, sendo apenas um resi-
informática, eletrônica e contabilidade dente há 3 anos – desde que assumiu os
e ainda o Curso Superior em Análise e negócios familiares. Já aqueles que estão
Desenvolvimento de Sistemas. Para o pre- morando na cidade, apenas um nunca
sente estudo observa-se também a oferta morou no campo – esse caso específico
dos cursos superiores de Administração e corresponde a um jovem que residiu 10
Agronegócios na Faculdade de Patrocínio anos fora do país e retornou para assumir
(IESP). a propriedade da família, porém apenas
O município de Patrocínio, de acor- vincula a propriedade à atividade e não
do com dados do último CENSO agro- como local de moradia.
pecuário, apresenta o 3º maior PIB agro- Dos jovens rurais participantes da
pecuário da mesorregião do Triângulo pesquisa, apenas três já são associados da
Mineiro/Alto Paranaíba. Do total de mu- COOPA, os demais justificaram a não as-
nicípios da microrregião de Patrocínio (11 sociação por conseguirem realizar tudo no
municípios), sete são pertencentes à área nome do pai e demonstraram interesse em
de atuação da COOPA. A cooperativa foi se associar futuramente. Quanto ao tra-
fundada em 1961 e atualmente conta com balho, todos se declararam trabalhadores
2.898 cooperados. A produção de leite é o rurais. Aqueles que trabalham somente na
foco da cooperativa, embora ela também propriedade familiar totalizam 15 jovens,
inclua em seus negócios a produção de e um jovem, além de trabalhar na proprie-
café, utilizado para troca em seus estabe- dade familiar, ainda é contratado como
lecimentos comerciais. tratorista em uma propriedade vizinha;
seis filhos de cooperados trabalham na
5 AS PERCEPÇÕES JUVENIS SOBRE COOPA como técnicos de campo ou nas
O INCENTIVO DAS INSTITUIÇÕES lojas agrícolas.
Os jovens pesquisados, em sua
Dos 22 jovens entrevistados, a maioria (77,27%), não estão mais estu-
maioria (63,63%) tem idades que variam dando, porém isso se justifica por já terem
entre 18 e 24 anos. Quanto ao estado civil, concluído o curso superior e estarem tra-
86,36% são solteiros, sendo apenas dois ca- balhando na área de formação. Dez jovens
sados e um em união estável. Em relação possuem formação na área das atividades
ao gênero, a minoria (27,27%) dos jovens desenvolvidas nas propriedades e, destes,
é do sexo feminino. Não se pode afirmar nove possuem ensino superior; cinco são
que o fato de a maioria dos entrevistados formados em áreas administrativas e uma
serem homens signifique uma tendência jovem possui pós-graduação. Dos jovens
à masculinização rural, porque, além de que estão estudando atualmente (cinco),
a amostra ser reduzida considerando a quatro estão cursando agronomia (um
totalidade de jovens da região, o estado deles já é técnico agrícola), e uma jovem
de Minas Gerais e a cidade de Patrocínio iniciou o curso de engenharia civil.
não demonstram tal característica. Ao tratar das percepções desses jo-
Quanto ao local onde residem, vens sobre os estímulos que recebem tanto
72,73% dos jovens moram nas proprie- da cooperativa quanto de suas famílias
dades familiares, sendo que os demais para a permanência na propriedade fami-
residem na cidade, pois, em grande par- liar e, ainda, na atividade já desenvolvida
te, trabalham como técnicos de campo e por seus pais, quase a totalidade dos en-
reuniões, adolescentes, aí vai gos- quatro jovens indicaram que já atuam nas
tando daquela atividade né, eu propriedades como sucessores; os demais
acho que isso tendência a querer afirmaram que nunca conversaram com
permanecer. (JOVEM 17). seus pais sobre esse assunto. No entanto,
Os jovens entrevistados foram ques- entre os filhos de cooperados pesquisados,
tionados também sobre o que a COOPA a maioria (86,36%) dos jovens gostaria de
ainda poderia fazer para incentivar os manter a propriedade e os negócios da
jovens a permanecerem nas atividades já família, considerando sua permanência no
desenvolvidas pelos núcleos familiares. meio rural. Alguns trechos das entrevistas
As respostas indicam uma demanda por exemplificam tal posicionamento:
novas tecnologias que resultem em maior Eu quero continuar aqui, traba-
eficiência e, consequentemente, em maior lhar prá gente é melhor. Minha
rentabilidade: família incentiva, por vontade
deles eu fico aqui sim. Eu até ia
Acho que o que mais tá faltando
prá cidade, trabalhar na Syngen-
agora é curso mesmo, que nem,
ta, mas aí não deu e eu fiquei. Pelo
vai numa reunião é um assunto,
meu pai e pela minha mãe eu fico
trata dele mas aí depois vai na ou-
aqui, eu que cuido do café, das
tra reunião e fala de outra coisa.
coisas aqui. (JOVEM 1).
Se eu quero agora fazer um curso
de inseminação, não tem. Apri- Ah, eu gosto desse meio, eu me
morar as técnicas sempre ajuda o sinto nesse meio. Igual, eu faço
jovem a querer ficar. (JOVEM 9). curso de agronomia porque eu
quero continuar, mesmo que não
Tem que incentivar a pessoa a
for assim na mesma fazenda, mas
enxergar a fazenda com um lugar eu quero continuar. (JOVEM 3).
diferente pra viver, porque quem
vive lá não é mais bobo, nada O que eu tenho de plano é traba-
disso. Tem que enxergar ela como lhar aqui [COOPA] até uma certa
uma empresa rural, até expandir idade e dali então ficar só lá na
mais os negócios, não só leite e propriedade mesmo. (JOVEM 8).
café. (JOVEM 12).
Eu tô fazendo o que eu gosto,
A cooperativa já faz, mas tem que cada dia mais eu aprendo, o que
intensificar de mostrar pro jovem eu aprendi na faculdade eu tô
que é uma atividade rentável, que podendo emprega aqui no meio
se fizer direitinho pode ganhar até rural, aqui em casa na fazenda.
mais que qualquer outro emprego Eu tô colhendo o que eu tô plan-
na cidade. Tem que levar é mui- tando. (JOVEM 9).
to exemplo, mostrar dos jovens
que começaram a tocar a mesma Eu tenho vontade de ficar, mas
atividade do pai, que já tá sendo é mais por amor mesmo, porque
o sucessor do pai e que tá dando é uma pequena propriedade. Eu
muito certo. Porque nesses caso o enxergo que tem como ganhar
filho tá empregando mais tecno- dinheiro mas às vezes acaba
logia que o pai e aí tá tendo mais que é mais fácil enxergar mais
sucesso ainda, isso aí é certo que oportunidade na cidade. Mas eu
incentiva o jovem. (JOVEM 16). queria mesmo era por uma ques-
tão de sucessão. Eu acho que é
Os jovens rurais participantes da um pecado não continuar aquilo
pesquisa também foram indagados se na que o meu pai tem e trabalhou a
propriedade de sua família já foi decidi- vida inteira e meu avô também.
do quem irá suceder aos pais. Somente (JOVEM 12).
de vida, ou seja, desejam um rural onde juventude que esta é uma profissão rentá-
possam construir suas vidas com acesso a vel e, quando aliada à tecnologia, torna-se
tudo o que podem ter em qualquer lugar. uma profissão menos penosa. Levando
Nesse sentido, por mais que a família os em consideração que esses jovens preten-
incentive para que permaneçam nas uni- dem suceder a seus pais, cabe mencionar
dades produtivas, se as instituições pre- que estes, em grande parte, pretendem
sentes no meio rural não oportunizarem fazê-lo mudando a atividade produtiva,
esses acessos, os jovens poderão optar por do leite para o café, por considerarem
sair do meio rural. Nota-se que as deman- que tal atividade exige menor esforço
das juvenis por cursos de capacitação/ físico, podendo ser tecnificada com mais
atualização, possibilidades de expansão facilidade. Daí decorre a necessidade, em
e diversificação dos negócios e tecnolo- futuro breve, de certa flexibilidade e adap-
gias que amenizem o trabalho pesado tação institucional por parte das famílias
e permitam maior lucratividade estão e também da cooperativa quanto a perfil
contempladas, ao menos teoricamente, da atividade econômica.
nas diretrizes que orientam a atuação e Considerando que as cooperativas
o papel das cooperativas no meio rural. têm, em seu princípio básico, atender as
necessidades de seus membros, cabe colo-
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS car que, mesmo o processo sucessório não
sendo de sua responsabilidade, pois é de
Neste artigo, objetivou-se investigar âmbito doméstico e privado, existem me-
a percepção dos jovens rurais filhos de canismos que ela pode utilizar para ameni-
famílias associadas da COOPA sobre o zar tais falhas comunicativas em relação às
incentivo das instituições – cooperativa unidades familiares, principalmente nos
e família – para sua permanência no momentos de reuniões nas comunidades,
meio rural e na atividade agropecuária. quando as famílias, e não apenas os coope-
Observou-se que, embora haja um per- rados, comparecem. As próprias famílias
centual maior de respostas em relação ao cooperadas participantes da pesquisa fo-
apoio familiar, na percepção dos jovens, a calizaram esses momentos coletivos como
cooperativa também é vista como institui- propícios para a abordagem dessa fase de
ção incentivadora. Os jovens da pesquisa transmissão patrimonial.
demonstraram a grande importância em Torna-se fundamental dispor do
sua escolha de permanência, tanto em fato de que a cooperativa está inserida em
função do incentivo familiar, como pelo uma região que oferece oportunidade de
fato de a cooperativa oferecer condições estudos e capacitação para esses jovens,
para melhorias na produção agropecuária. sem que precisem se deslocar, em alguns
Destaca-se que a maioria (86,36%) dos en- casos, nem mesmo de município, fato não
trevistados pretendem continuar nas pro- comum quando se analisa outros contex-
priedades familiares e ainda mantendo a tos de vivência da juventude rural. Os
atividade já desempenhada pela família. jovens participantes, quase em sua totali-
Foi perceptível nas entrevistas com dade, continuam residindo na zona rural
os jovens como a instituição cooperativa e deslocam-se diariamente para a cidade
pode adentrar no auxílio da permanência onde realizam seus estudos, o que possi-
juvenil e facilitar a reprodução social nas bilita vincular a formação com o trabalho
unidades produtivas familiares de seus na unidade de produção familiar. Nesse
associados. Para esses jovens, a coope- aspecto, a COOPA conta com filhos de co-
rativa deveria investir em cursos que os operados com nível de formação superior,
capacitem para continuar as atividades o que deveria ser valorizado como trunfo
dos pais, no sentido de mostrar para a em suas ações futuras. As demandas por
Sobre as autoras:
Amábile Tolio Boessio: Doutoranda em Extensão Rural na Universidade Federal
de Santa Maria (UFSM). Pesquisadora do Observatório da Juventude Rural e do
Observatório Mineiro do Cooperativismo. E-mail: amabiletolio@hotmail.com
Sheila Maria Doula: Docente no Departamento de Economia Rural, Pesquisadora do
Observatório da Juventude Rural e do Observatório Mineiro do Cooperativismo da
Universidade Federal de Viçosa (UFV). E-mail: sheiladoula@gmail.com