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Título do Projeto
Pesquisadores
Daniela Alves de Alves - Doutora em Sociologia (UFRGS); Professora Adjunta
(DCS-UFV)
Victor Luiz Alves Mourão - Doutor em Sociologia (IESP-UERJ); Professor Adjunto
(DCS-UFV)
Resumo:
Este projeto busca olhar para o processo de internacionalização da ciência a partir dos
diversos agentes constituintes de um laboratório. Tendo como embasamento a literatura
produzida no campo da Ciência Tecnologia e Sociedade (CTS), especialmente a teoria ator-rede,
o projeto buscará compreender as relações e os agentes imbricados na formação de uma rede
internacional de pesquisa sobre a Macaúba.
Introdução:
A internacionalização da ciência e da tecnologia (CT) tem sido um tema de extrema
relevância e atualidade no contexto contemporâneo. Multiplicam-se as iniciativas dos países,
institutos de pesquisa e universidades em estabelecer acordos bilaterais ou multilaterais de
cooperação científica e tecnológica, com o objetivo de trocar, compartilhar ou transferir
informações, tecnologias, processos, métodos, resultados de pesquisa. A pesquisa científica tem
sido um lócus privilegiado das relações internacionais no âmbito diplomático em um contexto
em que as universidades e institutos de pesquisa são vistos como alicerces do desenvolvimento
técnico e científico das diferentes nações.
Critérios internacionais de avaliação e validação do conhecimento técnico científico dos
pesquisadores e das revistas têm sido utilizados no Brasil como parâmetro de produtividade e de
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qualidade dos conhecimentos científicos produzidos. Os documentos institucionais das áreas de
conhecimento voltados para a avaliação da pesquisa nacional dão relevância à produção
científica internacionalizada, e as revistas científicas estrangeiras costumam ter uma presença
massiva nos estratos superiores da avaliação QUALIS de periódicos científicos.
A busca pela maior inserção na pesquisa internacional também é influenciada pelo
cenário internacional de busca por soluções conjuntas, embora desiguais, para problemas globais
tais como o impacto poluente crescente do consumo de energia e as mudanças climáticas. Neste
cenário, os grupos e laboratórios voltados para a pesquisa em fontes alternativas de energia são
inseridos na discussão técnica, científica e diplomática internacional em razão do alto grau de
relevância global das temáticas pesquisadas.
No ano de 2017 conduzimos uma pesquisa sobre a internacionalização dos grupos e
laboratórios de pesquisa em bioenergia. Entrevistamos o diretor de relações internacionais da
UFV, e cinco pesquisadores desta área, sendo quatro da UFV e um da UFMG. A proposta é que
aprofundemos o campo de pesquisa ao longo de 2018 ao realizar uma etnografia de um dos
laboratórios mais importantes nesta área em Minas Gerais.
Estamos diante de uma rede extensa de áreas distintas do conhecimento, produzindo em
seus laboratórios dados e fatos tecnocientíficos que já emergem transnacionais, especialmente no
campo dos tratados internacionais e das políticas locais. Há inúmeras agências enredadas nos
fatos tecnocientíficos, que são complexos, híbridos e globais. Esta rede que associa fluxos que
vão do global ao local, das políticas econômicas e científicas até a prática mais cotidiana da
produção do conhecimento, pode ser observada desde dentro do ambiente micro do laboratório,
como fazem os estudos etnográficos de laboratório. Como nos sugere Latour (2000),
consideramos que as fronteiras entre o interior e o exterior são porosas, já que as redes que
sustentam as atividades de pesquisa nos laboratórios se estendem para fora dele, canalizando
deslocamentos de pesquisadores e fatos científicos na trilha das inscrições “externas” e
transversais ao laboratório. Este movimento de deslocamento pela rede sociotécnica
internacional de pesquisa sobre a macaúba, é o aprofundamento a ser realizado neste momento
da do projeto ora proposto.
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Objetivo Geral:
O Objetivo geral do projeto é aprofundar o conhecimento sobre as práticas de formação
de redes sociotécnicas transnacionais de pesquisa em Macaúba sob a perspectiva bioeconômica.
Objetivos Específicos:
1. Analisar as dinâmicas internacionais da produção do conhecimento
científico-tecnológico, nas quais se insere a pesquisa brasileira sobre macaúba a partir do
laboratório etnografado;
2. Discutir teóricamente as concepções de centro e periferia do conhecimento científico;
3. Cartografar e diagramar, Ilustrando as dinâmicas e os processos de formação de redes
internacionais de pesquisa;
4. Etnografar as práticas, procedimentos e experiências subjetivas singulares de um
laboratório de produção do conhecimento em macaúba (rede macaúba de pesquisa
REMAPE).
Justificativa:
Para Latour (1997, p.18) o antropólogo na sua busca pelas relações simbólicas, é atraído
para o estudo das mais diversas tribos, porém se retrai quando se trata de engenheiros, médicos e
ciências duras em geral.
A busca pelo estudo etnográfico de um laboratório se faz necessária na medida em que
podemos melhor compreender, em toda a sua materialidade, os ambientes acadêmicos de
produção do conhecimento. Um laboratório é composto por uma gama de materiais
heterogêneos, tais como pessoas, expertises, equipamentos, instrumentos, documentos,
legislações, recursos financeiros. No entanto, é comum que vários desses agentes fundamentais
na produção do conteúdo científico sejam ignorados na apresentação discursiva e simbólica de
tais espaços acadêmicos. Latour (1997, p. 19) critica este tipo de literatura pois ao excluir a
dimensão social tramada em conjunto com o desenvolver dos fatos tecnológicos esta leitura
coloca a ciência em um patamar inquestionável e não consegue ver as contradições nos processos
de construção científica.
No processo de observação de um laboratório, encontra-se um encantamento inicial, em
que o etnógrafo busca fazer sentido e categorizar a todo momento as relações travadas pelos
diversos elementos que compõe este ambiente científico. Uma abordagem interessante proposta
por STRATHERN (2014, p. 354) para resolver isto é a participação nas relações se assim o
pesquisador for convidado a fazê-lo, as informações devem ser vistas de maneira residual, e o
diário de campo deve descrever os fenômenos ocorridos no momento em que se observa para
que haja uma busca sobre as conexões feitas em um momento ulterior da pesquisa. Não está
evidente para o pesquisador o sentido de todas as ações tomadas e as influências quotidianas do
universo observado, então é necessário voltar às informações no momento da escrita para
compreender o que se está escrevendo. Esta busca metodológica é o que STRATHERN (2014,
p.350) coloca como “momento etnográfico”:
“[…] Poderíamos dizer que o momento etnográfico funciona como exemplo de uma relação que junta o
que é entendido (que é analisado no momento da observação) à necessidade de entender (o que é observado no
momento da análise). É claro que a relação entre o que já foi apreendido e o que parece exigir apreensão é
infinitamente regressiva, isto é, ela desliza por todos os tipos de escala (e, mesmo na escala mais mínima, a
observação e a análise contêm, em cada uma delas, a relação entre as duas). Todo momento etnográfico, que é um
momento de conhecimento ou de discernimento, denota uma relação entre a imersão e o movimento[...]”
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Metodologia:
O presente projeto busca aprofundar resultados de pesquisa em andamento sobre a
produção do conhecimento internacionalizado em bioenergia, em Minas Gerais. Além das
entrevistas a serem realizadas, aprofundaremos a dimensão cotidiana da pesquisa com Macaúba.
O contato prévio com pesquisadores da área permitirá lançarmos mão da etnografia enquanto
ferramenta de estudo da formação da rede de pesquisa e fabricação científica sobre a Macaúba.
A origem da etnografia está em Franz Boas, (1848-1942) e em Bronislaw Malinowski
(1884-1842), que via na vida dos nativos que ele estudava uma lógica própria que precisava ser
descoberta. Foi Malinowski que instituiu a técnica de observação participante, pela qual o
pesquisador deveria passar por um período de imersão e de convivência cotidiana com os nativos
para ter acesso a sua cultura. Para estudar uma sociedade, uma comunidade, é assim necessário
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Notícia veiculada pelo portal CI Florestas: “Macaúba: história do nascimento de uma cultura - Sérgio Y.
Motoike, Antônio P. Nacif e José Mauro V. Paes fazem um balanço do histórico da Macaúba e suas
perspectivas”, disponível em: <http://www.ciflorestas.com.br/conteudo.php?id=7015>
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viver, falar, pensar e sentir com e como os nativos. A influência desta abordagem tem sido, desde
então, bastante relevante, sendo extremamente influente na pesquisa em ciências sociais e, em
particular, no campo dos estudos sociais das ciências (Goldenberg, 1999).
Os estudos de laboratório foram inaugurados na década de 1970 por três estudos
seminais: “Art and artifact in laboratory science: A study of shop work and shop talk in a
research laboratory”, de Michael Lynch; “Laboratory life. The Social Construction of Scientific
Facts”, de Bruno Latour e Steve Woolgar e “Manufacture of Knowledge: An Essay on the
Constructivist and Contextual Nature of Science”, de Karin Knorr-Cetina. Nestas obras, os fatos
científicos foram desnaturalizados, abertos, escrutinados, de tal forma que se pudesse tratar a
ciência de forma simétrica a outras produções simbólicas e materiais da sociedade, tal qual foi
proposto por David Bloor (2010).
No presente projeto, a etnografia consistirá em um acompanhamento presencial das
atividades, descrição e interpretação do que o pesquisador realiza e experimenta no laboratório,
especialmente nas dimensões do fazer científico que estiverem imiscuídas na conformação de
redes internacionais, tais como a troca de dados, de pessoas, de conhecimento e de
reciprocidades, com redes e pessoas de outros países e regiões. A etnografia pressupõe, conforme
colocado por Roberto Cardoso Oliveira (1996), três dimensões: Olhar, Ouvir e Escrever. O Olhar
constitui-se como um processo de refração no qual o pesquisador é capaz de enxergar os
elementos constitutivos do cotidiano pesquisa - em nosso caso, o laboratório - e como moldam as
interações presentes. O Ouvir possibilita um processo de compreensão das relações que os atores
que constituem o campo travam entre si, sendo necessário um ouvir que ultrapasse a relação de
pesquisador/informante, que se limita a apenas apreender a voz dos elementos estudados tal
como se fosse uma aspiração asséptica do conhecimento. O processo de Ouvir os atores em um
laboratório deve alcançar o nível dialógico de compreensão entre os mundos do pesquisador e
dos atores de seu campo de estudo. Por fim o Escrever é onde se materializa o conhecimento
estudado, constituído a partir de uma relação entre o conhecer e o comunicar, onde se descreve e
analisa o que se observou em campo. Trata-se de uma segunda parte do processo de pesquisa,
realizado após a coleta dos dados nos processos de Olhar e Ouvir, possibilitando uma reflexão ou
uma inferência do pensamento do pesquisador sobre a observação participante experienciada.
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Uma das abordagens mais influentes no campo dos estudos sociais de ciência e
tecnologia, é a teoria Ator-rede (TAR no Brasil, ANT - Actor-Network Theory - nos países
anglófonos), desenvolvida por pesquisadores como Bruno Latour e John Law. Um dos conceitos
centrais desta abordagem é o de simetria, trabalhado por Latour & Woolgar (1997, p. 24) no
sentido de nivelar analiticamente a arregimentação de elementos da natureza e da sociedade na
interpretação da construção dos fatos científicos. Latour (2005, 2011) aprofunda a simetria
quando trata como atores da construção social não somente os humanos, mas um coletivo de
híbridos, de humanos e não humanos, que de alguma forma modificam e são modificados no
processo de construção de fatos científicos.
A utilização de representações gráficas nas ciências sociais começa com Deleuze,
Influenciado pela teoria foucaultiana, ele distancia-se da representação cartográfica de senso
geográfico e pensa em como as relações podem ser representadas. PRADO FILHO & TETI
(2013, p.47) mostra que a cartografia deleuziana, busca ao invés de explicitar acidentes e
topografia dos espaços, busca a construção de diagramas dinâmicos, onde se possa verificar as
linhas de poder, os locais de enfrentamento e resistência sob uma perspectiva micropolítica.
Já sob a perspectiva de análise e representação da teoria ANT, o pesquisador
VENTURINI et. al (2012) busca as formas de elaborar o Controversy Mapping proposto por
Latour para representar as controvérsias sociotécnicas de um dado objeto de estudo. A
proposição do mapa não é interventiva, mas antes um produto de compreensão, reflexão e que
busca levar a novos pontos de controvérsias a partir das conexões explicitadas.
A utilização dos gráficos e diagramas para concectar os atores de um laboratório,
busca neste sentido, qualificar as conexões desenvolvidas e as relações de dependência e
articulação entre estes atores. Através da disposição gráfica dos equipamentos, cientistas,
procedimentos e corpo técnico, poderá compreender melhor a formação das caixas pretas e a
constituição do laboratório enquanto um negociador dos diversos interesses que se encontram
nele, como os do mercado, do campo acadêmico nacional e internacional.
Dentro desta perspectiva pode-se analisar a materialidade de um laboratório e o poder de
agência e relação destes diversos elementos tais como as ferramentas, as agências de fomento à
pesquisa, os instrumentos, os pesquisadores, etc, que formam e têm poder de ação sobre a
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produzidos no ocidente através do mundo. Para tal perspectiva, a divisão entre centro e periferia
seria a melhor forma de descrever a produção e a circulação do conhecimento, sendo que alguns
autores destacam o papel relevante da periferia como locus para coleta de dados e campo teste de
hipóteses das teorias centrais. Uma segunda abordagem mencionada pelo autor é a da teoria
pós-colonial, mais forte nos estudos culturais e na literatura do que na sociologia da ciência.
Nessa perspectiva o processo de constituição do saber é determinado pelo centro, devido a
aspectos desiguais que envolvem a colonialidade do poder, que legitima uma dicotomia na
produção do conhecimento, classificando aquela realizada na periferia como “cultural” em
detrimento do conhecimento científico, produzido no centro (cf. Mignolo (2003); Quijano
(2003)).
universidades.
Um dos tipos de redes encontradas no campo é voltada para a extensão tecnológica, na
qual a produção e a difusão do conhecimento está relacionada a uma expertise demandada por
um dos parceiros e concentrada pelo outro. Nesse tipo de redes a prestação de um serviço em
torno de determinado conhecimento é o produto principal.
Um terceiro tipo, a pesquisa internacional com trajetória de mercado, possui aportes mais
substantivos nas suas fontes de financiamento, o que permite uma prática mais sistemática e
planejada, no entanto se encontra vinculada a flutuações de mercado e a práticas protecionistas.
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