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RESUMO
A obra: Metáforas Teológicas de Marx de Enrique Dussel será nosso objeto de análise
aqui4. A adoção e interesse por esta obra deve-se à intenção de provocar a curiosidade para a
temática, dando uma dimensão introdutória à forma sistemática conceitual, na qual Dussel nos
traz desde curiosidades biográficas de Marx, até uma interpretação ímpar do conceito de
fetiche e da concepção de religião de Marx. Neste artigo, temos a intenção de, com Dussel,
sobretudo hoje. Ao contrário dos que afirmam a morte de Marx, Dussel alerta: "Contra lo que
piensa el teólogo polaco, Josef Tischner, Marx no sólo no ha muerto, sino que generará nuevo
impulso al pensar crítico filosófico, económico y aun teológico"5. (DUSSEL, 1993, p.3)
1 Filósofo, ativista social, docente dos cursos de filosofia da UMESP e da FAPCOM. Contato:
hugo.allan@gmail.com
2 Por constituição cultural, nos remetemos ao conceito de Núcleo Ético Mítico do filósofo Paul Ricoeur. Este
núcleo é o que em última instância, significa uma cultura, constitui um ethos, modo de ser de um povo.
3 Estamos em um processo de tradução coletiva para a língua portuguesa da obra: Las Metáforas Teológicas
de Marx, na qual Dussel defende essa tese. Fica este artigo, portanto, como um anúncio-divulgação da
questão e um convite à leitura da obra completa, que em breve estará disponível.
4 Escrevi sobre religião nessa mesma perspectiva, inclusive dando mais detalhes desta posição de Marx,
defendida por Dussel, nos artigos: "Religião como Supraestrutura e como Infraestrutura: como fica a
liberdade de religião" (https://goo.gl/BMNa99) e "O ATEÍSMO DE MARX E DOS PROFETAS:como
negação de fetichismos e afirmação da alteridade, possibilitadoras deRevoluções (ou novidade política)" que
você pode ler em: (https://goo.gl/qt7KlM)
5 Tradução Nossa, doravante apenas TN: "Contra o que pensa o teólogo polaco Josef Tischner, Marx não só
não morreu, como gerará novo impulso ao pensar crítico filosófico, econômico e ainda teológico".
Dussel provoca-nos ao problema central da obra. Muitos marxistas perguntariam:
como assim, novo impulso ao pensamento crítico filosófico e teológico? Este é um problema
na tradição marxista. Não é comum, mas mostraremos adiante que essa estranheza da relação
entre filosofia e teologia deve-se a uma leitura geralmente mal realizada do ateísmo de Marx.
Essa estranheza do horizonte teológico não ocorre com outros autores contemporâneos
a Marx, como Hegel ou Bauer, por exemplo. Aliás é necessário compreender o contexto
religioso em que Marx viveu para compreender o envolvimento direto dele com a teologia e a
religião, para depois, refletirmos sobre as influências deste contexto religioso em sua obra
filosófica.
"profunda renovação espiritual e religiosa" que não pregava a separação, como vários
movimentos que fundaram outras comunidades não mais luteranas, o pietismo queria
católico autoritário reinará este ducado, o que levou o movimento pietista a elaborar uma
teologia contra o poder, contra o Estado e contra o próprio Alexander, considerando-o o anti-
cristo. Uma teologia que se apoiava no Povo de Deus, dos pobres, para a vinda do Reino de
Deus, na terra, a partir de uma práxis pietatis, tomando como referencia a tradição antiga de
Wuerttenberg, antes de ser corrompida tanto pelo luteranismo ortodoxo, quanto pelo duque
católico. Essa teologia, em última instância, negava a ideia de um Deus distante, que
que clamava a libertação de seu povo de toda a dominação 6. Hegel depois trairá esta sua
6 Interessante perceber como o movimento latino americano que iniciou-se na década de 1960 - depois
Africano e Asiático - chamado: Teologia da Libertação, defende teologias, muitas com fundamentação
marxiana, próximas nesse movimento pietista alemão do séc. XVIII, com mesmos conceitos e
fundamentação: Reino de Deus, Povo de Deus, uma teologia para os pobres, uma ideia de Deus presente e
que impulsiona à libertação, etc.
inspiração inicial na defesa que fará do capitalismo. Karl Marx nunca critica este pietismo,
aliás, como mostraremos, participará diretamente dele 7. Este pietismo alemão, foi fundado por
Spener (1635-1705) e tem como principal fundamentações que "A realidade da religião não
consiste em palavras, mas em fatos"8 (Dickey, op. cit. p. 70) e "doutrina sem vida, não é
cristã"(ibid. p. 85).
Tréveris é plenamente influenciada por esta corrente pietista luterana. E Marx tendo
nascido e crescido nela, também recebe essa influência9. Nos textos de Marx haveria uma
estratégia argumentativa implícita qual Dussel conhece em St. Toumin na obra: The Use of
Esquema 1
lógica é muito interessante para o cristianismo e para a luta por libertação, sobretudo para o
marxismo de nossos dias. Como o cristão pode lidar com esta contradição de ser cristão e
de tal maneira que não pareça contraditória com o capital; 4) Interpretando de tal maneira o
Capital, a fim de que não pareça contraditório ao cristianismo, escondendo sua não eticidade.
capitalismo muito presentes hoje. Quais não desenvolverei aqui, mas posso trazer a teologia
da prosperidade, como exemplo, qual afirma que os amados por Deus, prosperam em
dinheiro, riqueza e poder, para isso, devem doar o que têm e Deus os abençoará dando em
dobro. Seria uma mescla das posturas 3 e 4. Ou ainda, alguns exemplos de Smith, Maltus e
Ricardo, como cita Dussel, que têm claramente esta intenção de justificar o capital, omitindo
sua não eticidade, claramente a postura 4 de nosso esquema. Mas por se tratar de um artigo,
aqui não poderei me ater nestes detalhes, apesar de interessantes e muito presentes hoje, além
de nos ajudar a compreender melhor a relevância da preocupação central, qual seja, se há uma
teologia política em Marx e se seu ateísmo não é contrário a toda religião, como se daria a
Marx não desenvolveu um projeto teológico sistemático com começo, meio fim. Não
escreveu uma obra exclusiva de Teologia Política, como fizeram muitos filósofos. Mas contra
a postura 3), Marx teceu um discurso considerável contrário à religião fetichista, mas que
tanto na hegemonia da tradição marxista quanto na tradição anti-marxista, foi tratado como
um discurso contrário à religião (sem mais). Marx é ateu. Mas qual é o seu ateísmo? Dussel
explicitará a natureza deste ateísmo nessa obra, afirmando que não é um ateismo contra toda
religião. É importante adiantarmos aqui que Dussel não concorda com a tese de seu colega
José Porfírio Miranda que em suas obras: "Marx e a Bíblia" e "O Cristianismo de Marx" tenta
Contra a postura 4) Marx dedica toda sua obra, mas sobretudo "O Capital", no qual seu
intento frequente é mostrar que o capital é mais valia acumulada, portanto, não paga, não
ética e que para tentar ocultar esta não eticidade, o capital tenta criar ganância a partir de si
crítica a este caráter fetichista do capital é uma tarefa economico-filosófica à qual Dussel se
dedica no primeiro capítulo de sua obra Metáforas Teológicas de Marx. Percebamos que o
intento de Dussel nesta obra é mostrar que nos Grundrisse e no "O Capital", portanto a obra
O que talvez chame mais à atenção é a premissa menor de nosso esquema 1: "Se o
Capital é o anti-cristo, o demônio visível"... Pode parecer – e essa crítica é recorrente – que
Dussel esteja querendo distorcer o discurso de Marx (Dussel, 1993, p. 17). Mas minha
sim um discurso metafórico que produz um discurso paralelo, intencional, junto ao discurso
econômico-filosófico, uma teologia política metafórica. Isso porque não são apenas metáforas
teológicas soltas, mas porque têm uma lógica. A partir daqui, traremos textos de Marx,
utilizados por Dussel para a defesa desta tese. Lemos nos Grundrisse:
...De sua figura de servo, na qual se manifesta como simples meio de circulação,
converte-se repentinamente em senhor e deus no mundo das mercadorias 12. (Marx,
2013, p.223)
Percebemos nesta citação que Marx utiliza-se de uma metáfora para mostrar o fetiche
do dinheiro, que transforma-se em soberano e deus do mundo das mercadorias. Mas não é só
isso. Grande parte dos marxistas e dos anti-marxistas que entendem Marx como um ateu de
qualquer religião, dificilmente sabem ou sequer desconfiam que Marx está referindo-se nesta
Percebemos aqui como Marx utiliza-se do texto do Novo Testamento para mostrar a
Deus anti-cristão, o anti-cristo. Mas ainda se pode levantar dúvidas sobre esta linha
argumentativa de Dussel, pois poderia ser apenas uma vez que Marx utiliza-se deste recurso.
Não. São várias vezes, e como mencionamos acima, de forma que pareça, de fato, construir
12 Nos chamou à atenção aqui, a diferença crucial nestas duas traduções, por isso, optamos por colocar as duas.
Na que Dussel se utiliza, em espanhol, lemos: "deus do mundo das mercadorias". E na segunda, em
português, deus no mundo das mercadorias. Podería aqui, discorrer sobre possíveis implicações nesta
diferença, mas como não é a intenção, talvez voltemos ao problema em outra oportuniade. Mas fica a dica de
pesquisa. É evidente, contudo, que na edição em português, há uma maior secularização na figura de deus e
na espanhol, uma maior sacralidade da mesma figura. Por acaso?!
La total cosificación, inversión y el absurdo [es] el capital como capital [...], que
rinde interés compuesto, y aparece como un Moloch reclamando el mundo entero
como víctima ofrecida en sacrificio (Opfer) en sus altares. (Karl Marx. Manuscritos
del 61-63, cuaderno XV, folio 893 (Teorías del plusvalor, FCE, México, t. III, 1980,
p. 406; MEGA, 11, 3, p.1460 apud Dussel, 1993, p. 22).
TN: A total coisificação, inversão e o absurdo é o capital como capital [...] que rende
interesse composto e aparece como um Moloch reclamando o mundo inteiro como
vítima oeferecida em sacrifício em seus altares.
Começaria a me repetir se tentasse justificar (com Dussel) as utilizações que Marx faz
artigo uma noção da quantidade de vezes que o faz e a diversidade de analogias (e metáforas)
que realiza e que Dussel retrata no decorrer de sua obra Metáforas Teológicas de Marx,
trazendo algumas curiosidades sobre Marx, das quais mesmo renomados marxistas nada
comentam.
É importante conhecer alguns dados biográficos de Marx que nos ajudam a entender
cristianismo em particular. Aqui não terei esta preocupação, atendo-me em poucos dados
apenas para se ter noção do quão envolvido este foi desde sua juventude e que tal
Na cidade de Tréveris, nasce Marx em 5 de maio de 1818. Sua família paterna Marx-
Levi de tradição rabínica (judia) desde o século XV, sendo seu avô e seu tio Samuel Marx,
rabinos com os quais Karl conviveu em sua infância 14. Entre 1816 e 1817 o pai de Marx, por
13 Dussel publica trabalhos biográficos de Marx em sua obra: Práxis Latinoamericana y Filosofía de la
Liberación.Nueva América: Bogotá, 1983, mas em "metáforas teológicas" o mesmo retoma estes dados e
acrescenta novos, sob a perspectiva do envolvimento de Marx com a religião.
14 Copio aqui, a nota de rodapé de número 6 da página 28 de "Metáforas Teológicas", pois é possível que
tenhamos que tomar contato com elas no desenrolar desta pesquisa: Heinz Monz, Karl Marx. Grundlagen
der Entwicklungzu Leben und Werk, Trier, 1973, p. 222. «Casi todos los rabinos de Tréveris desde el siglo
XVII hasta la emancipación pertenecena la familia del padre de Karl Marx» (p. 215). Véase Arnold Künzli,
Karl Marx. Eine Psychagraphie, Wien, 1966, quien llega a escribir que Marx es «comprensible sólo desde la
configuración del antiguo destino y del mensaje bíblico del judaísmo» (p. 817). Lamadre de Marx, Henriette
Marx (1788-1863), judía originaria de Holanda, también tiene rabinos entre sus familiares. Su nombre de
motivos políticos, batiza-se luterano e pelos mesmos motivos, Karl Marx o faz em 1824. Isso
mesmo, Karl Marx torna-se luterano, aos seis anos, sendo educado numa tradição judeu-
luterana, de influência pietista, numa cultura alemã do iluminismo. De 1830-1835, dos 12 aos
17 anos, Marx estudou no ginásio católico chamado Spee 15. É interessante o dado que dos 32
companheiros de Marx que fizeram o exame de bacherelado no colégio, apenas ele e mais 7
eram luteranos, sendo todos os outros católicos. Dois trabalhos de Marx, nessa época, 1835,
unidade do crente com Cristo segundo João 15,1-4" e "Reflexões de um jovem ao escolher
La misma religión nos enseña que el ideal al que todos aspiran es el de ofrecerse en
sacrificio (geopfert) por la humanidad.[...] Quien elija aquella clase de actividades
en que más pueda hacer en bien de la humanidad, jamás flaqueará ante las cargas
que pueda imponerle, ya que éstas no serán otra cosa que sacrificios (Opfer)
asumidos en interés de todos. Dirigimos nuestro corazón simultáneamente hacia
nuestros hermanos que él (Cristo) une a nosotros y por quienes también se ha
sacrificado (geopfert) [...]. Ese amor de Cristo también hace que guardemos sus
mandamientos, al sacrificarnos (aufopfern) unos por otros. (Hugo Assmann. Karl
Marx-Engels, Sobre la religión, Sígueme, Salamanca, 1974 apud Dussel, 1993, p.
30)
TN: A mesma religião nos ensina que o ideal ao que todos aspiram é o de oferecer-se
em sacrifício pela humanidade [...] Quem escolhe aquela classe de atividades em que
mais possa fazer o bem da humanidade, jamais fraquejará diante das cargas que lhe
podem ser impostas, ja que estas não serão outra coisa que sacrifícios assumidos em
interesses de todos. Dirigimos nosso coração simultaneamente até nossos irmãos que
Cristo une a nós e pelos quais também se sacrificou [...]. Esse amor de Cristo
também faz que guardemos seus mandamentos, ao nos sacrificarmos uns pelos
outros.
Aqui aparece para o Marx de 17 anos, um dos temas centrais do cristianismo: doar-se
pelos outros. Ainda que num vitalismo romântico, o filósofo mostra a importância da vida, na
religião, a vida de Deus na vida dos homens. Até onde Marx não assumiu isso como norma de
vida, dado que sua família chega a passar fome, morrendo seu filho? Mas Marx permaneceu
firme em seu propósito de uma crítica contundente ao Capital, qual nos serve agora, séculos
depois para análise de nossa sociedade, tendo em vista a superação desta economia diabólica e
portanto, a vida de todos.
TN: O jovem que inicia sua carreira na vida [...] O que queremos ser na vida [...] Por
um posto na vida [...] Não sempre podemos escolher na vida [...] Lindos fatos da
vida [...] Em vez de enamorar-se da vida, se alimentam de verdades abstratas [...]
Sim, somos capazes de sacrificar à vida.
A criticidade já está presente nestes textos, bem como a influência do pietismo, mas
não me parece aqui apenas uma influencia teórica, se não, uma paixão, uma defesa destas
ideias. Outro tema recorrente e central na tradição cristã, é o tema da comunidade
(Gemeinschaf), sobre o qual Marx também escreve:
Amaría también a los otros sarmientos porque un jardinero les cuida y una raíz les
da fuerza. Por eso, la unión con Cristo, desde lo profundo y desde la más viva
comunidad (Lebendigsten Gemeinschaft) con él, consiste en que le tenemos en el
corazón y ante los ojos; mientras nos sentimos poseídos del mayor amor a él,
dirigimos nuestro corazón simultáneamente hacia nuestros hermanos que él une a
nosotros. (op. cit. pp. 3-8; MEW, EB 1, pp. 591-594)
TN: Amaria também aos outros sarmentos porque um jardineiro cuida deles e uma
raiz lhes da força. Por isso, a união com Cristo, desde o profundo e desde a mais
viva comunidade com ele, consiste em que o tenhamos no coração e diante dos
olhos; ainda que nos sintamos possuídos do maior amor a ele, dirigimos nosso
coração simultaneamente aos nossos irmãos que ele une a nós.
Aqui está a intuição de uma das categorias fundamentais do pensamento de Marx, qual
provavelmente fora o evento mais triste de sua vida, a morte de seu filho Heinrich Guido:
Es sabido que los señores de Tiro y Cartago no aplacaban la cólera de los dioses
sacrificándose ellos mismos, sino comprando niños a los pobres para arrojarlos a los
brazos ígneos de Moloch. El pobre niño –refiriéndose Marx a su propio hijito
Heinrich Guido, muerto antes de un año en su pobrísimo y frío departamento de dos
habitaciones, en Londres– ha sido un sacrificio (Opfer) a la Misere burguesa.
(Dussel, 1993, p. 34 apud Karl Marx. Grundrisse. p. e. t. II, p. 133; p.199; p. 113)
TN: É sabido que os senhores de Tiro e Cartago não detinham a cólera dos deuses
sacrificando-se eles mesmos, mas comprando crianças dos pobres para atirá-los aos
braços ígneos de Moloch. O pobre menino – referindo-se Marx a seu próprio
filhinho Heinrich Guido, morto antes de um ano em seu pobríssimo e frio
apartamento de dois cômodos, em Londres – foi um sacrifício à miséria burguesa.
Esta metáfora onde considera a sociedade burguesa como Moloch, Marx utiliza várias
vezes, durante toda sua obra, notadamente nos "Grundrisse" e em "O Capital". Aqui Marx
narra que a morte de seu próprio filho, foi um sacrifício ao deus Moloch, à miséria burguesa,
dada sua situação de pobreza o filósofo não conseguiu impedir tal tragédia.
1843-1844. Em Kreuznach, setembro de 1843, Marx escreve uma carta a Ruge, mencionando
que o comunismo é uma abstração dogmática e a religião e a política são suas preocupações
agora, dado que são preocupações da Alemanha de sua época. Apesar disso, mesmo sendo um
texto pré-socialista, muitos tomam-no como definitivo para o ateísmo de Marx, o que segue:
Esquema 1.1
Nesta época toda crítica que Marx faz à religião, o faz à religião como entendia Hegel,
uma religião de dominação, a serviço do Estado, como Cristandade. Desta forma, um cristão
que baseia-se no cristianismo primitivo de Jesus e das comunidades cristãs, nada têm a negar
das objeções que Marx faz, aliás, deve assumi-las como suas. Os níveis II B e III B do
esquema 1.1 ajuda-nos a compreender a questão judia, sobretudo a necessidade da abolição
da religião em geral, tanto do cristianismo, como do judaísmo, mas como manifestações
concretas da essência abstrata. Lembrando que a questão tratada por Marx é o Estado cristão.
Marx não nega a essência absolutamente abstrata da religião, ou seja, a relação da pessoa com
o Absoluto, Nível I e sua possível manifestação concreta, a essencia geral da religião como
libertação, Nível IIa. A abolição da religião, portanto, em "A questão judia" é "abolição de
uma determinação, de uma essencia geral concreta..."(Dussel, 1993, p. 43 apud OF, I, p. 463;
CW, I, p. 146; MEW, 1, p. 347.; p. 466; p. 149; p. 350)
El dinero es el vínculo que me liga a la vida humana, que liga la sociedad (...) Es la
divindad visible (sichtbare) (...) Es la prostituta universal (...es) la fuerza divina en
que radica la esencia genérica alienada (del hombre) (...) Es el Poder enajenado de la
humanidad. (Ibid. p.179;pp.324-325;p.565 apud DUSSEL, 1993, p. 49-50).
TN: O dinheiro é o vínculo que me liga à vida humana, que liga à sociedade (...) É a
divindade visível (...) É a prostituta universal a força divina na qual radica a essencia
genérica alienada do homem (...) É o poder alienado da humanidade.
Aqui, Marx nos dá, segundo o filósofo latino-americano, uma "ideia concreta e exata
do demônio, de satã"(Dussel, p.50). Esta ideia é a oposição ao comunismo, dado que o
comunismo parece abstrato, inalcansável, utópico em demasia, o dinheiro em sua concretude
indiscutível é o que parece dar sentido à vida, uma vez que no modo de produção capitalista
ele permite a realização de todas as necessidades materiais.
Ainda sobre o fetiche da mercadoria, agora na última redação de O Capital, portanto, o
Marx em sua fase de maturidade, lemos:
Una mercancía parece ser una cosa trivial [...]. Su análisis demuestra que es un
objeto endemoniado, rico en sutilezas metafísicas y reticencias teológicas [...]. El
carácter místico de la mercancía no deriva [...] de su valor de uso. (El Capital, I, cap.
1.4 (I/1, p. 87; MEGA, II, 6, p. 102)
TN: Uma mercadoria parece ser uma coisa trivial [...]. Sua analise demonstra que é
um objeto endemoniado, rico em sutilezas metafísicas e reticencias teológicas [...].
O caráter místico da mercadoria não deriva [...] de seu valor de uso.
Marx nos mostra o caráter místico da mercadoria, que não surge de seu valor de uso, é
metafísico, teológico. O capitalismo faz com que a mercadoria, medie a relação entre o
mundo religioso e o mundo econômico.
17 Me refiro ao atual golpe de estado jurídico, parlamentar, midiático sob o qual estamos submetidos, em 2016,
pleno século XXI, um fantoche (Temer) do Capital toma o poder para implantar a atual reforma do
naoliberalismo, no Brasil, intensificando ainda mais nossa dependência política, cultural e econômica.
cristianismo são alguns discursos atualmente pregados nos púlpitos e altares glamourosos de
muitas igrejas e movimentos que se dizem cristãos, mas abandonaram totalmente os
fundamentos do cristianismo, que podemos sintetizar naquele que mais exploramos neste
artigo: dar a vida pelo outro, de sua comunidade. De forma que este pode ser -até hoje, como
era na época de Cristo - o critério para separar o joio do trigo, os verdadeiros cristãos, dos que
se dizem cristãos e não o são.
E por outro lado, contribuir para extirpar preconceitos das esquerdas vigentes, que
ainda longe de entenderem e cumprirem, o que entendo como o fundamental da mensagem
marxista: uni-vos (comunidade) - muito por vaidade, fetiche das instituições (partidos,
movimentos, pautas de luta...) - interpretam erroneamente o ateísmo de Marx e não dialogam
em igualdade com militantes, ativistas, atores sociais religiosos que pretendem superar o
capitalismo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS