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ARTIGO
Maio de 68 - A História
Categoria: Especial
A colonização da Argélia é outro marco. O país norte-africano foi região administrativa da França e
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guerreou pela independência entre 1954 e 1962, com a população muçulmana nativa lutando por sua
soberania política e econômica estimulada pela emancipação da Tunísia e de Marrocos, com a repressão
da França sendo criticada por crimes humanitários comparáveis aos do nazismo: de uma população de 10
milhões de argelinos, cerca de 1 milhão foram mortos e 3 milhões enviados para colônias de
reagrupamento. Isso levou ao surgimento de um gap, um vazio entre figuras de autoridade e estudantes e
trabalhadores; uma visão de nós contra eles que perduraria até a aura de conservadorismo que voltou a
despontar na década de oitenta.
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02/05/2018 Maio de 68 - A História - Artigo - Cineplayers
Filosófica e culturalmente, os primeiros anos do pós-guerra marcaram o mundo além dos eventos
históricos que o cercavam. Vimos a nascente de movimentos modernos em várias artes como o Teatro do
Absurdo, o Teatro Vivo, a Pop-Art, o Op-Art e o Expressionismo Abstrato, o Neorrealismo Italiano. O
francês Jean-Paul Sartre e sua companheira Simone de Beauvoir lançaram a ideia do existencialismo
modernizando o materialismo dialético de Marx após o esvaziamento de sentido provocado pela 2ª Guerra,
lançando a ideia da existência preceder a essência e a vida só ter sentido a partir do significado que nós
produzimos para ela. Paralelo a isso, os EUA viam a nascente do movimento beatnik, que incentivavam
prosa e poesia altamente experimentais apregoando o deslocamento físico e espiritual.
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Interessante salientar nesse sentido que o esvaziamento espiritual dos valores ocidentais da época
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encontraram eco em uma juventude progressivamente questionadora, que passou a experimentar
conceitos como o misticismo oriental, as ideias dos relacionamentos sexuais e afetivos livres e as políticas
de esquerda que estavam à toda após Cuba e China aderirem aos ideais soviéticos; O Livro Vermelho de
Mao Tsé-Tung foi de grande inspiração para a juventude universitária europeia da época, que forneceu
inspiração para os jovens que queriam lutar contra o sistema. Considere-se aí a morte de lideranças
políticas e ativistas que representavam oportunidade de mudança, como John F. Kennedy, Martin Luther
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King e Malcolm X e podemos tirar daí que a juventude “hipponga” e “desbundada”, que deu seu primeiros
acenos na metade dos anos 60 usando drogas diferentes dos habituais álcool e tabaco com o objetivo de • A Chinesa
“liberar a mente” e saindo da casa dos pais, pegando carona e atravessando seus países, já estava bem • A Gaia Ciência
mais consciente e combativa.
Maio de 68 na França veio justamente desse caldeirão onde velhas políticas mostraram sinal de
enfraquecimento. A França perdeu três colônias em questão de anos. Jovens estudantes e trabalhadores
operários paralisaram fábricas e ocuparam escolas, em uma consciência revolucionária que se espalhou
pela população sem barreiras sociais, etárias ou minoritárias. Quando de Gaulle tentou ampliar a ação
policial no bairro Quartier Latin, os protestantes entraram em confronto com a polícia e Paris ardeu em
chamas em um conflito civil que abalou o país. O Gaullismo mostrava sinais de desgaste e, apesar de
conseguir ampliar sua bancada após a dissolução dos conflitos, entrou em sua reta final, com o líder
renunciando em 1969 e vindo a falecer em 1970.
Enquanto isso, o cinema na França passava por uma revolução interna. André Bazin e a revista Cahiers du
Cinema revolucionaram o modo de se enxergar cinema observando em alguns artesãos da indústria como
Charles Chaplin, Alfred Hitchcock e Orson Welles o modo de refinar constantemente obsessões
particulares, lançando a política dos autores. Mais que uma teoria, a ideia era batizada de política por de
fato botar em prática os conceitos discutidos. Daí temos o surgimento do movimento francês Nouvelle
Vague, que aproveitou as ideias dos autores, do neorrealismo e de várias quebras de paradigma narrativos
e dramatúrgicos das outras artes para lançar um cinema livre, que experimentava edição pela primeira
vez em décadas de maneira radical e continham um tom marginalmente heróico e crítico aos valores
franceses antiquados.
Maio de 68 apresentou uma radicalização do cinema francês daquele período especialmente para algumas
figuras, o destaque mais óbvio e ululante sendo encontrado em Jean-Luc Godard, que de certa forma
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02/05/2018 Maio de 68 - A História - Artigo - Cineplayers
previu o caos político da frança com Week-end à Francesa e encenou a nascente do movimento
revolucionário em A Chinesa. Seu último filme do período de ouro veio com seu documentário One Plus
One/Sympathy For The Devil, onde misturou imagens do grupo guerrilho Panteras Negras americanos com
os Rolling Stones criando em estúdio, aliando em filme política com arte. Com desgosto, viu a política dos
autores tornar-se mais uma “marca” que certos diretores criavam para vender seus filmes (o que muito
criticaria em seu parceiro de nouvelle vague François Truffaut) e passou a integrar o grupo de cinema
Dziga Vertov, nome dado em homenagem ao famoso diretor soviético que retratou em inventivos
documentários os primeiros anos pós-revolução russa. O resultado foi Godard se afastando da
popularidade dos primeiros anos e tornando-se progressivamente mais radical; provocativo, seu A Gaia
Ciência foi rejeitado pela televisão local e banido pelo governo francês.
Não apenas Godard foi relevante, é claro. Outras figuras do cinema da França à época e posteriormente,
como Jean Eustache e Philippe Garrel, ajudariam a repensar o que Maio de 68 significou e ainda significa
não só para a população em geral mas para o cinema em si. Alguns embarcaram nas ideias e depois
passaram a ver glamour nos ideais da época, como Bertolucci, mas o que ficou para a posteridade foi a
aliança indissociável, ao menos para aqueles anos, da conscientização social e política da produção
cultural criada e consumida, do estilo como parte indissociável do que o filme quer dizer; do
enfrentamento da montagem tradicional com os jump cuts, das leis tradicionais de decupagem pelo plano
sequência, pela consciência do espectador em estar assistindo o filme, a quebra do ilusionismo e a
revelação do dispositivo, convidando ao espectador assistir criticamente.
Sendo uma narrativa tradicional, Maio de 68 seria o clímax, a eclosão de inúmeros movimentos que foram
nascendo, se concatenando e entrando em convergência. Na História real, deixou vários fantasmas e
memórias que no Dia do Trabalhador de 2018 completam meio século de acontecimento. O Cineplayers
traz, em textos individuais, artigos e análises de obras que mudaram a sétima arte como conhecemos de
um jeito indelével na esperança de retratar um pouco de um período fundamental da história cultural e
política recente. Desejamos uma boa viagem no tempo.
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