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UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL

CAMPUS CHAPECÓ, SC.

GENIVAL DA CRUZ CONRADO SANTOS.

CHAPECÓ MEU MUNDO É AQUI: IDENTIDADES


CULTURAIS E DIFERENÇAS

CHAPECÓ.

2017.2

Trabalho e Conclusão de Curso Ciências Sociais UFFS – Chapecó, SC.


GENIVAL DA CRUZ CONRADO SANTOS

CHAPECÓ MEU MUNDO É AQUI: IDENTIDADES


CULTURAIS E DIFERENÇAS

Trabalho apresentado ao curso de Ciências


Sociais – Licenciatura, como requisito para
obtenção de título de Licenciado em Ciências
Sociais.
Orientador: Professor Dr. Ubiratan G. Vieira

CHAPECÓ.

2017.2

Trabalho de Conclusão de Curso Ciências Sociais UFFS – Chapecó, SC.2017.2


FICHA CATALOGRÁFICA

PROGRAD/DBIB - Divisão de Bibliotecas


Santos, Genival Da Cruz Conrado
Chapecó meu mundo é aqui: Identidades Culturais e
Diferenças/ Genival Da Cruz Conrado Santos. -- 2018.
79 f.
Orientador: Ubiratan Garcia Vieira.
Trabalho de conclusão de curso (graduação) -
Universidade Federal da Fronteira Sul, Curso de Ciências
Sociais Chapecó, SC, 2018.
1. Identidade e Diferença: Do que estamos falando. 2.
Contexto Histórico, formação do município, povos e
etnias. 3. Chapecó: Uma cidade em números. 4. Novos
atores: "Chapecó meu mundo é aqui!". 5. Conclusão. I.
Vieira, Ubiratan Garcia, orient. II. Universidade
Federal da Fronteira Sul. III. Título.
Elaborada pelo sistema de Geração Automática de Ficha de Identificação da Obra pela UFFS
com os dados fornecidos pelo(a) autor(a).

Trabalho de Conclusão de Curso Ciências Sociais UFFS – Chapecó, SC.2017.2


GENIVAL DA CRUZ CONRADO SANTOS

CHAPECÓ MEU MUNDO É AQUI: IDENTIDADES


CULTURAIS E DIFERENÇAS

Trabalho de Conclusão do Curso de Ciências Sociais – Licenciatura, Universidade Federal da


Fronteira Sul – UFFS, apresentado como requisito para obtenção de título Licenciado em
Ciências Sociais
Orientador – Professor Dr. Ubiratan G. Vieira

APROVADO, EM 08/02/2018, PELA BANCA EXAMINADORA:

Professora Dra. Mônica Hass – UFFS

Professor Me. José Rada Neto – UFFS

Professor Dr. Ubiratan G. Vieira(Orientador) - UFFS

Trabalho de Conclusão de Curso Ciências Sociais UFFS – Chapecó, SC.2017.2


DEDICATÓRIA

Dedico esse trabalho as minhas filhas Júlia e Maria Clara e a todos e todas que
estiveram presente nessa caminhada. A todas e todos que fazem do viver uma luta cotidiana
por dias melhores.

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AGRADECIMENTOS

A essa altura da vida agradecer é sempre um problema complexo, pensamos quem


gostaríamos de lembrar, quais foram os que fizeram diferença nessa caminhada e que
possibilitou chegada. Uma chegada que não se alcança sozinho e com mérito individual, mas
que é construída dentro de um processo de significados e disputas. Em fim, a nossa vida
sempre é permeada de pessoas, grupos, organizações, amores, amigos e amigas que estão
sempre nos dando aquela força quando tudo parece não fazer sentido. Quando o cansaço nos
invade e o desânimo nos pegam, lá estão elas e eles sempre a dar aquela palavra que faz-nos
recompor e voltar à luta.
Eu gostaria de fazer um agradecimento aos movimentos sociais Pró-Universidade, sem
a luta e a perseverança desses atores sociais que ousaram sonhar com educação superior como
direito básico de cidadania não seria possível esse momento. Nesse sentido, a minha/nossa
chegada é um processo de construção realizado por várias mãos.
Para que a realização desse trabalho ser materializasse foi importante as sugestões,
orientações e parceria. Nesse sentido, eu gostaria de prestar um enorme agradecimento ao
meu orientador Ubiratan Garcia Vieira pela paciência, orientação, incentivo e, acima de tudo,
pela amizade e consideração que sempre dispensou pelas provocações dentro e fora da sala de
aula, pela postura emancipatória e responsável que sempre dedicou aos trabalhos reflexões
sobre as temáticas sociais fazendo com que nos experimentássemos a reflexão critica.
Agradecer ao meu amigo Anildo de Araújo e toda sua família pelo incentivo e apoio,
sempre acreditando que a educação é o maior legado de um ser humano e através da educação
é possível ser livre. Agradecer aos meus amigos e amigas Renata Daici, Márcia Pappis,
Ricardo Garmus, Marlova Bosetti, Guilherme Siqueira, Taise Staudt, Mariana, Laís, Robson,
Glória, Dalvana, Leydes, Josenildo e tantos outros amigos e amigas que fizeram parte dessa
caminhada tornando a jornada um pouco mais leve.
Eu não poderia deixar de registrar meu agradecimento a todas e todos os professore e
professoras do curso de Ciências Sociais, em especial o professor Vanderlei Smaniotto –
Introdução ao Pensamento Social, primeira fase, suas aulas foram fundamentais para
consolidar minha opção pelo curso – vocês são responsáveis, em grande medida, pelas
transformações em no nosso intelecto através de leituras, debates, reflexões e escrita. Por fim,

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não menos importante, gostaria de agradecer a Patricia Schons, minha querida, obrigado pelo
apoio, incentivo e paciência, sem você e seu apoio, seria bem mais difícil.

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Disparada (Geraldo Vandré e Théo de Barros, 1966)

Prepare o seu coração pras coisas que eu vou contar


Eu venho lá do sertão, eu venho lá do sertão
Eu venho lá do sertão e posso não lhe agradar
Aprendi a dizer não, ver a morte sem chorar
E a morte, o destino, tudo, a morte e o destino, tudo
Estava fora do lugar, eu vivo pra consertar
Na boiada já fui boi, mas um dia me montei
Não por um motivo meu, ou de quem comigo houvesse
Que qualquer querer tivesse, porém por necessidade
Do dono de uma boiada cujo vaqueiro morreu
Boiadeiro muito tempo, laço firme e braço forte
Muito gado, muita gente, pela vida segurei
Seguia como num sonho, e boiadeiro era um rei
Mas o mundo foi rodando nas patas do meu cavalo
E nos sonhos que fui sonhando, as visões se clareando
As visões se clareando, até que um dia acordei
Então não pude seguir valente em lugar tenente
E dono de gado e gente, porque gado a gente marca
Tange, ferra, engorda e mata, mas com gente é diferente
Se você não concordar, não posso me desculpar
Não canto pra enganar, vou pegar minha viola
Vou deixar você de lado, vou cantar noutro lugar
Na boiada já fui boi, boiadeiro já fui rei
Não por mim nem por ninguém, que junto comigo houvesse
Que quisesse ou que pudesse, por qualquer coisa de seu
Por qualquer coisa de seu querer ir mais longe do que eu
Mas o mundo foi rodando nas patas do meu cavalo
Já que um dia montei agora sou cavaleiro
Laço firme e braço forte num reino que não tem rei.

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RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo colocar em debate a problemática sobre a construção e
produção das identidades e das diferenças, na perspectiva do Estudos Culturais, a partir da
reflexão sobre o vídeo institucional comemorativo, “Chapecó meu mundo é aqui”, produzido
pela prefeitura do município de Chapecó-SC. Nesse contexto, buscamos apresentar reflexões
sobre audiovisual considerando como a formação social, cultural e econômica do município
produziram identidades positivas em e na relação com outras identidades consideradas
negativas dentro de um processo de segregação, contestação, oposição e luta. No desenvolver
desse trabalho apresentaremos o percurso dessa construção, de forma rápida, que permita
identificar os processos de produção social das identidades relacionadas à cidade. O nosso
objetivo é alcançar como e porque o passado e o presente estão sendo significado e
ressignificado na formulação do vídeo “Chapecó meu mundo é aqui”, para identificar quais
mudanças ou eventos sucederam para que novos personagens tomassem lugar de destaque na
cena centenária revelando uma cidade multicultural, e quais fatores contribuíram para que
essa representação sociocultural diversa tornasse possível. Portanto a nossa reflexão está
focada na produção das identidades e das diferenças, na perspectiva dos Estudos Culturais,
para compreender como essas novas representações ocupam espaço nesse arcabouço de
preservação das identidades tradicionalmente aceitas e apresentação de novas identidades.

Palavras-Chave: Diferença. Identidades culturais. Estudos culturais e Chapecó.

Trabalho de Conclusão de Curso Ciências Sociais UFFS – Chapecó, SC.2017.2


ABSTRACT

The present work has as objective to put in debate the problematic on the construction and
production of the identities and the differences, from the perspective of the Cultural Studies,
from the reflection on the institutional video commemorative, "Chapecó my world is here",
produced by the city hall of the municipality of Chapecó-SC. In this context, we seek to
present reflections on audiovisual considering how the social, cultural and economic
formation of the municipality produced positive identities in and in relation to other identities
considered negative within a process of segregation, contestation, opposition and struggle. In
the development of this work, we will present the course of this construction, in a fast way,
that allows identifying the processes of social production of identities related to the city. Our
goal is to achieve how and why the past and the present are being meaningalized and re-
signified in the formulation of the video "Chapecó meu mundo é aqui", to identify what
changes or events have occurred in order for new characters to take center stage in the
centennial scene, revealing a multicultural city, and what factors contributed to making this
diverse sociocultural representation possible. Therefore our reflection is focused on the
production of identities and differences, in the perspective of Cultural Studies, to understand
how these new representations occupy space in this framework of preservation of traditionally
accepted identities and presentation of new identities.

Keywords: Difference. Cultural identities. Cultural studies and Chapecó.

Trabalho de Conclusão de Curso Ciências Sociais UFFS – Chapecó, SC.2017.2


LISTA DE SIGLAS

CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior


CMC – Câmara Municipal de Chapecó
DC – Diário Catarinense.
EFAPI – Exposição-feira Agropecuária, Industrial e Comercial de Chapecó
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
LGBT – Lésbicas, Gays, Bissexual e Travestis
LGBTTT – Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros
LGBTTI – Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e pessoas Intersexo
PUC-RIO – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
SECOM – Secretaria de Comunicação
SEGOV – Secretaria de Governo.
SIDR – Seminário Internacional sobre Desenvolvimento Regional

Trabalho de Conclusão de Curso Ciências Sociais UFFS – Chapecó, SC.2017.2


Sumário

1 INTRODUÇÃO........................................................................................................10
2 CAPÍTULO I: Identidade e diferença: Do que estamos falando?.............................16
2.1 Identidade e diferença na perspectiva dos estudos culturais...................................24
3 Capítulo II: contexto histórico, formação do município, povos e etnias...................34
3.1 Contexto histórico-cultural: uma região em disputa...............................................36
3.2 Chapecó hoje: números; diferenças e identidade....................................................44
4 Capítulo III: Novos personagens: “Chapecó meu mundo é aqui!”...........................49
4.1 O vídeo e a centralidade da cultura.........................................................................60
4.2 Visualizações e compartilhamentos: o que temos a dizer........................................65
4.3 Mensagens e retornos..............................................................................................67
5 Conclusão..................................................................................................................71
Referencias....................................................................................................................73

Trabalho de Conclusão de Curso Ciências Sociais UFFS – Chapecó, SC.2017.2


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1 INTRODUÇÃO

A presente monografia pretende colocar em debate como a produção das identidades e


das diferenças na modernidade ou modernidade tardia produz processos de lutas e conflitos
por afirmação de identidades ora deslocada, ora descentradas, ora contestadas para significar
pertencimento. Nesse sentido, identificamos duas dimensões da formação social – diferença e
identidade –, que no nosso intendimento são as principais para construção das arquiteturas
sociopoliticoculturais imergidas nas lutas cotidianas.
Sendo assim, Stuart Hall(2011), leva-nos a refletir como “as identidades modernas
estão sendo “descentradas”, isto é, deslocadas ou fragmentadas”(HALL.2011, p.8). E como a
contemporaneidade tem colocado os sujeitos em constante luta pela afirmação das diferenças
reivindicando determinas diferenças que produzem identidades.
A perspectiva teórica do Estudos Culturais é muito interessante para pensar os
processos de formação e produção das identidades por problematizar temas que são caros para
os movimentos sociais e pela contribuição para o fortalecimento de uma escrita que objetiva
identificar os pontos de conflitos e pertubações sociais na produção social das identidades e
diferenças, sem contudo fechar o raciocínio para os contextos e movimentos das culturas
presentes em cada momento histórico. As reflexões sobre a cultura como central nas relações
de poder são de grande valor acadêmico e prático ao revelar cotidianos de lutas contínuas e
descontinuas dos diversos grupos sociais em movimentos.
A escolha dessa perspectiva teórica, Estudos Culturais, surge no sentido de fazer a
aproximação, ainda que incipiente, sobre o estudo da formação das identidades e produção
das diferenças em relação aos conflitos que permeiam essas lutas, ou seja, suas contradições,
identificações e conflitos. Além disso, muito contribui para o exercício individual da reflexão
sobre as profundas desigualdades que são geradas a partir das diferenças culturais e
identitárias produzindo assim, sentido teórico político e discursivo.
Identidades e diferenças são termos polissêmicos que adquirem sentidos na interação
sociocultural e no descentramento e/ou deslocamento em decorrência de uma “crise de
identidades”(HALL. 2011). Essas crises provocam pertubações ao passo que estão em luta
constante por reconhecimento e afirmação. A nossa intenção é colocar o debate da
“centralidade da cultura”(HALL.1997), como predominante na constituição do sujeito social e
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psicológico, tomando o psicológico, aqui, como as formas que os grupos pensam a “si”
mesmos em e na relação aos e, com os “outros” a partir das relações que são estabelecidas ou
ressignificadas culturalmente.
Nesse contexto de disputas, conflitos e significados o século XXI, é marcado pela
afirmação das diferenças e das identidades étnicos, raciais, culturais, religiosas, sexuais,
gênero, pessoa com deficiência entre outras tantas que reclamam o reconhecimento enquanto
sujeito cultural e social. O descentramento dessas identidades tem provocado o deslocamento
do próprio sujeito da modernidade tardia, exigindo um processo de lutas constate, dinâmica e
diversa pela afirmação das diferenças, até mesmo no interior de cada grupo esses conflitos
não estão superados dado a própria dimensão simbólica e cultural de complexas redes de
significação.
Muitos são os trabalhos que discorrem sobre as questões relativas às identidades e
diferenças nas mais variadas perspectivas teórico-metodológicas para refletir sobres esses
conceitos de forma a explicar a polissemia desses termos e as contribuições explicativas.
Como veremos mais a frente nas áreas da educação, filosofia, sociologia, psicologia e saúde e
etc, esses dois termos assumem importância central no debate. Os trabalhos sobre identidade e
diferença, têm se debruçado sobre a explicação da dinâmica social em relação ao
reconhecimento e o lugar dos grupos e indivíduos nesse complexo de relações culturais de
poder, hierarquizadas e hierarquizantes que produz conflitos e lutas.
Para compreender a sociedade contemporânea e suas plurirrelações culturais e sociais
que permeiam a vida cotidiana faz-se necessário verificar a centralidade da cultura como
geradora de formas simbólicas, poder e diferenciação que produz identidades diversas. É com
a intenção problematizar algumas alternativas explicativas sobre a polissemia dos termos
“Identidade” e “Diferença” no contexto da diversidade cultural e, como esses termos dão
sentido as formas representativas do sujeito num determinado espaço social. O que estamos
propondo é o exercício reflexivo para buscar argumentos que produzam compreensão sobre a
dinâmica desses termos e como as práticas cotidianas produzem e reproduzem sentidos de
afirmação e ou negação.
Para o nosso propósito, os escritos de Stuart Hall, Tomaz Tadeu da Silva, kathryn
Woodward sobre, Identidade e diferença: A perspectiva dos Estudos Culturais(SILVA;
WOODWARD; HALL.2009); A centralidade da cultura (HALL.1997); Identidade cultural na
pós-modernidade(HALL,2011); Da diáspora: cultura e mediações (HALL. 2009), são centrais
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para nossa reflexão. Esses autores debatem sobre os termos e sua influência na produção da
identidade e da diferença no espaço social e sua relação correspondente com a cultura.
Na modernidade, os termos identidade e diferença tem pautado as principais
discussões e lutas por reconhecimento como ponto central das disputas por representações e
poder. A unidade nacional, uma imaginação sobre um tipo único de identidade nos limites do
Estado, não mais consegue silenciar ou esvaziar o complexo de relações identitárias contidas
nas lutas cotidianas. Sendo assim, grupos e indivíduos envolvem-se numa dinâmica por
afirmação, identidade cultural e diferenças que extrapolam as nacionalidades pré-
determinadas.
A nossa intenção, inicialmente, pretendia desenvolver uma investigação mais ampla
envolvendo escolas do ensino médio regular, onde existia a presença de indígenas e não-
indígenas na mesma sala de aula, para compreender como essas identidades eram negociadas
ou disputadas no contexto da diversidade e da educação inclusiva. Mas, com o decorrer dos
dias essa ambição se mostrou-se pouco viável, dado o tempo necessário ser insuficiente e as
condições de pesquisas pouco favoráveis que oportunizou a reorientação do trabalho.
Nesse sentido, mudamos o objeto de estudo e como isso, mas mantemos a nossa
pretensão de buscar identificar a produção da identidade e da diferença na perspectiva da
representação e da apresentação, apresentados na mídia comemorativa, ou seja, um estudo de
caso, para dar um charme sociológico, sobre o centenário chapecoense. O nosso objeto, então,
passou a ser o vídeo institucional realizado para comemorar os 100(cem) anos da cidade de
Chapecó, “Chapecó meu mundo é aqui.” (2017), um vídeo configurado para promoção da
cidade, com personagens de quatro nacionalidades – estadunidense, colombiano, haitiana e
árabe identidades descentradas.
Essa opção surgiu a partir das primeiras orientações sobre o projeto, das discussões
que se apresentavam na cena chapecoense sobre os 100(cem) anos, a tragédia do 29 de
novembro, as manifestações não oficiais entorno das identidades esquecidas reclamando voz e
etc., todo esse caldeirão sendo alimentado com a aproximação da comemoração do
aniversário do centenário da cidade de Chapecó, no dia 25 de agosto de 2017, serviu para que
pudéssemos decidir sobre o artefato a ser usado com análises das diferenças e identidades.
Nesse ambiente de pertubações, comemorações e comoção, optamos por analisar as
identidades culturais e as diferenças a partir deste “artefato”, Vídeo institucional
comemorativo “Chapecó meu mundo é aqui” (2017). Para exercitar a reflexão sobre os
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possíveis desdobramento do vídeo em relação a produção das identidades e das diferenças.


Além disso, colocar em evidência alguns fatores que fugiram do tradicional e se fizeram
presentes no audiovisual, sem querer tirar considerações fechadas ou acabadas, mas, tentar
trazer elementos que permitam identificar a luta cultural por identidade e diferença que
permeiam a vida prática, ora silenciosa, ora agressiva, ora contemplativa mais num contínuo
processo de significados. Para isso precisamos refletir metodologicamente sobre como esses
termos operam produzindo significados para os sujeitos..
O objeto das Ciências Sociais é histórico, dinâmico e está num embate constante entre
o que está dado e o que está porvir,(MINAYO. 2002). Ainda segundo a professora, podemos
compreender que metodologia é o “caminho do pensamento e a prática exercida na
abordagem da realidade”(MINAYO. 2002, p. 16). O nosso trabalho se desenvolve utilizando
como método, “Falando sobre sociedade”(BECKER.1994), que consiste na seleção do
artefato, sua tradução, o papel dos produtores, os elementos padronizados, as interpretações
suscitadas pelo objeto, que elementos dão ao arranjo a lógica apresentada nas representações e
o que se espera dos usuários?
Nesse sentido, as atividades serão estruturadas a partir da pesquisa bibliográfica sobre
os Estudos Culturais, o contexto histórico de formação do município de Chapecó e suas
contradições identitárias, alguns dados estatístico sobre o município, inclusive utilizando
fontes de jornais e redes sociais, pesquisa sobre a recepção do vídeo nas redes sociais,
entrevista semiestruturada e análise do vídeo a partir das indicações de Becker(1994).
No capítulo I, pretendemos explorar questões relacionadas às identidades e diferenças
e como essas duas dimensões da formação social estão em constantes lutas por afirmação e
reconhecimento estabelecendo campo complexo de disputas por respeito aos diferentes
habittus (BOURDIEU. 1989). A perspectiva teórica dos estudos culturais é de grande valia
para cimentar nossas interpretações sobre identidades hegemônicas, transitórias e inacabadas
no contexto do reconhecimento das diferenças (HALL. 2011). Assim, vamos tentar conceituar
de forma contextualizada, as identidades e diferenças na perspectiva dos estudos culturais,
apresentando os autores e alguns tópicos de suas obras para contribuir com a nossa reflexão
sobre, o que é identidade e diferença nesse arcabouço polissêmico que os termos sugerem?
No capítulo II, abordaremos o contexto histórico da formação do município de
Chapecó apresentando um breve resumo sobre como a ideia de ocupação e urbanização
promovida pelo incentivo a imigração estrangeira prioritariamente necessária, tendo os
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europeus a preferência na compra de terras, tida como inóspita, na atribuição de valores


morais positivos e assim desconsiderando os povos autóctones, os caboclos e outras etnias
que aqui encontravam-se. Nesse sentido, esse espaço geográfico estava liberado, podendo ser
imediatamente colonizado. Não temos a intenção de refletir sobre os conflitos por quais
passaram a formação politica do município, mas colocar alguns fatos relevantes que permitam
ao leitor compreender as diferenças e as identidades que vão se estabelecendo num processo
de luta que inclui uns e exclui outros. Para pensar esse contexto, vamos recorrer aos escritos
da Dra. Arlene Renk (2004, 2006), e trazer o encadeamento histórico da formação da cidade
de Chapecó e algumas de suas contradições envolvendo os imigrantes de origem europeus, e
os de dentro, as identidades negadas, na formação da identidade cultural da região, bem como
a formação cultural do município sob a égide da supressão relativa de determinados grupos
em promoção de outros,
No capítulo III, e último, tentaremos trazer análise sobre o vídeo para problematizar a
diversidade e mudança estética de apresentação da cidade centenária. Apresentaremos os
novos atores que compõe a cena da representação dessa centenária Chapecó e buscaremos
apontar as contradições e luta no interior dessa suposta neutralidade receptiva. Ou seja, vamos
analisar o artefato, o vídeo, buscando expor que tipo de linguagem opera para consolidar e
unificar os diferentes sujeitos em torno de uma suposta identidade social, cultural e
hegemônica. O nosso desafio é identificar os diversos modus operandi, contido no vídeo, que
permitam identificar quais ferramentas objetivas e subjetivas são trabalhadas para promover a
identidade do trabalho como identidade unificadora ao mesmo tempo em que a diversidade
cultural é visibilizada e não vista pelos interlocutores.
Na conclusão, por fim, abordaremos como essa perspectiva de cidade aberta às
diferenças, parece se configura num ambiente simultâneo e complexo que liga termos
adversos, tragédia e mercado, para produzir o consenso. A percepção de que a cidade ao se
projetar para o mundo através dos noticiários, houve o encilhamento institucional ao transpor
a tragédia para o negócio, e na sequência para o sentimento de perda que pairava nos cidadãos
e cidadãs e assim, canalizou a comoção interna e externa para gerar oportunidade de negócios
e sentimento pertencimento cultural ressignificado na identidade chapecoense. No decorrer da
abordagem ficará mais explicado qual sentido assume a narrativa, quais fatores determinaram
a mudança na apresentação da cidade e como esses novos atores/personagens e a
17

comunicação institucional se conectam para produzir determinado entendimento


multicultural, sem contudo ameaçar a tradição.
Os fatores econômicos, o sentimento de perda, a comoção social que se abateram
sobre a cidade de Chapecó, após o desastre aéreo, foram determinante para que o órgão de
comunicação institucional – A secretaria municipal de comunicação – percebesse que era
preciso pensar um vídeo que colocasse a cidade em perspectiva mundial, como uma cidade
que tem muito a oferecer, além de acolher pessoas de vários países, também vende para vários
países. Essa narrativa está presente no desenvolvimento do audiovisual. No entanto, por trás
de toda essa multiculturalidade, progresso, crescimento econômico exibidos no vídeo,
percebemos que os atores não tem espaço para expressar suas culturas, além disso as
diferenças são diluídas para dar lugar ao suposto sucesso aberto para todos e a todos. Mas esse
suposto sucesso está assentado na numa imagética oportunidade de trabalho.
O artefato audiovisual comemorativo é parte importante e principal para nossa
reflexão sobre a produção social da Identidade e da Diferença por conter os pressupostos da
formação cultural na contemporaneidade e as complexas relações identitárias que se articulam
para produzir uma narrativa de consenso. O vídeo “Chapecó meu mundo é aqui”(2017), traz
as características de progresso, crescimento e acesso às oportunidades abertas a todas e todos
propondo uma apresentação multicultural e descentrada, ou seja, desloca os atributos das
identidades tradicionalmente aceitas para as novas representações presentes na cidade.
É nesse contexto que o audiovisual estabelece articulação entre o novo e o tradicional
sem romper com as velhas identidades. A nossa proposta é desvelar as multirrelações que
estão apresentadas e invisíveis, em conflitos ou aceitação, negação e afirmação na construção
da identidade chapecoense no debate das diferenças.
18

2 CAPÍTULO I: IDENTIDADE E DIFERENÇA: DO QUE ESTAMOS FALANDO?

O processo de construção das identidades culturais sofreram grandes mudanças ao


longo da história da caminhada humana, vários são os trabalhos acadêmicos que se debruçam
sobre essa temática buscando explicação, entendimento e considerações sobre a formação da
identidade e da diferença. Esses conceitos são debatidos em várias perspectivas sociais,
culturais e econômicas. Assim também como o são nos novos movimentos sociais, de gênero,
feministas, negros, LGBTs e tantos outros que estão em luta por reconhecimento e, luta no
interior do próprio movimento por reconhecimentos de diferenças particularizadas.
Por serem termos polissêmicos e correlacionais, quando atribuídos sentidos
socioculturais, identidade e diferença passaram a ser a palavras de ordem dos movimentos
pela afirmação da diferença e da identidade – identidades negra, indígena, de gênero, surda,
LGBT e muitas outras identidades em luta.
Para nós, identidade e diferença são fundamentais para concepção de sujeito que
estamos falando. Trazemos os argumentos de Stuart Hall, Tomaz Tadeu da silva, Henri
Giroux, Kathryn Woodward, entre outros, par contribuir no debate sobre identidade e
diferença na modernidade e modernidade tardia.
Na perspectiva desses autores(as), como veremos mais a frente, as identidades, hoje,
estão passando por constantes mudanças, dado o contexto de deslocamento e descentramento
dos sujeitos no complexo de relações multiculturais e interculturais. A nossa intenção é
produzir um arcabouço teórico que dê conta de estabelecer algumas fronteiras para os
conceitos de identidade e diferença, visto que esses conceitos são polissêmicos.
Para estabelecer um recorte explicativo sobre como o termo identidade acompanhou o
desenvolvimento histórico usaremos “três concepções de identidade” (HALL. 2011),
necessárias para compreender o deslocamento do termo até a modernidade:
a) do sujeito do iluminismo, b)sujeito sociológico e c) sujeito do pós-moderno. O
sujeito do iluminismo estava baseado na concepção de pessoa humana como um
indivíduo totalmente centrado, unificado, dotado de capacidades de razão, de
consciência e de ação.(…). O centro essencial do eu era a identidade de uma pessoa.
(…) era uma concepção muito “individualista” do sujeito e de sua identidade. O
sujeito sociológico refletia a crescente complexidade do mundo moderno e a
consciência de que este núcleo interior do sujeito não era autônomo e
autossuficiente, mas era formado na relação com “outras pessoas importantes para
ele” que mediavam para o sujeito os valores, sentidos e símbolos – cultura – dos
mundos que ele/ela habitava.(…), nesta concepção, a identidade é formada na
“interação” entre o eu e a sociedade. (…). A identidade, nessa concepção
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sociológica, preenche o espaço entre o “interior” e o “exterior” – entre o mundo


pessoal e o mundo público. (…). a identidade, então, costura, (…), o sujeito a
estrutura. O sujeito pós-moderno, conceptualizado como não tendo uma identidade
fixa, essencial ou permanente. A identidade torna-se uma “celebração móvel”:
formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos
representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam.(HALL.
2011,p.10-13).

Essa citação procura situar nossa reflexão diante dos diversos momentos da construção
da identidade e seu complexo conceito, uma vez que a cada período histórico o sujeito e suas
identidades foram transformando, reclamando novas conceitualizações para pensar novas
identidades que dessem conta da dimensão vivida e histórica do desenvolvimento humano.
Mas, não podemos deixar de chamar a atenção que, identidade e identificação embora a
semântica correlacionem esses termos, eles são conceitos que possuem atribuições distintas e,
que vão se aproximando num complexo de relações culturais e sociais que também não são
fixas e exigem dos grupos dinâmica e luta por significados.
Para Hall(2011): “O processo de identificação, através do qual projetamos em nossas
identidades culturais, tornou-se mais provisório, variável e problemático”(HALL. 2011, p. 12-
13). ou seja a identificação é mais variável, dinâmica e provisória dependendo do projeto e
lutas a que estamos ligados e o número de escolhas possíveis.
Nesse sentido, podemo dizer que as nossas identificações culturais são cambiantes,
mutáveis e deslocadas continuamente num processo de disputas e conflitos. Isso tem impacto
sobre a formação das identidades.
À medida que os sistemas de significação e representação cultural se modificam,
somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de
identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao menos
temporariamente. (HALL. 2011, p.13)

As identidades e identificações passam, então, por complexos deslocamentos e


descentramento para manter-se atualizados diante do cultural e do contexto social que os
interpelam. Sendo assim, podemos dizer, que a formação do nós no olhar do outro tem seu
início desde que somos crianças, na nossa relação com os “processos simbólicos” e a própria
entrada nos vários “processos de representação”. Portanto, podemos inferir que a identidade
forma-se no processo cultural e social. São sempre incompletas e inacabadas, não são algo
nascido com a gente.
As identidades são formadas numa relação inconsciente e alguma coisa imaginada
sobre sua unificação.(HALL.2011; SILVA.2011; HALL.2009). É diante desse processo de
construção que os movimentos sociais reclamam uma identidade que produza identificação
20

com seus membros. Isso também serve para as identidades nacionais que arvoram unificar
seus citadinos numa única identidade, diluindo as diferenças intrínsecas a cada grupo,
pessoas, culturas.
Na modernidade, “as culturas nacionais em que nascemos se constituem em uma das
principais fontes de identidade cultural”(WOODWARD. 2011, p. 47). Essas identidades
nacionais não são de logo apreendidas ou decididas geneticamente, “mas são formadas no
interior de representações” a partir do modo como a brasilidade é representada, “imaginada”,
o mesmo ocorre com as representações de identidade que marcam um lugar, uma região um
município. Por exemplo: “sou chapecoense” que dizer que não sou de outro município, além
disso, tal afirmação vem carregada de simbologia, pertencimento e poder.
Para Michel Foucaut(1979), refletindo sobre a “microfísica do poder”. O poder não
estaria num determinado lugar ou apenas numa determinada instituição, mas estaria presente
em todas as relações sociais e culturais que informam sua natureza de dominação e saberes.
O poder e dominação também foram objeto de estudos da sociologia ao longo de seu
desenvolvimento enquanto ciência social. Max Weber (2000, 2009)foi um dos sociólogos que
debruçou-se sobre os conceitos de poder e dominação para explicar suas possíveis formas.
Poder significa toda probabilidade de impor a própria vontade numa relação social,
mesmo contra a resistência, seja qual for o fundamento dessa. Dominação é a
probabilidade de encontrar obediência a uma ordem de determinado conteúdo, entre
determinadas pessoas indicáveis.(…). O conceito de poder é sociologicamente
amorfo. Todas as qualidades imagináveis de uma pessoa e todas as espécies de
constelações possíveis pode por alguém em condições de impor sua vontade.
(WEBER. 2000 p.33)

Nesse sentido, então, “a identidade é marcada pela diferença”(WOODWARD. 2011, p.


11), as diferenças são formadas em relação ao outro num processo de disputa, poder e
dominação, quase sempre desigual, para dar sustento as identidades preferenciais em
detrimento das outras identidades que permanecem em luta.
Para falar de diferenças é preciso, antes, conceituá-las dentro de certos parâmetros
sociológicos que orientem nossa reflexão sobre o termo. Sendo assim, as identidades podem
apresentar-se com aquilo que visto como a mesma coisa ou como diferença, mas as duas são
distintas e, ao mesmo tempo, interdependentes pois uma está em relação a outra.
A luta pela afirmação da diferença e pelo reconhecimento das identidades podem estar
pautada por elementos materiais, culturais e políticos como forma de dominação, existência,
resistência e reconhecimento.
21

As diferenças são marcadas por meios de atributos que classificam, distanciam,


aproximam e organizam pessoas, grupos e símbolos estabelecendo fronteiras, não fixas, de
identidades. “a diferença é crucial nos processos de produção da identidade,(…) a identidade
não é o oposto da diferença, mas identidade depende da diferença”(WOODWARD. 2011, p.
39-40). A reflexão da autora faz-nos pensar que as diferenças são produzidas num contexto de
relações culturais e sociais. Sendo a diferença algo fundamental para construção e
compreensão da identidade. Identidade e diferença são inseparáveis.
Nesse sentido, o fator econômico, per ipsum, não determina as diferentes maneiras e
formas de sentir, agir, gostar, tocar e olhar, os “gostos de classes e os estilos de
vida”(BOURDIEU; SAINT-MARTIN. 1976), determinam diferenças, mas as diferenças
culturais produzem conflitos e lutas por reconhecimento. Pensando a diferença como
“oposição binária” Woodward (2011):
A diferença pode ser construída negativamente – por meio da exclusão ou
marginalização daquelas pessoas que são definidas como os outros ou forasteiros.
Por outro lado, ela pode ser celebrada como fonte da diversidade, heterogeneidade e
hibridismo sendo vista como enriquecedora: é o caso dos movimentos sociais que
buscam resgatar as identidades dos constrangimentos da norma e celebrar a
diferença (WOODWARD. 2011,p. 50).

A oposição binária pode ser vista na afirmação da diferença em relação ao que o outro
é, define o que o nós somos numa relação de aceitação ou negação. Nós somos pelas
diferenças identificadas no outro numa dinâmica de luta, conflitos e poder.
A pesquisadora deixa explícito que os novos movimentos sociais feministas, negros,
LGBTs e tantos outros que estão em luta social, estão na busca pela afirmação das diferenças
e construção de identidades. A luta por identidades, nesse processo, estão muitas vezes
localizadas em afirmações essencialistas, quando recorrem ao biológico; e não-essencialistas
reivindicando uma história cultural ou comum que possibilite representação(WOODWARD.
2011).
Assim, identidade e representação estão contidos no “circuito da cultura em que o foco
se desloca dos sistemas de representações para a identidades produzidas pelo próprio
sistema”(WOODWARD. 2011, p. 17), ou seja, é a capacidade de atribuir significados aos
símbolos que permite a representação. “Todas as práticas de significação que produzem
significados envolvem relações de poder, incluindo o poder de decidir quem é incluído e
quem é excluído”(WOODWARD. p.18). Pensar identidades nesses lagos de representações e
22

disputas que posicionam os sujeitos e grupos em determinados lugares socioculturais é


ruminar as diferenças contidas nesse processo de oposições que definem as identidades.
Para o sociólogo Tomaz Tadeu Da Silva(2011): “A diferença está em relação de
estreita dependência com a identidade. A forma afirmativa como expressamos nossa
identidade tendem a esconder essa relação” (SILVA. 2011,p. 74). Ora, o encobrimento das
diferenças tem por objetivo criar uma identidade homogênea, amordaçar as diferenças e
estigmatizar grupos num contexto incessante de disputas e reconhecimento, negando aos
identificados como diferentes a afirmação das diferenças.
A identidade ao se autorreferenciar esconde a relação dependente com a diferença,
essa afirmação pode ser verificada nas identidades nacionais e tradicionais, que, ao afirmar ser
de um determinado país, nação, tribo esconde, invisibiliza e neutraliza um complexo de
diferenças existentes nessas afirmações escondendo os conflitos e lutas presentes no interior
dessas afirmações.
Segundo Silva(2011):
A afirmação “sou brasileiro” é parte de uma extensa cadeia de “negações” de
identidades e de diferenças. (…) as afirmações sobre as diferenças só podem ser
compreendidas em sua relação com as afirmações sobre as identidades. (…). Assim
como identidade depende da diferença, a diferença depende de identidade.
Identidade e diferença são, pois, inseparáveis.(SILVA. 2011, p. 75).

Na reflexão acima, podemos entender que a diferença não se dá simplesmente pelo


resultado de um processo “mas como o processo mesmo”(SILVA. 2011,p.76), ou seja, a
própria dinâmica cultural e social operam na construção das identidades e das diferenças
como interdependentes. Elas são partes e unidades das identidades culturais. Assim, “A
identidade e a diferença tem que ser ativamente produzidas. Elas não são criaturas do mundo
natural ou de um mundo transcendental, mas do mundo cultural e social”(SILVA. 2011,p.76).
Ou seja, são construções socioculturais.
Para Stuart Hall(2011), falando sobre “identidade cultural na pós-modernidade”,
aponta como o nacionalismo opera para tornar as diferenças diluídas ou invisíveis para que a
ideia de um único povo possa prosperar legitimando e definindo aspectos unificadores,
materiais e simbólicos. Afirma que:
Devemos ter m mente esses três conceitos, ressonantes daquilo que constitui a
cultura nacional como uma “comunidade imaginada”: as memórias do passado; o
desejo por viver em conjunto; a perpetuação da herança”(…). Não importa o quão
diferentes os seus membros possam ser em termos de gênero, classe ou raça uma
cultura nacional busca unificá-los numa identidade cultural, para representá-los
todos como pertencendo à mesma e grande família nacional. (HALL. 2011,p. 59-60)
23

Assim, identidade cultura nacional é também uma estrutura de “poder” que cria a
verdade sobre qual identidade é válida. “A verdade não existe fora do poder ou sem poder”
(FOUCAULT. 1979, p.12), que busca suprimir ou invisibilizar as diferenças propondo a
unificação cultural nacional como única possibilidade de verdade, baseado no pertencimento
territorial e nas tradições inventadas para simbolizar a unidade de uma “comunidade
imaginada”(ANDERSON. 2008). Dessa forma, produzir o consenso cultural de
pertencimento.
Os símbolos que conformam a cultura não são produzidos em um único evento, mas
perpassam pelas diversas instituições culturais, momentos históricos, educação, religião,
política, heróis, museus, datas comemorativas e economia. Esses espaços e tantos outros são
necessários para consolidar a história dominante e dar sentido a cultura tida como válida.
Além disso, as subjetividades que criam o ideal cultural nacional que atribui valor ao modo de
vida validado, desconsiderando a diversidade cultural num mesmo território impõe única
cultura ou uma cultura unificada. Esses eventos em conjunto ou não, podem ser classificados
como “sistemas simbólicos” que apresentam-se como “estruturas estruturantes” dos modos
operandi (BOURDIEU. 1989, p. 8). Os modos de descrever a cultura e posicionar-se como
integrante dela é produzido no interior das relações de poder e de significados.
As identidades e as diferenças são, portanto, construções socioculturais que estruturam
e são estruturantes das formas de “pensar agir e sentir”(DURKHEIM. 2007). Mas, não são
concretizadas como formas acabadas e definidas uma vez e para sempre, pelo contrário, são
construídas, produzidas e reproduzidas nos contextos de disputas, afirmação e diferença.
Nessa relação de poder que permeia a formação da identidade e da representação
identitária:
A representação é um sistema linguístico e cultural, arbitrário, indeterminado e
estreitamente ligado a relações de poder. É aqui que a representação se liga a
identidade e a diferença. A identidade e a diferença são estritamente dependentes da
representação. É por meio da representação, aqui entendido, que a identidade e a
diferença adquirem sentido.(…). É também por meio da representação que a
identidade e a diferença se ligam a sistema de poder (SILVA. 2011, p. 91).

Por fim, vimos que identidade e diferença estão numa correlação de interdependência
e luta cotidianamente, e que a representação e significação são de suma importância para
construção das identidades e das diferenças. O que estamos tentando argumentar é sobre essa
dinâmica inacabada da identidade e da diferença e as relações culturais que permeiam e
24

arbitram certos modos de identificação que envolvem relações de poder e luta por
reconhecimento, estão sempre e indefinidamente sujeito a negociações.
Nessa perspectiva, buscamos identificar como formas simbólicas e materiais foram
adquirindo corpo para expressar a cultura dominante, unificada, imaginada como válida e inda
lograram êxito quando intentaram transportaram os “estabelecidos” para lugar dos
“outsiders”(ELIAS; SCOTSON. 2000), estigmatizando os primeiros e positivando os recém-
chegados, estabelecendo critérios, símbolos, diferenças e identidades preferenciais e
homogêneas num determinado e continuado período.
A compreensão dessa dinâmica perpassa pela compreensão inicial sobre a formação,
preferencial do território que veio e ser chamado, imaginado Chapecó. A nossa intenção, até
aqui, foi refletir sobre como as diferenças e identidades estão em constantes mudanças na
modernidade e sua relação na vida social. Não pretendemos traçar um perfil histórico sobre os
conceitos de identidade e diferença, mas colocar em evidência como esses conceitos são
polissêmicos e estão imbricados nas relações de poder e contexto histórico, social e cultural.
A luta por reconhecimento tem levantado debates calorosos sobre identidades e
diferenças como instrumentalizadores dos conflitos culturais, sociais e identitários. As
disputas não se encerram no plano sociológico e abstrato do sentido dos termos, mas, pelo
contrário se perpetuam e ressignificam tanto no plano reflexivo como também no ponto de
vista da luta prática cotidiana.
Na perspectiva teórica dos Estudos Culturais, podemos destacar algumas premissas
que podem ser grande valia para compreensão da interdependência entre os diversos
processos sociais de formação de classes e as culturas:
A primeira é que os processos culturais estão intimamente ligados as relações
sociais, especialmente com as relações e formações de classe, com as divisões
sexuais, com a estruturação racial das relações sociais e as opressões de idade, é que
cultura envolve poder, contribuindo para produzir assimetrias nas capacidades dos
indivíduos e dos grupos sociais definir e satisfazer suas necessidades e, a outra é que
a cultura não é um campo autônomo, nem externamente determinado, mas um local
de diferenças e lutas. (JOHNSON et al. 2010, p. 12-13)

Essas premissas serão de grande importância para cimentar nossas interpretações


sobre identidades hegemônicas, transitórias e inacabadas no contexto do reconhecimento das
diferenças, uma vez que esse processo inacabado, dinâmico e inacabado resulta na exclusão
dos outros para tornar o nós incluídos, a partir das valorações culturais que hierarquiza e
define tipos e modos como normas a serem acolhidas e/ou entendidas naturalizadamente.
25

Esses processos culturais envolvem uma gama complexa de relações na luta informada
e não-informada pela própria dinâmica das posições de poder que estabelecem quais lutas são
significativas e significantes, assim definir, ainda que relativamente, os termos em que essa
luta pode ser significada, mas não há controle absoluto sobre os conflitos e contestações sendo
que as dinâmicas desenvolvidas no interior dessas lutas é que vão permitir abalos ou rupturas
significativas coloquem em evidências novas identidades.
O que importa são as rupturas significativas – em que velhas correntes de
pensamentos são rompidas, velhas constelações deslocadas, e elementos novos e
velhos são reagrupados ao redor de uma nova gama de premissas e temas (HALL.
2009, p.123).

O nosso propósito é verificar como as identidades e as diferenças apresentadas num


determinado lugar e momento específico – a comemoração do centenário da cidade de
Chapecó –, a partir do artefato específico – Vídeo “Chapecó meu mundo é aqui!” - as lutas
por afirmação das diferenças estão presentes ou negociadas no contexto da diversidade e na
“economia das trocas simbólicas”(BOURDIEU. 2007), essa trocas não se dão num ambiente
harmônico e passivo, mas, permeado por luta e contestação, afirmação e diferença.
Para compreender como esses conflitos e lutas são costurados para dar sentido ao
tecido social, temos que fazer uma imersão, ainda que passageira, no passado desse lugar
imaginado como Chapecó e rapidamente tornar perceptível, como sua história oficial
produziu histórias positivas para um determinado grupo e estigmatizadas para outros grupos
classificados marginais e inapropriados para cultura dos recém-chegados.
Nesse sentido, e de forma rápida, vamos tentar verificar alguns episódios que vão dar
origem a identidade chapecoense – pensando como identidade chapecoense a identidade
municipal unificada dentro de um arcabouço de interações que conjugam alemães, italianos e
poloneses – e como as relações de poder determinaram e validaram essas identidades
homogenizando-as como positivas e positivadas em detrimento das diferenças e identidades
outras que foram suprimidas ou invisibilizadas, mas, que resistem na luta por reconhecimento.
26

2.1 IDENTIDADE E DIFERENÇA NA PERSPECTIVA DOS ESTUDOS CULTURAIS.

A presente monografia pretende colocar em debate a produção das identidades e das


diferenças na modernidade, sendo essas duas dimensões da formação social – identidade e
diferença – no nosso intendimento, as principais para construção das arquiteturas
sociopoliticoculturais de gênero, raça e classe entre outras tantas diferenças que a luta
cotidiana pode arbitrar, compreendendo que as disputas por identidades culturais vai além das
disputas econômicas ou da técnica.
Para Ademar Bogo(2008): “O poder da técnica é, também, o poder de grupos
econômicos dominantes de planejar e comandar o processo de descaracterização das
categorias clássicas dos trabalhadores, da cultura e da identidade dos povos”(BOGO. 2008, p.
12). Essa afirmação pode jogar luz sobre como os imigrantes europeus foram caracterizados e
identificados como preferencial para tocar o desenvolvimento da região. Entretanto, para
efeito da nossa perspectiva, divergimos um pouco da afirmação de Ademar Bogo, pois
enquanto para ele o econômico determina e é determinante das outras dimensões da vida
social, escapa a apreensão do autor a luta por diferenças que ocorrem no interior da própria
economia e da técnica revelando processos culturais interdependentes.
Para nossa perspectiva, a cultura tem fundamental importância no estabelecimento de
lugares sociais e simbólicos de valor que se estende ao domínio econômico. A nossa hipótese
é de que os processos de disputas que envolvem identidades e diferenças estão na base das
construções das hierarquias culturais e sociais que significam e dão significados ao poderio
econômico. Os Estudos Culturais, por opção teórica, vão cimentar nossas reflexões sobre a
problemática que envolve identidade e diferenças colocando em perspectiva as disputas
culturais por reconhecimento.
Mas “O que é afinal, estudos culturais”(JOHNSON. 2010). Neste texto o autor vai
fazer uma reflexão histórica sobre a importância dos Estudos Culturais e sua relevância para
os estudos da Literatura, Sociologia, Mídia, Comunicação linguística e História. Para ele, os
Estudos Culturais apreendem os temas sobre cultura e sociedade em seguida desdobram em
problemáticas diversas para compreensão da formação das identidades e diferenças.
No contexto de desenvolvimento histórico os Estudos Culturais surgem na Inglaterra
no pós-guerra, com o propósito estabelecer uma nova crítica sobre as obras literárias com os
27

precursores Raymond Williams, “Cultura e sociedade, 1958”; Richard Hoggart “As


utilizações da cultura, 1973”; e em seguida o Stuart Hall, “Da diáspora: identidades e
mediações culturais, 2009”, “A identidade cultural na pós-modernidade, 2011”,entre outras,.
Esses autores são considerados os pais dos Estudos Culturais por fazer reflexões sobre a
cultura e as relações de poder que estão intrinsecamente ligados.
Os Estudos Culturais não estão preocupados, pelo menos centralmente, com o
deslocamento regular e pré-definido da constituição ou na tradição de desdobramentos
intermináveis, nem com a tirania das “rupturas epistemológicas” de correntes de pensamento
ou modelos predeterminados.(HALL.2009). “O que importa são as rupturas significativas em
que velhas correntes de pensamentos são rompidas, velhas constelações são deslocadas e
elementos novos e velhos são reagrupados ao redor de uma nova gama de premissas e
temas”(HALL. 2009, p.123).
Na citação acima já deixa exposto a pretensão dos Estudos Culturais de rompimento
de alguns paradigmas teóricos, reagrupa a contradição presente na relação novo e velho para
compreender os significados. Ou seja, a relação complexa entre história, pensamento e poder
são constitutivos de significados culturais que organizam e modos de sentir e pertencer a
determinadas culturas.
As pesquisas, de Stuart Hall, estão focadas nas mudanças por quais as sociedades pós-
modernas estão sujeitas, localizando suas transformações na relação com a cultura e na
produção das diferenças. Por exemplo, no texto a “Centralidade da cultura”(HALL. 1997), ele
vai localizar o papel central da cultura para constituição social, fazendo um recorte temporal,
a partir da metade do século XX, passando pelas transformações que sucederam até a
chamada globalização. A “centralidade da cultura indica, aqui, a forma como a cultura penetra
em cada recanto da vida social contemporânea, fazendo proliferar ambientes secundários,
mediando tudo”. (HALL. 1997,p.5). As lutas cotidianas por reconhecimento são mediadas por
aspectos culturais.
Em outra relevante reflexão, o autor vai discorrer sobre Identidade Cultural e como
esta vem compondo-se no contexto histórico e seu deslocamento até ao período, denominado
de “Pós-moderno”. Hall argumenta que a modernidade com suas transformações profundas
provocaram uma “Crise de Identidade” que fragmentou o sujeito moderno descentrou-o e
desloco-o. Nesse contexto o pensar sobre si foi também modificado, deslocado ou
descentrado.
28

As sociedades ditas pós-modernas são caracterizadas pela diferença, que podem ser
verificados pelo grande número de novos atores sociais em luta por reconhecimento e
diferenças. As diferenças de posições, visões, antagonismos e consequentemente diferentes
identidades que são produzidas pela dinâmica das relações sociais e culturais são inerentes ao
processo de desenvolvimento social. Essas sociedades não se esfacelam totalmente ao
contestar as velhas identidades, mas se articulam de modo que sua estrutura permanece aberta
a produção de novas identidades.
A discussão sobre sociedade e cultura são objetos dos Estudos Culturais, pois eles
expressam arranjos locucionais complexos que podem ser exploradas a partir das mudanças
contidas nos encadeamentos sociais em todas as suas instâncias e nas relações de poder, assim
como na luta por reconhecimento e diferença.
Para Hall(2011); Anderson(2008) a nação não é apenas uma entidade política, mas,
também uma representação simbólica, nas palavras de Benedict Anderson: “comunidades
imaginadas”(ANDERSON. 2008), ou seja, a nação é composta de símbolos, culturas e
representações podendo gerar sentimentos de lealdade e identidade no pertencimento de uma
determinada nacionalidade unificada é construída dentro de um complexo de identificação ,
diferenças e lutas, com toda polissemia que os termos sugerem.
E por fim, Stuart Hall “Da diáspora, 2009”, são apresentados uma séria de textos que
versam desde o desenvolvimento histórico dos Estudos Culturais, seus limites e alcance
teórico, sua posição política frente as correntes de pensamentos conservadora e determinista, a
importância da cultura para explicação das relações de poder que conformam e são
conformados pelos sujeitos numa relação dialética e complexas nos processos de
diferenciação, afirmação e assim por diante. Essa obra reúne escritos de Hall em diversos
momentos para compreender o papel da cultura na produção das identidades modernas.
Em nosso século, as disputas por reconhecimento, diferenças e identidades
étnicos/raciais/culturais/religiosas/sexuais/gêneros, entre outras tantas, estão progressivamente
presente na dinâmica cotidiana da luta por diversidade. Muitos são os trabalhos que discorrem
sobre identidade e diferença nas mais variadas perspectivas teórico-metodológicas nas áreas
da educação, filosofia, sociologia, psicologia e saúde e etc., com intenção de dar conta de
explicações sobre a polissemia dos termos “identidade” e “diferença”. Além disso, buscar
argumentos que produzam compreensão sobre as dinâmicas desses termos na perspectiva dos
Estudos Culturais.
29

Sendo assim, Stuart Hall(2011), leva-nos a refletir como “as identidades modernas
estão sendo “descentradas”, isto é, deslocadas ou fragmentadas”.(HALL. 2011, p.8). Ou seja,
identidades e diferenças são termos polissêmicos que adquirem sentidos na interação
sociocultural e descentramento e/ou deslocamento mostram como elas dinâmicas e estão em
luta constante.
Nesse sentido, identidade e diferença, por serem termos polissêmicos perpassam pela
construção cultural que dão formas ao corpo social de diferenciação dos sujeitos e seu
pertencimento identitário a um determinado grupo, e que muitas vezes apresentam-se, ao
mesmo tempo, descentrados em suas identidades culturais ao produzir um tipo ideal e
idealizado de identidade.
Para Hall(2011):
Um tipo diferente de mudança estrutural está transformando as sociedades modernas
no final do século XX. Isso está fragmentando as paisagens culturais de classe,
gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade, que, no passado, nos tinham
fornecido sólidas localizações como indivíduos sociais. Estas transformações estão
também mudando nossas identidades pessoais, abalando a ideia que temos de nós
próprios como sujeitos integrados.(HALL. 2011, p.9).

Nesse contexto as disputas por espaço, afirmação cultural e identidades entram em


conflitos, oposições e negociações produzidos pelas diferenças existentes entre o “nós” e os
“outros” como marcação e representação identitária. Em primeiro plano, para criar o círculo
de identificação que permita associação grupal reivindicando reconhecimento e
pertencimento. A professora Kathryn Woodward (2011), escrevendo sobre identidade e
diferença, afirma que:
A identidade é marcada pela diferença, mas parece que algumas diferenças são
vistas como mais importantes que outras, especialmente em lugares particulares e
em momentos particulares(…), identidade envolve reivindicações essencialistas
sobre quem pertence e que não pertence a um determinado grupo identitário nas
quais a identidade é vista como fixa e imutável. Algumas vezes essas reivindicações
estão baseadas na natureza e nas relações de parentesco. (…) A identidade é, na
verdade, relativamente a outras identidades relacional e a diferença é estabelecida
por uma marcação simbólica (WOODWARD. 2011, p.11)

A identidade nacional, nesse contexto, é organizada a partir de símbolos unificados


como essenciais a nacionalidade e a unidade. A marcação simbólica diz respeito aos diversos
símbolos unificadores, tais como, uniforme, a bandeira, as cores que identificam a nação e até
mesmo um tipo de comida vão constituir um sistema representacional da nacionalidade que
atribui sentido geral à nação.
30

A busca por afirmação das diferenças e identidades traz a tona reflexões sobre
igualdade e desigualdade, valorização e desvalorização como oposição binária da construção
social identitária. Pertencer a um determinado grupo é colocar em “si” as marcas simbólicas
que identificam e diferenciam dos outros grupos. “Assim, a construção da identidade é tanto
simbólica quanto social. A luta para afirmar as diferentes identidades têm causas
materiais”(WOODWARD. 2011, p.10). Essas causas materiais podem ser observadas nas
afirmações “eu sou brasileiro!”, “eu sou chapecoense!” que trazem em si uma posição de
nacionalidade e de municipalidade que produz a distinção entre os de fora e portanto com
direitos materiais diferenciados.
A forma coma as identidades adquirem sentido em que todos passam a reconhecer-se
automaticamente como um grupo ou nação produz uma imaginação de conhecer uns aos
outros intimamente sem nunca tê-los conhecidos, por conseguinte as diferenças não são postas
em evidência, pelo contrário, são diluídas. Essas identidades reclamam essências históricas,
podem ser compreendidas pelo que Benedict Anderson(2008), fala sobre “comunidades
imaginadas”.
Para ele:
Nação como uma comunidade política imaginada – e imaginada como sendo
intrinsecamente limitada e, ao mesmo tempo soberana. Ela é limitada por que os
membros das mais minúsculas das nações jamais se conhecerão, encontrarão, ou se
quer ouvirão falar da maioria dos seus companheiros, embora todos tenham em
mente a imagem viva de comunhão entre ele. (…). Na verdade, qualquer
comunidade maior que a aldeia primordial do contato face a face (e talvez mesmo
ela) é imaginada. Imagina-se a nação limitada, porque mesmo a maior delas, que
agregue, digamos, um bilhão de habitantes, possui fronteiras finitas, ainda que
elásticas, para além das quais existem outras nações.(…), ela é imaginada como uma
comunidade porque, independente da desigualdade e da exploração efetiva que
possam existir dentro dela, a nação sempre é concebida como uma profunda
camaradagem horizontal (ANDERSON. 2008, p. 32 – 34).

A nação e o nacionalismo são identificações com forte impacto sobre as identidades e


as diferenças existentes entre sujeitos de um mesmo território, nas diferentes lutas por
afirmação e reconhecimento. Dentro desse espectro, a nacionalidade sobrevive ao complexo
de identidades e diferenças grupais, pois, mesmo com a luta em curso por diferenças o
imaginário da nação é colocado a parte, ele continua ressignificando como ideários pelo qual
se deve lutar e morrer por ele. Diante da encruzilhada pelo reconhecimento surge o
multiculturalismo na perspectiva de uma suposta convivência pacífica entre as diferentes
culturas relativizando as desigualdades e apreensão simbólica em relação ao lugar ocupado
pelas diversas culturas.
31

O multiculturalismo propõe uma política de relativismo cultural colocando todas as


culturas, em tese, em pé de igualdade e com as mesmas possibilidades de afirmação.
Enquanto que a nação é imaginada como um único povo sob os mesmos padrões culturais. O
multiculturalismo reconhece a diversidade cultural, mas, não explora as lutas e conflitos por
identidades existentes no interior da multiculturalidade. Ou seja, a construção da igualdade na
diferença. Porém essa igualdade cultural não se traduz sem conflitos e lutas por afirmação e
reconhecimento das identidades.
A luta por afirmação e reconhecimento das diferenças não estão descoladas das lutas
sociais contra a hegemonia dominante, contra as relações de poder que classifica o que é
permitido e valorizado como identidade universal em detrimento do silenciamento e/ou
neutralidade das diferenças.
Nesse sentido, o pesquisador em Estudos Culturais, Henry A. Giroux (2003), afirma
que:
Nessa versão do multiculturalismo, raça e diferença são neutralizados dentro da
lógica inclusiva, mas homogênea, da assimilação, ou no discurso insensível ao poder
do pluralismo. Despolitizada e domesticada, a cultura agora é limpa e imune a
conflitos e exclusões que constituem seu legado histórico.(GUIROUX. 2003, p.79)

As identidades étnicas, raciais, sexuais, de gênero entre tantas outras reivindicadas no


contexto dos movimentos sociais, são negociadas dentro de arcabouço de outras necessidades
materiais de representação, comunicação e identificação que solicitam aos sujeitos e grupos
apresentar-se com suas características culturalmente construída no processo de disputas que
evidenciam as diferenças. Sendo assim, as identidades culturais chocam-se com a suposta
neutralidade sugestiva do multiculturalismo, mas esse processo de afirmação das diferenças
nunca se apresenta como uma forma acabada de identidade, está em constante movimento.
Para Hall (2011):
A identificação é, pois, um processo de articulação, uma suturação, uma
sobredeterminação, e não subsunção. Há sempre “demasiado” ou “muito pouco” -
uma sobredeterminação ou uma falta, mas nunca um ajuste completo, uma
totalidade. Como todas as práticas de significação, ela está sujeito ao jogo da
différance. (…). Uma vez que , como num processo, a identificação opera por meio
da différance, ela envolve um trabalho discursivo, o fechamento e a marcação de
fronteiras. Para consolidar o processo, ela requer aquilo que é deixado de fora – o
exterior que a constitui”. (HALL. 2011,p.106).

A identificação é adquirida na relação social para costurar a falta ou o demasiado, e


permitir o curso da luta no interior de cada movimento ou grupo. Além disso, a identificação
estabelece limites e articulam discursos para produzir uma certa unidade. Esse processo
32

também pode ser identificado no nacionalismo por estabelecer narrativas identitárias ou o


multiculturalista, ou por sugerir muitas culturas em pé de igualdade, mas a identificação por
ser flexível e inacabada está sujeita a mudanças e ao mesmo tempo o fechamento.
Nesse mesmo sentido, observamos que o pesquisador Tomaz Tadeu da Silva (2011),
falando sobre “A produção social da identidade e diferença. (…) a identidade e a diferença
estão estreitamente associada a sistemas de representação”(SILVA. 2011, p.89). Neste
contexto, coloca em perspectiva os sistemas de representação e o movimento dos grupos.
É no movimento literal, concreto, de grupos em movimentos, por obrigação ou por
opção, ocasionalmente ou constantemente que a teoria cultural contemporânea vai
buscar inspiração para teorizar sobre os processos que tendem a desestabilizar e a
subverter a tendência da identidade à fixação. Diáspora como negros africanos
escravizados, ao colocar em contato diferentes culturas e ao favorecer processos de
miscigenação, (…), forçosamente, transformam, desestabilizam e deslocam as
identidades originais. Da mesma forma, os movimentos migratórios em geral, (…),
nas últimas décadas, (…), favorecem processos que afetam tanto as identidades
subordinadas quanto as hegemônicas. Finalmente,, é a viagem em geral que é
tomada como metáfora de caráter necessariamente móvel da identidade. Embora
menos traumática que a diáspora ou a migração forçada, a viagem obriga quem viaja
a sentir-se “estrangeiro” posicionando-o, ainda que temporariamente, como o
“outro”. (…). Na viagem, podemos experimentar, ainda que de forma limitada, as
delicias – e as inseguranças – da instabilidade e da precariedade da identidade
(SILVA. 2011, p.88).

É com o propósito de investigar, na perspectiva do Estudos Culturais, como o jogo de


différance, com tendência ao fechamento influencia e/ou determina as relações sociais na
formação das identidades, considerando o espaço da cidade de Chapecó e sua formação
étnicas, culturais e afirmação das diferenças a partir de uma solicitação de igualdade que une
sujeitos diferentes em torno de um passado que impulsiona e condicionando o presente, pelo
resgate da primazia do trabalho como representação social de um povo.
Nesse sentido, “Chapecó meu mundo é aqui!”(2017), vídeo comemorativo dos 100
anos de emancipação política da cidade, expressa a multiplicidade de culturas que transitam
e/ou estão vivendo na cidade. Essas culturas compõe o imaginário da diversidade cultural do
município? O mundo do “outro”, o estrangeiro, pode ser construído e imaginado nesse mundo
que já existe? Mas quem decide quem é estrangeiro, numa sociedade que autoafirma-se
descendentes de estrangeiros? Em Chapecó, SC, segundo a propaganda dos 100 anos de
emancipação política, todos tem oportunidades materiais advindas do trabalho. E quanto as
oportunidades culturais e simbólicas? O município, nesse contexto, está aberto as diferenças e
as culturas diversas sob quais padrões de valoração cultural?
33

Nessa perspectiva, tentaremos investigar a formação e a representação identitária que


constitui o processo de criação, custo, financiamento, concepção, atores e usuários envolvidos
nesse mundo chamado Chapecó. E em consequência buscaremos identificar o “jogo” de
“identidades” e “negociação” das “diferenças” que se processam na temática comemorativa.
Ao desenvolver esse trabalho teórico buscando problematizar como as identidades e as
diferenças são negociadas na constituição de determinadas essências identitárias, do tipo: “eu
sou alemão”, “eu sou italiano”, “eu sou caboclo”, “eu sou brasileiro” e etc. Essas afirmações
se dão na e em relação ao campo de luta por reconhecimento das diferenças.
Na medida que afirmamos quem somos, também estamos afirmando quem não somos
e assim por diante. Sendo assim as identidades perpassam pela relação entre o “eu” e o
“outro”. As identidades sociais (GOFFMAN. 2013), e, culturais (HALL. 2011), exprimem
determinados atributos que esperamos de determinados grupos ou indivíduos, construídos
dentro de arcabouços de aproximação ou distanciamento enquadrados nas relações sociais e
cotidianas que validamos ou não.
Para Ervin Goffman(2013):
A sociedade estabelece os meios de categorizar as pessoas e o total de atributos
considerados comuns e naturais para os membros de cada uma dessas categorias. Os
ambientes sociais estabelecem as categorias de pessoas que tem probabilidade de
serem neles encontrados. As rotinas de relação social em ambientes estabelecidos
nos permitem um relacionamento com “outras pessoas” previstas sem atenção ou
reflexão particular.(GOFFMAN. 2013, p. 11-12).

A reflexão de Goffman enriquece o espírito ao identificar que o que executamos para


nos diferenciar nós dos outros, fazemos mediados por prejulgamento que são organizados
historicamente e na relação interpessoal cotidiana, mas, também na produção da identidade
social (SILVA. 2011); (HALL. 2011,2009); (WOODWARD. 2011); (GUIROUX. 2003).
Identidade e diferença são necessários para concepção de sujeito pertencente a um
determinado grupo que interage na vida social. Em nossa limitada visão, podemo dizer que
esses dois são articuláveis e inseparáveis na construção e apropriação da cultura e no
posicionamento dos sujeitos no interior do processo de distribuição de bens culturais.
Nesse caminhar a passos largos, vamos tentar verificar alguns episódios que vão dar
origem a identidade chapecoense – pensando como identidade chapecoense a identidade
municipal unificada em torno de seus símbolos – e como as relações de poder determinaram e
validaram essas identidades homogenizando-as, em detrimento das diferenças e identidades
34

outras que foram suprimidas ou invisibilizadas, mas que resistem e continuam colocando suas
representações e revindicando reconhecimento.
Para conhecermos um pouco desse movimento precisamos conhecer as “Narrativas da
diferença”(RENK. 2004), que se fizeram presente nessa luta pela “produção social da
identidade e da diferença”(SILVA. 2011), suas nuanças e contradições ao longo da história ou
das histórias que significaram a construção imaginada de Chapecó. Narrar as diferenças é
escamotear identidades invisíveis, as identidades dominantes e desvelar as lutas daí
decorrentes. É colocar em perspectiva como a construção do consenso dentro do dissenso
produz unidade.
Neste trabalho a antropóloga, Arlene Renk(2004), vai colocar em debate como etnias e
identidades foram mobilizados para construção e produção social de uma identidade
hegemônica como única alternativa, deixando no abismo as identidades autóctones. Em
seguida, ainda neste capítulo, buscaremos apresentar como a identidade chapecoense é
construída em oposição aos estabelecidos caboclos e povos tradicionais numa sacralização do
trabalho racionalizado e a demonização dos trabalhos considerados não-regrados dos povos
tradicionais e caboclos.
Algumas perguntas servem de orientação para nossa reflexão: Como se deu a
construção da identidade hegemônica como unificadora da representação chapecoense? Quais
condições objetivas e subjetivas foram mobilizadas para “suturar” essas identidades? Quais
atributos foram significados para produzir inferioridade versos superioridade que separa o
“eu” do “outro”? Como a esse outro foi negado o pertencimento histórico-cultural? Como a
identidade camponesa é transmutada para o colono e quais suas implicações e diferenças?
Essa volta ao passado, ainda que rápida, é necessário para podermos dar continuidade
a reflexão sobre a problemática da identidade e a diferença no contexto atual. Não
pretendemos esgotar a discussão sobre a formação das identidades e das diferenças que
permearam e permeiam a luta social por significados até os dias de hoje, mas pretendemos
problematizar como as mudanças de contextos, seja por um acidente de grande magnitude,
seja por uma projeção mundial, seja por novos atores presente na cena municipal, seja por um
novo símbolo unitário, seja por opções econômicas fazem com que algumas diferenças sejam
evidenciadas e colocadas em perspectiva positiva, sem, com tudo, reconhecer o passado
histórico e das contribuições dos povos tradicionais e caboclos, mas abrindo caminho para um
novo estrangeiro enquadrado no modelo de diversidade globalizada.
35

O nosso objetivo, é pensar como as identidades culturais vão sendo reconfiguradas no


contexto da cidade de Chapecó e suas possíveis negociações.
A Chapecó do progresso e do desenvolvimento está, mais que patente na representação
audiovisual, desenrolando-se como uma cidade da diversidade étnica e cultural, mas os
primeiros habitantes ainda estão invisíveis dentro dessa cidade multicultural. Um novo tipo
preferencial de imigrante parece tomar a cena e dar significado ao fazer-se chapecoense.
A ribalta chapecoense é alterada, mais uma vez, por evento de grande magnitude, - A
queda do avião em 29/11/2017 –, o perecimento dos jogadores do time “ A Chapecoense” e
sua delegação em terras colombianas, fez as cidades Chapecó, SC e Medelim, Col.
irmanarem em sentimentos de consternação e relações comerciais.
É diante desse contexto que esperamos demostrar quais fatores determinaram a
mudança na apresentação da cidade e como esses novos atores foram ligados a uma produção
audiovisual, pela comunicação institucional, para positivar a apresentação da cidade.
Em nossa conclusão, temos a pretensão de problematizar quais fatores contribuíram
com essa opção de apresentar uma cidade aberta às diferenças, que em um primeiro momento
parece ser em virtude da tragédia e do mercado funcionando como liame de representações. A
percepção de que a cidade ao se projetar para o mundo através dos noticiários e da comoção
generalizada permitiu o encilhamento institucional ao transpor a solidariedade em decorrência
da tragédia para o negócio demonstra a habilidade dos órgãos institucionais de promoção da
cidade para o mundo. O sentimento de perda que pairava nos cidadãos e cidadãs chapecoenses
e não-chapecoenses pelo mundo afora, canalizou comoção interna e externa para gerar
oportunidade de negócios. Essa afirmação ficará mais compreendida no decorrer da narrativa.
36

3 CAPÍTULO II: CONTEXTO HISTÓRICO, FORMAÇÃO DO MUNICÍPIO,


POVOS E ETNIAS

Neste capítulo, abordaremos o contexto histórico da formação do município de


Chapecó-SC, apresentando um breve resumo sobre como o a ideia de ocupação e urbanização
promovida pelo incentivo à imigração estrangeira, preferencialmente europeia, se fez presente
no enquadramento positivo cultural e tecnicamente elegendo-as etnias superiores em agravo,
neglicenciamento e silenciamento dos povos nativos, tidos como incapazes de promoverem o
desenvolvimento e a “racionalização do trabalho”(WEBER. 2000, 2009), tendo a apropriação
e compra de terras, qualificada como inóspita, como ponto fundamental e, motor para o
projeto colonizador.
Ao classificar as terras como inóspita e autorizar ocupação por colonos estrangeiros
(RENK. 2004), o Estado brasileiro promoveu o holocausto que se abateu sobre esses povos,
caboclos e indígenas, durante o processo de europeização desse espaço geográfico, uma vez
que caracterizada como terras desabitadas estariam abertas aos futuros donos exercer todo
tipo de violência para garantir a posse e impor suas culturas.
A presença dos povos autóctones, os caboclos, indígenas e outras etnias que aqui
encontravam-se foram desconsideradas ou ignoradas pelo projeto colonizador. Assim,
podendo ser imediatamente retirados ou colocados às margens da colonização preferencial.
Na visão ideal e idealizada de desenvolvimento, esses sujeitos foram considerados incapazes
não portadoras de características de progresso e desenvolvimento culturais esperados. Como
veremos a seguir, tais motivações tinham sentidos simbólicos e culturais.
Não temos a intenção de refletir sobre os conflitos e lutas por quais passaram a
formação político-administrativa do município, mas colocar alguns fatos relevantes que
permitam ao leitor compreender como as diferenças e identidades, aqui, vão se estabelecendo
num processo de luta e negociação contínua e desigual, consciente ou inconsciente que inclui
uns e exclui outros e, que essa dinâmica ainda está presente, um século depois de imaginada a
comunidade chapecoense.
Para pensar esse contexto, os escritos da Dra. Arlene Renk (2004): “Narrativas da
diferença”, vai colocar em debate como as etnias, identidades e diferenças foram mobilizados
discursiva e violentamente para construção e produção social de uma identidade hegemônica
37

que desse conta dos sentidos atribuídos ao projeto colonizador de desenvolvimento e


progresso.
Em seguida, ainda neste capítulo, buscaremos apresentar como a identidade
chapecoense unificada e homogenia, foi arbitrada e introjetada pelos de “origem” - italianos,
alemães e poloneses –, em oposição aos estabelecidos caboclos e povos tradicionais numa
sacralização do trabalho racionalizado e demonização do trabalho tradicional e dos povos
originários(indígenas), caboclos e brasileiros.
Algumas perguntas servem de orientação para nossa reflexão: Como se deu a
construção da identidade hegemônica como unificadora da representação chapecoense? Quais
condições objetivas e subjetivas foram mobilizadas para “suturar” (HALL. 2011) essas
identidades? Quais atributos foram significados para produzir inferioridade e superioridade
que separa o “eu” do “outro”? Como a esse outro foi negado o pertencimento histórico-
cultural? Como as identidades e diferenças são construídas e/ou negociadas?
Assim, pretendemos explorar a problemática relacionadas às identidades e diferenças
para tentar colocar em evidência as questões acima citadas. Para aproximar o conflito
existente nessas duas dimensões da formação social – identidade e diferença –, e identificar os
processos que estão em constante luta por afirmação e reconhecimento, precisamos partir
algumas premissas que orientem nosso argumento e estabeleça relação com o que
pretendemos alcançar.
Para que esse processo de substituição da forma de ocupação da terra lograsse êxito
foi necessário a produção do sentimento de superioridade nos imigrantes e o reagrupamento
de novas premissas que estabelecesse o que é, e, o que não é cultura nessa perspectiva de
colonização preferencial dos de origem, unificada na identidade de colono, por um lado e
expulsão e negação das culturas já existentes de outro lado.
Aos colonos de origem(RENK. 2004), foram atribuídos adjetivos positivos em relação
aos habitantes antigos e os imigrantes indesejados – os chamados de brasileiros. Mesmo com
uma relação identitária de “brasileiros”, os mercadores – assim eram percebidos -, que aqui
transitavam não era atribuído a eles o símbolo do desenvolvimento, outrossim aos imigrantes
europeu de origem. Nesse enquadramento dos preferenciais, a escolha não se deu apenas pela
natureza do trabalho, mas pela origem dos futuros donatários trabalhadores do mundo
desenvolvido europeu.
38

Na contemporaneidade, “a natureza reguladora da cultura e o seu poder de circular


mercadorias, disciplinar discursos e regular corpos sugerem que o sistema nervoso da vida
cotidiana não será mais encontrado no simples funcionamento e na demonstração do poder
industrial bruto”(GIROUX, 2003, p. 17), correlacionam nesse mesmo espaço e são
invisibilizados ou desconsiderados os povos étnicos como os caboclos, os povos tradicionais,
os afrodescendentes; e mais recentemente, a imigração haitiana e senegalesa como formadora
das diferenças e identidades culturais. Aqui cabe um parêntese – haitianos e senegaleses,
colombianos e americanos fazem parte do novo contexto migratório. A eles são atribuídos a
necessidade e realização pelo trabalho.

3.1 CONTEXTO HISTÓRICO-CULTURAL: UMA REGIÃO EM DISPUTA.

A cidade de Chapecó-SC, foi emancipada, Imaginada, politica e juridicamente em


agosto de 1917, enquanto emancipação politica com limites definidos, identidades
orientadamente em construção e negação das diferenças que provocava e ainda provoca
conflitos por reconhecimento das identidades negadas secularmente.
A cidade nasce envolta a dois contextos de guerras que vai além de suas fronteiras. 1).
Da luta por demarcação territorial, pós-Guerra do Contestado (1912-1916) - movimento
qualificado como messiânico e caboclo, que teve como pano de fundo a disputa de fronteiras
entre Santa Catarina e Paraná(QUEIROZ,1981) e 2). A Primeira Grande Guerra, também
estava em curso nesse período histórico (1914 – 1918), outro evento que marcara o ambiente
de hostilidade por qual passava o mundo europeu.
Embora a etnia alemã e italiana tenham grande relevância na colonização orientada
dessa região, no período da Primeira Guerra Mundial a Alemanha era estigmatizada como
inimigo do mundo, inimigo da nação, conforme artigo de Lívia Pires(2015). Mesmo assim, o
estigma não pesou sobre o europeu de origem quando a opção pela colonização da região foi
arbitrada e selecionadas como o novo povo para integra, colonizar e desenvolver essa região.
Em primeiro lugar, para a ossa compreensão, precisamos conceituar região e nação,
para que possamos acompanhar a construção teórica que pretendemos estabelecer. No
39

primeiro momento abordaremos como a invenção da região Oeste se ligou a ideia de nação e
nacionalismo para dar sentido a essa comunidade imaginada.
Para a antropóloga: “Nação, que consiste de um sistema de representação cultural, é
uma comunidade simbólica com poder para gerar um sentimento de identidade e
lealdade”(SCHWARZ, apud RENK, 2004,p. 11), de posse desse atributo é que o Estado
brasileiro logrou integrar os de origem a nação.
É nesse contexto de nação como uma a “comunidade imaginada e
limitada”(ANDERSON,2008),que a antropóloga Arlene Renk(2004), vai definindo o termo
região para pensar as multirrelações que se entrelaçam nessa organização territorial e
formação cultural das identidades. Embora região seja uma parte territorial com
características e atributos culturais e simbólicos distintos das características imaginadas do
nacionalismo esses termos se aproximam ao exprimir uma certa unidade nacional e certo
valor simbólico e prático de pertencimento. Isto é “no sentido clássico, os nacionalismos
regionais foram absorvidos em favor de uma cultura nacional, ou seja, encompassados pelo
teto político da nação.(GELINNER, 1983 apud RENK, 2004, p.11).
Ainda pensando numa tradução do conceito de região, temos uma grande variedade de
reflexões sobre a pluralidade desta noção conceitual, mas, para nossa compreensão, podemos
considerar o seguinte: “conceito de região passam pela consideração da região – enquanto
fração do espaço geográfico catalisadora de determinadas relações e convenções – como um
ator social fundamental na transformação de comunidades regionais e locais”(CUNHA. 2000,
p. 53). Essa conceitualização amplia nossos horizontes de sentido em relação a região ao
incluir limites e representações num processo articulado ao pertencimento de nacionalidade.
A formação territorial dessa região, enquanto conceito explicativo e social, foi
concebida a partir do final do século XIX, e sob o pressuposto “de vazio demográfico”
(RENK, 2004, p. 16), ignorando as populações aqui existentes e fomentando a colonização
estrangeira, preferencialmente de origem europeia. Esse encadeamento se deu num ambiente
de luta e resistência que permanece até os dias de hoje.
Nesse contexto, os povos originários foram reduzidos e/ou catequizados, expulsos ou
empurrados de seus locais tradicionais para dar lugar aos novos moradores e ao suposto
progresso da região.
Essa região, incluindo o que veio se chamar de cidade de Chapecó, estava envolvida
em disputas e conflitos regionais limítrofes internos e externos. As pendengas territoriais com
40

o estado do Paraná e com o país vizinho, a Argentina estavam no centro destas disputas. É
possível inferir que a arbitragem de “lugar vazio” tinha por pano de fundo negar, também, a
presença de outros povos não-nacionais aqui presentes e assim reclamar os limites territoriais
para o Brasil. A Argentina, devido a sua proximidade e as relações comerciais que eram
estabelecidos entre os Chamados brasileiros era mais presente por aqui do que o Estado
brasileiro, isso tornava essa fração de terra um território em disputa.
É na tentativa de incorporar essa fração de terras, em disputa, como parte do território
brasileiro que se declara que é preciso ocupar o espaço vazio. E nesse processo os povos
originários e os caboclos, que viviam embrenhados nas matas, foram considerados
“insubordinados” incivilizados pelas “autoridades”(RENK. 2004). Aqui havia muitos ervais,
os caboclos foram acusados de estarem “destruindo os ervais com poda fora de
época”(RENK. 2004p.17; 2006, p. 39) isso era como um atestado de incompetência para o
progresso e, ao mesmo tempo, a negação da identidade desse povo.
Essa região após ser …
Incorporada fisicamente ao Brasil (1895), passa pela disputa interna entre o Paraná e
Santa Catarina, resultando na Guerra do Contestado, (1912 - 1916). Após o acordo
dos limites, em 1917, Santa Catarina, de posse da área, região, anteriormente em
litígio, assegurou sua incorporação através da criação de quatro municípios: Mafra,
Porto União, Cruzeiro(atual Joaçaba) e Chapecó,”(RENK. 2004, p.18).

Esse contexto já permite inferir o grau de complexidade que envolveu a construção da


identidade de Chapecó e quanto de lutas e conflitos giravam em torno da produção social da
identidade e da diferença.
Diante da necessidade de colonização rápida que as terras foram entregues para que
empresas colonizadoras a repartisse em pequenos lotes destinados a venda para imigrantes
europeus “colonos” “para o preenchimento do suposto vazio demográfico”(RENK. 2004,
p.19). Assim, caboclos e índios foram reduzidos ao silêncio. O colono aqui é colocado em
perspectiva positiva em relação ao camponês, segundo a antropóloga:
O termo colono surge como expressão de identidade camponesa, o termo foi
atribuído pelas leis e regulamentos que nortearam a política de colonização desde a
implementação no século XIX. Acabou se transformando numa identidade assumido
pelos indivíduos que classificavam, igualmente associado a imigração europeia.
(SEYFERTH. 1993, apud RENK. 2004,p. 19)

A citação acima demonstra que a identidade é estimulada de fora para dentro,


absorvida e positivada pelos grupos imigrantes europeus de países diferentes – Alemanha,
Polônia e Itália – mas unificados pela identidade “colono” de origem, aqueles predestinados a
41

levar a cabo projeto colonizador com desenvolvimento e progresso para região. Essa
possibilidade de identidade positiva de colono, vai adquirir sentido de pequeno proprietário de
terra em “oposição/substituição ao termo camponês”(RENK. 2004, p.19), identificados como
o atrasado e pouco preocupados com a racionalização do tempo. Nesse complexo de relações
identitárias:
As narrativas da colonização, são por excelência, demarcadoras de tempos entre os
indígenas, a população brasileira e os colonos de origem. Maior visibilidade foi dado
ao discurso colonizador. Este assumiu o papel de encompassador de modo a
pretender ser a narrativa e não uma das narrativas possíveis.(RENK. 2004, p.20)

Esse processo de transmutação do camponês para o colono explicita a opção do


Governo catarinense pelos imigrantes alemães, italianos em detrimento da migração interna.
Essa opção não está descolada das transformações socioculturais por qual estava passando a
sociedade brasileiro do rente pós-abolição formal do trabalho escravo(1888). E ainda havia
como objetivo ideologizado sob os pilares, além da pequena propriedade, do branqueamento
da raça e na vocação agrícola do país. No outro lado, o que motiva os europeus a
desembarcarem por estas terras eram a realização social e “a busca da fartura, da liberdade e
da obtenção de terras”(RENK. 2004,p.21).
Os imigrantes aqui chegados eram classificados de colonos e o pequeno produtor
agrícola brasileiro era chamado de camponês. Assim, temos duas categorias que assumem
sentidos diferentes para conferir identidades diferentes, local e temporal de valoração e
desvaloração imersos num processo de legitimação de uns e negação de outros, essa oposição
de negação que significam as desigualdades nas lutas por diferenças e afirmação. Enquanto o
primeiro era a representação do desenvolvimento do progresso, o segundo era atribuído um
sentido de atrasado, incivilizado. Essas oposições vão determinar identidades dominantes e
homogêneas e legitimas portadoras das características necessárias para que o processo
colonizador possa desempenhar sua função de limpeza e ocupação
Benedict Anderson (2008), faz-nos refletir sobre o que são “comunidades
imaginadas”, onde são implantadas a ideia de nação como um conjunto de bens materiais e
simbólicos que universalizam características, saberes e fazeres para determinar um povo. Por
outro lado, a imigração europeia obteve, inicialmente, o privilégio de incorporar a nação, mas
manter uma identidade que permitisse está ligados às origens e assim diferenciar e sobrepor as
outras identidades a partir de uma narrativa positivada e estimulada.
42

Essa identidade e diferença ainda é reivindicada até os dias de hoje pelos descendentes
de europeus, o que, nesse contexto “presume-se que a identidade cultural seja fixada no
nascimento, seja parte da natureza, impressa através do parentesco e da linhagem de
genes…”(HALL, 2009, p.28). Ora, como expressamos acima, a identidade é construída na
dinâmica social e na diferença, esse tipo identidade que não abre mão do cordão umbilical
pode ser compreendido como uma “tradição” que mantém “sua fidelidade às origens”
(HALL,2009,p. 29), e ainda pode ser conceituada como uma identidade essencialista que
atribui determinadas características ao pertencimento biológico, mesmo distante de suas terras
de nascimento.
A afirmação da identidade de origem, embora seja anacrônico dado o deslocamento do
tempo/espaço, no contexto que estamos narrando, há uma relação de poder e construção de
uma identidade a partir de uma noção de estrangeiro europeu unificado e homogêneo. Por isso
a identidade de origem, italiana, polonesa e alemã, soam como imutáveis à dinâmica social.
Esse sentimento de pertença identitária com o lugar de origem consolidou a separação entre
os daqui e os recém-chegados. “Aos olhos dos colonos, a caboclização era um descenso
social”.(RENK. 2004, p.21), ou seja, diante da afirmação de superioridade, a mistura é
negativamente aceita por julgar o outro inferior, indigno. Esses fatores, além de produzir
segregação e classificação, produzem também as hierarquias culturais, privilégios e controle
dos bens materiais.
Podemos entender que formação da identidade, alemã e italiana, que perdurou, nos
últimos 100(cem) anos, em Chapecó, logrou invisibilizar, silenciar e negar formalmente as
diferenças e as outras identidades em luta por reconhecimento. Mas o processo de formação
da identidade e da diferença não pode ser obstruído por formalidades disciplinares ou legais
de uma vez por todas. A produção da identidade e da diferença é forjada na luta cotidiana,
embora sejam silenciadas ou abafadas encontram formas de significar a existência.
No século XXI, essa dinâmica de afirmação das diferenças estão cada vez mais
latente. A tônica dos novos movimentos sociais é luta pela diferença. Isso nos remete a pensar
sobre como as identidades dão sentido às diferenças nesse contexto de mudanças culturais,
econômicas e sociais tão rápidas, deslocamentos e descentramento de identidade.
A identidade, tal como a diferença é uma relação social. Isso significa que sua
definição está sujeita a vetores de força e relações de poder. Elas não são
simplesmente definidas; elas são imposta. Elas não convivem harmoniosamente,
lado a lado, num campo sem hierarquias; elas são disputadas (SILVA. 2011,p.81).
43

As disputas pelas identidades e diferenças não cessam com a conquista do território ou


a aceitação legal, pois, os campos de batalhas continuam em constante mudanças pela própria
dinâmica da modernidade. Os caminhos que cada grupo traça para possibilitar a afirmação da
identidade é permeado de idas e vindas, negociações, negações e arbitragens. “Podemos dizer
que onde existe diferenciação – ou seja, identidade e diferença – aí está o poder. (…)
Incluir/excluir; classificar ...”. (SILVA. 2011,p.81) todas relações de poder que estão contidas
no processo de diferenciação e identidade configura-se dentro de um processo incessante se
lutas.
O processo colonizador atribuiu características positivas ao imigrante europeu para
que este pudesse sentir-se a vontade para impor sua superioridade diante dos brasileiros,
indígenas e caboclos aqui presentes. Essa positivação tinha o pretexto de dar sentido a
expulsão dos “outros” e a negação de suas identidades e diferenças. Nesse sentido, o projeto
logrou êxito ao homogeneizar os imigrantes no termo identidade-colono com atributos
heroicos, diluindo as diferenças presentes no interior desses grupos. “A ideia de pioneirismo
está acoplada a de conquistador, de desbravador, aquele que venceu a terra inóspita e com seu
trabalho plantou o progresso, como uma de suas virtudes étnicas”(RENK. 2004, p.33).
A citação acima é bastante elucidativa, pois coloca os imigrantes como os
predestinados a impulsionar o progresso, o desenvolvimento econômico e cultural. Como
atributos naturais, inerente a condição de ser europeu. Além disso, torna invisíveis os outros
grupos que aqui estavam, por serem lidos como opostos a esses atributos.
O trabalho, como identidade organizadora das características de superioridade,
aparece como um traço que vai acompanhar toda construção positiva da identidade de colono,
dos de origem. O labor árduo, necessário para configurar a organização cultural, econômica e
social passou a ser atributos de diferenciação e, estava presente em todos os lugares
colonizados pelos novos moradores – da vida privada à vida pública. E assim possibilitou a
produção de narrativas unissônicas.
Esse breve relato orientam o nosso entendimento sobre a colonização da região e,
principalmente de Chapecó, que ao longo desses 100(cem) anos transformou-se na principal
cidade do Oeste Catarinense com seus atributos assentados na cultura do trabalho árduo.
A imigração europeia foi facilitada no intuito de, para além do desenvolvimento d=e
do progresso, povoar uma região entendida como não habitada, para o Governo, ou com gente
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que não tinha na posse da terra as condições de desenvolver e progredir, segundo as regras da
racionalização do trabalho e acumulação capitalista.
Com o passar do tempo e desenvolvimento da região: “A elite regional, à medida que
rejeitou e deixou no limbo grupos minoritários (índios e caboclos), silenciou vozes locais e
passou ler seus próprios feitos, fatos e narrativas como a glória e o enaltecimento de
necessidade feito virtude”(RENK. 2004, p.42). Esses arranjos positivos formaram um enredo
que culminou em orgulho de si e distinção em relação outro. A distinção marcavam as
características da diferenciação e identidade.
O processo de produção social da identidade e da diferença (SILVA. 2011), ocorreu
sob uma constante luta por disputa de significados. Os “outros” - no caso específico os outros
são os mais antigos – precisavam ser neutralizados para que a identidade dominante pudesse
ser construída, cimentada e articulada para convencer e vencer. Para isso, todo um movimento
de positivação de unidade na diferença foi produzido para silenciar o “outro” indesejado.
A unidade está em aglutinar os diversos imigrantes sob o guarda-chuva do colono
como identidade unificadora e redentora. O colono passa a ser a identidade que orienta e
silencia as diferenças, além disso, colocou em perspectivas opostas os termos colono e
camponês para organizar características e símbolos de diferenciação. Enquanto o primeiro
significava a promessa do progresso e do desenvolvimento, da criatividade e do trabalho. O
segundo era a memória de um passado que precisa ser superado, da falta de racionalização, da
indisciplina e da falta de objetivo (RENK. 2004).
Essa positivação antecipada e provocada deu aos recém-chegados as condições
necessárias para que internalizassem o sentimento de superioridade, como próprios de sua
natureza. Elemento que contribuiu para o silenciamento dos povos autóctones, assim como
sua segregação e negação identitária.
A separação produzida pelos atributos, inferioridade para uns grupos e superioridade
para outros grupos são repetidas ao longo da história humana como forma de hierarquizar,
subordinar inferiorizar e dominar o outro, expropriando suas culturas e seus bens simbólicos,
tal qual observamos na formação da cultura preferencial da região Oeste. Ou seja!“Em
qualquer operação de classificação, é preciso primeiramente estabelecer alguns critérios
objetivos com base na diferença e semelhança” (MUNANGA. 2003). Os critérios objetivos de
honestidade, trabalho, progresso e superioridade foram atribuídos aos imigrantes europeus de
45

origem e por consequência o eurocentrismo se institui como qualidades desejáveis e desejada,


ressignifica até os dias de hoje como sendo o ideal de identidade.
Por outro lado, em nossos dias, os imigrantes haitianos e senegaleses, fruto desse novo
movimento migratório, não são percebidos com essas mesmas qualidades, mesmo sendo um
dos motivos desta nova migração, a busca por trabalho assalariado. Ou ainda, buscando um
mercado de trabalho que oferece muitas vagas. Para suprir uma demanda da agroindústria.
Para compreender esse novo momento migratório com novos rostos, etnias e suas
contradições daí decorrente, basta observar a absorção dos haitianos vindos, majoritariamente,
para o trabalho nas indústrias frigoríficas não conseguem se integrar a dinâmica social da
cidade, sofrem preconceitos e por vezes ataques de violência física precedidos de
xingamentos preconceituosos demonstrando, além da xenofobia, o preconceito de cor.
Reafirmando o eurocentrismo dos estabelecidos sob o qual a cidade foi e é imaginada.
Nesse contexto de disputas e conflitos culturais, os haitianos e senegaleses fogem do
padrão unificador branco e, mesmo sendo aceitos como mão de obra, eles não conseguem
através do trabalho árduo, sob o qual a identidade da cidade repousa, produzir o mesmo
sentido identitário de reconhecimento.
Esses rápidos relatos nos ajuda a entender e permite reflexão sobre a formação do
município e suas contradições culturais e sociais inerentes a esse processo de exclusão dos de
dentro para acolhimento dos de fora. Os autores Bourdieu; Champagne(2001), faz uma
reflexão sobre a escola e os “Excluídos do interior” para chamar a atenção de como o
processo de escolarização atua para consolidar a exclusão dos de dentro do sistema. Aqui
vemos um processo de exclusão cultural semelhante. Os de dentro dentro, no nosso caso, são
os povos tradicionais, os caboclos e os migrantes brasileiros que por aqui transitavam e os de
fora são os imigrantes europeus. A forma de exclusão aqui também pode ser correlacionada
com exclusão aperfeiçoada pela escola, guardadas as especificidades dos tipos de violências
empregadas em cada caso. Afinal, é preciso que discipline e eduque os excluídos e os
incluídos para que ambos possam incorporar seus papéis socioculturais de hierarquias de
acordo com o esperado pela cultura dominante.
Nessa dinâmica de representação, Chapecó hoje, vale-se de dados numéricos positivos
para reforçar sua posição na região e daí se projetar como a cidade mais importante entre os
seus vizinhos mais próximos. Sua densidade demográfica crescente, seus atributos
educacionais e geração de emprego são alguns dos dados que são repetidamente mostrados
46

pelo poder publico nas campanhas publicitárias para justificar a posição da cidade e sua
ambição “para além do seu tempo”. Essa expressão contida no vídeo comemorativo
demonstra a pretensão do município e colocar-se em destaque, a partir de um conjunto
organizativo de instituições e oferecimento de empregos.

3.2 CHAPECÓ HOJE: NÚMEROS; DIFERENÇAS E IDENTIDADE

A Chapecó centenária, não suplantou as vozes dos atores dissonantes presentes na sua
configuração regional, a narrativa desenvolvida até aqui arvora demonstrar como uma
dinâmica cultural profundamente em disputas deu sentido a cidade. As velhas culturas
caboclas, indígenas e gaúcha, que no início foram estigmatizadas (GOFFMAN, 2013),
silenciadas e invisibilizadas – mas não apagadas –, elas permaneceram latente se
reconstruindo a cada dia, e querem ter suas vozes ouvidas e suas identidades e diferenças
repeitadas. A luta por afirmação que não cessou e não cessara dado ao próprio processo de
produção da identidade e da diferença que é inacabado e móvel.
A centenária Chapecó se depara com um turbilhão de outras culturas que no passado,
dado a construção histórica, seriam consideradas indesejadas e desajustadas para o progresso
e o desenvolvimento. E, além disso, a cidade cresceu demograficamente e a passos largos, já
são mais de 200(duzentos) mil habitantes. Segundo o IBGE, a estimativa da população de
Chapecó em “2017 é 213.279 habitantes”(BRASIL. 2017).
A Chapecó dos cem anos, chega com muitas diferenças e identidades, portanto não
pode ser pensada apenas a partir das identidades assentadas nas três etnias preferenciais do
passado colonizador de origem – italiana, alemã e polonesa – que sob a égide do trabalho e do
progresso criou uma identidade unitária em detrimento das outras. A cidade agora precisa
pensar qual o lugar dessas novas culturas na representação municipal?
As identidades, dos daqui, que antecederam a esse processo de colonização
sistemática e orientada, foram definidas como pejorativa ou atrasadas. Nesse contexto de luta
por diferenças e identidades elas sobreviveram reivindicando suas culturas e seus saberes. Os
caboclos e os brasileiros – os imigrantes do Rio Grande do Sul – foram transformados em
47

estrangeiros dentro de seu próprio país (RENK. 2006),os colonos passam a ser a identidade
dominante e preferencial para sutura da identidade nacional de progresso e desenvolvimento.
O que nos interessa de imediato, é pensar como essa Chapecó de hoje se movimenta
nesse lago cultural em meio às reivindicações por diferenças e identidades, não apenas as
identidades negadas no processo de colonização, mas as novas identidades dos novos
imigrantes de dentro, os brasileiros de outras partes do país; e os de fora, a nova migração
haitiana, colombiana, senegalesa, árabes entre outras.
Dentre estes, se destacam a imigração haitiana, em maior número, e senegalesa que
tem fluxo inicial datado de 2011, segundo as/os pesquisadores(as) Bernartt; Bordignon;
Piovesana; Giacomini (2015).
Os primeiros resultados demonstram que a configuração dos movimentos dos novos
imigrantes na região oeste de Santa Catarina, mais precisamente em Chapecó,
aparece mediante três fluxos: em 2011, pela busca de trabalhadores estrangeiros, em
Brasiléia (AC), realizada principalmente pelo interesse das empresas frigoríficas e
agroindústrias regionais; em 2013, o segundo movimento configura-se com a vinda
das esposas, ocasionada por campanhas realizadas entre entidades e empresas.
Recentemente consagra-se o terceiro movimento, de forma mais sutil, com a
chegada dos filhos dos imigrantes haitianos. (BERNARTT. et al, 2015)

Hoje, os movimentos por diferença parecem expressarem de forma contundente, por


aqui, suas reivindicações e são vários os eventos de rua que permeiam a vida cultural e social
de Chapecó. Desde movimentos dos caboclos, tradicionalistas, de mulheres e feministas,
imigrantes negros africanos, haitianos, LGBTs, estudantes, trabalhadores do campo e da
cidade, movimentos religiosos de matrizes africanas e juventudes entre outros tantos. Todos
reclamando identidades e diferenças na perspectiva do reconhecimento e afirmação, que
compõem a nova cena de Chapecó.
O nosso objetivo nesse desenrolar dos fatos é proporcionar uma leitura sobre esses
novos e antigos atores e assim identificar como eles estão sendo apresentado e lido dentro
desse livro das diferenças e das identidades na composição da cidade. Não pretendemos fazer
uma análise profunda, mas exercitar a reflexão no sentido de colocar em evidência a própria
dinâmica de reconhecimento da diversidade e adversidade dai decorrente.
A cidade hoje sustenta índices favoráveis de desenvolvimento na geração de emprego,
educação, saúde que mostram sua pujança comercial e sua localização privilegiada com os
países membro do Mercosul – Argentina, Paraguai e Uruguai – mais a Bolívia, facilita o
trânsito comercial internacional.
Segundo os dados IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística:
48

Em 2015, o salário médio mensal era de 2.7 salários-mínimos. A proporção de


pessoas ocupadas em relação à população total era de 42.7%. Na comparação com
os outros municípios do estado, ocupava as posições 19 de 295 e 28 de 295,
respectivamente. Já na comparação com cidades do país todo, ficava na posição 370
de 5570 e 143 de 5570, respectivamente. Considerando domicílios com rendimentos
mensais de até meio salário-mínimo por pessoa, tinha 24.7% da população nessas
condições, o que o colocava na posição 205 de 295 dentre as cidades do estado e na
posição 5321 de 5570 dentre as cidades do Brasil (BRASIL. 2017)

Os números do IBGE, oferecem um panorama sobre como a cidade está localizada em


relação a emprego e renda, chama atenção que quase metade da população, 42,7%, é
economicamente ativa e recebem em média um pouco mais dois e meio salários-mínimos e
desse total, um quarto da população economicamente ativa recebem em média meio salário-
mínimo por pessoa. Ou seja, os dados estatísticos também funcionam para garantir uma
relativa hegemonia no comando e nas escolhas de possibilidades da cidade.
Sobre a educação os dados do IBGE
Em 2015, os alunos dos anos inicias da rede pública da cidade tiveram nota média
de 6.4 no IDEB. Para os alunos dos anos finais, essa nota foi de 5.1. Na comparação
com cidades do mesmo estado, a nota dos alunos dos anos iniciais colocava esta
cidade na posição 73 de 295. Considerando a nota dos alunos dos anos finais, a
posição passava a 74 de 295. A taxa de escolarização (para pessoas de 6 a 14 anos)
foi de 98.4 em 2010. Isso posicionava o município na posição 137 de 295 dentre as
cidades do estado e na posição 1440 de 5570 dentre as cidades do Brasil.
(BRASIL,2017)

A educação na centenária Chapecó acompanha o desenvolvimento da cidade com de


98% das crianças de 6 (seis) a 14 (quatorze) anos escolarizadas. Segundo a revista
institucional, Cidade de crescimento. Lugar de oportunidades( 2017) a estrutura educacional é
um ponto forte na concepção de formação social da cidade. Notamos que o poder publico
evidencia essa estrutura como parte dos atrativos da cidade.
A estrutura de educação da cidade é composta por “39 (trinta e nove) centros de
educação infantil; mais 180(cento e oitenta) unidades de ensino médio e técnico
profissionalizante; 19 (dezenove) instituições de ensino superior, sendo que duas são
federais e uma estadual”(CHAPECÓ. p.20).

Essa estrutura de educação formal, confere a Chapecó a posição 137 em relação as 295
cidades do estado, embora o primeiro olhar cause estranhamento, mas na média de salário-
mínimo do trabalhador a cidade ocupa a posição 19 dentre as 295 cidades catarinenses
conforme dados do IBGE (BRASIL. 2017) A oferta emprego apresenta-se como o qualitativo
de destaque para a cidade.
A Chapecó dos cem anos, embora apresente uma estrutura de emprego e educação em
pleno voo para o futuro, os números sobre esgotamento sanitário e arborização de vias
49

parecem indicar que existe uma preocupação primeira com as vias. Segundo os dados do
IBGE(2017):
Apresenta 61.8% de domicílios com esgotamento sanitário adequado, 74.3% de
domicílios urbanos em vias públicas com arborização e 29.3% de domicílios
urbanos em vias públicas com urbanização adequada (presença de bueiro, calçada,
pavimentação e meio-fio). Quando comparado com os outros municípios do estado,
fica na posição 145 de 295, 56 de 295 e 110 de 295, respectivamente. Já quando
comparado a outras cidades do Brasil, sua posição é 1757 de 5570, 2820 de 5570 e
1273 de 5570, respectivamente. (BRASIL.2017)

Os números não mentem, Chapecó possui índices invejáveis se comparados com as


cidades no seu em torno como Xaxim; Concórdia; Coronel Freitas, Guatambu, Nova
Itaberaba por ser a maior cidade entre seus vizinhos Chapecó acaba por ocupar uma
localização centralizada e centralizadora de diversos serviços, assim capitaliza os grandes
eventos da região por oferecer uma estrutura de recepção bastante favorável em relação aos
seus vizinhos.
A cidade não é só número ou só eventos, mas uma cidade que quer ganhar o mundo.
Existe na Chapecó centenária um novo desafio. O desafio de estabelecer relação comercial
com os vizinhos estrangeiros – países do Mercosul que fazem ou tem fronteiras próximas ao
município – e estabelecer uma relação social com imigrantes de vários lugares que aqui estão.
Além disso tem as lutas por identidade e visibilidade que está imbricada no reconhecimento
das diferenças que também são produzidas nesse contexto de relações comerciais.
A aceitação ou negação desses novos reclamantes por diferenças e identidades, pode
indicar que “as mudanças no equilíbrio e nas relações das forças sociais ao longo dessa
história se revelam, frequentemente, nas lutas em torno da cultura, tradições e formas de vida
das classes populares”(HALL. 2009, p.231), sobre cultura e desenvolvimento capitalista que
desemboca em contradições, informado pelas lutas cotidianas e dinâmica que coloca em
abertos a novas possibilidades na Chapecó de hoje.
Já vimos que as identidades e as diferenças não cessam por arbitragem ou decisões
unilaterais, elas são construções culturais que se processam na relação cotidiana num
ambiente de disputa, conflitos, luta, poder e dominação. Vimos, também, que a construção da
imaginada Chapecó decorre de eventos de magnitude internacional e nacional que agem como
forças centrípeta atraindo os desejados e centrífuga para os indesejados.
É nesse contexto de lutas territoriais, identidades e diferenças que a cidade vai se
conformando sob a égide do trabalho como identidade unificadora, que tem seu ponto de
equilíbrio, inicial, no colono como termo simbólico identitário dos imigrantes europeus
50

preferenciais para “ocupação” desse território e os outros como identidades negadas sujeitas a
todo tipo de negação desde culturais até sociais.
O que pretendemos fazer, em seguida, é analisar através do “artefato”(BECKER.
1994), vídeo institucional, e como esses novos atores sociais são apresentados e qual o sentido
dessa mudança de representação da cidade para os dentro e os de fora? A diversidade
mostrada no vídeo dá conta da diversidade cotidiana? E os caboclos e indígenas? Que
diversidade é essa? São perguntas que permeiam a representação da centenária Chapecó e que
suscitam muitas reflexões, talvez não consigamos respondê-las, mas provocar o debate em
torno da produção da identidade e da diferença nas perspectivas das lutas por afirmação
cultural.
51

4 CAPÍTULO III: NOVOS PERSONAGENS: “CHAPECÓ MEU MUNDO É AQUI!”

A história dos 100 anos de Chapecó é recortado por grandes disputas territoriais e
identidades e diferenças entre os nativos – indígenas, caboclos e brasileiros –, e os imigrantes
de origem – italianos, alemães e poloneses. Os gaúchos que por aqui também circulavam,
identificados como os brasileiros, com frequência, inicialmente, eram vistos como
inferiores(RENK, 2004, 2006), e que com o passar dos anos esse estigma foi superado, em
relação aos gaúchos, deixando de serem percebidos como inferiores e pejorativamente
identificado de brasileiros para transmutar para identidade, tradicionalista gaúcha, da cidade, -
haja vista o número expressivo CTGs, na cidade são oito centros, segundo a Secretaria de
cultura do município -,sem contudo deixar de expressar suas origens europeia e a positivação
da descendência – italiana e alemã.
Aos 100(cem)anos, Chapecó esboça uma vitalidade de quem está em pleno
crescimento e tem muito a conquistar, imersa num contexto de comoção emocional e projeção
mundial advindos da queda do avião. A centenária Chapecó se apresenta como uma cidade
diversa e pronta para receber os novos imigrantes.
Para compreendermos a opção da campanha institucional e o jogo de identidades
presentes no audiovisual, realizamos duas entrevistas entre os dias 10 e 30 de outubro de
2017. A primeira entrevista foi com secretário de Comunicação do Município de Chapecó,
buscando algumas respostas sobre a organização do vídeo, os recursos destinados a produção,
a escolha da temática, da empresa e como foi encaminhado a preferência por esses novos
personagens representados e apresentando a cidade. A segunda entrevista foi com diretor da
empresa produtora do vídeo, a Pró3Comunicaçõesma.com os produtores queríamos identificar
como a ideia foi desenvolvida e, a aceitação do vídeo pelas pessoas da cidade e fora dela, se
houve alguma resistência na aprovação do vídeo com aquele formato. As entrevistas foram
realizadas, na secretaria de Comunicação, no gabinete do secretário, por mim. Vale destacar
que nas duas entrevistas o secretário de municipal esteve presente.
O vídeo comemorativo é organizado de forma a mostrar uma cidade que cresce, de
oportunidades de trabalhos diversos, uma infraestrutura educacional invejável, econômica e
de saúde como atributos de sua pujança e destaque no cenário nacional e internacional. E todo
52

esse caminhar de sucesso e positividade se configuram e são incorporados pelos novos


personagens demonstrando a diversidade de identidades que configuram a nova Chapecó.
Para os produtores, era preciso pensar uma forma de apresentar a cidade diante do
contexto atual, deixar de lado as velhas etnias formadoras das identidades preferenciais para
expor novas possibilidades e expressão de diversidade desse novo momento, segundo Márcio
Tecchio, a comunicação institucional, até aqui, pensou Chapecó como:
A terra do Frango, Terra do porco, suínos, dos alemães e dos italianos. A própria
comunicação da Prefeitura e todos que fazem, a comunicação, sempre foi focada
nisso bonitinho, aí, entramos no começo do ano (janeiro de 2017), começando a
pensar, já em Janeiro, sobre comemoração dos 100 anos. O que mostrar nos 100
anos de Chapecó?(TECCHIO. 2017).

O desastre aéreo ocorrido com o time de futebol colocaram a cidade em evidência no


cenário nacional e internacional com a comoção gerada pelo acidente. Esse evento fez com
que os órgãos de comunicação institucional pensassem um novo modelo de apresentação da
cidade que desse conta da diversidade que as relações comerciais, culturais e econômicas
sugerem na atualidade. Nas palavras do diretor da produtora do vídeo, Pró3comunicação.
A grande quebra(referindo-se aos anos anteriores e a tragédia da chapecoense) que
aconteceu, e que nos abriu a visão, para entrar nesse mercado, “meu mundo é aqui”
queira ou não foi a tragédia de Chapecoense, ela trouxe ela, ela fez todo mundo
pensar, e mais, ela trouxe uma projeção mundial para Chapecó, uma visão, todos
estavam olhando para Chapecó(TECCHIO, 2017)

O futebol como símbolo de unidade cultural que dissolve as diferenças e produz


sentimento de pertencimento e identidade municipal, transmutou da tragédia para
oportunidade de mercados, foi o motor propulsor dessa nova cidade que se apresenta aos
receptores de seus produtos, que também recebe gente desses lugares. As frases do vídeo são
contundentes, assim como a afirmação dos produtores, também para o secretário municipal de
imprensa, sr. Mario Tomazi, a cidade tem uma diversidade incrível, os novos imigrantes
precisavam ser apresentados para os chapecoenses como construtores dessa cidade que se
apresenta para o mundo, que os de origem europeia – italiana, alemã – já não davam conta de
expressar esse novo ciclo de desenvolvimento. Mas, a tragédia, também para ele, foi
determinante na escolha do formato do vídeo com atores de outros países, em suas palavras:
Aqui é espetacular essa diversidade em termos de origens, então, se baseou nisso,
pra que a gente pudesse fazer com que os chapecoenses entendessem que nós
tivemos lá traz um ciclo de, de chegada de imigrantes (italianas, alemães) e esses
imigrantes eles continuam chegando, não na mesma intensidade que a época, nem na
mesma quantidade mas são imigrantes de novas etnias e enfim e de outras origens
que estão ai construindo essa Chapecó, pra daqui os próximos 100 anos. (TOMAZI,
2017)
53

É nesse contexto de mudanças e oportunidades que é pensado a forma de apresentação


da cidade que o vídeo propõe, tendo como ponto fundamental o acidente aéreo e o sentimento
de perda que provocaram comoção internacional. Além disso, projetara a cidade para muito
além de suas fronteiras exigindo uma nova forma de exibi-la para o mundo reafirmando a
ideia de uma cidade de oportunidades e de crescimento econômico e diversa. Nessa
interpretação da cidade, pelas lentes do vídeo, surgem as aspirações com significações
positivas, sem tocar nas velhas identidades, vender uma ideia de progresso, que está em
concordância com projeto colonizador. Ou seja, o novo apresenta-se corrompido por velhos
ideais.
Chapecó meu mundo é aqui

Nossa força se espalhou pelo mundo.

Estamos na América, Europa, África e Ásia. (CHAPECÓ meu mundo é aqui.2017)

Nesse trecho do vídeo é possível perceber que as cenas são de uma cidade que está
pronta: A imagem do globo terrestre e da estátua da liberdade e outros monumentos de
expressão mundial propõe uma cidade que está presente nas relações comerciais, global. Essa
força é expressa pela capacidade de gerar oportunidades e vender produtos para outros países.
Mas, mesmo Chapecó se apresentando como diversa e aberta para mundo como uma força
que se espalha se ramifica por vários continentes, há identidades que são atribuídas pouco
valor simbólico e histórico. Para o Secretário de imprensa:
Chapecó, foi estabelecida, haviam os indígenas, vamos considerar Caboclos, enfim,
mais foi incrementada por alemães, italianos, que vieram naquele período da
colonização, passado esse estágio, nós estamos experimentando novamente,
novamente a vinda de outras, de outras pessoas, de outros países, porque isso
também, porque a matriz econômica de Chapecó ela, ela se fortaleceu, e nós
exportamos hoje, não gostaria de te dizer um número específico, poderia até
procurar, mas quase uma centena de países…(TOMAZI. 2017).

Embora, as falas dos entrevistados tentem expressar um certo reconhecimento positivo


dos novos imigrantes e dos antigos habitantes, há uma ostentação e veneração pelos europeus
como responsáveis pelo desenvolvimento e pela consolidação do município como uma matriz
econômica importante, capaz de atrair esses novos personagens e proporcionar oportunidade
de trabalho, mas não é identificado, nas entrevistas, como essas novas culturas e identidades
se integram na vida social do município. Na sequência o vídeo informa aos espectadores a
dimensão e alcance econômico do município, como uma dimensão sagrada e articuladora do
desenvolvimento.
54

Levando produtos e alimentos de qualidade para mais de 60 países.


Chapecó é uma cidade além de seu tempo.
É moderna, é ousada e empreendedora.
Gera milhares de empregos (CHAPECÓ meu mundo é aqui. 2017).
A questão do desenvolvimento é simbolizado por uma cidade que se desloca a
velocidade da luz, gera oportunidades de trabalho e emprego, com uma estrutura vibrante e
iluminada. A cidade se mostra planejada e pronta para acolher e vender-se.
Aqui o vídeo mescla diversão com feira de negócios numa operação de equivalência,
na proposta de atrair investidores e consumidores apresentando de forma rápida uma estrutura
de pavilhões e palco para shows. Como afirmou, em nossa entrevista, o diretor da
Pró3comuncação – agência que produziu o vídeo - “a intenção é vender a cidade, atrair
negócios e gerar ganhos para o município”(TECCHIO, 2017). Ora, as diferenças identitárias
parecem ser secundarizadas nesse projeto modernizador.
Realiza grandes eventos;
E tem indicadores de primeiro mundo;
Na economia, na saúde e na educação. (CHAPECÓ meu mundo é aqui,2017)
Nesse trecho os indicadores são apresentados para reforçar a afirmação anterior numa
referência “ao primeiro mundo”, Chapecó se transforma na cidade das oportunidades com
seus números e sua base bem equipada da economia ao bem-estar social. O termo raça
aparece p[ara reforçar multiculturalidade e neutralidade incutida no multiculturalismo,
negligenciando os conflitos que permeiam as lutas por diferenças e identidades.
Chapecó é a paixão de milhares de torcedores.
Uma nação com 100 anos e 210 mil de várias raças, idiomas, cores e sabores.
Somos uma janela para o mundo. (CHAPECÓ meu mundo é aqui,2017)
Aqui, temos uma cidade pretensamente multicultural que se reconhece como tal, não
há uma referência direta aos imigrantes de origem – alemã e italiana ou polonesa – mas
percebemos que essa “nação” se significa em torno da simbologia, da “paixão” pelo time,
“todas as cores e sabores” são transfiguradas para o verde e branco da bandeira do município
que produzem uma relação que ordena primeiro o símbolo que unifica todos e, depois as cores
nas quais significam o pertencimento chapecoense.
Os sabores trazidos pela culinária diversa, também é posto em evidência de
oportunidade de trabalho mas que significação cultural. Mas, imerso nesse grande caldeirão
positivo, o que produziu a comoção que suscitou o arranjo do vídeo para projetar a cidade
para o mundo foi, sem dúvida, o acidente aéreo.
55

Nas falas dos personagens, como se segue, as frases são repetidas por todos como um
mantra, uma forma de gerar pertencimento, mobilidade identitária. Mas, não há uma
referência às origens ou diversidade cultural, além do idioma sob o qual as frases são
proferidas como que reivindicassem ser parte desse mundo. Assim, os personagens reafirmam
que, embora estejam abrindo mão de suas nacionalidades para transmutarem-se seus mundos
para o mundo dos chapecoenses, continuam expressarem-se em seus idiomas nativos, tendo
que sere traduzidas para o português. Esses movimento, pode ser percebido como uma
suposta neutralidade por gerar a ideia de diferença e identidade sem conflito. Entretanto, a
própria expressão já é conflituosa ao dissimular a luta por diferença contida nas falas dos
personagens que ao mesmo tempo que se declaram ser chapecoenses, os fazem em seus
próprios idiomas expondo uma identidade deslocada ou descentrada como bem exemplificada
por Stuart Hall(2011). Isso pode demonstrar que os personagens, embora afirmem suas
pretensões de serem e estarem em Chapecó, suas origens continuam sendo significadas em
suas linguagens.
David J. Tritt (Estados Unidos – fala em inglês)
Eu sou Chapecó meu mundo é aqui.
Omar A. Fares ( Arábia Saudita _ fala em árabe)
Eu sou Chapecó, meu mundo é aqui”.
Marie M. Divers (Haiti – fala em crioulo haitiano)
“ Eu sou Chapecó, meu mundo é aqui”.
Rafael A. Colorado (Colômbia – fala em espanhol)
Eu sou Chapecó, meu mundo é aqui.(CHAPECÓ meu mundo é aqui, 2017.)

Por fim, no último quarto de minuto do vídeo, os atores são convocados a expressar
sua afinidade com Chapecó em sua língua materna, “Eu sou Chapecó, meu mundo é aqui!”.
Declarando ser aqui o espaço de suas conquistas materiais mas, não apresenta nenhum outro
elemento que possa exprimir a diversidade cultural. As imagens que circulam atrás dos atores
são referência a pontos de destaque da cidade, ou seja, pontos, locais estruturas físicas e estes
são apresentados em segundo plano e com pouca nitidez proposital, para que atenção se
prenda nas atividades e conquistas. Exceto, a imagem da igreja matriz aparece grande,
apresentando a imponência da arquitetura como símbolo de fé ao lado do desbravador
símbolo do trabalho racionalizado e do progresso e, também, da expulsão dos considerados
indesejados. O novo e velho articulado para mostra uma mudança sem nada transformar!
No mesmo caminhar entre novos e velhas identidades. As identidades que fora
preterida no passado, na contemporaneidade mesmo estando presente no cotidiano da cidade
continuam ocupando o lugar invisível na cena oficial dos 100(cem) anos, a mesma ferida
56

continua aberta e em conflito. Como afirma a antropóloga Adiles Savoldi, artigo escrito para o
36 Anpocs: “
No presente, caboclos e indígenas, por caminhos que as vezes se cruzam, ora se
distanciam, têm construído suas identidades transformando o estigma negativo, que
lhes fora imputado no passado, pela alteridade, em emblema de positividade”.
(SAVOLDI, 2012).

Essa afirmação demonstra a centralidade da cultura e sua forma de significar sentidos


e ressignificar diferenças num ambiente de constantes transformações e lutas, presentes nas
reivindicações dos indígenas pelo direito originário de suas terras e preservação de suas
culturas. Ao longo da história do município, esses povos não se calaram e a partir de suas
lutas foram conquistando direitos educacionais, gerando possibilidade de integrar a escola
regular sem abrir mão de suas tradições. também grupos como os caboclos se organizaram
formando associação para garantir que sua identidade não se perca no tempo – Associação
Puxirão dos Caboclos(as) do Município de Chapecó. É como esse movimento dinâmico e
incessantes que as diferenças e identidades vão adquirindo espaço e protagonismo dentro de
suas próprias lutas.
Na comemoração dos 100 anos da cidade Chapecó, “Chapecó meu mundo é aqui” um
fato novo acontece na peça institucional de apresentação da cidade, mas que não dar conta de
exprimir ou reparar as identidades secularmente negadas. São apresentados novos atores em
sua diversidade de estrangeiros e incluídos, ou com possibilidade de inclusão material.
Até então, a diversidade mais amplamente consolidada como representação dos
cidadãos e cidadãs chapecoense era a dos de origem – italiana, polonesa e alemã – como
representação do progresso e do desbravamento da região. As identidades indígenas e
caboclas foram invisibilizadas ou negadas como constitutiva da cultura municipal válida e ,
cem anos após, continuam condenadas a invisibilidade formal. Tem-se aqui uma operação
para produzir novas identidades relacional que acione o futuro sem integrar os excluídos do
passado.
Para Hall(2011), essas novas identidades que se configuram de forma deslocada e
descentradas não ameaçam as antigas identidades, pois, são produtos do próprio processo
dinâmico da modernidade tardia, em que as mudanças são provocadas pela migração e pelas
novas relações comerciais, sendo assim, as novas identidades apresentadas num arranjo
multicultural neutralizado, dissimulando a luta por significados..
57

Nesses 100(cem)anos, comemorativo, ao mesmo tempo que os produtores e


financiadores (prefeitura e produtora) do vídeo, exprimem a necessidade de mudança na
representação da cidade, pautando em suas falas o novo momento do desenvolvimento e a
diversidade dos novos imigrantes impregnados de devoção às velhas identidades.
Sendo assim, o status co heroico, dos de origem, é ressignificado pela confecção de
estátuas como símbolo e significado histórico, segundo a história dos dominantes, pelo
progresso e desenvolvimento do município. O jornal Diário Catarinense estampa a notícia
com o seguinte título: “Monumento do centenário de Chapecó gera críticas”(DIÁRIO
Catarinense. 2017). As críticas demonstram um ambiente de conflitos.
Os conflitos sugerem disputas por identidades e nesse contexto, a alteração na
representação e interpretação (BECKER,1994) da cidade não é suficiente para impedir que os
monumentos aos antigos desbravadores sejam realizadas/confeccionadas e colocadas em local
de pretendido destaque. Ora, não se trata de um processo sem conflitos ou, ainda, como
sugere a notícia do Jornal, do valor financeiro destinado a confecção dos símbolos. Mas, se
trata de uma luta por identidades, diferenças e poder que não se esgota nas relações
comerciais. Para Benedict Anderson(2008), esses símbolos e imagens são eficazes para
consolidação da comunidade e como estas se imaginam e significam a cultura.
O monumento terá três estátuas de bronze homenageando o colonizador da região,
Ernesto Bertaso, o industrial Plínio Arlindo De Nês, fundador do frigorífico
Chapecó, e Aury Bodanese, fundador das cooperativas Alfa e Aurora. O projeto
chegou a ser encaminhado para a Câmara de Vereadores e retirado após crítica de
vereadores da oposição. Também houve críticas nas redes sociais. Ao custo de R$
330.000,00(DIÁRIO Catarinense. 2017).

Essas quatro figuras, estátuas, trazem em si a história oficial de construção da


identidade e do desenvolvimento do município da Chapecó, sob a racionalização dos de
origem. A contradição está, ao mesmo tempo que os entrevistados – Secretário municipal de
Imprensa, Mário Tomazi e o diretor da Pro3Comuncação, Márcio Tecchio – afirmam que a
cidade vive um novo contexto de representação e apresentação, as ações do executivo
mostram que os de origem continuam sendo o epicentro gerador de características identitárias
formadora da identidade municipal, tanto pelo valor destinado ao financiamento quanto pela
escolha dos nomes nos ícones.
Portanto, a mudança sugerida em “Chapecó meu mundo é aqui”, não exprime uma
ruptura na base cultural dominante, pois, muda sem perder o contexto da identidade cultivada
e significada na formação social do município, tendo o trabalho, o desbravador como
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referências de um “povo que acorda cedo e dorme tarde”(TOMAZI. 2017). A nova estética
audiovisual traz elementos, ao mesmo tempo, fora e dentro desse contexto numa dinâmica
descentrada e deslocada ou globalizada.
Os caboclos e indígenas continuaram num passado distante e inóspito, para dar lugar
as novas imigrações de força de trabalho com objetivo de suprir a necessidade de sua
principal indústria e motor da economia local – A agroindústria – que reclama um grande
contingente de força de trabalho não especializado e seus produtos têm alcance em escala
mundial, demandam por números expressivos de trabalhadores. Como podemos notar nos
horários de saída e entrada nessas indústrias, muitos ônibus cheios de operários a cada turno
de que encerra/começa. Isso tudo e a propaganda de oferta de vagas de trabalho nesse setor,
faz a cidade entrar na rota das novas migrações.
Além disso, o desastre aéreo ocorrido 2016, nas terras da Colômbia, envolvendo o
time da cidade, comissão técnica, jornalista e alguns ilustres torcedores – foram 71 mortos –
colocou Chapecó no top of the news word, fazendo com que a cidade saísse de um lugar
qualquer para o mundo, conforme os noticiários de O jornal on line Globo Esporte(2016),
trazia a seguinte notícia com os dados da tragédia:
Uma tragédia no futebol mundial e especialmente brasileiro. O avião que
transportava a delegação da Chapecoense para a primeira partida da final da Copa
Sul-Americana contra o Atlético Nacional fez um pouso forçado na madrugada desta
terça-feira na região de Antióquia, em gravíssimo acidente na Colômbia. Segundo
informações do chefe da polícia colombiana, José Acevedo, 71 pessoas morreram e
seis sobreviveram. O zagueiro Neto, o lateral Alan Ruschel e o goleiro Follmann
estão entre os sobreviventes, sendo que Follmann teve uma perna amputada. Os
outros três que escaparam vivos da tragédia são o jornalista Rafael Henzel e dois
integrantes da tripulação: Ximena Suárez e Erwin Tumiri. O goleiro Danilo chegou a
ser resgatado com vida, mas de acordo com informações do SporTV, não resistiu.
Inicialmente, as autoridades informaram que eram 75 mortos, mas quatro pessoas
não chegaram a embarcar”. (GLOBO ESPORTE. 2016)

Assim, estava criado o clima de tristeza, comoção e oportunidades comerciais. A


cidade de Medellin foi a primeira a ser integrada ao círculo de amizade e negocio, como pode
ser conferido na Lei 6926/2016 (CHAPECÓ. 2012), Chapecó e Medellin cidades-irmãs. A Lei
que declara Chapecó, SC e Medellin Departamento de Antioquia, Col., cidades-irmãs é
composta de seis artigos e foi encaminhada pelo poder executivo municipal. Essa Lei tem por
objetivo promover o intercâmbio, a cooperação técnica, econômica e esportiva, turística e
cultural e, ainda, autoriza o executivo municipal e denominar espaço público com nome da
cidade de Medellin, Colômbia. Isso tudo foi motivado pela tragédia ocorrida em 29/11/2016.
Assim como o vídeo foi motivado pelo acidente, a Lei também foi motivada, com o
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determinado formato, em decorrência da tragédia e por conta disso não houve um debate
sobre o interesse publico implícito na lei.
Para a empresa que produziu o filme, Pro3 Comunicações, a grande motivação para
produção de uma mídia com proposta de mudança na apresentação da cidade foi o acidente
aéreo e a comoção gerada internacionalmente abriu caminhos às oportunidades comerciais:
A grande quebra (referindo-se aos anos anteriores a tragédia da chapecoense) que
aconteceu, e que nos abriu a visão, para entrar nesse mercado, “Meu mundo é aqui”
queira ou não foi a tragédia de Chapecoense, ela trouxe ela, ela fez todo mundo
pensar, e mais, ela trouxe uma projeção mundial para Chapecó, uma visão, todos
estavam olhando para Chapecó.(TECCHIO. 2017))

A afirmação acima mostra o quanto há de luta no processo de legitimação da diferença


e da identidade, sem perder unidade de identificação entre o passado, presente e futuro. O
vídeo propõe o acolhimento de outros, de fora do contexto formador da cultura municipal
dominante, sem que estes percam sua “identificação associativa”(HALL. 2009), que permite o
uso da língua materna como identidade cultural, mas, no segundo momento, uma nova
identidade é proferida como costura intercultural unificadora das relações comerciais. Afinal,
a mudança surge no interior de uma necessidade de mercado e atração de novos
consumidores.
A janela para o mundo foi aberta com a impulsão e velocidade de um avião em queda
livre que ao tocar o solo desloca a cidade para futuro, tal qual Chapecó se propõe o vídeo,
“uma cidade além do seu tempo” que se move com a rapidez, de uma explosão, para o futuro.
Um futuro que não abre mão do passado, por isso, algumas características sobrevivem para
manter o status co cultural e social que são significadas nas narrativas presentes nas estátuas,
museus, nomes de rua, na indústria e no desbravador.
O equilíbrio das diferenças é promovido por uma representação rápida e deslocamento
para o futuro promissor e de oportunidades. Isso faz com que os personagens identifiquem-se
com o desenvolvimento do município numa operação que transforma sentimento e identidade
em oportunidades comerciais.
Esse processo pode ser conceituado como “substantivo da cultura. O lugar da cultura
na estrutura empírica real e na organização das atividades, instituições, e relações culturais na
sociedade, em qualquer momento histórico particular” (HALL,1997, p1), adquire ponto
central para ativação de representações a partir das relações de trabalho.
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O vídeo mostra, dentro desse lago de misturas heterogêneas, uma certa ativação
cultural adversa da tradicional, sem problematizar ou propor rupturas significativas que
promovessem ou possibilitassem a inclusão cultural.
No sentido da representação e integração não há espaços para movimentos
contestadores, pois, ao passo que o outro é colocado de fora para dentro numa mobilização de
linguagem que, sugere este outro identificado pela língua estrangeira, mas, deslocado para o
mundo de Chapecó onde suas aspirações materiais serão concretizadas. Assim sendo, não é
cidade que muda com o outro, mas o outro que muda com a cidade ressignificando as velhas
estruturas formadoras da cultura municipal.
A identidade, fixada, de um povo trabalhador, de um povo essencialmente europeu
significado pelo trabalho racionalizado, progresso, ascetismo, desenvolvimento como centrais
na produção social da identidade e municipalidade chapecoense, são reafirmadas no vídeo
colocando os estranhos no lugar do acolhido. Conforme expressou durante a entrevista, o
secretário de Comunicação e Imprensa.
Todos os personagens que aparecem no vídeo são chapecoenses, independente de ser
adoção ou nascimento, então, são por adoção, estão e vieram pra cá pelo trabalho,
então esse ciclo, esse ciclo que a gente demonstra, no próprio material “Meu mundo
é aqui”.Por que Chapecó, primeiro, Chapecó, foi estabelecida, haviam os indígenas,
vamos considerar Caboclos, enfim, mais foi incrementada por alemães, italianos,
que vieram naquele período da colonização.(TOMAZI. 2017).

Os outros que aqui chegam, chegam com esse objetivo de realização material e
promessas de trabalho sugeridas no vídeo, são povos que estão ao alcance dos tentáculos
comerciais ou força de trabalho pouco especializados. Exceto, os povos antigos os que
antecederam a colonização orientada, estes ainda são percebidos como invisíveis ou de pouca
contribuição para construção do tão desejado progresso, como podemos perceber na citação
acima.
Nesse contexto, a diversidade apresentada no vídeo não traduz, não automaticamente,
uma abertura para um novo pensar sobre as identidades culturais. O que, Stuart Hall(1997),
denominou, fazendo uma crítica aos estruturalismos marxistas, uma “estrutura de unidade na
diferença”.(p.152). O que está em jogo são representações e descentramento sem
comprometer a cultura dominante. Ora, “essas representações”, (BECKER. 1994), contidas no
trecho do vídeo, logo no início – “somos uma janela para o mundo” – demarca uma posição
privilegiada. A alusão à janela e o mundo não estão deslocadas da ambição provocada pela
noção de que ser competitivo é ser globalizado e para fazer sentido simbólico são mostrados
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“como maneiras que as pessoas usam para contar o que sabem, para outras pessoas que
querem sabê-lo” (BECKER,1994,p. 137). “Chapecó meu mundo é aqui”, sugere um
encadeamento repetitivo em várias línguas falando de um mesmo lugar para outros lugares
que querem saber de Chapecó por pessoas que afirmam possibilidades. Mesmo fora de seus
lugares de origens de sua pátria, eles, os novos personagens, contam para as pessoas de dentro
e de fora o que elas sentem por Chapecó, corroborando com o sentimento de municipalidade e
pertencimento relativo.
As mídias visuais fornecem códigos textuais e simbólicos que visam produzir e
reproduzir determinados olhares, ou significar representações dentro desse arcabouço de
interpretações para conceber a visão de uma classe da sociedade sobre determinados grupos,
mas, na tentativa de dissimular os conflitos existentes entre as diversas identidades e
diferenças, que se chocam na luta cotidiana por reconhecimento, transitam pelo imaginário
deslocado do embate permanente no ambiente aberto e tolerante do multiculturalismo.
As tradicionais identidades que por tanto tempo apaziguaram o mundo social
municipal, seja pelo uso dos seus símbolos seja pelo uso da violência, estão em ligeiro
declínio ou com a legitimidade abalada, (HALL,2011), isso faz surgir um velho/novo
processo de luta por diferença. Um novo contexto de reconhecimento imbricado na
relativização das velhas culturas.
As antigas identidades indígenas e caboclas se reorganizam para fazer-se presente na
cena da cidade, embora contestadas e estigmatizadas, ainda hoje, elas resistem se apresentam
para reivindicar direito a identidade e contestam a municipalidade unificadora europeizante,
conforme constatou Savoldi(2012), em seu artigo “Territorialidades cruzadas: a construção
das identidades indígenas e caboclas no Oeste Catarinense”. Esses povos identitários não
desapareceram, pelo contrário, estão em permanente processo de luta por reconhecimento
material e simbólico.
A Chapecó de hoje, vive uma luta latente por diferenças desconsiderada pelo artefato,
que apresenta fala que unifica a imaginação da nação e distingue acolhendo o outro, propondo
um equilíbrio desprovido de conflitos ao racializar a diversidade cultural como natural da
formação do município: “nós somos uma nação com mais 210 mil habitantes, várias raças e
idiomas, cores e sabores”(CHAPECÓ meu mundo é aqui,2017), uma vez que o idioma, no
contexto do vídeo, está associado a raça, produz identificação e hierarquia. O termo “raça”
presente no vídeo opera no sentido classificar sujeitos e lugares organização imagética e de
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linguagem multicultural na qual “as qualidades (…) culturais são apresentados como
neutros”(MUNANGA. 2003), tendendo a conceber um espaço social sem luta, como se a
identidade independesse da diferença.
O sociólogo Tomaz Tadeu da Silva(2009), já observava em seus escritos, esse
movimento de colocar em evidência a produção da identidade descolada da diferença, mas
como vimos, anteriormente, identidades e diferenças estão em profunda correspondência,
interdependencia e luta.
As questões colocadas no vídeo podem nos levar a pensar que as identidades culturais
de origem, até então, privilegiadas em todas as peças de apresentação da cidade e formação
social, foram ocultadas pela entrada da cidade no mercado global e pela projeção mundial
advinda da tragédia. Mas, observamos que ao lado da homogeneização do global há também a
sedução pela diferença, a comercialização da “etnia e alteridade”(HALL. 2011), como
produtos da nova cidade aberta para o mundo.
As narrativas estão em relação aos seus objetivos comerciais, estão dependentes de
seus alvos, como afirmou Becker(1994). “O modo como escrevo depende quem estou
tentando impressionar”.(BECKER. 1994,p.135). Podemos ver um vídeo como linguagem
audiovisual, escrita para causar ou provocar impressões, no nosso caso, para o mundo, mas
quais impressões estão em evidências? Ao apresentar a diversidade cultural que não dá conta
do contexto social da cidade, pode criar cisões e ou unificação? Ou ainda, será que a
receptividade do vídeo foi favorável? Os custos de produção e divulgação foram bem-aceitos
pelos financiadores? Essa perguntas são partes das reflexões e provocações que estamos
construindo.

4.1 O VÍDEO E A CENTRALIDADE DA CULTURA.

O vídeo dos 100 anos, coloca em perspectiva uma cidade que cresce a velocidade da
luz, talvez seja esse o papel do deslocamento da iluminação que cria no olhar a ideia de
movimentos rápidos, desenvolvimento virtuoso, progresso e caminhado para o futuro. É nesse
contexto de deslocamento, velocidade e trabalho que vídeo apresenta a diversidade de uma
Chapecó que quer se mostrar para o mundo. uma Chapecó que autoafirma grande, cheia de
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possibilidades e se desenvolve a passos largos ou melhor, a voos altos. Mas, de acordo com
um dos criadores do vídeo, o filme vinha para responder algumas questões: “O que é essa
Chapecó que todo mundo tá olhando? O que as pessoas pensam de Chapecó? Até o momento
o que era Chapecó?” (TECCHIO, 2017). Essa perguntas eram as quais o vídeo deveria
responder. No entanto, observamos um vídeo que exprime um misto de ficção com realidade
imbricado numa sugestiva diversidade cultural, restrita.
Ao apresentar quatro identidades nacionais estadunidense, colombiana, árabe e
haitiana como essencialmente representantes dessas culturas nacionais, trabalhadores
imigrantes integrados a cultura Chapecoense que traz em suas representações o trabalho árduo
e dedicado, o amor a cidade e sua identificação associativa de origem. Nas palavras do
Secretário municipal de imprensa:
Chapecó realmente é uma terra de oportunidades. Eu gosto dessa pressa, mas ela
tem sim, ela tem um jeito de ser, por que as pessoas, eu creio que esse seja também
um dos motivos fortes, as pessoas aqui elas, nasceram com o manto da adversidade,
da dificuldade(TOMAZI. 2017)

Ao passo que, os mercados em que a cidade está inserida são “América, Europa, Ásia
e África”, ou seja, dos seis continentes do planeta a cidade, segundo o vídeo institucional
“Chapecó meu mundo é aqui,2017”., está presente em quatro através de seus produtos, e, em
“mais de 60 países”. Nesse contexto, o local não deve ser confundido com as antigas
identidades preferenciais italiana e alemã fechadas em si mesmas. Por questões comerciais é
preciso apresentar uma cidade como outra roupagem, com outros elementos e personagens. A
lógica da globalização é produzir novas identificações transitórias locais sem com isso
destruir as identidades mais enraizadas.
A ideia de inserção na economia global é bem definida logo na abertura do vídeo, que
articula progresso, modernidade, desenvolvimento e trabalho. Essas representações sugerem
uma interpretação, para quem está assistindo consciente ou não, sobre a produção de uma
realidade de “si” como protagonista da história dos atributos ali significados.
O filme mostra, como uma leitura de um mapa rodoviário, informações necessárias a
apreensível suprir suas aspirações, portanto os interlocutores são conduzidos por
encadeamentos de imagens e representações que satisfazem seu momento. Os personagens,
por outro lado, deixam escapar suas origens para transmutar-se para o mundo de Chapecó sem
causar danos, reivindicam suas identidades. Como afirmou em entrevista o secretário de
imprensa Mario Tomazi: “todos são chapecoenses, por adoção”(TOMAZI. 2017).
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As afirmações diretas, curtas e repetidas por todos personagens, em suas línguas


maternas, mostram uma cidade focada em manter um certo controle sobre os conflitos e
dissimular a luta presente na produção social da identidade. A diversidade, apresentada no
vídeo, é garantida por personagens vindos de outro países e que em Chapecó encontram sua
“felicidade” e seu mundo como se fosse algo naturalmente aceito.
Na perspectiva da diversidade, a diferença e a identidade tendem a ser neutralizada,
cristalizadas, essencializadas.(…), em geral, a posição socialmente aceita e
pedagogicamente recomendada é de respeito e tolerância para com a diversidade e a
diferença. (SILVA, 2011,p. 73)

Essa pretendida tolerância é promovida pela ideia do multiculturalismo em que as


culturas não estão em disputas e sim em harmonia, esvaziando os conflitos e as relações de
poder contidos no processo de construção das identidades e das diferenças.
Os artefatos produzidos nos limites da lógica global de mercados comerciais, em que
identidades locais e globais são postas em relevo, expõe o próprio caráter desigual que opera
no mundo em termos de escolhas e padrões de cultural legitimados como dominantes e
válidos. Sendo assim, não há de fato uma ameaça às velhas identidades, mas um surgimento
de novas identificações locais produzindo uma interculturalidade, subordinadas a cultura
dominante para enriquecer o processo cultural desmobilizando os conflitos gerando coesão
social.Para a professora da PUC-Rio Vera Maria Candau:
A interculturalidade é assumida como estratégia para favorecer a coesão social,
assimilando os grupos socioculturais subalternizados à cultura hegemônica. Este
constitui o interculturalismo que qualifica de funcional, orientado a diminuir as áreas
de tensão e conflito entre os diversos grupos e movimentos sociais que focalizam
questões socioidentitárias, sem afetar a estrutura e as relações de poder vigentes.
(CANDAU. 2010).

A professora reforça a percepção sobre a centralidade da cultura na formulação da


imaginação da comunidade como uma só nação, um só povo, como propõe “Chapecó meu
mundo é aqui”, assentado sobre a lógica do desenvolvimento, do progresso e da realização
material como traços de uma cidade que se quer moderna.
Assim, ao mesmo tempo que os diferentes são apresentados com suas identidades
deslocadas e descentradas (HALL, 1997, 2009, 2011; SILVA, 2011; WOODWARD, 2011),
podendo ser ressignificada a partir das oportunidades de trabalho e desenvolvimento
econômico que a cidade centenária oferece. Por outro lado, colocam esses estrangeiros numa
relação de abdicação de suas identidades. Esse processo de identidades deslocadas e
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descentradas ou ainda conflito de identidades estão presente , também, pelos deslocamentos


humanos em várias partes do mundo.
A migração tem sido tema no mundo todo, vários são os motivos que levam os
indivíduos a migrarem. A pobreza, a seca, a fome, os regimes políticos e guerra civil, esses
fenômenos têm produzidos deslocamentos de grandes contingentes humanos em busca de
novas oportunidades de trabalhos ou fuga dos conflitos e assim por diante. Ao mandar seus
produtos para fora, Chapecó também desperta interesses dos consumidores que são fisgados
pelo comercial institucional da realização e do sucesso “estamos presentes em mais de 40
países” essa mensagem contida no vídeo mostra a dimensão do alcance da propaganda e o
incentivo a novos imigrantes.
Os personagens que compõem o vídeo são apresentados apenas com seus nomes e
seus lugares de origem, mas não há nenhuma referência cultural ou suas profissões, apenas
sue pertencimento de nacionalidade com imagens da cidade de Chapecó ao fundo de forma
pouco nítida. Essa forma é compatível com a ideia de representação e interpretação que
mostram apenas o que é concebido como necessário a ser mostrado.
Ao oferecer uma narrativa de novas possibilidades identitárias, Chapecó não abriu
mão de suas antigas histórias e feitos heroicos no qual sustentaram, narrativamente, sua
pujança e desenvolvimento. O retorno às velhas culturas é ressignificado por seus
monumentos. É nesse ano também que a cidade ganha três estátuas em homenagem aos
fundadores das duas maiores cooperativas da cidade e o fundador do frigorífico Chapecó, os
de origem. Como destaca a notícia do “DC online”:
O prefeito quer homenagear pessoas que foram importantes para o desenvolvimento
da cidade. A construção do Monumento do Centenário, que será colocado no lado
norte da Avenida Getúlio Vargas, em Chapecó, tem gerado polêmica na cidade
(DIÁRIO Catarinense. 2017).

As esculturas, arquiteturas, museus e literatura, como observou Benedict


Anderson(2008), fazem parte de um sistema simbólico para construção da “comunidade
imaginada” da unidade nacional em torno dos símbolos dominantes. No nosso caso, em torno
de uma identidade cultural chapecoense e seus referenciais.
E como essas culturas fazem eclodir suas diferenças? Para entendermos essa questão
precisamos refletir sobre aquilo que o filme deseja e objetiva, e aquilo que as representações
no interior desse discurso podem sugerir. Partimo do pressuposto da luta e conflito por
reconhecimento e produção de identidades.
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Nas palavras do Secretário municipal de imprensa, sobre o vídeo, tinha entre os


objetivos mostrar o trabalho e as oportunidades que estão em aberto em Chapecó, e, que a
mistura é supostamente benéfica desde que os estrangeiros estejam dispostos a absorver o
trabalho como forma social e única via de significação do espaço cultural.
Então eu creio que também se mistura um pouco com essa ideia por que uma pessoa
sairia do Haiti pra vir a Chapecó, ou por que um gaúcho viria para Santa Catarina, o
que movia meu pai, moveu meu pai a sair do Rio Grande uma área na proximidade
dos seus pais pra ele vir pra cá com uma carroça e um terno de mula, trabalhar de
carroceiro ou transportador, pra depois ter outras atividades profissionais e a nossa
família estar aqui, o que é que me fez não sair de Chapecó(TOMAZI. 2017)

Na visão dos produtores e financiadores o filme objetivava levantar a autoestima dos


chapecoenses e ao mesmo tempo expor a cidade para mundo do mercado e suas
possibilidades de realização através do trabalho, ou seja, “vender a cidade” como proferiu os
produtores do vídeo. Decididamente, mostrar uma cidade aberta a outros atores sociais,
irmanados pelo time de futebol, pelas relações comerciais e pelas oportunidades trabalho.
Neste sentido, ainda que o vídeo coloque outros atributos, atrativos como ponto
central do progresso, as pessoas de carne e osso, os personagens estão lá realizando suas
performances para produzir nos usuários sentimentos positivos.
Mas o que as pessoas pensam, todo mundo triste cabisbaixo com a tragédia. Mas ao
mesmo tempo pensamos: A cidade é muito mais que isso. As pessoas têm que ter
autoestima. Mas então o vídeo, foi pensado em duas formas: Mostrar a cidade pro
mundo, o que ela realmente é, o que ela realmente tem; e, segundo dá uma
autoestima para a pessoa e mostrar uma diversidade. (TECCHIO.2017)

Nesse caminhar, o poder no interior das representações não está totalmente sob
controle, dado que produtores, atores e usuários não estão no mesmo grau de entendimento
sobre o artefato, embora compartilhem em alguma medida de certo conhecimento comum
sobre o que está sendo mostrado e o que está sendo visto em outra medida o conflito pode está
presente, mesmo dissimulado. Nessa relação de produção de significados é que os atores
desafiam a neutralidade ao colocar-se como pertencente a outro lugar. “O meu mundo é aqui.”
por motivos materiais, mas expresso isso em minha língua materna, reafirmando um conjunto
de códigos, símbolos que remete a essência de pertencimento deslocada.
A luta por diferença é travada nesses códigos, ora percebidos como neutros, mas, ela
se constrói e reconstrói na relação social cotidiana da visibilidade e da representação que
muitas vezes não são de imediatos identificadas. Não estamos aqui procurando encontrar o
ponto de fissura entre o tradicional e o novo, mas mostrar que os conflitos são produzidos no
interior do consenso.
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4.2 VISUALIZAÇÕES E COMPARTILHAMENTOS: O QUE TEMOS A DIZER.

O vídeo fora lançado na rede social e na página oficial da prefeitura nas três versões
português, inglês e espanhol nos dias 14, 16 e 24 de maio de 2017, foram mais 137000
visualizações, com 952 compartilhamentos na rede social Facebook(PREFEITURA de
Chapecó, 2017), esses números mostram o trânsito no meio virtual. Porem, no canal
YouTube(PREFEITURA de Chapecó,2017), no período – entre 18/05/2017 a/10/2017 –, as
visualizações foram um pouco mais de quatrocentas (400), foram bem baixas na comparação
com o Facebook, numa primeira verificação e se confirmou.
A escolha de buscar esses canais de divulgação como forma de identificar a circulação
do vídeo e suas possíveis críticas, se deu pelo próprio contexto do nosso tempo em que as
mídias não impressas e curtas circulam de forma muito rápida e sua visibilidade, além de ser
instantânea e de fácil acesso pelo espectador(a), e, também pelo número de visualizações que
permitisse aferir o volume de acessos, ainda podemo conferir os comentários.
Uma explicação, possível, pode ser a praticidade com que a rede social tem em fazer
vídeos viralizarem a partir dos compartilhamentos entre círculos de amigos virtuais e assim
produzir popularidade, aceitação ou negação. Para a produtora do vídeo, assim como, para o
secretário municipal de imprensa o artefato foi um sucesso embora ressaltem que a
discrepância nos números de visualização em determinados canais de veiculação eram
esperados. O aporte financeiro dirigido a realização desse empreendimento foi válido para
ambos lados, produtor e financiador. Essa discrepância nos números pode ser explicado ,
Becker(1994), “o que é feito, comunicado e compreendido varia entre estes ambientes”
(BECKER. 1994,p.139), podendo também varia o tipo de público e a frequência com que
acessam a esses canais.
Chapecó não é… se for analisar cresceu nos 10, 12 anos de 120 mil para 210 mil
habitantes hoje, aumentamos a população, estamos entre as cidades que mais
cresceram. Um pouco a comunicação faz isso também, ela tem duas coisas, atrai
muito a visão, muitas coisas, é importante para Cidade, porque isso, porque além de
trazer pessoas ela traz investimento. Um dos objetivos. É claro que com a
comunicação a prefeitura tem um gasto, mas ela tem retorno e Chapecó tem tido
esse retorno(TECCHIO. 2017)

Os valores destinados a produção, divulgação e circulação do vídeo nas três versões,


inclusive uma versão para rádio, segundo a SEGOV, foi R$ 80.000,00(oitenta mil reais).
Diferente do que aconteceu com as “estátuas da discórdia” que, segundo o Dário
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Catarinense(2017), custaram mais de R$ 300,000,00 (trezentos mil reais), gerando conflito


entre executivo e legislativo sobre a legalidade do valor destinado e desconfiança na escolha
empresa realizadora. A câmara se posicionou contrária ao projeto por ter sido contratado sem
licitação colocando em suspeita o tal projeto, mas sem fazer críticas diretas ao monumento e
sim o processo de contratação.(DIÁRIO Catarinense. 2017).
O vídeo comemorativo, por outro lado, também realizado sem processo de vlicitação,
passou sem nenhum constrangimento em relação a contratação ou valor destinado, ou ainda
sobre a empresa realizadora. Faltaram também questionamento sobre sua forma ou os
personagens, ali presentes. A primeira vista, indica que houve um pacto silencioso devido à
positividade e diversidade exibidas no audiovisual ou pelo fato do vídeo externar uma
pretensão de ganhar o mundo para Chapecó, ao fim e ao cabo ganhou Chapecó para o mundo,
conforme externaliza, em entrevista, o diretor da Pró3comunicação, Márcio Tecchio(2017).
O cara vai pensar onde que ele vai investir. Ele vai investir aqui, que tem um povo
de autoestima, ele vai escolher este aqui ou vai em outro lugar? Esse é o foco, são os
três focos autoestima, que é o que? Fazer com que as pessoas também... Autoestima,
isso refletiu muito no número de compartilhamentos, visualizações não teve que
impulsionar o material na internet,não precisou .Tudo aquilo é orgânico, espontâneo.
Trazer uma nova perspectiva de quem faz Chapecó, então uma gente tá buscando
isso aí, quebrar um pouquinho fazer com que a cidade tenha mais projeção. Não só
porque ela produz frango e mata frango, mas ela tem futebol, ela tem turismo, tem
gastronomia é isso. Nós temos que abrir mais a cidade, isso traz dinheiro pra cidade.
Uma cidade mais diversa, quebrou um pouquinho dessa questão de que só foram os
italiano e alemão que fez a cidade, que só tem isso aqui(TECCHIO. 2017).

Na entrevista, os organizadores do vídeo, fez referência as mudanças na estética de


representação da cidade, como uma forma mais trabalhável de imagem e para sustentar esse
argumento que tangencia diversidade e mudança estética sem produzir conflitos sociais,
justifica a posição da agência em continuar diversificando as peças promocionais da cidade.
Afirma, ele, referindo-se ao outdoor da Feira da EFAPI, que tinha um adolescente negro de
corpo inteiro:1
Tem-se ainda essa questão dê... restrições ainda tu encontra, entendeu? Como vou
poder dizer...eu não tive criticas por usar o menino negro, mas, elogios de usar. Mas
assim, existe ainda,(sobre restrição a negros na cena chapecoense) na cidade tem
questões culturais, ainda que tem, tem restrições! A gente não pode negar as
restrições, é uma coisa que vai tempo, nós estamos numa região aqui de imigrantes
europeus.(TECCHIO. 2017)

1EFAPI – Exposição Feira Agropecuária, Industrial e Comercial de Chapecó


é o principal evento do município, considerada uma das maiores feiras multissetoriais do País. Em 2017 será
comemorada 50 anos da primeira edição do evento e o centenário do município. Disponível em:
http://turismo.sc.gov.br/evento/efapi-2017/ . Acessado em 27/01/2017.
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A longa citação expõe alguns temores em relação as figuras que compõe a cena da
nova estética das campanhas, mas percebemos que essa pretensa mudança repousa num
determinado momento, movido por sentimentos outros, que integrar os diferentes à cena da
cidade, mas sim, trazê-los para produzir riquezas para a cidade.
É muito cedo para saber se as mudanças na representação da cidade será permeada de
diversidade, ainda que restrita, ou será apenas pontual em razão da tragédia e a oportunidade
de mercado. Como objetivou Hall(2011), sobre as pertubações e as fronteiras que separam
identidades nacionais no mundo globalizado. “Num mundo de fronteiras rompidas e de
continuidades rompidas as velhas certezas e hierarquias da identidade,(...), tem sido posta em
questão”.(HALL, 2011,p. 84). O que se espera é que essa questão seja debatida continuamente
e promova a inclusão dos invisíveis na cena social da cidade.
Ora, a comunicação tem essa problemática de ligar as pessoas a certos comunicados
que se constituirão em sentido na vida cotidiana. A percepção pode ser diversa, de atração,
neutralidade ou repulsa, não necessariamente nessa ordem ou uma após outra, mas os sentidos
são produzidos na relação sociocultural conforme as expectativas subjetivas e objetivas dos
leitores os espectadores.
Para Howard S. Becker(1994): “Pessoas numa variedade de disciplinas intelectuais e
campos artísticos pensam saber algo sobre a sociedade que vale a pena contar para os outros,
e eles usam uma variedade de formas, mídias e meios para comunicar suas ideias e
descobertas”(BECKER. 1994, p.136). Essa reflexão é importante para entendermos o que o
vídeo quer comunicar e a quais públicos é destinado, no nosso caso, comunica a cidade para
além da cidade. Os modos de recepção do material visual depende dos sentimento que os
usuários dispõe para efetuar aceitação, neutralidade ou negação.

4.3 MENSAGENS E RETORNOS.

O vídeo faz uma mágica estética audiovisual ao colocar os diferentes, novos


estrangeiros, para produzir a identidade multicultural para uma cidade que chega aos 100anos
pensando na diversidade a partir da tragédia e da projeção mundial gerada. É no contexto da
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comoção que esses diferentes são apresentados, no vídeo, e parecem escapar aos olhares de
quem visualizou, curtiu ou compartilhou.
Nas suas três versões, foram mais 137500 visualizações. Na página da Prefeitura de
Chapecó (oficial) Facebook, (não estamos considerando o canal YOU TUBE devido a sua
baixa visualização no período aqui analisado), de 18 de maio de 2017 a 06 de outubro 2017. o
que sustenta a nossa afirmação sobre o que é visto nem sempre é o que é mostrado, foi falta
de questionamento ou interrogação sobre o formato do vídeo ou a ausência das etnias
legitimadas como formadora da identidade chapecoense. Para os produtores do vídeo, o
foco foi centrado nas redes sociais do Facebook, para que pudesse, segundo eles, medir como
seria a aceitação e circulação do vídeo.
Hoje em dia a questão é a rede social, o YouTube não é um local para quem vai
buscar realmente, a não ser que você impulsione você. A gente decidiu não
impulsionar, a gente não quis impulsionar no You tube, a gente quis que as pessoas
quisessem compartilhar para medir uma aceitação.(TECCHIO.2017)

A versão em português com mais 32 mil visualizações e 900 compartilhamentos, entre


os dias 14/05/2017 até 06/10/2017,. A versão em espanhol 101 mil visualizações e um pouco
mais de 30 compartilhamentos, a versão em inglês, apenas 4,4 mil visualizações no mesmo
período observado. O mas intrigante é que não há nessas visualizações ou compartilhamentos
nenhum comentário sobre o vídeo em si, uma critica ou elogio ao formato. O que há é uma
reverência ao aniversário da cidade ou marcação de outros amigos virtuais. Ou seja, que há
são elogios a cidade e felicitações pelo seu centenário. É como se o vídeo mostrasse
personagens que não aparecem, personagens que ficam invisíveis ao serem apresentados.
Para Becker(1994). “A forma e o conteúdo variam não somente por que a organização
social molda não somente o que é feito, mas também o que as pessoas querem que as
representações façam, que tarefa precisa ser realizada”(BECKER. 1994, p.139), é possível
que a organização das imagens sejam apresentadas de maneira a conduzir o olhar para
positivação dos atributos da cidade deslocando o sentimento de perda, provocado pela
tragédia para o sentimento de realizações e pertencimento a uma cidade que está a frente do
seu tempo..
A leitura do filme pelo publico é bastante complexa, do ponto de vista da análise, uma
vez que as manifestações sobre o filme em si, foram nulas ou sem questionamentos
direcionados ao formato, a estética e aos personagens e autores. Como reflete Becker(1994):
“A influência de orçamentos, o papel da profissionalização, que conhecimento o publico
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precisa ter para que uma representação seja efetiva e o que é eticamente permissível ao fazer
uma representação”(BECKER. 1994,p140). Esses aspectos parecem não ter escapado aos
proponentes financeiros, nem aos produtores, uma vez que vídeo circulara sem críticas, pelo
menos não identificamos nos comentários nenhuma exposição sobre a problemática no
interior do vídeo, como veiculação relativamente esperada.
O apelo a autoestima vem das frases que fazem o papel da unidade em torno do
desenvolvimento e sentimento de pertencimento a uma cidade que está “além do seu tempo. É
moderna, ousada e empreendedora. Gera milhares de empregos(...)”(CHAPECÓ meu mundo
é aqui, 2017), essas afirmações criam de início uma positividade no pertencimento e
identificação com a cidade, provocados pelos ideais de progresso.
As afirmativas esvaziam o olhar do público sobre a crítica e direcionam par o positivo
unitário e acrítico. Dentre as milhares de visualizações recebidas pelo vídeo, os comentários
eram sempre em parabenizar a cidade pelo seu centenário ou quando muito marcação de
outros amigos para que visualizassem o vídeo.
As frases contidas no roteiro do filme parecem fazer a mediação entre o mostrado e o
invisível levando o espectador reconhecer-se naquela realidade perene e ficticia. O mostrado
perpassa pela configuração do desenvolvimento, da simbologia do progresso e nas qualidades
positivas que fazem da cidade ser o centro das atenções entre os seus vizinhos.
O invisível aos olhos do espectador, está na apresentação dos personagens e suas
diferenças, mas essas diferenças são sufocadas pelos próprios personagens ao abrir mão,
temporariamente, de suas identidades para glorificar Chapecó, mesmo fazendo em suas
línguas nativas.
A neutralidade apresentada pela falta de críticas ou comentários sobre o vídeo não
pode ser encarados como um campo sem batalhas, pois, “há uma luta contínua e
necessariamente irregular e desigual por parte da cultura dominante, no sentido de
desorganizar e reorganizar a cultura popular; dentro de uma gama mais abrangentes de formas
dominantes”(HALL. 2009, p.239). E assim o vídeo veicula sem percalços.
A produção, comercial institucional, logrou êxito ao colocar a diversidade e, ao
mesmo tempo, esvaziar as críticas sobre a tradição, sobre a supressão dos europeus na cena
midiática, mas, isso não significa que o controle está dado e de uma vez por todas
estabelecidos seu limites. Os conflitos que resultantes da produção das identidades e das
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diferenças é próprio do desenvolvimento social. Mesmo esse combate acontecendo de forma


irregular e desigual as culturas minoritárias não desaparecerão, elas permanecem em luta.
Ao colocar os invisíveis no vídeo, também coloca outras identidades em evidência,
mesmo que os comentários não apontem para crítica ou uma interrogação, isso provoca
possibilidades de lutas por reconhecimento das diferenças. A produção social das identidades
estão presentes mesmo que não se levantem polêmicas no que está sendo mostrado.
Ora, se administração da cidade estava com suas preocupações voltadas para levantar
a autoestima, segundo a produtora, num primeiro olhar crítico sobre o filme, poderíamos
perguntar mas onde estão os sentimentos dos munícipes no filme? Porque a alusão ao time
dura apenas e no máximo 2(dois) segundos? Não há no roteiro algo que conecte a tragédia a
autoestima, pelo contrário, o filme surfa na onda da comoção e projeção que a tragédia
proporcionou para a cidade sem fazer menção ao acidente aéreo. A partir daí, constrói uma
narrativa na tentativa criar laços econômicos mais extensos e virtuosos aproveitando-se do
momento em que a cidade está sendo mostrada para o mundo. É nesse universo que está
sendo traçado a trajetória para trazer o mundo para Chapecó. “Visto que qualquer
representação deixam de lado elementos da realidade”(BECKER. 1994,p.141).
O filme coloca no mesmo plano o presente e o futuro, deixando emergir do passado
apenas sua identificação com o trabalho ligando esse termo ao desenvolvimento e ao
progresso. Aliás, esse é o tema sobre o qual repousa as falas dos personagens ao descentrar-se
de suas culturas para produzir o mundo aqui.
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5 CONCLUSÃO

O trabalho de pesquisa é algo importante para colocar em prática alguns


conhecimentos que adquirimos durante a graduação com intuito de poder refletir sobre
determinadas problemáticas a partir do raciocínio sociológico e trazermos autores e teorias
para dar credibilidade a nossa escrita. Muitas vezes as teorias falam por nós, deixando
invisíveis a reflexão e autonomia intelectual para que assim possa garantir a validade
científica.
A nossa intenção nesse exercício de pesquisa foi mostrar como as identidades e as
diferenças são e estão presentes em todas as relações de poder, mesmo aquelas que não
produzem constrangimentos ou lutas mais visíveis são perpassadas por um processo de
disputas e conflitos. O vídeo percorre o caminho da pretensa multiculturalidade, elegendo não
a diversidade de culturas, mas algumas culturas que foram eleitas, arbitrariamente, para
representarem a simbologia de uma cidade moderna e desenvolvida e que se desenvolve a
velocidade da luz, com diversidade sem conflitos. Mas a suposta neutralidade apresentada,
deixa escapar a luta por diferença e identidade, podemos perceber nas falas proferidas e
predeterminadas para os personagens. Que embora o mundo deles sejam aqui, seus idiomas
continuam sendo de suas identidades de origens. É nesse contexto que a luta se configura,
afirma-se o que é sem deixar de ser o que era.
Nesse trabalho, apresentamos que a formação da cidade de Chapecó-SC é fruto de
lutas, neutralização, negação e aniquilamento dos indesejáveis, autorizado pelas autoridades e
que esses conflitos moldaram a forma de pensar-se chapecoense, numa relação de negação
dos povos autóctones, que foram relegados, marginalizados e estigmatizados como inferiores.
Além disso, suas identidades foram invisibilizadas. Apresentamos que esses povos não
desapareceram e continuam em luta por identidade e diferença, pois, estão em constante
negociação por representação e reconhecimento.
As identidades e diferenças foi objeto reflexão a partir do vídeo,“Chapecó meu mundo
é aqui”, ao apresentar personagens que destoam da construção imaginada da cidade de
Chapecó, problematizamos como essa mudança podem produzir espaços de luta por
afirmação das identidades uma vez que não é possível controlar ou limitar os conflitos que
envolvem as duas dimensões importantes da vida social, cultura e identidade. Mostramos
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também que essa operação audiovisual não deu conta de problematizar, nem as identidades
contemporâneas aceitas, e nem as identidades negadas. O objetivo, primeiro, observado foi de
estabelecer uma operação que teve como foco atrair atenção para a cidade a partir de uma
pretensa diversidade cultural e oportunidades de trabalho, mas no o sentido direto foi vender a
cidade. Foi apresentado um misto de personagens que apenas tinham nome e declaravam seu
pertencimento/amor a Chapecó como atributos naturais chapecoenses.
No decorrer de nossa narrativa, também, ficou esboçado que o vídeo em si esvaziou as
críticas ao colocar a sequência desenvolvimento, modernidade e futuro em perspectiva e
assim produzir nos usuários a sensação de pertencimento ao interpretar a realidade exibida
correlacionando com sua própria realidade. A final, aqui é uma terra de imigrantes e ao
apresentar outros imigrantes como pertencentes a esse mundo, sem contudo colocar em risco
as identidades tradicionalmente aceita, o vídeo veiculou sem críticas.
No contexto em que foi pensado e divulgado o vídeo, a recepção alcançou uma marca
que considero boa e também considerada pelos produtores e financiadores, além disso, o
vídeo passou sem críticas contundentes ou interrogativas sobre o seu formato e seus
personagens, ou ainda, sobre o valor destinado a produção e veiculação.
A pretensa diversidade exposta através dos personagens não deram conta de
representar a diversidade da cidade de carne e osso, embora os personagens sejam parte dessa
diversidade, outras identidades foram negadas.. Nesse sentido, não há uma mudança na forma
como a cidade se ver, mas uma mudança na foram como se pretendeu mostrar a cidade.
Os conflitos por identidades e diferenças são dinâmicos em suas formas de
apresentação e representação, vimos que mesmo os personagens tendo passado despercebidos
em suas identidades e diferenças eles afirmavam quem eram e de onde eram. Essas
identidades e diferenças estão lá, estão ocupando um espaço e colocando-se em evidências,
negociando e afirmando. Não dá para dizer que de agora em diante essa diversidade vai ser
ampliada ou sufocada. O que dá para dizer é que as identidades e diferenças estão em luta e
conflito e não sessam por decreto.
Por fim, podemos observar que o processo de identificação, identidade e diferença se
dá na relação social e cultural. A cultura molda, não de uma vez por todas, mas de forma
inacabada como a cidade se organiza e se percebe no seu caminhar histórico e estão sujeitas a
abrir mão da tradição para que outras identidades e diferenças possam surgir e significar.
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