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Ficha de Leitura – Texto 10

O PARADIGMA
COMUNICACIONAL
Adriano Duarte Rodrigues
2º Semestre
2020/2021

UC: Comunicação e Linguagem


Curso: Jornalismo
Docente: Fernanda Bonacho

Filipa Amaro nº 13254


Flávia Gomes nº 13292
Inês Policarpo nº 13278
Mariana Madeira nº 13249
Marta Carvalho nº 12675
Índice

Introdução – Modalidades da Experiência ............................................... 2

A modalidade tradicional da experiência .................................................. 2

A modalidade moderna da experiência ..................................................... 4

• A automatização dos domínios e das dimensões da experiência....... 4

• A institucionalização e a autonomização da modalidade disciplinar


do saber .............................................................................................. 5

• A emergência da questão do fundamento e da questão comunicacional


............................................................................................................ 6
Introdução – Modalidades da Experiência
A investigação de Adriano Duarte Rodrigues defende que a experiência é um
processo complexo com componentes que se relacionam entre si. Estas componentes
podem ser agrupadas em três modalidades pragmáticas distintas que coexistem sempre
em qualquer tempo e sociedade: as modalidades originária, tradicional e moderna da
experiência. Cada uma destas modalidades referidas tem princípios e exigências
diferentes, mas, neste trabalho académico, vamos focar-nos nas diferenças e semelhanças
entre as duas últimas modalidades.

A modalidade tradicional da experiência


De acordo com Adriano Duarte Rodrigues, a modalidade tradicional da
experiência trata os saberes, crenças e convicções transmitidos de geração em geração
que nos são impostos de maneira indiscutível, pois não questionamos nem refletimos
acerca destes ensinamentos. Assim, percebemos que esta é a modalidade referente ao
senso comum que não se confunde com as normas sociais. A experiência tradicional é
também indissociável daquilo a que o autor dá o nome de lógica da sociabilidade.
Na origem destas convicções aceita-se que possa ter havido reflexão. Contudo,
correntemente, não se tenta refutar, questionar nem encontrar uma explicação racional
para aquilo que nos é dito, mas é possível adaptarmos estas crenças ao mundo atual. A
este processo correspondem diferentes formas de mitificação que se aceitam
simplesmente como uma verdade. É desta forma que nascem os mitos e rituais que
sustentam e garantem a continuidade das tradições.
Para ilustrar a sua tese, Adriano Duarte Rodrigues recorre à obra Ensaio Sobre a
Dádiva, de Marcel Mauss. Através do exemplo que remonta ao potlatch e ao kula - duas
tradições muito semelhantes praticadas em locais distantes - o autor conclui que os
processos da modalidade tradicional da experiência são responsáveis por criar, manter e
intensificar “os laços ou os vínculos de aliança entre os parceiros” (p. 81) de uma prática.
Desta forma, percebemos que esta modalidade valoriza o estabelecimento de um
compromisso. Uma ação que seja considerada desrespeitosa, como por exemplo recusar
dirigir, receber ou retribuir a palavra, constitui uma rutura “de aliança e, por conseguinte,
uma declaração de guerra” (p. 81). Conclui-se que a troca de palavra é a base estruturante
da sociabilidade. Mauss também alerta para o facto de determinadas instituições
compreenderem a totalidade dos domínios e das dimensões da experiência, atribuindo-
lhes, assim, o nome de fenómeno social total ou de sistema de prestações totais. Contudo,
não se encontra nas sociedades tradicionais uma questão comunicacional e uma
problematização das relações sociais e dos quadros do sentido da experiência.
De acordo com o autor, é na interação discursiva, ou seja, na oralidade, que se
funda a tradição partilhada pelos homens. Posto isto, é possível concluir que nenhum
indivíduo possui identidade autónoma visto que partilha uma sabedoria com a sociedade
em que se insere.
A tradição, que nos une enquanto comunidade, é o nome dado à maneira de
sustentar a existência de crenças que nos transmitem saberes que já não sabemos de onde
surgiram. É exatamente por não se saber de onde surgiram estas crenças e valores que os
aceitamos sem questionar.
“A modalidade tradicional da experiência não confunde os diferentes domínios e
as diferentes dimensões da experiência, embora não institua a sua autonomia.” (p.84). Isto
significa que embora não haja confusão entre os vários domínios e dimensões da
experiência, estes não são independentes. Assim, continua a existir, na experiência
tradicional, não só uma coexistência por parte dos três domínios (mundo natural, mundo
subjetivo e o mundo intersubjetivo), como também uma correlação entre as três
dimensões da mesma (juízos ontológicos, juízos éticos e juízos estéticos). É exatamente
esta prevalência da tradição ao longo dos anos que garante a relação entre os diferentes
domínios e dimensões da experiência e que, por sua vez, não deixa que do processo de
distinção dos mundos da experiência se gere a problemática comunicacional.
Nesta modalidade da experiência, a linguagem é encarada como necessária e
“eficaz na intervenção sobre os diferentes mundos” (p.84), pois é nela e através dela que
acontece a simbolização, sendo assim o meio de comunicação privilegiado. A esta
modalidade de tecnicidade própria da experiência tradicional dá-se o nome de tecnicidade
mágica.
No texto, o autor refere que a língua materna é a que “melhor representa a
modalidade tradicional da experiência'' (p.85). Desta forma, percebemos que a linguagem
não requer uma aprendizagem rígida das suas regras, mas sim instintiva, dependendo
apenas do funcionamento do nosso raciocínio lógico para a dominarmos. No entanto,
Adriano Duarte Rodrigues afirma que ao recusarmos as regras do funcionamento da
linguagem estamos a recusar não só a “experiência do mundo e de nós próprios” (p.85)
como também as relações com os demais utilizadores da nossa língua materna. Para além
disto, é através dela que recebemos todas as ferramentas de que necessitamos para
compreender tudo o que nos rodeia e que, posteriormente, compreendemos todos os
acontecimentos à nossa volta e o que pensamos sobre isso, ou seja, a nossa mediação do
mundo.
Também a experiência afetiva está relacionada com este conceito de experiência
tradicional na medida em que não conseguimos fundamentar racionalmente o afeto, visto
que nunca conseguiremos chegar a respostas concretas sobre o tema. “É da racionalidade
da modalidade tradicional da experiência que podemos dizer, como Pascal, que «o
coração tem razões que a razão desconhece.»” (p.85).

A modalidade moderna da experiência


Por sua vez, a modalidade moderna da experiência diz respeito a um processo de
dissociação com a tradição e, simultaneamente, a uma autonomização dos diferentes
domínios e dimensões da experiência. Isto leva a uma quebra entre a esfera da natureza e
a esfera da cultura.

A automatização dos domínios e das dimensões da experiência


“A experiência moderna consiste na autonomização do mundo natural como
domínio autónomo em relação aos domínios subjetivo e intersubjetivo” (p. 86). A
implementação da modernidade é acompanhada pela aprendizagem de um complexo jogo
de pronomes que é representado pela gramática. Ao adquirir o controlo sobre o domínio
da gramática é possível obter condições que permitem acesso à modalidade moderna da
experiência.
A autonomização da experiência do mundo natural permite que exista um
processo de instrumentalização do “mundo não humano” (p. 86). Um processo idêntico
de instrumentalização pode chegar ao domínio intersubjetivo, onde a racionalidade
moderna transforma esse domínio num “objecto de apropriação por parte de dispositivos
institucionais” (p. 86).
A partir do momento em que o processo de racionalização atinge eficácia
suficiente, o outro deixa de ser considerado como interlocutor para se tornar objeto
através da marca díctica da terceira pessoa gramatical: “ele”.
A institucionalização e a autonomização da modalidade disciplinar do saber
O processo de racionalização, que tem como objetivo tornar claro os mundos da
experiência, está ligado à emergência de uma nova modalidade de saber: a do saber
disciplinar. Como vimos anteriormente, a sabedoria tradicional é adquirida através do
testemunho, ou seja, não provém da aquisição de um conhecimento discursivamente
formulado. Sendo assim, é importante mencionar que se trata de “um processo que exige
a inserção numa comunidade total de vida” (p. 87).
Podemos assim referir que a aquisição do saber tradicional é muito diferente da
do saber disciplinar moderno, já que este se adquire através da adoção de métodos de
investigação dos fenómenos, ou seja, da aquisição de uma disciplina. Dessa forma,
podemos dizer que a formulação feita através do saber disciplinar é predominantemente
discursiva e especializada: “não envolve, (...) a totalidade dos domínios da experiência.”
(p. 87).

Como Adriano Duarte Rodrigues refere, enquanto que a sabedoria tradicional se


assenta numa experiência mais particular, o saber disciplinar moderno pretende ser
validado universalmente. Assim, o dizer e o fazer relacionado com os indivíduos
começam também a desempenhar funções distintas: ao dizer, na sabedoria tradicional,
atribui-se apenas uma função pragmática explícita; mas para o saber disciplinar moderno,
as regras pragmáticas que fazem o nosso discurso acabam por se autonomizar em relação
às regras do discurso em si. Isto acaba por fazer com que, no quadro da experiência
moderna, exista uma clara separação entre “saber dizer” e “saber fazer” (p. 88).

Contudo, estas funções pragmática e discursiva nem sempre são exclusivas do


saber moderno, como diz o autor. A função pragmática muitas vezes é independente da
função discursiva: a isto corresponde uma autonomização do campo científico
relativamente ao campo técnico. Percebe-se assim que a experiência moderna não é
propriamente exclusiva das sociedades modernas.

De facto, a rutura para com a modalidade tradicional da experiência resulta na


autonomização dos diferentes domínios da experiência, o que corresponde ao processo
de secularização ou de dessacralização da experiência. Max Weber chama a este processo
de “desencantamento”: a experiência moderna é desencantada na medida em que o
homem percebe que o seu destino é traçado só e apenas por si, não dependendo de
ninguém para além de si mesmo para tomar as suas decisões.
Esta experiência, ou, por outras palavras, a modernidade, é também o processo
onde o homem ganha consciência de que a experiência tradicional acaba por, de certa
forma, impossibilitar a autonomização individual.

A emergência da questão do fundamento e da questão comunicacional


Para a experiência moderna, o traço que se reveste de maior importância é o da
natureza específica da fundamentação e da legitimação da ação e do discurso. Isto
significa que a modernidade se foca nos fenómenos pertencentes ao “mundo da
experiência de si, ao mundo natural e ao mundo intersubjetivo” (p.92). Compreendemos
assim que, ao contrário da experiência tradicional, a experiência moderna recusa qualquer
preocupação com a tradição e com as crenças do passado.

No seio da experiência moderna destaca-se o ideal de racionalidade metódica. Este


ideal é responsável pela origem das dimensões da experiência e da diferenciação moderna
dos domínios. O papel desta diferenciação reveste-se de uma vasta importância sendo que
autonomiza e institucionaliza vários campos sociais.

Estando a experiência dividida em tantos campos diferentes, cada um com as suas


regras e ordens próprias, surge uma dificuldade em gerir todos estes campos e as suas
necessidades distintas e, por vezes, contraditórias. Os vários campos sociais mostram-se,
assim, difíceis de conciliar. Adriano Duarte Rodrigues atribui o nome de “questão
comunicacional” a esta dificuldade típica do quadro da modalidade moderna da
experiência.

A questão comunicacional debate-se igualmente sobre a própria natureza da


racionalidade que “serve de fundamento aos comportamentos e aos discursos” (p.92). O
autor explica que, desta forma, esta questão é responsável por romper com o
“desencantamento”: aquilo que antes era aceite por todos, sem qualquer tipo de discussão,
passa agora a ser questionado, leva os indivíduos a formular hipóteses e a duvidar. Passam
a seguir-se procedimentos metodológicos - já não se aceita, simplesmente.

Adriano Duarte Rodrigues apoia esta tese recorrendo a um excerto de Michel de


Certeau. O autor atribui a causa da imposição do problema comunicacional no mundo ao
facto de o homem ter dificuldade em se impor como sujeito autónomo de enunciação no
domínio da experiência tradicional. De Certeau atribui muita da culpa a uma “visão
redutora da experiência”. A verdade é que os dois autores concordam em afirmar que a
palavra foi fundamental para o homem, ao longo de várias épocas e culturas. Desta forma,
começaram a racionalizar e a ultrapassar os pressupostos da modalidade tradicional da
experiência.

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