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Ora, no que toca à ditadura portuguesa, num passado que é ainda muito recente, a
censura à imprensa era, sem dúvida, um instrumento de governação política do regime
português e de todos os outros regimes totalitários. Esta censura imposta aos meios de
comunicação social pode ser – e era – feita de formas diferentes: censura na rádio, na
televisão, e na imprensa escrita – os jornais. E é um poderoso e indispensável instrumento
de governação política porque dá a hipótese a quem está no poder de, através da
imposição de limitações à imprensa, impedir que se fomente a consciencialização da
população e que se ponha em causa a ideologia inerente ao regime em causa. Ideologia
esta que e também fomentada através da propaganda. Aliás, é-me praticamente
impossível não falar de propaganda, outro mecanismo de governação política, enquanto
falo de censura: a censura esconde aquilo que não se quer que seja visto – o regime é
pintado como algo essencial para a manutenção de um bom (e fictício) Portugal.
A censura à imprensa escrita teve também um impacto muito forte nos jornais
portugueses e os editores eram forçados a escrever (ou a não escrever) sobre determinados
assuntos de determinada forma. Aliás, existiam um conjunto de normas orientadoras que
eram impostas para o uso interno da direção para a censura da imprensa: “a primeira ideia
a ter em mente na censura de textos (notícias e outras formas de informação, relatórios,
artigos e comentários) deve ser… a unidade intrínseca de todos os territórios portugueses,
independentemente dos continentes em que estão localizados” (Castelo, 2017)3. Enfim,
para além da censura imposta pelo regime ditatorial, que tinha como principal objetivo
manter a opinião pública do lado do regime e não contra ele, existia, também, um certo
nível de autocensura. E esta tal autocensura era mais comum do que aquilo que nós
podemos pensar: até depois do fim da censura, os meios de comunicação sentiam
dificuldade em se desvincularem da escrita que fugia do “lápis azul” que lhes assombrou
durante décadas.
Tal como fiz questão de referir logo muito inicialmente, a propaganda e a censura
andam de mãos dadas. Afinal, “a propaganda e a censura fizeram parte do mesmo
processo de condicionamento e coerção do espírito e de autodeterminação cognitiva”
(Castelo, 2017).4 O Estado Novo precisava desesperantemente de que a população o
apoiasse e não se podia dar ao luxo de a comunicação social pôr em causa a sua ideologia,
1
Cadima, F. Rui, “A Televisão e a ditadura (1957 -1974) in Revista História, nº 29 ,2012, março
1997.
2
Cristo, Dina, “ A Informação”, Rádio em Portugal e o declínio do Regime de Salazar e
Caetano ( 1958 -1974). Coimbra: Minerva, 2005
3
Castelo, C., The Luso -Tropicalist Message of the Late Portuguese Empire, Media and
Portuguese Empire, London: Palgrave Macmillan, 2017.
4
Castelo, C., The Luso -Tropicalist Message of the Late Portuguese Empire, Media and
Portuguese Empire, London: Palgrave Macmillan, 2017.
então, a censura servia como bengala à propaganda. Estes dois instrumentos de
governação política complementam-se, já que a censura extermina aquilo que não
interessa ao regime, e a propaganda é o reflexo da imagem que o regime quer ver passada
ao público.
Por fim, gostaria de deixar uma última reflexão: será que, apesar de vivermos em
democracia e termos efetivamente uma legislação que proíba a censura e dê enfâse à
necessidade da liberdade de expressão e de imprensa, não somos também nós vítimas de
censura, ainda que de outra forma? Será que enquanto futura jornalista não pensarei duas
– ou mais vezes – sobre aquilo que escrevo? Isto não quer dizer que realmente não tenha
de refletir sobre aquilo que transmito ao público. Aqui estou a falar de ter cuidado com
aquilo que escrevo, receando repercussões no meu meio de trabalho. Será que não sofrerei
Bibliografia