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Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa

Processo: 312/09.8SILSB.L1-
9
Relator: TRIGO MESQUITA
Descritores: EXAME DE
DETECÇÃO DE
ÁLCOOL NO SANGUE
CONTRAPROVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06-05-2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário: I - Tendo o
condutor de um
veículo, depois de
submetido ao teste
de pesquisa de
álcool no sangue,
optado pela
realização da
contraprova, só a
utilização de outro
aparelho aprovado
assegura o
exercício de tal
direito.
II - O novo exame,
tendo sido
efectuado no
mesmo analisador
quantitativo,
traduz-se em
prova inválida na
medida em que
não foi respeitado
o direito à
contraprova, não
podendo por tal
razão ser
valorada.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 9ª Secção Criminal do Tribunal da
Relação de Lisboa

I.
No processo n.º 312/09.8 SILSB, do 2.º Juízo de
Pequena Instância Criminal de Lisboa, o arguido P…,
foi condenado em 12 meses de prisão e na pena
acessória de proibição de condução de veículos a
motor pelo período de 16 meses, por ter sido
considerado autor do crime de condução de veículo
em estado de embriaguez p. e p. pelos art.ºs. 292.º n.º 1
e 69.º n.º 1 al. a), ambos do Código Penal.
Desta decisão interpôs recurso, com os fundamentos
constantes da respectiva motivação concluindo, em
síntese, a sentença é nula por omissão de factos
essenciais para a boa decisão da causa por não constar
se as penas anteriormente aplicadas ao arguido já se
encontravam ou não extintas e ainda por utilização de
prova ilegal visto que a contra-prova requerida foi
realizada no mesmo aparelho utilizado pela P.S.P.
para o primeiro exame. Subsidiariamente, requer a
diminuição da pena aplicada e a posterior suspensão
da sua execução.
O Ministério Público junto do tribunal a quo
respondeu, concluindo pela consistência dos
argumentos aduzidos pelo arguido sobre a validade
dos exames efectuados, devendo o recurso ser
considerado procedente por razões formais; se assim
se não entender, pela improcedência substantiva do
recurso
Neste Tribunal o Exmº Procurador-Geral Adjunto
teve vista dos autos, emitindo parecer no sentido da
nulidade da contraprova.
Foi dispensado o cumprimento ao disposto no artigo
417.º n.º 2 do C.P.Penal.

II.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
***
Vem interposto o presente recurso pelo arguido P…,
da sentença do 2° Juízo, 2a Secção dos Juízos de
Pequena Instância Criminal de Lisboa, proferida em
05.05,2009, a fls. 72/79 — que o condenou pela prática
de um crime de Condução de Veículo Automóvel em
Estado de Embriaguez, p. e p. nos termos dos art°s
292°, n°1 e 69°, n°1, al. a), do Código Penal, na pena
de doze (12) meses de prisão e na pena acessória de
proibição de conduzir veículos a motor pelo período
de dezasseis (16) meses.
Compulsados os autos, nomeadamente o auto de
notícia, os talões de fls. 2 e a douta sentença recorrida
verifica-se que, de facto, o arguido efectuou o exame
de pesquisa de álcool no sangue e posterior exame de
contra-prova no mesmo aparelho DRAGER 7110
UKIII P — ARMA — 0068.
No art. 3.º do Dec. Regulamentar n.º 24/98 de 30/10 –
diploma que até há pouco tempo regia a matéria –
estava expressamente prevista a possibilidade de ser
utilizado o mesmo analisador para a contraprova,
ainda que a título excepcional e sob a condição de não
ser possível recorrer a outro aparelho no prazo de
quinze minutos após o primeiro teste.
Com a aprovação do novo Regulamento de
Fiscalização da Condução Sob Influência do Álcool ou
Substâncias Psicotrópicas, aprovado pela Lei n.º
18/07, de 17/05, deixou de existir norma idêntica
àquele art. 3.º, dispondo o actual art. 3.º do novo
regulamento que “os métodos e equipamentos previstos
na presente lei e disposições complementares, para a
realização dos exames de avaliação do estado de
influenciado pelo álcool, são aplicáveis à contraprova
prevista no n.º 3 do art. 153.º, do Código da Estrada”.
O Código da Estrada aprovado pelo DL 44/05 de 3/2
(que se encontra em vigor), dispõe, no seu art.º 153.º
n.º 3, que a contraprova subsequente a um exame com
resultado positivo “... deve ser realizada por um dos
seguintes meios, de acordo com a vontade do
examinado:
a) Novo exame, a efectuar através de aparelho
aprovado;
b) Análise de sangue.
e no n.º 4 expressamente se diz que no caso de opção
pelo novo exame através de ar expirado “... o
examinado deve ser de imediato, a ele sujeito e, se
necessário, conduzido a local onde o referido exame
possa ser efectuado.”
Resulta deste normativo, que o examinado, escolhendo
o meio de contraprova, se escolher novo exame por
aparelho aprovado, se necessário, deve ser conduzido
a local onde possa fazer esse exame. É necessário
quando não possa ser feito ali, ou seja, prima facie
quando não estejam reunidas as condições para o
efeito. Se na contraprova pudesse ser utilizado o
mesmo aparelho que havia sido utilizado no primeiro
teste, nunca seria necessária a deslocação a outro
local, pois o aparelho está ali, no local do exame Cfr
Ac da Relação de Lisboa, 5.ª secção rec. 974/08.3
SFLSB, relator Des. Dr. José Adriano.
É que a contraprova é uma garantia de defesa do
arguido, um meio pelo qual o examinando pode
impugnar o resultado apresentado pelo aparelho
utilizado no primeiro teste quantitativo. A utilização
do mesmo analisador na contraprova não daria
quaisquer garantias contra a eventual falta de
fiabilidade do aparelho, de cujo resultado o
examinando desconfia. Só a utilização de outro
aparelho certificado para o efeito poderá confirmar
(afastando as eventuais dúvidas), ou não, o resultado
anteriormente obtido.
Nos autos não está demonstrada a impossibilidade de
o arguido ser de imediato conduzido a local onde o
exame de contraprova pudesse ser realizado em
diferente aparelho – conforme exige hoje o art. 153.º,
n.º 4, do CE – nem a lei admite, após a entrada em
vigor da Lei 18/07, de 17/05, a utilização do mesmo
aparelho na contraprova.
Nessa conformidade, a contraprova realizada violou o
disposto no art. 153.º, n.ºs 3 al. a) e 4, do CE, não
podendo ser valorado o resultado obtido na aludida
contraprova, por força do disposto no art. 153.º, n.º 6,
do mesmo Código.
Pelo que inexiste meio de prova válido susceptível de
sustentar a conclusão do tribunal relativamente à
concreta taxa de álcool apresentada pelo arguido no
momento em que foi sujeito a controle, declarando-se
não provada a taxa de álcool no sangue que consta da
matéria de facto provada.
Na sequência de tal alteração fáctica, não se mostra
preenchido o tipo legal de crime imputado ao arguido,
pelo que deve este ser absolvido, conforme defendido,
no seu douto parecer, pelo MP junto deste Tribunal
da Relação.

III.
Pelo exposto delibera este tribunal ad quem julgar
procedente o presente recurso do arguido P…,
revogando-se a decisão recorrida e absolvendo-se
aquele do imputado crime.
Sem custas por não serem devidas.
Notifique.
Lisboa, 06 de Maio de 2010

Trigo Mesquita
Maria da Luz Baptista

Elaborado em computador e revisto pelo relator, o


primeiro signatário - artigo 94.º, n.º 2, do CPP

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