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Tomás de Aquino e os
argumentos para provar a
existência de Deus (ou sobre
as cinco vias)
Frank Wyllys Cabral Lira
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11/08/2018 Tomás de Aquino e os argumentos para provar a existência de Deus (ou sobre as cinco vias)
Introdução
De Frank Wyllys Cabral Lira[1].
Resumo
A Suma Teológica é possivelmente a obra mais famosa e estudada do filósofo Santo Tomás de
Aquino. Entretanto, na questão dois do primeiro livro (no início da Prima Parspara ser mais
exato) temos como título para o capítulo a seguinte pergunta: Deus existe? Para não somente
responder o capítulo como tentar responder a pergunta que o filósofo nos apresenta “cinco vias”
para provar a existência de Deus. Portanto, este trabalho dará foco a apresentação e explanação
dessas cinco vias argumentativas.
A Suma teológica é a sua obra mais conhecida e utilizada. O título de cada capítulo é um
questionamento, sendo desenvolvido nele mesmo a resposta para esse. Toda a sua obra segue
uma minuciosa estrutura argumentativa devido a influência de Aristóteles no pensamento do
filósofo – e isso será facilmente percebido quando explanarmos as cinco vias argumentativas de
Tomás. A Suma se dividirá em três grandes partes – pois é assim que a obra é habitualmente
apresentada: Prima Pars, Secunda Pars – a segunda parte se apresenta dividida em mais duas
partes e por isso a Suma contém habitualmente quatro volumes – e Tertia Pars. Os argumentos
de Tomás de Aquino a favor da existência de Deus está na Prima Pars, pois nela é que se trata de
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Por fim, a questão número dois do primeiro livro da Suma trata do seguinte problema filosófico:
Deus existe? Para Tomás de Aquino, sim, mas a existência dEle não é assim algo evidente a
ponto de somente haver feito a apreensão de seu termo ou definição para efetivamente saber
que existe – e aqui está a crítica de Tomás ao argumento ontológico. Tomás expõe inicialmente
na questão de número dois argumentos contra a existência de Deus – o primeiro argumento
apresentado, por exemplo, é sobre o problema do mal -, mostrando neles sua falta de cogência.
Entretanto não são somente apresentados argumentos a favor da inexistência de Deus: para
Tomás de Aquino é possível provar a existência de Deus através de “cinco vias”, cinco
argumentos. Todas as cinco vias necessitam de uma causa transcendente, pois sem tal ela não
poderia existir. São essas vias, no final, formas de chegar a um único lugar – pois o efeito existe,
portanto, deve existir uma causa. Uma única prova – que no caso é Deus – fundamentada por
cinco caminhos diferentes.
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Na segunda via é defendida a existência de uma causa primeira para conseguir explicar a cadeia
de causas que acontecem no mundo. Proposicionalmente falando, a segunda via pode ser assim
apresentada:
(3) Não é possível que se proceda até o infinito nas causas eficientes.
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Causa eficiente tem por definição algo produzir outro algo – e no mundo conseguimos observar
uma ordem de causas eficientes e seus efeitos como bem aponta a premissa (1). E se o último
algo produzir um terceiro algo e assim o ciclo continuar sucessivamente, assim teremos uma
ordem de causas eficientes. Se, por exemplo, X produz Y, X é a causa eficiente de Y. Y não pode
ser a causa eficiente de si mesmo, mas apenas efeito de uma causa eficiente (2) – que no caso é X.
Portanto, como observamos os efeitos, fazer um regresso ao infinito para chegar a causa
eficiente primeira torna-se impossível, pois assim como na primeira via, caso não assumíssemos
uma causa eficiente primeira, não haveria qualquer efeito posterior (3). Por fim, se existem
efeitos no mundo, é preciso que exista uma causa eficiente primeira, sendo ela Deus (4).
Na terceira via é defendida a existência de um ser necessário na qual dependem todos os seres
contingentes. Proposicionalmente falando, a terceira via pode ser assim apresentada:
No mundo podemos constatar as coisas contingentes, pois elas poderiam ser ou não ser/existir
ou não existir. Computadores por exemplo não existiam no passado, mas agora existem. O ser
humano pode facilmente estar dentro da categoria dos contingentes: uma hora existimos e numa
outra hora não mais (1). Se toda sorte de coisa é contingente, então em algum momento essas
deixarão de existir. Devido ao absurdo dessa consideração, é preciso de alguma coisa que seja
necessária para dar origem aos contingentes (2). Entretanto, regredir ao infinito nas coisas
necessárias é impossível, pois será preciso um necessário por si que seja a causa de outros
necessários (3). Essa primeira coisa necessária causadora de outras coisas é Deus (4).
A quarta via fala sobre a existência de um ser máximo na qual todos os seres presentes no
mundo participam no mesmo com Ele em diferentes graus de perfeição. Proposicionalmente
falando, a quarta via pode ser assim apresentada:
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(4) Logo, há algo que é a causa da existência para todas as coisas, que é Deus.
É facilmente observável que, no mundo, as coisas que chegam a nosso entendimento através de
nossos sentidos contém determinado grau de perfeição – seja esse grau para mais ou para menos
e segundo também nosso julgamento diante de tais coisas (1). Estando esses graus presentes
desde os objetos mais comuns até os sentimentos mais obscuros ou nobres, julgamos sobre tais
grais de tais coisas tendo como referência alguma coisa de grau máximo (2). Mas esses graus
máximos que temos como referência para determinada coisa é o que da existência de todos do
seu gênero (3). Ainda mais: se para cada coisa existente existe um grau máximo, portanto, deve
existir um Ser que contém todos os atributos e coisas possíveis em seus graus de perfeição no
máximo – e que seria geradora de todas as coisas em grau de perfeição menos (4). Esse Ser
é Deus.
Não somente Deus pode ter algo em seu grau de perfeição máximo como todo e qualquer ser
pode assim ter esse grau máximo, bastando participar da Suma Perfeição. Ou seja: uma coisa ou
ser somente consegue chegar a seu grau máximo de perfeição caso participe da perfeição do Ser
mais perfeito – pois Deus é fonte de toda coisa ou ser, transcendendo a ordem natural do mundo
devido a sua perfeição.
Na quinta e última via Tomás de Aquino argumenta sobre a existência de arquiteto inteligente
que governa, coordena ou dá uma finalidade a todas as coisas no mundo. Proposicionalmente
falando, a quinta via pode ser assim apresentada:
(3) Estas coisas não tendem para um fim a não ser que estejam sendo dirigidas por algo
inteligente.
(4) Logo, existe algo inteligente, que é Deus, que dirige as coisas a um fim.
Tomás aqui faz referência a finalidade das coisas do mundo. Existem certas coisas que não tem
inteligência e que, regidas pelas leis da natureza, são ordenadas e contém a finalidade certa (1).
Assim como a flecha, em sua finalidade única, é direcionada para seu alvo pelo arqueiro, as
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coisas não recebem uma finalidade arbitrária (2). Devido ao tamanho e a diversidade de coisas
presentes no mundo, não é possível observar a harmonia e ordem do mundo e a finalidade
específica presente em cada coisa carente de inteligência – ou até mesmo não a contendo – sem
pensar na possibilidade de haver uma inteligência por trás de tudo (3). Como existem essas
coisas ou seres de pouca ou nenhuma inteligência realizando seus atos com finalidade específica
e de forma harmoniosa com o outro que preenche o mundo, deve haver sim um ser inteligente
que governa, coordena e atribui as devidas finalidades a esses. Por fim, o Ser inteligente é
Deus (4).
Complementando as cinco vias
Ressalto aqui que, reunindo as informações presentes nas cinco vias, podemos montar um
singelo quadro onde comparamos Deus e suas Criaturas – pois como ele é o início e fim de todas
as coisas, também devemos perceber como as criaturas voltam-se para Ele:
Deus Criatu
Ser necessário Ser co
Imutável Mutáv
Infinito Finito
Causa de sua própria existência Sua ex
Com essa leitura explanada dos cinco argumentos propostos por Tomás de Aquino para provar a
existência de Deus – e assim cumprindo com o problema central da filosofia que segundo o
filósofo deve se assegurar de resolver os questionamentos sobre Ele -, fica nítida a influência que
Aristóteles exerceu através de seus escritos nesse filósofo medieval – principalmente na parte
metafísica e lógica. Contribuindo com a tradição medieval de conciliar a fé com a razão, Tomás
de Aquino abre mais uma porta para aqueles que desejam chegar a Deus (pois a primeira teve
origem em Santo Agostinho através da ontologia, valendo observar a influência que Platão teve
nele). É observável também a influência do uso da empiria, pois, diferente do acesso a Deus por
via da gnosiologia inata, temos Tomás de Aquino fazendo uso da empiria de Aristóteles. Ou seja:
é no mundo que vemos as provas da existência de Deus, pois todas as vias partem de uma
realidade verificável e concreta, tendo Tomás suas racionais demonstrações a posteriori. Perceba
que Tomás de Aquino não pretendeu dizer o que era Deus, mas apenas provar sua existência.
Porém, alguns pontos importantes antecedem as cinco vias. Fazer perceber todo uma gama de
conclusões e raciocínios que nos levam a provar a existência de Deus na obra de Tomás de
Aquino é essencial para um melhor entendimento delas. Logo, um retorno a coisas anteriores –
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como o contato de Tomás com a filosofia aristotélica e o desenvolvimento de parte da sua teoria
do conhecimento – será realizada. Como bem disse Carlos Lopes de Mattos:
O papado controlava a organização das universidades e contribuía, para o lado dos teólogos, o
embate existente entre os dialéticos (filósofos) e teólogos. A prerrogativa era que a igreja
considerava a dialética uma ferramenta auxiliar para os teólogos, devendo estes não ostentá-la.
Além disso, um vetor que acentuou mais os conflitos da época foram as divulgações da tradução
da filosofia aristotélica. A existência de vários conflitos dessa filosofia com os dogmas da igreja
levaram essa última a uma censura, porém não bem sucedida. Entretanto, visando a
cristianização da filosofia aristotélica, ela “[…] só veio a se tornar possível graças aos espírito
analítico, à capacidade de ordenação metódica e à habilidade dialética de Tomás de Aquino, que
aliava a um profundo sentimento de fé cristã”[4].
O pulo do gato de Aquino está justamente nessa interpretação. Ele, tendo em vista o princípio do
realismo ontológico, conclui que as criaturas não existem por elas mesmas. Isso ocorre devida a
definição de essência das criaturas, não resultar em sua existência, restando atribuir a algo ou
alguma coisa uma origem e existência. Logo, apenas Deus contém a identidade entre essência e
existência (pois existe por si e é criador e fundamento de todas as coisas e de suas existências
contingentes).
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também a possibilidade por ele levantada para demonstrar a existência de Deus, temos, como
resultado último, as cinco vias. Tais objetivam uma única coisa: provar a existência de Deus.
Partindo de uma exposição destacado por Sávio Laet de Barros Campos da teoria do
conhecimento de São Tomás, é observável que temos: um conhecimento sensível, um
conhecimento intelectivo e um conhecimento humano de Deus.
Conhecimento Sensível
O conhecimento é originado pelos nossos sentidos. Sabendo que o homem eleva-se através do
sensível ao inteligível, nosso saber advindo dos sentidos serve de base para essa elevação. Vale
detalhar que o ser humano nasce sem conhecimento –sendo desconsiderado todo conhecimento
inato de coisas e criaturas -, mas com a faculdade/potência de conhecer. Aquino pressupõe que
os nossos sentidos não nos enganam, pois é a nossa forma de entrar em contato com o real. E se
os mesmos são enganosos, nosso conhecimento também o é – o senso comum é que está
passível de erro, não os sentidos. Além disso tudo, os nossos sentidos apreendem as qualidades
sensíveis dos objetos, Portanto, através dessas qualidades, conseguimos diferenciar os objetos
similares por exemplo ou diferenciar objetos de qualidades similares. Mas são muitas as
qualidades que um objeto tem Por isso, temos o senso comum, que nos ajuda a reunir no
intelecto essas qualidades e associá-las a um ou mais objetos. Esses objetos são a imagem da
própria coisa e esta é guardada na imaginação.
Conhecimento Intelectivo
Para que haja um conhecimento intelectivo, é necessário a presença de um corpo e uma alma.
Assim, o intelecto deve voltar-se ao sensível para saber, pois só há saber intelectivo com a
presença do sensitivo. Portanto, além de termos uma faculdade intelectiva, ela nos leva (através
das qualidades das matérias do sensível) a uma universalidade dos objetos. Por isso, o objetivo
do nosso intelecto é conhecer a universalidade e natureza dos objetos sensíveis. Tomás distingue
duas funções do intelecto (devidamente nomeadas):
Por conseguinte, “[…] o conceito é o meio no qual conhecemos o objeto, pois o conhecimento
do conceito só ocorre por reflexão sobre o próprio ato cognitivo”[7].
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Como a verdade revelada é, não sendo preciso demonstrá-la, sempre se partirá da posição de que
Deus existe (para que a revelação seja válida). Porém, não temos isso assegurado através de uma
verdade natural, onde partimos da criaturas e ascendemos a Ele. Por isso a importância em
provar a existência de Deus, pois qualquer conteúdo sobre ele, sem o respaldo de sua existência,
não terá validade. Segue-se que a prova da existência de Deus tem que ser feita dentro dos
limites do conhecimento sensitivo. Dele, apreenderemos os efeitos que Deus gera, sendo o
intelecto responsável por ruminar esses e, através da sua busca da natureza e universalidade,
gerar um conceito sobre Deus e suas qualidades.
Para que a proposição “Deus existe” seja provada, será necessário compreender o que é, para
Tomás de Aquino, evidência e demonstração. Evidência é
“[…] o que pode não ser visto. Um objeto evidente é de tal forma manifesto à
inteligência que esta não pode negá-la. Na evidência não há nada para se
demonstrar. A necessidade da demonstração nasce quando uma verdade não pode
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Conclusão e Referências
A filosofia tomasiana é rica e vasta. E, nesse artigo, vislumbramos um pouco dela – mais
precisamente na prova da existência de Deus. As cinco vias, que tem por objetivo apresentar 5
provas relativamente distintas sobre a existência de Deus, são mais ricas do que a realização de
uma leitura direta delas poderia imaginar. Muitos são os pontos efetivamente demonstrados
entre as vias que fazem referência ao trecho da teoria do conhecimento desenvolvida por Tomás
de Aquino. Por fim, visando não somente apresentar as cinco vias, procurei complementá-las
através de um desenvolvimento minimamente necessário.
Referências
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TORREL, Jean-Pierre. Iniciação a Santo Tomás de Aquino: Sua pessoa e sua obra. Trad. Luiz
Paulo Rouanet. 2ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 1999. P. 174-176.
MATTOS, Carlos Lopes de. Sto. Tomás de Aquino, Dante Alighieri (Os pensadores). Disponível
em http://copyfight.me/Acervo/livros/AQUINO,%20Tomas%20-%20Dante%20-
http://copyfight.me/Acervo/livros/AQUINO,%20Tomas%20-%20Dante%20-
http://copyfight.me/Acervo/livros/AQUINO,%20Tomas%20-%20Dante%20-
%20Colec%CC%A7a%CC%83o%20Os%20Pensadores.pdf
%20Colec%CC%A7a%CC%83o%20Os%20Pensadores.pdf.
%20Colec%CC%A7a%CC%83o%20Os%20Pensadores.pdf Acesso em: 05 de Fevereiro de 2015.
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