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Atenção na redação, para que haja punição.

O texto “inaplicabilidade da Lei Seca”, de autoria de Igor Araújo de Arruda, traz uma visão
crítica acerca da Lei Nº 11.705/08, popularmente conhecida como “Lei Seca”, que visa cessar de
uma vez por todas o uso de álcool ou outra substância psicoativa por condutores de veículos
automotores. Essa Lei alterou o Código de Trânsito Brasileiro – CTB (Lei Nº 9.503/97), quando fez
modificação à redação originária do seu artigo 306, o qual trata do Crime de Embriaguez ao Volante.
Antes, a condução de veículo automotor, em via pública, sob a influência de álcool ou
substância de efeito análogo, que expusesse a dano potencial a incolumidade de outros,
independentemente de demonstração técnica ou científica precisa da concentração deste no sangue,
já caracterizava esse delito de trânsito. Visto que, à época, entendia-se ser um crime de perigo
concreto. Porém, após a modificação na redação do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, a
condução veicular junto à prevista concentração de álcool, já caracteriza o crime do artigo
anteriormente citado, sendo irrelevante considerar o perigo causado concretamente.
O autor ressalta que, o legislador ao fazer alterações na redação do dispositivo legal, cometeu
falhas técnicas e estruturais que resultaram numa afronta ao Princípio Constitucional da
Inexigibilidade de Autoincriminação, decorrente do Direito Constitucional ao Silêncio (art. 5º, inciso
LXIII, da Constituição Federal de 1988 e art. 186, parágrafo único, do Código de Processo Penal).
Princípio esse, que prevê que ninguém será obrigado e constrangido a produzir prova contra si
mesmo, como forma de se incriminar (direito à autodefesa passiva).
O legislador ainda “esqueceu” de que havendo recusa por parte dos condutores é impossível
provar a existência da exata concentração de álcool no sangue, ao passo que no passado, a simples
constatação da direção sob a influência alcoólica já seria suficiente para caracterizar o delito. Tendo,
agora, uma delimitação da prova à quantificação etílica, não podem os agentes de trânsito e policiais
(em amplo sentido) constranger ou forçar condutores a realizarem o exame de alcoolemia de modo a
provar a sua conduta criminosa, sob pena de caracterização do crime de abuso de autoridade dos
agentes públicos (artigo 4º, “b”, da Lei Nº 4.898/65), visto que aqueles estão salvaguardados por
força de princípio constitucional supracitado.
Percebe-se que, em virtude do erro técnico dos Congressistas, o Crime de Embriaguez ao
Volante torna-se sem qualquer efeito, uma vez que os condutores poderão se negar ao exame técnico,
regulamentado atualmente no Decreto Nº 6.488/08, sem maiores repercussões no âmbito criminal,
visto que o fato criminoso jamais poderá ser presumido ou demonstrado supletivamente. No entanto,
essa recusa terá conseqüências no âmbito administrativo, podendo o condutor responder por infração
de trânsito nos termos dos artigos 277, § 3º, e 165 do CTB, posto que, não se aplica o Princípio da
Não Incriminação.
Em apoio aos seus argumentos o autor cita uma decisão judicial recentemente deferida pelo
Supremo Tribunal de Justiça, no julgamento do Habeas Corpus Nº 166.377/SP (2010/0050942-8)
ressaltando que a expressão utilizada na atual redação do artigo 306, do CTB, é considerada como
elementar do crime, exigindo, pois, a exata demonstração da quantidade de álcool no sangue pelos
órgãos acusadores (ônus probatório incumbe ao Sujeito Acusador), sob pena de não se conseguir
provar o delito de trânsito. Ficando claro que o Poder Judiciário afirma que não pode se furtar das
garantias constitucionais e legais conferidas aos cidadãos de um Estado Democrático de Direito.
O autor é feliz quando expõe duas faltas graves: o desrespeito a um princípio constitucional e a
desatenção para com a redação de norma jurídica tão importante para questão tão sensível. Exigindo
do Legislador que, ao perceber a impossibilidade de aplicação do dispositivo legal, atente-se ao
equívoco cometido, retificando a norma penal incriminadora de forma a atender aos reclamos sociais
da falta de segurança no trânsito brasileiro.

Nádler Guilherme é graduando do curso de Direito da AESGA.

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