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Alunos: João Raphael R C Sousa / Gilvan de Barros Pinangé Neto

EXCELENTISSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA “XXX” VARA


CRIMINAL DA COMARCA DE “XXX”

PROCESSO Nº “...”

Astolfo, já qualificado nos autos do processo em epigrafe, vem por meio do seu
advogado constituído através da Procuração em anexo, apresentar à Vossa Excelência, com
fulcro nos arts. 403, §3º c/c 404 do Código de Processo Penal (CPP), ALEGAÇÕES FINAIS
EM FORMA DE MEMORIAIS, pelas seguintes razões fáticas e jurídicas:

I - DOS FATOS

Narram os autos que Astolfo, idoso e réu primário, estava em sua casa, residência
humilde na comunidade “Favela da Zebra” em Goiânia-Go, quando foi surpreendido pela visita
do chefe de tráfico vulgarmente conhecido como “Russo”.
Armado, Russo exigiu que Astolfo realizasse o transporte de 50g de cocaína para outro
traficante em um posto de gasolina, sob pena de ser expulso da residência e da comunidade em
razão da negativa.
Coagido, Astolfo acatou a ordem. Contudo, já dentro do automóvel e em direção ao
posto, foi abordado por policiais militares, sendo a droga encontrada e apreendida.
O acusado foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei nº
11.343/06. Ainda que preso em flagrante, recebeu a concessão de liberdade provisória.
Durante a audiência de instrução e julgamento os fatos narrados na denúncia foram
confirmados pelos policiais militares, ressalvando que o transporte ocorreu por exigência de
Russo.
Durante o interrogatório, Astolfo reafirmou os fatos narrados, enfatizando novamente
que o transporte da droga só ocorreu por coação do chefe do tráfico, sob pena de ser expulso
do único lugar onde morou a vida inteira, correndo o risco de ter que viver na rua, pois não
possuía familiares e/ou fora do local.
Após juntada de folha de antecedentes criminais do réu e laudo de exame pericial, os
autos foram remetidos ao Ministério Público (MP), que pugnou pela condenação do acusado
nos termos exatos da denúncia.

II - DO DIREITO

1) Nulidade processual

Preliminarmente é necessário o reconhecimento da nulidade processual, em virtude da


não concessão de prazo para apresentação da Resposta Escrita à Acusação.
Nos termos dos arts. 396 e 396-A do CPP, a ausência de Resposta à Acusação
compromete a garantia do contraditório e ampla defesa, conforme descrito no art. 5º, LV da
Constituição Federal (CF), assim como a irrenunciável defesa técnica, nos termos do art. 564,
III, “e” do CPP.
No caso concreto, o acusado só pode manifestar-se por escrito nos autos nas Alegações
Finais por Memoriais, após debate em audiência de instrução. Não obstante, entendem os
Tribunais Superiores que a apresentação da defesa escrita é peça indispensável ao
prosseguimento do feito, devendo o Juiz nomear defensor dativo após inércia da parte
interessada de prazo razoável da intimação.

2) Coação moral irresistível

Subsidiariamente, caso V. Exa. não acate a tese anterior, no mérito pugna-se pela
Absolvição do réu, baseada na excludente de culpabilidade por coação moral irresistível.
A fim de absolver, deve existir certeza de juízo acerca da excludente de ilicitude, porém
a dúvida absolve o réu. Entretanto, prescreve o art. 22, caput, do Código Penal (CP), bem como
a doutrina majoritária, que a coação moral, quando irresistível, torna a vontade viciada.
No caso concreto, ainda que o acusado tenha tentado praticar fato típico e ilícito, atuou
justificado pela coação irresistível, isto é, tinha sua vontade viciada ao tempo do crime. Não
obstante, foi violentamente ameaçado de despejo de sua única moradia pelo traficante, agente
coator munido de arma de fogo.
Observa-se que os fatos são preceituados como excludente de culpabilidade, coação
moral irresistível e a inexigibilidade de conduta diversa, conforme narrativa do art. 397 do CPP.
Ainda que o acusado tenha incidido em conduta prescrita em lei como crime, dadas as
circunstâncias narradas não teve alternativa de proceder de forma diversa, mesmo imputável e
plenamente consciente da ilicitude do fato.
Temos o seguinte entendimento jurisprudencial sobre o tema

HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. ATIPICIDADE.


COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-
PROBATÓRIA.
VIA IMPRÓPRIA. REGIME INICIAL FECHADO. OBRIGATORIEDADE
AFASTADA.
APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ART. 33 C.C. O ART. 59, AMBOS DO CÓDIGO
PENAL. INTELIGÊNCIA DAS SÚMULAS N.os 440 DESTE SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA E 719 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR SANÇÕES
RESTRITIVAS DE DIREITOS.
POSSIBILIDADE, EM TESE. RESOLUÇÃO N.º 05/2012, DO SENADO
FEDERAL.
ORDEM DE HABEAS CORPUS PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESSA
EXTENSÃO, PARCIALMENTE CONCEDIDA.
1. A Paciente foi condenada à pena de 01 ano, 11 meses e 10 dias de reclusão, e 194
dias-multa, como incursa no art. 33, § 4.º, c.c. o art. 40, inciso III, ambos da Lei n.º
11.343/06, porque presa em flagrante ao tentar ingressar em um estabelecimento
prisional com 164,1g de maconha.
2. Reconhecer que a Paciente praticou o crime de tráfico ilícito de entorpecentes sob
coação moral irresistível, porque teria sido ameaçada, implica, necessariamente,
reexame da matéria fático-probatória constante dos autos, impossível na via estreita
do habeas corpus.
3. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o HC 111.840/ES, afastou a obrigatoriedade
do regime prisional fechado para os condenados por crimes hediondos e equiparados,
devendo-se observar, para a fixação do regime inicial de cumprimento de pena, o
disposto no art. 33 c.c. o art. 59, ambos do Código Penal. Inteligência das Súmulas
n.os 440 do Superior Tribunal de Justiça e 719 do Supremo Tribunal Federal.
4. A proibição da conversão da pena privativa de liberdade em sanções restritivas de
direitos foi afastada pela Suprema Corte, por ocasião do julgamento do HC
97.256/RS, que ensejou a edição da Resolução n.º 05/2012, do Senado Federal, pela
qual foi suspensa a execução da parte final do art. 33, § 4.º, da Lei n.º 11.343/2006.
5. No caso, a fixação do regime inicial fechado e a negativa de substituição da pena
privativa de liberdade por restritivas de direitos fundaram-se unicamente na vedação
legal.
6. Ordem de habeas corpus parcialmente conhecida e, nessa extensão, concedida em
parte, para determinar ao Juízo das Execuções que proceda à fixação do regime
prisional adequado à espécie, bem como que examine o preenchimento pela Paciente
dos requisitos necessários à substituição da pena privativa de liberdade por sanções
restritivas de direitos, à luz dos elementos constantes nos autos. 1

Em relação à “Coação Moral Irresistível”, o célebre doutrinador Masson (2008, p. 537)


postula que “A lei não pode impor às pessoas o dever de atuar de modo heroico. Destarte, se
presente uma ameaça séria, grave e irresistível, não é razoável exigir o cumprimento literal pelo
coagido do direito positivo, sob pena de suportar riscos que o Direito não será hábil a reparar”.2

1
(HC 240.837/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 03/10/2013, DJe 11/10/2013).
2
MASSON, Cleber Rogério. Direito penal esquematizado – parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
A coação moral irresistível afasta a culpabilidade do coagido (autor de um fato típico
e ilícito). Não há, contudo, impunidade: pelo crime responde somente o coator. Trata-
se de manifestação da autoria mediata, pois o coator valeu-se de uma pessoa sem
culpabilidade (inexigibilidade de conduta diversa) para realizar uma infração penal.
(MASSON, 2008, p. 538).

3) Reconhecimento das atenuantes

Caso o entendimento de V. Exa. seja pelo prosseguimento do procedimento, pugna-se


pela conversão da pena restritiva de liberdade em pena restritiva de direitos (Art. 44,I, II e III,
CP), fundamentada na aplicação das atenuantes relativas à idade ao tempo do crime e confissão
voluntária do réu (Art. 65, I e II, “d”, CP); aplicação das causas de redução da pena relativas à
condição primária e com bons antecedentes do réu (Art. 33, §4º, lei nº 11.343/06), não obstante
a modalidade tentada e não consumada do crime (Art. 14, II, parágrafo único, CP).
Conforme entendimento jurisprudencial, o STF afastou a obrigatoriedade do regime
prisional fechado para os condenados por crimes hediondos e equiparados, observando-se
durante a fixação do regime inicial de cumprimento da pena os dispositivos arts. 33 c/c 59 do
CP. Portanto, é pacífico na Suprema Corte tal decisão, ainda segundo inteligência das Súmulas
número 440 do STJ e 719 do STF.
Caso V. Exa. não acate nenhuma das teses anteriores, pugna-se pela concessão do sursis
etário (Art. 77, §2º, CP), tendo o réu 74 anos no tempo do crime.

III - DO PEDIDO

Ante o exposto, requer a Vossa Excelência o deferimento dos seguintes pedidos:


1) Preliminarmente, a declaração de nulidade do processo pelo prejuízo ocasionado em
face da não concessão de prazo para apresentação da Resposta Escrita à Acusação, nos
termos do art. 564, III, “e” do CPP.
2) Subsidiariamente, no mérito pugna-se pela Absolvição do réu, nos termos do art. 397,
II do CPP, já que é patente a presença da excludente de culpabilidade da Coação Moral
Irresistível (art. 22 do CP).
3) Caso o entendimento de V. Exa. seja pelo prosseguimento do procedimento, pugna-se
pela conversão da pena restritiva de liberdade em pena restritiva de direitos (Art. 44,I,
II e III, CP), fundamentada na aplicação dos atenuantes relativos à idade ao tempo do
crime e confissão voluntária do réu (Art. 65, I e II, “d”, CP); aplicação das causas de
redução da pena relativas à condição primária e com bons antecedentes do réu (Art. 33,
§4º, lei nº 11.343/06), não obstante a modalidade tentada e não consumada do crime
(Art. 14, II, parágrafo único, CP).
4) Caso V. Exa. não acate nenhuma das teses anteriores, pugna-se pela concessão do sursis
etário (Art. 77, §2º, CP).

Nesses termos pede deferimento.

Goiânia, 11 de março de 2015

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Advogado “...”
OAB “...”

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