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Teoria e Prática do Tribunal do Júri:

COMO ATUAR PERANTE A MAIS DEMOCRÁTICA


INSTITUIÇÃO JURÍDICA BRASILEIRA

Prof. Ms. Rodrigo Lustosa Victor


Evandro Lins e Silva

“Ao Tribunal do Júri, ponto de partida,


escola da democracia, o povo na Justiça,
onde aprendi que o direito deve servir à
vida”.
1. O JÚRI NO TEMPO: BREVES
RECORTES HISTÓRICOS

 1215 o ponto de partida: Magna Carta (Magna


Charta Libertatum) – Art. 48: [...] Ninguém poderá
ser detido, preso ou despojado de seus bens,
costumes e liberdades, senão em virtude do
julgamento de seus pares [...].
1.1. As declarações de 1776 e 1789: o
júri na “era dos direitos”.

 O espraiamento do júri pelo mundo se deu a


partir da segunda metade do século XVIII,
justamente quando a ideia de que existe um
direito universal apresentou significativos
avanços, saltando para o campo do direito
positivo, provido de eficácia jurídica.
1.1.1 O júri nos EUA

 1776 a Declaração de Direitos do Bom Povo


da Virgínia” (artigo VIII): [...] em todo
processo criminal incluídos naqueles em que
se pede a pena capital, o acusado tem
direito ... a ser julgado por um júri imparcial
de doze homens [...].
1.1.2 Ilustrando a importância do júri
nos EUA

 EMENDA VI - Em todos os processos criminais, o


acusado terá direito a um julgamento rápido e
público, por um júri imparcial [...] e de ser
defendido por um advogado.
 Emenda VII - Nos processos de direito
consuetudinário, quando o valor da causa
exceder vinte dólares, será garantido o
direito de julgamento por júri [...]
 Lysander Spooner (Ensaio sobre o julgamento
pelo júri):

[...] A razão da preferência pelo julgamento ‘pela


comunidade’ ou pelo povo, ao revés de um
julgamento pelo Estado, é proteger o acusado
contra toda espécie de opressão do próprio Estado
[...]
1.1.3 O júri na França
 Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de
1789 : não há referência ao júri.

- Decreto de 30 de Abril de 1790.

- Código de Instrução Criminal de 1808.


1.2.1 Ilustrando a importância do júri
na França
 António Macieira (Do júri criminal. Lisboa: Imprensa
Nacional, 1914):
[...] A revolução francesa viu o mal maior. Tentou
cortá-lo pela raiz. As penas eram arbitrárias? O
juiz omnipotente? [...] desdobre-se a força
do juiz, fiscalizando-o pela acção popular... Daí a
instituição do júri [...].
1.3 O júri no Brasil: na onda do
liberalismo político

 Lei de Imprensa (18 de junho de 1822);

 A Constituição do Império (1824);

 Código Criminal do Império (1832).


1.3.1 Os períodos de exceção e
o Tribunal do Júri: uma relação
difícil
 Durante os dois períodos de exceção mais recentes
que ocorreram no Brasil, Estado Novo (1937 - 1945) e
Regime Militar (1964 - 1985), embora não se tenha
banido a instituição do júri, dela se subtraiu a
soberania, com nítido propósito de enfraquecê-la.

- Decreto 167 de 1938


- Emenda Constitucional n. 01 de 1969
1.3.2 Questões para debate

 A aura democrática do Tribunal do Júri e a


excessiva preocupação dos governos ditatoriais
com o júri.
“A Tribuna” (22 de outubro de 1977):

 [...] JÚRI ABSOLVE FLEURY DAS ACUSAÇÕES DO


ESQUADRÃO. O delegado Sérgio Fernando
Paranhos foi absolvido pelo Tribunal Popular de
Barueri, por unanimidade, das acusações de
chefiar o Esquadrão da Morte [...]
2. TRIBUNAL DO JÚRI: CONCEITO E POSIÇÃO
CONSTITUCIONAL

 Conceito: o Tribunal do Júri é órgão da justiça


comum, estadual ou federal, composto por 25
jurados e um juiz de direito que é seu
presidente.
 Quanto a sua posição na Constituição Federal : o júri
se encontra previsto no artigo artigo 5º, inciso XXXVIII,
da Constituição, inserto no TÍTULO II - Dos Direitos e
Garantias Fundamentais e CAPÍTULO I DOS DIREITOS E
DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS.

 Entre nós, portanto, o júri se insere entre as


chamadas cláusulas pétreas, conforme o disposto no
art. 60, §4º, inciso IV, da Constituição Federal.
2.1 O júri como garantia humana
fundamental

 “O Tribunal do Júri é, apenas, uma garantia


humana fundamental formal. Em hipótese
alguma, pode-se considerá-lo garantia
individual essencial” (Guilherme de Souza Nucci, in Tribunal do
Júri, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p.39)
2.2 Princípios constitucionais próprios do júri (art.
5º, inciso XXXVIII, CF)

2.2.1 Princípio da Defesa Plena: existe diferença


entre defesa ampla e defesa plena?

- Os jurados são leigos em direito;


- Argumentos extrajurídicos podem ser decisivos;
- As teses da autodefesa devem ser submetidas
a apreciação do Conselho de Sentença.
 Art. 482 (...) Omissis
 Parágrafo único. Os quesitos serão redigidos em
proposições afirmativas, simples e distintas, de
modo que cada um deles possa ser respondido
com suficiente clareza e necessária precisão. Na
sua elaboração, o presidente levará em conta os
termos da pronúncia ou das decisões posteriores
que julgaram admissível a acusação, do
interrogatório e das alegações das partes.
Art. 497. São atribuições do juiz presidente do Tribunal do
Júri, além de outras expressamente referidas neste Código:

V – nomear defensor ao acusado, quando considerá-lo


indefeso, podendo, neste caso, dissolver o Conselho e
designar novo dia para o julgamento, com a nomeação
ou a constituição de novo defensor;
2.2.1.1 Questões para debate

 Pode a defesa inovar na tréplica?


 1. Vem o júri pautado pela plenitude de defesa
(Constituição, art. 5º, XXXVIII e LV). É-lhe, pois,
lícito ouvir, na tréplica, tese diversa da que a
defesa vem sustentando. (entre outros, HC-
42.914, de 2005, e HC-44.165, de 2007). 3.
Habeas corpus deferido. (STJ, HC 61615/MS,
sexta turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Rel.
para acórdão Min. Nilson Naves, julgado em
10/02/2009, publicado no DJU do dia
09/03/2009).
 A Súmula 523 do STF se aplica ao júri?

“No processo penal, a falta da defesa


constitui nulidade absoluta, mas a sua
deficiência só o anulará se houver
prova de prejuízo para o réu”
2.1.2 Princípio do Sigilo das Votações:

 A Constituição garantiu o sigilo das votações.


Por isso os parágrafos 1º e 2º, do art. 483 do
CPP, estabelecem a necessidade de
interrupção da apuração dos votos, sempre
que se obtiver 04 votos em determinado
sentido.
“(...) Conquanto a regra contida nos §§ 2º e 3º do art. 483
do CPP..., estabeleça encerramento da votação com a
resposta de mais de 3 (três) jurados, a circunstância de o
magistrado haver prosseguido na abertura das respostas
dos demais jurados não maculou o princípio do sigilo das
votações, tratando-se de mera irregularidade" (HC
162.443/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA,
julgado em 10/04/2012, Dje 09/05/2012).
2.1.2.1 A incomunicabilidade dos
jurados:
Art. 466 (omissis).

§ 1o O juiz presidente também advertirá os


jurados de que, uma vez sorteados, não
poderão comunicar-se entre si e com outrem,
nem manifestar sua opinião sobre o processo,
sob pena de exclusão do Conselho e multa, na
forma do § 2o do art. 436 deste Código.
 Aramis Nassif: Creio firmemente que o sistema brasileiro
de deliberação é muito melhor que o norte americano
(ou qualquer outro), na medida em que (...),
preservados o sigilo das votações e a
incomunicabilidade dos jurados, evita-se a influência
entre os julgadores de fato. enquanto debatem na sala
especial. (NASSIF, Aramis. Júri, Instrumento da Soberania
Popular. Porto Alegre: Ed. Livraria do Advogado, 2008,
pág. 145).
2.1.3 A soberania dos veredictos:

 Segundo o Novo Dicionário Aurélio da Língua


Portuguesa soberania é a “Qualidade ou estado
do que é soberano. Autoridade de soberano.
Poder supremo”.

 O que significa soberania das decisões do júri?

“É a impossibilidade de os juízes togados se


substituírem aos jurados na decisão da causa” (José
Frederico Marques, in Elementos de Direito
Processual Penal).
Art. 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias:

d) for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos


autos.

§ 3o Se a apelação se fundar no no III, d, deste artigo, e o tribunal


ad quem se convencer de que a decisão dos jurados é
manifestamente contrária à prova dos autos, dar-lhe-á provimento
para sujeitar o réu a novo julgamento; não se admite, porém, pelo
mesmo motivo, segunda apelação.
O caso Irmãos Naves:

 João Alamy Filho, um exemplo para todos os advogados


criminais, em especial os advogados do Tribunal do Júri.
 Cabe revisão criminal das condenações
proferidas pelo júri?

 Sim. Neste sentido é o entedimento do STJ e do


STF. Confira-se:

(...) 1. É possível, em sede de revisão criminal, a


absolvição, por parte do Tribunal de Justiça, de réu
condenado pelo Tribunal do Júri... (REsp 964.978/SP,
Rel. Min. Laurita Vaz, Rel. p/ Acórdão Min. Adilson
Vieira Macabu (Desembargador Convocado do
TJ/RJ), Quinta Turma, julgado em 14/08/2012, DJe
30/08/2012) (No mesmo sentido vide ARE
674151/MT).
2.1.4 Competência mínima para julgar os crimes
dolosos contra a vida.

TÍTULO I
DOS CRIMES CONTRA A PESSOA
Capítulo I – Dos crimes contra a vida

- Homicídio (art. 121)

- Induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio (art. 122)

- Infanticídio (art. 123)

- Aborto (arts. 124, 125, 126, 127 e 128)


2.4.1 - Homicídio

Homicídio simples
Art 121. Matar alguém:
Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
Homicídio Privilegiado

Caso de diminuição de pena

§ 1º Se o agente comete o crime impelido por


motivo de relevante valor social ou moral, ou
sob o domínio de violenta emoção, logo em
seguida a injusta provocação da vítima, ou juiz
pode reduzir a pena de um sexto a um terço.
Homicídio qualificado

§ 2° Se o homicídio é cometido:
I - mediante paga ou promessa de
recompensa, ou por outro motivo torpe;
II - por motivo fútil;
III - com emprego de veneno, fogo, explosivo,
asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel,
ou de que possa resultar perigo comum;
Homicídio qualificado

IV - à traição, de emboscada, ou mediante


dissimulação ou outro recurso que dificulte ou
torne impossivel a defesa do ofendido;

V - para assegurar a execução, a ocultação, a


impunidade ou vantagem de outro crime;
Homicídio qualificado

VI - contra a mulher por razões da condição de sexo


feminino.

VII – contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e


144 da Constituição Federal, integrantes do sistema
prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no
exercício da função ou em decorrência dela, ou contra
seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até
terceiro grau, em razão dessa condição: Pena -
reclusão, de doze a trinta anos (Incluído pela Lei nº 13.142,
de 2015)
Norma explicativa

§ 2° - A Considera-se que há razões de condição


de sexo feminino quando o crime envolve:

I - violência doméstica e familiar;

II - menosprezo ou discriminação à condição de


mulher.
Homicídio com causa de aumento
de pena

§4º Sendo doloso o homicídio, a pena é


aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é
praticado contra pessoa menor de 14
(quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos.
A majorante do feminicídio

“§ 7º A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um


terço) até a metade se o crime for praticado:

I – durante a gestação ou nos 3 (três) meses


posteriores ao parto;

II – contra pessoa menor de 14 (quatorze) anos, maior


de 60 (sessenta) anos ou com deficiência;

III – na presença de descendente ou de ascendente


da vítima.”
Homicídio – Breves considerações sobre
as teorias do dolo

 Representação, vontade e assentimento.


 Embriaguez ao volante e dolo eventual (precedente da
Suprema Corte): 1. A classificação do delito como
doloso, implicando pena sobremodo onerosa e influindo
na liberdade de ir e vir, mercê de alterar o
procedimento da persecução penal em lesão à cláusula
do due process of law, é reformável pela via do habeas
corpus. 2. O homicídio na forma culposa na direção de
veículo automotor (art. 302, caput, do CTB) prevalece se
a capitulação atribuída ao fato como homicídio doloso
decorre de mera presunção ante a embriaguez
alcoólica eventual. 3. A embriaguez alcoólica que
conduz à responsabilização a título doloso é apenas a
preordenada, comprovando-se que o agente se
embebedou para praticar o ilícito ou assumir o risco de
produzi-lo. (STF - HC: 107801 SP, Relator: Min. CÁRMEN
LÚCIA, Data de Julgamento: 06/09/2011, Primeira Turma,
Data de Publicação: DJe-196 D
Induzimento, instigação ou auxílio ao
suicídio – art. 122, CP

Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se


ou prestar-lhe auxílio para que o faça:

Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio


se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se
da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de
natureza grave.
Suicídio - destaques

- Participação/possibilidade: A instiga B a
instigar C a suicidar-se

- Suicídio a dois (pacto de morte)


 Ambicídio e pacto de morte
são expressões equivalentes, empregadas
para designar a situação em que duas ou mais
pessoas decidem dar fim às próprias vidas de
modo conjunto. A doutrina também chama
esta hipótese de suicídio a dois (BITENCOURT,
Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte
especial: dos crimes contra a pessoa. 8ª ed.
São Paulo: Saraiva, 2008, p. 116).
Pactos de morte - possibilidades

“A” e “B” trancam-se em um quarto


hermeticamente fechado. “A” abre a torneira
de gás; “B” sobrevive. Neste caso, “B” responde
por participação em suicídio [art. 122, CP].

O sobrevivente foi quem abriu a torneira: nesta


hipótese, responde por homicídio, uma vez que
praticou o ato executório de matar.
Pactos de morte - possibilidades

 Os dois abrem a torneira de gás, não se


produzindo qualquer lesão corporal em face
da intervenção de terceiro: ambos respondem
por tentativa de homicídio, uma vez que
praticaram ato executório de matar. “A” em
relação a “B”; “B” em relação ao sujeito “A”.
Pactos de morte - possibilidades

 Suponha-se que um terceiro abra a torneira de


gás. Os dois se salvam, não recebendo lesão
corporal de natureza grave. Respondem os
dois por participação em suicídio? E o terceiro?
A solução está em os dois ficarem impunes,
sendo que o terceiro responde por tentativa
de duplo homicídio, uma vez que praticou o
ato executório de matar.
Infanticídio

Art. 123 - Matar, sob a influência do estado


puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo
após:

Pena - detenção, de dois a seis anos.


Influência de estado puerperal

Conceito. Puerpério, sobre parto ou pós-parto, é


o período cronologicamente variável, de âmbito
impreciso, durante o qual se desenrolam todas as
manifestações involutivas e de recuperação da
genitália materna havidas após o parto.
Aborto

Aborto provocado pela gestante ou com seu


consentimento
124 - Provocar aborto em si mesma ou consentir
que outrem lho provoque:
Pena - detenção, de um a três anos.
Art. 125 - Provocar aborto, sem o consentimento
da gestante:
Pena - reclusão, de três a dez anos.
Art. 126 - Provocar aborto com o consentimento da
gestante:
Pena - reclusão, de um a quatro anos.
Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a
gestante não é
maior de quatorze anos, ou é alienada ou débil mental, ou
se o
consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça
ou violência
Forma qualificada

Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos anteriores


são
aumentadas de um terço, se, em conseqüência do
aborto ou dos meios
empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão
corporal de natureza
grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas,
lhe sobrevém a morte.
Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:
Aborto necessário
I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
Aborto no caso de gravidez resultante de estupro
II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido
de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de
seu representante legal.
2.1.4.1 Competência por conexão e
ou continência

 Havendo conexão ou continência, entre um crime


doloso contra a vida e uma outra infração penal de
natureza diversa, será o Júri competente para o julgamento
de ambos os delitos. É o que se depreende do art. 78, I do
CPP, observe-se:
Art. 78 Na determinação da dependência por conexão ou
continência, serão observadas as seguintes regras:

I – no concurso entre a competência do júri e a de outro órgão


da jurisdição comum, prevalecerá a competência do júri.
2.1.4.1 Questões para debate

 Eutanásia e ortotanásia constituem crime?


Qual? Que teses caberiam em plenário do júri
em defesa de casos desta natureza?

 E o crime de genocídio? Lei 2.889/56


3. O PROCEDIMENTO BIFÁSICO DO
TRIBUNAL DO JÚRI

 O procedimento do júri é escalonado, apresentando


duas fases distintas, uma de “formação da culpa” ou de
instrução preliminar e outra que vai da preparação ao
julgamento em plenário.
3.1 Juízo de formação da culpa ou
instrução preliminar
a) Recebimento da denúncia, resposta e réplica (arts.
406-409 do CPP)
 O Juiz, ao receber a denúncia, abre prazo para a defesa
responder, no prazo de dez dias.

 Mas a que se presta a resposta à acusação no procedimento do


júri? Na prática ao reclame de nulidades relativas e ao
requerimento de diligências.

 Com a palavra o STJ:


 RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO
QUALIFICADO. NULIDADE DO PROCESSO EM FACE DA
INOBSERVÂNCIA DO ARTIGO 397 DO CÓDIGO DE
PROCESSO PENAL. ADOÇÃO DO PROCEDIMENTO ESPECIAL
PREVISTO PARA A APURAÇÃO DE CRIMES DOLOSOS
CONTRA A VIDA. MÁCULA INEXISTENTE. DESPROVIMENTO
DO RECLAMO.
 1. Os artigos 406 e seguintes do Código de Processo Penal
regulamentam o procedimento a ser seguido nas ações
penais deflagradas para a apuração de crimes dolosos
contra a vida, assim, rito especial em relação ao comum
ordinário, previsto nos artigos 394 a 405 do referido diploma
legal.
 2. Por conseguinte, e em estrita observância ao princípio
da especialidade, existindo rito próprio para a apuração
do delito atribuído ao recorrente, afastam-se as regras do
procedimento comum ordinário previstas no Código de
Processo Penal, cuja aplicação pressupõe, por certo, a
ausência de regramento específico para a hipótese (cont)
 3. Se as normas que regulam o processo e o
julgamento dos crimes dolosos contra a vida
determinam que o exame da viabilidade de
absolvição sumária do réu só deve ocorrer após o
término da fase instrutória, não há dúvidas de que
deve ser aplicado o regramento específico, pois,
como visto, as regras do rito comum ordinário só
têm lugar no procedimento especial quando nele
houver omissões ou lacunas.

 4. Recurso desprovido. (RHC 52.086/MG, Rel.


Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em
18/12/2014, DJe 03/02/2015)
 Diante deste cenário, a defesa, na maior parte
das vezes opta por oferecimento de Resposta à
Acusação genérica.
 E se a Resposta à Acusação não for
apresentada?
Art. 408. Não apresentada a resposta no prazo legal, o juiz
nomeará defensor para oferecê-la em até 10 (dez) dias,
concedendo-lhe vista dos autos.

Art. 409. Apresentada a defesa, o juiz ouvirá o Ministério


Público ou o querelante sobre preliminares e documentos,
em 5 (cinco) dias.
b) Instrução concentrada
Art. 410 - O juiz determinará a inquirição das testemunhas
e a realização das diligências requeridas pelas partes, no
prazo máximo de 10 (dez) dias.

Art. 411. Na audiência de instrução, proceder-se-á à


tomada de declarações do ofendido, se possível, à
inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e
pela defesa, nesta ordem, bem como aos
esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao
reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em
seguida, o acusado e procedendo-se o debate.
c) Debates Orais (411, §§ 4º, 5º e 6º)
 As alegações finais, em tese, serão feitas por debates orais,
concedendo-se a palavra, respectivamente, à acusação e à
defesa, pelo prazo de 20 minutos, prorrogáveis por mais 10;
havendo mais de 1 acusado, o tempo previsto para a acusação
e a defesa de cada um deles será individual; ao assistente do
Ministério Público, após a manifestação deste, serão concedidos
10 minutos, prorrogando-se por igual período o tempo de
manifestação da defesa.

 Na prática local, na maioria das vezes, os debates orais são


substituídos por alegações finais escritas, através de emprego
analógico da regra do art.403, § 3º, que estabelece:

“O juiz poderá, considerada a complexidade do caso


ou o número de acusados, conceder às partes o prazo
de 5 (cinco) dias sucessivamente para a apresentação
de memoriais. Nesse caso, terá o prazo de 10 (dez) dias
para proferir a sentença”.
3.1.1 A decisão intermediária (arts.
413 a 419)

 Encerrados os debates ou oferecidos os memoriais, o


juiz proferirá a sua decisão, ou o fará em 10 dias,
ordenando a conclusão dos autos para tal fim.

A seguir as espécies.
3.1.1.1 Pronúncia (art. 413, CPP)

 Trata-se de decisão interlocutória mista não terminativa, por


meio da qual o juiz determina a submissão do réu a
julgamento pelo júri.

Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o


acusado, se convencido da materialidade do fato e da
existência de indícios suficientes de autoria ou de
participação.
 A fundamentação da decisão de pronúncia:

Art. 413, § 1o - A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à


indicação da materialidade do fato e da existência de
indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o
juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o
acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as
causas de aumento de pena.
 Precedente do STJ (HC 142803-SC) em situação onde houve
excesso de linguagem no édito pronunciatório:

HABEAS CORPUS . HOMICÍDIO SIMPLES. TRIBUNAL DO JÚRI. PRONÚNCIA.


EXCESSO DE LINGUAGEM. JUÍZO DE VALOR ACERCA DO CONJUNTO
PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. EXCESSO DE LINGUAGEM. CONSTRANGIMENTO
ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA. 1. Embora uma das alterações
significantes no procedimento do julgamento dos crimes dolosos
contra a vida, com o advento da Lei n.11.689/2008, tenha sido a
proibição das partes se referirem em Plenário à decisão de pronúncia
(art. 478, I, do CPP), é certo que os jurados, caso solicitem, terão
acesso aos autos e, consequentemente, à provisional objurgada (art.
480, 3, do CPP), razão pela qual vislumbra-se o risco de influência no
ânimo do Tribunal Popular (cont.)
3.
2. Para a pronúncia, que encerra simples juízo de admissibilidade da
acusação, exige o ordenamento jurídico somente o exame da
ocorrência do crime e de indícios de sua autoria, não se
demandando aqueles requisitos de certeza necessários à prolação
de um édito condenatório, sendo que as dúvidas, nessa fase
processual, resolvem-se contra o réu, ou pela sociedade. É o
mandamento do antigo art. 408 e atual art. 413 do Código
Processual Penal.
Na hipótese, o juízo singular teceu manifestações diretas acerca do
mérito da acusação - que deveriam ser submetidas a julgamento
pelo Tribunal do Júri -, ao expressar claramente que seria impossível o
acolhimento das teses defensivas de legítima defesa e de
inexigibilidade da conduta diversa, considerações estas capazes de
exercer influência no ânimo dos integrantes do Conselho de
Sentença, principalmente em razão da falta de cuidado no
emprego dos termos, sendo constatado, assim, o alegado excesso
de linguagem na decisão de pronúncia, caracterizando o aventado
constrangimento ilegal. 4. Ordem concedida para anular a decisão
de pronúncia, devendo outra ser proferida com observância dos
limites legais.
 No momento da decisão de pronúncia tem
aplicação o princípio in dubio pro reo?

 Responde Evandro Lins e Silva :


[...] O juízo de acusação posto diante do Júri há de ter como
pressuposto absoluto a prova da existência de um crime
contra a vida e indícios suficientes de autoria ou
participação de alguém. Ninguém é culpado mais ou menos,
ou quase, ou duvidosamente. É ou não é. Não há grau
intermediário [...]
3.1.1.2 Impronúncia

 É “uma decisão terminativa que encerra o processo sem


julgamento de mérito, não havendo a produção de coisa
julgada material, pois o processo pode ser reaberto a
qualquer tempo, até a extinção da punibilidade, desde que
surjam novas provas” (Aury Lopes Junior).

Art. 414. Não se convencendo da materialidade do


fato ou da existência de indícios suficientes de autoria
ou de participação, o juiz, fundamentadamente,
impronunciará o acusado.
3.1.1.3. Absolvição sumária
 Art. 415. O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o
acusado, quando:

I – provada a inexistência do fato;

II – provado não ser ele autor ou partícipe do fato;

III – o fato não constituir infração penal;

IV – demonstrada causa de isenção de pena ou de


exclusão do crime.
Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV do caput
deste artigo ao caso de inimputabilidade prevista no caput do
art. 26 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 –
Código Penal, salvo quando esta for a única tese defensiva.
3.1.1.4 Desclassificação

 Art. 419. Quando o juiz se convencer, em discordância


com a acusação, da existência de crime diverso dos
referidos no § 1o do art. 74 deste Código e não for
competente para o julgamento, remeterá os autos ao
juiz que o seja.
3.1.1.5 Recursos aptos a fustigar as
decisões intermediárias

 Contra a sentença de impronúncia ou de absolvição


sumária caberá apelação (art. 416), nos demais casos
cabível será o recurso em sentido estrito (art. 581, incisos
II e IV).
4. ORGANIZAÇÃO E PREPARAÇÃO
DO JÚRI

 Alistamento (arts. 425-426)

O alistamento compreenderá os cidadãos maiores de 18


(dezoito) anos de notória idoneidade.
 Número de jurados alistados:

a) comarcas com mais de 1.000.000 de habitantes: 800 a


1500 jurados;

b) comarcas com mais de 100.000 habitantes: 300 a 700


jurados;

c) comarcas até 100.000 habitantes: 80 a 400 jurados.


 A lista geral de jurados será publicada pela imprensa
até 10 de outubro e fixada em editais no foro, devendo
conter as respectivas profissões. O jurado que tiver
integrado o Conselho de Sentença nos 12 (doze) meses
que antecederem a publicação da lista geral fica dela
excluído.
Profissões dos Jurados da Comarca de Goiânia – 2013

Profissão Números absolutos Números relativos

Funcionários Públicos 999 52,6%

Estudantes 444 23,4%

Advogados 40 2,1%

Professores (rede privada) 25 1,3%

Bancários 16 0,8%

Outras 372 19,6%

Total 1896 100%


 Audiência para Sorteio dos Jurados (art. 432)

O sorteio de jurados que atuarão na reunião periódica


será realizado entre o décimo quinto e o décimo dias
úteis antecedentes à instalação da reunião, devendo
ser intimados para a audiência o Ministério Público, o
representante da OAB e Defensoria Pública. A audiência
não será adiada pelo não comparecimento de
qualquer das partes. Serão sorteados 25 jurados. O
jurado não sorteado poderá integrar o sorteio das
reuniões futuras.
 Recusa ou não comparecimento e
Responsabilidade Penal (arts. 436-446)
A recusa injustificada ao serviço do júri ou não
comparecimento injustificado à sessão acarretarão multa
no valor de 1 (um) a 10 (dez) salários mínimos.
 Composição do Conselho de Sentença (arts. 447-
452).

A lei expressamente dispõe sobre o impedimento das pessoas


que mantenham união estável para compor o mesmo
conselho e, além disso, daquele que

I - tiver funcionado em julgamento anterior do mesmo


processo, independentemente da causa determinante do
julgamento posterior;

II - no caso do concurso de pessoas, houver integrado o


Conselho de Sentença que julgou o outro acusado;

III - tiver manifestado prévia disposição para condenar ou


absolver o acusado.
4.1 Preparação do julgamento (art.
422 e 423)

 Art. 422. Ao receber os autos, o presidente do Tribunal do Júri


determinará a intimação do órgão do Ministério Público ou do
querelante, no caso de queixa, e do defensor, para, no prazo de
5 (cinco) dias, apresentarem rol de testemunhas que irão depor
em plenário, até o máximo de 5 (cinco), oportunidade em que
poderão juntar documentos e requerer diligência.
 Art. 423. Deliberando sobre os requerimentos de provas a
serem produzidas ou exibidas no plenário do júri, e adotadas
as providências devidas, o juiz presidente: ordenará as
diligências necessárias para sanar qualquer nulidade ou
esclarecer fato que interesse ao julgamento da causa e fará
relatório sucinto do processo, determinando sua inclusão em
pauta da reunião do Tribunal do Júri.
5. O PLENÁRIO DE JULGAMENTO

 Sequência procedimental:
a) Verificação de quórum: presença de no mínimo 15 –
art. 463

b) Juiz declara instalados os trabalhos e anuncia o


processo que será submetido a julgamento.

c) Pregão das partes e testemunhas (sobre ausências vide


artigos 457 a 462)
d) Esclarecimento aos jurados sobre impedimentos, causas
de suspeição e incomunicabilidade – art. 466

e) Sorteio e recusas – arts. 467 a 469.

f) Compromisso do Conselho de Sentença – art. 472

g) Instrução em plenário - arts. 473 a 475: oitiva da vítima,


das testemunhas, reconhecimento de pessoas e coisas e
esclarecimento dos peritos, bem como a leitura de peças.

h) Interrogatório – art. 474

i) Debates orais - art. 477: O tempo destinado à acusação


e à defesa será de uma hora e meia para cada, e de
uma hora para a réplica e outro tanto para a tréplica.
Havendo mais de 1 (um) acusado, o tempo para a
acusação e a defesa será acrescido de 1 (uma) hora e
elevado ao dobro o da réplica e da tréplica.
j) Elaboração dos quesitos e votação (arts. 483 a 491):
Os quesitos serão formulados na seguinte ordem,
indagando sobre:
I – a materialidade do fato;
II – a autoria ou participação;
III – se o acusado deve ser absolvido;
IV – se existe causa de diminuição de pena
alegada pela defesa;
V – se existe circunstância qualificadora ou causa
de aumento de pena reconhecidas na pronúncia
ou em decisões posteriores que julgaram admissível
a acusação.

k) Sentença – arts. 492 a 496.


6. A prática do júri

 a) Estudo do caso e montagem do material para


plenário.

 b) Saudações.

 c) A aproximação do júri: postura e empatia.


 d) Teses defensivas recorrentes:
- Negativa de autoria ou participação
- Legítima defesa própria e de terceiros
- Inexigibilidade de conduta diversa como causa
supralegal de exclusão da culpabilidade.
- Coação irresistível (art.22, CP)
- Estrito cumprimento do dever legal
- Inimputabilidade e semi-imputabilidade.
- Desistência voluntária e arrependimento eficaz
(art. 15 do CP).
 e) Os apartes – art. 497, inciso XII, CPP.

 f) Arguição de nulidades em plenário (art. 571,


inciso VIII, CPP).

 g) A interposição de apelação em plenário.

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