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Deus Odeia Todos Nós

com Jonathan Grotenstein Simon Spotlight Entertainment

DAPHNE AMAVA VELOCIDADE. Não no sentido tradicional: ela raramente


passava da terceira marcha com seu Honda Civic desbotado. A corrida para
Daphne estava nos corredores de sua mente, extensa e confusa, e a garota
precisava da sua energia. Cocaína, quando ela podia dar-se ao prazer; ou
descongestionante nasal efedrina quando ela não podia. Mas ela nunca
esteve tão feliz quanto no par de vezes que eu a vi recebendo uma remessa
de Simpamina, um estimulante aparentemente italiano que lhe garantia
“setenta e duas horas seguidas de sexo, rock and roll, e serviços domésticos
com grande prazer.” Seguidas imediatamente de quatro horas de desilusões
paranóicas, argumentos impetuosos sobre questões irrelevantes, e, durante
nosso último final de semana juntos, um par de tentativas de suicídio
envolvendo uma arma letal.

Eu conheci Daphne quando retornei para a Universidade, um estudante do


segundo ano quebrado precisando de um emprego de meio turno. Meus
planos de verão como ajudante para os ricos no Hempstead Golf e Country
Club entraram em colapso quando eu tentei atravessar uma janela de vidro
com um carrinho de golfe. Minha passageira—uma dama de honra com o
cabelo de Stevie Nicks que minutos atrás eu estava masturbando atrás da
Pro Shop—estava atrasada para o brinde de casamento do outro lado da
janela.

A subsequente explosão de vidro deu um final emocionante para aquilo que


estava sendo, até aquele ponto, um brilhante atalho através dos obstáculos
no Buraco 13, improvisados com a ajuda de meia garrafa de Stoli, de um
nervoso supervisor em perseguição e dos dedos recíprocos da dama de
honra na frente das minhas calças. Nós escapamos sem arranhões, graças
aos efeitos sedativos da vodka, e a conversa de apresentar queixa ficou
apenas nisso. Mas o emprego era história. Eu passei o resto do verão como
um incômodo na bunda dos meus pais.
De volta à escola eu respondi a um anúncio no jornal do estudante:
organização de banquetes. Eu comecei a entrevista com uma narrativa
profundamente editada de minha experiência no clube de golfe, mas na
insistência da minha entrevistadora—uma loira oxigenada de vinte e tantos
anos, punk-rock, DJ de final de semana na rádio universitária e com um
sorriso matador—eu continuei adicionando detalhes até que ambos
estávamos rolando no chão. Eu ganhei o emprego e uma iniciação no
estranho e maravilhoso mundo de Daphne Robichaux, um curso intensivo
em música alternativa, produtos farmacêuticos, e muito sexo,
ocasionalmente com algum leve sadomasoquismo. Eu deixei ela furar minha
orelha esquerda e aprendi a tocar alguns acordes na guitarra.

Quando retornei para casa no Natal, anunciei que estava deixando à


universidade para escrever música e me juntar com a minha nova alma
gêmea. Minha mãe chorou e recusou-se a falar comigo. Meu pai
simplesmente encolheu os ombros.

“Nos salve algum dinheiro, em todo o caso,” ele disse.

Se por milagre ou piada cósmica, Daphne e eu sobrevivemos a um


aparentemente interminável ciclo de brigas e continuávamos juntos no Dia de
Ação de Graças do ano seguinte. Nenhum de nós buscava passar o feriado
com a família—a minha ainda estava magoada, enquanto Daphne afirmou
que era órfã—então, como alternativa, nós planejamos um Grande Final de
Semana de Gloriosa Ingratidão: quatro dias e três noites nas Cataratas do
Niágara, onde nós traçamos um objetivo de nunca usar a palavra “obrigado”,
preferencialmente enquanto fazíamos muita merda na suíte de lua de mel
mais vagabunda que pudéssemos pagar.

Nós entramos no Civic e demos ré na calçada com neve, Daphne quase


atropelou o carteiro. Ele fez escárnio de nós enquanto entregava para ela
uma pequena caixa branca com um carimbo postal italiano.

“Obrigada,” ela deixou escapar para o carteiro.


Ele lhe mostrou o dedo médio e se afastou.

“Eu apenas gostaria de salientar,” eu disse, olhando para a merda do Timex


que meu pai me deu chamando-o hilariamente de herança, “que você
precisou apenas de trinta segundos para quebrar a nossa única regra para o
final de semana.”

“Você está dirigindo,” disse ela, já passando por cima de mim.


Enquanto eu colocava o carro na rua, ela rasgava várias camadas de
papelão e plástico para retirar os "italianos". Seus olhos brilharam quando
viram as cores das pílulas: Metade era um preto sinistro, a outra metade
transparante revelando as cores branca e laranja.

"Saúde", disse ela, e engoliu uma pílula seca.

Uma hora depois, paramos em um cinema drive-in abandonado, próximo a


Seneca Falls (uma vila de NY). Ela tirou a calça e abriu meu zíper. Eu mal
tive tempo de desligar o carro e ela já estava sobre mim e colocou sua
calcinha de lado o suficiente para por meu pau pra dentro.

Usando uma mão para segurar sua cabeça contra o teto baixo do Civic e
usando a outra para arrumar o meu banco. O banco foi para trás com um
estrondo, com os nossos movimentos o carro começou a andar para trás. Eu
não tinha pensado em puxar o freio de mão.

Os olhos de Daphne se arregalaram com a emoção. Medo? Tesão? Os dois?


Eu experimentava a sensação de pânico quando meu corpo deslizou para
trás, fazendo com que eu não conseguisse pisar no freio. Agarrando o banco
do passageiro eu consegui puxar o freio de mão. Nós deslizamos alguns
metros no gelo antes de colidir com um dos auto falantes do drive in.

Daphne abaixou a cabeça, riu e voltou ao ritmo anterior. Nós terminamos


rapidamente e sai do carro para ver os danos no para-choque, que eram
poucos. Ela tomou outra pílula e voltamos para a estrada.

Duas horas depois, fomos a suíte nupcial do Royal Camelot Inn. Nós
rachamos a garrafa de champagne e para complementar tentando abri-la,
quebramos a jacuzzi, então trepamos mais uma vez na cama em forma de
coração antes de eu desabar em um sono sem sonhos. Acordei 8 horas
depois e vi Daphne limpando a banheira, usando um spray desinfetante
durante sua exploração do motel e das redondezas. Ela já tinha planejado o
nosso dia: visitar uma vinícola do outro lado da fronteira canadense.

A região era muito fria para a tradicional fabricação de vinhos, as uvas


congelavam antes da colheita. Impulsionados pela criatividade e pelo desejo
de beber, os moradores desenvolveram uma técnica de retirar gotas das
uvas congeladas, o resultado era uma espessa e doce bebida, chamada de
"vinho de gelo".
Que nunca chegamos a experimentar. Embora tivéssemos tido a visita como
uma forma de explorar o Canadá, Daphne era uma sábia de 22 anos, e eu
ainda tinha um ano e meio para completar 21 - Daphne me arrastou para um
banheiro enquanto o nosso grupo experimenta o "vinho de gelo".

Nossa odisséia sexual foi tomando seu "pedágio", especificamente sobre a


minha masculinidade: O toque macio e molhado de Daphne e o atrito feito
era como uma lixadeira elétrica.
Eu disse isso a ela em nosso retorno ao estacionamento, ela abriu o zíper da
minha calça na intenção ver a cabeça machucada.

"Tanto faz", ela disse sacudindo o zíper fechado.


Ela começou a caminhar em direção ao principal evento da área, As Quedas,
então a caminhada se tornou uma corrida.

Talvez ela não fosse se atirar, pensei enquanto corria atrás dela, mas ela
parecia que ia se atirar mesmo. Quando ela se aproximou da beirada, eu
pulei em seus tornozelos e derrubei ela no chão.

"Que porra é essa, Daphne?"

Meu cavalheirismo foi compensado com socos no rosto e no peito. Acenei


para os turistas que nos viam. "

Estamos todos bem", eu gritei.


"Ela tem problemas."

Nós não nos falamos a viagem inteira de volta. Enquanto eu descia do carro,
ela pegou as chaves e foi embora. Voltei para o quarto e assisti a ESPN
durante quatro horas, até que ela voltou.

"Eu não tinha certeza que você voltaria" eu disse.

"Nem eu" respondeu ela.


"Mas eu fiquei com medo que você pegasse as pílulas".
Ela pegou a garrafa no banheiro e tomou outra.

"Se você quer acabar com você mesma, vá em frente", eu disse.

"Você já tinha me dito isso quando me recusou no estacionamento."


Eu não me lembro o que mais foi dito naquela noite. O padrão, até agora, era
familiar: as acusações e lágrimas, palavras duras, e, finalmente, a
reconciliação.
Uma tentativa de sexo foi tomada pelo estado do meu pau inflamado. E
então dormimos.

Ou pelo menos eu dormi. Quando me empurrou acordada, ela foi olhando


para mim, saltando levemente, aparentemente cheia de vida. Apenas seus
olhos de zumbi contestavam o fato de que ela estava em seu segundo dia
consecutivo sem dormir.

"Número três", afirmou.

Nossa "pior briga de todas" teve apenas duas semanas em nosso


relacionamento, na volta de um show na Meat Loaf. Então, uma semana
depois em uma festa "Around-the-world" no meu dormitório, fazemos uma re-
encenação da guerra civil espanhola. Nós fizemos uma lista de "Top 5"
brigas no quadro pendurado na cozinha, esperando que as águas passadas
inspirassem a harmonia no futuro. Até agora, a lista tinha apenas conseguido
mais oportunidades de briga, fazendo com que as novas brigas batalhassem
por uma posição melhor que as velhas.

"Sério?", eu perguntei apontando para as contusões no meu braço.


"Número dois, moça. Isso poderá deixar alguma cicatriz."

"Viado!", ela disse me socando no braço.

Nenhum de nós se sentiu como voltando as Quedas, e depois de dois dias


na sala, me sentia mais como na prisão do que como livre. Subimos no carro
e ela começou a dirigir de volta para a escola. Ela celebrou o início da nossa
jornada com mais uma pílula de Simpamina.

"Onde você conseguiu eles?" eu perguntei.

"Com Dino", ela disse.

Dino foi um cara de Roma que ela namorou durante um semestre na Itália,
quando ela estava se graduando em Artes. Ele era um artista genial, pelo
menos foi o que ela disse. A minha tendência era ignorar o que ela falava
sobre ele a maior parte do tempo, em relação a seu vasto talento artístico e
que ele aparentemente foi dotado com um pau equivalente a uma pós-
graduação em fazer amor. Enquanto eu estava seguro em meu tamanho e
habilidades, falar no Dino me lembrava que eles tiveram uma relação mais
selvagem, ele era mais sábio e mais velho, fazendo eu me sentir como um
moleque.
"Ah, Dino, o seu amigo com o nome dos Flinstones."

"Isso não foi engraçado agora e nem nas mil vezes que você disse isso."

Daphne estava pronta para uma briga, e eu estava me sentindo estúpido o


suficiente para começar uma.

"Dino, o artista genial que tem o que, 30 anos? E ainda mora com os pais?"

"Você sabe muito bem que essa porra é tradição na Itália. Não é como esse
inferno consumista que nós vivemos aqui, valores familiares significam algo!"

"Só estou dizendo, gênios de verdade não moram com os pais."

A resposta dela foi rápida e eficaz, quase fatal para nós dois. Ela segurou
meu braço e me puxou junto com o volante para o lado dela. Quando eu me
virei para arrumar o volante, ela me socou meu pescoço e minha cabeça
sem largar meu braço, o quão rápido ela podia. O que lhe faltava em força, a
velocidade compensava.

"Eu odeio consumismo!", ela gritou.

O carro começou a girar lentamente, mas ainda assim, fora do meu controle.
Eu lutava para conseguir controlá-lo com meu braço livre, enquanto defendia
com o meu outro.

"Eu odeio consumismo", ela continuou gritando novamente e


novamente, como um monge cantando.

Agora nós estávamos diante do tráfego. Os carros desviavam, seus


motoristas com suas caras de bravos e assustados. Eu comecei a sorrir, a
mesma expressão estava no meu rosto quando o carro completou o giro de
360º e bateu na divisória central.

Nós sentamos na faixa de emergência, imóveis e quietos. Até que Daphne


saiu do banco do passageiro e desapareceu em um bosque nevado de
árvores. Bati no volante com raiva, mas pelo menos eu tinha uma desculpa
para deixá-la aqui. Deixe que ela pegue uma carona.

Ela poderia chegar em casa mais tarde, cheia de mijo e de vinagre e talvez
sem vontade de me perdoar, mas foda-se, desta vez nosso relacionamento
acabou. O número um e dessa vez não havia volta.
Eu bati no volante mais algumas vezes, xingando Daphne, Dino e meus pais,
por serem uns babacas fazendo com que eu tivesse essa maldita viagem.
Então eu soltei meu cinto de segurança e fui procurá-la na estrada, jogando
uma espécie de Frogger na vida real.

Não foi muito difícil, ela havia caído de joelhos cerca de 30 metros da
estrada. Eu me aproximei lentamente falando o nome dela. Eu interpretei seu
silencio como uma coisa boa, e coloquei a mão no ombro dela.

Uma rajada de dor no meu ombro, me fez lembrar instantaneamente como


eu interpretei mal a situação.

O canivete foi mais uma lembrança de Dino, algo que ela começou a
carregar o tempo inteiro com ela, desde que uma menina foi estuprada na
faculdade. Ela tirou a faca do meu ombro, tive tempo para gritar até que ela
enfiou na minha coxa. Então ela foi para o peito. Meu instinto de defesa
ordenou meu ante-braço a empurrá-la para trás, derrubando ela em um
monte de neve. Tentei ir em direção dela, mas a dor na perna disse não.
Fiquei de joelhos e cai para trás, olhando para o céu cinzento, sangrando na
neve, esperando para morrer.
2

DURANTE O SÊDER DOS KIRSCHENBAUM DE 1984, cheio de hormônios


e Manischewitz, eu beijei Tana Kirschenbaum, agora com trinta anos,
enquanto deveríamos estar caçando o Afikomen (tradição judaica). Eu até
tentei acariciar seus seios —maravilhosos naquela época, e só melhoraram
com o tempo—até que, para a minha desgraça, ela me derrubou. Não é que
Tana não gostasse de mim: ela apenas sabia que não podia confiar em mim.
E quando eu perdi uma conquista em potencial, eu encontrei uma irmã. Nos
anos seguintes, Tana foi a principal estrategista para os meus envolvimentos
românticos. Ela me ajudou a colocar em ordem meus sentimentos quando
estava amando e, quando não estava, ouviu pacientemente todos os meus
pecados. Em troca, eu ofereci sábios conselhos sobre seus casos, os quais
tendiam a ser bem profundos, mas geralmente eram curtos e sujos.

“Ele é gay, definitivamente” era a minha mais freqüente observação.

Com exceção do último Dia de Ação de Graças—é difícil acreditar que um


ano se passou desde o “Grande Final de Semana de Gloriosa Ingratidão”—
os Kirschenbaums tinham fornecido o cenário para a maioria dos feriados
importantes. Meus próprios pais não têm muitos laços familiares: o clã de
protestantes da minha mãe vive principalmente em Indiana, enquanto os
parentes do meu pai—chamá-los de católicos caducos não dimensiona muito
bem a imensidão do problema—sempre pareceram estar mais engajados em
alguma disputa de sangue que impedia qualquer contato cara-à-cara. Larry
Kirschenbaum, que defendeu meu pai três vezes por estar dirigindo bêbado,
é a coisa mais próxima que ele tem de um amigo. Ainda assim, meu pai tem
uma suspeita permanente, repetida a cada vez que entramos no carro para ir
aos Kirschenbaum, como se o convite permitisse que Larry reduzisse o preço
da refeição.
Na mesa deste ano há treze cadeiras, o que para os Kirschenbaum é
considerado um momento íntimo. Ninguém está sóbrio o suficiente para ir
buscar a sobremesa. Eu estou razoavelmente certo de que Dottie, a mãe de
Tana—cheia de rímel, mas notadamente conservada—está dando em cima
de mim. Não existe realmente nenhuma razão para o seu insaciável
interesse no meu novo trabalho, servindo sorvete da Carvel na Avenida
Jerusalém. O pé de Dottie, subindo pela minha perna, confirma minha teoria.
Embaraçoso, já que eu estou sentado do lado do seu marido. Duplamente
embaraçoso, já que eu tenho quase certeza que Dottie e meu pai transaram
mais de uma vez. Além disso, meu pai—que passou a maior parte da noite
fixado nos gloriosos seios de Tana—está me encarando com um olhar que
seria intimidador se não estivesse mergulhado no whisky. Eu estou aliviado
por ver minha mãe tão indiferente, graças ao doutor Marty Edelman, um
dentista cujas recentes férias em Napa Valley aparentemente não
produziram nenhuma particularidade muito pequena ou insignificante.

Embora eu possa imaginar destinos piores do que mergulhar meu Fudgie the
Whale (bolo de sorvete da franquia Carvel) dentro da Cookie-Puss (outra
torta de sorvete da franquia Carvel) de Dottie, a idéia de ir onde meu pai já
esteve me parece um pouco ‘Complexo de Édipo’ demais para me confortar.
Eu peço licença e saio para fumar.

Tio Marvin esbarra em mim na varanda. Ele não é meu tio—pertence a


família materna de Tana—mas está tão presente nessas comemorações
quanto os talheres. Um ou dois anos depois dos sessenta, ele continua com
uma vasta cabeleira grisalha e brilhante, mais um lembrete cruel do que um
sinal de virilidade. Ele era um dos melhores de Nova York nos anos
sessenta, até que seis tiros na perna e na virilha forçaram uma
aposentadoria antecipada, um coxear contínuo e uma incontinência urinária
fodida o suficiente para exigir um saco de mijo permanente. Tana afirma que
ele está complementando seu salário por invalidez com um trabalho de meio
turno executando hipotecas—um negócio em expansão devido aos recentes
escândalos envolvendo poupanças e empréstimos—mas nada daquele
dinheiro parece ter encontrado seu caminho para o guarda-roupas dele:
calça de poliéster, camisa social e uma jaqueta de couro preta que, como o
próprio tio Marvin, já viveu dias melhores.

“Tio Marvin,” eu digo.


Tio Marvin grunhe para mim como se eu fosse um idiota. Eu não estou
ofendido—tivemos conversas inteiras que não foram feitas por muito mais do
que isso. Ele me vê batendo um maço de cigarros contra a palma da minha
mão por alguns segundos antes de pegar dentro de sua jaqueta um cigarro
enrolado à mão e uma caixa de fósforos. Então ele desliza um fósforo entre
dois dedos e o acende diretamente na sua mão em forma de concha, o que
naturalmente abriga o fogo do vento gelado. Um truque muito legal, eu tenho
que admitir. Enquanto ele traz à vida sua fumaça, eu contra-ataco
pressionando duas vezes um Zippo sobre a minha perna—não é a única
coisa que eu aprendi durante a minha curta experiência na faculdade, mas
definitivamente a mais útil. Eu acendo um Camel sem filtro e dou uma
profunda tragada, de repente percebo um cheiro ainda mais exótico do que a
minha mistura favorita de tabacos turcos e americanos.

“Isso não tem cheiro de cigarro,” eu falo.

“Vocês, crianças malditas, não conheceriam uma boa erva nem se ela
estivesse na frente dos seus olhos”

“Eu já fumei maconha antes,” eu respondo, reconhecendo que estou em


sério perigo de ser perturbado por um velho castrado vestido como Serpico.

“Bem, minha sobrinha com certeza não fumou merda nenhuma.”

“Eu pensei que nós deveríamos ‘só dizer não’?”

“Não é o conselho,” ele diz através dos dentes cerrados “que viria de mim.”

Ele me oferece uma tragada, que eu recuso.


“Eu estou mais ou menos numa fase de cigarros e whisky agora,” digo a ele.

“Aproveite enquanto você pode. Em breve tudo vai ter ido.”

As conversas com o tio Marvin tendem a ser curtas, dada sua natural
aversão a qualquer coisa elegante, mas eu não estou com pressa para voltar
pra dentro, e estou mais do que disposto a conseguir uma folga.

“Eu te entendo. Estou pensando em me mudar para a cidade.”

“A cidade?” Seus olhos estreitam.


“Todo mundo que eu conheço está indo embora. A cidade é uma fossa
maldita.”

“Bem, isso deve tornar mais fácil minha busca por um apartamento.”
“Engraçado,” ele diz sem rir.

Um minuto ou dois se passam em silêncio, os quais me fazem pensar que a


conversa terminou.

“Obrigado, como sempre, pela resposta pronta espirituosa.” Eu digo, jogando


o toco do cigarro no chão e estampando-o com o bico do sapato.
“É melhor eu entrar antes que meu pai mova-se sobre a sua sobrinha.”

“Espere um minuto... Quando você for para a cidade, você pode me trazer
mais disso.” Ele faz um sinal para explicar.

“Você sabe que eu adoraria lhe ajudar, tio Marvin, mas eu nem saberia
aonde ir.”

“Você vai ir ver meu cara. Aqui...” Ele tira do seu bolso da frente um maço de
dinheiro do tamanho do punho de um bebê, tira seis notas de vinte, e as
pressiona na minha mão.
“Isso vai comprar aproximadamente sete gramas.”

“Sete gramas?”

“Sete gramas. E não deixe ele te enganar com caules e sementes. Peso
morto, essas merdas.”

Para ser honesto, eu estou grato por não ter que fazer alguma coisa que
envolva sorvete.

Na manhã seguinte, eu acordo cedo e me visto no escuro, saio de casa


antes que meus pais possam acordar e fazer perguntas. Depois de uma
caminhada de 50 minutos, eu estou a bordo do trem para Long Island, só
mais uma cabeça de gado no rebanho que se dirige para Nova York. Eu
encontro um assento ao lado de um cuzão em um terno lendo o jornal. O
vagão balança suavemente enquanto o trem passa pelas fileiras de casas da
classe trabalhadora. Eu estou tentando decidir se ‘classe trabalhadora’ é um
paradoxo quando uma loira numa saia executiva passa elegantemente pelo
meu lado. O tempo que estive com Daphne me ensinou, entre outras coisas,
que eu não era o maior fetichista quando se tratava de sexo, existe algo na
combinação de meias com tênis de corrida que fazem isso por mim.
Eu passo os próximos trinta minutos querendo saber se existe uma ferrovia
equivalente ao Mile High Club. Ao chegar na estação, o rebanho levanta e se
dirige às saídas por instinto e cafeína. Eu vou à deriva pelo trajeto, flutuando
numa onda de grupos dinâmicos para a Sétima Avenida.

Os contatos de tio Martin ficam em Alphabet city, o que fazem com que
viagens cômodas, sejam quase impossíveis. A coisa mais fácil a se fazer é
pegar um trem, mas eu ainda tenho esperança que meu dia como um laranja
possa resultar em lucro.

Então depois de alguma consulta em um mapa das vias subterrâneas, eu


resolvo ir pelo bloco leste, desembolsar dois reais por duas fichas e pegar a
linha F para a segunda avenida.

Um bêbado grisalho em um gorro de esqui tropeça sob o vagão, sacudindo


um copo de isopor, oferecendo "A bênção de Deus" cada vez que um
passageiro coloca algumas moedas. Eu sinto uma vontade de sacudir o
cara—'Que tipo de Deus que ele pensa está vendo por ele?'—Eu obtive
minha resposta um minuto depois, quando um segundo mendigo entrou no
vagão vindo de outra direção. O fluxo de doações chega então a um fim
abrupto. É como se a vista da falta de esperança sufocasse qualquer impulso
feito para caridade. Se existe um Deus prestando atenção para este par de
almas perdidas, ele tem um péssimo senso de humor.

Emergindo na Rua Houston, tento parecer como um vivo e focado cidadão


de Nova York. Não quero ser comparado a um turista.

Viro à esquerda (norte, eu me lembro) na Avenida A e passo pela praça


Tompkins. Onde foram erguidas novas cercas plásticas para manter
pretensos herdeiros longes do terreno e juntamente, todos os outros. O
resultado final, parece menos um parque e mais um museu feito para
lamentar a passagem do espaço público.

"Acredite ou não", diz o guia turístico imaginário na minha cabeça", as


crianças já puderam andar livremente sobre esses gramados.”

No canto mais distante do parque, uma congregação de "skinheads" me faz


acelerar o meu ritmo. Um deles tem uma suástica tatuada na testa. Boa sorte
para conseguir um emprego, Fritzie. Eu não preciso de nenhum contato
visual para saber que eles estão me encarando, o que rapidamente faz meu
coração disparar. Mas aparentemente, sou branco o suficiente para
conseguir passar sem maiores incômodos.
Enquanto eu não tinha nenhuma idéia se o tio Marvin tinha noção sobre o
exôdo que Nova York obteve por ser fundamentada em fatos, eu estava
começando a ver uma lógica. O clima predominante é o desespero,
pontuado por momentos de terror.

Um quarteirão depois, eu estou em Puerto Rico, ou eu sou levado a acreditar


devido a completa falta de sinalização em inglês.
Fico em frente ao endereço que meu tio Marvin me deu, um edifício de cinco
andares ancorado por uma casa noturna que me parece não estar apta a
uma reabertura tão cedo. Toco então o apartamento 4D.

"Yah?" sussurram uma resposta.


"Mark Kirschenbaum me enviou. Eu procuro por —"

O portão destrava e um zumbido de alarme começa a tocar, luto para


empurrá-lo e entrar a tempo.
Dentro de um corredor mal iluminado rodeado por caixas de correio, eu
busquei os nomes até chegar ao 4D: "O Pontífice". Aparentemente, esta é a
santa peregrinação.
Eu olho para cima, atraído por uma súbita comoção na escada. Levantaram
as vozes. Uma porta batendo. Uma explosão bilíngue de Inglês e palavrões
espanhóis.

Eu começo a subir cautelosamente, e encontro a fonte da agitação, ou pelo


menos uma das chaves participantes, na escada entre o segundo e o
terceiro andar. Ele é um garoto da minha idade, porto-riquenho, vestindo
uma camisa "Tommy Hilfinger" superdimensionada e larga, além de uma
calça jeans "Girbaud Ar" naquele estilo que se deixa a cueca à mostra, e
mais aqueles "Air Jordans"; os quais me lembraram o que eu faço
semanalmente em Carvel. Quando me viu, ele cuspiu no chão. Então tirou
um daqueles pagers da Motorola da bainha da calça e esmagou-o contra a
parede.

"Nada pessoal", diz ele.

Concordo com a cabeça e continuo sem mais nenhum incidente para o


quarto andar, onde chego ao Apartamento 4D no fim do salão e bato na
porta. Um olho mágico se abre, revelando um olho.

"Você um policial?" rosna uma voz do outro lado.

"Não senhor", respondi, imaginando que até mesmo traficantes de drogas


apreciam boas maneiras.
O olho pisca duas ou três vezes antes que o olho mágico se feche. Do outro
lado, escuto cinco fechaduras abrirem sucessivamente. Então a porta se
abre, revelando uma outra.

"Você embala?", Pergunta a porta, que agora reconheço como um homem


extremamente grande e preto vestindo um terno azul escuro "Warm-up".

"Eu tenho dinheiro, se é isso que você quer dizer", eu respondo. Minhas
mãos estão suando.

"Bom para você." De repente, suas enormes mãos estão me revistando de


cima à baixo.

É tudo muito clínico e detalhista, mas isso não me impede de contorcer.

"Continue assim e você vai ter que me comprar um drinque", digo.

O homem silenciosamente me empurra a uma sala com o tamanho de uma


lanchonete de escola, uma ilusão realçada por uma iluminação fluorescente
e mesas de banquete com pequenos bancos. Apenas neste universo
alternativo, o ensino médio é preenchido totalmente por mulheres de meia-
idade porto-riquenhas. A sala, enquanto perfumada, não cheirava nada
diferente de uma cafetaria. As pilhas de maconha que cobriam as mesas me
fazem pensar em gramados cortados. Ou mesmo aquelas mulheres que
faziam cachorros-quentes do tamanho de uma pizza e chapava-os em
escalas, adicionando e subtraindo nuggets para conseguir diminuir o
tamanho antes de ensacá-los em sacos plásticos, conseguindo com que
ficassem com a metade do que já eram, tamanho o qual eu jamais havia
visto em qualquer supermercado.

Um homem gordo, com olhos pequenos—O vice-diretor dessa escola bizarra


se encontrava entre as mesas—mantendo um olho esbugalhado vigiando
seu engraçado negócio e, ocasionalmente, reabastecendo a escola com
capim vindo de mais um negócio familiar em um saco robusto e pequeno.
Havia pelo menos uma dúzia a mais desses sacos num dos cantos do
quarto.

A única mobília na sala, é uma mesa velha no canto oposto, ocupada por um
homem magro junto a uma mulher que usava uma camisa roubada e que
tinha um cigarro apagado pendurado em sua boca.
Sobre a mesa, apenas um cinzeiro novo e um telefone com um botão de
pressão que parece tocar cada vez que o homem magro termina uma
chamada. Enquanto eu levava um tempo para sacar isso, por razões óbvias,
o ambiente estava sujeito a uma rigorosa política de não fumar, nesse
momento era difícil não pensar em "Sísifo de Sagitário", com sua tarefa sem
fim. Era um obstáculo perpétuo para eu poder largar a nicotina.

O trabalho do homem magro não parece envolver muito mais do que a


repetição de alguns endereços, os quais ele inscreve edições em notas
compostas dentro de um mapa de metrô pregado na parede.

"Acorde, menino. O Pontífice está esperando ", diz o porteiro.

Ele não perde tempo adicional com palavras ou gestos, sua enormidade
simplesmente elimina todas as opções que não seja a de entrar por uma
porta na parte de trás da sala.

Eu entro em uma sala pequena cuja única luz vem de uma lâmpada de lava
num daqueles estilos hippies, banhando tudo em tons de vermelho. Um covil,
eu acho, ouvi então o fechar da porta atrás de mim. Meus olhos lentamente
se ajustam, revelando paredes e tetos alinhados com um tipo de tapeçaria
"Batik" que era muito popular na faculdade entre os veteranos do colégio e
os fãs de "Grateful Dead".

O único habitante da sala, é um homem caucasiano na casa dos cinquenta


anos que olhava fora à fora o lugar. Há uma pequena barbicha no queixo e
dread-locks branqueados naturalmente ou originalmente laranjas, que
estendiam até o meio das costas. Ele está vestido como um agricultor sul-
americano, mas tudo sobre ele sugere realeza, da poltrona de veludo, a qual
ele ocupa como um trono devido a maneira como inclina sua cabeça quase
que imperceptivelmente, à reposição de travesseiros que se alinhavam no
chão do quarto. Eu reconheço a gesto como uma ordem para se sentar.
Exatamente o que eu faço. O homem no trono—O Pontífice, presumo—olha
para mim como se eu não fosse real.

"Então", ele finalmente declara.


"Você é a criança." Concordo com a cabeça.
"E você está pronto para isso." Suas perguntas não têm pontos de
interrogação. Ele não está procurando respostas, ele está confirmando o que
ele já sabe.

"Eu acho que sim." Procuro em meu bolso pelo dinheiro.


"Marvin não me disse muito."

"Marvin".

"Marvin Kirschenbaum." Eu pego uma das contas, que desastrosamente


deixo cair ao chão.
"Ele disse que queria um quarto. "

"Um quarto?"

"Apenas um quarto?"

"Isto não é sobre tomar uma posição?"

"Marvin não me disse nada sobre uma posição."


Disse isso, esperando que minha voz não me traísse e mostrasse o terror
crescente beirando a histeria em minha face desesperada. Cada instinto de
meu corpo me dizia para eu dar o fora dali. Mas a minha boca, por alguma
ímpia razão, continuava se movendo:
"Você poderia me dizer um pouco mais sobre isso? "

"Então você está aqui sobre a posição." O Pontífice voltou o olhar para uma
pequena caixa de madeira, embora tenho certeza de que ele ainda está
falando comigo. Eu respiro fundo.

"Eu não tenho certeza se tenho informação suficiente ainda para responder a
essa pergunta. "

O Pontífice balança a cabeça e abre a caixa. O meu destino aparentemente


está decidido. A caixa está cheia de ervas daninhas. Ele remove um pedaço
do seu produto e desintegra-o entre seus dedos dentro de uma taça "Bong"
de três metros de altura a qual de alguma forma eu não havia notado.

"Foi a minha obra original," diz ele, riscando um fósforo com metros de
comprimento contra sua embalagem cilíndrica.

"Então você está aqui para substituir Carlos.


Diga-me por que eu deveria contratá-lo?"

Ele coloca a extremidade acesa do jogo ao lado da bacia e inala, fazendo


com que a chama salte do pó para a grama. A água na parte inferior do tubo
de vidro se torna opaca com o fumo, talvez por apenas vinte segundos. Eu
respiro fundo.
"Fume comigo, garoto."

"Tenho vinte anos de idade.

Eu comecei com uma idade em que eles dizem que eu supostamente


deveria descobrir tudo. Estou apenas levando suas palavras. Seguindo meu
coração. Perseguindo aquilo que me interessa, satisfazendo meu desejo.
É uma filosofia que até agora só me levou para o setor alimentício, onde
admito que não era exatamente onde eu gostaria ou esperava estar, mesmo
antes de alguns incidentes—um deles, realmente, uma expressão solitária da
jovem exuberância—fez consideravelmente danos irreparáveis às minhas
perspectivas no comércio.

Outro interesse que tenho seguido é o sexo oposto—As fêmeas, as


senhoras—e sem querer me gabar, mas vamos apenas dizer que tive um
pouco mais de sucesso do que com o setor de alimentos. Bom de cama, é o
que posso dizer. Sério, eu posso obter referências—embora talvez não da
minha última namorada, que por razões que ainda não estão claras para
mim, me apunhalou com uma faca e me selou com problemas de confiança.
Alguns desses problemas, somados com meu trabalho atual de fazer
sorvetes e bolos em forma de vida marinha, levaram decididamente a menos
encontros com mulheres e, tenho até medo de dizer, mas também a um
cinismo prematuro impróprio da minha idade.
Só que eu não digo nada disso. Em vez disso, espalho alguns chavões
típicos sobre ser confiável e ter disposição para trabalhar duro.

"Você pode manter sua boca fechada", diz o Pontífice.


Balanço a cabeça concordando com ele.

Vinte minutos mais tarde, eu estou saindo do edifício com um novo trabalho,
um daqueles que promete remuneração relativamente alta e pouco serviço,
foda-se você Tom Carvel, chupa essa!

Percebo no momento que embarco no trem de volta para Long Island que
havia esquecido de comprar a erva para oTio Marvin.
3

"TALVEZ VOCÊ POSSA FICAR TÃO INTELIGENTE QUE não vai querer
fazer sexo mais", diz Tana.

Ela está vestindo uma camiseta e uma cueca samba-canção enquanto se


inclina em algum tipo de pose de yoga. Uma das matérias que ela está
fazendo na escola.

"Felizmente eu não sou tão inteligente", eu digo.


"É costume fazer yoga usando uma roupa sobre a outra?"

"Não. Para as meninas usa-se principalmente Lycra e tiras de couro.


Para quem podemos perguntar quem realmente é inteligente?"

Eu me sento em sua mesa rosa, estudando uma colagem de belos astros da


música pop e ídolos adolescentes que estão pregados no seu quadro de
avisos desde que a conheci.

"Embora seja verdade que eu não sou mais um cara da faculdade, tenho
experiência para saber que o homem desenvolveu seu cérebro para obter
mais sexo, e não o contrário."
"Quero dizer, Glenn, ele é totalmente brilhante", diz ela, sem fôlego, embora
isso possa ser devido a yoga."

"Ele não pode ser assim tão brilhante se ele quer fazer sexo com você."

"Me diga você que faz doutorado sobre semiótica aplicada."

"Não posso dizer que estou muito familiarizado com o assunto. Agora por
outro lado 'sêmen-bióticos...'"

"Você fica aí zombando", diz ela, esticando-se até os dedos dos pés,
"O que você não entende é que..."

"Bem-vindo à história da minha vida."

"Você tem que ouvi-lo falar sobre isso. Eu fico tão excitada só de ouvir sobre
o que ele está lendo."

Ela se levanta e caminha em minha direção, tentando alguns movimentos


para me seduzir.
"Lacan ..Derrida...Foucault."
Eu ameaço um rugido apreciativo e ela reconsidera sua abordagem.
"Então, chega de falar sobre meu sofrimento", diz ela, dobrando seus braços.

"Quem você está fodendo nesses dias?"

"Essa é fácil, você."

"Vamos, confesse. E aquela garçonete? Aquela com o cabelo loiro e sedoso,


e com os seios desenvoltos?"

"Heidi", eu digo. Um caso de verão. Eu costumava ligar após o seu turno da


tarde no Bennigan, quando seu sedoso cabelo loiro cheirava tragicamente a
cerveja velha e fumo, e até mesmo suas tetas já estavam esgotadas.
"Nós atingimos um ponto."

"Deixe-me adivinhar....Ela cansou de sair apenas para transar?"

"Desculpe-me por não querer voltar para um relacionamento sério.

Tana se recupera da pergunta anterior.


"Deixe-me ver novamente."

Eu puxo para baixo a gola da minha camisa, expondo a cicatriz que tenho—
aliás a única que posso mostrar e ao mesmo tempo manter minhas calças
vestidas.

"Puta merda", diz ela.


"A vadia era sentimental."

"Nenhum argumento aqui. Mas nós tivemos nossos momentos."

Tana suspira em tom melodramático.


"E agora você nunca vai se apaixonar de novo."

"Pelo contrário. Estou pensando em me apaixonar muitas, muitas vezes."

"O verdadeiro amor é apenas uma piada?"

"As piadas são engraçadas. O verdadeiro amor não é apenas falso, é


também perigoso à sua saúde."

"Seja esfaqueado por um psicopata..."


"Estou falando sério", eu digo.
"Alguns produtos químicos em seu cérebro te enganam e fazem pensar que
você tem sentimentos por alguém. E isso é quando os problemas começam.
Abaixe sua guarda, e acontece igual a Lucy Van Pelt jogando futebol
americano com Charlie Brown."

"Você deveria estar me animando."

"Eu pensei que estava. Você não pegou a referência daquele desenho do
Snoopy? Você sabe...Lucy, Charlie Brown..."

"Eu acho que esse novo emprego vai ser bom para você. Pelo menos você
vai encontrar algumas pessoas que não conhecia no colegial."

Meu novo emprego começou naquela mesma manhã logo depois da minha
entrevista. Conforme orientado pelo Pontífice, conheci Rico perto de um
balcão dentro da Autoridade Portuária. Minha segunda audição.
O trabalho foi, sem surpresa, longe de ser praticamente ilegal, como eu
poderia dizer, relativamente de baixo risco, pelo menos para mim.

O Pontífice tinha um sistema de entrega do pote bem inovador, assim como


audacioso, permitindo que aqueles que desejassem o alface do demônio
deixassem seus dedos caminharem sempre que surgisse a necessidade.
Um operador estava a espera—Billy, o Sísifo, aquele homem próximo a
esposa que estava no apartamento.

Uma hora mais tarde, em um ponto perto, mas nunca muito perto de sua
localização, os fumantes felizes poderiam trocar US$ 100 por aquilo que o
Rico chamava de "Um quarto de um cavalheiro." Não resisti e perguntei o
que diabos seria isso.

"Uma taxa conveniente," ele diz. A operação não seria possível sem essa
conveniência moderna: o pager. De uma maneira que eu admito não ser
totalmente saudável, é o que finalmente me colocou em um trabalho que, se
eu realmente tivesse algum senso comum ou mesmo algum julgamento
moral e ético de um cavalheiro, eu teria recusado.

Mas o Motorola que Rico havia entregue a mim, era uma homenagem em
miniatura ao estado-da-arte: uma com apenas duas linhas, com 40
caracteres (um recurso que Billy teimosamente se recusou a abraçar, nunca
se afastar de seu padrão "4:20"), contendo hora e data (Eu poderia
finalmente me livrar desse Timex de merda que estava usando), oito
selecionáveis alertas musicais (com ordens estritas para deixá-lo no modo
vibratório—Billy novamente); e um despertador embutido (uma boa idéia na
teoria, desnecessariamente chocante em prática).
Eu me sentia como a porra do James Bond.

"A corda", Rico chamava assim o pequeno aparelho.

Talvez. Mas após uns anos vagando sozinho no deserto, estava pronto para
ser amarrado por essa "corda".
Mesmo sendo uma organização de viciados criminais, e ainda mais
impressionante, viciados criminais maconheiros; eles estavam muito bem
organizados.

A parte mais importante de ser um "Rosto"—um termo usado pelo Pontífice,


onde a maioria dos empregados diriam apenas "O garoto da entrega"—foi a
de manter um suprimento sem fundo de troco e fichas de metrô. O resto do
trabalho estava próximo de um telefone público, de preferência em algum
lugar quente e à espera de páginas trazidas por Billy.

As conversas que se seguiram foram curtas e diretas ao ponto: duas


localidades—pegando as coisas e ir ao encontro.
À sua maneira, a parte de pegar as coisas era mais empolgante que o
pequeno aparelho que eu havia ganho.

Billy, usando alguma lógica misteriosa entendida apenas por ele, dirigiu sua
face ao que era tipicamente um lugar de reunião lotada.
Lá, estava Middleman—mais frequente do que Joseph, com um Rastafari e
uma cicatriz na bochecha—esbarrou-se no "Rosto", deslizando um saco
("Um Quarto de Cavalheiro") para dentro do bolso. Toda a interação entre os
dois encerrou-se sem cumprimento ou reconhecimento, apesar dos meus
acenos sutis e sobrancelhas levantadas, Joseph parecia com a intenção de
fazer com que "não tomar conhecimento de mim" seja parte do seu trabalho
muito, muito a sério.

No caso improvável de que alguns senhores da lei com olhos-de-águia por


acaso vejam nossa transação, o pequeno tamanho do saco e a falta de
qualquer componente financeiro, significava no máximo uma contravenção
classe B, que Rico havia mencionado a mim de um modo que me fez pensar
que realmente não era muito assustador.
Mas nunca me ocorreu. A cidade tinha uma média de três assassinatos e
Deus sabe quantos assaltos e estupros por dia, fornecendo drama o
suficiente para uma força policial que, pela sua própria estimativa era
sobrecarregada.

Eu tenho certeza absoluta que poderia ter feito a primeira parte do plano
vestido com roupas de palhaço, tocando tubas e violão, que não haveria
nenhuma interferência dos homens de azul.
O que permitiu ao "Rosto" meia hora, mais ou menos, para chegar e
encontrar-se com o cliente.

O encontro nunca ocorria no mesmo local em que Billy transmitia. Ao longo


do primeiro dia, eu assisti Rico caminhar cada potencial comprador para um
beco próximo ou varanda isolada, onde ele os submetia a uma série de
perguntas que ele me contou mais tarde foram escritas por advogados do
Pontífice.

"Não importa o quão grande e duro seja o pau, o juiz tem que colocá-lo para
fora", ele me explicou.
"Um policial responde a estas perguntas, isso é uma fria armadilha."

Mas novamente, eu nunca cheguei a isso. No final do expediente—um


armário tradicionalista, o Pontifíce quebrou a semana de trabalho em cinco
ou oito horas restritas—Middleman e o "Rosto" se encontraram para uma
última colisão. Dessa vez era dinheiro que trocava de mãos—o dia havia
valido menos do que um salário diário, o que para mim era $80.

Não foi um esquema infalível, mas como ninguém agiu como um tolo, ele
poderia muito bem ter sido. Assim disse o Pontífice, que promoveu seu
negócio com um ar de atrevimento que beirava a fronteira do absurdo, nem
mesmo seus clientes mais próximos poderiam esquecer a quantidade de
pedágios livres que ele forneceu a eles:

1-212-MARIJUANA.
Meu novo emprego.

"Eu sou um traficante, Tana.


Ninguém quer sair por aí com um desses."

"Bom argumento," ela admite, se curvando em outra posição de yoga.


"Eu acho que você está destinado a ser sem amigos e sozinho, exceto para
mim."

"Você vai voltar para a escola."

"Você sempre pode ser preso.


Três palavras para você: Prisão. Quente. Sexo."

"Não pense que nunca considerei isso", digo, deslizando para fora da mesa.

"Falando de trabalho..." Eu atirei a ela um saco do material.


Ela abre e inala o buquê.

"Vou deixar um pouco para o seu tio Marvin. Não belisque muito."

"Uh, eu vou embora amanhã de manhã.


Eu não sei exatamente se vou vê-lo antes de ir."

"Então me devolva." Tana começa a formar um grande bico.

"Você nem mesmo gosta de maconha." Eu digo.

"Eu não. Normalmente. Mas Glenn disse algo sobre


querer ficar alto..."

"Por que você não disse logo?


Considere essa minha doação às suas poses eróticas de yoga. Eu pego para
Marvin outro saco desse."

"Você vê isso?"
Diz ela, escorregando a grama dentro de sua bolsa de maquiagem.
"Isso, meu amigo, é um bom karma. Apenas sente e assista. O universo está
agindo para recompensá-lo."

4
NÃO ENCONTRAR COM PESSOAS NÃO É A ÚNICA COISA permanente
entre mim e a vida social. Há também o fato de que eu ainda vivo com meus
pais. Meus pais os quais dirigiram incontáveis horas para me buscar em um
hospital próximo das Cataratas do Niágara.
Nós voltamos para casa em relativo silêncio, o que por mim tudo bem; pelo
menos não havia muitas questões sobre Daphne.

Pelo tempo que ficamos presos na estrada, eu decidi que eu poderia tolerar
pelo menos uma ou duas semanas sob o teto deles novamente. Apenas
tempo suficiente para voltar ao jogo. Mas que jogo?

Com minhas feridas curadas e minha inquietude crescendo, eu fiz duas


descobertas preocupantes:
(1) não tinha qualquer pressa para voltar para trás na faculdade, dado o quão
desligado eu estava durante o último semestre; e
(2) Eu era um intocável, pelo menos enquanto a indústria de alimentos
estava preocupada com meu trabalho. Os acontecimentos em Hempstead
tinham me transformado em uma celebridade local. E embora muitas bebidas
gratuitas percorriam o meu caminho, ofertas de trabalho não.
Só meu velho chefe na Carvel, onde trabalhei meu último ano do ensino
médio, teve misericórdia de mim quando eu concordei em trabalhar por
apenas um salário mínimo. O que não dava para pagar alojamentos que não
tinham o nome "Projetos" anexada a suas portas.

Eu larguei Carvel na mesma noite que regressei a minha orientação com


Rico. Em duas semanas, eu tinha salvo dinheiro o bastante para achar um
lugar só meu. Talvez até mesmo na cidade, como se eu me vangloriasse ao
tio Marvin. Mas eu ainda preciso de uma história para contar aos meus pais.
Muito arriscado mentir sobre um emprego em um restaurante—poderia gerar
uma visita surpresa deles, já que ficava muito próximo a cidade.

Eu decidi dizer a eles que eu encontrei um trabalho regular como controlador


de temperatura em um escritório. O que significava sorrir muito enquanto a
minha mãe, explodindo de alegria descobria sua nova capacidade de usar
"meu filho" e "escritório" em uma mesma frase, me arrastando para o
shopping e forçando um guarda-roupa totalmente novo para mim.

Ela acorda na Segunda-feira bem cedo, me faz café da manhã e prepara


minhas novas roupas. Eu com certeza seria o único negociante de ervas na
área vestido com roupas de negócios casuais.

Até o momento que cheguei na cidade através do meu primeiro dia de vôo
solo, o telefone já está tocando.

"A entrega está na Rua da Estação nº 59, perto da banca de jornal. O


encontro é num portão na Av. Engenheiros nº95.
Jovem garota. Procure por Lycra."

Acho que vou gostar deste trabalho. O problema, quando eu chegar ao


portão, vai ser um embaraço de riquezas.

Cada terceira ou quarta pessoa é uma mulher com menos de trinta anos
usando Lycra, muitos corredores tonificam os glúteos na pequena estrada
em torno do reservatório do Central Park.

Meu olhos finalmente acham uma mulher que não está correndo. Ela é
alguns anos mais velha que eu, talvez vinte seis ou vinte e sete. Pele clara,
cabelo loiro curto, e os seios que, embora não enormes, ainda demandam
atenção. Tênis caros. Talvez uma jovem advogada. Uma mulher casada.
Uma professora e filha de algum capitão da indústria.
Em qualquer caso, minha primeira cliente.

"Você é ele?", Pergunta ela.

"Eu espero que sim", Eu respondo, escrevendo uma nota mental


agradecendo a minha mãe por me tirar de casa em outra coisa que não seja
uma camiseta e jeans.

"Você não se parece com um traficante de drogas."

"Quem disse que eu sou um traficante?"


Nunca admita que você é um revendedor, Rico tinha me avisado. Você os
deixa estabelecer a intenção de vender, e você poderia muito bem ter
entregue as chaves para sua cela na prisão.

Ela suspira. "Não, não, sim, não, sim."


"O que é isso?"

"As respostas para as perguntas que você está prestes a me perguntar."

"Você já fez isso antes."

"Sim", diz ela, balançando impacientemente seus dedos.

"E você?"

"Você pode dizer que é meu primeiro dia no trabalho?"

"Parabéns. Podemos acabar com isso? Eu devo voltar para casa."

Ela puxa o dinheiro para fora do sapato. Eu entrego o saco.


Ela desliza o saco pela parte de trás da calça e começa a caminhar. Tanta
coisa para fazer novos amigos no trabalho.


MEU PRÓXIMO ENCONTRO É NA "Wall Street", uma estreita cidade na
Segunda. Joseph desliza por mim no trem entre as estações Chambers e
Fulton, escorregando um saco na minha jaqueta. Eu emergi da estação
enquanto lá fora começava uma chuva leve, tenho ainda dez minutos de
sobra até o encontro.

Tomando abrigo em uma porta, eu assisto as pessoas com seus trajes de mil
dólares, água escorrendo e rolando fora de seus cabelos com gel enquanto
eles gritam com seus telefones portáteis. Eu silenciosamente torço por um
relâmpago.

Dez minutos passaram apontando o tempo do encontro, percebo um garoto


com a minha idade que facilmente poderia parecer comigo. Uma versão bem
babaca de mim mesmo. Seu cabelo está lambido, todo para trás, parecido
com todos aqueles Tele-tubbies, mas seu casaco mostrava outra coisa. É
uma versão fora de moda que fugia o uniforme padrão.

Ele tenta fazer um contato com os olhos, então eu aceno um pouco com a
cabeça.

"Hey," ele diz. "Você está a procura de Danny?"

"Isso depende," Eu respondo. "Você é ele?"


"Talvez, por quê?"

"Pois, eu saberia que não estaria procurando por você," eu digo.


"O cara que procuro deveria supostamente estar usando uma jaqueta
Armani."

"Relaxa, almofadinha," ele diz, insultando as calças que minha mãe havia
comprado para mim. Agora eu realmente não gosto desse cara.

"Danny está no seu escritório. Ele me disse para vir aqui encontrar com
você."

Eu me virei para o lado do metrô, pronto para correr—outra sugestão de


Rico.

"O proxy é como um sinal vermelho," ele disse, me surpreendendo por usar a
palavra "Proxy".

"Ninguém é lerdo o bastante para não pegar sua própria merda, se você me
entende?"
Por outro lado, a polícia, na experiência de Rico. era mais que capaz "desse
tipo de subterfúgios."
Digo a ele que não conheço nenhum Danny.

"Danny Carr," ele insiste.


"Ele disse que há mais onças esperando se você resolver ir até o seu
escritório."

Estranhamente, a oferta de dinheiro extra é atualmente um sinal positivo de


que isso não é uma armadilha. Outro "Ricoísmo": A polícia não pode ter um
caso, se algum policial incita você a cometer um crime.

"Por quê eu deveria ir até seu escritório?"

Ele segura a palma de sua mão e começa a esfregá-las.


"Trabalhar para Danny significa fazer o que ele pede, quando e aonde ele
pedir. Ou como ele mesmo diz, "Por-quês" não são componentes do meu
trabalho."

"Meu coração sangra por você. Mas eu não trabalho para seu chefe."

"Nem mesmo eu, se você não me seguir de volta para lá. Vamos. Cem
verdinhas a mais por, digamos, dez minutos a mais de trabalho."

Eu procuro por outros sinais suspeitos. Como eu saberia.


"Você é um policial?" Pergunto apenas para seguir o roteiro.

"Claro que não, caralho!" Ele ri com feições nervosas.


"Por quê você acharia que eu sou um policial?"

Meu espírito cauteloso finalmente vai embora diante do meu desejo


ganancioso pelo dobro do pagamento diário. Eu sigo o garoto através da rua
até um escritório. Nós passamos por uma mesa, acenando para o segurança
e pegamos um elevador até o vigésimo terceiro andar.
Logo que entramos no elevador ele estende uma das mãos.

"Rick Cleary."

"Okay," Eu ignoro sua mão.

"Então você é, digamos, o traficante de Danny?"

"Eu realmente não sei sobre o que você está falando."

"Sei, sei, ainda com a dúvida de eu ser um policial."


Eu procuro no elevador pela possibilidade de câmeras escondidas, fingindo
não ouvir ele.

"Você não quer falar sobre isso, fique frio."

Chegamos ao vigésimo terceiro andar, onde uma daquelas máquinas


recepcionistas nos dá boas vindas aos "Investimentos DC". A mesa está
vazia como a maioria dos cubículos, Rick me direcionou até um escritório no
canto da sala.

Dentro do escritório, um homem bem arrumado usando um terno mas com


um penteado bagunçado tipo do Gargamel, ruge algo parecido com japonês
falando através de um celular. Danny Carr, eu presumo.
Ao me ver, ele gesticula para me sentar no sofá. Já ao ver Rick, ele acena
vigorosamente para a saída. Rick volta seus passos como um carangueijo,
fechando a porta atrás dele.

Quando me sento no sofá de couro, Danny alcança um cabinete atrás dele,


puxando uma caixa que me lembrou uma daquelas casas de pássaros que
se pode comprar em uma loja de madeira. Essa casa de passarinho estava
rodeada de fios elétricos, eu notei quando ele os encaixou na parede,
deixando a caixa iluminada de um verde neon.

Enquanto continuava sua conversa em japonês, Danny retorna ao seu lugar


com um tubo cirúrgico com mais ou menos 20 cm e um pequeno disco metal
que talvez tivesse a circunferência de uma Skol.

"Onde está Carlos?" ele diz, finalizando sua chamada. Carlos era o garoto
que havia visto destruindo seu Motorolla na escadaria.

"Eu sou o novo Carlos," eu digo.

"Novo Carlos." Ele ri.


"Como uma nova Coca. Vamos esperar que você dure mais tempo. Você não
se parece com um traficante."

"Engraçado. Todo mundo continua me dizendo isso."

"Carlos e eu temos alguns arranjos, isso é tudo. Ele merece um suco extra
por fazer o truque nas escadas."

Ele desenrola duzentos dólares de um clipe de dinheiro e coloca em minhas


mãos.
"Você não se importa, certo?"

"Eu acho que não." Meus olhos se viram de volta a casa de passarinho.

"É chamado de vaporizador," ele explica.


"Meu primo me mandou um de Los "inferno" Angeles. É como uma coisa
saudável para se comer. Só demanda muito tempo para digerir."

Danny puxa um pacote de cigarros e balança umas duas vezes com suas
mãos antes de me oferecer um. Balanço a cabeça dizendo não. Meu celular
está vibrando novamente.

"Eu devo ir agora."

"O serviço de um doceiro nunca acaba. Mas enquanto eu tenho você aqui,
deixe-me usá-lo para resolver outro assunto. Outro negócio que tenho com
Carlos. Esse merda que você trouxe está boa para o escritório," ele diz,
apontando para a mala que eu coloquei na mesa.
"Mas para o fim de semana, eu vou precisar de mais peso. Eu sei: eles já te
disseram que não trabalham com mais do que isso."

Ele está certo: Rico deixou isso claro, durante nosso tempo junto, qualquer
transação envolvendo algo mais que "Um quarto de um cavalheiro" estava
proibido por decreto papal. É o tipo de modéstia que mantém o Portífice
dentro dos negócios e fora da jaula, é também, ele havia sublinhado, a razão
de Carlos ter sido demitido.

"Primeiro dia," eu digo, segurando minhas mãos uma sob a outra.

"Claro," Danny diz, me entregando um cartão.


"Quando você mudar de idéia, existe um extra de quinhentos dólares por
semana para você."


EU ENCONTRO COM O PRÓXIMO CLIENTE na esquina da Rua Vinte e
Três com a Sétima avenida. Meu primeiro pensamento foi: Quem sabia que
tantas mulheres bonitas fumavam esse bagulho? Meu próximo pensamento:
Ela é ele. Não um travesti...mas, eu tenho que admitir, um homem muito
atraente vestindo uma calça de couro apertada e uma jaqueta preta.

Ele grita quando me vê.


"Hey! Pooooor favor me diga que você tem a maldita erva!"
Ele bate seu pé inquietamente enquanto eu continuo com o script habitual e
ele responde com todas as respostas certas. Até que nós chegamos na parte
do dinheiro.

"Merdaaaaa!" Ele remexe os bolsos tirando uma camisinha e alguns fiapos.

"Nós terminamos aqui," eu digo, andando de volta para a estação.

Ele segura meu ombro. Eu me viro novamente para ele, colocando-me o que
eu espero que seja um movimento de combate. Eu me considero mais um
amante do que um lutador, mas eu não vou ser intimidado por um cara
usando delinhador.

"Você está violando meu espaço pessoal," eu digo.

"Me siga de volta até meu lugar. Kristof tem seu bagulho."

"Me ligue de novo quando você o tiver." Eu continuo a andar.

"É logo abaixo a essa maldita rua. Você conhece o Hotel Chelsea?"

5
EU VI SID E NANCY QUATORZE VEZES. Diferente do que você está
pensando, eu não sou um fã retardado e obsessivo. Digo, é um ótimo filme,
mesmo eles estragando Johny Rotten. Uma história de amor que não é cheia
de merda, que reconhece a estupidez de tudo—verdadeiro amor, impossível
no mundo real, só leva à dor.

Mas essa não é a razão deu ter visto ele quatorze vezes. Eu o vi, pois era o
único filme que Daphne tinha, e nós éramos muito preguiçosos, lerdos, ou
estávamos excitados demais para ir até a loja de vídeos.

"Te lembra de alguém que conhecemos?" ela me perguntava toda vez que o
filme acabava. Uma pergunta que poderia ter sido, vamos encarar, uma
gigante bandeira vermelha, dado que—desculpe se eu estou contando o final
para vocês—Sid acaba enforcando Nancy até a morte em um quarto no
Hotel Chelsea.

Mas então Daphne cantava junto com o final, Leonard Cohen: "I remember—
you well in the Chelsea Hotel, you were talking so brave and so sweet, giving
me head on the unmade bed..." Em certo ponto ela parava de cantar no meio
da cena—a T.V. estava localizada no quarto. Agradavelmente, diferente da
música ou do filme, a versão de Daphne sempre acabava com um final feliz.

Nós costumávamos conversar sobre ficar nesse hotel, tempo o suficiente o


qual eu assumia ser uma noite de sexo que poderia estourar os miolos.
Antes dela tentar me matar. Ainda assim, eu devia para mim uma visita ao
lugar.

"Entro e saio," digo ao "calças de couro".


"E isso, você sabe, não é alguma metáfora para qualquer coisa. Falo sério. É
melhor você não se oferecer para me chupar quando chegarmos lá."

Ele já está correndo rua abaixo.

"Você sabe, para um traficante," ele grita sobre seus ombros, "você se veste
como um verdadeiro cuzão."

O hotel, com mais ou menos uns cem anos, parecia exatamente com sua
idade. Não muito de fora, mas dentro parecia que havia acontecido uma
guerra recente entre latifundiários e trabalhadores. Eu apostaria nos
latifundiários. Mas eu ainda sentia uma coceira ao ver o já familiar salão de
espera, perto de cada quadrado de tinta na parede havia um espaço pintado
por pintores e artistas que aparentemente teriam sido escolhidos de forma
aleatória.

Eu sigo o "calças de couro"—que até agora se apresentou como Nate—


passamos o balcão até os elevadores. Um cara com um suéter caro,
possivelmente Casimir, um colete apertado e um sapato de bico fino
pressionando o chão que pisava. Ele nos examina através de um óculos
preso por um cordão envolto a seu pescoço. Ele não parece satisfeito.

"Olá, Herman!" diz Nate, acenando para ele enquanto subia uma escada
espiral pulando de três em três degraus após passar pelo homem. Vou atrás
de Nate, sentindo uma encarada de Herman atrás de mim. Nós não paramos
até chegar ao quarto andar.

Eu não tenho certeza do que esperar. Meio que uma casa punk-rock
animalesca, talvez. O papel de parede escuro e os encanamentos rústicos
pareciam certos, mas o corredor está quieto e vazio. Me ocorreu na hora que
era a segunda vez nos meus três encontros, que eu violava a regra de não
seguir os clientes até suas salas ou quartos. A polícia poderia estar
esperando por mim. Ou pior, eu poderia estar prestes a cair em uma
armadilha ao dar o primeiro passo através da porta.

Nate seguiu até o fim do corredor correndo como um daqueles "jackass"


maníacos, fixando seus pés no quarto 411.

"Janis Joplin," ele diz.

"Me desculpe?"

"Essa foi a suíte de Janis Joplin."

Então ele abre a porta, sugando todo o medo e o desapontamento no ar.


É o bastidor de um concerto de rock nascido na imaginação de um
adolescente excitado: cerveja, garrafas do bom e velho Jack, ninfetas do
rock semi-nuas. Ouvia-se explodindo em um rádio sobre a cabeceira o som
de Guns 'n' Roses.

Uma loira de topless rebolava ao som da música em cima de um cara


sentado em um sofá, hipnotizando-o com seus seios perfeitos demais para
serem reais.

Um cara europeu com um cigarro já queimado e uma jaqueta marrom que


poderia ser feita de pele de bebês, se animava junto com duas morenas
usando camisas curtas, traseiros tão esculpidos que deveriam estar em um
museu, assim como elas praticavam um rebolado que poderia fazer a
Lambada parecer Break-dance. Uma parte do meu cérebro que não se
maravilhava como um turista, se perguntava do por que eu não ver nenhuma
marca de calcinha.

"É você?" vem uma voz da cama atacada à parede.

Eu me viro em tempo o suficiente para ver uma perfeita silhueta de mulher


formando-se no corredor contra a luz da porta, um caminhão me veio em
mente. Então ela entra no quarto, e nada mais me lembrava o caminhão.
Seu rímel parecia ter uma fração maior de tinta do que preciso, deixando
espaço para seus olhos—um azul radioativo, vivo e inteligente. Suas
bochechas altas eram suavizadas pelos seus afáveis lábios e um cabelo que
descia em formato de ondas através de suas costas. Um corpo com longas
pernas e curvas que poderiam ter sido a assinatura de algum gênio da
cirurgia plástica e ainda assim seriam consideradas verdadeiras. Ela usava
um top com mais ou menos um quarto de comprimento, calcinha branca, e
nada mais.

Ela olha para mim com um tom de dúvida. "Você não é o Nate."
Nate cruza a porta com o cara europeu que tentava alcançar sua carteira.

"Não," eu respondo, esperando uma oportunidade de falar. Mas fui muito


lento.

"Bem, então feche a maldita porta," ela diz. No momento que eu entro e
fecho a porta atrás de mim, Nate está agradando-a com um beijo.

"Aqui está meu anjo," ele diz, envolvendo-a com seus braços como um
dançarino.

"Eu apenas estava me assegurando sobre sua escolha."

Ele a abraça, desliza uma nota de $100 em sua calcinha, e a vira para mim.
Nós realizamos ao mesmo tempo—e ambos com alto nível de desconforto—
que eu deveria remover o dinheiro de suas intimidades. Nós finalizamos a
transação com o mínimo de contato visual.

"Ao menos aí dentro é tudo natural," ela diz. Eu tiro o pacote de erva do
bolso e coloco em sua mão.

"Agora venha aqui, docinho," Nate diz, levantando sua sobrancelha.


"Algumas coisas artificiais têm o seu charme. Não acha, Clem?"
O rapaz no sofá parecia concordar, sua resposta foi abafada pelas
magníficas curvas das loiras.

"Você é um porco," diz a silhueta, retornando com a erva para seja lá qual for
a terra mágica que ela emergiu. Nate a segue, parando apenas para me dar
um soco no ombro.

"Você é o cara," ele diz para mim.


"Fique e festeje. Eu aposto que Kristoff irá dividir."

No outro quarto, as duas morenas—que Kristoff aparentemente pagou—


cruzavam suas línguas em algo que aparentava um beijo. Eu olho para baixo
procurando meu celular. É exatamente onze horas da manhã.

"Eu preciso voltar para o trabalho."

"Bem, então volte depois mais tarde," ele diz, fechando a porta do quarto.
"A festa nunca acaba."

Seis horas depois, após colocar minha jaqueta esporte em uma escada de
incêndio próxima, eu volto para Chelsea.
O homem naquele suéter de talvez-casimir está sentando na mesa,
visivelmente em seu elemento natural. Ele é o mestre do envolvimento.
Iludido por alguma ilusão ótica ou algum arranjo, a luz na sala realmente
parecia ter vindo do homem.

Eu sorrio, aceno da mesma forma que havia visto Nate fazer, digo "Olá,
Herman!" e me dirijo às escadas.

"Eu não 'ááácredito' que nos conhecemos," Herman diz. Sua voz é o que
você pode dizer, "A autêntica Nova Iorque," nasal e amplificada pelo domínio
de sua garganta presa.
"Cê tava aqui má cedo, com o Nate."

"Eu estou subindo as escadas agora para vê-lo," eu respondo. Mas meu pé
para de se mexer e a escadaria—outra ilusão ótica—parecia se mover para
longe de mim.

"Não, cê não vai. Não á ménos que priméiro cê passé por mim."
"Eu não imaginava que aqui fosse esse tipo de espelunca," eu respondo,
uma tentativa lamentável de humor barato. Talvez faltou algo sobre mulheres
nuas.

"Você quer ver meu cartão?"

"Huh," ele nega.


"Cê achá qué eu não séi o qué é um tráficánte?"

Ouch. Eu viajo sobre meu cérebro por uma resposta até que um sino tocou.
É o elevador. Nós dois nos viramos para suas portas. A silhueta está
diferente, mas eu sabia imediatamente que era a mesma garota. Ela entra no
salão. Seu cabelo está liso, ainda molhado devido ao chuveiro. Ela usa uma
mini-saia de alguma escola Católica, e uma jaqueta muito grande que
provavelmente pertencia a Nate.

"Oi," eu digo, um pouco cedo.

"Oi," ela responde, potencialmente concedendo sua inabilidade de me notar.


Seus azuis radioativos estão como um vermelho petrificado.

"Quando eu estava aqui mais cedo. Essa manhã. Nate me disse para passar
aqui mais tarde."

"A festa acabou horas atrás."

Herman olha para baixo quando ela diz isso, aparentemente profundamente
triste com a novidade.

"Eu sou um idiota," eu sugiro.

Ela olha para mim. Agora eu desejava estar usando outra coisa além de uma
jaqueta esporte de lã e uma calça ridícula.

"Provavelmente," ela finalmente diz.


"Mas você é coerente o suficiente para tomar uma bebida comigo, certo?"

"Claro," eu digo, "Eu me orgulho da minha coerência."

Herman desliza de volta para a sombra atrás de sua mesa.

Eu a sigo ao final de um corredor que conectava o salão até um restaurante


mexicano, onde algum tipo de música 'macareña' tocava através de
pequenos auto-falantes e as garçonetes se vestiam para alguma luta de
touros. Nos sentamos em uma mesa e pedimos algumas margaritas e
nachos.

Seu nome é K. Na verdade, Katherine, mas ela adotou a inicial pois achava
que poderia ajudá-la na carreira de modelo profissional. Seu primeiro
emprego, arrancou-a do Norte da Califórnia—"Sunnyvale!" ela força um
sorriso falso—até cruzar o oceano pacífico, onde ela passou três meses
fazendo fotos para catálogos na Coréia do Sul, Japão, e Hong Kong.

"Incrível," ela diz, "mas incrivelmente solitário."

Ela conheceu Nate durante uma viagem de volta a São Francisco—ele e


Clem, o cara que eu havia visto se dando bem no sofá, formaram metade de
uma revigorante banda de L.A. chamada Venomous Iris. Um encontro
embriagado seguido de um fim de semana embriagados no Vale da Napa e
um convite de Nate para voltar com ele a L.A., onde ele arrumou algumas
brincadeiras ao pôr do sol.

“Ele era alto, sexy, falava um inglês britânico e que se foda, a idéia de seguir
uma banda por algum tempo seria provavelmente muito divertido.” diz K.

Clem havia dito desde o começo que Nate era um deus da guitarra, e ele não
estava mentindo: A banda assinou um acordo para seu primeiro álbum, 'Love
Vampire', ganhou alguns críticos influentes que diziam que o álbum era algo
como a fusão entre Guns e Bowie. As vendas não foram incríveis, mas
prometeram algo que valeria um tiro dado para um segundo álbum, o qual
conseguiram começar as gravações em um estúdio. Apenas mais um estúdio
em L.A. era...você sabe, L.A.—não exatamente condizente o suficiente para
terminar essa merda.

Eles de alguma forma se envolveram com Kristoff, quem gastou um pouco


de seu tempo trabalhando para estúdios e também possivelmente como um
traficante internacional de armas, mas nós não conversamos sobre isso, ele
ofereceu também não apenas gerenciar a banda mas bancar uma viagem
para Nova Iorque, pois não há distrações em Nova Iorque, certo?

Essa última parte foi sarcasmo, K. reforça para mim.

Eles mudaram para Chelsea oito meses atrás. Herman se encarregou para
que eles fossem tratados como convidados, dando-os a suíte que pertenceu
a Janis pois, como ele disse à eles, ele realmente acreditava nas habilidades
artísticas de Nate.

Herman amava artistas, K. explica. Ela achava que as pinturas no salão


eram presentes que ele havia aceito em troca dos aluguéis dos quartos.
Pedimos mais uma rodada de margaritas.

"Como o álbum está indo?" Eu pergunto.

"Ah," ela diz com um suspiro.


"O álbum."

Um mês após ela estar no Chelsea, Brett, o baixista, morreu de aneurisma.


O processo então demorou aproximadamente dois meses até acharem o
substituto de Brett. Ralphie dos Queens, durante um dia de seleção no
CBGB.

Ralphie era bom, provavelmente melhor que Brett—muito Les Claypool—


mas Brett era mais paz e amor, enquanto Ralphie é, você sabe, intenso.
A reformulada Venomous Iris gravou mais quatro músicas antes de Ralphie
socar Clem na cara, o que, se você ficar algum tempo com Clem, seria
inevitável. Ralphie foi embora e os próximos três caras eram horríveis.

Scott, o baterista, ficou tão puto com a situação que largou a banda e se
inscreveu em Columbia—curso de psicologia. Mas Clem finalmente resolveu
as coisas com Ralphie e então começaram a gravar o mais cedo possível
após Scott terminar os exames finais. Nate acreditava que o álbum—agora
eles o chamavam de Hell's Sweet Gravity—poderia estar pronto até o Natal,
mas com todos nós nas festas dos feriados, curtindo, e depois se
recuperando da ressaca, seria um grande feito, sem mencionar um milagre
eles terminarem antes do verão.

K. olha para mim para mensurar meu interesse.


"Eu estou te amolando muito?" ela pergunta.
Eu digo a ela que não e peço outra rodada para provar isso.

Em outra rodada de ironia, o que foi mal para a banda foi bom para K.
Uma semana após sua chegada, no elevador—o elevador do hotel era
basicamente onde tudo de interessante acontecia—ela conheceu Ray
Mondavi. Ele morava no oitavo andar, onde tinha um estúdio fotográfico, e
ele ofereceu tirar novas fotos para ajudá-la a entrar de novo em circulação.
Isso não foi tudo que ele ofereceu, mas se você conhece Ray, você sabe que
ele simplesmente não pode ajudar a si mesmo e não, nada nunca aconteceu.

Ele mostrou as fotos para John do Elite, quem fez um 'Book' e a colocou em
uma lista que gerava algum tráfico na Broadway e agora John dizia que ela
estava no topo da lista de biquínis da Sport's Illustrated. Não que ela
acreditasse nele—ela sabe todas as estórias—mas merda, dedos cruzados,
certo?

K. cruzou seus dedos, balançando-os para mim como se fosse soltar alguma
mágica.
"Eu agora oficialmente terminei de falar sobre mim," ela diz.
"Sua vez."

Três margaritas eram exatamente o suficiente para eu começar a falar de


Daphne.

"Eu deixo minha estória para nosso próximo encontro," eu digo, colocando
duas notas de vinte em cima da mesa.

"Eu não tenho certeza se Nate gostaria disso."

Quando ela se curvou, eu pensei naquele filme de desenho de um coelho.


Eu não sou mau. Eu apenas fui desenhado desse jeito. Eu posso ver o
porque K. daria uma ótima e efetiva modelo.

Eu mexo meu pé para sair. Sempre deixe elas querendo mais.


Mas não leva muito tempo para eu reconhecer o furo em minha estratégia.
Eu não tenho lugar algum para ir.

"Você vai para casa? ela pergunta, sem inocência no seu olhar.

"Vou. Não. Eu realmente não tenho uma casa..."

"Oh..."

Eu podia quase escutar as portas se fechando dentro de seu cérebro como


se sua opinião sobre mim mudasse de "Cara misterioso e legal" para “Triste
mendigo sem casa.”
"Quero dizer, eu estou ficando em Long Island até eu achar um lugar na
cidade," eu acrescentei rapidamente.
"Eu comecei a procurar agora."

"Sempre há lugar no Chelsea." ela diz animada.

Quando uma porta fecha, eu reflito e vejo uma janela aberta. Minha segunda
atitude genial em trinta segundos.
Eu percebi, era um sinal certo de que estava ficando bêbado.

"Eu não sei. Eu tenho uma impressão distinta de que Herman poderia não
gostar de me ver andando por lá."

"Eu aposto que eu posso fazê-lo mudar de idéia." O olhar vermelho e


petrificado foi drenado dos seus olhos, substituído por algo competitivo e
talvez um pouco feral.

Eu a deixo me levar de volta ao salão principal, onde para benefício de


Herman eu me reinventei como um estrondoso poeta o qual ganhou uma
pequena herança de palavras de uma querida tia que tinha como último
pedido, que eu as usasse para alavancar minha carreira. Eu tenho uma única
e importante voz, uma cruzada entre Stevens e Bukowski, e um recente
interesse Nova Yorquino.

Eu posso dizer que Herman não é idiota, mas K. não era o tipo de mulher
que você se inclina para discutir, isso se você é do tipo que discute com
alguma mulher.

No final, seus olhos azuis radioativos quebraram a rigidez na face de Herman


e foi me oferecido o quarto 242, com um aluguel que não tinha a mínima
chance de eu poder pagar, o mais cedo possível eu apareceria com um
primeiro e um último depósito, mais um adicional de $1,200.

"Eu séi á dificuldade que um poéta póde tér," ele me consola.

Eu aperto a mão de Herman, dei a K. algo incompreensível parecido a um


abraço e um beijo, e deixei o salão para uma noite gelada. Minha jaqueta
ainda está onde deixei. Eu olho nos bolsos e acho o cartão de Danny Car.

6
A LIMOUSINE—MAIS PARECIDA COMO UM CARRO DE CIDADE,
REALMENTE—para na esquina. A janela é aberta. Danny estava com uma
cara de que havia comido merda.

"Entre," ele diz.

Eu ando ao redor do carro e entro pelo outro lado. Quando eu fecho a porta,
eu percebo que a cara de Danny não tinha nada a ver com ter comido
merda. Há uma cabeça, feminina pelo que vejo, pulando entre suas pernas.

"Jesus," eu exclamo.

"Você não se importa, certo?"

"Uh, não, eu acho que não."

"Eu estou surpreso que me ligou, Você reconsiderou minha oferta."

"Ainda não, eu digo." Melhor não parecer tão desesperado.


"Só estou considerando minhas opções."

"Eu não estou te dando uma opção. Opções são como raridade ou não
raridade. Cebolas, sem cebolas. Morenas ou ruivas. Qual você prefere,
aliás?"
Ele dá um tapinha na cabeça saltitante. A mulher levanta do colo de Danny
fazendo um barulho molhado que me deixou mais incomodado do que já
estava.

"As ruivas, cuzão," ela diz.

"Veremos sobre isso," ele responde, guiando-a de volta para suas pernas.
"O que estou oferecendo a você, não é uma opção. É uma oportunidade.
Uma oportunidade de dobrar seu pagamento semanal."
Ele aponta para um punhado de garrafas em um compartimento.

"Sirva-se de algo enquanto conversamos."

Eu me sirvo de um whisky chamado Scottish o qual eu nunca havia ouvido


falar. O gosto me fez pensar que nunca havia tomado um Scotch antes, mas
até agora somente mijo e água.

"Como eu disse no escritório, o quarto, ou o que vocês chamam mais que


um quarto, eles são o suficiente para a semana. Mas no fim de semana, eu
me divirto. Brinco em Bridgehampton, outra dia em Miami. Você verá por si
mesmo. Mas então, agora, eu preciso de um extra."

"Tenho que ser honesto com você. Eu acho que você me confundiu com
alguém que tem algum dinheiro. Eu apenas entrego o bagulho."

"Eu não estou pedindo que cresça comigo."

"Não, digo, eu não controlo o fluxo. Eles me dão um pacote, um cliente."

"Você nunca ouviu a expressão pensando fora da caixa?"

Minha atenção se volta involuntariamente de volta para a cabeça saltitante.


"Uh, não."

"Merdas que se escuta na escola. Mas atualmente é uma idéia aplicável.


Não deixe suas percepções das circunstâncias limitar suas possibilidades."

"Eu não tenho a menor idéia do que você está falando."

"A melhor maneira de obter mais produtos é vender para mais clientes, então
continuar vendendo para mais e mais clientes."

"Aha," eu digo.
"Você quer dizer que pode ligar para o mesmo cliente mais de uma vez no
dia."

"Eu? Não. Muito ocupado. Mas você pode."

O carro vai perdendo sua velocidade até parar.


"Tome cinco," ele diz para a cabeça.
"Nós estamos ficando no hotel."

Eu sorrio para a mulher enquanto ela coloca suavemente seu vestido,


simplesmente pois ela é adorável e porque eu não gostaria de ver a rigidez
do pacote de Danny.

"Aqui é onde você fica," Danny diz enquanto o motorista abre a porta. A
mulher deixa o carro.
"Para onde você precisa ir?"

"Para o trem," eu respondo. "Grand Central."

"Não, quero dizer, onde você realmente precisa ir?"


"Levittown?"

"Mel," ele diz ao motorista.


"Leve esse homem para Levittown."

"Sim, senhor." ele responde.

Danny me deu dez notas de $100.


"Arrume mais cinco pacotes até o fim de semana. O resto do troco você faz
o que quiser."
Ele pula para fora do carro.
"Eu sei que posso contar com você, cara!"

O carro começa a sair do hotel. Eu me arrumo novamente no assento,


tomando muito cuidado para evitar algum resíduo de Danny e seu 'encontro'.
Há uma cópia do jornal 'New York Post' presa no canto do assento. Uma
criança no Bronx, dezessete anos, morto por um tiro devido a uma discussão
de escola. Dois policiais, acusados de baterem em um protestante no parque
Tompkins Square, foram inocentados e retirados de qualquer acusação. Um
esquema que poderia ter sido feito por qualquer homem de preto com um
bigode, esse em particular era procurado por quebrar uma roleta de metrô,
enquanto ele esfaqueava até a morte um dos homens que vendiam bilhetes.

As estórias reforçavam a visão que tio Marvin tinha de Nova Iorque, com
certeza um lugar fodido. Mas elas não descrevem a cidade que eu estou
vendo dentro de uma limousine. Eu me sentia como um rei em uma
carruagem, a chuva, as luzes e o constante movimento de tudo parciam uma
performance beneficiando somente a mim.

Uma hora e três seja-lá-o-que-for-Glen depois, o carro para em frente a casa


dos meus pais com três quartos, dois banheiros e uma dúzia de algo
produzido em massa depois da Segunda Guerra Mundial. Eu ando
silenciosamente até meu quarto e tiro todo meu dinheiro do bolso. Guardo
todo ele dentro de uma caixa de madeira, algum ornamento que uma ex-
namorada me comprou quando voltava da Índia, que eu deixo em cima da
mesa.

"Isso é muita grana," diz meu pai.


Ele senta na minha cama, bufando algo tranquilo e intenso ao mesmo tempo,
seus olhos brilhavam com um vermelho que eu reconheço como o momento
exato entre o segundo e o terceiro Scotch da noite. Em outras palavras, ele
tenta se manter distante do mesmo jeito que eu.
"Eles estão pedindo para que fique até tarde no escritório?" ele pergunta.

"Tomei uma cerveja com um amigo meu."

"Seu amigo tem um belo carro."

"Pertence a empresa. Eu tenho que trabalhar até tarde. Há alguma razão


para você estar no meu quarto?"

"Seu quarto." Ele aponta para seu peito.


"Minha casa."

"Tanto faz." Eu me viro para a T.V.


"Eu vou cair fora daqui o mais cedo possível."

"Você mentiu, eu sei. Para sua mãe."

"Sobre o quê?"

"Seu trabalho,' ele diz, encarando a caixa na mesa.


"Ou agências temporárias pagam em dinheiro?"

Eu estava prestes a inventar uma desculpa, quem sabe qual, quando ele
continuou.

"Eu não direi nada. Não se preocupe. Mas você fará seu velho muito feliz se
ele ver cem pratas."

"Você quer que eu empreste $100 para você?"

"Você se importa, criança?" Eu estou gastando mais do que devia esse


mês."

"Gastando muito?"

"Você sabe o que eu quero dizer."

Eu sei, de fato, o que ele quer dizer. Havia notado recentemente a atenção
que meu pai estava tendo com sua aparência. Cortes de cabelos mais
frequentes. Mais sapatos novos. Tubos misteriosos de 'Bom-ar' esguichavam
ao redor da casa. Eu também vi minha mãe prestando mais atenção às
dívidas do banco e do cartão de crédito, colocando uma séria dúvida na
habilidade de meu pai de financiar uma amante. Meu palpite é que o
'empréstimo' dos $100 seriam para pagar um lanche barato no Casa de
Carnes do Charlie, sobrando o suficiente para uma hora no conveniente
perto-mas-não-muito-perto Motel Starlight.

"Claro, pai." Eu digo.


"Você já fez muito por mim."

Eu retiro uma nota da caixa e dou a ele. Ele se levanta e me dá um tapa no


ombro.

"Esse é meu garoto. Então, onde é?"

"Onde é o que?"

"O restaurante que você trabalha."


Eu quase choro de alívio—ele sabe exatamente nada.
"Melhor não ser muito excroto," ele adiciona, finalizando sua terceira dose de
Scotch da noite.

"Como eu disse, é só um monte de merda."

7
SE VOCÉ É ALGUMA COISA PARECIDA COMIGO, A ÍDEIA DE ser
rodeado por super-modelos poderia ser algo que você sempre sonhou. Se
você é do tipo de pessoa que gosta dos seus sonhos intactos—livre de
buracos pontuais—você provavelmente não quer ler o que vem a seguir.
A experiência é odíavel. Eu não estou dizendo que as modelos são odiáveis.
Qualquer coisa além disso. Você pode imaginar se de perto elas são apenas
garotas regulares com uma descente estrutura óssea, e com cabelos e
maquiagem feitas por artistas da moda. Elas não são. Elas são perfeitas, ou
quase.

E não é por isso que elas são estúpidas, ou inseguras, ou vagas, mesmo que
algumas delas também sejam. Talvez a maioria delas. Mas a beleza às
vezes esquece alguma habilidade intelectual.
Não, o que é odiável é a experiência de conhecer uma super-modelo. Pois
no fundo, você espera que ambos irão se apaixonar. Ou melhor. Ou somente
irá achar algo para conversar mais do que trinta segundos. Mas você não
vai. Super-modelos são como atletas profissionais ou violinistas prodígios:
brilhantes mas limitados a visão mundial.

Talvez você seja o tipo de cara que conhece muito sobre sapatos chiques ou
fundações de aplicação. Mas se você está sonhando com super-modelos em
sua cama, você provavelmente não é esse cara. Você diz a si mesmo que
pode controlar esse tipo de situação. E você está certo. Você pode. Mas ela
não. Mulheres se importam muito com suas conexões importantes. E a
menos que você possa trazer algumas delas para a mesa, você poderá estar
falando em alguma linguagem de marte.

Pelo menos essa foi uma das experiências que tive hoje. Toda conversa foi
petrificada e estabilizada sobre como eu não sou famoso. Não trabalho para
nenhuma agência, e não tenho a menor idéia sobre sapatos caros.

Mas não posso dizer o mesmo sobre meu amigo, Ray. Ele é um cinturão na
arte de 'insultos flertantes', o que parece ser exatamente o melhor jiu-jitsu
para encarar essas belezas. Já havia conseguido três números de telefone
até agora. Seu verdadeiro talento se encaixa na sua habilidade de identificar
uma microscópica falha no corpo humano, invisível para a maioria das
pessoas, o que levava as modelos gastarem algumas horas angustiantes na
frente do espelho se contorcendo de raiva. A visão de uma ruga que um dia
irá aparecer. Um milímetro de estria na bunda. Um pequeno músculo fugindo
da proporção de um todo.

"Eu não acredito que eles deixam você sair assim," eu o escuto
masterizando algum defeito da garota. Alguns minutos antes, ela estava
escrevendo seu número na mão de Ray.
Ele esfregou a tinta de caneta no momento posterior que ela foi embora.

"O jogo fica velho, não é?" Ele boceja, me apontando três dedos.
"Três bocejos. Eu só aguento dez. Nada de bom nunca acontece depois do
décimo."

Eu conheci Ray no dia que me mudei para Chelsea, quando ele se


apresentou para Tana. Mesmo com a grana extra que consegui de meus
negócios com Danny Carr, eu ainda levei três semanas para economizar o
suficiente para o quarto.

Tana, em casa novamente após terminar suas provas finais, me ofereceu


para ajudar na mudança. O que se torna o código mundial para vadia
querendo conversar sobre seus problemas com Glenn e me presentear com
algum pequeno cacto vendido em Duane Reade onde se encontra em
qualquer esquina.

Foi encarregado a mim lutar com minha saturada bagagem(tudo foi tirado do
meu armário) e meu mini-arquivo(uma seleção da IBM e alguns livros de
Freshman Lit Primeiro que eu esperava que pudesse me vender como um
poeta) subindo e descendo as escadas e através do corredor até o quarto
242.

Em algum lugar no caminho duas coisas aconteceram:


Tana encontrou um homem no caminho com algum sotaque sulino o qual
eficientemente acabava com qualquer esteriótipo Yankee sobre os mesmos
conversarem lentamente; e uma das minhas bagagens rasgou no meio do
corredor, impossibilitando-me de mover. Eu tentei evitar a queda utilizando o
maior nível de força que tinha, mas rapidamente esse meu ato se tornou
embaraçoso.
Eu imaginava o que iria quebrar primeiro, minhas tralhas ou meu ombro.
Então, de repente, o peso de tudo havia desaparecido. Eu deslizo a cabeça
para tentar ver algo além da bagagem. Meu momento de alívio foi devido a
um rato de academia com um longo rabo-de-cavalo e pernas finas. Ele fica
parado fazendo uma pose como de uma estátua de Atlas, minha mala é
como seu globo, então ele me cumprimenta com sua mão livre.

"Ray Mondavi," ele diz.

Ele é o mesmo Ray Mondavi que tirou as fotos de K. e reanimou sua


carreira. O sotaque sulista é um resíduo de sua nativa Richmond, em
Virgínia, uma entrega em um trem-expresso fruto de cinco anos que ele
passou em Miami, alugando equipamentos para um fotógrafo importante o
qual Tana reconhecia o nome.

Enquanto eu colocava minhas coisas no guarda-roupa do quarto—O quarto


242 parecia um closet (ou banheiro)—Ray mantém Tana com um olhar do
tipo "modelos são tão estúpidas quanto você pensa que elas são" enquanto
conta uma estória de um recente tiroteio em Turks e Caicos. Seus olhos se
viram para os delas exceto quando ele não está olhando seu corpo, seu
olhar era semelhante a um profissional atento aos detalhes, parecido a um
alfaiate observando alguém para produzir um terno.

Ele quebra sua concentração do seu cálculo interno duas vezes: a primeira
ele me olha para que eu saiba que ele sabe que eu sei que ele está olhando
para ela, a segunda, para ver se ele estava me incomodando. Eu dou minha
benção a Ray sinalizando com a cabeça.

Apesar de nossa reputação pela intensiva e emocional retardadice, nós


homens temos um surpreendente e rico vocabulário não-verbal.
Especialmente quando há uma mulher presente.

"Você deveria me deixar tirar sua foto," Ray diz a Tana.

"Aham, tá bom" ela diz, ensaiando uma risada envergonhada.

"Eu falo sério. Não para passarelas—você não tem estilo para isso—mas
imagine...Você é como uma clássica Ellen von Unwerth. Sensual, como
Cláudia ou Carré."

Tana está ficando corada.


"Vou pensar sobre isso," ela diz.

"Eu espero que sim," Ray responde, saindo do quarto.


"Bem-vindo ao Chelsea."

Eu estou grato por vê-lo saindo, não porque eu não gosto de escutá-lo
falando do seu joguinho—já está claro que esse homem pode estar apto a
ensinar ao meu cão interior algumas dicas—mas porque o quarto não era
grande o suficiente para três pessoas.

A cama de casal ocupa quase todo o espaço, uma pia embaixo de um


espelho quebrado ocupava o resto—qualquer coisa requerendo algo mais
elaborado que um encanamento, deveria ocupar espaço no gigante banheiro
no fim do corredor. Eu esperava por uma sacada, como em Sid e Nancy, mas
tive que me contentar com uma escada de incêndio e uma vista que dava
para um muro de tijolos.

"Ao menos você tem uma janela," Tana diz enquanto voltava seu corpo de
volta ao quarto após colocar o cacto em um canto da janela, uma semana
depois ele iria morrer.

Tana senta no canto da cama, testando sua sedução.


"Então quando você vai quebrar essa barreira de bad boy?" ela pergunta.

Acontece que essa é uma excelente pergunta. Durante minha primeira


semana no Chelsea, eu era um fantasma, invisível para os outros residentes,
os quais eu ocasionalmente via fechando as portas. Eu ando pelos quartos
de Nate e K. o suficiente para parecer com um perseguidor, e algumas outras
vezes mais. Eu pressiono minha orelha na porta, tentando captar qualquer
dica de outra festa inacabável. Um sorriso grande de uma mulher com traços
amazônicos irradiava através do elevador e por um momento minhas
esperanças se renovaram. Até que 'ela' responde a minha introdução: Mika
tem a voz três oitavos mais baixa que a minha e, pelo meu palpite, um pênis
funcional.

A única prevista interação humana era de Herman, uma pequena ou grande


permanente presença em frente a sua mesa, e quem sempre pergunta sobre
minha poesia toda vez que me via. Devido às suas habilidades de merda
para detectar coisas, eu faço o melhor para fazer esses diálogos curtos.
Pela primeira vez desde sempre, eu estou sozinho.

Eu ligo para Tana quase toda noite de um telefone pago no restaurante


Mexicano. Ela atendeu a minha chamada uma vez, tendo finalmente
terminado as coisas com Glenn, mas o estilo marimba do restaurante e as
merdas que lembravam exatamente Nova Iorque mantinha-nos distantes.

Eu cheguei até mesmo a ligar para minha mãe uma vez, mas sua
curiosidade maternal sobre meu trabalho, me forçava incrivelmente a
produzir mentiras, e suas perguntas sobre minha vida social me deixavam
ainda mais depressivo.

Em duas semanas, eu poderei economizar o suficiente para uma vida social.


Mas por agora somente hot-dogs, pedaços de qualquer coisa e noites
solitárias.

Acontece que o velho hotel é um bom lugar para gastar o tempo, apesar da
notável excessão que é meu quarto em miniatura, e seus canos expostos de
água quente. A noite a temperatura poderia chegar aos 39º. Eu aprendi a
usar minha janela como um tubo reverso, refrescando o quarto com algum ar
fresco. Isso me dava alguma coisa para fazer enquanto eu deito a noite
tentando me lembrar do porque eu pensei que viver nesse lugar seria melhor
que em casa.

Durante o dia, ainda deitado, fico imaginando sobre como penero minhas
interações com os clientes para qualquer pepita quente que conseguia achar.

A corredora do Upper East Side me deu seu nome ('Liz') mas após eu elogiar
seus olhos, lágrimas saíram deles após dizer que ela tinha mais coisas
importantes a fazer.

Charlie, um garoto com a minha idade que trabalha a noite brincando em um


jogo de cartas, é usualmente bom para uma boa conversa de quinze minutos
antes dele ficar preso em um banco num parque na 'desejolândia' me
prometendo mais que o sol.

E Danny Carr. A maioria das pessoas fumam maconha para relaxarem.


Danny não é uma dessas pessoas. O homem é o que meus pais poderiam
dizer 'dinamite' e a erva somente inicia o fogaréu. Estou mais inclinado a
usar a palavra 'cuzão,' mas ele mais que dobrou meu pagamento semanal
equivalente a algumas ligações, então eu sigo no caminho para desfrutar
sozinho.

Cada dia de trabalho eu faço duas ligações para a linha gratuita do Pontífice.
A princípio, eu uso um sotaque diferente cada vez que ligo: Um de Park
Avenue, Porto Rico, Staten Island, e até mesmo um de Haiti que
rapidamente deteriorava-se em alguns tipos diferentes de tons: "Quêêêééé
quê cê tá falando, Senhor D.?"
Por sorte, os anos de Billy atendendo chamadas de viciados, fazia
impossível meu linguajar parecer incompreendido.

Mas eu não sou Richard Little: Personificações não são o meu negócio. Eu
faço no máximo seis, talvez sete vozes que soavam remotamente
convincentes. Então me transformo em alguns clientes regulares,
requisitando a compra de um pequeno notebook preto na Duane Reade para
que possam manter-se na trilha dos meus multi-personagens e seus hábitos
imaginários. Eu não quero foder tudo.

Quando eu não estou enganando o Pontífice—ou qualquer coisa, eu estou


gerando mais negócios—entregando dois quilos para Danny a cada semana
certamente me expondo a riscos fora da zona de conforto da operação, algo
que Rico, durante minha audição, pressionou-me para nunca fazer.

Sexta-feira a noite, minha terceira semana trabalhando na luz da lua para


Danny, eu retorno pro meu quarto no hotel após fazer minha última entrega
legítima. Eu carrego minha blusa com os pacotes.

"Isso é parecido com uma barriga de erva," digo para o espelho quebrado.
Eu abro a porta antes que o espelho possa responder, andando rápido para
as escadas até o escritório de Danny. Somente dessa vez eu quase passo
por cima de K. quando ela entrava no elevador.

"Hey, você," ela diz.


Podia-se sentir o aroma de seu shampoo já que ela acabara de sair do
chuveiro, não se preocupou em usar maquiagem, e não estava sofrendo nem
um pouco por isso.

Meu coração bate como um martelo, mas eu nunca estive mais lúcido.
Eu finalmente tinha uma uma resposta honesta do porque eu escolhi morar
no Chelsea.

"Eu tenho procurado por você," eu digo.


"Sobre aquele segundo encontro."

Ela ri.
"Vai ter que ser uma rapidinha. Eu preciso voltar para Nate. Eles estão
voando para Chicago essa noite e eles nunca conseguirão chegar ao
aeroporto sem mim."

"Eu consigo trabalhar rápido quando eu preciso."

"Um trabalhador rápido, hã?"

"Não me entenda mal, eu prefiro fazer o meu tempo."

"Você sabe que eu não sou assim tão fácil."

"Eu também não," eu atiro de volta.


"Mas estou aberto a uma reabilitação."

Ela ri novamente. Será que minhas asneiras podem realmente estar


funcionando? Seus olhos pareciam confusos, sinalizando um debate interno.

"Eu tenho um show amanhã a noite," ela finalmente diz.


"Versace."
"Parabéns."

"Obrigada, obrigada," ela diz cheia de si.

"Mas você acredita que eu ainda fico nervosa com isso?


Uma vergonha eu sei, mas eu realmente poderia gastar algum tempo com
alguém, e com Nate fora da cidade..."

"Eu estou aqui!" Eu digo, ou grito, talvez até alto demais.

"Não fique imaginando nada: Eu sou uma boa garota. Mas eu não posso
dizer o mesmo de todos meus amigos. Uma mulher cheia de beleza,
insegurança e carácter questionável. Um cara como você pode fazer tudo
certo."

"Um cara como eu?" Eu acredito que acabei de ser insultado.

Ela gentilmente dá um tapa na minha bochecha.


"Pobre menino, haverá um passe para você na porta, se você puder
esquecer essa dor. Ray irá também. Talvez vocês dois possam dividir um
táxi."

Finalmente ela passa por mim para entrar no elevador. Vejo ela rindo
enquanto as portas se fecham.

"Vocé dévia éscrévér um poéma sobré isso, há," Herman me zoa, tendo visto
a cena do seu lugar atrás da mesa.

"Acabei de pensar o mesmo," eu respondo, me escorregando para rua


evitando assim um interrogatório.

Eu deixo meu momento me levar para a Sétima Avenida, onde eu pego o


trem para o centro da cidade.

APESAR DA SUGESTÃO DE K. NÓS NÃO precisamos de um táxi, são


somente dez quarteirões de caminhada até o show, um matadouro no distrito
de refeições foi chamado de 'espaço da arte'. Como um verdadeiro
cavalheiro, Ray trouxe uma garrafa de cachaça para manter-nos quentes
durante o caminho, nos deixando levemente felizes até o tempo que
chegamos a nossos assentos.

Nós ficamos inquietos no momento que K. saiu dos bastidores pela primeira
vez, enrolada por um pano verde fluorescente que eu não podia imaginar
jamais ser usado por alguma pessoa normal. Como uma boa profissional que
ela é, ela nos ignora completamente.

Meia hora depois—depois de vinte e cinco minutos assistindo tantas


beldades marchando para dentro, rebolando, marchando para fora de novo,
enquanto corriam é claro— eu acordo com o som dos aplausos.
O designer cavalgava a super-modelo no palco.

"Cara de sorte," eu digo.

"Diga isso para o namorado dele," Ray responde.


"Agora vamos nos divertir."

Foi quando eu comecei a me animar, e Ray a bocejar.


Ele estava completamente entendiado até que K. apareceu, tendo
completado seu circuito na indústria que Ray chama de Grande Rio de Picas:
"Especialmente as mulheres!"

Ela ainda estava maquiada mas vestida para o centro da cidade, tendo
dividido seus colares em favorecimento a uma peça única de um mini-vestido
preto e seus olhos azuis radioativos.

"Yow!" Ray grita para ela, colocando suas mãos nas costas e uivando como
um lobo.
"Você mereceu isso querida!"

K. aceita seus elogios com um sorriso embaraçoso.

"Mas eu não sei o que eles estavam pensando quando colocaram em você
esse 'tomara-que-caia,' ele continua.
"É preciso ter peitos para usar isso."

"Você é um cuzão," K. diz, mas ela está rindo.

Ela olha para mim para ver minha reação, o que até agora é rir como um
retardado.
Quando eu falho em dar uma resposta socialmente aceitável, ela me joga
uma indireta.

"Alguns de nós estamos descendo até o 'Leste'"

"O Restaurante Leste," Ray diz.


"O mais irônico nome de restaurante no mundo."

Não leva muito tempo para descobrir o que ele quer dizer. Eu notei o
restaurante durante minhas transações com Charlie na Praça Union e, havia
visto o lugar apenas na luz do dia, fui enganado pelo nome. Ninguém estava
jantando; em fato a maioria das pessoas—modelos, crianças ricas, e uma
minoria de celebridades com cabelos estranhos—pareciam ter alguma
desordem alimentar.

Nós passamos pelos cordões de seda, nossa entrada foi possibilitada por K.
e duas fêmeas com rostos de anjos mas nomes muito importantes para
dividirem comigo, e paramos numa mesa em um canto com área coberta.
As mulheres ordenaram algo chamado mojitos e pediram licença para irem
ao banheiro.

"Cavalgando sobre o pó," Ray diz quando elas saem.


"A menos elas vão ficar excitadas. Qual delas você quer?"

"Eu acho que K. está fora dos limites," eu deixo a pergunta no ar.

"Perda de tempo. Nate não a merece, mas ele tem todo esse negócio de
Rock Star trabalhando para ele.
Ray curva seus dedos no ar.
"Vudu vampiresco. Ele fincou seus dedos nela como o maldito Drácula."

"Eu devo ter perdido as marcas."

"Elas estão em toda parte. No sangue, coração, alma, buceta...Seja lá o que


você quer, não vai ganhar nada dela."

"Nesse caso," eu sugiro,


"Deixarei você escolher primeiro."

Ray faz uma careta.


"Eu sequer gosto de mulheres brancas.
Eu preciso de um pouco de Tang na minha tanga," ele diz, fixando seus
olhos em outras mulheres para confirmar seu ponto.
"Mas eu não gosto de ir para cama com fome, e mesmo assim, vamos
apenas deitar nelas e brincar."
Vinte minutos depois, estou preso em uma conversa com uma das amigas
de K. Uma morena que finalmente se apresentou como Stella. Acontece que
ela estava presa em seja lá o que fosse que estava acontecendo atrás de
mim. Após algumas danças e erros, eu entro na multidão a procura de Ray.
Ele estava na pista de dança, tirando vantagem da outra garota como se
fosse John Travolta. Já Stella aproveitou minha breve distração para fugir
com um cara que eu reconhecia como alguém do jornal local.

"Então," diz K., retornando de uma sessão de 'noiados' do banheiro.


"Parece que você e Stella não se deram muito bem."

"Um pouco bem demais. Nós mudamos rapidamente de paixão para sexo
quente e agora para um longo e estranho silêncio."

"Você disse que trabalha rápido."

"Touché," eu digo, levantando um copo para brindar.

"Falando de trabalho...você não tem nada aí contigo, tem?"

"Oh, entendo," eu respondo me sentindo insultado.


"Eu sou como seu 'Sherpa' das drogas."

"Não é nada disso. Eu só preciso de algo que me deixe mais estourada. Eu


não suporto cocaína."

"Isso não te impediu de cheirar essa coisa no banheiro," eu digo.

Meu ponto é me aproximar nos insultos ditos por Ray, naquele seu jogo com
mulheres. Mas o que vem para fora, julgando pela reação de K., é mais
parecido com um tapa na cara. Eu retorno um passo o mais rápido que meu
pé poderia me levar.

"Eu estou brincando, moça. Estou apenas tentando alienar o maior número
de pessoas possíveis com minhas habilidades conversionais de merda.
Parabéns. Você é minha centésima cliente."

Seu sorriso retorna.


"Você é muito legal para ser um traficante."

"Eu realmente gostaria que você parasse de me chamar disso."

"Traficante?"

"De legal. 'Legal' é o beijo da morte."


Seus olhos subitamente estão cheios, do que eu espero se estou lendo
corretamente, de vigor.

"Meus beijos não mataram ninguém ainda," ela diz chupando seu mojito
através de um canudo.

Nós estamos flertando? Meu coração me diz que sim, trabalhando o dobro
da força para levar sangue até meu cérebro.

"Eu acho que devo levar sua palavra em consideração. Mas para ser
honesto, eu preciso de um pouco mais de informação para continuar."

Ray volta novamente a cena, a outra amiga de K. está em seus braços.

"Décimo bocejo," ele diz.


"Eu preciso levar essa moça em casa antes que me torne uma abóbora."

As duas mulheres trocam beijos aéreos e K. desliza o resto do pó para


dentro do bolso de sua amiga. Ray me puxa perto para algo parecido com
uma combinação de um aperto de mão e um abraço-de-homem.

"Isso aí garoto!", ele sussurra—alto o suficiente, tenho certeza, para K. ouvir.


Mas ela não demonstra que escutou.

"Então," ela diz quando eles saem.


"Onde estávamos?"

"Eu devo ter perdido alguma coisa," eu respondo, "mas parece que
estávamos negociando."

"Negociando? O que estávamos negociando?"

"O que mais seria? Nosso primeiro beijo."

E então aconteceu—descansando uma mão em minha bochecha, ela toca


seus lábios nos meus. Sutilmente e gentilmente colocando sua língua ao
redor da minha.

"Viu?" ela diz.


"Você continua vivo."

"Pode ter falhado. Nós teremos que tentar novamente."

Desta vez eu a abraço. Nosso lábios se prendem, então se partem, as


línguas se mexem dando mais entusiasmo a exploração. Eu sinto um
pequeno inconveniente em minha calça—o Motorola.

"Eu acho que você está vibrando," ela diz.

Eu tiro o telefone do meu bolso e coloco na mesa. O número de Tana pisca


no display numérico.

"Trabalho?" K. pergunta.

"Não essa noite."


Eu me viro para outro beijo.

A mesa balança quando o celular vibra novamente desconcentrando K.


Então ela ri.

"Namorada," ela diz.

"Não, longe disso," eu insisto, encarando o '911' que Tana colocou agora na
mensagem de texto.

"Família. Isso só vai levar um minuto."

Eu entro no corredor do banheiro e procuro por um telefone pago. Não me


preocupei mais cedo em me equipar com créditos para uma possível
chamada para a ilha natal, e menos ainda com alguns trocados. Ligo então à
cobrar.

"Eu espero que alguém esteja morrendo," digo após Tana aceitar a cobrança.
"Pois se não for isso, você está quebrando meu pau em proporções
imensas."

"Eu não tenho certeza," Tana diz.


"A casa de seus pais está quase toda queimada. Isso é importante o
suficiente para você?"
"O quê?!"

"Não se preocupe. Eles estão bem."

"Bem, é como eu disse, se eles não estão mortos.


O que aconteceu? Meu pai desmaiou com algum cigarro aceso?
Uma das suas putas apareceu em casa com alguma lamparina?

"A polícia acredita ter sido um ato criminoso."

"Criminoso?" eu pergunto, minha voz estava em um nível entre raiva e


descrença.
"Meus pais tentaram queimar sua própria casa?"

"Não seus pais. Daphne.


Aquela vadia louca tentou botar fogo em tudo."

"VOCÊ POR ACASO ESTÁ TENTANDO COMER MINHA NAMORADA?"


Quando você confronta uma pergunta de uma pessoa, uma pessoa sem
controles e com provas adquiridas de comportamento violento, no sentido
mais profundo da palavra, irracional, você realmente tem apenas duas
opções: se retrai e espera pelo melhor, ou fica louco e tente quebrar a defesa
do urso. Eu escolho pela última. Mas o urso continua arranhando.

"É você," ele diz, "não é?"


Seus olhos severos e preguiçosos deixam a possibilidade de que ele não
está olhando para mim, mas sim em um buraco na parede sobre meu ombro.
Mas eu tenho quase certeza de que ele falou aquilo para mim. Eu me retraio
na cadeira e espero Daphne se manifestar.

"Deixe ele em paz, Vincent," ela diz enquanto atravessa a sala.

Eu estou preso por uma vontade de rir: Daphne está vestida para o
Halloween como uma Mulher-Louca. Um pouco de tinta marrom em seu
cabelo agora separa as pontas de seu couro cabeludo. Seus olhos estão
profundos e pretos de maquiagem. Ela está até usando aqueles requisitados
aventais verdes de hospitais e patins para se locomover. Em poucos
segundos, ela ia baixar a guarda e rir. Nós fumamos um baseado e
procuramos um lugar para foder. Alguns segundos se passaram.

"Eu sei," Daphne diz, "Eu pareço horrível."

"Eu sou obrigado a discordar," eu digo.


"É muito punk rock."

Adicionando, quando ela queria começar a chorar.


"O avental parece incrivelmente confortável. Você sabe onde posso descolar
um?"

Ela tenta rir mas o sorriso se desfaz rapidamente.


"Eu conheço um cara," ela diz.

"Hey, Vincent...um pouco de privacidade."


O urso passa seus dedos rígidos de raiva em seus cabelos parecidos aos de
Hitler e se encaminha para uma área diferente em um quarto sem acústica.

Quarto sem acústica. Daphne e eu tivemos uma das nossas Top 5 brigas
(Número 3, para ser exato) em um quarto que parecia muito com esse. Eu
dei carona a uma mulher para uma festa, ou foi isso que eu contei a Daphne.
A verdade é que eu havia saído com uma ex-namorada que estava de
passagem vindo de Ithaca até Toronto. Nós começamos a noite conversando
sobre como é estranho que nós não estávamos mais no colegial e
finalizamos com uma demonstração dela de sua recém descoberta
maturidade com um boquete em frente de seu carro.

Daphne tinha amigas em todos restaurantes e, uma vez alertadas, ela ia


diretamente ao meu dormitório. O residente do quarto abaixo ao meu,
claramente com raiva por ser acordado às três da manhã por um grito no
meio do corredor, chamou a segurança do Campus. Eu arrasto Daphne para
dentro de um desses quartos sem acústica, enquanto a briga continuava
através da luz do dia. Isso aconteceu apenas a um ano atrás. Foi um longo
ano.

Hoje Daphne dificilmente parecia querer brigar. A mulher que na semana


passada, de acordo com o relatório da polícia, espalhou gasolina na casa de
meus pais enquanto gritava meu nome, agora parecia ser candidata a
soneca mais longa do mundo. Ela está aqui no Kings Park, mantida em
avaliação psiquiátrica, graças aos 'Herculanos' esforços de Larry
Kisrchenbaun, cujas conexões colocaram ela fora da população geral em
Rikers Island, já que meu pai se recusou a tirar as acusações contra ela.

"Como estão seus pais?" ela pergunta.

"Minha mãe está um pouco aborrecida por causa das rosas."

"Eu estou tão arrependida."

"Não fique. O seguro vai cobrir a maioria do estrago. O resto pode vir do
fundo de putas do meu pai. Mas hey...da próxima vez você quer fazer uma
ligação para mim?"
Eu levanto o Motorola.
"Eu tenho um desses agora."

"Ha," ela diz.


"O que você é agora, um traficante?"

"Engraçado você perguntar..."

Eu a deixo à par da minha nova vida, menos a parte pífia de solidão e minha
recente sessão com uma super-modelo em ascenção. Daphne soltou um
sorriso real quando eu a disse sobre o Chelsea. Minhas palavras pareciam
curá-la e eu me lembrei do porque ficamos juntos tempo o bastante para
fazer a lista das nossas Top 5 brigas. Claro, ela fez algumas coisas loucas,
mas eu não fui sempre um namorado honesto—se ela estava biruta, eu a
ajudei a ficar assim.

Então eu continuo por uma hora, como um escoteiro novato tentando fazer
fogo de um graveto; há algumas faíscas, mas no final, os olhos mortos de
Daphne se recusavam a dar ignição. Ela descansa uma mão sobre a minha,
me deixando saber que estava tudo bem eu parar de tentar. Eu a prometo
que a visitarei novamente, que ela pode me ligar qualquer hora que precisar
de algo, mesmo se for só para conversar.

"Há uma coisa que você pode fazer por mim," ela diz.
"Eu quero achar meu pai."

Seu pai deixou sua casa quando ela tinha cinco anos. Alguns anos depois,
ele completamente desapareceu da sua vida. Daphne e eu tivemos alguns
debates sobre qual gramado é mais verde, o cara que tem um tipo de pai
que roba dinheiro do filho para levar alguma vadia para lanchar, ou a garota
sem o pai.

"Wow," eu digo.
"Você tem certeza que agora é uma boa hora para isso?"

"Seu nome é Peter."

"Peter?"

"Peter Robichaux. Você disse se eu precisasse de algo..."

"Eu queria dizer algo que eu realmente poderia fazer. Achar um cara que
sumiu do mapa por dez anos, não necessariamente está sobre meu poder."

"Esquece," ela diz, forçando um sorriso.


"Eu estava apenas te enxendo. Eu sou doida, eu sei."

"Eu vou ver o que posso fazer, você tem alguma outra informação, um
endereço ou um telefone?"

"Isso é tudo que tenho," ela suspira.

São cinco minutos de caminhada do lugar que Daphne está até o


estacionamento. Tana está esperando por mim em seu carro. Ela segura seu
relógio de pulso quando me vê.

"Sério?" ela pergunta.

Eu entro calmamente no banco do passageiro. Me sinto um pouco


desorientado—passei uma hora em um instituto mental, e o mundo lá fora
parecia um pouco estranho. Tana, que Deus a abençoe, passou a primeira
marcha. Nós dirigimos de volta a Levittown em silêncio.

O NATAL ESTÁ AQUI, SE AS MULTIDÕES DESCENDO na praça Herald


Square estavam indicando. O que para mim significa que a caminhada—de
um princípio de um longo dia de trabalho—estava mais difícil. Alguns poucos
ventos do rio batiam como homens fracos de Kato, batendo somente em
pessoas não preparadas. Mini-tsunamis formavam de qualquer ângulo de
interseção causando ondas de vento gelado jogarem em nós um pouco de
neve pseudo-colorida e alguns pisos mais escorregadios que o normal.
Chegar do ponto A até o B necessitava determinação, concentração e força.
Nenhuma dessas foram o suficiente para me derrubar. Então novamente, eu
estava de pé.

"Toda aquela visita a Daphne, eu achei que me transformou. Parecia que


estava fazendo a coisa certa. Como se tivesse uma força no universo me
forçando para fazer coisas boas."

Ou foi mais ou menos isso que expliquei a Tana assim que a Jump Street 21
teve uma pausa comercial. Ela sorri claramente, mas não estou tão certo se
foi o suficiente para tirar minha epifania.

"Você regulou esse negócio a noite toda?"


Eu passo a ela o bagulho.
"Você não vai entrar na Corporação da Paz," ela pergunta enquanto traga o
cigarro. "Vai?"

"Não," eu respondo, pegando de volta a erva.


"Eu não sei. Não pensei sobre isso até hoje. Mas parece que toda minha
vida está me guiando a esse ponto."

"Você passou muito tempo na indústria alimentícia. E traficando, você está


ajudando muitas pessoas."

Eu concordo com a cabeça, examinando o graveto em chamas na minha


mão.
"Comida para a alma."

"Uh-huh," ela diz, se virando sobre mim.


"Agora divida comigo, em estou faminta."

Mais cedo naquela tarde, eu havia conversado com Larry Kirschenbaum


sobre o pai de Daphne. Ele me deu o nome de um investigador privado que
ele achava que poderia ajudar—um ex-policial chamado Henry Head—mas
que provavelmente me custaria $500 a semana.
"Não é um problema," eu respondo um pouco rapidamente, levando Larry a
me estudar em uma nova luz. Sem respeito, exatamente—mais como o
instinto, ganho por décadas defendendo criminosos, que eu poderia em
algum dia próximo requerer seus serviços. A verdade é que eu não posso
pagar Henry Head, graças aos meus negócios não prontos relacionados a
Danny Carr.

Eu planejo reinvestir meu salário extra em meus assuntos com K. que


atualmente estava longe de Nate. Mas até agora eu não tinha negócios. Não
havia visto ela em aproximadamente duas semanas desde que nós ficamos
no bar. Na pressa para ir embora eu esqueci de perguntar a ela seu número.
Ray me disse que tinha, mas não conseguiu achar, e me sugeriu para
'apenas voltar até seu quarto.' O que foi exatamente o que fiz, mais uma vez
me sentindo como um perseguidor, e novamente com sucesso zero.

Aquela sexta a noite, eu pego o elevador até o andar de Danny Carr. Seu
assistente Rick está fora do escritório, enrolado com uma máquina de fax.

"Então, se não é o homem misterioso," ele me cumprimenta.

"E aí, Rick. O chefe está por aí?"

"Deixa só eu terminar essa ligação. Vocês irão..." Rick coloca sua mão e seu
indicador na frente de sua boca chupando-o enquanto fazia uma mímica de
um tiro.

"Eu não tenho a menor idéia sobre o que você está falando." Rick sorri, ou a
menos tenta.
"Então é assim, huh?" Ele volta sua atenção a uma caixa na mesa.
Um minuto depois, Danny coloca sua cabeça para fora do seu escritório.

"Meu novo melhor amigo," ele diz, gesticulando para eu entrar.


"Você pode ir Rick."

"Mas e o fax?"

"Eu pego o fax," Danny responde.


"Agora vaza daqui."

Rick pega suas coisas lentamente, um homem com alguma coisa em sua
mente prestes a dizer.
"Você decidiu sobre aqueles ingressos?" ele finalmente coloca para fora.
"Sim," Danny diz em uma voz seca.
"Eu não acho que vá acontecer dessa vez."

"Sem problema," Rick responde.


"Te vejo segunda, chefe. Não festeje muito esse fim de semana. Dias longos
e noites melhores."

Danny já está em seu caminho de volta para seu escritório. Eu o sigo,


fechando a porta atrás de mim assim que ele me pede.

"Que viado," ele diz, já removendo o vaporizador de seu gabinete.


"Quer meus malditos ingressos do jogo dos Knicks para impressionar algum
rabo de saia de States Island. Que desperdício de um pênis humano."

Danny me dá o dinheiro, $500 prometidos para Henry Head, que durante


nossa conversa de cinco minutos no telefone garantiu resultados imediatos e
me assegurou que 'quando eu precisar de um particular, você pode contar
com o cabeça.' Eu me peguei lembrando a mim mesmo que Larry
Kirschenbaum me indicou ele.

"Você os quer?" ele pergunta.


"Os ingressos. Eu supostamente deveria pegar um avião para Sain Bart
em..." Ele olha para seu relógio.
"Agora mesmo. Vamos, pegue-os. Eles são de um lugar atrás do banco dos
Sonics. Você pode tocar bongo na cabeça careca do X-man. Não...você não
pode fazer isso. Eu vou perder meus ingressos. Mas você sabe o quero
dizer."

Isso é incrível, eu digo a mim mesmo após sair do escritório com os


ingressos em meu bolso, isso é o que você pode ganhar por não ser um
cuzão. E as coisas só ficavam melhores. O elevador esperava por mim
quando eu apertei o botão. O segundo andar chegou no momento que
alcancei a plataforma. Há um assento vago perto da porta. E quando eu
finalmente alcancei o hotel com tempo suficiente para me trocar—fora de
minhas trastes leais, do que agora considero como minha própria marca; o
bem vestido traficante, eu ainda estou usando algum traje de negócios
casual—eu escuto uma voz familiar chamando pelo meu nome. Eu me viro e
vejo K.

"Eu sabia que conhecia essa bunda," ela diz.

"Hey," eu protesto.
"Eu não sou apenas um brinquedinho sexual que você pode pegar
emprestado qualquer hora."

"Mmm. Que pena. Eu me diverti naquela noite."

"Eu também. Tentei te ligar até descobrir que não tinha o seu número."

"Eu estou super ocupada," ela diz.


"A vida na cidade grande."

Nós esperamos juntos o semáforo na Sétima Avenida.

"Também..." ela começa, e então pausa no meio.

"Não me diga. Você tem herpes."

"Nojento. Não, eu tenho um namorado. E eu provavelmente não deveria


estar beijando homens estranhos em bares."

"Eu acho que se você começar a me conhecer," eu digo, atravessando a rua,


"não vai me achar tão estranho. E também, há a regra dos cem-quilômetros."

"Certooooo," ela diz, me seguindo na rua.


"Eu esqueci sobre a regra dos cem-quilômetros. Tenho certeza que Nate iria
entender."

"Ele me parece um cara compreensivo."

"Pena que não posso perguntar a ele essa noite," ela adiciona, "parece que a
banda está em Cleveland. Quão longe é Cleveland?"

"Cleveland, Espanha?

Chegamos então ao Chelsea, eu tenho agora um encontro para o jogo dos


Knicks. Nós concordamos em trocar e nos encontrarmos no salão do hotel
em quinze minutos.

"MACONHA CARA!' MEU ENCONTRO ME CHAMA no fim do corredor.


"Você é a nossa única esperança!"

"Grite um pouco mais alto, Nate," eu respondo.


"Eu acho que o time inteiro não ouviu."

Um dos jogadores dos Sonics que estava sentado no banco se virou e


apontou para mim, confirmando que ouviu. Descobri que ele não estava
tentando me deixar envergonhado mas sim tentando chamar atenção para si
mesmo—mesmo não tendo informações suficientes para julgar seu talento
musical, está claro que Nate já tinha um apetite por atenção digno de um
rock star. Ele era a única pessoa no estádio usando um chapéu roxo rodeado
de penas de pavão coloridas.

"Eu pareço amolecido sem o meu portfólio," ele continua, sua voz semi-
toneada, uma confirmação e um foda-se aos milionários que nos rodeavam.

"Você faria a gentileza de trocar uma de vinte para mim?


Esses locais parecem que não possuem nem uma nota de cinco para
brincar."

Eu imagino quão mal-educados temos de ser para Danny Carr perder todos
os ingressos da temporada. Eu dou a nós alguns minutos para arrumarmos
uma briga aqui e agora.

Após esperar meia hora no salão do Chelsea, encarando os quadros e


evitando as perguntas de Herman sobre poemas que eu não tinha a menor
intenção de escrever. Eu imbecilmente subi as escadas. Acho a porta do
quarto de K. parcialmente aberta. Eu bato e sem respostas, então
cautelosamente abro a porta. Nate anda para fora do quarto coçando seu
saco.

"Parece inflamado para você?" ele pergunta, segurando para inspeção.

O pau de Nate é longo, magro e sem pêlos, como tudo mais sobre ele.
Mesmo de uma certa distância eu consigo ver o que parece ser algo
vermelho em seu negócio. Mas Nate não estava olhando para seu pau—ele
estava encarando os ingressos dos Knicks, os quais por alguma razão idiota
eu estava segurando em minhas mãos.

"Os Knicks? Merda!" Nate volta ao quarto, zombando algo como se fosse
'Ricky Ricardo'.
"Oh, Lucy...você tem visita..."

K. sai do quarto em um roupão. Seus olhos imploravam por perdão. Tudo


mais sobre ela, gritava que havia acabado de ser comida.

"Precisa de uma acompanhante?"


Nate pergunta, referindo-se aos ingressos.
"Eu voei para cá mais cedo para surpreender minha garota somente para
descobrir que ela tinha outros planos na Ilha dos Gigantes."

"Talvez se você tivesse avisado antes que estava vindo," ela diz a Nate sem
tirar os olhos de mim.
"Eu não teria marcado nenhum plano com as garotas."

"Elas sempre dizem que querem espontaniedade," Nate diz,


"Até você as surpreender."

"Isso é só porque sua idéia de surpresa," K. protesta, "é acidentalmente


escorregar para dentro do meu cu."

Nate geme como um gato bem alimentado.


"Você não estava reclamando até agora à pouco."

"E eles dizem que o romance acabou," eu finalizo qualquer ameaça de briga
devido a explosão nuclear acontecendo em meu cérebro.

"Eu gosto desse cara," Nate diz a K., colocando seus braços em meus
ombros como um tentáculo.
"Então o que você me diz, homem-erva? Uma noite só para homens?"

Eu olho para meu celular, surpreso pela velocidade da minha transformação


de idiota com ingressos sobrando para um traficante bem sucedido. Eu sei
que não tenho nenhuma boa razão para ficar com raiva de K., mas eu estou
mesmo assim.

"Porque não?"
Quem diabos entra num quarto segurando ingressos?

Como Danny prometeu, os assentos eram perto o suficiente para sentir o


cheiro do jogo. Mas cheirar homens suados dificilmente parecia ser um
prêmio de consolação. Quando Nate se ofereceu para me comprar uma
cerveja com meu próprio dinheiro, eu tiro uma nota de vinte do meu bolso,
enrolo-a como uma bola e entrego a ele.

"Clássico," ele diz, pegando o dinheiro e se levantando do assento.

Eu tento me perder vendo toda ação. O jogo se move tanto rápido como
lentamente, igual na televisão. Em cima, os jogadores pulam e cortam muito
mais rápidos que seu tamanho anormal (ainda mais impressionante de perto)
poderia permitir. Mas o estilo de jogo dos Knicks, curto, rápido e
previsivelmente tentando enganar a defesa adversária toda vez que chegava
à cesta, parecia irritar todos no ambiente. Mas o que não estava ajudando
era seu técnico, que pedia tempo toda vez que os Sonics encestavam duas
vezes seguidas.

"Você precisa ver o cuzão que costumar sentar aqui," eu escuto um cara
atrás de mim dizendo sobre os assentos. Devo soltar um cumprimento de
mão para trás? Alguma maldição por alguma oração? Essa merda realmente
importa? Eu estou procurando por alguma briga.

Somente quando eu me viro, eu vejo Liz, minha cliente favorita do Upper


East Side. Seus seios demandavam atenção providos de um suporte
engraçado, muito longo para ser um suéter mas muito curto para ser uma
camisa, deixando visível suas pernas longas e delineadas por uma calça
atlética e botas pretas com cano alto. Seu cabelo está cacheado e sedoso.
Uma leve camada de maquiagem ajuda seus olhos a sobressaírem dos
brincos de diamantes em suas orelhas, enquanto o colar de diamantes ao
redor do seu pescoço, fazia-a parecer como se acabasse de pisar num
daqueles tapetes vermelhos de algum evento importante.

"Oi," eu digo.

"Você conhece esse cara?" diz um homem sentado ao lado dela, aquele que
eu mirava para uma briga.

Ele é mais ou menos sarado, vestindo um casaco marrom e um boné dos


Yankees para cobrir algo que eu assumo ser uma careca genética. A mente
de Liz parece circular respostas potenciais. Ou potenciais rotas de fuga.

"Liz e eu estudamos no colegial," eu digo, estendendo uma mão.


"O nome é Coopersmith...Biff Coopersmith."

"Jack Gardner," ele responde, segurando minha mão enquanto a apertava


mais forte.
"Colegial? Eu juro que Lizzie me disse uma vez que foi para Spence."

"Mmmm-mmm," eu digo, parando minha mão.

"Ele quis dizer acampamento de verão." Liz intercede, "já que Spence era
uma escola só para mulheres."
"Spence era uma escola só para mulheres."
"Acampamento de verão!" eu solto um sorriso.
"Ela era absolutamente imbatível durante as guerras de comida."

"Coopersmith," Jack diz, esfregando seu queixo.


"Terá alguma relação com Casey Coopersmith...?"

"Você conhece meu primo Casey?" Eu dou um tapa no joelho de Jack.


"Ele é o melhor."

"Casey é uma mulher."

"Bom, claro né," eu digo. "Depois da operação."

Liz, que estava rindo demasiadamente muito, começou a soluçar. Nate


retorna com as cervejas e eu faço as devidas apresentações. Eu não me
preocupo com meu novo e ridículo, aliás eu duvido que Nate se lembra do
meu nome verdadeiro.

"Você tem uma filha adorável," Nate diz para Jack, encarando Liz e subindo
na minha lista de pessoas consideráveis que gosto. Com um projétil.

"Eu tenho," Jack responde com seus dentes cerrados.


"Ela tem treze anos e mora em Boston com a mãe."

"Bom para você, velho!" Nate diz.


Agora é a vez dele dar um tapa no joelho de Jack.
"Então o encanamento ainda está em ordem, hã?"

"O encanamento está em excelente condições," ele responde


surpreendentemente orgulhoso.
"Eu deveria saber, sou um urologista."

"Você é um médico de paus?"


Nate grita, mais uma vez capturando a atenção de todo o banco dos Sonics.
"Brilhante!" Você provavelmente vê isso todo o tempo, mas eu tenho essa
mancha no meu negócio..."

Eu olho para Liz, esperando ver uma cara de desgosto. Ao invés disso, ela
está mordendo seu lábio, determinada a esconder seus soluços.

"Eu vou comprar pretzel," eu anuncio, já saindo do lugar.


Acabo de chegar na fila e Liz aparece atrás de mim.

"Quer fumar um pouco?" ela pergunta.


Nós nos aconchegamos em um corredor de serviços. Ela tira o bagulho
enrolado. Eu faço meu truque com o fluído e meu Zippo.

"Você é cheio de surpresas, Biff," ela diz, soprando uma nuvem de fumo
sobre seus ombros.
"Mas obrigada por nada, você sabe, apenas colocando para fora. É apenas
nosso terceiro encontro. Muito cedo para dizer a ele que eu tenho meu
próprio traficante. Seu nome não é realmente Biff, é?"

"Terceiro encontro é grande. Vocês dois fizeram a coisa selvagem já?"

"A coisa selvagem?"


Ela cruza os braços. Brincando com os peitos. Talvez até em um modo
flertivo. E de novo, eu li errado os sinais com K.

"Eu não estou julgando," eu digo.


"Nós não podemos controlar por quem ficamos atraídos."

"Não é como se..." ela interrompe.


"Digo, ele é bonito..."

"Careca."

"Distinto," ela contra-ataca.

"Rico?"

"Ele é isso," ela suspira.


"Veja, você não me conhece muito bem..."

"Ainda não. Mas eu sei uma coisa. Você poderia ter algo muito melhor que
um médico de paus."

Suas bochechas levantaram.


"Isso é algo legal para se dizer."

"Eu falo somente a verdade, milady. Eu sei que um monte de jovens idiotas
que estariam honrados em deitarem seus chifres em sua porta."

"Eu não tenho a menor idéia do que isso significa. Era para ser algum tipo de
metáfora?"

"Meta-o-quê?" Eu já estava fora de si.


"A verdade é que eu não sei sobre o que eu estou falando. Meu cérebro está
funcionando com pouco oxigênio desde o minuto que te vi essa noite."

"Você é mau," ela diz.

O que acontece a seguir não é exatamente um beijo. Ela serra os dentes,


morde meu lábio, e se afasta.

"Eu estaria envergonhado em perder o resto do jogo," eu digo.

Cinco minutos depois, estávamos nos agarrando no banco de trás de um


táxi, destino Upper East Side. Chegando ao destino, eu tiro outra nota de
vinte e digo ao motorista para ficar com o troco. Nós andamos rapidamente
até o apartamento, tentando não deixar o porteiro nos notar.

A charada de antes foi descoberta por ela no elevador. Nós estávamos rindo.
Lágrimas começaram a cair em nossas faces. Então as línguas resumiram-
se em outro conflito. Minhas mãos estão taticamente na terra prometida,
deslizando entre o suéter e sua camisa apertada. Eu corro minha mão por
debaixo dele, colocando-a contra mim. Ela se entrega e pressiona mais seu
corpo. Eu arrisco um movimento na frente, gentilmente traçando uma linha
em suas calças. Dois dedos pausam entre suas pernas. Eu posso senti-la
molhada através do nylon.

O elevador abre e pulamos para o corredor. Liz me leva pela mão até o seu
apartamento. Ela procura em suas coisas pelas chaves. Eu tento beijá-la
novamente mas ela coloca um dedo na minha boca. Ela abre a porta. Dentro,
uma garota ruiva, quatorze anos talvez, está assistindo TV.

"Você chegou em casa cedo," a ruiva diz.

"Tudo está bem?" Liz pergunta.

"Nunca esteve melhor," a ruiva responde. Ela já está colocando seu casaco.

Liz a agradece e a entrega algum dinheiro. Gira a chave duas vezes para
trancar a porta atrás dela. Ela se vira para mim como se fosse explicar algo,
mas meus lábios já estão de volta aos dela, minhas mãos novamente
procurando um caminho embaixo de seu cinto. Nós caímos no sofá. Suas
mãos deslizam dentro de meu jeans o mais longe que podem—eu estou
mais duro que pedra e não há exatamente muito espaço na sala para
manusear. Ela usa as duas mãos para descer minhas calças e tirar minhas
botas—problema resolvido. Meu pau pula para fora. Ela se agacha na minha
frente e corre sua língua no meu negócio, começando pela base. Chegando
ao topo, ela se levanta, satisfeita com a visão do todo. Ela retira uma
camisinha de sua bolsa e joga para mim. Eu luto com a borrachinha
enquanto ela tira sua camisa apertada. Ela espera por mim até terminar,
mãos nos peitos, e um pouco de suéter visível para proteger sua modéstia.

No próximo quarto, uma criança começa a chorar. Privativamente sempre


considerei a mim mesmo por ter algum talento em mensurar o temperamento
de uma mulher. Mas a expressão na face de Liz me força a reconsiderar.
Não vazia, mas o oposto. Arrependimento co-existindo com orgulho, com
toques de ressentimento, alegria, frustração, vergonha, resignação, e
curiosidade. Quando o assunto é emoções, mulheres sabem como pintar
com todas os tons de óleo, enquanto os homens estão ocupados brincando
com seus cérebros de baixo.

Liz resmunga algumas palavras de desculpas e sai em direção do barulho


intenso. Eu sento no sofá e olho para o meu raivoso e duro, me sentindo
ridículo. Então eu coloco de volta minha cueca, pego minhas calças, e me
parto para a porta. O choro desaparece—eu posso ouvir Liz sussurrando
alguma coisa suave e amável. Deixando ela agora, eu começo a achar que
estava fazendo a jogada errada. Eu olho em volta procurando por um
telefone: eu posso escrever o número dela e ligar depois para me desculpar.

"Clássico," eu escuto Nate dizendo na minha cabeça.

Eu vou bisbilhotar no quarto. Tendo pego o suéter e se vestido, posso ver Liz
de frente pelo espelho em um ponto cego. Ela está cuidado de um bebê,
sexo indeterminado nessa distância. A cena no espelho confirma que eu
estava certo sobre a atenção demandada pelos seus seios. Mas eu os perdi
para uma nova audiência. Talvez eu não fui totalmente cheio de merda
durante a minha última conversa com Tana. Talvez não é sobre marcar, mas
sim sobre dar.

Liz olha para o espelho e me pega meditando como Buddha. Eu reconheço


sua expressão: um quebra-cabeça. Eu imagino se ela encara com o que eu
imagino ser um tiro iluminado ao meus olhos, até eu descobrir que seu foco
está em meu chacra mais baixo. Eu ajeito minha cueca para tentar alguma
acomodação. Não é Buddha, mas uma ereção, de volta como um mastro
gigante. No mesmo tempo que a olho novamente, ela não me parece mais
encucada. Algo mais mudou por inteiro.

Ainda segurando o bebê, ela senta no canto da cama e se deita lentamente,


até que a mãe e o bebê estejam na horizontal. Eu sento ao lado dela,
colocando minha mão em seu braço. Ela abre suas pernas como tesouras,
um convite para completar o circuito. Dar para receber, eu penso assim que
entro nela. Dar para receber. Eu agradeço ao universo por me dar partes tão
maravilhosas para brincar.

10

EU ACORDO, DIFICILMENTE DE UM JEITO FÁCIL devido as roupas de


cama de merda forjadas com algum tipo de algodão fofo ou polyester do
futuro. Louvado e cego pela radiação do sol matinal, descobri que pessoas
ricas dormem melhor, o que pode ser a razão delas serem ricas.

Liz está sentada no canto da cama, em um estilo Indiano, me encarando.


"Você está acordado," ela diz.
"Fico feliz."

"Eu também." Eu me sento, mantendo o lençol sobre o meu corpo.


Parcialmente eu não quero ofender com minha nudez, já que ela está
totalmente vestida: jeans e um tomara-que-caia rosa. Na verdade eu só
estou resistindo a me entregar a luxúria dos lençóis.

"Ontem a noite foi ótimo."

"Ótimo?," ela pergunta. Seu tom é confuso.

A última noite de sexo foi claramente uma cópia e uma excelente


performance, digna de um catálogo de L.L. Bean.

"É isso que você acha? Ótimo?"

"Muito bom?"

"Muito bom? Muito bom. Meu deus. Eu quase explodi os miolos."

"Eu estou um pouco confuso. Por acaso eu sou péssimo na cama?"

"Não, você foi bem," ela diz.


"Melhor que bem. Eu me diverti muito, muito mesmo. Mas eu preciso que
alguém me explique como eu saio de um encontro com um médico, um
médico solteiro e bem sucedido, maduro, pela primeira vez na minha vida,
que sabia sobre Lucy e ainda queria...Que ainda tinha algum interesse por
mim além de...Como eu saio desse cara para transar com meu traficante
adolescente?"

"Eu não sou nenhum psicólogo, mas você estava chapada. Nós estávamos
chapados. Falando nisso...Não sei quanto a você, mas eu sou um grande fã
de umazinha matinal."

"Eu estava chapada," Liz diz.

"Eu não sei porque, mas falar isso só faz você se sentir melhor, não faz?"
"Chapada enquanto eu cuidava de minha filha. Enquanto meu traficante
adolescente me comia por trás. Digo...que tipo de mãe eu sou?"
Liz pega o telefone e aponta para mim.
"Você pode ligar para os serviço de cautela infantil? Pois se você não pode,
eu irei. Lucy estaria melhor em um lar para crianças."

"Calma aí maninha. Respira fundo. Primeiro eu não sou um adolescente, eu


tenho vinte um."

"Vinte e um, imagine só."

"Quase vinte-e-um-e-meio. E enquanto eu concordar, o sexo mais esse


negócio de cuidar do bebê pode vir a ser um pouco estranho, mas não faz
você uma péssima mãe. Acredite em mim. Eu conheço pais ruins, você não
é um deles. Nós nos divertimos ontem a noite. Todos merecem um pouco de
vez em quando—"

"Você é doce," Liz me corta.


"Muito obrigada. Você realmente me ajudou a ver como minha vida ficou
completamente fudida e fora de controle. Agora se você puder se vestir e
vazar daqui, eu não preciso que Clarinda me julgue também."
Ela sai do quarto.

Eu pego minhas roupas e me visto rapidamente, passando por uma


enfermeira ranzinza—essa deve ser Clarinda—no caminho para a porta. Ela
me cumprimenta, com metade de um sorriso como se ela soubesse sobre
tudo que aconteceu na noite anterior.

"Ela vai ficar com bom humor essa manhã," ela diz.

"Eu espero que você esteja certa," eu digo, mais para mim mesmo e me
dirijo ao elevador.

No lobby do apartamento eu me dou de frente com um igualmente conhecido


mas muito menos sorridente olhar do porteiro. No colégio, nós chamávamos
essa experiência de 'O andar da vergonha.'

Peguei um táxi até Chelsea. Me esparramo no banco, refazendo a noite em


minha cabeça, tentando congelar o momento onde tudo deu errado.

A cena que continuo congelando sou eu, entrando no apartamento de K.,


ingressos seguros para cima como penas de pavão. Eu pago o táxi e ando
até o salão, imediatamente agradecido por ser a folga de Herman. Manuel
felizmente me ignora devido ao jogo de futebol narrado em espanhol em uma
pequena televisão em preto e branco. Eu estou metade do caminho na
escadaria para meu quarto, quando eu encontro K.

"Ho, ho," ela diz.


"Eu ouvi que você teve uma noite interessante."

"Interessante?"

"Nate disse que você o trocou por alguma namorada de um médico."

Ela ri para mim com um olhar que eu já havia visto antes, geralmente quando
meu rap está quebrado ou queimado. Você é legal e eu poderia dormir com
você, o olhar diz, se eu fosse algum perdedor sem qualquer respeito próprio,
Qualquer janela que eu tinha com K. agora está fechada.

"Não foi exatamente a noite planejada," eu digo friamente.


"A noite que nós planejamos, realmente."

"Você sabia que eu tinha um namorado."

Poderia ter algum arrependimento na maneira que ela havia dito isso, mas
eu não estava com qualquer humor para ver isso. Eu não conseguia em
pensar em mais nada que não soasse desesperado, idiota, ou somente
patético, então eu continuei até o meu quarto.

Sobre circunstâncias normais, eu sou um grande fã de um longo banho. Por


mais doente que isso provavelmente soe, lavar vestígios de um sexo recente
sob meu corpo, me faz parecer um homem de bigode que acabou de
descobrir algumas migalhas de um delicioso jantar da noite passada. Mas eu
não quero mais pensar sobre a noite anterior. Apesar da incomunicável
luxúria que é ter um banheiro para si mesmo, eu me seco rapidamente e
retorno para o quarto.

O Motorola está vibrando em cima da cama. Um número gigante que eu não


reconheço. Eu coloco algumas roupas, tento parecer mais bonito do que
estou, e caminho até o restaurante Mexicano.

"Kings Park," diz a recepcionista do outro lado da linha, rapidamente


desvendando a identidade do número misterioso.
"Daphne Robichaux, por favor." Dois toques se passam até ela começar a
falar.
"Hyia!" Daphne diz radiante.
"Como vai a América?" É uma fala de Sid e Nancy, uma brincadeira que
costumávamos fazer entre nós.

"Fodasticamente chata," eu finalizo.


"Agora, onde está você, pessoa empolgada, e o que você fez com Daphne?"

"Ela conheceu um negocinho chamado fluoxetina. E deixe me dizer, foi amor


a primeira engolida."

Essa bolha de vida que Daphne está envolvida, soa muito mais como a boa
fase dos Beatles que uma má fase e o tão esperado 'Chinese Democracy'
dos Guns and Roses. Na verdade eu me sinto com um pouco de inveja da
sua vida, gasta com personagens coloridos criados por ela, em um ambiente
livre de stress. Talvez não totalmente sem stress—quando meu pai
finalmente ligou para a polícia para desistir das acusações, eles disseram a
ele que ela ainda poderia tentar algum ato criminoso—mas a última conversa
de Daphne com Larry a deixou confiante que não haveria nenhum tempo na
cadeia.

Eu já estava prestes a fugir da ligação quando ela me pergunta se há


novidades sobre seu pai. Eu prometo ligar para o investigador particular, que
é o que eu faço quando eu desligo o celular. Esse tipo de conversa tende a
ser muito curta.

"Ainda bem que você ligou," diz Henry Head.


"Por quê você não aparece por aqui no escritório?"

O escritório fica no coração de uma cozinha no inferno. No segundo andar


onde há uma faixada prometendo identidades falsas e sexo ao vivo, eu acho
a porta onde no vidro está escrito 'Investigações Cabeça'. Nâo há
recepcionista, só o próprio Head, deitado sobre sua cadeira e com os pés em
cima da mesa. Ele usa um casaco velho que parece mais irônico que
funcional—Henry Head deve pesar uns 180kg. Ele nota minha chegada,
limpando um Twinkie em sua blusa.

"Apetitoso," ele explica, gesticulando para que eu me sente no sofá cujos


assentos me deixam curioso se algo vive por de baixo.
"Sinta-se em casa."
Tento me manter seguro, descansando minha bunda no braço do sofá. Um
termostato ruge com um barulho alto no canto da sala, puxando a
temperatura cerca de cinco graus a mais que o confortável. Realmente
parece que estou em casa.

"Você tem alguma idéia de quantos Peter Robichauxs há no estado?" Head


pergunta.

Eu balanço minha cabeça.

"Eu também não. Talvez algum dia com computadores e outros tipos de
informações nós poderemos saber. Até lá, nós temos as páginas brancas,"
Ele olha uma lista telefônica toda molhada. Minha temperatura aumenta até
atingir a da sala.

"Deixe-me entender," eu digo.


"Eu acabo de te pagar $500 para procurar o cara na lista telefônica?"

"Você nunca ouviu a navalha de Occam? O caminho mais perto entre dois
pontos é uma reta."

"Na verdade, a navalha de Occam cita que as mais simples explicações


eram as corretas," eu digo, desenhando o meu único semestre no curso de
filosofia.

"Mas que merda? Então do que você chama essa coisa dos dois pontos e a
reta?"

"Eu acho que é somente uma linha reta."

Ele segura a palma das duas mãos como um tipo de defesa.


"Eu nunca tentei ser um cara 'escolado'.

"Então, existe algum Peter Robichaux na lista?"

"Quatorze deles." Head consulta um caderno em espiral, e diz inspirado.


"Dois deles morreram a cinco anos, significando que ambos tem certificado
nos Queens. Eu não posso te dizer o quão fácil fica quando o cara que você
procura possui um certificado de morte."

"Você acha que ele está morto?"

"Só estou dizendo que fica mais fácil. Aliás. Eu não acho que nenhum dos
Robichauxs mortos, sejam o que a gente procura. Muito novo, muito preto,
muito velho. Você disse que ele é um cara branco, certo?"

"Fico feliz em ver que você estava prestando atenção. E enquanto aos
Robichauxs vivos?" Head balança a cabeça e volta para seu caderno.

"Um deles está na cadeia por homicídios. Mas eu não acredito que seja ele
já que ele matou toda sua família. Sua garota continua viva, certo?"

"Sim, ela está."

"O outro está servindo...Alemanha. Eu fiz uma ligação para ele. Longa
distância—você verá quando chegar a conta. Mas pelo resto...'squadoosh'."
Head junta suas mãos como um mágico. Outro gesto irônico.

"Por uma série de razões eu devo eliminar todo o resto de possíveis


candidatos." Ele joga uma segunda pastilha amarela em sua boca.

"Certo, assumindo que isso seja verdade, onde isso nos deixa?"

"Como eu disse," ele se ajeita na cadeira.


"Eu fiz uma ligação para Alemanha." Ele limpa sua boca com um lenço de
papel.
"É um tiro longo, é por isso que te liguei para vir aqui. Nossa investigação
acaba de atingir uma cruz na estrada."

"Você quer dizer 'encruzilhada'."

"Como é?"

"A expressão. Encruzilhada na estrada."

Head levanta sua cabeça com o lenço na mão.


"Isso não me parece certo. Encruzilhadas tem três pontos, talvez quatro. Nós
só temos duas opções."

"Talvez se você me dissesse quais são?"

"A primeira seria expandir a procura...relatórios policiais, licenças de


veículos, que Deus abençoe. Se você quiser eu posso dirigir até Albany. É
aonde eles guardam outras informações de pessoas mortas. Isso, se forem
de Nova Iorque. Se ele morreu em Jersey ou Connecticut, é uma estória
totalmente diferente. Eles possuem suas próprias listas telefônicas. Mas eu
preciso te avisar. Esse tipo de coisa pode levar algum tempo."
Ele gesticula com seus dedos, me deixando saber que esse "algum tempo"
iria me custar mais.

"Eu não tenho certeza quão profundo seus bolsos são."

"Não muito, qual a segunda opção?"

"A segunda opção," Head diz.


"É fazer absolutamente nada."

Eu tiro um momento para considerar minhas opções.


"Eu não posso dizer que particularmente gostei de alguma delas," Eu digo.

"O que eu posso te dizer? Às vezes temos que lidar com os problemas de
mãos vazias."

Nós finalmente concordamos em continuar a investigação por outra semana,


tempo o suficiente para ouvir alguma resposta de Peter Robichaux na
Alemanha. Deixo outros $500 na mão de Head e desço para a rua entrando
em uma gelada chuva que não caía por volta de uma semana.

11

O NATAL DA FAMÍLIA KIRSCHENBAUM poderia ser uma contradição, e


deveria ser se não fosse o pragmatismo de Larry Kirschenbaum: se seus
clientes conseguiam se encher de fé, então ele poderia também.Todo ano,
os familiares e alguns convidados se reúnem em torno de uma árvore
enfeitada de Natal com dois metros, vestidos geralmente como duendes
pervertidos, enquanto lhes era servidos um pouco de batata assada.

Esse ano, o 'menorah' será ministrado por Kwanzaa kinara, uma


comemoração para um semi-famoso rapper que Larry safou das acusações
feitas a ele por posse de arma. Ainda assim, esse cliente é muito diferente
daquela mesma defensoria de Católicos Irlandeses que dirigiam e colidiam
seus carros, graças as suas paixões por bebidas—o pão e a manteiga do
dia-a-dia de Larry—o evento em si provavelmente seria chamado de 'O natal
da família Kirschenbaum'.

Após fazer minha entrega regular de sexta-feira à noite para Danny Carr, eu
pego o trem de volta à ilha. É a primeira vez que volto para casa depois que
mudei para a cidade. Desta vez, ninguém acordou para me dar felicitações.
Mas eu me sinto bem em dormir na minha velha cama. Quando eu acordo,
minha mãe já está na cozinha. Sento na mesa enquanto espero minhas
panquecas.

"O pai ainda está dormindo?"

"Não sei," minha mãe diz.


"Ele não voltou para a casa na noite passada."

Eu coloco o mel na pilha de panquecas quando o velho chega através da


porta. Ele ainda está usando as roupas de ontem. Ele beija minha mãe, que
se senta na mesa comigo.

"O maldito Harvey me fez dormir no bar," meu pai diz.


"Eu disse a ele que estava bem, mas você conhece Harv..."

"Tenho certeza que ele só queria que você ficasse são e salvo," minha mãe
diz sem olhar para ele.
"Querido, você por favor pode me passar o mel?"

"O quê? Você não acredita? Ligue para Harv e pergunte para ele."

"O telefone dele está funcionando?" ela pergunta.

"O que você quer dizer com se o telefone dele está funcionando?"

"Quero dizer que, se o telefone dele estivesse funcionando, você teria ligado
avisando. Ou chamado um táxi."
"Como se eu precisasse dessa merda mo começo da manhã," meu pai grita.

Bem vindo de volta à casa, moleque. Felizmente Tana me liga, dando uma
desculpa para voltar ao quarto.

"Você vai vir aqui a noite, certo?" Tana pergunta.

"Então é verdade. Seus cumprimentos finalmente se tornaram passé. Oi para


você, também."

"Você vai vir ou o quê?"

"Eu estou aqui não estou?


Na casa dos meus pais."

"Só estou tendo certeza," ela diz.

"Deixe me adivinhar. Você está tendo alguma dificuldade com a


representatividade de um sexo rude?"

"Algo parecido." Tana parece ansiosa de um jeito que eu não podia imaginar.

"É algo que pode esperar? Pois se não, eu posso ir agora."

"Eu não estarei aqui. Estou indo no Dottie cortar o cabelo, fazer manicure. Ah
é, e uma massagem."

"Deve ser horrível ser você," eu digo.

"Te vejo hoje a noite." Ela desliga o telefone, o 'adeus' parece ter vindo do
mesmo jeito que o 'oi'.

Eu volto para o show de esquisitice na cozinha, mas o circo se virou para


mim. Meu pai está parado no caminho da porta como um maníaco
esperando sua vítima.

"Você tem um minuto para falar?" ele pergunta.

"Claro," eu respondo.
"É sobre o dinheiro que você pediu emprestado?"

"Heh," ele diz, fechando a porta atrás dele.


"Não, eu estou pensando em deixar sua mãe."
O silêncio se torna constrangedor.

"Ok," eu finalmente digo.

"É isso, ok?"

"O que você quer que eu diga? 'Não faça isso?' Parabéns?'"

"Você tem toda a noite para ficar com raiva..."

"Eu não estou com raiva, nós dois sabemos que a mãe merece alguém muito
melhor que você. Espero que essa vadia que você está pegando esteja
funcionando, mas conhecendo você, provavelmente não está."

"Janine, o nome dela é Janine. Nós não queríamos que chegasse a isso..."

"Pai," eu digo, "eu realmente estou pouco me fudendo para isso."

Ele levanta seu corpo, olhando para mim como se tivesse algo a mais a
dizer. Após um ou dois falsos começos, ele dá um tapa no meu ombro e sai.
Eu passo o resto da manhã escondendo no meu quarto.

Quando é hora de ir para a festa, minha mãe insiste que eu saia de carro
com meu pai.

"E onde nós vamos," ele diz, ligando o carro, "para mais uma festa de
sonegação de impostos feitas por Larry Kirschenbaum."

Nós terminamos o caminho em silêncio, estacionando o carro em uma


barraca vermelha que Larry havia alugado para a ocasião. Meu pai já se
encaminhou para o bar, me deixando sozinho com minha mãe. Ela parece
pálida. Eu quero dizer algo, mas eu não sei exatamente o que meu pai disse
para ela.

"Vá se divertir," ela me diz.


Eu dou um abraço nela e me encaminho para a sala de estar.

Eu procuro na multidão por Tana quando uma das inúmeras duendes


pervertidas aparece ao meu lado. Cabelo preto, talvez trinta anos, com uma
pinta sobre seus lábios como Cindy Crawford. Não tão alta, mas ela ganha
alguns pontos pela fantasia. Eu não tinha idéia que duendes pudessem ser
tão atraentes.

"Sufganiot?" ela pergunta. Sua voz é rouca. Eu posso imaginá-la, trinta anos
mais à frente, jogando canastra com um longo cigarro marrom dançando na
sua boca. Estranhamente. Eu não acho isso broxante.

"Gesunheidt," eu respondo.

"É uma rosquinha de geléia."

Eu devo admitir que brincar com umas das Kirchen-fêmeas duendes era uma
fantasia de muito tempo minha. No passado, elas pareciam remotas e
inatingíveis, como super-modelos. Mas agora que eu passei algum tempo
próximo a algumas modelos, uma duende da ilha não me parecia muito
desafiadora.

"Se eu fosse o velho Noel," eu digo aceitando a rosquinha.


"Eu acho que não deixaria você sair da fábrica."
Ela já está se movendo fugindo da trilha.

"Tome cuidado," ela diz sobre seus ombros.


"Meninos maus costumam terminar com carvão nas suas meias."

"O que foi isso?" Tana pergunta, se materializando atrás de mim.

"Somente eu tentando descobrir o que eu quero no Natal esse ano."

"Uh, oi," ela diz, irritada já que eu não me incomodei em me virar. Meu
queixo cai imediatamente no chão quando finalmente me viro.

"Puta merda," eu digo.


"Olhe para você."

Tana definitivamente é algo que se deve olhar. Um curto vestido preto faz
com que os seus já formidáveis seios ficassem mais que memoráveis
naquele decote. E Scarpin. Tana nunca usa Scarpin.

"Quem você está tentando impressionar? Bono está vindo esse ano?"

"Você podia dizer só que eu estou bem," ela diz.


"Você está ótima. Mas você poderia apenas olhar ao redor da sala e ter a
mesma opinião."

De fato, a maioria das pessoas não chegavam aos seus pés, suas faces
formavam um contínuo entre 'cobras mortas' e 'cachorros mal-encarados'.

Tana resmunga algo.


"Eu preciso de uma bebida," ela diz.

Alguns minutos depois, armados com alguns egg-nogs, nós sentamos em


um sofá para algo que se tornou como uma tradição anual de Natal para
Tana e eu: jogando um jogo de adivinhações sobre os segredos dos
convidados.

"Terrorista internacional," eu digo me referindo a um homem com um bigode


fino.

"Nem se quer chegou perto," responde Tana.


"Esse é o Senhor Atkins. Motorista de táxi. Que tal o cara com suéter
vermelho?"

Eu vejo o suéter vermelho mas meus olhos continuam seguindo até


alcançarem meus pais. Scotch geralmente deixa meu pai em um dos dois
estados—perdido ou prestes a se perder—mas por agora, ele apenas parece
desconfortável.

Ele encara nervosamente uma loira em um casaco de negócios do outro lado


da sala. Ela não é uma das mais bonitas do ambiente, mas é atraente. Ela
está parada próxima a um cara, careca vestindo um suéter marrom de Natal.
Ele está com sua mão na cintura dela. Eles estão conversando com outro
casal, rindo. Ela olha de rabo-de-olho para o cara, deixando-o entender que
sua atenção está para o outro casal, e então joga um meio-sorriso por toda a
sala para meu pai. Eu não sei exatamente como eu sei, mas eu tenho
certeza que essa é Janine.

"Olhe para as dez horas," eu digo a Tana.


"Eu acho que é a mulher que está desbancando minha mãe."

Tana segura minha cabeça para ficarmos cara-à-cara.


"Como é que é?!"

Eu rapidamente a deixo a par dos acontecimentos de hoje de manhã.


"Que filho da puta!" ela diz, pulando do sofá.

"Onde você está indo?"

"Descobrir quem ela é."

E então ela parte a multidão, traçando seu caminho até os dois casais. Vejo-
a se apresentar. Assim como meu pai, que olha para mim com uma
expressão indeterminada entre raiva e confusão. Eu o saúdo com meu copo,
que descobri estar vazio. Levantando do sofá, eu retorno ao bar e peço um
Scotch. Dottie, a mulher que estava conversando com minha mãe, me
chama.

"Eu estava aqui escutando sobre o seu trabalho," Dottie começa a conversa.
"E vivendo na cidade. Talvez você possa ajudar minha Tana a achar um
emprego quando ela finalmente terminar o colégio."

"Ela tem o seu olhar, Dottie. Ela não precisa da minha ajuda."

"Oh você," Dottie diz, acariciando minha mão como um gato robusto.
Minha mãe, em contraste, está com um olhar petrificado.

"Está tudo bem mãe?" eu pergunto.

Ela não responde. Dottie intensifica a interação.


"Judy?"

Minha mãe acorda.


"Eu estou bem," ela diz.
"Só preciso de um pouco de água."

"Vamos," Bonnie diz, a pegando pelo braço.


"Eu tenho um pouco do 'mau' na cozinha."

Eu olho para Tana. Ela está sendo encoxada pelo semi-famoso rapper, mas
não está reclamando.

"Koki?" pergunta uma rouca voz familiar.

"Agora você só está se divertindo," eu digo, me virando para a duende sexy.


Ela ri.
"Culinária de Kwanzaa. Eu acredito ser feita de ervilhas."

"Fico só com o Scotch," eu digo, levantando meu copo.


"Eu acho que teremos que descobrir outro jeito de celebrar Kwanzaa."

"Como?" ela pergunta.

Tana aparece antes que eu possa responder, pegando um dos petiscos na


bandeja.
"Vou experimentar um desses."

A sexy duende ri e se move para longe.

"Essa, pequena garota, era um Quebra-Koki," eu digo a Tana quando me


asseguro que a duende está a uma distância segura para não ouvir.

"Ela?" Tana levanta seu nariz.


"Por favor."

"Tanto faz. Então o que você sabe?"

"Sei que J-Bigg toca todos os seus próprios instrumentos."


Tana cruza seu olhar pela sala até o rapper.
J-Bigg a pega olhando e ri. Alguns de seus dentes são feitos de ouro.

"Eu aposto que sim," eu respondo.


"Ele pediu para que você tocasse sua flauta?"

Tana me empurra.
"O que há de errado com você?"

"Talvez esteja com ciúmes."

"Você deveria estar. Ele disse que nós poderíamos andar por aí juntos."

"Olhe para você," eu digo.


"Já faz parte desse circo. Um de nós. Agora, o que você descobriu sobre a
senhora de gelo?"
"Você estava certo. Seu nome é Janine Canterbury ou algo parecido. Casada
com Ted Canter-qualquercoisa, o cara de suéter esquisito. Digo, uma árvore
de Natal marrom? Coisa de doido."

"Foi meu pai que a convidou?"

"Duvido. Ela parece conhecer Larry," Tana diz, adicionando quando eu


levanto uma sobrancelha:
"De um jeito profissional."

"Minha mãe parece estar muito fora de si," eu digo, olhando pela sala
procurando por ela.
Ela ainda não voltou da cozinha.

"Você acha que ela sabe?" Tana pergunta.

Eu repudio.
"Hey...você não tinha algo importante para me dizer sobre hoje a noite?"

"Mais tarde," ele diz.


"Quando você trocou para Scotch? Eu me sinto como se fosse largada de
lado."

Já estávamos indo para o bar quando Dottie nos parou. Uma mascara está
escorregando de seu rosto.

Dois minutos depois eu estou no segundo andar, gritando pelo meu pai,
abrindo várias portas. Finalmente acho o velho no quarto de Dottie, onde ele
e Janine estão se pegando como um casal de adolescentes. Ele levanta sua
mão como sinal de frustração. Janine esconde à frente de seu corpo devido
a seu vestido erguido.

"Bom," meu pai diz,


"Essa não é a maneira que eu queria vocês dois se conhecessem."
Janine segue a deixa, estendendo sua mão. Eu ignoro.

"É a mãe," eu digo.


"Ela acaba de desabar na cozinha. Há uma ambulância a caminho."

12

MEU PAI E EU DEMOS UMA TRÉGUA, residindo permanentemente na sala


de espera do Centro médico da Universidade de Nassau. Nós tentamos
manter nossas conversas limitadas a declínios ocorridos na ilha de Nova
Iorque enquanto alternávamos uma ordem de viagens entre a cafeteria do
hospital e comprar mais cigarros.
Uma porção de médicos nos deixava aprisionados sobre a condição de
minha mãe. A televisão na sala de visitantes nos dizia quando o Natal,
chegou e foi.

Fora do padrão, a condição da minha mãe confundia toda a equipe. Seu


novo psiquiatra, Dr. Winfield Edgars—"Me chame de Dr. Win(vitória), todos
me chamam assim."—deu alguns socos no seu diagnóstico inicial:

"O problema é que seus sintomas fortemente sugerem um tumor no


cérebro."

Rapidamente percebo que a parte do problema para o Dr. Win não era a pior
condição da minha mãe, mas a falta de qualquer evidência para suportar seu
diagnóstico. Após uma bateria de exames e testes, o tumor substancialmente
se recusa a se apresentar.

No quarto dia, Dr. Win entra no quarto com um sorriso.


"Ela não tem um tumor," ele diz. Sua voz mal contém sua excitação enquanto
ele explica como seus sintomas o enganaram.

"Síndrome Paraneoplástica. Alguns anos atrás, nós não tínhamos


capacidade de diagnosticar essa coisa. Nós ainda não temos certeza exata
sobre o que é. Seu cérebro—na verdade, seu sistema nervoso—está sendo
atacado por uma alguma coisa deixando ele imune a qualquer resposta. O
que nós estamos vendo em seu cérebro são os sintomas, não a causa em si.
Nós precisamos olhar para trás e descobrir o que está causando essa
imunidade."

"E?" meu pai pergunta.

Dr. Win rebate.


"Pode ser câncer," ele diz.

"Ela sequer fuma," eu digo.

"Ela por acaso vive com alguém que fuma?" ele pergunta, obviamente se
referindo aos dentes e dedos nicotinados de meu pai.
"Pode ser também asbestos. Quão velha é sua casa?"

O trabalho do Dr. Win está acabado. Nós fomos até o melhor doutor em
Oncologia, o qual Dr. Win nos avisou ser um pouco irritante, pelo seu senso
de humor.

"Noventa porcento desses casos não passam dos cinco anos," ele começa,
antes de lançar uma viva descrição da agressiva terapia de radiação que ela
estava prestes a suportar.

Eu queria chorar. Suspeito que meu pai também. Em respeito de alguma


tradição familiar, nós não fazemos isso em frente um do outro.

O estado emocional de minha mãe varia de acordo com seu tratamento. Mas
o sentimento que eu tenho por ela está longe de ser alívio. Ela insiste para
que eu volte ao trabalho.

"Volte para sua vida. Não é saudável para você estar aqui."

Então eu vou. Apesar do frio e gelado inverno, a cidade está cheia e viva. É
quase véspera de Ano Novo, então as crianças e os colegiais estão de férias
da escola. Os negócios estão bombando, o que eu fico grato. O constante
movimento me deixa anestesiado.

A semana que tirei de folga do trabalho para ficar no hospital e


consequentemente as três semanas de viagem de Danny Carr para Flórida,
conspiraram para quebrar minhas finanças pessoais, me forçando a voltar
para dieta substancial de cachorro-quente e pizza. Eu definitivamente estarei
atrasado no meu aluguel de Janeiro, então evito Herman usando à escada
de incêndio até o meu quarto. Eu também ignoro Henry Head, já que ele me
bateu firme e forte com uma conta.

Tana me liga todo dia. A maioria do tempo não retorno. Não estou a fim de
conversar. Mas ela quebra minha resistência com uma oferta de uma
refeição feita em casa, entregue no meu quarto no Chelsea.
Eu a encontro na Estação Penn, onde ela sai do trem carregando duas
vasilhas de alumínio e um pequeno cooler.

"Sorvete feito em casa," ela diz.


"Nós podemos pegar uma garrafa de vinho enquanto voltamos para seu
hotel. É Chardonnay tudo bem? Eu acho que irá cair bem com o frango."
Ela aparentemente participou de um clube de apreciação de vinho no
colégio.

Nós paramos para o vinho e talheres de plástico, já que eu não tenho


nenhum de prata. Tana serve tudo em pratos de papelão. Quando ela produz
duas velas da sua jaqueta, eu me dirijo até o banheiro e pego dois rolos de
papel para segurá-las. Acendemos as velas e brindamos com dois copos de
plástico. Eu começo a comer a refeição lentamente. Tana então começa a
conversa com uma série de perguntas já estruturadas sobre minha mãe, as
quais eu respondo somente balançando a cabeça, sim e não.

"Enquanto ao seu pai?" ela pergunta.


"Ele ainda vai largá-la para ficar com Janine?"

"Eu não tenho a menor idéia," eu confesso, temporariamente largando a


refeição para fumar um cigarro próximo a a janela aberta.

"Você não está congelando? Assim você não vai querer o sorvete."

Percebi nessa hora que pela primeira vez desde a festa no Natal, Tana
estava usando maquiagem. E apesar dela não ter imitado o decote
dramático, ainda estava ótima em um jeans desenhado e um suéter apertado
que não escondia nenhuma de suas curvas.

"Eu declaro, senhorita Kirschenbaum, que um dia você irá fazer um desses
homens que você gostaria de sair muito, muito feliz."

Tana se aborrece.
"Eu estou cansada de homens e suas desculpas."

Eu deixo meu copo.


"Aqui, aqui. você deveria tentar o lesbianismo." Ela ri, derramando um pouco
de vinho. Eu tiro um dos rolos segurando a vela e a entrego.

"A menos eu vou ter alguma coisa," ela diz.

"Qual é, não é tão ruim assim, é?"


Eu pergunto. Sua expressão está semi-questionável. E semi-qualquer-outra-
coisa.
"Quão horrível pode ser?"

"Você sabe que nunca cheguei a tentar, certo?"

"Com uma mulher? Hey, homossexualidade não é para todo mundo."


"Quero dizer, com qualquer um."

"O...qu...que...nunca?"

"Eu estava meio que pensando," ela diz, sua voz se aproxima de um
sussurro, "que talvez você deveria me iniciar."

Pensamentos estouraram no meu cérebro.


"A outra noite, quando você disse que queria conversar comigo..." Ela
confirma timidamente. Eu nunca havia visto Tana tão vulnerável. Eu a puxo
para um abraço, e outro pensamento me veio a cabeça. Oh. Tão perto. Mas.

"Primeiro de tudo," eu digo, "Eu estou incrivelmente lisonjeado..."

"Oh meu Deus," diz Tana. Ela já está me afastando.


"Aqui vamos nós."

"Você está levando isso para o lado errado. Você é brilhante, uma mulher
incrivelmente sexy, Tana Kirschenbaum. Mas você também é minha irmã—
talvez não de sangue, mas você sabe o que quero dizer. Sexo para mim é..."

Eu interrompo. Eu não tenho a menor idéia de como terminar a sentença. O


que sexo significa para mim? Por quê eu não quero fazer com Tana?
Ela já está limpando os restos do jantar.

"Eu posso fazer isso," eu digo. Tana coloca de volta um prato e pega sua
jaqueta na cama.
"Podemos conversar sobre isso?"

Ela coloca sua jaqueta.


"Não há nada para conversar," ela diz.
"Você está certo. Má idéia. Totalmente retardada."
"Eu não me lembro de dizer nenhuma dessas coisas."

Ela caminha até a porta.


"Eu devo ir."

"Posso pelo menos ir com você até a estação?"


Eu a sigo esperando que o ar frio limpasse minha cabeça e me deixasse
consertar qualquer dano que já tinha feito. Ela pausa no corredor, me
esperando alcançá-la. Mas ela muda de idéia no momento que chegamos na
rua.

"Você quer saber? Está muito frio. Vou pegar um táxi."


Tana acena para um táxi antes que eu possa oferecer um contra-argumento.

"Obrigada pelo jantar."


"Diga a sua mãe que eu irei vê-la."
Tana diz enquanto fecha a porta e o táxi vai embora.

13

EU NÃO TENHO O MENOR INTERESSE EM RETORNAR para refúgio que


eu chamo de casa e além do mais, eu me sinto extremamente arrependido.
Em tempos como esses, realmente não há substitutos para uma melhora do
que ficar bêbado. Fora de conveniência, eu escolho o restaurante Mexicano.
Eu devolvo minha primeira dose de tequila quando me lembro de ainda estou
quebrado. Eu acho uma nota de dez no bolso, dinheiro que havia guardado
para comer no fim de semana. Eu trabalho na matemática—contando com as
sobras da refeição de Tana, eu devo sobreviver até segunda. Então agora,
eu tenho três doses. Suficiente para uma embriaguez, talvez, mas não para
tamanha obliteração que eu estava esperando.

Durante o tempo que tomava minha terceira dose, eu reclamava meus


problemas com o cara do bar. Ernesto vindo da Nicarágua. Que é, nesse
momento, a pessoa mais inteligente do mundo.

"Então o que você tem a me dizer, Ernesto? Que eu sou idiota? Que amor é
impossível? Que eu sou um gringo estúpido os quais os problemas não
significam merda nenhuma?"

"Ah." Ernesto balança a cabeça.


"Dios nos odia todos."

"Isso é bonito," diz uma voz atrás de mim. É K. Ela parece que tinha chorado.
"O que isso significa?"

"Eu tenho quase certeza que ele disse 'Deus odeia todos nós.'
Mas eu larguei o espanhol, então quem sabe ao certo. Você está bem?"

"Estou bem," ela diz.


"Apenas bem. Nate e eu terminamos."

Eu acabei de quebrar o coração de minha melhor amiga. Minha mãe está


morrendo no hospital enquanto meu pai a traía com uma loira. E mesmo
assim as notícias de K. me fizeram soltar nos lábios algo parecido com um
sorriso.

"Bem, puxe uma cadeira, minha senhora. O clube dos corações solitários
está começando a sessão."

"Por quê?" K. pergunta.


"O que está havendo com você?"

Eu digo a ela tudo que aconteceu sobre Tana e minha mãe, adicionando que
estou muito quebrado para ficar bêbado.
"Pobre criança," ela diz.
"Deixe-me cuidar de você."

Nós ordenamos outra rodada para Ernesto, que francamente parecia aliviado
de parar de conversar comigo. Eu digo a K. sobre a festa de Natal e o
hospital. Ela me diz sobre o término com Nate.

Ela tinha oferecido o que ela chamou de "obscena" quantia de dinheiro por
duas semanas de fotos no Sudeste da Ásia. Victoria Secret havia começado
uma nova campanha publicitária por lá e K. havia sido escalada, já que ainda
tinha devotos e homens asiáticos seguidores. Ela tinha a intenção de largar o
trabalho—o dinheiro iria ser bom, mas ela não precisava dele, e ela queria
mesmo voltar para a solidão, mesmo que fosse por duas semanas? Mas
então ela contou a Nate sobre a oferta, ele pirou.

Pegando vantagem das férias do baterista Scott, Venomous Iris planejava


residir no estúdio de gravação tempo suficiente para finalizar seu álbum.
Nate insistia que precisava dela pelo suporte emocional. Mas depois de um
dia no estúdio, ela percebeu que seu verdadeiro trabalho era lembrá-los de
comer no meio do uso coletivo de heroína e, quando seus suprimentos do
mesmo ficassem poucos, arrumar mais.

"Digo, eu não sou uma merda de traficante," ela diz.

"Obrigado," eu respondo com o sarcasmo apropriado.

"Você é diferente," ela diz.


"Maconha não é uma droga. É uma ferramenta de emergência. Mesmo
assim, ele disse que se eu não fosse arrumar, ele poderia arrumar outra
vadia que faria. E que talvez, finalmente teria um boquete decente. Você
acredita nele?"

"Que cuzão," eu digo.

"Que cuzão," ela diz.

Uma hora depois, K. e eu estávamos transando no quarto. Eu estou bêbado


e não tinha certeza se estava sonhando toda essa coisa até que acordei na
próxima manhã e ela ainda estava lá. Então ela acorda e fazemos de novo,
quase acabando totalmente com minha ressaca.

Nós caminhamos rua abaixo até um padaria francesa. K. insistia em pagar


para mim os ovos e Bloddy Marys. "Um caso complicado" é como ela me
descreve para o garçom, mas o poder do tempero restaurativo da comida
não causa qualquer efeito no meu orgulho masculino. Nós retornamos para
meu quarto, onde, dessa vez, nós fizemos certo. O sexo começou e foi
esquentando aos poucos, o mistério misturado com uma intimidade que
começava a parecer familiar, e terminava atleticamente, nossos dois corpos
se moviam como pistões.

Agora estávamos segurando as mãos no elevador, nossos dedos


entrelaçados. Subimos até o décimo quarto andar, onde a Festa Anual do
Novo Ano de Roscoe Trune estava. Não há proprietários oficiais para
qualquer quarto no Chelsea, mas a suíte poderia pertencer a Roscoe, um
aberto poeta gay de Savannah, Georgia, que residia lá por quase todo o
tempo que eu era vivo.

K., a convidada, estava-o cumprimentando com beijos na bochecha; fui


tratado cordialmente, mas com uma sobrancelha arqueada significando que
eu poderia causar algum escândalo causando algum dano ao quarto. Eles
esperavam ver Nate. A excessão é Ray, cujo olhar era de um novo
descoberto respeito.

"Eu preciso lidar com você," ele diz.


"Eu não pensei que alguém fosse quebrar esse gelo."

As pupilas de seus olhos pareciam gotas de biscoito de chocolate. Mais tarde


descobri que ele—assim como toda a festa—estava chapado de algo
chamado "Adam," uma psicodélica droga que mais tarde, eu teria conhecido
como "Ecstasy." O que eu sei agora é que toda conversa parecia voar para
a textura das minhas roupas e a densidade do meu cabelo. Um pouco de
crédito, eu penso, para um cara que mal se importou em tomar um banho.
Mais tarde enquanto K. dançava com um cara sem camisa, um musculoso
que Ray me garantia que era "um dos brinquedinhos de Roscoe," ele propõe
que eu me junte a ele para viajar um fim de semana para a Coréia do Sul.

"Eu irei ver uma Deusa," Ray diz

"Você está drogado, Ray. Tente manter-se na terra conosco em assentos


baratos."

"Vá se foder, cara. Ela realmente é uma Deusa."

"Mesmo? Ela cavalga um unicórnio?"


"Ela é uma Kumari, cara. Uma encarnação da Deusa Taleju."

"Tally o quê?"

"Taleju. É o nome napalês para a Deusa Durga. Totalmente foda. Ela tem dez
braços e carrega espadas e tal. Ela cavalga uma porra de um tigre."

"Eu admito que dez braços apresentam algumas possibilidades


interessantes, mas me escute: Mulheres e objetos afiados não são uma
combinação muito boa."

Ray aplaude.
"Eu não estou dizendo que ela é Durga. O ponto é que Devi—esse é o nome
dela—foi escolhida diante de milhares de mulheres para ser a encarnação de
Durga."

"Parecido o concurso de Miss Universo," eu sugiro.

"Exatamente! Só que muito mais difícil. Ela deve ter o que eles chamam de
'As trinta e duas perfeições.' Uma voz suave e rouca como um pato. Um
peito como uma leoa. Um pescoço como um concha."

"Toda vez que eu tento levar você a sério, me lembro que você está
drogado."

"Eu estou sendo totalmente sério, cara. Por dez anos, seus pés não foram
permitidos tocarem o chão. Alguns caras a carregam para todo lugar em um
daqueles, você sabe, aqueles carrinhos de mão. Pessoas se alinham para
tocá-la—a porra do seu pé!—para dar boa sorte. Até mesmo o rei de Nepal,
uma vez ao ano fica de joelho e beija aquele chulé."

"E você acha que ela vai querer algo com um mortal como você?"

"Essa é a melhor parte. Ela não é tecnicamente mais uma Deusa. Taleju
significa 'virgem.' No primeiro momento que ela, você sabe, sangrar, a
divindade acaba—Durga deve achar para si mesmo uma nova hospedeira. E
Devi? Um dia ela é uma Deusa, no outro ela é uma mulher com sérios
problemas de personalidade. Ou o que eu gosto de chamar, uma casa que
gira!"
"Você é um tipo de cara fodido, Ray."

"Eu sei. Mas o que eu posso fazer? Ele tende para o mau."

"Como iremos ver Devi?"

"Nós começaremos pela Coréia..."

"Coréia!"

"...para ver uma Deusa do Nepal que...por quê ela está na Coréia mesmo?"

"Ela é uma modelo. Vicky a contratou pela mesma campanha que K. está
fazendo. Por isso iremos a Coréia. Você pode surpreênde-la. Mulheres
amam essa merda. Sobrecarrega seus cérebros em um nível tão alto, que
elas só conseguem pensar com suas bucetas."

"Por mais tentador que possa ser colocar K. numa brincadeira de sexo com
uma zumbi, eu exatamente não tenho fundos internacionais para essa
viagens."

"Ninguém paga pela viagem. Você pode voar de graça."

"Não, você voa de graça. Você é um fotógrafo. Traficantes pagam o preço


total."

"Você vai como um courier. Há um monte de lugares no centro que iriam te


contratar. Você acha alguém que precisa entregar alguma coisa na Coréia, e
eles pagam a viagem."

"A courier? Não me parece exatamente um cargo muito promissor."

Ray ri.
"Você não acabou de dizer que é um traficante?"

"A redistribuição de algumas ervas produzidas é uma coisa. Comércio


internacional, é uma coisa totalmente diferente. Você nunca viu o Expresso
da Meia-noite?"

"Eu falo de legítimos homens de negócios. Um amigo meu faz isso todo o
tempo. Documentos importantes—merdas de contratos. Você leva dez
minutos para despachá-los, o resto da viagem fica de graça."

"Não é mesmo, como, um vôo de dez horas?" eu digo. Minha resistência


começa a amolecer.
"Eu não posso exatamente pedir por mais tempo de trabalho."

"Dez horas? Está mais para vinte."

"Eu preciso voltar na segunda. A menos que eu esteja perdendo alguma


coisa, um dia lá e um dia de volta me deixa com tempo insuficiente lá."

"Você está perdendo algo," ele diz com uma voz estúpida.
"O Fuso-horário internacional."

"Soletrar isso para quem largou o colégio e que nunca foi mais longe que o
Canadá."

"Você precisa voar cruzando esse fuso-horário, o qual, eu não sei


exatamente como, mas que volta ao passado. Você deixa a Coréia às seis
da manhã na segunda, você chegará a Nova Iorque às seis da manhã na
segunda. Talvez até um pouco mais cedo."

"Isso não me parece possível."

"Nem você comer K. Mas veja como aconteceu." Ambos nos viramos para a
pista de dança. K. nos pega olhando e ri de volta, rodando seus olhos para a
entusiasmática interpretação de Mc Hammer do seu parceiro.

Alguns minutos antes da meia noite Roscoe abre as janelas. Eu finalmente


estou em um quarto com balcões, à la Sid e Nancy. O ar frio é soberano,
mas une com a antecipação que crescia através dos milhões de peregrinos
nas ruas. Adeus 1980; os anos 90 terão que ser melhores. K. acha minha
mão e entrelaça com a dela, e quando o relógio atinge o doze, nós nos
envolvemos em um momento muito público de afeto. Alguns minutos depois,
nós retornamos para meu quarto e fizemos algumas outras coisas em
particular.

14

ACONTECE QUE O PRIMEIRO DIA DO ANO FOI DE trabalho, como


normalmente, ou não, o Motorola vibrava o dia inteiro. Todo mundo na cidade
de Nova Iorque estava de ressaca, e cabia a mim brincar de 'Doutor Sinta-se
Bem.' Relutantemente deixo K. na cama e tento me perder pela cidade. Eu
provavelmente terei esquecido toda aventura da proposta se a chance não
houvesse intervindo.

Muitos artistas não dão a mínima para seus "temperamentos criativos," e


provavelmente estão certos. Mas em uma cidade como Nova Iorque, o custo
para viver require que esses famintos artistas sejam verdadeiros prisioneiros:
realmente é preciso ter bolas para se manter já que a maioria dos seus
vizinhos de profissão, geralmente pensam em vender suas calças quando
pegos com alguma dívida. Era isso que eu estava pensando, a propósito, tive
que fazer uma entrega a um escultor de metal no sul de Houston onde não
muito tempo atrás, aquilo ali era uma zona de combate. Talvez a arte possa
realmente mudar o mundo.

Após o encontro, eu passo em uma agência de turismo que parece ter sido
invadida por uma multidão nova iorquina. Uma doninha usando listras
verticais fareja exóticas cidades, que soavam vagamente familiares. Onde
diabos é Machu Picchu? Igreja de Cristo? Eu conheço um vídeo-clipe que
dizia que uma noite em Bangkok pode "fazer um homem durão desmoronar,"
mas isso não quer dizer que eu possa achá-la em um globo. Seoul, Coréia,
fica a três-quartos abaixo da lista, custando $599, bem fora do alcance
financeiro. Mas a placa na janela prometia fotos para passaporte, cartões de
imunização, e comissárias de bordo. Dez minutos, cinco páginas perdidas, e
noventa e nove dólares depois, eu deixo a agência com instruções para
pegar um passaporte e encontrar com um tal de Mr. Yi, nessa sexta às oito
da noite, em frente ao Coréia Aéreos no aeroporto Kennedy. O agente me
avisa para não atrasar.

"Mr. Yi é adepto ao horário."

A noite antes de K. partir, nós fomos a um distante restaurante no distrito


oeste. É um restaurante requintado na Rua Barrow, o tipo de lugar que na
semana passada eu teria zombado sem qualquer piedade, cheio de violinos
e sugestivos trabalhos de arte para servir tarados ricos e apaixonados por
romance manufaturado e originalidade. O invés de zombar, eu me sinto feliz
e sorrindo junto com o resto de retardados enquanto duas taças chegam
antes de termos a chance de ver o menu.

Após o jantar, K. e eu caminhamos de volta ao hotel. Ela entrelaça seus


braços nos meus e deita a cabeça no meu ombro como uma velha amante.
Eu sinto como se estivesse flutuando em uma banheira de endorfina.
Cinicamente menos, eu estou me apaixonando.

"Eu não acredito que estou indo amanhã," ela diz depois, no nosso pós-coito.
"Eu não quero te deixar sozinho."

Eu quero contar a ela tudo: sobre minha viagem surpresa; sobre meus
sentimentos por ela. Mas então ela sobe sobre mim para outra rodada.

"Eu vou apenas deixá-lo exausto antes de ir."

Quando eu acordo na outra manhã, ela já havia ido para o aeroporto. Um


engraçado e sentimental bilhete prometia mais bons tempos quando ela
retornasse. E então meu celular toca, outro número não familiar de Long
Island. Era Danny Carr.

"Bem-vindo de volta, Danny. Como foi a Flórida?"

"Muita neve," Danny responde, claramente sem demonstrar precipitação.


"Muitas tetas falsas. Você sabe quando isso aconteceu? Não que eu esteja
reclamando. Muitas garotas, isso as deixa comíveis, você sabe? Eu preciso
do dobro essa semana."

"Dobro? Eu não sei nem se posso entregar o regular. Você não me avisou
exatamente quando ia voltar."

"Você precisa pensar para frente, cara. Olha, eu te pago o triplo."

"Mesmo se eu pudesse, Danny, eu não tenho esse tipo de dinheiro para


desbancar para você."

"Quadruplo. Me encontre em Bridgehamptom e eu disponibilizarei o que você


precisa."

Eu ligo para Billy e digo que não posso ir trabalhar, usando a condição de
minha mãe como desculpa. Uma hora depois, eu estou no trem para Long
Island, passando Levittown para Hamptons. Eu deixo a estação entrando
num frio molhado e constante, e pego um táxi até o endereço que Danny me
deu.

Quando eu toco a campainha, sou recepcionado por uma distinto idoso que
poderia ser o presidente Bush, mas ele usava algo mais parecido com uma
banana amassada.

"Uopa!" eu digo, sendo encarado pelo olhar de muitas pessoas.

"Ei!" diz o velho. Ele fala com sotaque pesado. Alemão eu acho.
"Você é ele? Você é mais velho do que eu pensava."

"Uh, eu acho que posso ter pego o número da casa errada."

"Vá com calma Hans," diz Danny, que aparece atrás vestindo, o que estou
feliz por ver, um modesto traje de banho.
"Volte para a sauna. Eu te aviso quando o entretenimento chegar."

Hans se vira e desaparece no fundo da casa, mas não tão rápido o suficiente
para salvar meus olhos da confirmação que, sim, seu traje de banho é uma
tanga.

"Malditos alemães," Danny diz.


"Você não acreditaria nas coisas que preciso fazer para mantê-los felizes.
Obrigado por vir todo esse caminho até aqui. Normalmente eu mandaria Rick
fazer, mas o cuzão está com a semana de folga. Você quer alguma bebida
ou um baseado? Eu tenho um Boliviano."

Eu aponto sobre meu ombro.


"O táxi está me esperando."

"Certo, certo, certo, certo," Danny diz. Ele desaparece de volta na casa,
retornando um momento depois com três mil dólares em dinheiro.

O restante da semana é um apagão. Meus imaginários fumantes estão


inalando como chaminés enquanto eu me viro para dar dez pacotes extras
para Danny. Fiz uma viagem de volta para a agência para pegar meu
passaporte. Uma vergonhosa chamada para minha mãe, até seu humor
brilhar consideravelmente quando eu a digo que há uma presença feminina
na minha vida.

Numa sexta à tarde, apenas algumas horas antes do meu vôo para Coréia,
eu consigo o pacote de Danny. Eu carrego minha jaqueta com mais de dois
quilos de erva e pego o ônibus para o centro. Quando eu chego ao escritório
de Danny, o segurança está fora da sua mesa. Sussurrando, eu me
apresento como "Mr. Green" e caminho até o elevador. Quando a porta se
abre novamente, eu dou de cara com dois policiais. Todo instinto que eu
tenho me diz para correr. Mas a simples geometria da caixa do elevador dita
outra coisa. Além do mais, eles estão olhando diretamente para mim.

"Está tudo bem," um deles diz.


"Não há nenhuma bomba ou alguma coisa assim."

Eu manejo algo que espero ter sido um sorriso. Minha alta temperatura
poderia dar ignição aos dois quilos de marijuana na minha jaqueta, fora o
aroma inconfundível, eu certamente, estava sendo enforcado naquele
instante. Definitivamente eu iria para a cadeia.

Eu não estava realmente consciente quando andei pelo corredor, mas de


repente eu estava de frente ao escritório de Rick. Eu ainda não havia
despistado a tempestade quando visualizei diretamente o centro espião: O
escritório de Danny estava inundado com uniformes azuis.

Em contraste com meu show de horror interno, Rick parecia relaxado, talvez
até sonolento, como se estivéssemos assistindo atores filmando um
daqueles episódios do Policiais na Tv. Ele estava prestes a dizer algo mais
quando Danny foi escoltado para dentro do seu escritório, um homem sóbrio
em um casaco cinza o envolveu pelo braço.

Danny olha para mim como se eu não estivesse lá, um gesto que eu
rapidamente percebi estar agradecido.

"Guarde minhas palavras Rick," ele diz para seu assistente.


"Eu vou te foder."

"Você talvez deva guardar um pouco desse romance para seu companheiro
de cela," Rick responde.

Danny contra-diz.
"Qual cela? Você acha que algum colarinho apodrece na prisão? Pior lugar
para tirar férias é um clube country, seu retardado, cara de cu ignorante."

"Eu não teria tanta certeza disso," diz outro homem de casaco, reparando
sua postura e atitude, ele é o homem no comando. Ele segura o vaporizador
de Danny em sua mão.
"Eu já identifiquei pelo menos três tipos de narcóticos Classe A em seu
gabinete lá atrás. Seu colarinho branco irá parecer muito mais sujo para o
juiz. Espero que você tenha um bom advogado Danny."
O homem no comando se vira para um de seus comandados.
"Limpe uma dessas mesas, certo? Junte todas drogas e essas parafernálias.
O jornal irá querer uma foto."
E então ele se vira para mim.
"Quem diabos é você?"

Há inúmeras alternativas para responder essa pergunta, e nenhuma delas


pareciam boas.

"Você conhece esse cara?" ele pergunta a Danny.

"Eu não sei de nada," Danny diz vagamente.


"De agora em diante eu só converso do lado do meu advogado." Ele faz um
gesto de trancar a boca e jogar a chave fora.

"Tire ele daqui," diz o homem no comando, cheirando o ar.


"Santa Maria e José. O andar inteiro está fedendo maconha." Ele retorna
para o escritório de Danny me deixando cara-à-cara com Rick.

"Eu não acho que Danny vai estar disponível para seu encontro," Rick diz.
"Deixe-me acompanhá-lo até o elevador." Ele está prestes a dividir algo.
"Esses alemães que ele insiste em encontrar?" Ele diz assim que estávamos
fora da visão da polícia.
"Trazendo dinheiro do Irã. Malditos comunistas."

Eu resisto em dizer a ele que no Irã reside uma Teocracia.


"Loucura," eu digo ao invés.

"Tanto faz. Hey, eu sei que você era o traficante dele, mas por mais que isso
importe, as drogas eram fracas. Viva e deixe viver, certo? Maldita erva.
Quem ainda fuma essa merda? Agora se você puder me arrumar um pouco
de pó..."

Eu imagino as várias forças da lei ainda peneirando o escritório, totalmente


oblíquas a nossa conversa. "Eu não..."
"...não tenho a menor idéia do que você está falando. De qualquer jeito.
Jogue do seu jeito. Feliz Ano Novo."
"Te vejo por aí, Rick," eu digo, entrando no elevador.

"Ele pega o que vem a ele!"


"Ninguém consegue o que vêm a eles," eu digo enquanto as portas do
elevador se fecham.
"E o que eles conseguem, eles provavelmente não mereciam," eu adiciono,
falando alto, para ninguém.

Eu caminho rapidamente por talvez doze quarteirões, olhando nervosamente


sobre meus ombros, mas não acredito que fui seguido. Eu pulo na frente de
um táxi.

"Kennedy,' eu digo, subindo nele.


Já são quase seis horas, duas horas até meu encontro com o Senhor Yi.
"Quanto tempo você acha que leva até chegar lá?"

O motorista, um cara esquisito com um nome impronunciável, me examina


por trás de seus óculos.
"Depende do tráfico," ele diz, quase batendo em um carro estacionado. Ele
solta uma série do que deveria ser profanidades em uma língua distante,
algo do Leste Europeu.

"Você está bem?" eu pergunto.

Ele grune.
"Merda ao quadrado."

"Apenas nos deixe lá em um único pedaço."

"Você não gosta, você ache outro táxi," ele diz, virando seu rosto para mim.

"Você pode manter seus olhos na—" Tarde demais.

Eu escuto um barulho de freio enquanto éramos jogados até um carro


parado. O motorista vira o volante na direção contrária, compensando o
suficiente para não batermos em um carro a frente na próxima pista. Fui
jogado para frente, então para o lado assim que o taxista virou o volante para
o outro lado, fazendo que o carro rodasse no meio da pista. Nós batemos em
mais dois carros antes de paramos, em direção contrária ao tráfico. alguns
outros carros colidiram ao nosso redor.
Sentamos por um minuto em silêncio.
"Eu vou procurar aquele outro táxi agora," eu digo a ele, pulando
rapidamente do assento de trás para a segurança da calçada. O tráfico na
Primeira Avenida tinha virado uma completa bagunça.

"O culpado!" ele grita depois de mim, subindo em cima do capô do táxi
parecendo um policial fora de si.

Eu desvio dele como um pássaro e me dirijo a um beco escuro. Corro dois


longos quarteirões até a próxima avenida e paro outro táxi.

"Kennedy," repito ao meu novo motorista, um cara do Paquistão usando um


turbante, que ao menos não parecia perigosamente cansado.

"Você quer que pegamos o túnel ou a ponte?"

"Qual é mais rápido?"

Ele se aborrece.
"Isso não cabe a mim decidir."

"Qual delas na maioria das vezes é mais rápido?"

"Às vezes a ponte, outras o túnel."

"Ok, o túnel."

"Eu acho, que talvez a ponte seja mais rápido."

"Tudo bem," eu digo.


"A ponte."

O táxi chega no Terminal dez minutos depois do tempo que deveria me


encontrar com o senhor Yi.

"Nós deveríamos ter pego o túnel," diz o taxista.


"Você nunca sabe, entende o que quero dizer, cara?"

"Quanto?"

"Quarenta e dois dólares."


Eu jogo três notas de vinte para o taxista.

"Você tem trocado?"

Quando eu balanço a cabeça em sinal de não, ele suspira. Ele procura


dentro de seus bolsos.
"Eu espero que você não esteja com pressa."

"Bem jogado," digo a ele.


Eu pulo do táxi deixando para ele aproximadamente 50% de gorjeta.

"Deus te abençoe!" ele grita.

Como prometido, o pontual senhor Yi não pode mais ser encontrado.

"Buuuuuuucetaaaa!" eu grito para ninguém em particular.

"Olha a língua," alerta um policial transitando.

Pelo tempo que eu bipei o senhor Yi do endereço público e liguei para a


agência—ambos sem sorte—o vôo demoraria menos que uma hora. Eu
desmorono no chão perto do caixa. Você a verá novamente em duas
semanas. Eu digo a mim mesmo enquanto coloco minhas mãos sobre minha
cabeça.

"Você está bem?" pergunta uma mulher por de trás do caixa. Ela é Coreana,
aproximadamente com uma idade média, vestida com o uniforme da
empresa aérea que eu supostamente deveria estar voando.

"Minha mãe está morrendo," eu digo, surpreso comigo mesmo.


De repente, nós dois estávamos chorando.

"E você perdeu seu vôo?" ela pergunta, segurando uma caixinha de lenço.

"Eu supostamente deveria encontrar o cara com minha passagem aqui, mas
meu táxi sofreu um acidente e cheguei atrasado." Eu aceito um lenço e seco
meus olhos. Meu cérebro não está mais controlando minha língua.

"Ela está em um hospital em Seoul...," me escuto dizendo.

Eu pouparei vocês do restante da performance; mas digo que foi


desesperado, vergonhoso, e no final, efetivo.

"Há uma coisa que eu posso fazer para você," ela diz.
"O avião não está cheio. Eu posso vender a você um assento."
"Eu não tenho muito dinheiro."

"Eu posso tirar uma taxa aqui, outra ali, claro, devido a situação da sua mãe.
Você pode pagar trezentos e cinquenta dólares?"

Eu aceno que sim—ainda tenho mil dólares sobrando do meu acordo com
Danny. Após checar meu passaporte, ela rabisca uma série de números e
letras na minha passagem.

"Quando você desejaria voltar?"

"Segunda de manhã?"

"Tempo muito curto!" ela diz, pausando para me olhar.


Eu balanço a cabeça a olhando com olhos parecidos a de filhotinhos. Ela
começa a chorar novamente.
"Há mais uma coisa," ela adiciona, lágrimas correm sobre suas bochechas.
"Eu somente posso te dar uma passagem para a primeira classe."

Um minuto depois eu estava correndo pelo aeroporto igual O. J. Simpson


naquele comercial da Hertz, chegando no portão quase na hora de fechar.
Eu mostro minha passagem a aeromoça, que me joga em um assento tão
grande que não caberia no meu apartamento.

"Coquetel?" ela pergunta.

E então começamos a voar. Estávamos no ar aproximadamente uma hora


quando uma velha senhora sentada próxima a mim me oferece um grande
sorriso.

"Você não ama essas viagens internacionais?" ela diz.


"Tão excitante. Até mesmo o ar no avião tem um cheiro diferente. Ele me
lembra o meu jardim."

Eu dou uma fungada no ar. E imediatamente me veio que o que ela estava
cheirando eram os dois quilos de marijuana que ainda carregava em meus
bolsos. Peço licença para ir ao banheiro, onde eu jogo dois mil dólares
pesados em drogas pelo vaso.

15

"ONDE ESTÁ SUA BAGAGEM?" PERGUNTA O Coreano vestido de oficial


com uma cara de poucos amigos.

"Sem bagagem," eu respondo, levando o rabugento levantar uma


sobrancelha.
"Eu estou aqui somente no fim de semana. Para ver minha namorada."

"Ah, namorada," ele diz, carimbando meu passaporte.


"Ela deve ser uma ótima namorada para você viajar todo esse caminho."

"Ela é a melhor," eu olho para o relógio atrás dele, que demonstrava a hora
local de 15 horas.

O rabugento devolve meu passaporte e acena para um soldado que está


parado entre nós e a saída. "Soldado" não é a palavra certa para descrever
uma criança com cabelos ondulados, uma pequena camada de pele
suavemente queimada e quem, apesar da potente metralhadora presa em
seu pescoço, me lembra o ursinho Teddy. Ele sorri e gesticula para mim com
sua arma, indicando que estava tudo bem para passar. A Coréia do Sul pode
ser o mais adorável país da Terra.

Diferente de Nova Iorque, o metro de Seoul liga diretamente ao aeroporto,


fazendo disso uma escolha óbvia para um viajante duro como eu
realmente—eu tenho apenas algumas centenas de dólares restando, e
parece que vão ser os últimos devido ao bruto final do meu relacionamento
com Danny Carr.

Então eu fiquei desapontado em descobrir, estudando o mapa na parede,


que nenhuma das paradas levavam até o "Four Seasons," o hotel de K.e o
único ponto de referência que eu me incomodei de trazer comigo. Mais uma
coisa para me lembrar a próxima vez que for evitar a polícia e passar um fim
de semana com alguma mulher.

Eu deixo o terminal para uma tarde sem sol, onde sinto como se estivesse
dez graus mais frios que eu havia deixado para trás. A chuva é inevitável.
Por sorte, o táxi estava aonde eu esperava que ele estivesse, de fora um
homem com um casaco preto me escoltou até um carro esperando. Mais a
frente chegamos a algo parecido uma pista de pouso, branca, brilhante e
limpa, uma miniatura de Manhattan como nos Jetsons.
Após quarenta minutos, nós paramos em um semi-círcular caminho em
frente ao Four Seasons. O motorista aponta para o taxímetro, que havia
acabado de quebrar, $11,000. Eu esfrego meus olhos para ter certeza de que
estava lendo o taxímetro corretamente. Eu seguro o retrato de Andrew
Jackson.

"Hothyel," diz o taxista.


Eu estou salvo quando um esperto chofer abre a porta do táxi para mim.

"Bem-vindo ao Four Seasons," ele diz em inglês perfeito.


"O consulado ficará feliz em trocar seu dinheiro americano para um coreano.
Eu irei falar ao seu motorista para desligar o taxímetro enquanto espera.
Você deveria saber que na Coréia, não é costume dar gorjeta ao motorista."

As portas do hotel se parecem com cortinas, expondo um internacional


elenco de beleza e saúde. Quando eu chego ao salão principal do
consulado, eu acho Ray. Ele está sentado em um sofá, parecendo
completamente em casa, sua atenção está em uma mulher de cabelo preto.
Ele se quer me repara quando eu passo por ele até a mesa dos atendentes.
O agradável e eficiente consulado magicamente transformou $100
americanos em $70,000 Won. Eu já estava a caminho para pagar o táxi
quando Ray me interceptou no caminho.

"Aí está ele!" ele grita, capturando-me em um abraço de urso.


"Cara, nós temos que conversar!"

Eu me desengancho dele e coloco uma mão sobre seu ombro.


"Bom te ver, também. Só me espera aqui um minuto para eu resolver uma
coisa com o táxi."

De fora, o taxista aceita a exata quantia medida com o mesmo sorriso que
ele ficou durante toda viagem. Eu dou uma nota de $5,000 para o ajudante
do hotel—os zeros extras me fizeram sentir como Donald Trump. Eu entro
novamente no hotel, desta vez mais devagar. Ray está esperando por mim,
com suas mãos ao redor da mulher de cabelo preto. Decido naquela hora
que as trinta e duas perfeições "pele como um sorvete delicioso" e "as
pernas de uma Rockstar" pertenciam realmente a ela.

"Você deve ser Devi," eu digo, estendendo minha mão. Ela me dá a dela e a
estende como se quisesse que fosse beijada, é o que eu faço.
"Primeira vez que beijo uma Deusa."

Devi solta um sorriso perfeito e me surpreende com um elegante sotaque


Inglês.
"Em meu país, isso é considerado boa sorte."

"Essas são muito boas notícias," eu respondo.


"Eu espero estar com sorte."

"Vocês americanos são mau meninos," ela diz, não com cara de
desaprovação.
"Ray e eu estávamos prestes a tomar um coquetel no bar. Quer se juntar a
nós?"

"Eu adoraria, exceto que eu estarei aqui só até Segunda e eu realmente


adoraria ver a mulher que me fez vir até aqui."

Devi coça sua cabeça intrigada.


"Você vai embora amanhã?"

"Não, Segunda."

"Mas hoje é Domingo."

"O que acontece com o fuso-horário internacional?" eu pergunto a Ray.

Ray olha para mim com vergonha.


"Só funciona no caminho para casa. Acontece que você perde um dia vindo
aqui. Minha falha. Escuta, cara—"

"Só um minuto...Eu só tenho, o que, dezoito horas aqui? Agora eu realmente


preciso achar K."

Ray concorda e parece que iria dizer algo mais, mas Devi interrompe ele.
"K.?" Ela está na nossa suíte." ela diz. A mudança no seu sorriso é fracional,
mas transforma sua mensagem de benevolência para algo mais misterioso.
Eu posso ver o porque dela ter sido a provável Deusa.

"Suíte," eu digo, balançando-a para para falar.


"Eu gosto desse som. Qual é o número do quarto?"

"Claramente você não vai interromper eles."

"Eles? Eles quem?"

"Oh, é quase mágico," Devi diz, agora feliz como uma adolescente.
"Seu namorado a surpreendeu. Ele debulhou pétalas de rosas por todo o
corredor..."

"Seu namorado? K. não tem um...Nate está aqui?"

Ray esfrega seu rosto.


"Eu estava tentando falar para desde que você chegou aqui."

"Nate está aqui, na maldita Coréia? Debulhando pétalas nessa merda de


corredor?"

"Ele estava fora do quarto quando ela chegou."


Devi continua, ainda divinamente indiferente ou somente oblíqua ao meu
sofrimento mortal.
"Com sua guitarra. Ele tem a voz de um anjo. E o colar..."

"Um colar?" Eu me viro para Ray. Ele olha para mim com uma simpática
empatia, como se ele acabasse de ter visto alguém chutar minhas bolas.

"Diamantes," diz Devi.

"Diamantes? No plural?" Minha cabeça começava a rodar. Eu sentia vontade


de vomitar.

"Diamantes da Tiffany," ela completa.


"Com aquela coisinha azul e tudo!"

"Onde eles estão agora?" Um olhar para Devi, e eu posso dizer que me fiz
parecer com mais raiva do que sentia.
"O número do quarto? eu pergunto, me fazendo parecer ainda com mais
raiva.

Os olhos de Devi pareciam mais nervosos perante a Ray.


"Você não quer fazer isso." Ray diz, colocando uma mão afável sobre meu
ombro. Eu dou um tapa nela.

"Qual. A porra. Do quarto."

"Eu acho que já falei muito," diz Devi, claramente assustada com a visão dos
meus olhos.

Eu foco na pequena bolsa de mão que ela agora prende em seu peito.
Grilado o suficiente para roubá-la de uma Deusa. Eu puxo a bolsa da mão
dela. Devi se assusta. Ray estava pausado, pensando em me abraçar ou me
socar no queixo. Eu vasculho rapidamente na bolsa, minha mão emerge com
a sala do quarto.

"Quarto 24021," eu leio alto o que está escrito no plástico.

Devolvendo a chave e a bolsa a ela, eu vazo para o elevador. Ou o mais


perto que eu consegui chegar, antes que um lutador de sumô vestido de
segurança segura uma arma para atrapalhar meu caminho e pergunta sobre
a chave do meu quarto. Eu procuro em minha jaqueta pela chave. O cara do
sumô claramente já havia visto isso antes.

"Hóspedes somente," ele diz.

"Seja como você quer," eu ando de volta a mesa principal.


"Eu quero um quarto," eu digo a atendente.

"Me desculpe," ela diz gentilmente.


"Todos com hóspedes."

"Algum quarto."

"Me desculpe mesmo, talvez eu possa recomendar outro hotel?"

"Escute," eu digo.
"Eu viajei quase sete mil quilômetros para ver um de seus hóspedes."

"Você é bem-vindo para usar o telefone do hotel," ela diz, seus olhos estão
nervosos e vidrados no cara do sumô. Ele vai embora. Eu decido aceitar o
convite dela e usar o telefone. Eu disco o número do quarto de K. Após
alguns toques alguém atende e—antes que algum de nós pudesse falar uma
palavra—a chamada cai. Eu disco novamente. Dessa vez toca quatro vezes
antes deu ouvir a voz de Nate na linha.

"Seja lá quem for, vá se foder!!" ele grita. Clique.

Eu disco novamente. Desta vez ninguém atende. Eu imagino Nate se


deliciando com K. enquanto ele faz alguns arranjos de guitarra, e pula
novamente na cama para deliciar com ela mais um pouco. Minha cabeça
está prestes a explodir.

"Você está bem, cara?" Ray pergunta.


"O quê você acha?"

"É, deve estar toda fodida, eu sei. Mas eu tentei avisar você naquela noite.
Rock Stars são como mestres vudus. Digo, veja Billy Joel. Ele é casado com
Chirstie Brinkley. Christie Brinkley? Você está zuando?"

"Valey, Ray. Eu me sinto muito melhor agora."

"Você precisa de uma bebida."

"Seu convite ainda está de pé?"

"Para mim sim, mas Devi...eu não sei se você fez uma boa impressão."
Eu espiono a ex-Deusa do outro lado da sala. Ela me encara de volta com
uma fúria sombria. Eu rapidamente desvio o olhar.
"Aliás," Ray continua.
"Nós estávamos prestes a fazer toda aquela merda sexual e tal."

"Sorte sua," eu digo, realmente desejando isso. Eu olho para o relógio de


meu celular.
"Eu acho que posso sentir pena de mim mesmo pelas próximas dezessete
horas.

"Dr. Ray tem outra idéia. Há um lugar rua abaixo. Boate."

"Boate?"

"Não derrube a idéia até você ter tentado, cara. Boates—esse é um fato
certo—são cheias de vadias excitadas. Vadias excitadas de férias não ficam
em seu julgamento normal. Um cara bonitão como você vai se dar bem com
o mínimo de esforço, digo esforço zero, a menos que você tenha o sovaco
raspado e alguma privacidade."

Minha raiva está dissipando, deixando espaço para um sono depravado.


"Eu não sei sobre as vadias, mas eu definitivamente estou para um pró-
cochilo."

"Ainda está," Ray diz, parecendo aliviado.


"Um pouco de olhos fechados, e então você está comendo uma vadia. Eu
recomendo as Australianas. Ache uma com uma amiga e coma as duas. Vá
beber alguns Scotchs."

Eu dou um tapa no ombro de Ray e deixo o hotel. O chofer aparece


imediatamente.

"Devo chamar um táxi?

Eu olho para o céu e vejo nuvens de chuva se formando e um escuro se


aproximando. Um perfeito par para meu humor.
"Obrigado, mas vou andando."

Eu vejo na rua um beco muito parecido com os de Nova Iorque, somente


com algumas partes andáveis. Sigo o caminho que Ray me indicou para a
Boate, viro à direita para a primeira luz e o primeiro letreiro, um quarteirão
depois, uma vizinhança muito mais parecida com um subúrbio. Um muito
iluminado letreiro escrito 7-Sete-tipo que está ancorado em um edifício
tendente a cair.

O local em si, é ocupado por uma dúzia de homens Coreanos, muitos


vestidos em ternos de negócios, os quais estão formados em três distintos
círculos. Cada círculo possui uma garrafa da sua próprio bebida local,
passada com uma alegre camaradagem para um homem sorridente à outro.
Não há uma mulher à vista, eu noto. Isso explica os sorrisos.

16

"MINHA MULHER ESTÁ EM MANCHESTER, MINHA AMAda em Hong


Kong, e minha amante em Jakarta," diz o Britânico.
"Você não tem uma licença para matar, tem?" Eu pergunto de forma
sarcástica.

O britânico grune, sua cabeça se aproxima da minha.


"Não, mas uma vez eu vi um homem morrer em meus braços. O que você
diz sobre isso?"

"Eu acho que você é igualmente cheio de merda assim como o homem mais
interessante que eu já tive conhecido," eu respondo.
"Mas ainda assim, eu acho que você ficou com medo um pouco demais."

"Impossível!" ele grita, levantando seu pé.


"Eu estou bebendo nada mais que essa coisa laranja toda noite. Vamos
empurrar nosso amigo para fora da dança antes que todos nós sejamos
levados a cortar nossos pulsos."

Eu conheci o britânico, junto com um poliglota e a mulher Americana que


chamava a si mesmo de Janie, no andar superior do local que Ray
recomendou—dois andares suspensos com uma estrutura de madeira e uma
porta frontal como uma casa da árvore, escondidos no jardim entre o final de
um restaurante e uma floricultura. O tipo de lugar que você pode imaginar
nos guias como "uma não descoberta gema." Eu não tenho um guia, e
minha descoberta da Superioridade é severamente interrompida devido a
chuva que começa logo após eu ir embora do círculo. Misturada com a
escuridão, visibilidade é um problema sério. Eu perdi a entrada de um hotel
três vezes antes de entrar, ensopado e miserável.

O quarto dificilmente pode ser chamado de quarto após ter ido ao Four
Seasons—um pequeno, cubículo de madeira, muito em comum com uma
cabana. Eu me dirijo para um dos quartos mais baratos, onde nele há duas
camas velhas. Jogo todas minhas tralhas da viagem em um canto, e então
me deito na cama mais distante da porta. O sono vem rapidamente, mas não
dura muito: Duas horas depois, eu acordo tremendo. Ou a tremedeira me
acorda. Eu abro os olhos para ver Ray. Ele cheira a álcool.

"Você está dormindo, cara? ele pergunta.

"Estava. O que você está fazendo aqui? Não deveria estar transando com a
Deusa agora? Fazendo toda aquela merda e tal?"

"É, aquela lá meio que fudeu com tudo."

"O que aconteceu com tirar vantagem de sua baixa-estima?"


"Hah! Acontece que parte do teste em se tornar uma Deusa, era ficar uma
noite sozinha com uma série de cabeça de animais. Sem chorar. Ela tem
malditos três anos a mais. A puta é uma problema-natural."
Ray se balança para causar efeito.
"Isso, fora que você fica louco sem fazer nenhum favor."

"Sinto muito por isso. Eu acho que isso nos deixa quites, senhor 'fuso-horário
internacional' fodido."

"Você deveria me agradecer. Imagina se você tivesse que ficar todo o fim de
semana aqui. Vamos embora beber. É por minha conta, filho da puta."

"E quanto a nós?" pergunta uma voz britânica. Nós vimos o homem
Britânico, sentado em um estilo indiano em um banquinho do outro lado do
quarto.

"Eu gostaria de ficar bêbado." aparece uma voz atrás de mim. Ray pula da
cama, descobrindo a cabeça do poliglota debaixo do lençol.

"Jesus Cristo," Ray fala.


"De onde diabos vocês vieram?"

"Utah," responde o poliglota.


"Mas essa é uma longa estória. Vamos beber."

Ambos estavam claramente acostumados em viver na estrada. Cada um


parecia ter trinta anos, com suas barbas por fazer e roupas bi-colores hippies
de alguma indeterminada nacionalidade. Nenhum havia tomado banho por
muitos dias.

"Onde nós iremos beber?" diz Janie, uma grandona Americana com cintura
fina e óculos fashions. Ela está segurando um envelope.

"Isso é o que eu acho que é?" pergunta o Britânico, referindo ao envelope.


"Por acaso nosso barco para São Francisco chegou?"

"Meu barco," Janie o corrige.


"Eu sei que você vai tentar e fazer disso como seu problema pessoal, mas
esse é meu."

"O que eu você vai fazer com essa quantidade de ácido?" pergunta o
poliglota.
"O que eu quiser," Janie diz.

"Deixe a gente experimentar, sua doente," diz o Britânico, puxando sua


perna.

Janie releva.
"Cada um de vocês pode pegar um tablete."

Do envelope ela puxa uma carta grande enrolada em pequenas caixas, cada
uma pintada com uma estrela azul. E, eu imagino, um amplo serviço de LSD.
O britânico e o poliglota aceitam seus pequenos tabletes, colocando-os em
suas línguas. Janie se vira para Ray e sorri.

"Se importa em unir conosco?"

"Eu? Não," Ray diz.


"Eu não quero ser visto todo fodido e feio quando tiver quarenta."

"Isso é um mito urbano," ela diz, e se vira para mim.


"Enquanto a você? Você parece que poderia usar um pouco."

"Muito agradecido," eu digo.


"Mas eu prefiro manter meus pés no chão por agora. Eu acredito que há uma
conversa sobre beber?

"Nós iríamos levá-los ao Suzie," sugere o Britânico.


"Que tal, colegas? Podemos quebrar a casa das putas?"

A palavra "puta" parecia demolir qualquer objeção que Ray poderia ter.
Alguns minutos depois, nós cinco estávamos em um táxi indo para Itaewon,
a versão de Seoul para um distrito vermelho. O poliglota—cujo nome
verdadeiro é Gene—usa a pequena viagem para explicar como ele chegou a
esse novo estado da vida. Ele estava em uma missão religiosa na Indonésia,
com sua esposa e recém-nascido, quando ele presenciou um "Acordar."

O Britânico começa a tossir teatricamente.


"Mais como uma queda na moral construída."

"Eu apenas me dei conta que estava vivendo uma vida que eu supostamente
não deveria estar vivendo," responde Gene.
"Porque você é um desertor," diz o Britânico.

"Eu não sou um," Gene diz, olhando diretamente para Ray.
"Além do mais esse aqui possui toda essa merda que eu sempre quis."

"Porque você é uma porra de um viado," o Britânico diz, enquanto fala o


óbvio.

O poliglota sorri com alguma tolerância praticada.


"Eu realmente não sou gay. A propósito, eu tenho viajado dois anos desde
então. Eu já vi muito desse mundo."

"Enquanto sua família?" eu pergunto.

"Eu tentei manter contato no começo. Mas depois de um tempo eles não
estavam tão interessados em ouvir notícias minhas. Eu acho que todos
seguimos em frente."

Quando o táxi chegou no Suzie, ninguém exceto Ray podia achar a carteira.
A minha aparentemente foi roubada enquanto eu dormia na cabana. Eu
fiquei um pouco consolado devido ao fato de que o ladrão ignorou meu
passaporte e a passagem de volta.

"A recepção deveria ter te avisado," Janie diz.


"Esse é o quinto ou sexto assalto na semana."

Ray contrariado paga o táxi.


"Ele tem uma desculpa," ele diz, apontando para mim.
"E quanto ao resto de vocês?"

O Britânico levanta sua mão em sinal de rendição.


"O que podemos dizer? Nós somos apenas viajantes pobres. Mas se você
busca por recompensa," ele diz, apontando para o poliglota, "Tenho certeza
que ele irá abençoá-lo com alguma benção brilhante."

"Ha!" diz o poliglota com uma risada.


"Ele está brincando. Eu realmente não vou, você sabe, fazer o que ele diz
que eu faço. Isso seria um pecado."
As pernas do poliglota estão tremendo: O ácido está chutando ele.

"Apenas pague a corrida," Janie diz.


"E pare de fingir que você não tem toda essa grana no bolso."
Algo me diz que Ray e Janie não são destinados a serem bons
companheiros.

Dentro, Suzie parecia uma concessionária de carros. Grandes janelas de


vidro proviam uma visão natural do tráfico de pedestres e uma vista colorida
da vizinhança para os clientes. A maioria do espaço interior é devota a uma
pista de dança, onde uma dúzia de belas Coreanas deslizavam em seus
vestidos curtos em seus parceiros machos—a clientela, eu assumo—
rebolando inacreditavelmente ao som de "New Kids on the Block". A cena
parece mais com uma dança USO(Exército Americano) que um bordel: Uma
larga porcentagem de homens vestidos com uniformes militares Americanos.

"Yongsan Garrison está a leste daqui," Janie explica.


"Trinta mil sangues-vermelhos, estão fudendo e chutando o exército
Americano."

"Como a Córeia está lidando com isso?" eu pergunto.

Janie responde.
"Meu palpite é que eles provavelmente estão odiando isso. Mas não Suzie.
Sem eles, ela estaria fora dos negócios. Homens Coreanos possuem rédeas
curtas. Eles esperam que suas mulheres sejam boas 'hausfraüs', vestidas
todas como pin-ups e que fiquem em casa na cozinha. Se eles virem alguma
mulher Coreana agindo desse jeito, provavelmente farão alguma merda."

Eu olho novamente para as dançarinas em busca de algum comportamento


que poderia enlouquecer os habitantes locais—nudez pública, bucetas
fortificadas, bolas de Ping-Pong, etc.—mas eu não vejo muito mais do que
um ocasional e sugestivo sorriso. Para os forasteiros—Ray, em particular—a
dança relativa não funciona muito como seu país natal. Se a menção de
prostitutas capturou o interesse de Ray, o sinal de potenciais parceiras
sexuais de sotaque asiático, esbugalharam seus olhos.

"Como isso funciona?" ele pergunta, pulando de lado-a-lado.

"A Senhora Suzie irá cuidar de nós," diz o Britânico.

A Senhora Suzie parece uma velha versão de uma de suas empregadas,


entretanto falando de mulheres asiáticas eu nunca posso dizer—meu melhor
palpite é que sua idade está em torno de trinta e setenta. Ela cumprimenta o
Britânico com uma confortável familiaridade.

"Bem-vindo de volta, Senhor Christopher. Você trouxe amigos hoje à noite."


Suzie nos guia para uma sala no fundo.
"Eu enviarei alguém com suas bebidas."
Ela pausa por um momento, cuidadosamente estudando cada um de nossos
rostos.

Ela disfarça graciosamente e muda sua atenção para outro grupo, soldados
Americanos que pareciam prestes a acabar com o mundo àquela noite.

"Ela não deveria ter perguntando o que queríamos primeiro?" Eu imagino em


voz alta.

"Só há duas bebidas no menu," diz o poliglota Gene.


"Amarelo e laranja."

Gene está claramente viajando—suas pupilas, estão totalmente opostas as


de Janie e o Britânico, horizontais e brilhantes—mas alguns minutos depois,
uma das beldades Coreanas presenteou a turma com duas garrafas
plásticas de soda, recicladas e cheias com o que parecia ser um radioativo
Sprite. Amarelo e laranja.

"Puro álcool," diz Janie.


"Tome cuidado. Essa coisa irá te atingir como um muro de tijolos."

Ray zomba dela. Ele pega um dos pequenos copos que acompanham a
garrafa, enche com a bebida amarela, e torna tudo. E então ele se serve com
outra.

Janie se afasta.
"Ohhh!"

Ray ignora ela


"O que agora?" ele pergunta.

"Devíamos esperar a Senhora Suzie," responde o Britânico.


"Mas não se preocupe, você está em boas mãos."

Quando Suzie reaparece, ela está de mão dadas com uma dançarina que ela
escolheu, parecia, especialmente para Ray.

"Essa é Sunny," ela diz para ele.


"Você parece que dança bem. Ela é muito boa também."
Sunny está coberta com uma uma camada de luz enquanto dança, sorrindo
para Ray, não sexualmente mas como uma inocente criança sendo
apresentada para um adulto. O efeito em Ray é imediato. Ele torna o
segundo copo e no mesmo movimento pula com um pé e agarra a mão de
Sunny.

"Você gosta de Sunny?" pergunta a Senhora Suzie.

"Eu gosto de Sunny," Ray responde, já levando-a para a pista de dança.


"Dias ensolarados estão aqui novamente." (Sunny significa dia ensolarado
em inglês.)

"Quanto a você, Senhor Christopher? Mi-Hi sempre pergunta sobre você."

"Isso depende," o Britânico diz, chamando Ray.


"Senhor dinheiro! Você vai pagar nossas danças também?"

Ray continua na pista de dança sem olhar para trás, usando sua mão que
não estava atracada em Sunny para mostrar ao Britânico seu dedo do meio.

"Eu vou entender isso como um não," diz o Britânico.

"Próxima vez," diz a Senhora Suzie.

"Exceto pelo cara-trágico!" Ray grita da pista de dança.


"Ele pode ter o que quiser!"

Senhora Suzie vira para mim.


"Ele quer dizer você?

"Não, não mesmo."

"Que tipo de garota você gosta?"

"Agora? Eu não estou gostando de nenhuma garota preferencialmente."

Ela começa a me examinar com um olhar profissional.


"Não. Você gosta de mulheres. Apenas as mulheres erradas. Garota errada."

"Impressionante."

"Eu sei," ela diz segurando seu olhar.


"Não se preocupe. Você achará a mulher certa. Talvez você dance comigo
essa noite?"

"Estou lisonjeado," eu digo.


"Na América, o homem que chama a mulher."

"Me chame, então. Vamos. Seu amigo disse que está tudo bem."

"Me pergunte após eu tomar mais um pouco desses," eu digo, levantando


meu copo de amarelo.
Ela pisca para mim e vai para outra mesa.

O Britânico, travado devido a indução-ácida, desperdiçou os próximos vinte


minutos listando os prós e contras em manter uma relação íntima com três
diferentes mulheres em três diferentes países. Parece haver muito mais
contras, e eu digo a ele o porquê.

"Você pode estar certo," ele diz.


"Mas nós somos homens. Qual escolha nós realmente temos?"

Ray retorna para a mesa somente para deixar suas coisas e tornar um pouco
do laranja. O resto do tempo, ele e Sunny são o rei e a rainha de seu baile de
formatura. A música de Steve Winwood na caixa de som está totalmente fora
de contexto, mas isso não impede Ray de fazer sua coisa de 'Febre de
Saturday Night', deslizando Sunny até o chão e a puxando bruscamente até
seus ombros. Os soldados aplaudem. Gene e o Britânico estão tão ocupados
com sua conversa que nem notam; alguma discussão sobre uma
conspiração mundial envolvendo algo chamado de Grupo Bilderberg.

Janie está ocupada também, fuçando nas coisas de Ray.


"O que diabos você está fazendo?" eu pergunto.

Janie pula para trás como se eu a tivesse dado um tapa.


"Só, você sabe, olhando. Me desculpe, eu sou enxerida."

"Você pegou minha carteira?"

"Não."

Eu examino o rosto de Janie por sinais de culpa. Ela me encara de volta com
olhos de LSD, gêmeos rodeados de chacota, fogo e extinção,
sarcasticamente me lembrava dos azuis radioativos de K.
Nós terminamos os amarelos e os laranjas e, depois de um parlamental
debate zombativo sobre os méritos de cada um, pedimos e drenamos outro
laranja. Estávamos verdadeiramente chapados, entretanto para ser honesto,
os três viajantes-do-ácido estavam lidando com a embriaguez muito melhor
que Ray e eu.

Ray finalmente se fixa na mesa, claramente deliciado com Sunny.


"Vamos explodir esse buteco!" ele grita.

Nós levantamos e fomos para um lugar mais calmo enquanto a música


parecia estar parando.
Conversas são abandonadas em meias-sentenças. Alguém fecha as cortinas
pretas nas janelas de vidro.

"O que está havendo?" eu sussurro para Janie.

"Exército," ela sussurra de volta.

"Eu achava que isso aqui era tudo legal."

"Exército Americano. Estão a paisana, ou algo do tipo."

Eu olho sobre a mesa para os soldados, todos quietos mas preparados para
explodirem a qualquer momento em risadas, violência, ou os dois. Uma
nervosa olhada no Motorola me diz que são quatro da manhã: Meu vôo de
volta parte em cinco horas. Eu começo a rezar silenciosamente. Não quero
ser detido. Por favor Deus, me deixe pegar o avião.

A patrulha passa sem nenhum incidente. As cortinas são reabertas e o


sistema de som volta à vida. Nosso momento olhando para a porta resume
bem. Ray dá uma larga quantia de notas para a Senhora Suzie, que ri para
mim enquanto sai da mesa.

"Talvez uma próxima vez," ela diz.


Eu concordo, bêbado demais para dizer algo mais inteligente.

Nós vagamos para fora. A chuva foi embora, mas a rua ainda continua
molhada. O ar parece limpo. As estradas estão claramente vazias, salvo
alguns homens assustados que passavam em suas scooters, sobreviventes
do círculo de bebida que eu testemunhei mais cedo.

Nós movemos como um bando de lobos. Gene e o Britânico são os guias,


descendo cada um rua à baixo emitindo uma energia quase sexual, a menos
para Gene. Ray e Sunny são são os cães Alphas, rei e rainha, ainda
dançando rua à baixo. Ray canta uma serenata de uma velha música que eu
quase reconheço. 'Sunny, thank you for the truth you let me see/Sunny, thank
you for the facts from A to Z...' Sunny, uma estranha para nosso alfabeto,
baseada em atenção. Janie e eu cobríamos a retaguarda. Em algum ponto
ela entrelaça seus braços nos meus. Eu não a interrompo.

Gene quebra seu papel e vai para na frente de Ray e Sunny. Ele tagarela
como um homem louco.
"Eu vou ver vocês dois tran-sando?"

"Porra, claro que não, sua fada endiabrada," Ray responde.

Gene dá umas gargalhadas.


"Talvez eu troque de cama com Chris. Assim vou ficar beeem perto de
vocês."

Eu percebo uma mudança no humor de Ray.

"Se afaste, Gene," eu digo.


"O Senhor dinheiro não quer esfregar cotovelos ou outras partes do seu
corpo em nossa bunda arrependida. Ele está ficando no Four Seasons."

Ray para como se houvesse acabado de levar um soco no estômago.


"Merda."

"Você não esta mais no Four Seasons?"

"Devi me disse para cancelar o quarto. Pois eu estava com ela , certo? Por
quê desperdiçar toda essa grana quando eu poderia estar cuidado de
alguma família em Nepal? Algumas vacas durariam quase dois
invernos...Aquela maldita puta!"

Nós caminhamos por um tempo até que o Britânico finalmente quebrou o


silêncio.
"Bolas," ele diz solenemente para Ray.
"Eu acho que Gene vai ver você comendo a belezura apesar de tudo."

O rosto de Sunny nebulou-se em confusão, sua disposição, pela primeira vez


na noite, foi contrário ao seu nome.
"Quão longe é esse lugar, aliás?"

Ray murmura para ninguém.


"Vou pegar a porra de táxi."
Ele puxa Sunny até uma interseção com uma alta concentração de tráfico.

O Britânico os alcança.
"Eu falo sério, colega, você não vai levá-la até o lugar que estamos."

"Por quê não? Ray exige uma explicação.

"É contra as regras."

Ray alcança a interseção e acena para um táxi.


"Foda-se as regras."
Ele guia Sunny até o carro e olha para mim.
"Vamos cara."

Meus braços ainda estão entrelaçados com os de Janie. Eu poderia ir e


correr até o táxi, mas eu não sou esse tipo de cuzão. Ao invés, eu aparo a
diferença, semi-correndo o mais rápido que as pernas dela permitem. Gene e
o Britânico interpretam minha cavalgada bêbada como um convite. Eles
correm até o táxi, entrando antes de mim.

O motorista encara assustado as seis figuras em seu banco traseiro. Ele está
ainda mais preocupado quando nós dizemos a ele para ir a Casa de
Hóspedes Superior.

"Vocês são loucos," o motorista diz, sua voz claramente cantava sua
experiência.
Ray procura por sua carteira—uma tarefa difícil, devido a confusa puta
Coreana em seu colo.

"Sério," o Britânico diz.


"Deixe Sunny fora do táxi."

Gene, que empurrou o Britânico dentro do carro para ganhar o direito de ficar
próximo a Ray, parecia concordar com ele.
"Ele está certo. Isso é contra as regras. Você deveria deixá-la ir."
Gene segura as bochechas de Sunny em seus dedos e diz diretamente para
seu rosto.
"Você deveria ir."
"Tire suas malditas mãos dela," Ray diz, quando finalmente tirou a carteira
de seu bolso.
"Eu vou quebrar essas merdas de dedos."

"Você deveria deixá-la ir," Gene insiste.

Agora Ray está gritando.


"Cadê meu dinheiro?"
Ele olha para mim. Eu olho para Janie.
"Por quê você está olhando para ela?"

"Não estou."

Janie está olhando pela janela.


"O Senhor dinheiro gastou tudo lá no Suzie," ela diz.

"Ela pode estar certa," eu digo.


"Eu vi você deixando muito dinheiro lá."

"Você deveria deixá-la ir," diz Gene.

"Você deveria calar a porra da sua boca!" Ray diz.


Eu percebo a reflexão do motorista no assento da frente. Obviamente ele
está arrependido de sua decisão em parar para nós.

"Você sequer tem algum dinheiro," Gene diz.


"Você deveria deixá-la ir."

Agora os freios estão gritando. Nós fomos jogados para frente por um
momento. O motorista está gritando para nós.
"Sem dinheiro?!"

Todos os olhos se viram para Ray. Ele abre sua porta e sai com Sunny. O
restante de nós rapidamente o acompanha.

"Eu vou chamar a polícia!" o motorista grita, acelerando o táxi.

Nós estávamos na rua que mesmo meu pequeno tempo que estou em Seoul
me sentia vagamente familiar—verdadeiramente parecido com minhas
caminhadas noturnas. Janie renova seus braços entre os meus.

"Por aqui," ela diz, me puxando.

Eu olho sobre meu ombro para Ray, que estava de mãos dadas com Sunny.
Seus olhos estavamo cobertos com um pânico desenhado.

"O que você me diz, Ray?" Eu me escuto usando uma voz delicada, como
um negociante falando para alguém prestes a pular.

"Você deveria deixá-la ir," repete Gene, dessa vez demais.

Ray mantém-se sobre uma perna, rodando a outra como um um jogo de


'Tetherball' em um poste. Há uma brusca porrada de seu pé voador
conectando-se com a ponte do nariz de Gene. Gene desaba no chão,
segurando seu rosto. Sangue escorre pelos seus dedos.

Ray ainda não acabou.


"Eu disse para você calar essa merda de boca!" ele grita.
"Mas você não podia!"

Ray chuta ele novamente, dessa vez nos rins. A força faz Gene escorregar
pelo chão, alguns metros até uma parede. Ray encurta a distância. Eu solto
Janie e pulo em frente de Ray, enrolando meus braços em sua cintura o
derrubando para o chão. Eu o seguro lá enquanto ele se mexia
desesperadamente, com seu ego inchado para continuar a luta. Nós
continuamos medindo força eu não sei por quanto tempo até seu corpo
desistir, a raiva sucumbia como um espírito sumindo. Gene senta na calçada
segurando seu nariz quebrado. A frente de sua camisa está vermelha.

Homens em ternos de trabalho, trabalhadores de uma Segunda de manhã,


emergiam de um terminal de metrô próximo, passando por Gene como água
corrente. Apesar da sua condição apenas um único homem para—do outro
lado da rua, para conversar com um policial. Os dois olham em nossa
direção.

"Você está bem? eu pergunto a Ray.


"Porque nós realmente precisamos vazar daqui."

Ele ainda fraco, concorda. Eu o levanto e o guio até a entrada do metrô, a


mais óbvia rota para escapar. Nós corremos escadas à baixo para o terminal
até que todos ficassem no passado. Pausamos para recuperar o fôlego.
Sunny por alguma razão misteriosa escolheu nos seguir. Ela gesticula para
as catracas e diz algo em Coreano, apontando para umas máquinas
eletrônicas presas na parede.
Eu me afego a ela como um pai condizente.
"Não tenho dinheiro. Eu sei. Você não entende uma palavra do que eu digo.
Não. Dinheiro."

Sunny se vira e vai embora. Ou eu pensei que tivesse ido, até que ela
começa a conversar com um homem de terno. Ele empurra ela para o lado.
Eu ainda não entendia as palavras e tinha minhas dúvidas se elas foram
pronunciadas diferente, mas ainda sim, implorar parece igual em todo lugar.

Um dos homens que não a ignorou ofereceu uma tradução—vergonha, uma


mulher Coreana escandalosamente envolvida com dois homens brancos
quebrados. Até que um homem bem aparentado, com cabelos brancos e
óculos deu a ela algumas moedas. Sunny abraça o homem que
efusivamente a afasta embaraçado.

Sunny volta da máquina com três ingressos, entregando um para mim e


pressionando outro nas mãos de Ray. Ela o leva pelo braço até a catraca,
colocando seu ingresso na máquina. Ela observa para ter certeza de que
faria o mesmo, então nos segue até o trem. A sorte está do nosso lado: Ray
havia colocado a gente certamente em uma linha de metrô que ligava do
terminal até o aeroporto. Sunny senta ao lado dele, dando um ombro para
sua cabeça cansada.

Chegamos ao aeroporto três horas antes do meu vôo marcado.


"Café da manhã," Ray fala, as primeiras palavras que ele solta depois da
luta.

"Eu achava que você não tinha dinheiro."

Ele puxa um cartão de crédito verde da carteira.


"American Express." Ele ri, ainda fraco.
"Não deixe sua casa sem isso."

O restaurante do aeroporto parecia servir plástico. Tomamos um pouco de


café e sentamos em silêncio. Sunny, usando um óculos de sol usurpado de
Ray no trem, agradecidamente devora uma grande quantidade de
panquecas. Na entrada de passageiros, Ray e Sunny—apesar das roupas de
festa e o óculos de sol, me lembra da pintura, aquela do fazendeiro e sua
esposa.
"Você gostou da viagem?" pergunta o atendente.

"'Gostar' não é a primeira palavra que me vem à mente. Mas certamente foi
interessante."

"Que bom. Sua bagagem?"

"Sem bagagem."

"Sem bagagem?"

"Qual o problema de vocês com essa bagagem? Ninguém pode vir só para
fazer uma visita?"

O atendente afasta de mim por um momento antes de retornar com um


papel.
"Aqui diz que você é um 'comerciante internacional' mas você não carrega
sequer uma pasta?"

Durante tempos felizes, talvez vinte horas atrás, eu escrevi "comerciante


internacional" no meu cartão de declaração. Uma piada.

"Essa foi uma visita social," eu digo, dando uma espiada para o soldado
adolescente segurando uma metralhadora que estava do nosso lado. Ele
parecia muito menos o urso Teddy que a versão de ontem.
"Eu não quero parecer impaciente, mas meu vôo parte agora mesmo."

"Claro," o atendente diz.


"Eu apenas preciso fazer uma ligação primeiro. Ter certeza de que você não
é um traficante."

Seu sorriso não parecia sincero. Por quê eu quis bancar o esperto com essa
merda toda de "comerciante internacional"? E se eles acharem toda a merda
que eu dei descarga no caminho até aqui? Imagens de Coreanos me
revistando e todas formas de torturas passam diante meus olhos. E se eles
me fizerem passar por um detector de mentira, e se perguntarem se sou um
traficante?

O atendente finalmente desliga o telefone e, após uma pausa, carimba meu


passaporte.
"Eu espero que tenha gostado da Coréia."

17

DURANTE O ENTENDIANTE FALATÓRIO das aeromoças–demonstrando


os procedimentos de emergência do avião, eu deito meu assento e levanto o
descanso de braço. Eu estou quase certo de que em um minuto ou dois,
alguns adolescentes Coreanos segurando armas automáticas irão invadir o
avião gritando meu nome. Mas uma vez no ar, eu relaxo e descanso meus
olhos.

Eu durmo por oito horas. Não me sinto renovado, exatamente, mas eu irei
melhorar. Eu tiro um momento para refletir sobre minha situação. Quebrado.
Coração partido. Mãe doente e morrendo. Eu quase posso ouvir os violinos.
Vamos cair na real, eu digo para mim mesmo. Por acaso eu mesmo criei
essa infelicidade? Talvez Tana estava certa sobre o karma. Eu realmente
espero algum favor do universo após vergonhosamente explorar a doença da
minha mãe para conseguir uma passagem de avião? Quando meu plano foi
roubar a mulher de outro cara?

Eu me lembro, durante um dos programas sobre álcool do governo que meu


pai frequentava, ele havia pedido para fazer uma lista das pessoas que ele
havia feito algo errado devido a influência do álcool. É hora de colocar minha
própria casa em ordem. Eu peço para uma das aeromoças uma caneta e
papel.

1. Mãe. Me deu tudo; recompensada tendo o filho fugindo do rancho o mais


cedo possível. Menti para ela sobre o trabalho, aceitando presentes e
admiração sobre falsos pretextos. Ela está doente e morrendo numa cama
de hospital, uma condição que eu explorei para perseguir uma garota por
meio mundo.

2. Tana. Minha melhor amiga, minha irmã de outra mãe—então como eu fui
tão cego pelos sentimentos dela? Resposta: Eu sou um cuzão.

3. Daphne. Claro, ela é doida, mas quanto disso é minha falta? Eu a traí e
menti sobre isso. Provoquei argumentos e coloquei combustível no fogo. Fiz
ela se sentir errada, mesmo quando soube que eu não estava certo. Ainda
roubei a fantasia dela sobre o Hotel Chelsea e a fiz minha. Supostamente
deveria ajudar ela a encontrar seu pai; ao invés fiquei procurando sexo com
super-modelos.

4. K. tentou sabotar seu relacionamento por nenhuma outra razão que meu
próprio libido. Tomei vantagem do término dela e entrei em ação.

5. Nate. Veja #4.

6. Herman. Menti sobre poesia.

7. Zach Shuman. Gerente assistente no Hempstead Golfe e Country Club.


Ainda um viado. Mas eu o demiti. Pior, eu estava feliz em vê-lo demitido. O
que isso diz sobre mim?

8. O moleque na minha formatura que eu esmaguei seu rosto com um


extintor de incêndio enquanto estava viajando devido aos cogumelos. Não
devia ter feito isso. Merda: Eu sequer consigo lembrar seu nome.

EU CONTINUO ESCREVENDO POR ALGUMAS páginas, impressionado


com quantos deslizes eu fui capaz de fazer. O último pareceu ser o mais
chocante.

27. Pai.

PAI. PROVAVELMENTE NÃO HÁ UM mau no mundo que eu não o culpo.


Bem, você nunca vai ganhar um prêmio de "Pai do ano", mas você colocou
uma aura sobre minha cabeça e pagou minha educação, presentes que eu
aceito com um grande “Vá se Foder”. De algum jeito eu te transformei em um
Anti-Cristo, quando na verdade você é simplesmente perdido e estúpido e
confuso e retardado como todo mundo.

Quando o avião chega a Kennedy, eu ligo para Billy—somente, devido a


perda da minha carteira—para dizer a ele que eu estava preso no aeroporto
sem dinheiro ou jeitos para ir até a cidade.

"Eu tenho um pouco para te cobrir," Billy diz.


"Mas você e seus dias pessoais, criança. Estão sendo um verdadeiro
problema."

"Minha falha. Circunstâncias externas."

"Divida comigo palavras de dez-dólares. Eu estarei diretamente até você.


Você comprou muitos negócios extras nessas últimas semanas. Não ache
que ele não notou."

Billy está se referindo a meia-dúzia de personagens que eu inventei a serviço


das necessidades de fumo de Danny Carr, personagens que agora se
aposentaram.

"Você mereceu um pouco de boa vontade. Mas essa boa vontade vai ser
cobrada. E você está perto de ser cobrado."

"Entendido, Billy."

"Bom. Apressa essa porra logo."

"Não há ninguém que poderia me dar uma carona?" Billy desliga o telefone.

Eu penso em ligar para Tana, mas eu não conversei com ela desde aquele
jantar. Há apenas uma opção real. Após uma confusão com a recepcionista
do sistema de ligações, eu consigo falar com meu pai.

"Hey, sou eu," eu digo.


"Preciso de uma carona."

"Você está bem? Onde você está?" Ele quase parece preocupado.

"No aeroporto."

"O que você está fazendo no aeroporto?"

"Eu prefiro não dizer."

Alguns segundos de silêncio passaram.


"Você sabe que eu acabei de chegar no trabalho."

"Que incrível coincidência. Eu acabo de discar esses dígitos, completamente


aleatórios, e te achei no escritório. Qual é, pai. Eu não estaria te ligando a
menos que você não fosse minha última opção."

"Kennedy ou La Guardia?"

"Kennedy. Terminal Internacional. E sem querer parecer não grato, mas se


você conseguir achar em seu coração aqueles cem dólares que você 'pediu
emprestado' de mim, seria uma boa hora."

Ele chega uma hora depois. Eu subo no assento do passageiro.


"Você está bem?" ele pergunta.

"Estou ótimo. Vamos."

Meu pai para me encarando tempo o suficiente para eu visualizá-lo no


espelho. Ele encosta num canto da rua.

"Isso são drogas? Você está usando drogas?"

"Eu não uso drogas."

"Bom." Ele dá um soco no acendedor de cigarros e puxa um de seu bolso.


"Você quer um?"

"Sim, por favor." Eu fumei meu último Camel em algum lugar no Oceano
Pacífico. Meu pai me passou o maço e, quando o acendedor estalou seu
barulho, ele gesticula para eu acender o cigarro primeiro.

"Na verdade, é uma mulher," eu digo.

"Sinto muito ouvir isso."

"Que eu gosto de mulheres?"

"Que você está no caminho para ser um grande cuzão como eu."

"Não se venda por tão pouco," eu digo com um sorriso."


"Você me deixou um grande sapato para usar até alcançá-lo."

"Heh," ele ri brevemente.


"Escute. Sua mãe não está muito bem."

"Eu sei. Eu sei que não tenho sido muito bom em visitas, mas eu tentarei
fazer as coisas melhor agora."

"Agora não vai ser tão longo, é tudo o que eu digo. Nós temos algum destino
real para ir?"

"Estação de trem, assumindo que você tem o meu dinheiro."

"Eu tenho o seu dinheiro. Então onde diabos você estava aliás?"

Eu começo a falar dos fatos, ou tento. A estória tinha acabado de alcançar o


Bordel quando chegamos a estação.

"Acho que você vai ter que terminar ela outro dia," ele diz, me entregando
cem pratas.
"Talvez tomando umas duas cervejas."

"Eu gostaria disso."

"Me desculpe por ser um pau no cu."

"Você não é isso. E eu não fui sempre o melhor filho, também."

"Visite sua mãe," ele grita depois que eu começo a andar.

Eu chego na cidade em tempo para um meio-dia de trabalho, e eu tenho


dinheiro suficiente para retornar a ilha ao anoitecer. Meu pai provou ser um
mestre no entendimento. Minha mãe está pouco consciente quando eu
chego no quarto do hospital, dopada com sérios medicamentos que em
algum outro tempo eu poderia ter furtado. Ela ri quando me vê, mas com
energia pouco suficiente para conversar. Eu fiquei sentado ali por uma hora
quando vejo o Dr. Best passando no corredor. Eu então o intercepto.

"Ela não parece muito bem," eu digo.

"Você vai ter que me lembrar quem você é de novo..." Eu sei.


"Certo!" diz o doutor.
"Eu pensei que já havíamos falado sobre isso."

"Talvez com meu pai."

"Certo! Então não, nada bem. Talvez uma semana ou duas."

"Uma semana ou duas?"

Ele muda seus olhos para uma face que ele provavelmente aprendeu na
escola de medicina no dia que estudou sobre “Como Lidar com Pacientes
Terminais e Suas Famílias”.

"Eu gostaria que pudéssemos fazer mais. Tenho certeza que ela aprecia
você estar aqui. Mesmo que eles não possam responder, como ela, eles
ainda apreciam isso. É o que dizem, de qualquer jeito." Eu percebo pela
primeira vez que ele está sacudindo minha mão.

Eu passo a noite no quarto dela, escutando sua respiração até que eu caio
no sono na cadeira. Eu repito o mesmo ritual no resto da semana, acordando
na cadeira cada manhã, pegando o trem, enchendo e esvaziando a cidade
como o resto das pessoas presas aos seus relógios. Toda noite eu retorno
para meu turno ao lado da cama, assistindo minha mãe dormir perto e mais
perto da linha final.

18

"AO MENOS ELA NÃO SOFREU MUITO TEMPO," Dottie diz,


aparentemente relevando os vinte dois anos que minha mãe foi casada com
meu pai, que parecia sedado e passivo durante o seu funeral como em toda
a vida dela. Não que alguém fosse mostrar muita vida durante a solene e
falta de humor do serviço. O temperamento de meu pai estava longe de ter
havido qualquer relação dele com minha mãe, parecido com alguém que
vivia no velho-oeste. Tana, estava absolutamente quebrada antes, durante e
depois do serviço. Quando o funeral acabou, ela me abraça.

"Sinto muito," ela diz.

"Ande comigo enquanto eu fumo," eu digo.


Por um acordo não dito meu pai e eu evitávamos acender um cigarro em
frente a família da minha mãe, para não lembrá-los do câncer que matou a
única não-fumante.

"Isso é estranho," eu digo quando alcanço umas árvores que ofereciam


alguma privacidade.
"Eu acho que sempre vou vê-la como esse personagem de duas
dimensões—você sabe, minha mãe. Ela viveu toda sua vida dentro de sua
mente que eu nunca dei crédito o suficiente. Que eu nunca saberei. Eu acho
que é verdade o que eles dizem: Todos nós morreremos sozinhos."

"O que diabos está errado com vocês caras?" Tana pergunta.

"Isso depende do que você quer dizer com 'caras'."

"Homens. Vocês todos dizem a mesma merda de sempre. 'O mundo não tem
significado. Todos morreremos sozinhos. Nada significa nada."

"Se nada significasse nada," eu digo, "minha mãe não estaria morta de uma
doença de outra pessoa."

"Meu ponto é que ela não morreu sozinha," Tana diz, encarando os
necrotérios no cemitério.
"Talvez nós estamos todos por aí, flutuando por nós mesmos em um buraco
negro. Mas nós construímos conexões, você sabe? Nós construímos nosso
próprio mundo com as pessoas que amamos. Sua mãe não morreu sozinha.
Ela tinha amigos e sua família, e mesmo quando eles a decepcionaram, ela
sempre sentiu como se tivesse um lar."
Tana desmonta novamente. Eu a abraço.
"Me desculpe," eu sussurro em seu ouvido.

"Eu também," ela responde.


"Mas não vamos foder tudo isso de novo."

Eu seguro Tana bem perto, duas figuras solitárias rodeadas por árvores.

19

ALGUNS DIAS DEPOIS, EU RETORNO PARA O Hotel Chelsea pelo que


seria a última vez. Eu passo por Herman sem ele me notar e corro escada à
cima até meu quarto. As fechaduras foram trocadas.
"Deh, você ah," diz Herman quando eu volto para o salão.

"Ei, parece que tem algum problema com minha chave."

"É, paréce qué vocé tevé algum probléma com o aluguél."

"É, sobre isso..."

"Éu tambéém convérsei com um amigo em Nova Yorqué. Éles nunca


óuviram falar de vocé."

Herman levanta e segura a chave. Exceto que, ao invés de me levar até o


quarto, ele destranca um armário atrás dele. Meu Marlboro e máquina de
escrever estão dentro.

"Obrigado pór ficá com á gente. Mélhor sórte com súa poésia."

Eu carrego minhas coisas até a porta da frente quando Nate a segura para
mim.

"Cara da maconha!" ele grita.


"Onde diabos você estava?"

Eu olho para K. que estava do seu lado. Ela parecia mais interessada em
alguma coisa no chão.

"Você não está deixando a gente, está?"

"Me mudando," eu digo.

"Bem, boa sorte com tudo isso."

K. finalmente conversa.
"Nós devíamos pagar uma bebida."

"Eu não posso, querida," Nate diz.


"Eu disse aos repórteres da Rolling Stone que iria ligar para eles uma hora
atrás. Que horas são aliás?"

"Bom, então eu deveria pagá-lo uma bebida." K. diz.

K. e eu fomos a um restaurante de frente ao hotel. Apenas um mês atrás, foi


o aniversário do nosso relacionamento; agora comemoramos nosso fim.

"O que aconteceu com você?" ela pergunta assim que as bebidas chegam.

"Eu fui para Coréia para te ver."

Seus olhos azuis brincavam com uma emoção não escrita, começando em
confusão, então pulando para culpa, remorso, e tristeza antes de retornar
para o ponto inicial.

"Você foi para Coréia? Por quê você..."

"Nate."

Ela olha novamente para o chão.


"Eu juro para você que não tinha a menor idéia de que ele iria para lá. Ele,
apenas, apareceu."

"Com um monte de flores, eu vi. E jóias." Meus olhos se fixam a um colar de


diamantes brilhando em seu pescoço.

"Isso é minha culpa," ela diz.


"Eu pensei que podia ter te dado a impressão de que Nate e eu...que as
coisas eram muito mais fáceis que antes."

"Você acha?"

"Eu sei, eu me sinto horrível. Nós éramos...você era ótimo. Você é ótimo e
merece muito mais—" Eu levanto a mão para fazê-la parar de falar.

"Primeira coisa, me poupe do discurso de final de namoro. Eu distribuí


muitos desses para saber como você se sente."

"Você não sabe como eu estou me sentindo..."

"Segundo, eu tenho que dizer, eu meio que tive o que merecia."

Ela pausa antes de continuar.


"Eu estava tão confusa. E então quando eu voltei, você tinha ido embora.
Sem bilhetes, nenhuma chamada."

"As coisas têm sido um pouco doidas."

"Sua mãe?" ela pergunta. Eu concordo e deixo isso assim.


K. olha para mim de forma simpática.
"Você deve me odiar."

"Eu não te odeio," eu respondo, pelo menos não quero fazer parecer.
"E quanto ao Nate? Rolling Stone? Ele é o verdadeiro negócio."

"Talvez. Por agora. Quem sabe o que o futuro pode nos trazer?"
Eu posso vê-la abrindo as portas novamente para mim. Me oferecendo uma
dose de esperança.

"Quem sabe?"

Nós nos abraçamos em despedida. Eu pego minha mochila e a máquina de


escrever e caminho por um quarteirão antes de cair em uma rua até a
estação. Eu caminho para estação com uma mão vazia e pego o primeiro
trem até Levittown.

20

EU CONTINUO TRABALHANDO NA ILHA por umas duas semanas, até ser


sumonado pelo Pórtifice no apartamento no Lower East Side. Ele diz algo
sobre o clima econômico, talvez sazonal, e que o negócio está caindo.
Mas há uma cópia do jornal aberta perto dele, uma estória verídica
detalhando o primeiro dia do Estado de Nova Iorque vs. Daniel Carr, e eu sei
a verdadeira razão de estar sendo demitido.
Eu amo o Motorola demais para destruí-lo na escadaria, então eu o entrego
a Billy na saída.

Meu pai e eu nos tornamos bons inquilinos, tentamos nos manter longe um
do caminho do outro, e manter o local relativamente limpo. Nós estamos
muito tristes ou supersticiosos para fumar dentro de casa, então ao invés,
nós tomamos café e fazíamos toda merda de fora da casa, próximo a parte
que ainda continuava queimada graças a aventura com fogo de Daphne.
Eu a visitei alguns dias depois. Ela finalmente deixou seus cabelos
crescerem até seus ombros. Seus olhos, ficaram um pouco encharcados
quando eu disse a ela sobre minha mãe, mas tendo ganho seu brilho
novamente.

Quando meus próprios olhos queimavam como brasas, ela me segurou e


sussurrou em meus ouvidos.
"Tudo vai ficar bem."

Quando eu finalmente juntei meus pedaços, ela me escoltou até a entrada.


"Eles acham que eu estou melhorando," ela disse.
"Por acaso eu estou enganando eles ou o quê?

"Significa que a fase institucional da sua vida está chegando a uma


conclusão?"

"É o episódio dessa semana, de qualquer jeito."

Seu senso de humor voltou: É a velha e boa Daphne. Eu me lembro como é


se apaixonar por ela novamente. Como alguns anos de diferença tem sido
um mistério bom e não revelado. Ela me apresentou os Ramones e Jonathan
Richman e festas que duravam três dias. Ao sexo em lugares semi-públicos.
A idéia do amor e a dor que ele mesmo nos causa. Eu era um nada quando
eu a conheci, um garoto de dezoito anos ingênuo e talvez um pouco feliz por
isso. Eu nunca mais seria essa pessoa. Mas agora, olhando para Daphne, eu
posso ver esse garoto refletindo nos olhos dela.

"Eu talvez possa sair no fim do mês," ela diz.


Eu a abraço me despedindo e a digo para me ligar em casa o mais cedo que
ela saiba quando vai sair.

Alguns dias depois, meu pai sai de casa.


"É Janine," ele diz.
"Ela não dorme na cama de sua mãe. Como se ela fosse pegar câncer na
cama. Totalmente louca, ela."

"As melhores sempre são."

"De qualquer jeito, ela finalmente deixou aquele cuzão que era casado, e nós
estávamos pensando em pegar um apartamento juntos. Na verdade, nós já
arrumamos um."

"Parabéns."

"Você pode ficar aqui o tempo que quiser. Eu não estou planejando vender—
não agora, de qualquer jeito, não enquanto temos algum pouco no tanque.
Talvez você possa contribuir um pouco quando começar a trabalhar
novamente."

"Valeu, pai. Eu sei que é estranho, mas honestamente eu espero que você e
Janine sejam felizes juntos."

"Felizes," ele diz um pouco esnobe.


"Ninguém nunca disse que seríamos felizes."

21

PELAS PRIMEIRAS DUAS SEMANAS após ela retornar do colégio, Tana e


eu conversávamos quase todas as noites. Mas após outras duas semanas,
as ligações envolviam algo mais curto, menos frequente, e decididamente
mais distantes—um efeito causado, eu suspeitava, por um cara chamado
Todd que ela começou a ver.
"Gay," eu perguntei, durante os tempos que nós conseguíamos conversar.

"Ele realmente gosta de garotos na água," Tana admite.


"Mas eu estou feliz em dizer que por outro lado ele possui todas
características necessárias, associadas com um homem de
sangue=vermelho."

"Sua pequena viking," eu digo.


"Você está dando uma."

Eu não posso vê-la, mas eu sei que ela está vermelha.


"Então, me diga sobre seu novo trabalho," ela diz.

Sem emprego e sem namorada, eu coloquei meu foco na casa,


especialmente nas paredes e carpetes ainda destruídos devido a tentativa de
Daphne.

Foi durante uma das minhas viagens a loja de construção que eu topei com
Zach Shuman, meu chefe formal no Hempstead Golf e Country Club, onde
fui demitido por meus erros. Surpreendentemente, ele olha para mim sem
raiva.

"Ouvi sobre sua mãe," Zach diz.


"Foda."

"Eu sei, obrigado."

"Olha, eu estou na gerência do Beefsteak Charlie's na cidade de Garden,"


ele diz.
"Eu poderia usar um garçom."

Meu último presente dado por minha mãe, eu zombei de mim mesmo quando
me vi usando calças e um jaleco curto alguns dias depois.

Duas semanas depois de entrar no novo emprego, Daphne me liga.


"Adivinha quem escapou da faculdade de loucos?"

No dia que ela saiu, eu a pego no carro que era de minha mãe. Um buick.
"Para onde?" eu pergunto.

"Algum lugar com um chuveiro não público," diz Daphne.

Eu a levo para minha casa. Quando chegamos, eu a vejo examinando o


exterior por sinais de dano do fogo, mas realmente eu fiz um bom trabalho
com a pintura. Dentro, ela olha para o banheiro (recentemente reorganizado)
como uma vista de um delicioso bife.
Ela não sai dele por uma hora. Finalmente criei coragem para bater na porta,
pensando comigo mesmo sobre a possibilidade de que ela pode não estar
bem como ela diz.

Daphne abre a porta, molhada, pingando água por todo chão e totalmente
nua.
"Eu esqueci de te pedir uma toalha," ela diz.

Nós caímos um no outro, um beijando o outro como mortos de fome. Apesar


de alguma resistência de sua parte—"A fluoxetina supostamente afeta o meu
libido," ela me avisa—tudo está se encaixando como deveria. Nós passamos
a noite na cama dos meus pais, uma prática que continua sem interrupção
toda noite que segue.

Eu a levo até os Kirschenbaums para um jantar. Meu pai chega com Janine,
que não demonstra nenhum sinal de embaraço sobre os olhares da multidão.
Mas o humor de todos é festivo, com muito mais foco em Todd, o convidado
de Tana da escola. Apesar de alguns resíduos de acne adolescente, Todd
parecia ser o que os velhos parceiros chamam de "pequeno homem
formado." Mais importante, ele parecia intensamente devoto a Tana e talvez
tentado por qualquer bagagem assombrado pelo resto de nós. O local está
tão enfestado com tantas auras boas que meu pai abraçava Daphne, nunca
mencionando o incêndio.

"Chega!" grita meu tio Marvin quando o abraço dura tempo demais.

A rodada do jantar começa tarde, um Henry Head, acompanhado por uma


Senhora Head. O investigador privado começa uma conversa curta após o
segundo copo de vinho.

"Eu estava tentando falar com você," diz Head.


"Mas o número que você me deu não funciona mais." O Motorola.

"Sem pele no meu joelho," ele continua.


"Eu tenho novidades para você. Eu estava nessa venda de garagem com
Lorna." Ele aponta para a Senhora Head.
"Eu achei essa velho catálogo telefônico. Eles estavam tentando vender essa
merda, você acredita nisso? Quão bom é um velho catálogo?"

"Você me diz."
"Muito bom, pra falar a verdade. Eu me lembrei do nome que você me deu,
Peter Robichaux. Você já leu algum James Lee Burke? Ele tem um detetive
chamado Dave Robichaux. De Nova Orleeeeens."

Eu balanço a cabeça negativamente. Daphne, ouvindo o nome de seu pai


dito em voz alta, junta-se a nós para ouvir o restante.

"Então, você acredita que o bastardo, perdão meu Francês, estava no livro.
Ênfase no "estava" pois como eu disse, velho catálogo. Mas eu dirigi até lá
de qualquer jeito, só para ver."

"Você achou ele?"

"Não, mudou de lá anos atrás. Mas o residente atual disse que ele ainda
tinha correspondência de Kings Park. Você sabe, o local que interna
malucos? Meu palpite é que ele reside lá por um tempo."

Eu observo Daphne em rabo de olho, procurando alguma reação pela idéia


de que ela e seu pai dividiram a mesma instituição mental, mas seu rosto
não revela nada.

"De qualquer jeito," Head continua, "Eu chequei algumas coisas. Ele passou
algum tempo em Bellevue, esquizofrenia e tudo mais, mais ou menos nos
anos oitenta. Até Reagan vir e chutar todos para outro lugar. Eu tenho medo
que é aí que a pista fica fria."

"Você olhou para onde os residentes foram transferidos?" pergunta Marvin,


que entra na conversa sem ser notado.

"Chequei," responde o detetive.


"Mas sem sorte."

"Huh," Marvin diz.

Daphne não parecia interessada em perseguir por mais tempo, mas


enquanto voltávamos para casa, eu pensei que era melhor descobrir
novamente

"Nós podemos contratar outro detetive," eu sugiro.


"Talvez um com meio-cérebro."
"Talvez eu supostamente não deveria achar ele," ela diz, sem emoção
aparente.
"Coisas acontecem por uma razão, você sabe?"

Então nós retornamos para nossas vidas. Eu trabalho pra caralho no


restaurante; ela achou um emprego na loja de discos. Mesmo eu nunca
considerando que nós moramos juntos, nós estávamos felizes em nossos
novos papéis. Fazíamos compras, dividimos o trabalho do jardim e contas,
segurávamos as mãos no cinema. Foi quando tio Marvin me ligou, uma
semana depois, para me dizer que achou ele, eu tive que perguntar quem.

"Robichaux," Marvin diz.


"Quem diabos a mais eu estaria falando?"

22

DOMINGO DE MANH×O DIA QUE NÓS escolhemos para nossa


viagem—poderia ser um comercial de primavera: Há um céu azul e um
nascer de sol para dividir com todos. Pulamos no carro de minha mãe,
Rolling Stones como trilha sonora e seguimos cortando estrada abaixo pela
495.

Nas semanas que passaram a morte da minha mãe, eu tendia a associar


qualquer pensamento de cidade com algum desrespeito, um senso reptiliano
meu. Mas hoje, minha senhora carregou sua escopeta e temos um mistério
quase resolvido, eu me sinto energizado. Energizado pois, eu admito, pode
ser devido as nuvens e a fragrância do fumo tragado por meu tio Marvin no
acento de trás. Ambos, Daphne e eu nos recusamos a dividir, eu por razões
de segurança, ela pois, ela diz claramente, "Eu quero ficar sóbria disso."

Seguindo a conversa no caminho, tio Marvin, clamava que "Henry Head não
podia achar uma jujuba no pote," deixando o feito dele mais admirável. Ele
valeu seu pagamento quando ouviu o nome de Peter Rochichaux na boca de
um amigo na Quinta Província, uma área estendida de ChinaTown e a
Pequena Itália no Rio Leste. Após cavar um pouco mais, o amigo de Marvin
descobriu um presidiário, um ano depois, de um habitante local chamado
"Peter Robishow." A Acusação era um pequeno assalto, mas o crime em si—
dito na voz de um policial—não foi tão impressionante para o juiz, que
ordenou ele ser solto sem qualquer pena.

"Robishow" não tinha endereço. O amigo de Marvin nos leva até Reuben
Brown, um advogado de sem-tetos. Tio Marvin não podia dizer "Advogados
de sem-tetos" sem qualquer desrespeito visível.

"Eles não tem trabalhos ou responsabilidade e nós alimentamos eles com


todo o queijo que conseguem comer." Marvin diz.
"O que diabos mais direitos eles querem?"

Nós decidimos que era melhor para mim ligar para Reuben. Eu digo a ele
que Robichaux—quem chama a si mesmo de "Robes"—pode estar na nossa
linha de investigação. Reuben não parece convencido com minha estória,
mas concorda em nos encontrar em um lugar embaixo a ponte Brooklyn na
condição de nós ajudarmos ele a distribuir uma dúzia de pães velhos às
pessoas que moravam ali.

"Eu só quero te lembrar," diz Reuben, um homem preto e magro com cabelo
vermelho, "que a maioria dessas pessoas não possuem limite de certo ou
errado. Nâo deixe suas esperanças crescerem, é tudo que eu digo."

"Entendido!" diz Daphne. Reuben concorda lentamente, retirando o


entusiasmo dela quando chegamos a um vilarejo cheio de pessoas, uma
coleção de caixas, carrinhos de compras e mesas quebradas. Apesar dos
sacos de pães que carregávamos, a maioria de seus ocupantes esconde
quando nos vêem. Aqueles bravos ocupantes que ficaram, nos olhavam com
algum ar suspeito.

"Ele mora em uma caixa?" Daphne pergunta a Reuben, dizendo "caixa"


quando poderia ser "papelão" ou "Casa Colonial."

"Robes? Não, Robes mora no sub-solo," diz uma das pessoas ali.

"Ótimo, um maldito Homem Buraco."

"O que é um Homem Buraco? eu pergunto.

"É um mito urbano," diz Reuben.


"Muitos desses homens e mulheres, eles não possuem outra chance a não
ser morar no sub-solo. Um velho túnel de metrô é um inferno sendo muito
mais quente que uma caixa de geladeira. De algum jeito eles tem sua própria
sociedade, com regras e leis. Sua própria civilização, se você desejar. Mas
eu digo por experiência, não é bem assim. Não há nada civilizado em viver
no túnel de um metrô."

Ainda, é difícil não imaginar, descendo dentro da escuridão de um túnel, que


nós estávamos entrando em um reino perdido. Nós definitivamente
estávamos sendo observados—mais de uma vez eu vi um par de olhos
brancos na escuridão. Eu acho a mão de Daphne, imaginando que ela
poderia precisar de apoio, mas ela parece calma e feliz. Nós poderíamos ter
ido a um piquenique. Eu penso nisso como uma forma de meditar.

"Está muito longe?" Daphne pergunta.

"Naquele canto ali," Reuben responde. Ele carrega uma lanterna gigante de
alumínio, apontando para os ratos que cruzavam nosso caminho. Um
barulho não esperado balança as paredes e arrepia todos os cabelos do meu
pescoço. Acontece que estamos na trilha de um trem.

"Hey Robes, você está aí? Reuben diz, mirando a luz da lanterna em uma
fenda na parede.
"Sou eu, Reuben." Há uma resposta, uma cruz emerge da fenda, que
encoraja Reuben a continuar.
"Eu tenho alguns amigos comigo. Amigos seus, eles dizem."
Meus olhos acostumam com a pouca luminosidade, e eu consigo ver agora
algo como um humano junto à parede.

Daphne aproxima dele devagar, uma mão levantada para tocá-lo.


"Pai," ela diz.
"Sou eu, Daphne."

"Pai!?" Reuben exclama.


"Você não me disse nada sobre isso."

"Shush," Marvin diz, levantando seu cigarro para ele.


Reuben recusa a oferta para dividir.

Eu coloco uma mão no ombro de Daphne. Ela tira, se movendo até a figura
no chão.
"Pai," ela repete.

A figura se contorce, tentando ver o rosto de Daphne. É impossível ler


alguma expressão no rosto dele, isso se há alguma. Reuben é cuidadoso
para não colocar o brilho da luz diretamente nos olhos do homem.

"Pai," ela diz.


"É você?"

A figura sussurra algo impossível de escutar. Daphne continua a chegar


perto. Eu posso sentir Reuben inquieto ao meu lado. Daphne coloca sua mão
no rosto da figura.

"Cuidado, Daph." Eu aviso, sem qualquer compreensão de quais riscos


aquilo poderia oferecer.

Daphne remove algo brilhante do seu bolso e aperta, criando um barulho


vagamente familiar, como uma garrafa de cerveja sendo quebrada. Quando
Reuben joga a lanterna sobre eles, eu vejo que Daphne está segurando a
garrafa de fluído que eu usei para manter meu Zippo.

"Mas que merda?" Reuben diz. Agora Daphne está segurando uma caixinha
de palitos de fósforo, riscando um na caixa e jogando o resto no chão. A pilha
entra em chamas, como uma erupção.

Eu a agarro por trás. Seus braços escorregaram de mim. Tio Marvin faz uma
abordagem mais direta, estampando o fogo. Daphne recompensa seu ato de
heroísmo dando nele um chute nos testículos, ou o que deveria ser se o tio
Marvin ainda os tivesse. Ao invés há duas bolas que se conectam
diretamente ao saco escrotal, que explode como uma piñata. A figura no
chão, ainda assustado, ergue e corre. As chamas rapidamente se espalham
no lugar.

"Nós temos que sair daqui," diz Marvin, começando a caminhar.

Ele vai em direção ao caminho que entramos. Reuben e eu pegamos


Daphne e o seguimos. Está muito escuro para ver a fumaça dentro do túnel,
mas nós conseguíamos sentir.

"Continuem andando," Marvin grita.

Eu sigo o caminho de Reuben, ajudando Daphne a chegar até um ponto de


luz distante. A luz fica mais forte quando chegamos na entrada. A cena no
lado de fora é constrangedora. Uma dúzia de pessoas, olhando a escuridão,
seguindo a fumaça pelo túnel até o vilarejo.

Reuben está balançando Daphne, insultando-a com uma série de


profanidades que continuam mesmo após eu afastá-lo dela. Daphne desaba
no chão em posição fetal. Marvin está parado em pé próximo a ela. Eu
escaneio o caos procurando algum sinal de Robes. Mas tudo que eu consigo
ver é um exército de zumbis, rodeados de grama, mijo e sangue, piscando
seus olhos contra o sol brilhante.

23

DAPHNE SE MANTÉM CALADA por todo caminho de volta. Após


deixarmos Marvin, eu a coloco no chuveiro, faço o melhor para deixá-la
limpa, e a coloco na cama.
"E quanto as drogas longínquas?" são suas únicas palavras para mim, uma
fala de Sid e Nancy. E então ela caiu no sono, tão profundo que roncava.

Eu fico o resto da noite sentado numa cadeira do lado da cama, olhando ela.
Eu desmaio em algum ponto durante as primeiras horas da manhã. Quando
eu acordo, a cama está vazia e o carro sumiu da garagem. Há um bilhete
preso na geladeira.

"Desculpe."

Recebo uma ligação de Kings Park na tarde desse dia. A senhora Robichaux
decidiu se internar novamente por conta própria, diz um gerente irritante
após eu pegar o carro no estacionamento.

Na próxima manhã, outro dia ensolarado, meu pai me leva na instituição.


Daphne chega na área de visita, parecendo muito mais ela do que a primeira
vez que a vi. Ela conversa lentamente. Eles claramente a doparam.

"Então," ela pergunta.


"Como você gosta de mim agora?"

"Do mesmo jeito que sempre," eu digo.


"Você parece exatamente a mulher que eu amei."

Ela sorri ainda fraca.


"Você sabe o por quê das histórias terminarem com finais felizes?"
Eu balanço a cabeça negativamente.
"Porque elas terminam muito cedo," ela continua. "Elas sempre terminam
com um beijo. Você nunca tem que ver toda a merda que vem depois. Você
sabe, vida."

"Mulher, essa história de amor está só começando. Descanse, pois quando


você se sentir melhor..." Eu pauso, pois eu não sei exatamente o que falar
depois.

"O que?" ela pergunta.


"Vamos voltar ao subúrbio? Nos casar? Isso vai acontecer com a gente,
certo? Duas crianças e meia e um traje branco."

"Foda-se tudo isso. Nós podemos nos mudar para o Chelsea. Eu posso até
te pegar em um grande táxi amarelo." É uma referência do final de Sid e
Nancy que eu digo esperando animá-la.

"Você não é Sid," ela diz, se trancando no quarto.


As palavras de Daphne doeram no começo, mais porque ela estava certa.
Toda essa merda que nós usávamos para fazer piada—trabalhos estúpidos e
valores suburbanos—de algum jeito se tornou minha vida. Eu começo a
entender a necessidade dela de botar fogo no mundo. Mas eu não sou Sid
Vicious. Apesar do mundo ser um lugar fodido, e eu não poder consertar o
passado, eu não tinha nenhum desejo em quebrar tudo.

Talvez seja o sol me dando um soco na cara quando eu caminho para a


porta, mas eu não estou pronto para ir para casa e começar a trabalhar.

Posso começar de novo. Procurar um emprego em um restaurante melhor.


Procurar algo muito melhor do que o ramo alimentício. Eu nem preciso ficar
em Nova Iorque. K. disse que a viagem é solitária e compensadora, mas eu
nunca havia ido a Califórnia, onde o sol supostamente deveria nascer todo
dia do ano.

A idéia de recomeçar as coisas com K. Pareciam animadoras, porém ainda


vagas. Somente Deus sabe o que espera no caminho de volta. Mas “Dios
nos odia todos”, já dizia um sábio amigo meu.

Eu coloco uma fita cassete no rádio do Buick. São os Ramones. Aumento o


volume e abaixo as janelas. O ar da estrada cheira a fumo, mas ainda está
muito bom para respirar.

AGRADECIMENTOS

Esse livro nunca teria existido se não fosse meu agente destemido Charlie
Runkle, o melhor no negócio. Obrigado também a sua esposa Marcy, por
tudo que ela fez para mantê-lo desse jeito. Eu também devo uma imensa
gratidão para meu editor, Cara Bedick, onde sua persistência salvou você,
querido leitor, talvez um grande clichê (mas talvez não seja esse em
particular).

Para Tom K., por acreditar em mim antes que todos os outros o fizeram.
Obrigado também, em ordem particular, para Alex Cox, Sid Vicious e Nancy
Spungen (e Gary Oldman e Chloe Webb), a todo elenco do Kings Park,
Johnny's Deli e seus sanduíches substanciais de ovo. Randy Runkle, os
Ramones, e Judy Blume, que me ensinou tudo que eu acho que sei sobre
mulheres.

Finalmente, eu sou agradecido a minha família: meu pai, por observar cedo
(e ocasionalmente) que eu não deveria deixar de fazer um trabalho honesto;
minhas irmãs, cujas risadas na mesa do jantar ainda me deixam doido, e
minha mãe, para quem eu devo, literalmente e metaforicamente
absolutamente tudo.

TRADUZIDO POR NOBAIS CHINASKI

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