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1988 - A Percepção Popular Da Assembleia Nacional Constituinte PDF
1988 - A Percepção Popular Da Assembleia Nacional Constituinte PDF
Florestan Fernandes
A percepção popular da
Assembléia Nacional Constituinte
A sociologia dos mandarins fugiu dos em suma, os símbolos pelos quais
temas concretos. Hoje se fala no buscavam fazer sua cabeça, decapitá-lo
imaginário e nas suas relações com o como agente histórico e político? Ele os
simbólico. Porém, não se faz uma introjetou nos próprios termos de sua
análise objetiva das representações. miséria e da negação do que lhe era
Voltamos a Hegel de uma forma negado. A ANC converteu-se em um
perversa, como se a sociedade não foco de luz, de esperança — uma
tivesse história e essa fosse uma promessa que não cabia no imaginário
expressão metafísica das "construções das elites das classes dominantes e no
mentais" do sociólogo, não "a atividade realismo de seus políticos profissionais.
do homem que persegue seus objetivos" A iniciativa popular foi organizada e
(ENGELS, 1844). O que é a Assembléia desencadeada de cima para baixo, por
Nacional Constituinte? O imaginário entidades bem conhecidas, tendo à
das elites das classes dominantes ou de frente a CNBB, a OAB, as comunidades
seus escribas? Ou uma formação política de base e várias outras organizações,
parida da crise cataclísmica de uma entre as quais se contavam sindicatos,
sociedade civil que se tornou inviável federações sindicais, partidos de esquerda,
para quase cem milhões de excluídos e de facções radicais dos partidos da ordem
oprimidos, ou de trabalhadores que a (no caso especialmente o PMDB e o
ela são incorporados morfologicamente, PFL). Contudo, é preciso distinguir a
mas privados, pelos dinamismos de iniciativa popular do significado da
repressão e de opressão, de peso e voz presença e das compulsões mentais e
em sua ordenação e funcionamento? sociais dos de baixo. Esta última
Os partidos da ordem e os políticos polaridade, mais ou menos escamoteada,
profissionais trabalharam a consciência surgiu espontaneamente. Ela estava no
social desses excluídos, desses oprimidos, sangue do pobre, dos mais humildes, e na
desses trabalhadores que entram consciência contestadora dos
subterraneamente na história, pelas trabalhadores mais organizados e mais
portas dos fundos. A campanha eleitoral decididos em tomar seus destinos nas
teve esse alvo: difundir a ideologia dos próprias mãos. Na cabeça dessa gente,
estratos dominantes das classes burguesas. por motivações opostas, o imaginário
Assim, ampliam e aprofundam sua das elites era conversa fiada. Essa gente
coisificação, iniciada nas fábricas, forjou um antiimaginário contra-elitista,
prolongada nas escolas e nas igrejas, que atravessa a realidade brasileira como
completada nos sindicatos e nos partidos um punhal afiado, fundado em suas
comprometidos com o melhorismo, representações, que não refletem uma
o obreirismo pacífico, a alienação imagem invertida de suas condições de
refinada e aguçada graças ao consumismo vida. Queriam vários tipos de reforma
de massa e à indústria da comunicação social simultaneamente e, por quererem
cultural. esses tipos de reforma social, tentaram
decifrar a seu modo a ANC e suas
Todavia, o que fez esse desgraçado da tarefas imediatas. É uma ilusão de
terra com as idéias, os ideais, os valores — mandarins supor que a falta de educação