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Francisco Erdos
Mestre em Teologia
Pontifícia Universidade Católica do Paraná
francisco@erdos.com.br
CAPES
ST 17 – Leituras Libertadoras da Bíblia
Resumo: A temática específica a ser tratada aqui é um recorte da tese de doutorado em Teologia na PUC-
PR que está em preparo. Trata-se da análise do Salmo 82, que descreve uma assembleia de deuses
presidida pelo deus El, onde se posiciona Yahweh contra outros deuses, a favor dos indefesos que são
nominados como: fraco; órfão; aflito; desamparado e necessitado. Nesta assembleia divina há um
julgamento: Yahweh levanta-se e julga as ações dos demais presentes. Os deuses são sentenciados à morte
por tomarem partido pela causa dos ímpios que praticam a injustiça e não serem favoráveis aos indefesos.
O objetivo deste texto é esclarecer quem são os elohyim que apoiam os ímpios que exploram os indefesos:
são juízes humanos que julgam em nome de Deus, mas de forma injusta, a troco de subornos, como pode
ser identificado em 2Cr 19,4-7; Lv 19,15; Dt 1,16-17; Dt 16,19? Ou são deuses, conforme identificado em
Dt 32,8-9 no texto preservado da Septuaginta e traduzido na Bíblia de Jerusalém? A metodologia adotada
é a pesquisa bibliográfica e será exposto que a narrativa bíblica está repleta de relatos de injustiças contra
os fracos, pobres, necessitados, aflitos, desamparados, estrangeiros, órfãos e viúvas. Os poderosos da terra
têm o poder em suas mãos para proceder retamente e praticar a justiça. Mas manipulam as situações a que
têm controle e provocam a ruína dos desamparados e desestabilizam o equilíbrio social. O Salmo 82
descreve o julgamento aplicado contra os elohyim que apoiam os ímpios que exploram os indefesos e
mostra que a morte é o fim de todo aquele que se volta contra Yahweh e seus atos de justiça. Os textos
citados acima permitem encontrar evidencias sobre a relação de Yahweh com a defesa da causa do pobre.
E uma visão do contexto social, político e religioso que direcionaram Israel a se tornar um povo
monoteísta ante um deus cuja bandeira é a justiça. Em um contexto politeísta e de injustiças sociais,
levanta-se a voz profética do salmista para denunciar as injustiças afligidas sobre os pobres e
desamparados. A acusação contra os deuses que tem o poder de julgar com justiça e proceder retamente
mostra que não adianta desviar-se de Yahweh e ir atrás dos falsos deuses com suas vãs promessas. A
descrição sobre Yahweh contida no Salmo 82 pode trazer um conhecimento mais profundo sobre a
divindade e sua justa relação com a humanidade.
Não há informações suficientes para precisar com segurança qual é a data em que foi
escrito o Salmo 82 1. Permite-se fazer suposições baseadas em análises de algumas
particularidades do texto. Mas mesmo que tenha sido escrito, ou editado, em uma data mais
recente, pode estar retratando fatos do passado, do antigo Israel. Temos evidencias de que este
Salmo pode ter sido escrito à época dos primeiros profetas escritores. Hermann Gunkel afirma
que as origens da poesia sálmica remonta a época anterior à monarquia ou aos primeiros anos da
história de Israel (GUNKEL, 1983, p. 449). Por sua vez Siqueira (2004, pp. 7-8) esclarece que
devido a teologia do reino do norte estar bem clara nos Salmos de Asaf, pode-se afirmar que o
Salmo 82 foi composto logo após a queda de Samaria (721 a.C.).
1
Hermann Gunkel (1983, p. 449) tem absoluta certeza de que o Salmo 82 é pós-exílico, ainda que seja impossível
data-lo com precisão.
Há certas particularidades no Salmo 82 que indica ser este texto de data mais recuada: o
tratamento respeitoso que se dá a outras divindades é diferente em relação aos textos de Isaías, p.
ex., que desqualifica os outros deuses, dando-lhes credenciais de simples objetos da imaginação
de homens ignorantes que os conceberam segundo suas baixas capacidades de conhecimento. São
frutos de mentes incapazes de tecer uma teologia mais elaborada para trazer a salvação, Is. 45,20.
No texto do Salmo 82 não há a negação da divindade dos outros deuses. O versículo 6 que diz:
“Eu disse: sois deuses, sois todos filhos do Altíssimo.” indica que na época em que foi escrito,
Israel estava em passagem do politeísmo para o monoteísmo (SIQUEIRA, 1987, p. 13) e está
retratando a crença ainda viva de que existiam outros deuses que eram adorado pelos antigos
Israelitas.
2 O SALMO 82
A estrutura da teologia global nos mostra que El era a divindade mais elevada no
panteão do antigo Israel, explica Smith (2006, p. 157), prova disto é que o nome El faz parte do
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Conteúdo do Deutero-Isaías com perspectiva de leitura para o pós-exílico, conforme J. Severino Croatto (1998, p.
12).
Até quando julgareis injustamente e tomareis partido pela causa dos ímpios?
Mas por outro lado, o texto inserido em um contexto mais amplo permite interpretar que
os elohyim são outros deuses: em uma visão politeísta segundo Smith (2006, p. 160), ou na visão
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Segundo Strong (2005, H430) a palavra hebraica ’( אלהיםelohiym), plural de ’( אלוהelowahh) é traduzido por:
(plural): 1a) governantes, juízes; 1b) seres divinos; 1c) anjos e 1d) deuses. (plural intensivo - sentido singular): 2a)
deus, deusa; 2b) divino; 2c) obras ou possessões especiais de Deus; 2d) o (verdadeiro) Deus; 2e) Deus
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Salvo referências específicas, todas as citações bíblicas são da Almeida Revista e Atualizada (ARA) ou tradução
livre
A Tradição Judaica em uma de suas interpretações dos vs. 6 e 7 diz que os elohyim são
os juízes de Israel, como evidencia o Midrash (Midr. Ps. 82) esclarece Neyrey (1989). Santo
Agostinho (2008, p. 7805) escreveu: “Longe de nós pensarmos serem estes deuses os dos gentios,
os ídolos ou qualquer criatura celeste ou terrestre, fora dos homens”. João Calvino (2002, p. 296)
disse: “[...] o nome deuses deve ser entendido como sendo os juízes, [...]”. Por sua vez Bortolini
(2011, p. 434) explica que Deus planejara aplicar a justiça servindo-se de juízes humanos, mas
estes devido a corrupção saíram fora do plano de Deus e por isso Deus os condenou à morte.
Soares (1998, p. 30) baseando-se no vs. 7 esclarece que “[...] não passam de homem de barro. O
texto original contém a palavra adam. Ora, adam é o termo masculino correspondente a adamah
(terra, barro) [...]. Morrer é voltar (misturar-se) ao pó da terra.
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Salmo 81 na numeração da Septuaginta e da Vulgata.
Surge uma voz solicitando que Yahweh, assuma o poder de julgar toda a terra: (vs. 8):
CONCLUSÃO
Diante das evidências nos textos apresentados e considerando que o antigo Israel era
comprovadamente politeísta, conclui-se que os elohyim do Salmo 82 são deuses e não juízes e
governantes humanos. O compositor ou compositores deste salmo e seus contemporâneos, criam
na existência de outros deuses e esta era a crença do antigo Israel. Devido da passagem do
politeísmo ao monoteísmo supõe-se que houve um grande esforço para apagar o rastro histórico
dos outros deuses do passado e assim reescrever a história da religiosidade de Israel.
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