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O Antigo Testamento
e a Historicidade das
Narrativas Patriarcais
Uma análise Arqueológica, Cultural e Bíblica
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© Editora Reflexão, 2017 – Todos os direitos reservados.
© Danilo Moraes
1a Edição – Fevereiro/2017
ISBN: 978-85-8088-260-5
216 páginas.
06‑6456 CDD‑809
Editora Reflexão
Rua Fernão Marques, 226 ‑ Vila Graciosa ‑ 03160‑030 ‑ São Paulo
Fone: (11) 4107‑6068 / 3477‑6709
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INTRODUÇÃO.....................................................................................9
PRIMEIRA PARTE:
OBSERVAÇÕES HSTÓRICAS, TEOLÓGICAS E LITERÁRIAS........ 15
SEGUNDA PARTE:.............................................................................73
ANÁLISE HISTÓRICA, ARQUEOLÓGICA, CULTURAL E BÍBLICA.73
CONCLUSÃO...................................................................................197
BIBLIOGRAFIA.................................................................................201
1 Propostas que não partem de Deus como a fundação essencial, da Escritura como a base
cognitiva externa e do Espírito Santo como o princípio interno do conhecimento podem
ainda assim descobrir e sistematizar muitos dados. Entretanto, sem partir dos princípios
relacionados será como uma descoberta sem brilho e sem a glória dada a Deus (Sl 4.6).
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Onde não é possível a certeza absoluta o melhor é ter mente aberta, com
grande reverência, tendo o cuidado de não confundir ideias tradicionais
sobre a composição dos livros com aquilo que a Bíblia realmente reivindi-
ca para si mesma (COLE, 1981, p. 49).
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fatores que contribuíram para uma nova concepção acerca da Bíblia, essa, dei-
xou de ser considerada Palavra de Deus inspirada, e passou a ser vista como
qualquer outra literatura antiga que contenha reflexões humanas e religiosas.
Pode-se dizer que neste período a ênfase passou da inspiração das Escrituras
para sua humanidade. A consequência disso foi que “para muitos a palavra de
Deus neutralizou, como se não fora mais do que uma mera ressonância ainda con-
servada no Ocidente ‘cristão’” (LÄPPLE, 1976, p. 10).
Vale ressaltar que “o destino que vamos alcançar depende do nosso pon-
to de partida”. Isso se aplica ao estudo dos Patriarcas, pois, se partirmos de
concepções exegéticas arraigadas de pressuposições filosóficas naturalísticas,
chegaremos onde muitos críticos têm chegado nos últimos anos, ou seja, em um
mar de teorias que se conflitam entre si e falácias exegéticas juntamente com
hermenêuticas destituídas de sentido lógico e práxis cristã. Da mesma forma
as respostas que obteremos do texto bíblico, depende em muito do tipo de per-
gunta que faremos ao texto, e se estas perguntas são relevantes. De igual modo,
a concepção que temos da Bíblia e neste caso dos Patriarcas, podem determinar
o resultado de nossas pesquisas, se a entendermos como um produto literário
humano da antiga comunidade sociopolítica e religiosa de Israel terá um resul-
tado que entrará em conflito, quando comparados com uma concepção que a
entenda como a Palavra de Deus revelada.
Porém, se partirmos de uma abordagem do texto onde o próprio texto
forneça um esclarecimento, e tomar as palavras em seu sentido usual e co-
mum, assim como tomar as palavras no sentido que indica o conjunto da frase,
analisar o contexto da passagem em análise, levar em consideração o objetivo
ou desígnio do livro ou passagem em que ocorrem as palavras ou expressões
obscuras, e consultar passagens paralelas, estaremos bem próximos de conhe-
cermos o que realmente o autor do texto quis dizer, e para quem disse.
Hoje, se reconhece como atividade legítima e necessária os estudos bí-
blicos que levam em consideração evidências linguísticas, literárias, históricas
e científicas; mas alguns pesquisadores que são denominados como críticos bí-
blicos, ou conforme tem sido usado com frequência no Brasil e outros países da
América Latina para não causar uma imagem “negativa”, preferem ser chama-
dos de biblistas. Estes, geralmente têm sido mostrados dotados de uma menta-
lidade cética quanto à autoridade e inspiração da Palavra de Deus.
O que proponho não é um retorno ao século XVI, pois a forma como o
Período Patriarcal é entendido desde seus primórdios não foi abandonada devi-
da suas inconsistências internas ou suas aparentes contradições, mas sim, por-
que foi inadequadamente analisado ao submete-lo a métodos desprovidos de
relevância bíblica e dotado de pressuposições filosóficas. Proponho então, que
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O que fazer? O que dizer? Em que acreditar? Bem estas são algumas das
dúvidas3 que sobrevêm ao se deparar se com este tema. E isso foi à mola pro-
pulsora que impulsionou o presente livro. Se iremos ter respostas por completo,
não sabemos; mas pelo menos vamos poder encarar o assunto com maturidade.
Sabendo que o conhecimento e dados adquiridos podem ser falhos e necessi-
tem serem reexaminados. Assim, postulando uma posição conservadora mante-
nho no essencial a certeza através da fé e da razão, e nos pontos não essenciais
tolerância em nome de uma unidade saudável.
Faz-se necessário esclarecer alguns pontos. Como pesquisador evangélico
do Antigo Testamento, assumo a importância de obras que discordem de meu
ponto de vista, e mantenho profundo respeito por aqueles que discordo. Meu
posicionamento conservador evangélico deu-se após estudo sério, reflexão e
luta, diante de inúmeras propostas metodológicas e teológicas. Com isso, pos-
tulo uma abordagem conservadora quanto à história de Israel e à historicidade
do Período Patriarcal.
Este livro, em última análise, é uma profissão de fé; uma fé que pensa,
assim desejo, e também uma fé que é sensata: aquilo que Anselmo chamou de
“fé que está em busca de entendimento” (fides quarents intellectum).
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OBSERVAÇÕES HSTÓRICAS,
TEOLÓGICAS E LITERÁRIAS
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na subjetiva, pois ao levar em conta que os objetos achados são “mudos” entre
em cena o “intérprete” com seus pressupostos e princípios.
Da mesma forma, levamos a sério dados arqueológicos que podem nos
ajudar a formar uma visão sobre a história do Antigo Israel. Não levamos esses
dados arqueológicos e suas interpretações mais a sério do que textos bíblicos.
No entanto, nós os consideramos seriamente, esperando que, haverá uma con-
vergência entre o testemunho bíblico e as interpretações dos dados arqueológi-
cos. “Dados arqueológicos nos auxiliam a formar o quadro geral do mundo que
o Antigo Israel viveu.” (PROVAN, 2016, p. 159). Há limites para o que a arqueo-
logia pode nos dizer a respeito de Israel. De qualquer modo, as informações que
essa disciplina produz devem ter como contrapartida uma leitura cuidadosa do
relato bíblico.
A arqueologia pode apresentar alguns artefatos que lancem luz sobre os
costumes sociais de determinado momento histórico, mas, apesar dos melhores
esforços dos estudiosos desse campo, a Bíblia continua sendo a principal, e na
maioria das vezes a única, testemunha dessas ações de Deus na história e, o
mais importante, a única intérprete autoritativa dos acontecimentos.
Temos que ser cautelosos, os dados arqueológicos não são completa-
mente objetivos, mas devem ser interpretados, o que é um processo subjetivo.
Portanto, é conveniente recordar que muitas conclusões arqueológicas não são
comprovadamente factuais, não importa quando ou por quem foram propostas.
Apesar disso, a arqueologia desempenha um papel inestimável. Correlações po-
dem ser feitas entre o texto bíblico e dados arqueológicos, mas, além disso, a
arqueologia é a principal ferramenta para a reconstrução de muitos aspectos da
sociedade israelita. Devemos evitar uma abordagem ingênua e fundamentalista
ao texto e, por outro lado, qualquer outra abordagem excessivamente manipu-
ladora, não-crítica, ou as interpretações imaginativas. O historiador não pode
escapar do uso do texto bíblico em se aproximar a história do antigo Israel. À
história antiga é vasta e complexa, e nosso escasso testemunho a respeito dela
só pode proporcionar vislumbres dessa vastidão e complexidade.
Em si mesmos vestígios arqueológicos (quando não se inclui o testemu-
nho escrito) são mudos. Não falam por si, não tem nenhuma história a contar e
nenhuma verdade a comunicar. São os arqueólogos que falam a respeito deles,
testemunhando sobre o que descobriram e estabelecendo as descobertas em
uma estrutura interpretativa que lhes dá sentido e significado. Toda tarefa de
relacionar descobertas arqueológicas com aspectos específicos do passado con-
forme se encontram descritos em textos é, na verdade, repleta de dificuldades.
É inevitável que surjam diversas interpretações sobre as descobertas. Determi-
nada camada com vestígios de destruição deve ser associada a esta ou áquela
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Uma das razões para que o registro no texto bíblico tenha prioridade
sobre a evidência arqueológica são as limitações da arqueologia, por natureza
confinada ao reino material. O professor Amihai Mazar, diretor do Instituto de
Arqueologia da Universidade Hebraica de Jerusalém, observa:
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(1) iluminar a Bíblia, (2) apoiar eventos do texto em nosso tipo de história
e geografia e (3) edificar a confiança na revelação do Deus da verdade que
sempre será consistente em todas as suas obras, sejam elas revelação das
Escrituras ou seus atos no tempo e no espaço. (KAISER, 2007, p, 89).
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mais antigas sobre a Bíblia. Muitos estudiosos afirmaram que nunca houve
um Davi ou um Salomão, mas hoje temos uma esteia que de fato mencio-
na Davi. (Apud PRICE, 2006, p. 151-152).
8 Para uma boa avaliação do contexto soacial e cultura, nos tempos do Antigo Testamento,
ver: HARRISON, R.K. Tempos do Antigo Testamento, 2010, p. 9-31.
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quais vieram os textos do Antigo Testamento. Embora ainda haja muitas lacu-
nas no nosso conhecimento a respeito do antigo Oriente Médio, também existe
uma quantidade crescente de material que se torna disponível para exame dos
estudiosos, e uma parte deste material frequentemente esclarece, de modo sig-
nificativo os textos do Antigo Testamento.
Devemos observar que a teoria de Graf-Wellhausen sobre a historicidade
e composição dos textos do Antigo Testamento, originalmente foram constru-
ídas em um momento em que o estudo arqueológico estava em sua infância.
À luz das modernas descobertas arqueológicas, os estudiosos liberais de hoje
reconhecem que certos aspectos destas teorias, já não podem ser considerads
sustentáveis. Há, no entanto, uma teimosia em muitos círculos acadêmicos que
se recusa a deixar de seguir as hipóteses JEDP9, e muitos ainda seguem os prin-
cípios básicos da teoria.
Com isso, podemos comcluir com um citação de Tenney a respeito da
relevância da arqueologia bíblica para compreensão dos textos bíblicos:
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Além disso, Finkelstein alega que a história bíblica deve ser lida como
historia regressiva, que “significa que os primeiros capítulos na história israelita,
as narrativas dos Patriarcas, Êxodo, conquista, bem como a idade de ouro de
Davi e Salomão, não podem ser entendidos como simplesmente retratando re-
alidades históricas”. Em vez disso, deve ser percebido que a história bíblica “foi
escrita para servir de uma plataforma ideológica”. (2007, p. 185).
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rante muito tempo, uma paráfrase racionalista do texto bíblico. De fato, grande
parte da historiografia sobre essa temática foi conduzida por religiosos. Dentro
e fora da academia à história dos antigos israelitas era vista como a evolução de
um único grupo, ou seja, aceitava-se a sequência: patriarcas, escravidão no Egi-
to, êxodo, conquista da Palestina, confederação das 12 tribos, monarquia davídi-
co-salomônica, divisão entre reino do norte e do sul, exílio e volta para a terra. O
abandono da credibilidade das histórias antigas contidas nos textos bíblicos foi
se dando aos poucos, primeiramente abandou-se a credibilidade das narrativas
patriarcais, depois, o êxodo e asnarrativas da conquista de Canaã como fontes
que podem servir de base para uma reconstrução significativa da história; logo
em seguida deixaram de lado o livro de Juízes e as narrativas de Saul, e por fim,
todo o ralato bíblico deixou de ter credibilidade histórica confiável. A mais alta
consideração que se pode ter para com os relatos da história de Israel – segun-
do os minimalistas – é de que se trata de “uma elaboração literária artificial e
influenciada pela teologia”. (PROVAN, 2016, p. 37). Temos em nossas mãos um
texto bíblico artificial, não convincente e de pouquíssima utilidade histórica, e
em grande parte lendas folclóricas, um passado imaginário e não real.
Acreditava-se que todas essas etapas estavam em conformidade com as
evidências arqueológicas e fontes extra-bíblicas, de tal modo, houve um razoá-
vel consenso sobre a história de Israel até meados da década de 70 do século
XX (...) Uma mudança significativa só veio a ocorrer, de fato, a partir da década
de 1990, com a criação do Seminário Europeu sobre Metodologia Histórica. O
grupo de pesquisadores que possibilitou o surgimento do referido seminário se
uniu em torno das frustrações referentes ao debate sobre o Israel antigo. A partir
de então, tem sido conduzida uma profunda revisão deste tema, de modo que
os resultados obtidos até o presente momento colocam em xeque o paradigma
tradicional da história antiga de Israel. Dentro do mencionado seminário des-
tacou-se um grupo de pesquisadores que ficaram conhecidos como Escola de
Copenhague ou minimalistas, os quais, gradativamente, adquiriram notoriedade
internacional. Apesar destas significativas mudanças no âmbito historiográfico
internacional, os estudos sobre a história de Israel levados a cabo no Brasil se
encontram afastados do recente debate referente a essa temática.
Vejamos uma avaliação aos métodos críticos que analizam a história an-
tiga de Israel, sem ao menos, levar em consideração a importãncia dos relatos
bíblicos:
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12 Para uma resenha completa do livro: In Search of ‘Ancient Israel, consultar: http://airtonjo.
com/site1/resenha-1.htm. Acessado em: 03 de agosto de 2016.
13 Baruch Halpern, em seu artigo intitulado “Erasing history: the minimalista assault on
ancient Israel” (Apagando a história: o assalto minimalista ao Israel antigo) produziu um
quadro das principais inscrições encontradas no antigo Oriente Próximo que confirmam
as alegações narradas nos livros bíblicos.
14 Erasing History: The Minimalist Assault on Ancient Israel, BAR 11.6, 1995, p. 29.
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própria Bíblia. Então, torna-se óbvio: o relato bíblico relativo a Moisés tem de
ser reinterpretado a fim de que ele apareça como uma figura legendária, um
herói nacional e um objeto de pensamento e de fé posteriores, ou na melhor das
hipóteses foi apenas um personagem da história antiga de Israel.
Muitos críticos têm verdadeira aversão ao sobrenatural. Mas se não pu-
dermos aceitar o sobrenatural, não podemos aceitar a revelação da divindade e
muito menos a encarnação de Jesus e sua ressurreição. Se o valor histórico das
Escrituras é descartado e os milagres são impossíveis nada fica na Bíblia que
mereça crédito. Não podemos nos esquecer do papel de Deus em conduzir a
história para seus propósitos, “a história não é um movimento neutro e cego de
destinos imponderáveis, mas, ao contrário, é conduzida por uma vontade e uma
liberdade, as de Deus.” (RAVASI, 1985, p. 93).
Estamos longe da época em que se aceitava tudo como histórico a res-
peito da Bíblia. Desde o século XVII e XVIII que insurgem-se graves acusações
quanto a autoridade e historicidade dos relatos bíblicos. O que se evidência é
que a rejeição do aspecto sobrenatural da Escritura vicia toda a sua discussão, e
compreensão. Para muitos críticos a simples presença de um elemento sobrena-
tural no texto, serve de evidência suficiente para que ele rejeite a sua historici-
dade. Não levam em conta os críticos que a ciência moderna não mais encara a
natureza como um sistema fechado, pelo que não se pode mais insistir em que
os milagres são impossíveis cientificamente. A religião de Israel é uma religião
histórica, e olhar para ela não levando em consideração sua historicidade é um
dolo ao povo de Israel. Quando estudiosos concluem que milagres podem acon-
tecer dentro da história humana, muitas de suas ideias sobre outros detalhes da
história bíblica brotam naturalmente.
A escola de Wellhausen começou com a mera suposição que a religião de
Israel era de origem meramente humana como qualquer outra, e que precisava
ser explicada como mero produto da evolução. Não fazia diferença para eles
que nenhuma outra religião conhecida (a não ser aquelas que surgiram da fé
dos hebreus) ter chegado ao monoteísmo genuíno; os israelitas também devem
ter começado com animismo e politeísmo cru, exatamente como as demais
culturas antigas. Porém, a evidência em contrário, aponta que desde o Gênesis
até Malaquias, que a religião israelita era monoteísta desde o começo até o fim.
Segundo a Hipótese Documental não pode existir aquilo que se chama re-
ligião sobrenaturalmente revelada. Por este motivo, todas as narrativas simples
e diretas em Gênesis e no restante do Pentateuco que descrevem as experiências
de Abraão, Isaque, Jacó e Moisés têm sido sujeitadas a uma reanálise, procu-
rando demonstrar que um retoque monoteístico foi aplicado àqueles antigos
destinatários politeístas pelos assim-chamados “Deuteronomistas” ou a escola
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16 Esse é a transcrição de uma entrevista com Willian Lane Craig, realizada por The Veritas
Forum.
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Não acho que se pode tornar plausível que, em qualquer raça, as fábulas
e os mitos viessem, no decorrer do tempo, a serem aceitos cada vez mais
como fatos reais, de modo que devêssemos agora, quiçá, estar dispostos
a aceitar como fatos históricos as lendas do Poema dos Nibelungos ou do
Chapeuzinho Vermelho. Mas isto, segundo os críticos, deve ter acontecido
com Israel.20
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podia ser e era significativa em muitos pontos da história de Israel, dando, ga-
rantia e esperança para o futuro.
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É bem improvável que esse relato houvesse sido inventado pelos israelitas.
Se o tivessem inventado, seria de esperar que atribuíssem a sua libertação
ao Deus a quem até então haviam cultuado. Se a missão de Moisés fosse
obra do seu próprio coração e da sua simpatia para com os seus compa-
trícios maltratados e oprimidos, de esperar seria que ele lhes apresen-
tasse em nome do seu Deus. Em vez disso, dirigiu-se a eles na confiante
persuasão de que fora mandado por Iahweh... Povo algum seria capaz
de inventar, contra a verdade, uma história de que seus antepassados ti-
nham sido escravos de uma nação estrangeira. Povo algum inventaria a
história de que havia sido libertado por um Deus que até então não havia
adorado, caso não tivesse sólidos motivos para crer que isso era verdade.
E homem algum complicaria desnecessariamente a sua tarefa de libertar
um lote de escravos, com uma estranha história de que havia sido enviado
por um deus cujo nome eles jamais reconheceriam como o nome de seu
deus, a não ser que estivesse profundamente convencido de que isso era
verdade... Desconte-se qualquer dos aspectos desse acontecimento, e a
narrativa ficará mais inacreditável do que como está na Bíblia. (ROWLEY,
2003, p. 59-61).
22 Uma outra obra importante de Rowley, foi: The relevance of the Bible, 1942 (A relevância
da Bíblia).
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ainda mais movimentada, uma vez que os textos estavam mais expostos a se
deteriorar, os copistas tinham mais possibilidade de fazerem erros involuntários
ou correções voluntárias, que hoje corresponderiam a uma edição corrigida.
Muitas obras antigas supunham uma pré-história oral, consistindo o trabalho do
autor em pôr por escrito segundo a tradição oral. Enfim, ele podia compilar e
sintetizar textos já existentes, fenômeno este que parece bastante característico
dos textos históricos.
Para que a Hipótese Documental possa se sustentar, torna-se totalmente
dependente dos “redatores”.23 Com isso quando falha a gramática, a ideia de
continuidade e os nomes divinos; basta apenas dizer que é por causa do redator.
Podemos definir os redatores como “pessoas que confeccionam uma versão
acabada de um texto a partir dos materiais postos à sua frente; esses materiais
podem consistir em versões alternativas completas, várias versões parciais ou
até uma versão substancialmente completa, que só precisa de pequenas mu-
danças.” (GABEL, 1993, p. 23). Caso a existência dos redatores e seu trabalho
editorial nos textos patriarcais, tenha de fato ocorrido como alegam os críticos,
podemos certamente inferir que, estes redatores apropriaram-se das tradições
para seus próprios fins teológicos, políticos e apologéticos.
A verdadeira contribuição dos editores/redatores está em sua seleção e
arranjo das fontes disponíveis. Em alguns casos, a sua tarefa foi realizada com
tal respeito pelo material e com tal perícia que a mão do editor é virtualmente
invisível. Não se pode determinar a extensão de revisões dos escribas ou reda-
tores, ainda que provavelmente mínima. Os redatores tinham certa libertade,
e adaptavam suas histórias às circunstâncias e necessidades de sua época.
Assim, não apenas a transmissão das tradições de geração a geração causava
alterações, mas o mesmo narrador mudava uma mesma história a cada vez
que a contava.
A Hipótese Documentária atribui ao redator um papel de editor respon-
sável por todos os casos em que a análise não produz os efeitos que desejam.
Sempre que se apresenta um versículo ou palavra que contradiga seus argumen-
tos, se apressam em “criar” mais um redator arbitrariamente. Assim, o redator
teria inventado um cenário histórico para as leis e narrativas a fim de atingir
seus objetivos. Mas se atentarmos para os manuscritos de Qumran, veremos
que não era usada a prática de intervenções textuais por parte de redatores da
forma como alegam os críticos.
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25 Alusões a fontes literárias antigas que não sobreviveram à passagem dos séculos são vistas
na menção ao Livro do Reto [ou Livro dos justos (versão ARA), ou ainda Livro de Jasar,
(versão TB)], feita nos livros de Josué (10.13) e Samuel, enquanto que outro documento,
conhecido como o Livro das Guerras do Senhor é citado em Números. A objetividade
e seletividade dos historiadores hebreus ficam evidentes pela maneira controlada com
que lidavam com as fontes que lhes estavam disponíveis, para a compilação de obras
como os livros de Reis e Crônicas. Uma tradição curiosa, e pouco provável a respeito da
origem do Livro de Jasar, é a seguinte: “Chiyya bar Aba, o estudioso rabínico do século
III, pergunta no Talmud: ‘Que se pretende com o Livro de Jashar?’ Responde de maneira
didática: ‘É o livro de Abraão, Isaac e Jacob, que são chamados os ‘justos’ (em hebraico:
iesharim, cujo singular é iashar).” (apud AUSUBEL, 1964, p. 86).
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26 ALTER, Robert, The art of Biblical narrative (New York: Basic Books, 1981), p. 47-62.
27 Grupo de dois versos; máxima em dois versos.
28 Posteriormente trataremos deste incidente detalhadamente.
29 Uma possível solução para a aparente duplicação ou parelha literária seria: “Uma fonte
múltipla da história do dilúvio pode ser vista também como imaginária. A narrativa de
Gênesis 6 não pode ser contrária nem separada do registro em Gênesis 7. O capítulo 6
descreve uma preparação para o dilúvio, e o capítulo 7 descreve sua vinda. Por exemplo,
há uma suposta discrepância entre Gênesis 6.19, em que um par de cada espécie é
chamado para entrar na arca, e Gênesis 7.2, onde Noé deve levar sete pares de animais
limpos. É óbvio que 6.19 é uma generalização e 7.2 é uma exceção relacionada apenas
aos animais limpos. (TENNEY, 2008, p. 897). Segundo muitos adeptos da Hipótese
Documental, afirmam que: “o relato do dilúvio (Gn 6.5-9.17) é uma combinação de J e P.
O relato P estaria inteiramente conservado, mas o J estaria incompleto. O relato tomado
como base seria P, no qual os elementos J teriam sido inseridos. (VOGELS, 2000, p. 17).
30 A crítica entende que no dilúvio as narrativas foram “combinadas”, enquanto as da
criação (Gn 1 e 2) foram “juntadas”.
31 “Um grande número de codornizes migra todos os anos da África para a Europa e a
Ásia, passando pela península do Sinai. Como têm o corpo pesado e não voam bem,
essas aves dependem em parte do auxílio de ventos fortes em seu voo, de modo que
não fiquem exaustas pela longa jornada. Por volta de 1900, os árabes que viviam ao
norte do Sinai apanharam com suas redes mais de um milhão de codomizes que
voavam baixo.” (Bíblia de Estudo Arqueológica, 2013, p. 212).
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anuais é repetido até cinco vezes (Êx 23.14-19, 34.23-26; Lv 23; Nm 28; Dt 16).
Segundo os adeptos desta teoria, o redator final que compilou esses diferentes
documentos não se preocupou com o problema, talvez nem tivesse consciência
dele. No dizer de J. P. Fokkelman, “mediante a junção de duas cenas fiferentes, o
escritor oferece uma visão binocular.”32 Os exemplos relacionados as narrativas
patriarcais, serão apresentados separadamente em outro capítulo.
As duplicatas não são pura e simplesmente repetições. Tais relatos parale-
los efetivamente apresentam semelhanças, mas também diferenças. Em vez de
ver nessas duplicatas uma questão de origem, pode-se ver nelas uma arte nar-
rativa criadora. A repetição não é marca de um ator ruim, pelo contrário, repetir
pode ter um valor didático. Em vez de se limitarem a apontar as dificuldades,
irregularidades e contradições do texto, os pesquisadores se admiram cada vez
mais diante dogênio do autor ou redator que nos legou essa história literária,
artística e maravilhosa que são as narrativas patriarcais.
Segue abaixo, a fim de ilustração, uma tabela que apresenta a divisões de
fontes da narrativa do dilúvio segundo a Hipótese Documentária:33
32 Narrative art and poetry in the Books of Samuel: a full interpretation basead on stylistic and
structural analyses (Assen: Van Gorcum, 1981), vol. 2, p. 203.
33 GOODER, 2005, p.38-39.
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Pelo contrário, a repetição, dentro da prosa hebraica, pode ser ligada com
o uso hebraico (e de fato, semítico) característico da repetição para efeito
de ênfase. As ideias são compreendidas, na literatura hebraica, não pela
conexão lógica com outras ideias, mas mediante uma espécie criativa de
repetição que procura influenciar a vontade do leitor. (DOUGLAS, 1995,
p. 1262).
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Vale lembrar que a repetição era parte essencial das narrativas do Antigo
Oriente Médio. Os contadores de histórias repetiam os relatos duas ou
mais vezes (às vezes de perspectivas diferentes ou diferindo os detalhes),
e os narradores recontavam histórias paralelas (cf. as três ocasiões em que
um patriarca faz sua esposa passar por sua irmã; Abraão nos cap. 12 e 20
e Isaque no cap. 26; para um exemplo bem posterior, ver o relato da con-
versão de Paulo, em Atos 9.22 e cap. 26). Nas narrativas da Antiguidade,
a repetição era vista não como evidência de múltipla autoria, mas como
confirmação de um único autor. (Bíblia de Estudo Arqueológica NVI, 2013,
p. 15).
Não existe razão para que a história e a arte literária não possam existir
lado a lado... a repetição é muitas vezes utilizada para apresentar uma
narrativa de mais de um ponto de vista. Por exemplo, 2Samuel 18 des-
creve o lamento de Davi sobre Absalão de três perspectivas: a do próprio
Davi, a de Joabe e a de todo o povo, intensificando assim a sua angústia.
(OSBORNE, 2009, p. 268).
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36 FISHBANE, M. Composition and Structure in the Jacob Cycle (Genesis 25.19— 35.22). JJS n°
26, 1975, pp.15-38. Republicado em Text and Texture: Close Readings of Selected Biblical Texts.
Nova York: Schocken, 1979, pp. 40-62.
37 W alters, S. D. Jacob Narrative. ABD nº 3, 1992, pp. 599-608. Composition and Structure
in the Jacob Cycle (Genesis 25.19—35.22, em JJS n° 26, 1975, pp. 15-38.
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sando estabelecer sua leitura correta ou original. Esses termos são praticamente
deixados de lado atualmente, e a crítica contemporânea assistiu à emergência
de novas perspectivas que se baseiam em abordagens literárias e sociológicas
na busca do significado dos textos.
A crítica histórica da Bíblia começou seriamente no século XVIII, flores-
ceu no século XIX, e dominou o cenário das pesquisas bíblicas no século XX. O
desenvolvimento da crítica bíblica se deu segundo parece, pela língua francesa,
sobretudo a partir do século XVII, para designar a arte de emitir uma opinião
qualificada sobre obras literárias. Segundo La Bruyère a crítica:
Muitas vezes, não é uma ciência. É uma função em que mais saúde que
espírito se torna necessária, mais trabalho que capacidade, hábito mais
que gênero. Se proceder de um homem que possua menos discernimento
que leitura e que por certos capítulos se exerça, corrompe os leitores e o
escritor. (STEINMANN, 1960, p. 7).
63
Temos que ser cautelosos, pois alguns críticos partem da intenção de des-
truir a fé, por causa de alguma distorção psicológica que os leva a destruir em
vez de edificar. Alguns deles parecem indignados diante da Igreja cristã e seus
ensinos. Outros sentem-se insatisfeitos com o próprio cristianismo.
Em contrapartida alguns conservadores fazem parecer importante para
a fé àquilo que, não tem importância. É necessário, pois um equilíbrio ao se
fazer uma crítica no campo bíblico e teológico. A verdadeira crítica não parte
do pressuposto de destruir a autoridade e ensinamento das Escrituras. Tanto
os críticos radicais quanto os críticos conservadores precisam evitar cuidadosa-
mente preconceitos. Segundo E. J. Young (1964, p. 12): “... a chamada moderna
escola crítica se baseia sobre certas pressuposições filosóficas que do ponto de
vista Cristão são negativas em seu caráter e revelam um conceito inteiramente
inadequado sobre Deus e a revelação.”
Segundo Geisler (2002, p.116) segue abaixo um quadro comparativo en-
tre a Crítica positiva (conservadora), e a Crítica destrutiva (liberal):
Crítica positiva
Crítica negativa (destrutiva)
(construtiva)
Base Sobrenaturalista Naturalista
O texto é “inocente até que O texto é “culpado até que
Regra
prove ser culpado”. prove ser inocente”.
A Bíblia é completamente A Bíblia é parcialmente
Resultado
verdadeira verdadeira
Autoridade
Palavra de Deus Mente do homem
final
Papel da Descobrir a verdade Determinar a verdade
razão (racionalidade) (racionalismo)
64
No século XIX a crítica bíblica teve maior aceitação e difusão, devido a vá-
rios fatores entre eles o “espírito da época”. E nesta mesma época o Liberalismo
Teológico se propagou, tendo como seu território a prática da crítica bíblica. Si-
multaneamente ao se aplicar a Bíblia à crítica literária, o Pentateuco como parte
da Bíblia sofre duras críticas, assim, para analisar as interpretações que o Pen-
tateuco sofreu é necessário analisar juntamente a Crítica Bíblica e suas escolas.
Do ponto de vista técnico, não há problema algum nisso e mesmo os te-
ólogos conservadores tendem a concordar com esta característica. Na realidade,
a própria Bíblia restringe para esta condição o seu estudo, tal como podemos
observar em Deuteronômios 4.2, Isaías 28.10, Mateus 5.18-19, 2 Pedro 1.20-21,
Apocalipse 22.18-19, dentre outros. Ou seja, as Escrituras não permitem, em
hipótese alguma, interpretações parciais, pessoais e tão pouco tendenciosas.
Seu estudo deve ser impessoal, reconhecendo sua autossuficiência explicativa e
sempre levando em consideração o todo. Estudar a Bíblia, partindo de um pres-
suposto de que ela seja um livro qualquer, de forma alguma pode ser encarada
como uma abordagem imparcial. É a negação intelectual de todas as evidên-
cias que apontam para sua singularidade. É uma postura, portanto, questionável
frente às definições da hermenêutica do criticismo bíblico.
Uma vez que se neguem as evidências que apontem para o caráter singu-
lar da Bíblia, os proponentes do criticismo bíblico procuram, com os conceitos
da hermenêutica e heurística, descobrir em que época aqueles escritos foram
feitos, como eles foram elaborados, a localidade de sua confecção e porque cada
um deles foi produzido. A conclusão por este método parcializado gera elemen-
tos contrários ao posicionamento cristão, judaico e qualquer outro seguimento
que se baseie nas Escrituras como fundamento de sua crença. Como exemplo
disso, podemos citar a alegação de que Moisés não teria escrito o Pentateuco e
que as narrativas patriarcais não passam de lendas; e que, os primeiros textos
hebraicos teriam sido escritos apenas por volta do século X a.C. Sendo assim,
toda a suposta “estória” produzida anteriormente e boa parte da posterior, não
passariam de uma coleção de antigas lendas do povo judeu, sem qualquer fun-
damento histórico que as sustente. Já seria muito se fosse apenas isso. Suas
conclusões apontam, ainda, que esses livros do Antigo Testamento foram pro-
duzidos por etapas ao longo de vários séculos, sendo a maioria por interesse
política ou apenas ideológica.
Em relação aos escritos do Novo Testamento, os críticos afirmam que
os evangelhos foram reescritos ou reeditados várias vezes, no final do primeiro
65
No Antigo Testamento
66
No Novo Testamento
38 O “documento Q” é uma hipótese levantada por alguns estudiosos para explicar a origem
de alguns dos ditos de Jesus que aparecem em Mateus e Lucas, mas não em Marcos.
Sua existência continua sendo motivo de especulação. Para uma posição favorável, ver,
por exemplo, MACK, Burton L. O evangelho perdido: O livro de Q e suas origens cristãs.
Rio de Janeiro: Imago, 1994; THOMAS, Robert L.; FARNELL. F. David. The Jesus crisis:
the inroads of historical criticism into evangelical scholarship. Grand Rapids: Kregel
Publications, 1998, p. 136-140. Para uma posição contrária, ver o capítulo “Adieu to
Q” [“Adeus a Q”] em EDWARDS, James R. The Hebrew Gospel and the development of the
synoptic tradition. Grand Rapids: Eerdmans, 2009.
67
Novo Testamento de forma geral. As questões que eles colocaram foram: Qual
foi a mensagem principal de Jesus? Como essa mensagem se relaciona ao Juda-
ísmo? Por acaso essa mensagem fala à realidade de hoje?
A descoberta dos Manuscritos do Mar Morto em 1948 revitalizou interes-
ses na possível contribuição que a arqueologia poderia fornecer para ajudar a
compreender o Antigo Testamento e Novo Testamento. Joachim Jeremias e C.
H. Dodd produziram estudos linguísticos que tentaram sistematicamente identi-
ficar camadas nos evangelhos que pudessem ser atribuídas a Jesus, aos autores,
e à Igreja Primitiva; Burton Mack e John Dominic Crossan expuseram o meio
social da Judéia do século I; e os estudiosos de “Jesus Seminar” procuraram ve-
rificar o que poderia ser considerado histórico nos evangelhos.
John Dominic Crossan em sua obra O Jesus Histórico: A Vida de um Cam-
ponês Judeu do Mediterrâneo, de 1991 (publicado em português em 1994), em-
prega os apócrifos Evangelho de Pedro e especialmente o Evangelho de Tomé
para a reconstrução do Jesus histórico. Segundo Crossan, essas duas obras são
mais antigas que os evangelhos canônicos e contêm informações importantes
que não foram incluídas em Mateus, Marcos, Lucas e João. Essa atitude de Cros-
san é característica dos demais membros do “Jesus Seminar” e de muitos outros
eruditos neotestamentários críticos, que aceitam a autoridade dos evangelhos
apócrifos, especialmente os gnósticos, acima daquela dos canônicos.39
Hoje a atenção dos críticos estão voltadas particularmente para as raízes
“judaicas” do Jesus histórico, e sua formação nas tendências políticas e religio-
sas do primeiro século na Palestina (Bruce Chilton, Geza Vermes, Marcus Borg,
etc.).
68
69
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71
72
ANÁLISE HISTÓRICA,
ARQUEOLÓGICA, CULTURAL E
BÍBLICA
73
74
2 A história do pai de Abraão e de seus filhos são introduzidas pela expressão tôledôt,
ao passo que a de Abraão começa com uma palavra de Deus: “Então o Senhor disse a
Abraão...” (Gn 12.1). A história de Abraão não é como as outras.
75
Abraão, Issac e Jacó não parecem mais, doravante, figuras isoladas, quanto
menos reflexos da história hebraica posterior; parecem atualmente ver-
dadeiros filhos de sua época, trazendo os mesmos nomes, deslocando-se
sobre o mesmo território, visitando as mesmas cidades (especialmente
‘Harran e Nahor), submetidos aos mesmos costumes que seus contempo-
râneos. Em outros termos, os relatos dos patriarcas têm de cabo a rabo um
fundo histórico, ainda que a longa transmissão oral dos poemas originais,
e em seguida das sagas em prosa, que se encontra na base do texto atual
do Gênesis, tenha sem dúvida deformado consideravelmente os aconteci-
mentos originais. (apud VOGELS, 2000, p. 27).
76
Individualmente: Abraão (Gn 28.13), Isaque (Gn 31.42; 32.9) e Jacó (Gn
29.1; 30.1); e os três patriarcas juntos: Abraão, Isaque e Jacó (Êx 3.6,15,16; 45;
cf. Dt 6.10; 1 Cr 29.18 na oração de Davi).
Um modo de determinar o espaço cronológico de personagens históricos
é considerando seus nomes. Nomes tendem a refletir um ambiente cultural es-
pecífico no tempo. As principais exceções são nomes imortais tirados de gran-
des personagens do passado, mais frequentemente figuras bíblicas. Por esta
razão sempre teremos Davis, Marias, Joãos e Paulos.
Parentes mais próximos de Abrão, como seu bisavô Serugue, seu avô
Naor e seu pai Terá (e o próprio nome de Abrão). Pesquisadores confirmaram
que estes nomes aparecem em antigos textos assírios e babilônios e aqueles
textos neo-assírios e correspondem aos lugares na região Eufrates-Habur da Si-
ro-Mesopotâmia.
77
3 Naor, irmão de Abraão (Gn 11.26), gerou oito filhos com sua esposa e quatro com sua
concubina, que vieram a ser os ancestrais das 12 tribos arameias, assim como Ismael,
filho de Abraão, se tornou o ancestral de 12 tribos (Gn 17.20; 25.12-16) e seu neto, Jacó,
o ancestral das 12 tribos de Israel (Gn 35.22-26; 49.28).
4 Naaraim ficava na parte norte da área que mais tarde seria chamada Mesopotimia pelos
gregos (“entre os rios”). Provavelmente nomeada depois do tempo do irmão de Abraão
(Gn 24.15; 11.26).
78
assírios tardios datados do século XVII a.C. referem-se a ela como Til Nakhiri,
que significa “monte de Naor”. Embora a localização exata de Naor seja desco-
nhecida hoje, numerosas referências nos textos antigos a situam no vale do rio
Balikh, ao sul de Harã.
Terá gerou Abraão com a idade de 70 anos e morreu com 205 anos (Gn
11.26,32). Uma cidade chamada Til Turahi (“monte de Terá”) é mencionada em
textos assírios do século IX a.C. como sendo a região norte de Harã, também no
rio Balikh. (ver Bíblia de Estudo Arqueológica, 2013, p. 23).
Os nomes patriarcais inserem-se na onomástica5 amorrítica, a língua semí-
tica ocidental mais antiga que podemos ter acesso, ainda que limitadamente. O
nome “Abrão”, só mudado para “Abraão” a partir de Gn 17.5, deriva do amorreu
‘ab ram, raiz rwm (= pai que é exaltado) forma compacta da lomga ‘abiram (Nm
16.1, 12, 25, 27; 1 Rs 16.34), podendo ou não ter por detrás o semítico oriental
ou acádico Abu r’m (= pai que ama). O nome Abraão é, como se vê, e como era
usual no mundo amorrítico, um nome teofórico6, dado que, na Síria-Palestina do
II milênio a.C., o deus El tinha o título de “deus-pai” (= il ab). “Abraão” ‘ab hamôn
(= pai da multidão). Este ‘abraham pode ser o equivalente de Aburahana, que
aparece nos textos de execração egípcios (séculos XIX-XVIII a.C.).
Os nomes de Isaque e de Jacó são nomes breves, certamente longos na
sua forma original – então formados por um verbo no imperfeito (yitshaq =
sorrir, ser favorável; ya’qob = proteger), seguido do sugeito (‘el, ‘ab). O nome
pleno Yitshaq-‘El siguinificaria “Deus ri, é favorável” ou “que Deus ria, que seja
favorável”. Na Bíblia, o fato de YHWH “rir” nunca está associado com favor, mas
sempre com desprezo e zombaria (Sl 2.4; 37.13; Hc 1.10). Não conhecendo o
primeiro siguinificado, e não podendo recorrer ao segundo, a Bíblia explica o
nomde de Isaque recorrendo ao riso (tsahaq) de Abraão (Gn 17.17) ou de Sara
(Gn 18.12; 21.6) ou ainda à “brincadeira” (metsaheq) de Ismael com Isaque (Gn
21.9) e até ás “carícias” (tsahaq ‘et) de Isaque a Rebeca (Gn 26.8). Quanto ao
nome pleno de Ya’qub-‘El, ele siguinificaria “Deus protege” ou “que Deus pro-
teja”. Devemos notar que a raiz ‘aqab entra na composição de muitos nomes
amorreus7, com o siguinificado de “proteger”, que desapareceu no cananeu e
5 A onomástica (do grego antigo ὀνομαστική, ato de nomear, dar nome) é o estudo dos
nomes próprios de todos os gêneros, das suas origens e dos processos de denominação
no âmbito de uma ou mais línguas ou dialectos.
6 Um nome teóforo ou teofórico (do grego antigo ϑεοϕόρος, composto de ϑεο- “deus” e
-ϕόρος “portador”) na onomásticaé todo nome que contém elementos alusivos a Deus ou
a deidades.
7 “Povo conhecido como amurru, controlou partes da Síria e da Babilônia, mas a palavra
‘amorreu’ é usada na Bíblia como generalização de uma classe étnica, referindo-se, assim,
79
Os nomes dos parentes mais próximos de Abrão, como seu bisavô Seru-
gue, seu avô Naor e seu pai Terá9 (e o próprio nome de Abrão). Pesquisa-
dores confirmaram que estes nomes aparecem em antigos textos assírios
e babilônios e aqueles textos neo-assírios e correspondem aos lugares na
à população geral da Terra Santa (e.g., Gn 15.16). Desse modo, o termo é essencialmente
intercambiável com ‘cananeu’. Em geral, porém, o termo ‘amorreu’ se refere à população
das montanhas (e.g., Nm 13.29) e é usado especialmente para designar os dois reis da
Transjordânia, Seom e Ogue, os quais foram subjugados sob a liderança de Moisés (Nm
21.21-31). Outros centros amorreus eram Ai, Hebrom, Jarmute, Jerusalém, Eglom e a
região do Líbano.” (Bíblia de Estudo Arqueológica, 2013, p. 265).
8 Quantas esposas teve Esaú? Gênesis 26.34 afirma que Esaú casou-se com Judite, filha
de Beeri, heteu, e com Basemate, filha de Elom, heteu. Entretanto, Gênesis 36.2-3
afirma que as esposas de Esaú eram Ada, filha de Elom, heteu; Oolibama, filha de Aná;
e Basemate, filha de Ismael. Esaú casou-se com a filha de Elom chamada Basemate ou
com a sua filha Ada? Teve então Esaú duas, três ou quatro esposas? As esposas de Esaú
foram quatro: Judite, a filha de Beeri; Basemate, que também tinha o nome de Ada, filha
de Elom; Oolibama, filha de Aná; e Basemate, filha de Ismael. A razão por que Judite
não é mencionada em Gênesis 36.2-3 é porque ela não lhe deu filhos, e Gênesis 36 é um
registro dos “descendentes de Esaú”. Ainda, era uma prática comum as pessoas serem
conhecidas por mais de um nome. Aparentemente Basemate, filha de Elom, também
tinha o nome de Ada, e desta forma é que ela é identificada em Gênesis 36:2, para
distingui-la da outra Basemate, que era filha de Ismael. Esaú teve assim quatro esposas.
9 Alguns estudiosos identificam o nome Terá como sendo uma forma da palavra hebraica
yareah “lua”, o que pode sugerir que o seu nome revelava qual era sua orientação
religiosa. Quando Terá e sua família deixaram a cidade de Ur, reestabeleceram-se em
Arã, um outro importante centro de adoração ao deus Sin.
80
81
cais acusa qualquer referência a YHWH ou a Baal, como será usual na época
mosaica.10
É notável que vários nomes de pessoas da família de Abraão sejam tam-
bém nomes de cidades. O irmão de Abraão se chama Harã (Gn 11.27), e a famí-
lia dicide se instalar em Harã (Gn 11.31). Serugue (Gn 11.22), nome de um dos
ancestrais de Abraão, é também o nome de uma cidade situada entre Harã e o
Eufrates. Naor, o nome de seu avô (Gn 11.24) e do irmão de Abraão (Gn 11.27), é
também o nome de uma cidade a sudeste de Harã. Terá, o pai de Abraão, tam-
bém recebe o nome de uma cidade. Vale ressaltar que todas estas cidades estão
próximas a Harã, no noroeste da Mesopotâmia.
É certo que seus nomes não foram identificados em nenhum dos docu-
mentos originais antigos, embora os nomes de outras figuras bíblicas, Ezequias,
rei de Judá no século VIII a.C.; Sambalate, governador de Samaria, no século V
a.C., o rei Davi do décimo século a.C., foram encontrados. Mas a ausência dos
nomes dos patriarcas no extra-registro bíblico histórico é, em si, inconclusiva:
Ausência de evidência não é evidência de ausência. O que o futuro trará, não po-
demos saber, exceto que ele será cheio de surpresas, como a recente descoberta
da inscrição da Casa de Davi atesta.
Alguns críticos buscaram até mesmo negar a historicidade dos patriarcas
Abraão, Isaque e Jacó, atribuindo-lhes nomes de divindades distintas, vejamos:
A teoria de A. Alt (“Der Gott der Vâter”, 1920, em “Kleine Schriften” I [Beck,
1959], p. 24), de que o Deus de Abraão, o Temor de Isaque e (49.24) o
Poderoso de Jacó eram originalmente três divindades distintas, foi erigida
precariamente numa teoria gratuita de que não havia relação entre os
três patriarcas, e que eram desconhecidos uns dos outros. Mas numerosos
exemplos mostram que o Velho e o Novo Testamentos deleitam- se em
multiplicar nomes para o Deus Único (cf., por ex., SI 18.2; Ap 15.3), ao
passo que quanto à relação paterno-filial dos patriarcas, este é o pivô dos
capítulos centrais de Gênesis, em torno do qual tudo gira sobre a promessa
de um filho a Abraão e a eleição do filho mais novo de Isaque. (KIDNER,
2001, p. 155).
Os nomes Abraão, Isaque, Labão, Jacó e José parecem ter sido de uso bas-
tante comum durante este período, pois no segundo milênio a.C., Abraão
aparecia como A-ba-am-ra-ma, A-ba-am-ra-am, e A-ba-ra-ma, ao passo que
Jacó (Ya-’equb’-el) estava em uso como nome de um lugar na Palestina já
82
O nome Jacó conhecido entre os povos semitas há muito tempo, tanto que
em 2000 a.C. ele já aparece entre os escritos de Hamurabi como Yakkibu-
la. Há provas de que também era um nome bem conhecido entre os cana-
neus dos dias pré-abraâmicos, segundo os registros do templo Carnaque.
O nome de uma cidade capturada por Tutmés III também é semelhante
à palavra hebraica Jakob-el. (Bíblia de Estudo Arqueológica, 2013, p. 44).
Não devemos nos precipitar achando que o paralelo histórico dos nomes
por si só, seja suficiente para a historicidade dos patriarcas, mas os mesmos nos
fornecem um paralelo histórico importante, pois estes documentos extrabíblicos
nos permitem afirmar que os patriarcas trazem o nome de personagens históri-
cos do segundo século a.C.
O ambiente histórico das narrativas patriarcais aponta fortemente para
o contexto da primeira metade do segundo milênio. Os primitivos nomes dos
patriarcas remontam ao segundo milênio, Bright após listar diversos nomes do
período patriarcal que se encontram em textos do segundo milênio, conclui:
É certo que em nenhum destes casos nós provavelmente nem mesmo te-
nhamos uma citação dos patriarcas bíblicos. Mas a profusão de tais nomes
em textos contemporâneos demonstra claramente que a Alta Mesopotâ-
mia e o norte da Síria continham de fato uma população parecida com
os antepassados de Israel na Idade do Bronze média e séculos antes. Os
nomes são de tipo primitivo e não são certamente característicos da no-
menclatura israelita tardia. (BRGTH, 2003, p. 107).
83
Serugue – seu nome, que corresponde a um lugar chamado Sargi nas ins-
crições assírias do século XVII a.C., e ainda sobrevive como a moderna
Suruç, cerca de 56 quilômetros a noroeste de Arã.
Naor – Uma cidade chamada Naor é mencionada em 24.10 como o lar dos
descendentes de Betuel, outro filho de Naor (24.24). Essa ciddae também
é mencionada nos textos de Mari e da Capadócia dos séculos XIX e XVIII
a.C., bem como em inscrições assírias do século XIV a.C. Registros assírios
tardios datados do século XVII a.C. referem-se a ela como Til Nakhiri, que
significa “monte de Naor”. Embora a localização exata de Naor seja desco-
nhecida hpjel, numerosas referências nos textos antigos a situam no vale
do rio Balikh, ao sul de Harã.
11 P. Kyle McCarter, “The Patriarcal Age”, in Ancient Israel, ed. Hershel Shanks (Washington,
D.C.: Biblical Archaeological Society, 1988), p. 11, questionou esses dados sobre os
prefixos i/y argumentando que esses nomes continuaram nos períodos posteriores
também. Kenneth Kitchen refutou vigorosamente a alegação de McCarter, mostrando
que no segundo milênio, de um repertório em torno de 6 mil nomes da primeira metade
daquele milênio, 16%, ou 1.360 nomes começavam com o tipo amorita de i/y. No final
da idade do Bronze, Kitchen declarou que estes tinham caído para apenas 2 ou 3 por
cento de 0.5 por cento na idade do Ferro (Kitchen, “Patriarchal Age”, p. 90-92).
84
2. A historicidade de Gênesis 14
12 Numa caravana normal, que cobriria uma distância de 32 quilômetros por dia, a viagem
de Harã a Canaã, algo em torno de 800 quilômetros, teria levado pouco menos de um
mês. Siquém e Betel, localizadas na região montanhosa central, eram paradas usuais
para descanso e se tomaram os lugares sagrados mais importantes da história de Israel.
85
86
dos despojos que os reis inimigos haviam tomado da coalizão Cananeia. Quan-
do Abraão voltou, oo sacerdote-rei de Salém o encontrou e o abençoou. Abraão
deu o dízimo ao sacerdote-rei.
Gênesis apresenta essa batalha como real e verdadeira. Mas, de acordo
com a Hipótese Documentária do criticismo bíblico, essa história foi um acrés-
cimo posterior, sendo totalmente fictícia.
W. F. Albright observou que: “A despeito de nosso fracasso de até agora
fixarmos o horizonte histórico do capítulo 14, podemos ter certeza de que o seu
conteúdo é bem antigo. Há várias palavras e expressões não encontradas em
parte alguma do restante da Bíblia e que agora são reconhecidas como perten-
centes ao segundo milênio a.C. Os nomes das cidades da Transjordânia também
são considerados muito antigos”.13
Y. Muffs descreve Abraão de Gênesis 14 como aquele que “atua como um
chefe militar que, por meio de um tratado, é aliado de três destacados líderes
locais, possui um exército particular de mais de trezentos homens e, como bom
comandante, está preocupado com a porção de suas tropas e com a parcela do
despojo a que seus aliados têm direito.”14
Alguns críticos questionam se de fato o relato de Gênesis 14 faz parte da
narrativa de Abraão. Eles alegam que esta narrativa não se encaixa na narrativa
de Abraão. Porém, “um exame cuidadoso do contexto mais amplo mostra, con-
tudo, que o capítulo se encaixa em uma estrutura mais abrangente. O centro da
narrativa de Abraão são os capítulos 15-17, cujo foco são as promessas pactuais.
Esses capítulos são emoldurados por dois capítulos em que Ló desempenha pa-
pel importante (Gn 13-14; 18-19).” (PROVAN, 2016, p. 187).
Da mesma forma, alguns críticos questionam se o relato realmente faz
parte da narrativa de Abraão, afirmam que, em outras passagens na narrativa,
Abraão é retratado como um simples nômade, vagando de uma cidade para ou-
tra, ao passo que aqui é apresentado como um guerreiro, obtendo vitória sobre
uma coalizão entrangeira relativamente grande. Porém, ele não era um simples
nômade, mas um líder que dispunha de riquezas imensas e que também tinha
aliados cananeus que lhe davam apoio.
Uma outra crítica que levantam contra esta narrativa de Gênesis 14, é a
de que em Gênesis 14.10, descreve que os reis de Sodoma e Gomorra caíram
em poços de betume, e a passagem, mais adiante, diz que o rei de Sodoma insis-
te em que Abraão receba os despojos. Entretanto, outros estudiosos respondem
87
88
Tão especial é este relato que os altos críticos têm sido forçados a cha-
má- lo de farsa ou creditá-lo a uma fonte isolada (separada das supostas fontes
documentais da escola da Hipótese Documentária usadas na composição do
livro de Gênesis e baseada no uso de diferentes nomes para Deus no texto e
supostamente na influência sacerdotal referida como J = Javista, E = Eloísta,
S = Escola Sacerdotal). O que torna este capítulo tão impressionante é sua
listagem de nomes e lugares tão detalhada e precisa (tanto estrangeiros como
locais), várias vezes explicada incidentalmente por mais nomes contemporâ-
neos, como “o vale de Sidim” para “o mar Salgado” (mar Morto v. 3). Ou “o
vale de Savé” para “o vale dos Reis” (o baixo “vale do Cedrom” v. 17). Tais
esclarecimentos literários estão entre os traços que indicam que este capítulo
tenha a marca da antiguidade. Apesar do fato de que aqueles reis nomeados
em Gênesis 14 ainda tenham que aparecer nos relatos bíblicos cuneiformes,
nós sabemos que os nomes certos estão conectados com os lugares certos.
Sabemos disso porque enquanto os personagens específicos não são men-
cionados fora da narrativa do Gênesis, tais nomes aparecem em vários textos
mesopotâmios deste período.
Nenhum dos reis invasores ou dos acontecimentos mencionados em
Gênesis 14 foram identificados ou confirmados por evidências arqueológicas,
apenas por evidências extrabíblicas, que lançam luz sobre o texto e apoiam
sua historicidade. Não há razão para tratá-lo como ficção, como o fazem certos
eruditos.
A dificuldade de se compreender o contexto histórico de Gênesis 14, tem
produzido duas ações em si negativas: ou cria-se uma atitude de completo ceti-
cismo acerca desse acontecimento, produzindo a teoria de que tudo não passou
de fábula histórica ou, por outro lado, desenvolve-se o desejo de identificar cada
um desses personagens com indivíduos bastante conhecidos do Oriente Médio.
“É muito mais prudente dizer hoje que apesar do relato possuir cada marca de
credibilidade histórica, não há como fazer a identificação desses reis do Orien-
te.” (MERRILL, 2002, p. 26). Embora as pessoas listadas em Gênesis 14 não
possam por enquanto serem ligadas a indivíduos em histórias extrabíblicas, os
nomes são por outro lado muito familiares no período do Bronze Médio.15 Não
há nada no relato bíblico que tenha sido reprovado pelas novas descobertas lite-
rárias, e nem existe qualquer incongruência com o ambiente histórico onde tais
narrativas tiveram lugar.
89
“Anrafel, rei de Sinar” parace ser um perfeito nome típico do oeste semí-
tico, da baixa Mesopotâmia, ilustrado em fontes acadianas e amoritas, e
talvez ligado ao nome amorita Amud-pa-ila. “Sinar” é usado em textos
egípcios como sendo o nome da Babilônia. “Arioque, rei de Elasar” parece
semelhante aos nomes Mari amorita ou Nuzi hurriano de Arriyuk(ki) ou Ar-
riwuk(ki). “Quedorlaomer, rei de Elão” é com toda certeza um nome elami-
ta, pois ele tem o tipo de nome Kudur (“servo de X”), que é encontrado em
pelo menos três nomes reais. A segunda parte do nome de Quedorlaomer
é Lagamar, a principal deusa do panteão elamita. “Tidal, rei de Goim” é
um nome heteu bem comprovado, da mesma forma que Tudkhalia. Diz-se
que Tidal foi rei sobre o “povo/grupos”, um fato que sem dúvida reflete
a fraguimentação política presente no império heteu em Anatólia (atual
Turquia) no período entre os séculos 19 e 18 a.C. (KAISER, 2007, p. 82).
90
O que podemos tiras da análise dos nomes destes reis, é que, os nomes
parecem autênticos, mesmo não sendo possível identificar com certeza esses
reis com nomes mencionados fora da Bíblia.
Se esse texto tivesse sido criado para atender aos propósitos da época pós-
-exílica, o termo há muito já tinha se perdido e não faria sentido para seus
leitores; na verdade, não seria nem mesmo possível fazer uma “arcaização
deliberada” do texto, visto que a palavra teria, há muito, desaparecido do
vocabulário de qualquer pessoa no período de sua suposta redação. (KAI-
SER, 2007, p. 83).
91
e com ele conversa normalmente. Não há razão, seja arqueológica ou de qualquer outra
origem, para que se questione quanto à personalidade histórica de Melquisedeque.
“Malki-Sedéq”, pode ter várias significações: “(o dues) Sédek é meu rei”, “(o rei) Milku
é justo” ou “meu rei é justo”. Seu nome faz referência a justiça. É o rei de “Shalém”. A
tradição judaica identificou Shalêm a Jerusalém (Sl 76.2). A palavra shalêm assemelha-
se também a shalom, a paz. Além de rei, é sacerdote de El-Elyôn, o Deus Altíssimo. É
o primeiro sacerdote mencionado na Bíblia. Melquisedeque reconhece que a mão do
Deus Altissímo esteve presente na pessoa de Abraão. Descobriu que Abraão foi uma
benção para as nações. Nos tempos antigos, a deidade cananeia principal era chamada
“altíssimo”, “senhor do céu” e “criador da terra”. A terminologia e a localização (Jerusalém
estava na Canaã central) fazem supor, portanto, que Melquisedeque era um rei-sacerdote
cananeu. Abraão, no entanto, ao identificar o “Deus Altíssimo” de Melquisedeque
como “o SENHOR” (cf. v. 22), deu testemunho do Deus único e verdadeiro, a quem
Melquisedeque passara a conhecer.
17 Kitchen, Ancient Orient and the Old Testament, pp. 46, 73; “The Patriarchal Age: Myth or
History?”, Biblical Archaeology Review, volume 21, n.° 2 (Março/Abril de 1995), p. 57.
92
termo usado para caracterizar vários povos que vieram como invasores.18 As-
sim, este rei era provavelmente um governante andarilho que assimilou várias
tribos e províncias em seus exércitos. Dado este entendimento e a mudança do
quadro político, é lógico que um rei elamita encabeçasse uma coalizão mesopo-
tâmica de cidades-estado e lançasse um ataque punitivo contra os rebeldes reis
cananeus. Depois deste período, e especialmente durante o primeiro milênio
a.C., o mapa político tornou-se completamente incompatível com as condições
necessárias para tal formação
Mas, mais a leste, a situação era completamente diferente. Na história da
Mesopotâmia e seus vizinhos, verificamos que as condições geopolíticas topam
com a situação em Gênesis 14 em apenas um período, a era dos patriarcas de
acordo com a cronologia bíblica.
Além disso, as campanhas militares da Mesopotâmia para o Levante estão
bem atestadas a partir do terceiro milênio a.C. (Akkad e Terceira Dinastia de Ur),
através do início do segundo milênio a.C. Uma guerra da aliança abraâmica contra
uma aliança dos reis do oriente no período dos patriarcas é certamente plausível.
Na verdade, um relato a partir do início do segundo milênio é semelhante
a Gênesis 14, embora do ponto de vista oposto, o da aliança dos reis orientais.
Em uma esplêndida inscrição de Iahdun-Lim de Mari, somos informados de que
Shamsi-Adad I da Assíria, chegara ao Líbano, avançou passando nas montanhas
de madeira e prosseguiram para o Mar Mediterrâneo; ele fez oferenda para ce-
lebrar o seu sucesso (como Abraão dizimou a Melquisedeque [ Gênesis 14.20])
e impusera seu governo e “tributo perpétuo” sobre os povos do Levante que ele
conquistou, que foi pago até ao ano da inscrição, quando Shamsi-Adad I derro-
tou uma aliança de quatro outros vassalos que se rebelaram.
A conquista, a servidão e a revolta descritas nesta inscrição estão em
paralelo em Gênesis 14.1-11, mas do ponto de vista oposto. Em suma, o tipo de
envolvimento militar descrito em Gênesis 14 está em casa no início do segundo
milênio a.C.
Por volta do século 18 a.C., porém, a situação mudou drasticamente na
Mesopotâmia. Os triunfos de Hammurabi da Babilônia e Shamsi-Adad I da Assí-
ria terminaram a era das alianças rivais, com as numeroas cidade-estado meso-
potâmicas desaparecendo para sempre. A partir de então, a terra foi dominada
por apenas duas potências, Assíria e Babilônia. Durante dois séculos (c. 1550-
1350 a.C.), elas partilhavam o poder com Mitanni, mas isso foi tudo.
18 Bruce Vawter, On Genesis: A New Reading (Garden City, Nova York: Doubleday, 1997), p.
188. A. E. Speiser, Genesis, Anchor Bible (Garden City, Nova York: Doubleday, 1983), pp.
107, 108.
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16.1 P 16.4-14 J
16.2 J 16.15-16 P
16.3 P 21.9-21 E
94
26.34,35 P 28.13-16 J
95
redator posterior. Ele propõe, em vez disso, que cada fonte sucessiva desenvolva
ou complete a tradição anterior. O javista não é a fonte mais antiga, como sempre
se afirmou, mas teria sido precedido por fragmentos escritos mais antigos. Ele se
refere assim, a um primeiro, e depois a um segundo estágio pré-javista. O javista
(J) retrabalhou esse material, ainda bem limitado, o completou e inseriu suas pró-
prias observações. Acrescentou, além disso, muitos relatos de sua autoria. Depois
disso, o autor sacerdotal (P) acrescentou alguns fragmentos, e uma última edição
é pós sacerdotal. Contrariamente à opinião bastante comum de que J dataria do
século X a.C., da época de Davi/Salomão, Van Seters situa J na época do exílio,
portanto na época em que se situava P. Para ele, P é pós-exílico.
É evidente que o autor de Gênesis não pretendia dar a Israel uma infor-
mação exata acerca do passado distante, e as narrativas não deviam ser entendi-
das assim. “Ele é impudentemente seletivo. ‘Somente aquilo que contribui para
a história de Deus – i. é, para a intenção teológica do texto - merece ser comen-
tado.” (GREIDANUS, 2009, p. 46). E ainda, “as narrativas de Gênesis podem ser
descritas como sermões dirigidos ao antigo Israel, cuja intenção é comunicar a
Israel a mensagem relevante de Deus.” (p. 47). Ou seja, não é prudente fazer
perguntas ao texto, que o autor não pretendia responder.
96
Isto aponta fortemente para uma autoria única do livro de Gênesis, este
tratamento sistemático não aponta para uma autoria de diversas fontes indepen-
dentes postulada pelos adeptos da Hipótese Documentária.
Tendo isso em mente, as etapas que foram necessárias para a composi-
ção de Gênesis perdem um pouco sua importância, pois não tratam se de tradi-
ções rivais disputando por autoridade, e o próprio autor não chama atenção para
as fontes da sua informação.
Segundo Canon Dyson Hague (1857-1935):
19 O termo “quiasmo”, ou “quiástico”, deriva da forma de letra graga chi (“X”, uma cruz ou
intersecção).
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neles. Todos os três foram instrumentos para alcançar um fim que extrapolou
em muito o tempo de suas vidas. São catalisadores de um processo e não sua
conclusão. Assim, ao lermos sobre a vida de Abraão em Gênesis, nosso principal
objetivo não é conhecermos o cotidiano do segundo milênio a.C, mas as pro-
messas de Deus para o futuro. Em última análise, nosso interesse é profético,
não histórico.
As narrativas patriarcais, seu valor como fontes de informação a respeito
da pré-história é considerado como mínimo, ou inteiramente nulo pela Hipótese
Documentária. Abraão, Isaque, Jacó eram comumente explicados como amte-
passdos epônimos de clãs, ou mesmo como figuras míticas, e sua existência real
era muitas vezes negada.
A cronologia e a historicidade das narrativas patriarcais, em certo ponto
estão sujeitas, a se o pesquisador está sujeito a aceitar a facticidade da informa-
ção contida em Gênesis. Caso argumente, baseado em qualquer informação,
que a vida longa dos patriarcas é impossível ou que as narrativas registram
acontecimentos não históricos, episódios legendários, tal pessoa não poderá di-
zer nada significativo a respeito da cronologia ou história patriarcal. “Rejeitar os
únicos dados disponíveis significa desprezar qualquer chance de reconstruir a
história primitiva dos hebreus.” (MERRILL, 2002, p. 73).
Prontamente muitos críticos alegam que os patriarcas foram figuras não
históricas, ou seja, figuras lendárias21, sobre isso Bright declara:
As tentativas antigas de não achar nos patriarcas mais que a criação livre
da lenda, antepassados epônimos de clãs, ou figuras atenuadas de deuses,
já foram abandonadas e de tal forma que não merecem hoje a mínima
discussão. O sabor de autenticidade das histórias nos impede que con-
sideremos os patriarcas como lendários, e a descrição deles, que nos é
apresentada, não tem nada de mitológico. (BRIGHT, 2003, p. 124).
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Não existe mais um “Antigo Israel”. Não há mais lugar para ele na histó-
ria. Temos certeza absoluta disso. E agora, uma das principais conclusões
desse novo conhecimento é que o “Israel bíblico” foi originalmente um
conceito judaico.27
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tória de Israel que desejassem ser reconehcidos como “críticos”. Van Seters até
mesmo propõe paralelos aos costumes patriarcais em textos neo-assírios, neo-
-babilônicos, persas e egípcios, todos posteriores ao século VII a.C. Da mesma
forma recusa qualquer validade de uma tradição oral pré-literária, não atribui
valor histórico algum a narrativa patriarcal.
Martin Noth, apresenta uma concepção intermediária entre a historicida-
de das narrativas patriarcais, vejamos:
“... eles eram homens de verdade, que viveram num momento dado como
personagens históricos”, mas depois de uma declaração positiva, ele
acrescenta: “... não dispomos de nenhuma prova, além do que já foi dito,
que nos permita propor algumas afirmações históricas definitivas no que
converne ao tempo, ao lugar, aos pressupostos e às circunstâncias da vida
dos patriarcas como seres humanos.” (1960, p. 122-123).
30 Ver: NOTH, Martin. The History of Israel. 2ª edição, New York : Harper and Row, 1960,
p. 121-127.
31 Ler um texto nunca é um procedimento neutro. Cada leitor aborda o texto a partir de
106
foram contadas por diversos clãs, que buscavam transmitir as histórias de seus
pais e fundadores. Vejamos a declaração de Noth: “Abraão é menos um indiví-
duo do que um símbolo ou personificação dos clãs israelitas.”32
Wellhausen, é o crítico mais representativo da escola Documentária, a
concluir que os relatos sobre Abraão tinha valor histórico nulo. A história de
Abraão seria a que teve maior proeminência e acabou prevalecendo sobre as
demais. E assim ele declara:
Na página 320 do seu livro, ele disse: “Abraão... é algo dificultoso para
interpretar. Isto não significa que, em tal conexão como esta, podemos
considerá-lo como um personagem histórico; podia, com mais probabili-
dade, ser considerado como uma criação livre de arte inconsciente. Talvez
seja ele a figura mais jovem no grupo e provavelmente foi num período
comparativamente posterior, que ele tenha sido colocado antes de seu
filho Isaque.”
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teis. (KITCHEN, 1995). Então, onde estamos? Será que os patriarcas realmente
viveram, ou não? E como podemos dizer?
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A tradição é uma entidade flexível que, à medida que o tempo passa, pode ser
modelada por interesses religiosos e etiológicos e por perspectivas mitológicas.
Ela tem grande força inerente, de forma que até mesmo a substituição da me-
mória da escrita somente ajuda a controlar o processo em vez de interrompê-lo.
Na fase oral de transmissão, isto é, antes que surja uma tradição historiográfica,
não existem controles eficazes, de modo que nem mesmo um esforço sério por
aqueles que transmitem os relatos passando-os adiante sem distorção é capaz
de impedir a reformulação deles.
Assim, as tradições patriarcais em particular, agora contidas no que Ewald
chamou de “Grande livro das Origens” (Gênesis – Josué) – ao qual atribuiu a
data do período da monarquia antiga -, devem ficar sob suspeita, pois surgiram
antes do início da historiografia em Israel (na era mosaica e pouco depois).
Ewald considerou, rejeitou a ideia de que não podemos conhecer nada acerca
da existência e do estabelecimento histórico dos patriarcas em Canaã. Preferiu,
porém, em vez disso, extrair tal história da tradição conforme achama possível.
(apud PROVAN, 2016, p. 49).
Sobre a origem do material de Gn 12-50, devemos nos atentar para a
possibilidade de que estas tradições, tenham se originado da transmissão oral,
mas não se pode deduzir com base nisso que essas tradições distorceram inevi-
tavelmente as memórias do passado. De um modo ou de outro, a civilização da
região mesopotâmica de onde, segundo o Antigo Testamento, Abraão procedeu
era uma região em que a escrita dominava já havia algum tempo. Portanto a
suposição de que nossas tradições de Gênesis foram transmitidas apenas de
forma oral é somente isso: uma suposição. “É igualmente possível que ainda
em uma etapa bem antiga fossem transmitidas em forma tanto escrita quanto
oral – permitindo assim a relativa estabilidade da tradição que a escrita produz,
mesmo em meio à relativa flexibilidade que a tradição oral admite -, ou que a
forma escrita predominasse até mesmo no início.” (PROVAN, 2016, p. 95).
Uma vez que os sistemas de escrita estavam em uso por volta do III milê-
nio a.C., o que torna desnecessário presumir que tenha existido um longo
período de transmissão oral entre os próprios fatos e sua documentação
em relatos escritos. Os povos do final do III e início do II milênio a.C. man-
tinham registros escritos e não dependiam da memória para os assuntos
que consideravam importantes. Os acontecimentos do período patriarcal
podem ter sido registrados logo após sua ocorrência em textos que o escri-
tor bíblico utilizaria mais tarde como fontes (Bíblia de Estudo Arqueológica
NVI, 2013, p. 73).
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É inconcebível que o público alvo original pensasse que Abraão não fosse
uma pessoa de verdade ou que sua mudança de Ur até Harã e daí para a
Palestina não fosse uma jornada real. É inconcebível que o autor de Gêne-
sis quisesse que seu público alvo pensasse nessas pesoas como “ireais”.
Por isso, os estudiosos que, para descrever o gênero das narrativa patriar-
cais, utilizam termos como “saga”, “ficção” ou “folclore” não estão se re-
ferindo tanto ao gênero de fato do texto quanto à sua falta de confiança
(por qualquer que sejam os motivos) na veracidade histórica do material.
(PROVAN 2016, p. 173-174).
33 The first historians: the Hebrew Bible and history (San Francisco: Harper and Row, 1988),
p. 8.
34 Geralmente se entende por “saga” um texto que possui um núcleo historio, mas com
inserções não históricas. “A ‘saga’, um termo escandinavo, tem sido definido como
‘uma longa narrativa tradicional em prosa, de estrutura episódica, desenvolvida em
torno de temas ou objetos estereotipados... A principal questão não resolvida com
a saga é se ela é histórica e quanto dela é histórico... apesar disso o termo pode ser
usado proveitosamente para denotar um tipo de literatura que é diferente na forma, no
conteúdo e no propósito de escrever história, é tão diferente que deve ser pregada de
maneira distintiva. (GREIDANUS, 2009, p. 43-44).
111
35 Foi publicado em 1872 por George Smith, tirado de uma tabuleta da biblioteca de
Assurbanipal em Nínive, trata-se de uma narrativa sobre o dilúvio babilônico. A
mais extensa composição literária proveniente da Mesopotânia. Gilgamesh foi rei
de Ereque (Gn 10.10) por volta de 2600 a.C. A epopéia é datada em cerca de 1600
a.C. Ereque, atual Warka, a 56 km do Tell Obeid, acima do vale do Eufrates. “Os
textos mesopotâmicos, entretanto, embora formalmente similares, são radicalmente
diferentes do Velho Testamento em conteúdo, significado e relevância. As similaridades
formais nem sempre são óbvias à primeira leitura. Há uma boa razão para isso.
Primeiro, a concepção cosmogônica e cosmológica de ambos é radicalmente diferente.
Segundo, a concepção da deidade é totalmente dessemelhante. Terceiro, o lugar e
o papel do homem no mundo e sua relação com as deidades é totalmente distinto.
Quarto, a concepção do mal, do pecado, do castigo, da morte e da imortalidade são tão
diferentes que é difícil usar os mesmos termos para referir-se a tais ideias... Dizer que
há certas similaridades formais entre a Bíblia e os textos mesopotâmicos é possível,
porque os homens participam da mesma natureza, dos mesmos temores, das mesmas
esperanças e metas gerais. O relato bíblico é original e universalmente aplicável.
Os outros são, como a Bíblia indica, produtos da mente e do coração humano, em
completo alheamento de Deus, mas, não obstante, procurando lidar com a realidade
da vida, mas em termos do homem e da projeção de sua vida, imaginação e desejos”
(GRONINGEN, 1995, p. 47-48).
36 Escritos em caracteres cuneiformes, os sete cantos do épico foram escritos em sete
tabletes e recuperados da biblioteca do imperador assírio Assurbanipal (669-626
a.C.) em sua capital, Nínive. Essa versão, embora tardia, retorna, quanto aos aspectos
políticos, aos dias de Hamurabi, o Grande, (1792-1750 a.C.) e além dele aos dias dos
sumérios, os primeiros habitantes da baixa Babilônia.” (UNGER, 2008, p. 41). “Este
material foi desenterrado em 1853, e entre as tábuas estavam cópias assírias das
narrativas da Criação e Inundação da Babilônia, subsequentemente decifradas, em
1872, por George Smith, estudioso do Museu Britânico. Magníficos baixos relevos
retratando a caça e outras cenas na vida real também foram recuperados do palácio
de Nínive, que em estilo representam o clímax da arte na Assíria.” (HARRISON, 2010,
p. 254). Hamurabi estava ansioso para estimular a adoração da divindade patrona
da Babilônia em todo o império, e com este objetivo introduziu modificações nas
tradições religiosas anteriores de Acade, para dar maior importância a Marduque, que
foi tornado o herói de uma grande epopéia da criação. “Embora as tábuas existentes
sejam, obviamente, cópias das anteriores, a presente forma da epopéia remonta à
época de Hamurabi e, como se poderia esperar é fundamentada por originais sumérios
ainda mais antigos.” (HARRISON, 2010, p. 59). “Muitos estudiosos já acreditaram que
a história babilônia da criação serviu de fonte para a sua contrapartida bíblica, porém
hoje poucos sustentam essa teoria. Na verdade, as diferenças entre os relatos babilônia
e bíblico são mais significativos que as semelhanças.” (Bíblia de Estudo Arqueológica,
2013, p. 888).
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Moisés estava ciente dos mitos pagãos, mas não os usou como fontes.
Ele escreveu com um propósito definido em mente; a saber, remover das
mentes e corações dos israelitas os conceitos totalmente inferiores de dei-
dade, das cosmogonias e cosmologias nas quais estas deidades estavam
envolvidas, da natureza do cosmos e da natureza e papel da humanidade
no cosmos. (GRONINGEN, 2002, p. 107).
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37 sabemos que Ur era uma cidade extremamente requintada (seus restos se encontram
no Iraque). À época de Abraão, Ur já era uma cidade antiga, fundada pelos sumérios
muitos séculos antes. Era o auge da civilização. No antigo Oriente Próximo ouvir
falar de Ur tinha o mesmo efeito que ouvir falar, em nossos dias, de Nova Iorque,
Londres, São Paulo ou algum outro centro importante de civilização. É verdade que,
durante essa época, Ur foi destruída pelos bárbaros e, com isso, perdeu prestígio,
mas provavelmente vamos pensar em Ur no apogeu. Em outras palavras, Ur é uma
cidade difícil de se deixar para trás.
38 PRICE, Randall. Arqueologia Bíblica. Rio de Janeiro: CPAD, 2006, p. 84.
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39 Nahum N. Sama, “The Patriarchs”, Genesis: World of Myths and Patriarchs, Ada Feyerick,
editora (Nova York: University Press. 1996).
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43 A fome era comum em Canaã, uma vez que a produtividade da região dependia da
estação das chuvas. O Egito era menos vulnerável à seca e à fome em razão do alagamento
anual do Nilo. Alguns arqueólogos e geólogos modernos encontraram evidências de uma
seca generalizadaque teria durado trezentos anos, ocorrida entre o final do III e início
do II milênio a.C., que corresponde tradicionalmente à época de Abraão. (ver Bíblia de
Estudo Arqueológica, 2013, p. 22).
12.11 A beleza de Sara é louvada no apócrifo Gênesis (um dos manuscritos do mar
Morto). Os critérios para se avaliar a beleza no antigo Oriente Médio, particularmente no
caso de uma mulher mais velha, seriam bem diferentes dos padrões modernos.
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Toda literatura deve ser interpretada à luz do tipo ao qual ela pertence.
Não devemos em absoluto simplificar em demasia as origens de Israel, porque
elas são muito complexas. Repetir a narrativa bíblica seria um procedimento
insípido e monótono. Qualquer pessoa poderia fazê-lo por si mesma. Deve-se
repetir que, no que respeita à historicidade da maior parte de seus detalhes, a
evidência externa da arqueologia não dá nenhum veredicto pró ou contra. Por-
tanto, fazer uma seleção rigorosa das tradições, de acordo com a historicidade
disto e negando a historicidade daquilo, é um método muito subjetivo, que só
reflete as predileções de cada um. (BRIGHT___________ Reconstruções hipo-
téticas, embora possam ser muito plausíveis, devem ser evitadas. Muita coisa
deve permanecer obscura. Mas também pode ser dito o bastante para nos cer-
tificar de que as tradições patriarcais estão firmemente ancoradas na história.
Gênesis 12—50 indica um período de Bronze Médio datado do mais
recente terceiro milênio aos meados do segundo milênio a.C. (2166-1805). A
evidência arqueológica para este período tem emergido na forma do Código
de Hamurábi, textos heteus e egípcios, e milhares de tabletes de argila da
cidade amorita de Mari (Tel Hariri), a cidade horita de Nuzi, e as cidades de
Leilan e Alalakh.
Assim como outras nações e povos, os patriarcas posseum o seu pró-
prio patrimônio histórico, cultural, religioso, as suas próprias características
familiares, sociológicas e lexicográficas. As narrativas patriarcais suscitam
questões literárias, históricas, culturais e religiosas. Os principais pontos dis-
cutidos e relevantes na arqueologia a respeito dos patriarcas, giram em torno
de três pontos: os movimentos dos povos, os nomes dos indivíduos e dos
lugares e os costumes. O esforço para resolver o problema da historicidade
dos patriarcas por meio de paralelos extrabíblicos resultou em conclusões
bem diferentes, e mesmo contraditórias. Mas, a postura conservadora que
demonstra e pleiteia a historicidade dos patriarcas, tem fortes fundamentos
como veremos.
131
50 James A. Sauer, “A Climatic and Archaeological View of the Early Biblical Traditions”,
Scripture and Other Artifacts: Essays on the Bible and Archaeology in Honor of Philip J.
King, M. D. Coogan, J. C. Exum e L. Stage, editores (Louisville, Kentucky: Westminster
John Knox Press, 1994), pp. 366-398.
51 A history of the Hebrews. London: Willians and Norgate, 1895.
132
52 Fontes cuneiformes confirmam a existência de Harã nos séculos XIX e XVIII a.C. A cidade
é mencionada em documentos assírios como Harranu (caminho), porque ficava na grande
rota comercial, entre, Nínive, Damasco e Carquemis. “O termo deriva do acadiano paddanu
(estrada) + Aram, ou seja ‘a estrada de Aram’. Vsto que este local é identificado como o Arã-
Naharaim (Aram dos dois rios) em Gênesis 24.10 (cf. 28.2) e, mais tarde, com o Aram em
27.43 e 28.10, pode até ser que o nome signifique nada mais que Aram.” (MERRILL, 2002,
p. 35). Embora a incerteza sobre o nome permaneça, os estudiosos estão convencidos de
que o nome Padã-Arã se refere à região ao redor de Arã ou à própria Arã. “Padã-Arã, isto é,
a planície de Arã, era o distrito situado perto de Harã, a noroeste da Mesopotâmia, onde se
estabelecera Naor, irmão de Abraão. Era a terra natal de Rebeca.” (KIDNER, 2001, p. 2001).
A viagem de Abraão de Harã a Canaã, algo em torno de 800 quilômetros, teria levado
pouco menos de um mês. “Gênesis é o único lugar no qual o nome geográfico Padã-Arã é
encontrado (e.g., 28.2), e seu significado e localização exatos são incertos. Muitos eruditos
acreditam que Padã-Arã seja o nome alternativo de Arã-Naaraim (‘Arã dos dois rios’; 24.10),
região ao norte do rio Eufrates, nas vizinhanças de Harã, que figura de forma proeminente
em Gênesis como o nome do ancestral dos patriarcas. O profeta Oséias faz referência à
jornada de Jacó na ‘terra [ou campo] de Arã’ (Os 12.12). Alguns estudiosos acreditam que
essa frase seja a tradução de Oseias do nome Paddan Aram, baseados no fato de um texto
ugarítico citar o ‘campo de Arã’ e porque o substantivo arábico paddan às vezes significa
‘campo’. Esse argumento, porém, permanece inconclusivo. Outros sugerem que Paddan
signifique ‘estrada’, por causa da palavra acádia similar paddanu (‘estrada’). Desse modo,
Padã-Arã significaria ‘estrada de Arã’. Um sinônimo de paddanu é a palavra harranu, que
pode ter sido o lugar de origem de Harã, cidade da qual Abrão partiu para Canaã. (ver Gn
12.4,5). Entendido dessa maneira, Padã-Arã poderia ser mesmo um nome alternativo para
Harã. Embora a incerteza sobre o nome permaneça, os estudiosos estão convencidos de
que o nome Padã-Arã se refere ou à região ao redor de Harã ou à própria Harã Harã foi um
dos mais importantes centros comerciais e religiosos do norte da Mesopotâmia, conhecida
por seu culto dedicado a Sin, o deus-lua. Os textos de Mari atestam que Harã era próspera
na época dos patriarcas. Durante cerca de mil anos depois dos patriarcas, Harã continuou
a florescer, graça a seu comércio com outras nações e suas atividades relacionadas ao deus-
lua Sin.” (Bíblia de Estudos Arqueológica, 2013, p. 47-48).
133
A cidade de Ur
A cidade de Harã
134
em 612 a.C., mas foi capturada em 609 a.C. pelos babilônios, que reavivaram
o decadente culto a Sin e restauraram Harã como próspero centro comercial
(cf. Ez 27.23).
Padã-Arã. Gênesis é o único lugar no qual o nome geográfico Padã-Arã é
encontrado (Gn 28.2), e seu significado e localização exatos são incertos. Mui-
tos eruditos acreditam que Padã-Arã seja o nome alternativo de Arã-Naaraim
(“Arã dos dois rios”; 24.10), região ao norte do rio Eufrates, nas vizinhanças de
Harã, que figura de forma proeminente em Gênesis como o nome do ancestral
dos patriarcas. O profeta Oséias faz referência à jornada de Jacó na “terra [ou
campo] de Arã” (Os 12.12). Alguns estudiosos acreditam que essa frase seja
a tradução de Oseias do nome Paddan Aram, baseados no fato de um texto
ugarítico citar o “campo de Arã” e porque o substantivo arábico paddan às
vezes sig-nifica “campo”. Esse argumento, porém, permanece inconclusivo.
Outros sugerem que Paddan signifique “estrada”, por causa da palavra acá-
dia similar paddanu (“estrada”). Desse modo, Padã-Arã significaria “estrada de
Arã”. Um sinônimo de paddanu é a palavra harranu, que pode ter sido o lugar
de origem de Harã, cidade da qual Abrão partiu para Canaã. (ver Gn 12.4-5).
Entendido dessa maneira, Padã-Arã poderia ser mesmo um nome alternativo
para Harã. Embora a incerteza sobre o nome pe’maneça, os estudiosos estão
convencidos de que o nome Padã-Arã se refere ou à região ao redor de Harã
ou à própria Harã.
A cidade de Hebrom
135
53 Até a morte de sua esposa, Abraão peregrinou por Canaã como pastor. Precisando de
um canteiro para sepultar Sara, comprou seu primeiro pedaço do vasto território que
Deus havia prometido a seus descendentes (Gn 15.18). A compra incluiu uma caverna
para servir de sepultura e o campo no qual ela estava situada, ambos conhecidos como
Macpela e localizados em Hebrom. O escritor de Gênesis observa que Sara, Abraão (25.9-
10) e Isaque (35.27-29) foram sepultados nessa caverna. Mais tarde, em em seu leito de
morte no Egito, Jacó/lsrael deixou instruções para que seus ossos fossem levados para
Canaã e sepultados nesse local com os de seu avô Abraão, sua avó Sara, seu pai, Isaque,
sua mãe, Rebeca, e sua esposa Lia (ver 49.29-32; 50.13). Não é de surpreender que os
israelitas lembrassem dessa caverna nas gerações seguintes. Um cercado monumental
foi construído sobre o local nos dias de Herodes, o Grande. Essa bela estrutura de 61 33,5
metros possui notável similaridade arquitetônica com o templo de Herodes no monte em
Jerusalém e ainda hoje está intacta. Dentro dela, sobre o chão, seis grandes cenotáfios
(túmulos vazios que servem como monumentos) medievais honram a memória dos
patriarcas e matriarcas sepultados ali. Uma igreja bizantina construída mais tarde
dentro desse cercado foi, vez por outra, transformada de igreja em mesquita, com as
sucessivas mudanças de governo (e, portanto, de religião) na área. Durante o século XIV
d.C, os muçulmanos selaram as estruturas subterrâneas que ficam abaixo do complexo,
ainda que algumas investigações clandestinas continuassem a ser feitas. Um estudo no
século XX, sob a direção de Moshe Dayan, de Israel, envolveu uma descida no período
noturno, com uma câmera, até o túmulo de uma adolescente de 12 anos de idade. Os
pesquisadores informaram a existência de uma escadaria, um longo corredor e uma sala.
(ver Bíblia de Estudo Arqueológica, 2013, p. 39).
136
A cidade de Berseba
Berseba foi assim nomeada por Abraão ou mais tarde por Isaque? Em Gê-
nesis 21.31 Abraão deu a essa cidade o nome de Berseba “poço do juramento”.54
Mas posteriormente em Gênesis 26.33, Isaque deu-lhe o mesmo nome. Mas é
altamente improvável que duas pessoas diferentes, em duas ocasiões diferentes,
viessem a chamar um mesmo lugar com o mesmo nome? Isto não é absoluta-
mente improvável, por duas razões. A primeira é que a segunda pessoa era filho
da primeira, e pode ter tido conhecimento da experiência de seu pai naquele
lugar. A segunda razão é que a experiência semelhante pela qual Isaque passou
ali pode lhe ter despertado a memória, fazendo-o lembrar-se do nome que seu
pai tinha dado àquele lugar. Assim, não é de todo incomum que Isaque tivesse
mais tarde renovado o nome que seu pai havia anteriormente dado àquele im-
portante lugar em suas vidas.
A cidade de Siquém
137
erguida ali durante a Idade do Bronze Médio (ca. 1900-1550 a.C.). Essa cidade
sofreu uma aniquilação desastrosa no final desse período, e grande parte do
entulho provocado por essa destruição foi encontrada nesse nível. Siquém foi
reconstruída durante a Idade do Bronze Tardio. O grande templo encontrado ali
é provavelmente o templo de El-Berite, mencionado em Juízes 9.46-49, o local
em que Abimeleque matou cerca de mil pessoas. Siquém parece ter sido uma
cidade bem modesta em grande parte da Idade do Ferro e no período pós-exíi-
co. Lemos em 1 Reis 12.25 que Jeroboão fez de Siquém sua residência por um
tempo, e a cidade também é mencionada em Jeremias em 41.4-8.
A condição de Siquém na Idade do Bronze Tardio representa o desafio
maior para os arqueólogos. Muitos acreditam que a cidade foi reconstruída por
volta de 1450 a.C. (depois de ter sido destruída no final da Idade do Bronze
Médio). Uma ideia aceita de modo geral é a de que um grupo de povos conhe-
cidos como os labayus dominou a região montanhosa central, usando Siquém
como base durante a Idade do Bronze Tardio II (ca. 1400 -1300 a.C., também
conhecida como a “era de Amarna” por causa das cartas de Amarna, ou seja, a
correspondência entre Canaã e o Egito datada desse período).
O problema com essa teoria é a referência bíblica à convocação feita
por Josué a Israel em Siquém para a realização das cerimônias de aliança, nas
proximidades dos montes Ebal e Gerizim (Js 8.30-35; 24.1). Nenhum encontro
com a cidade ou com o povo de Siquém é mencionado nesse contexto, o que
seria inevitável se o local estivesse ocupado por um poder regional naquele
tempo. Alguns historiadores sugerem que os siquemitas cooperaram com os
israelitas, mas isso é muito improvável, em razão da ordem de Deus aos is-
raelitas para que exterminassem os cananeus e não negociassem concessões
com eles (Dt 7.1,2).
A cronologia e a história da Siquém da Idade do Bronze Tardio estão lon-
ge de ser um assunto resolvido. A ideia de que os labayus dominaram a região
montanhosa de Siquém é especulativa. Também há incerteza acerca de quando
a primeira cidade, na Idade do Bronze Tardio, foi realmente construída. Isso
pode ter acontecido após a conquista. Pode-se concluir pelo silêncio de Josué 8 e
24 que não havia nenhuma cidade cananeia importante naquela área, na época.
Josué 24 menciona um lugar com esse nome, mas não faz alusão a um encontro
com os cananeus que habitavam a cidade. É difícil harmonizar as evidências
bíblica e arqueológica de Siquém com uma história coerente, e esse dilema é
agravado por outras questões que cercam a data da conquista. Como sempre, os
pesquisadores têm sido sensatos ao evitar conclusões precipitadas.
138
A cidade de Betel
55 um poço ali chamado “poço de Abraão”, embora sua autenticidade seja incerta (ver Gn
21.25).
139
ria dos intérpretes não está convencida da validade dessa teoria, uma vez que
parece evidente que a Betel bíblica era um lugar. De fato, alguns textos bíblicos
parecem atestar que Betel, em seus dias primitivos, foi uma cidade conhecida
como Luz (mencionada em Gn 28.19; 35.6; 48.3) e que foi renomeada por Jacó
(Jz 1.23). (ver Bíblia de Estudo Arqueológica, 2013, p. 59).
Além de todos esses locais da era patriarcal, surgiu um local pertencente
à linha de defesa das cidades no Neguebe56 em Berseba. Um dos nomes em-
pregados para desiginar essa linha de defesa construídas por Davie Salomão,
no século X a.C., foi preservado num relevo da parede no Templo Egípcio de
Amum em Carnaque (Luxor), chamado “O Forte de Abraão”. Yohaman Aharoni
acreditou que os egípcios conheciam a cidade israelita de Berseba por seu nome
antigo, indicando portanto, que ela foi assim chamada porque Abraão fora seu
fundador original (Gn 21.31-32). Roland Hendel sugeriu que “quando os gover-
nos construíam fortificações era natural que dessem o nome de homens ilustres
ou heróis nacionais. Abrão, com sua fama bíblica, certamente se encaixa nesta
descrição.”57
Como os filhos de Hete poderiam estar em Hebrom, em 2050 a.C, sen-
do que o seu reino situava-se onde hoje é a moderna Turquia? Hete foi o pro-
genitor dos hititas, cujo reino se localizou onde hoje é a moderna Turquia. Mas,
de acordo com alguma evidência arqueológica, os hititas não se sobressaíram
no Oriente Médio antes do reinado de Mursilis I, que começou a reinar por
volta de 1620 a.C. e que dominou a cidade de Babilônia em 1600 a.C. Entre-
tanto, em Gênesis 23 várias referências são feitas ao encontro de Abraão com
os filhos de Hete, que controlavam Hebrom no ano de 2050 a.C. aproximada-
mente. Como então a Bíblia pode dizer que os hititas controlavam Hebrom,
140
muitos anos antes de eles se tornarem uma força significativa nessa região?
Descobertas arqueológicas mais recentes de tábuas cuneiformes descrevem
conflitos em Anatólia (hoje Turquia), entre vários principados hititas de cerca
de 1950 a 1850 a.C. Mesmo antes desse conflito, entretanto, havia uma raça
de não-indo-europeus, conhecida como povo de Hati. Esse povo foi subjugado
por invasores indo-europeus por volta de 2300 a 2000 a.C., os quais adotaram
o nome Hati. Nas línguas semíticas, como no hebraico, Hati e Hiti tinham a
mesma grafia, porque somente as consoantes eram escritas, Nos dias de Ram-
sés II do Egito, a força militar dos hititas era suficiente para propiciar um pacto
de não-agressão entre o Egito e o império hitita, que estabeleceu limites entre
eles. Nesse tempo, o império hitita ia ao sul até Kadesh junto ao rio Orontes
(hoje Asi). Entretanto, outras evidências demonstraram que os hititas realmen-
te penetraram mais ainda para o sul, até a Síria e a Palestina. Embora o reino
hitita não tenha tido o seu ápice senão na segunda metade do século XIV a.C,
há suficiente base para se admitir a presença hitita em Hebrom no tempo de
Abraão, controlando aquela área.
O sítio israelita de Tel Dã nas montanhas de Golã preserva o nome da
antiga cidade de Dã, que muitos leitores da Bíblia se lembram por causa da des-
crição geográfica da Bíblia “De Dã até Berseba.” De acordo com alguns textos
egípcios de execração, o antigo nome de Dã era Laís (Jz 18.7,14). Esse teria sido
o nome da cidade no tempo dos patriarcas. As escavações arqueológicas neste
sítio revelaram uma grande cidade cananita com cultura altamente desenvolvi-
da, ricas tumbas, e enormes fortificações diagonais de defesa. A grande surpre-
sa na escavação foi descobrir no meio das fortificações um portão de tijolos de
4 mil anos com um arco (uma realização arquitetônica que pensava-se ter sido
inventada pelos romanos 2 mil anos depois!). Ainda mais incrível é o fato de que
este muro de tijolos ainda permanece de pé hoje exatamente como foi constru-
ído originalmente, completo até em cima.58 Esta serviu como principal porta
58 Segundo Avraham Biran, escavador do sitio, a razão de a porta de tijolos ter sido
preservada “nao foi por causa de alguma coisa que fizemos. Parece que o povo na
antiguidade, por algum motivo ou outro, o povo de Lais, os cananeus que viveram em
Lais, decidiram que a porta nao tinha mais utilidade. Por isso a bloquearam, encheram de
terra e depois cobriram tudo. Assim, com a terra natural da area, foram enterradas todas
as escadarias que davam acesso a cidade, de forma que tudo o que fizemos foi remover
a terra e descobrir a construcão de ambas as escadarias e eis aqui outra construcao de
pedra que provavelmente era um empreendimento que sustentava, que protegia a porta.
Talvez houvesse algo de errado na estrutura. Encontramos uma rachadura na torre e
talvez fosse essa a razão que levou aquele povo a deixar de usar a porta e abrir outra
porta em outro lugar” (Entrevista no Museu Skirball, da Hebrew Union College, Jerusalem,
em 12 de outubro de 1996).
141
para Laís, e teria sido usada por todos os que visitavam a cidade. De acordo com
Avraham Biran, isso poderia ter muito bem incluído os patriarcas:
59 Entrevista com Avraham Biran, Museu Skirball, Jerusalem (em 12 de outubro de 1996).
60 Roland Hendel, “Finding Historical Memories in the Patriarchal Narratives”, Biblical
Archaeology Review, volume 21, n.° 4 (Julho/Agosto de 1995), p. 58.
142
lugar de sua tumba onde ela está hoje ao longo da estrada de Hebrom, na
entrada para Belém, mas é duvidoso que este seja o lugar verdadeiro do en-
terro, baseando- nos numa comparação geográfica cuidadosa das descrições
bíblicas do livro de Gênesis, 1 Samuel e Jeremias. O relato de Gênesis diz que
Raquel foi enterrada na estrada para “Efrata (que é Belém)” (Gn 48.7). Belém
hoje está localizada ao sul de Jerusalém no território designado à tribo de Judá.
Porém, Jeremias, aludindo à morte de Raquel, diz que ela está “em [ou perto
de] Ramá” (Jr 31.15), uma área ao norte de Jerusalém (A-Ram dos dias atuais)
na herança tribal de Benjamim. Esta localização próxima a Ramá ou a Gibeá
(logo a leste de Ramá) parece sustentada pela declaração de Samuel de que o
“sepulcro de Raquel” estava “no termo de Benjamim, em Zelza” (1 Sm 10.2). O
lugar original de Efrata tem sido identificado com uma cidade antiga constru-
ída perto da fonte de Ein Prat, onde a estrada de Betel à fonte primeiro passa
entre Ramá e Gibeá. Somente a uma pequena caminhada deste local estão
localizadas cinco grandes estruturas de pedras que, desde os tempos antigos,
os árabes têm chamado de Kubr Bnai Yisrael (“Os Sepulcros dos Filhos de Isra-
el”). A origem destas estruturas retangulares permanece um mistério; tem sido
cuidadosamente sugerido que elas datem da era megalítica (2000-1500 a.C.),
uma delimitação de tempo que inclui os patriarcas. Durante o último século
Clermont-Ganneau identificou o lugar como a tumba de Raquel.61 Argumentos
posteriores em favor do local foram feitos recentemente pelo topógrafo e na-
turalista israelita Nogah Hareuveni.
Acerca da alegação de que “Abraão e sua lenda” foi criada num período
exílico ou pós-exílico, vejamos seis considerações relevantes:
Em primeiro lugar, se Abraão tivesse sido um mero personagem literário
inventado tardiamente, como se explica que o redator lhe tivesse dado o nome
de Abraão, que é um nome muito comum no Próximo Oriente Antigo, mas que
não será encontrado em nenhum outro personagem bíblico, em vez de lher dar
um nome teofórico, composto com o nome YHWH? Um tal nome seria mais
mosaico e israelita do que Abraão. E, na mesma linha de ideias, porque é que
nenhum dos nomes teofóricos dos relatos patriarcais se refere à YHWH ou a
Baal, como será usual na época normativa do Yahvismo mosaico?
143
62 De acordo com 2Crônicas 3.1, foi no “monte Moriá”, em Jerusalém, que Yahweh
apareceu a Davi, inspirando-o a construir um altar e oferecer sacrifício. Salomão mais
tarde, construiu o templo no mesmo lugar. Alguns estudiosos hesitam em identificar
esse local como o mesmo lugar em que Deus provou a fé de Abraão por meio do
quase sacrifício de Isawue, porque Gênesis 22.2 diz que Moriá é uma região, não uma
montanha. Além, disso, parece inverossímil que Abraão levasse madeira a Jerusalém,
área bem florestada, em vez de apanhá-la no lugar em que planejava fazer o sacrifício.
No entanto, não é de surpreender que Abraão partisse com todos os preparativos para
o sacrifício, pois talvez não quisesse arriscar a possibilidade de não encontrar madeira
seca após sua partida. Além disso, pode-se dizer, com alguma certeza, que Moriá, em
Jerusalém, distava cerca de três dias de Berseba (ver v. 4,19). Gênesis 22.14 indica que
as gerações posteriores conheciam esse local como o “monte do SENHOR”, expressão
usada em outros lugares para descrever Sião/Jerusalém (ver SI 24.3; Is 2.3; Zc 8.3). O
nome Moriá pode estar associado com o verbo hebraico que significa “ver” ou “prover”,
termo teologicamente significativo que aparece repetidamente em Gênesis 22.1-19. Em
Jerusalém, como em nenhum outro lugar, o Senhor sempre seria “visto” e “proveria”
benesses para seu povo por meio dos sacrifícios por ele ordenados. Baseados nessa
associação, os autores bíblicos podem ter imaginado que Abraão estava preparado para
oferecer seu sacrifício na mesma montanha em que os israelitas mais tarde ofereceriam
os deles—o monte Sião, em Jerusalém. (ver Bíblia de Estudo Arqueológica, 2013, p. 37).
Atualmente, o monte Moriá é ocupado pelo Domo da Rocha, impressionante estrutura
muçulmana erigida em 691 d.C. Uma grande pedra que emerge do edifício é ainda hoje
apontada como o lugar tradicional do quase sacrifício de Isaque.
144
Bruce K. Waltke, faz uma preciosa análise que, demonstra que se a in-
tenção do autor de Gênesis fosse “inventar” as narrativas patriarcais, este autor,
teria acomodado as narrativas patriarcais ao conteúdo do restante do Penta-
teuco, como as narrativas patriarcais divergem em alguns pontos do restante
do Pentateuco, isso demonstra que, o autor narrou acontecimentos históricos e
reais. Vejamos:
145
65 O termo ‘cananeu’ é muitas vezes usado de forma genérica para descrever a população
da Terra Santa (e.g., Gn 10.18; Jz 4.23,24), ou a ‘terra de Canaã’. Em outras passagens,
refere-se à população das regiões costeiras, incluindo o sul da Síria, especialmente os
habitantes dos vales e planícies, incluindo o vale do Jordão (e.g., Js 5.1; 11.3). ‘Cananeu’,
mais tarde, veio a significar ‘mercador’ — a principal ocupação desses povos litorâneos
(e.g. Jó 41.6; Ez 17.4).” (Bíblia de Estudo Arqueológica, 2013, p. 265).
146
147
148
proibidas pela lei mosaica, que prescreve o luar de culto (Dt 12.2-5) e condena
essas árvores sagradas (Dt 16.21). Teria os “inventores” da “lenda” dos patriar-
cas ter esquecido dos preceitos da lei, que estava em vigor em seu tempo, e
apresentado Abraão quebrando preceitos importantes da lei de Moisés? É difícil,
portanto, imaginar que essa religião patriarcal tivesse sido inventada por um
autor que era fiel a tradição Javista e a lei de Moisés. Certamente, se a intenção
fosse “inventar” uma história dos ancestrais de seu povo e de sua fé, teriam in-
ventado uma história muito mais “ortodoxa”.
Somos forçados a concluir que as narrativas patriarcais refletem autenti-
camente os costumes sociais vigentes no segundo milênio, e não os que esta-
vam em viger em período posterior, principalmente da monarquia, como ale-
gam os críticos. Os patriarcas não foram simples indivíduos particulares, mas
chefes de clãs consideráveis.
149
66 J. K. Hoffmeier, Israel in Egypt: the evidence for the authemticity of the Exodus tradition
(Oxford: Oxford University Press, 1997, p. 33.
67 Terá, ao que parece cultuava Nana, o deus de Ur.
150
O texto bíblico relata que Yahaweh disse a Abrão para deixar seu país (na
ocasião Arã), indo para um lugar que ele progressivamente lhe revelaria. É bem
provável que Abrão tenha se movido daquele lugar participando das grandes
migrações de amoritas68 que estavam em voga naqueles dias.
68 “Amorita” é uma palavra acádia que significa “ocidental”. Esta palavra foi usada como
designação para os vários povos semitas do noroeste da Alta Mesopotâmia e Síria na
idade patriarcal e antes dela. Ela deve, portanto, ter-se estendido àqueles povos da área
cujos descendentes vieram depois a falar aramaico, assim como aos antepassados de
Israel.
151
152
69 Alguns pesquisadores (T. L. Thompson e J. Van Seters) invalidam tal paralelismo para
propor como mais viável o nomadismo árabe da época exílica ou pós-exílica.
153
de que Abraão seguiu a rota tradicional entre os dois lugares, viajando rio Eu-
frates acima e, depois, descendo do norte até Canaã.” (PROVAN, 2016, p. 184).
Nos anos de sua estada em Arã - que na época era um centro comercial e
de negócios habitado principalmente por uma raça conhecida pelos sume-
rianos por MAR.TU e pelos acadianos por Amurru (os amoritas bíblicos),
Abrão sem dúvida tornou-se fluente no dialeto semítico amorita que lá
era falado e adquiriu um estilo de vida nômade, com o qual ele viria mais
tarde familiarizar em Canaã. (MERRILL, 2002, p. 16).
154
71 New internacional dictionary of Old Testament theology and exegesis. Vol. 1, p. 837.
155
crição da procissão e seu propósito. O texto afirmava que estas pessoas eram
parte de um grupo de 37 asiáticos da região de Shut (a qual incluía a área do
Sinai e o sul de Canaã). Eles estavam sendo levados por seu chefe, chamado
Abishai, para comercializar com os egípcios. Detalhes como composição físi-
ca, penteados, roupas, sapatos, armas e instrumentos musicais são claramente
apresentados.
Enquanto ainda não se sabe exatamente quem eram estas pessoas ou
mesmo porquê elas estavam vindo em caravana à uma região tão distante dos
centros comerciais, a importância da pintura repousa sobre sua descrição visual
de como as pessoas se pareciam no tempo dos patriarcas. Quando olhamos es-
tas imagens, podemos imaginar a viagem de Abraão e Sara ao Egito (Gn 12.10)
e mais tarde a jornada de Jacó e seus filhos ao Egito (Gn 42.5; 43.11; 46.5-7).
Algumas pessoas têm até sugerido que os padrões de cores sobre as túnicas dos
asiáticos no mural são como a “túnica colorida” de José (veja Gn 37.3). Mesmo
que, como outros eruditos têm pensado, uma melhor tradução fosse “uma túni
ca de mangas longas,”. (ver PRICE, 2006, p. 58-59).
156
157
bíblicos não está, como se pensava, no fato de conterem paralelos bíblicos, mas
talvez em poderem nos contar, em termos gerais, como era a vida na Siro-Pa-
lestina do III milênio a.C. A história desses documentos serve de advertência
aos arqueólogos para que sejam cui-dadosos quando tentarem ligar descobertas
históricas e literárias ao material bíblico. (ver Bíblia de Estudo Arqueológica,
2013, p. 19).
158
72 Barry L. Eichler, “Nuzi and the Bible: a retrospective”, DUMU-E-DUB- RA-A: Studies in
honor of Ake W. Sjöberg, ed. por H. Behrens et al. (Philadelphia: Samuel Noah Kramer
fund, 1989), p. 108-109.
159
160
as áreas habitadas pelos egípcios, hititas e assírios o deixou vulnerável ao ataque. Por
volta de 1250 a.C., Mitani já havia deixado de existir como reino. Pouco se conhece sobre
o idioma dos hurritas, porque a maioria dos documentos que desse povo sobreviveram
está em acádio, não na língua deles. Contudo, é certo que os hurritas não eram um
povo semita. Os hurritas cultuavam divindades como o deus da tempestade, o deus-
sol e o deus-lua no templo/panteão mesopotâmio (templo dedicado a vários deuses).
Peritos em metalurgia e na fabricação de vidro, também ficaram conhecidos por sua
cerâmica decorada de forma intrincada, conhecida hoje como ‘louça de Nuzi’. Alguns
eruditos acreditam que os horeus bíblicos (Gn 36.20,21; 14.6) eram os hurritas, mas essa
teoria provavelmente está incorreta. Os horeus eram um grupo tribal nativo da região de
Seir, ao sul do mar Morto, no final do III milênio, enquanto os hurritas eram um povo
que entrou na Mesopotâmia vindo do norte durante o II milênio a.C.” (Bíblia de Estudo
Arqueológica, 2013, p. 58).
75 Nuzi and the Bible, p. 119.
76 Patriarchal family relationships and the Near Eastern Law, 1981, p. 209-2014.
161
Mari, conhecida nos dias atuais como Tell Hariri, está situada no rio Eu-
frates logo abaixo da confluência com O rio Habur. Situada estrategicamente na
convergência de algumas rotas de comércio que conectavam a Sumária à Assíria
e a Mesopotâmia à Siro-Palestina, a cosmopolitana Mari era o lugar ideal para
comércio e intercâmbio entre os reinos. A cidade servia como tampão entre as
cidades-Estado sumérias a sudeste e as terras das tribos pastoris, conhecidas
como amorreus, ao norte. Esses nômades criadores de rebanhos parecem ter se
concentrado em torno da cidade Harã (cf. a estadia de Abraão nesse lugar, em
Gn 11.31-12.5). Oriundos da Mesopotâmia, eles se estabeleceram ali entre 2400-
2200 a.C. De fato, os povos do noroeste da Síria governaram Mari após esse
período, de forma que os mais famosos reis da cidade eram de descendência
amorreia. Boa parte da primitiva história de Mari é obscura. Fundada por volta
de 2900-2700 a.C., a cidade adquiriu riqueza e importância, ainda que periodi-
camente fosse controlada por poderes tão eminentes quanto Sargão da Acádia e
a II Dinastia de Ur, no III milênio a.C. Em 1775 a.C., Zimri-Lim de Mari rompeu
com o domínio assírio, porém Hamurabi da Babilônia queimou a cidade em
1761 a.C.” (ver Bíblia de Estudo Arqueológica, 2013, p. 54).
Bem preservados, esses tabletes abrangem uma ampla variedade de as-
suntos, como administração do palácio, administração provincial, haréns, des-
pesas, registros de presentes, obras literárias, cartas e tratados. Estes achados
são mais de vinte mil tábuas de argila em várias salas do palácio. Tais tábuas
incluíam correspondência entre Hamurabi e Zimri-Lím, o último rei de Mari,
além de uma imensa coletânea de documentos de negócios, cuidadosamente
inseridos nos arquivos reais. Outras tábuas estavam escritas no idioma babilônio
antigo, ao passo que algumas continham rituais relacionados com a adoração a
Ishtar. Embora fossem de uma natureza indeterminada, algumas tábuas conti-
nham referências aos habiru. Este período da história dos amorreus é de grande
importância, porque abrange a era patriarcal, e esclarece, de forma considerá-
vel, as narrativas do livro de Gênesis que descrevem as vidas e os tempos de
Abraão, Isaque e Jacó, progenitores dos israelitas.
Temos muitas razões para acreditarmos na historicidade das narrativas
patriarcais. Os arqueólogos descobriram paralelos interessantes quanto a luga-
res e costumes descritos em Gênesis. Os costumes sociais e procedimentos le-
gais comprovados nestes textos são paralelos às tradições patriarcais. Por exem-
plo, Selman nota que “em Gênesis 25.23, o termo hebraico para o filho mais
velho não é o usual bekor, mas rab, o qual é usado aqui somente neste sentido.
A palavra acadiana cognata, rabu, por sua vez é também usada para o filho mais
velho, mas até agora apareceu somente em tabletes dos meados do segundo
milênio.” (apud WALTKE, 2010, p. 32).
162
163
77 Os cristãos que estão em Cristo compartilham dos privilégios de sua íntima relação com
a herança recebida do Pai (Hb 12.23-24) e são advertidos a não rejeitar ou menosprezar
seus direitos, como fez Esaú (Hb 12.16-17).
164
princial. Há provas, ainda em nossos dias, que que um casal que aparentemente
não pode ter filhos consegue às vezes, após haver adotado um, gerar um outro.
Diríamos que esse fenômeno também havia sido constatado na época.
Uma tabuleta de Nuzi relata como certo Nashwi havia adotado Wullu,
vejamos:
78 “A concubina no Antigo Testamento não era uma amante secreta ou ilícita, mas uma
mulher unida de forma legal a um homem pelo casamento, porém numa condição inferior
165
pois de esperar em vão que sua esposa principal gerasse um filho. Como no caso
de Sara, a esposa principal poderia, ela mesma, tomar a iniciativa.
A lei hurrita, em Nuzi (meados do II milênio a.C.) e o Código de Hamura-
bi, na Babilônia, (início do século XVIII a.C.) permitiam ao marido adotar como
herdeiro legítimo qualquer filho que ele tivesse gerado por meio de uma escrava
(ver Gênesis 17.18). Um contrata de casamento de Nuzi obriga a mulher estéril
a proporcionar a seu marido uma serva que dará à luz por eles: “Se Gilimninu (a
esposa) der à luz, Shennima (o esposo) não tomará outra mulher. Mas se Gilim-
ninu deixar de dar à luz ela encontrará outra mulher pra Shennima, da terra de
Lullu (terra de onde provinham os escravos), como concubina.” (apud VOGELS,
2000, p. 41).
Na suméria, o filho mais velho herdava todo o conjunto de bens do pai e
assumia a responsabilidade por seus irmãos. Na Assíria e em Nuzi, porém, os
irmãos dividiam a propriedade do pai, embora o filho mais velho recebesse uma
porção dobrada.
A lei de Nuzi permitia que os direitos de herança fossem transferidos para
um filho nascido de uma esposa principal depois que ela tivesse adotado um fi-
lho substituto. De forma semelhante, Isaque (mesmo nascido depois de Ismael)
tinha o direito de ser o principal herdeiro de Abraão (Gn 21.12).
A lei neobabilônica continha uma cláusula, segundo a qual os filhos nasci-
dos de uma concubina seriam subordinados a qualquer um dos filhos da esposa
principal, e o conjunto dos filhos da esposa principal herdariam dois terços da
propriedade.
A desertação de um filho, prática permitida em certas sociedades, geral-
mente exigia um tribunal para que pudesse ser revogada, se fosse comprovado
que o pai agira desonestamente. Alguns estudiosos, baseados nessa proibição da
lei de Nuzi, questionaram a legalidade da demanda de Sara pela expulsão de Ha-
gar e Ismael (Gn 21), atitude que, por analogia, podia indicar que Abraão viveu
sob costumes e leis semelhantes. De fato, Abraão foi hesitante em concordar
com o desejo de Sara e só fez após a intervenção divina (Gn 21.10-13).
ao da esposa regular. Nenhum moral estava ligado ao seu status, que era considerado
parte natural do sistema social polígamo. As concubinas não desfrutavam oiutros direitos
além da coabitação legal. Elas não exerciam autoridade NBA família nem nos afazeres
da casa, e o marido podia mandá-las embora a qualquer momento, com um pequeno
present (Gn 25.6). O mesmo podia acontecer com os filhos delas, ou seja, ser excluídos
da herança familiar por meio de pequenos presentes, embora eles fossem considerados
legítimos. Pelo menos nos tempos patriarcais, a causa imediata do concubinato era quase
sempre a esterilidade da esposa legal, a qual poderia, ela mesma sugerir que seu marido
tivesse filhos por meio de sua criada (Gn 16 e 30).” (Bíblia de Estudo Arqueológica, 2013,
p. 43).
166
167
mais tarde, Raquel deu Bila a Jacó (Gn 30.3-4). Segundo a lei de Nuzi, qualquer
criança que resultasse de tal união deveria permanecer na família e a sua expul-
são era estritamente proibida. Este fator explica a apreensão que Abraão sentiu
(Gn 21.11), quando Sara decidiu expulsar Agar e Ismael, depois que este tinha
zombado de Isaque, o filho pequeno de Abraão e Sara, no dia de seu desmame.
A lei da primogenitura determinava que se desse ao filho primogênito uma
dulpa porção da propriedade do pai quando este morresse (Dt 21.15-17). De acor-
do com os costumes em Nuzi, o “direito de primogenitura”, ou título à posição
de primogênito, era negociável entre os membros da família. Uma vez que estas
transações eram bastante comuns em Nuzi, não haveria nada particularmente
incomum no fato de que Jacó se aproveitasse de seu irmão faminto para obter seu
direito de primogenitura (Gn 25.31). Onde era necessário que a herança fosse divi-
dida, a lei de Nuzi reconhecia como líder da família, aquele que tivesse possessão
dos ídolos da casa.80 Estes ídolos eram, evidentemente, as imagens, ou “terafins”
que Raquel roubou (Gn 31.19), e uma boa quantidade de estátuas similares foram
recuperadas em Nuzi. “Ao roubar os terafins ou ídolos do lar, Raquel pode ter tido
um motivo religioso, em parte (Gn 35.2,4), mas o fato de que possuí-los poderia
fortalecer a reivindicação da herança (como o revelam as lâminas de Nuzi) dá-nos
o mais provável indício do seu ato.” (KIDNER, 2001, p. 153).
Tomando como exemplo o texto de Gênesis 15.2-3 bem se sabe que en-
tre os horeus um homem sem filho podia adotar um herdeiro para garantir um
a carne”, aos produtos dos esforços próprios do homem quanto à religião (G1 4.22),
sempre incompatíveis com os do espírito (G14.29).
80 Os “dolos do clã” eram de tamanho pequeno, portáteis, provavelmente imagens dos
ancestrais ou dos deuses venerados por esses ancestrais. Acreditava-se que esses ídolos
traziam prosperidade e proteção. Não tinham templos, mas recebiam um altar dentro da
área da casa. Raquel talvez desejasse alguma coisa tangível, que lhe servisse de objeto de
longa jornada, prática mencionada mais tarde nos escritos historiador judeu do século I.
Os ídolos do clã eram muitos valorizados em Nuzi, por isso eram entregues ao principal
herdeiro. Se a herança fosse disputada no tribunal, a posse dos ídolos familiares podiaser
aceita como prova de que o possuidor deles fora designado herdeiro pelo falecido.
168
169
demonstram que a esposa principal estéril podia dar sua criada ao marido com
o propósito declarado de prover um herdeiro para ele, e esse herdeiro poderia
ser depois adotado pela esposa principal. De acordo com esse; textos, se ela
mais tarde desse à luz um filho, ele poderia substituir o filho da criada como
legítimo herdeiro, conforme as histórias de Sara e Hagar, em Gn 16.1-4; 21.8-10;
as criadas de Lia e Raquel, em Gn 30.1-13).
Em Gênesis 15, Deus vem reassegurar a Abraão de que cumprirá sua pro-
messa, feita a ele e à esposa, de lhes dar um filho na velhice. A resposta inicial
de Abraão indica que ele perdeu a confiança na capacidade divina de fazê-lo:
83 Veja a análise por E. A. Speiser, “Notes to recently published Nuzi texts”, Journal of the
American Oriental Society 55 (1935): 435,436, e Cyrus H. Gordon, “Biblical customs and
the Nuzi tablets”, Biblical Archaeologist 3 (1940): 2-3.
84 D. J. Wiseman, “Abban and Alalah”, Journal of Cunieform Studies 12 (1958): 129.
170
assumindo uma maldição sobre si. Deus, que assume a forma de fogo e fumaça
em Gênesis, assume tal maldição sobre si mesmo.
No entanto, o que está faltando aqui é esse passar em meio às partes di-
vididas. Para isso apelamos a outro texto do antigo Oriente Próximo, desta vez
dos hititas. Um texto que descreve um ritual depois de uma derrota militar, diz:
171
citadas por nome às suas filhas quando se casaram (Gn 29.22-24,28,29), porém
alguns contratos de casamento descobertos em Nuzi estipulavam que se desse à
noiva uma criada, cujo nome deveria ser registrado no contrato.
Os ídolos domésticos de uma família eram muito valorizados em Nuzi e
eram passados ao principal herdeiro. Se a herança fosse disputada no tribunal,
os ídolos de propriedade da família podiam ser aceitos como prova de que o
morto tinha a intenção de que o vencedor da demanda fosse seu herdeiro. As-
sim, o roubo dos ídolos familiares, levado a efeito por Raquel, poderia ser consti-
tuído um crime muito grave, uma tentativa de garantir que as riquezas de Labão
passassem para seu marido e, possivelmente, para os filhos dela (Gn 31.22-37).
Os “ídolos do clã” eram de tamanho pequeno, portáteis, provavelmente
imagens dos ancestrais ou dos deuses venerados por esses ancestrais. Acredi-
tava-se que esses ídolos traziam prosperidade e proteção. Não tinham templos,
mas recebiam um altar dentro da área da casa. Raquel talvez desejasse alguma
coisa tangível, que lhe servisse de objeto de longa jornada, prática mencionada
mais tarde nos escritos de Josefo, o historiador judeu do século I. Os ídolos do
clã eram muito valorizados em Nuzi, por isso eram entregues ao principal her-
deiro. Se a disputada no tribunal, a posse dos ídolos familiares podia ser aceita
como prova de que o possuidor deles fora designado herdeiro pelo falecido.
172
dial em Tell el’- Atshana (Alalakh) naquilo que originalmente era o norte da Síria,
ele descobriu dois estratos que continham palácios reais, um dos quais perten-
cente ao período 1900-1780 a.C., e o outro ao século XV a.C. Muito mais de qua-
trocentos e cinquenta textos foram recuperados das ruínas, e são considerados
aproximadamente contemporâneos aos de Mari e Nuzi. No entanto, são de um
valor consideravelmente maior para o período patriarcal, uma vez que são mais
próximos daquele tempo, tanto cronológica quanto geograficamente.
Estas tábuas fornecem informações adicionais sobre o status preferencial
que podia ser dado a qualquer filho de uma mulher em particular A posição de
filho primogênito na família normalmente implicava que a pessoa interessada
podia reivindicar uma dupla participação na herança por ocasião da morte do
patriarca da família. No entanto, as tradições de Alalakh reforçam determinados
casos tanto em Mari quanto em Ugarit, para mostrar que o pai tinha liberdade de
desconsiderar as sequências naturais da primogenitura e, em vez delas, escolher
o seu próprio primogênito entre os seus filhos. Este costume, obviamente, in-
fluenciou o caso de Manasses e Efraim (Gn 48.13-20), a reputação de Rúben (Gn
49.3), e a promoção de José (Gn 48.22). Com base neste costume, fica evidente
que as instituições sociais registradas nas narrativas patriarcais são abundante-
mente representativas da vida no segundo milênio a.C.
Um ponto de comparação entre estes textos e a Bíblia envolve leis que
regiam a herança. Em Gênesis 49, Jacó abençoa seus 12 filhos, dividindo uma
fatia igual da herança para cada filho. Isso, porém, mudou no Sinai, pois a lei
mosaica estipulava que o filho primogênito devia receber o dobro da herança (Dt
21.15-17). Esta aparente contradição foi formalmente explicada pelos altos crí-
ticos de acordo com a Hipótese Documentária de Wellhausen, que alegava que
diferentes escritores compuseram relatos conflitantes do Pentateuco ao mesmo
tempo na história pós-exílica de Israel. Entretanto, os documentos do antigo
Oriente Próximo confirmam que a situação refletida na distribuição de Jacó de
uma herança “igualitária” a todos os seus filhos foi o que precisamente se achou
nas Leis de Lipit-Istar do século XX a.C; “uma fatia igual na lei das heranças é
evidente nas leis de Lipit-Istar (século XX a.C.).” (PRICE, 2006, p. 84).
Todavia, 200 anos mais tarde, a situação tinha mudado, no Código de
Hamurabi (século XVIII a.C.), uma distinção é feita entre os filhos da primeira
mulher de um homem - que têm a primeira escolha - e os filhos de sua segunda
esposa. Então, quando comparamos os textos de Mari e Nuzi (século XVIII a XV
a.C.) descobrimos que um primogênito natural recebeu uma porção dobrada
enquanto um filho adotado não recebeu. As leis neobabilônicas do primeiro
milênio refletem uma progressão semelhante, com os filhos de uma primeira
esposa recebendo uma porção dobrada e os demais recebendo uma porção úni-
173
ca. Por isso, de acordo com a mudança dos costumes sociais refletida por essas
leis, somente o contexto do segundo milênio vai encaixar-se no tipo de prática
de herança dos patriarcas.
174
sentimento, meu irmão me deu como mulher a....”. (VOGELS, 2000, p. 44). “A
abrupta menção do presente de uma serva para a noiva (Gn 29.29) é mais um
dos pormenores iluminados pelas lâminas gravadas de Nuzi.” (KIDNER, 2001,
p. 149).
Alguns historiadores argumentam que as leis de Nuzi que permitiam a um
homem adotar uma jovem como filha, com o propósito de entregá-la em casa-
mento ao seu filho, lançam luz sobre os dois protestos de Abraão, nos quais diz
que sua esposa é, na verdade, sua irmã (Gn 12.10-20; 20.1-18).88 Alguma dúvida
de que esse paralelo seja legítimo ainda existe, porém esses incidentes sugerem,
pelo menos, que os relatos dos patriarcas têm raízes em antigos costumes, dos
quais pouco ou nada sabemos.
Se tal história foi conservada, e isso nos três relatos, é claro que não era
(tão) chocante na época. O que nos leva a perguntar se não existe um
costume por trás desse comportamento que não mais compreendemos.
Abraão afirma que Sara é sua meia irmã (Gn 20.12), pode ter sido uma
filha adotiva de Terá. No caso de Rebeca, ela foi dada em casamento a Isa-
que por seu irmão Labão (Gn 24). Textos de Nuzi, mencionam o costume
dos hurritas, em que uma mulher podia ter o estatuto duplo de esposa e
irmã, com duplos privilégios e deveres, do ponto de vista social e jurídico.
Outro paralelo encontramos na cultura egípcia, onde a palavra “irmã” e
“irmão” não possuem o sentido restrito que possui hoje. Certos contratos
de casamento chamam a esposa de “irmã”, mesmo que esteja claro que
ela não era parente do marido. Talvez, “quando Abraão diz: ‘Ela é minha
irmã’, joga, com o sentido restrito e o sentido amplo dessa palavra. (VO-
GELS, 2000, p. 39).
88 Infelizmente, tal pai, tal filho: Isaque lançou mão do mesmo subterfúgio (capítulo 26).
Robert Polzim (The Ancestress of Israel in Danger. Semeia. Vol. 3, 1975, pp. 81-98.) chama
a atenção para a forma como cada monarca inocente foi informado da verdadeira
identidade da mulher. Em 12.17, por meio de pragas; em 20.3, através de um sonho;
em 26.8, quando o rei observou Isaque acariciando Rebeca. No primeiro caso vemos a
ação de Deus na história (a lei?); no segundo, vemos a revelação de Deus por meio de
sonhos e visões (os profetas?); no terceiro, o uso natural dos olhos de alguém (ênfase na
sabedoria?).
175
servada em três relatos, podemos supor que, não era “tão” chocante em sua
época. Isso indica que, nossa compreensão cultural esta distante da realidade.
176
91 Ver Thomas L. Thompson, The historicity of the Patriarchal narratives, série Beihefte zur
Zeitschrift für die alttestamentliche Wissenschaft, 133 (Berlin: deGruyter, 1974); John
Van Seters, Abraham in history and tradition (New Haven: Yale University Press, 1975).
92 Quanto a estudos detalhados a este respeito, veha Martin J. Selman, “Comparative
customs and the patriarchal age”, em Essays in the patriarchal narratives, ed. por A. R.
Millard e D. J. Wiseman (Leicester: Inter-Varsity, 1980), p. 91-140; Eicheler, “Nuzi and the
Bible”, p. 107-19.
177
Abraão, não haveria como se criar uma grande nação. Sendo essa a ideia e a
explicação para seu ardil, Abraão pode ser considerado o arquétipo dos crentes
que sentiram que Deus precisava de ajuda para livrá-los de alguma situação des-
concertante e perigosa em potencial.
Outras práticas podem ajudar a reintegrar a compreensão do casamento
“esposa/irmã”. No Egito, o rei às vezes se casava com sua irmã; isso ocorria tam-
bém, mais tarde, na Pérsia e em certos estados helenistas. Notemos ainda que as
palavras “irmão” e “irmã” não possuem o sentido restrito que têm pra nós hoje.
Certos contratos de casamento egípcios chama à esposa de “irmã”, mesmo que
esteja claro que ela não era um absoluto parente do marido. Tinha-se portanto
o direito de falar de sya mulher como de sua irmã; isso é visto até mesmo no
Cântico dos Cânticos (5.1-2). Quando Abraão diz: “ela é minha irmã”, joga, tal-
vez, com o sentido restrito e o sentido amplo dessa palavra (ver VOGELS, 2000,
p. 40).
178
te- Arba (Hebrom) para enterrar sua mulher Sara (Gn 23.10-20). Desde então
ficou conhecida como a Tumba dos Patriarcas. O outro foi Urias, o heteu, um
soldado no exército do rei Davi.
Todavia, a despeito da proeminência dos heteus no texto bíblico, há ape
nas 100 anos os críticos eruditos duvidavam de que eles jamais tivessem existi
do. Àquela altura, nenhuma evidência de tal povo havia sido encontrada. Eles
eram simplesmente parte da história religiosa da Bíblia. No entanto, este vere
dicto histórico estava para mudar. Em 1876, o erudito britânico A.H. Sayce sus-
peitou que uma inscrição não decifrada descoberta esculpida nas rochas da Tur-
quia e Síria pudessem ser uma evidência dos até então desconhecidos heteus.
Então tabletes de argila foram descobertos nas ruínas de uma cidade antiga na
Turquia, chamada Boghazky.
O povo local estava vendendo estes tabletes e alguns caíram nas mãos de
peritos. Isso permitiu que um perito alemão em texto cuneiforme, Hugo Win-
ckler, fosse ao sítio e escavasse. Ali, ele descobriu cinco templos, uma cidadela
fortificada e muitas esculturas monumentais. Em um armazém incendiado ele
também encontrou mais de 10 mil tabletes. Logo que eles foram finalmente
decifrados, foi anunciado ao mundo que os heteus haviam sido encontrados!
Boghazky havia sido de fato a antiga capital do império heteu (conhecida com
Hattusha). Outras surpresas se seguiram, tal como a revelação de que a língua
hetéia devia estar associada com as línguas indo-européias (das quais o inglês é
uma parte), e que a forma de seus códigos de lei eram muito úteis para a com-
preensão daqueles descritos na Bíblia. A redescoberta deste povo perdido, uma
das mais extraordinárias realizações da arqueologia do Oriente Próximo, agora
serve como um aviso para aqueles que duvidam da historicidade de certos rela-
tos bíblicos. Só porque a arqueologia não produziu evidência corroborativa hoje
não significa que não possa produzila amanhã. Os heteus são simplesmente
um exemplo de que a Bíblia tem se demonstrado historicamente confiável. Por-
tanto, isso deve ser respeitado apesar da presente falta de apoio material para
certos eventos ou problemas cronológicos que permanecem sem solução. (ver
PRICE, 2006, p. 65).
Abraão quis comprar apenas uma pequena parte do campo, porque a
aquisição do campo inteiro teria acarretado certas obrigações financeiras e so-
ciais. “As leis hititas estipulavam que, se alguém vendesse apenas parte de sua
propriedade, ainda seria exigido dele (o proprietário original e principal) o paga-
mento de todos os débitos e taxas da terra, mas se ele vendesse a área inteira o
novo proprietário é que teria de pagar os débitos.” (Bíblia de Estudo Arqueoló-
gica, 2013, p. 38).
179
180
94 Todavia, M. R. Lehmann anota em BASOR, CXXIX, 1953, p. 15, que, segundo a lei dos
heteus, comprar toda a propriedade de alguém era incluí-lo em suas obrigações feudais.
Daí, nesta passagem, Efrom podia estar manobrando para vender-lhe a propriedade
inteira, em lugar da parte solicitada no v. 9. Mas como não temos meios de saber se esse
campo era a única possessão de Efrom, o ponto continua no terreno da conjectura.
95 Ver, G. M. TUCKER. The Legal Background of Gnenesis 23. Journal of Biblical Literature 85,
1966, p. 77-84.
181
escrita ou editada muito tempo depois do que se acredita ou suas passagens não
são sempre confiáveis.
Vejamos alguns argumentos em apoio à domesticação tardia dos camelos
na época patriarcal:
“Os camelos já eram domesticados antes da época dos patriarcas, mas
antes de 1200 a.C. não eram empregados para fins militares e de nomadismo
em larga escala.” (KIDNER, 2001, p. 136).
Há um crescente corpo de estudiosos que acreditam que a domesticação
do camelo deve ter ocorrido antes do século XII a.C. e que as narrativas patriar-
cais refletem exatamente isso.96 Da mesma forma, R.W. Younker, que coletou
dados sobre a domesticação antiga de camelos por anos, recentemente desco-
bertos e publicados um breve estudo de alguns petroglifos de camelo localizados
no Nasib Wadi, para o qual ele propõe uma data de cerca de 1500 a.C.97
96 Ver, por exemplo, O. Borowski, Every Living Thing: DailyUse of Animals in Ancient
Israel [Walnut Creek, Califórnia: Altamira, 1998, p. 112-18.
97 Late Bronze Age Came lPetroglyphs no Wadi Nasib, Sinai, NEASB 42, 1997, p. 47-54.
182
183
Dois irmãosde pai e mãe viviam juntos. O mais velho, Anpu, tinha uma
casa e uma mulher. O mais novo, Batu, vivia com ele e realizava para ele
todas as tarefas do campo. Era um bom homem: não havia ninguém como
ele em todo o país. Um dia, estando os dois irmãos no campo, lhes faltou
semente. Então o mais velho enviou o mais novo em busca de semente. O
irmão mais novo encontrou a mulher de seu irmão mais velho sentada e
penteando-se. Quando ele saiu carregado com uma grande quantidade de
grãos, ficou-se ela admirada da força do rapaz. Então ele lhe disse: “Vem,
fica uma hora dormindo comigo. Será bom para ti, porque te farei vestes
elegantes”. O rapaz lhe respondeu: “Tu és como uma mãe para mim. Ele
é quem me criou. Não me voltes a propor semelhante crime. Eu não con-
tarei a ninguém”. E foi com sua carga para o campo. Pela noite, chegou
Anpu a casa e encontrou sua mulher coberta de feridas que ela mesmo
havia feito. Seu marido lhe disse: “Quem esteve falando contigo?”. Ela
lhe disse: “Ninguém esteve falando comigo, exceto seu irmão mais novo.
Quando veio para levar-te semente, me encontrou só e me disse: “Vem,
fica uma hora dormindo comigo”. Eu lhe disse: “Não sou eu tua mãe? E teu
irmão mais velho não é como um pai para ti?”. Ele então, muito assustado,
me bateu. Assim, se tu o deixas com vida, eu me matarei”. O irmão mais
velho, como um leopardo, tomou uma lança e foi atrás de seu irmão. Este
pôde explicar a seu irmão a verdadeira história. Anpu “chegou à sua casa,
matou sua mulher e a arremessou aos cachorros”. (ARANA, 2003, p. 501).
184
traintuitiva. Quem lesse a história pela primmeira vez não esperaria que a saga
de Jacó e Esaú tomasse os rumos que tomou. De fato, revela uma surpreendente
característica de nosso Deus, cujo inesperado e aparentemente confuso sistema
de valores continua a nos maravilhar de várias maneiras.
98 Joseph en Egypte: Geneses chap. 37-50 à la lumière dês études égyptologiques recentes
(Louvain: Publiications Universitaires, 1959).
99 Kitchen tem contribuído com vários estudos para a compreensão do assunto, em
particular “Joseph” (in: NBD, p. 617-20) e “Genesis 12-50 in the Near Earstern world”
[Cambridge: Tyndale House, 1993], p. 77-92.
100 Israel in Egypt.
185
rativa, enquantos muitos estudiosos bíblicos negam isso. Até hoje não surgiu
nenhuma prova direta de que José tenha sido um oficial da corte egípcia. No
entanto, tem se buscado apresentar a autenticidade da narratitiva através de
provas indiretas. Segundo Hoffmeier a narrativa de José não apresenta nada de
extraordinário ou de inacreditável.101
É amplamente difundida a ideia de que toda a história de José foi trans-
mitida de diferentes formas no sul de Israel pela fonte J e no norte pela fonte E,
sendo as duas traduções entretecidas em Gênesis por um redator, talvez do sécu-
lo VII a.C. Já vimos amplamente os fundamentos e incoerências desta hipótese
na formação do texto do Pentateuco. Vejamos como Kidner expõe o malabaris-
mo da Hipótese Documentária ao explicar a divisão das fontes:
O mais notório traço disto é a liberdade que tomam com o texto. Rúben
é eliminado de 37:21 (J) e Judá é posto no lugar dele, apenas para fazê-lo
diferir do v. 22 (E). Nega-se o nome e posição de Potifar em 39:1 (J) só
porque concorda com 37:36 (E). A referência aos prisioneiros do rei é reti-
rada de 39:20 (J) apenas para que não dê apoio a 40:2. (E). As afirmações
de que José era prisioneiro em 40:3, 15; 41:14 são negadas a E, somente
porque corroboram 39:20, de J. Além disso (antecipando), a afirmação
de que José foi vendido, e não apenas roubado, em 45:4, 5, também será
suprimida, para não eliminar o conflito daquela passagem E com J. Qual-
quer teoria que faz isso com os seus dados está confessando o seu fiasco.
(KIDNER, 2001, p. 172).
Presume que onde se diz uma coisa duas vezes, é dita por dois
escritores. Esta hipótese é antieconômica. Por exemplo, em 37:5,
a delaração resumida de 37:5 e os pormenores de 6-8 relacionam
primeiro o novo acontecimento com o que se havia passado antes,
e depois o deenvolvem. Este método é compreensivel e mesmo
admirável; não neessita do aparelhamento de dois autores e um
editor para explicá-lo. A mesma coisa se pode dizer dos vs. 13, 14;
dos vs. 18, 19; dos vs. 21,22; e assim por diante. É uma expansão
da forma familiar: “ele respondeu e disse”, “ele levantou os olhos
e viu”, etc. Entretanto, essa escola de pensamento raramente se
detém a considerar tão singela possibilidade. (KIDNER, 2001, p. 173).
186
Diante disso, podemos afirmar que, uma teoria que insiste em alterar o
seu dado fundamental, o texto, repetidamente, drasticamente, e sem o apoio de
uma única versão antiga, talvez seja bem intencionada; dificilmente pode ser
verdadeira.
Mesmo que a narrativa de José flua naturalmente, muitos críticos procu-
ram isolar diferentes fontes no texto. A presença de nomes duplos para designar
tribos, personagens e assim por diante constituem evidências sufcientes para
estes críticos. Mas, conforme é destacado por G. W. Coats, “Um exame mais
recente do relato enfraquece o argumento a favor de duas fontes, sugerindo que
é possível um autor usar a repetição como técnica para ênfase, talvez apenas
com o propósito de diversificar.”102 A narrativa de José tem uma coerência e uma
precisão de pormenores que defendem vigorosamente a veracidade das pessoas
e dos acontecimentos que a compõem. Não há boa razão para a afirmação, mais
frequentemente imposta feita do que fundamentada, de que os atores desta
história são personificações de clãs.
Como Isaque e Jacó antes dele, José é apresentado como um membro
da familia especialmente escolhido. Muito tem sido escrito a respeito da real
natureza do relato sobre José na Escritura. Críticos avançados não têm estado
em acordo sobre essa natureza. O que seria o relato sobre José? Um precioso ro-
mance, um conto, uma história, uma história de tribos? Uma história sapiencial
da corte salomônica? Uma história romanceada?
Hermann Gunkel considera o relato como um dos textos legendários em
Israel, que tratam não de ocorrências históricas, mas de coisas que fascinam
as pessoas. G. W. Coat encara a história de José como uma novela destinada a
entreter, o que é apenas uma adaptação do ponto de vista de Gunkel. Donald B.
Redford, concorda que a história de José é uma criação artística, polida literatura
hebraica, escrita para entretenimento. Robert Graves e Raphael Patai falam do
relato como um mito hebraico. Bruce Vawter optou pela abordagem Documen-
tária, vendo duas tradições originais distintas, J e E, que o redator combinou. A
posição de Vawter não difere essencialmente da de Martin Noth. Gerhard von
Rad fala da história de José como uma narrativa originalmente conectada, isto é,
não uma compilação de muitas tradições previamente independentes.103
Tratando a respeito da história de José, Andrés Ibánez Arana comenta:
102 Joseph, sono f Jacob, The Anchor Bible dictionary, vol. 3, p. 979.
103 Para uma discussão detalhada deste assunto, ver: GRONINGEN, 1995, p. 139-140.
187
As duas versões circularam cada uma em seu ambiente, até que se encon-
traram por ocasião da destruição do reino do Norte (721), quando alguns
que escaparam da destruição da ruína fugiram para refugiar-se em Jerusa-
lém. Ali alguém (o Jeovista?), antes de que irrompesse a corrente deutero-
nomista, juntou as duas narrações, ao mesmo tempoem que o fazia com
o restante das histórias de J e E. (ARANA, 2003, p. 464).
188
189
106 Siclo era a unidade de peso mais comum nos tempos antigos. No início, o siclo era
apenas um peso, não uma moeda, pois a cunhagem só foi inventada no século VII a.C.
107 The Patriarchal Age: Myth or History? Biblical Archaeology Review 21 (março/abril de
1995), p. 52.
190
191
Não há razão, porém, para supor que a história bíblica seja derivada desse
conto egípcio. A qualidade bizarra da história egípcia contrasta fortemente
com o tom factual na narrativa bíblica. Entretanto, não se pode dizer que
os paralelos entre os dois relatos sejam apenas acidentais. Se foi composto
depois da época de José, o conto egípcio pode ter sido influenciado pela
história bíblica verdadeira. Se a história egípcia já existia antes do tem-
po de José (admitindo-se que o papiro D’Orbiney não é a iteração mais
antiga), os paralelos óbvios incluídos na narrativa de José podem ter a
intenção de destacar o fato de que o Deus de Israel podia elevar um filho
de Israel ao poder, mesmo no contexto egípcio. Outro argumento possível
192
é que o conto bíblico mostra que José cumpriu o ideal egípcio de herói.
(Bíblia de Estudo Arqueológica, 2013, p. 66).
193
De acordo com Gênesis 37, José encontrou seus irmãos próxino a Dotã.
Tomados de ciúme por causa do favoritismo de seu pai para com o irmão mais
jovem, eles o agarraram e o venderam a uma caravana de ismaelitas que pas-
sava a caminho do Egito. Essa caravana, provavelmente, estava viajando pelo
caminho do Mar (Via Maris), antiga estrada que começava no Egito, margeava a
costa mediterrânea de Canaã e continuava seu caminho sinuoso em direção ao
111 How was Joseph taken to Egypt? (Genesis 37.12-36), The Bible Translator 46, 1995, p.
445-448.
194
norte, passando a oeste de Dotã e indo para o Megido. Dali os viajantes podiam
continuar na direção norte, para além das áreas costeiras da Fenícia, ou virar
para o nordeste, na direção de Damasco e da Mesopotâmia. A estrada Real,
outra rota dos tempos do Antigo Testamento, permitia aos povos viajar do norte
até o sul, pela Transjordânia, ligando Damasco ao golfo de Acaba.
Nos tempos antigos, os mercadores costumavam viajar em caravanas,
procurando a proteção dos grupos maiores, por causa dos muitos perigos e tam-
bém pela falta de acomodações ao longo do caminho. As aravanas tendiam a ser
bem grandes (não eram incomuns colunas de 3 mil jumentos) e muitas vezes
incluíam guardas armados. Textos antigos dos assírios, egípcios e hititas fazem
constantes referências às dificuldades das viagens. Os animais selvagens, até
mesmo leões, sempre representavam perigo, e um mercador sozinho a trans-
portar seus produtos era alvo tentador para os bandidos. Condições extremas
de temperatura, da seca à neve, também faziam que as viagens fossem muito
perigosas.
O elaborado sistema romano de estradas (exemplificado pela celebrada
via Apia) ainda não existia na época do Antigo Testamento. As estradas não
eram pavimentadas. Na verdade, eram pouco mais que rastros enlameados de
caravanas anteriores. Por muitos anos, os estudiosos puderam apenas deduzir a
localização desses caminhos, fazendo suposições com base no contorno do ter-
reno e tirando conclusões das referências às rotas encontradas em antigos docu-
mentos. Em tempos recentes, porém, as fotografias de satélites têm se mostrado
uma ferramenta útil para a localização desses caminhos. Sempre que possível,
os mercadores transportavam seus bens pelo mar ou por rios navegáveis.
A despeito de todas essas dificuldades, os mercadores percorriam gran-
des distâncias no antigo Oriente Médio. As mercadorias chegavam à terra de
Israel de lugares muitos distantes, como a India e o sul da Arábia. (ver Bíblia de
Estudo Arqueológica, 2013, p. 63).
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Desde o início das pesquisas críticas ficou evidente que sempre foi mais
fácil formular claramente questões e problemas do que respostas e soluções. É
evidente que a visão que o pesquisador tiver da integridade e autoridade do seu
material de pesquisa, influenciará a forma como ele irá trabalhar, sem falar dos
procedimentos metodológicos e de suas conclusões. Neste ponto, o presente
trabalho demonstrou, o quanto as pesquisas sobre as narrativas patriarcais estão
comprometidas.
Não devemos desanimar e muito menos deixar de buscar um maior es-
clarecimento, juntamente com as ciências disponíveis a nós hoje. Faz parte do
dia a dia do estudioso do Antigo Testamento, conviver com a inquietude de não
poder desvendar por inteiro os “mistérios” contidos no texto e os “mistérios”
produzidos pelo texto. Verifica-se que quanto mais a exegese se preocupa com
questões menores, mais incertos tornam-se seus resultados.
A arqueologia como uma das principais ciências auxiliares, que nos ajuda
a esclarecer o texto bíblico, nos tem apresentado de tempos em tempos novas
luzes e esclarecimentos, aos exegetas tem fornecido materiais de pesquisa como
documentos escritos ou iconográficos e textos dos mais variados meios. Apesar
do destaque que arqueologia possui não deve ser dado a ela o papel decisivo,
pois como ciência possui suas limitações, somente o texto bíblico possui esta
função e privilégio. A arqueologia tem levado os críticos a terem uma prudência,
da qual não tinham alguns anos atrás. Isso tem colocado o estudante sempre em
estado de alerta para as “novas descobertas”, e estas descobertas muitas vezes
desmoronam os fundamentos de conclusões precipitadas.
É inegável que muitos críticos acreditam que estão prestando um serviço
ao reino de Deus. É também inegável que antigos pressupostos filosóficos con-
trários às posições históricas das Escrituras contribuíram com a rejeição da auto-
ridade Bíblica. “O verdadeiro problema não é factual, e sim filosófico”. (GEISLER,
2003, p. 397). A grande maioria das alegações dos críticos não são oriundas da
arqueologia, exegese e do próprio texto bíblico, mas sim de suas pressuposições
filosóficas, como foi demonstrado. Fatalmente lideranças de seminários e igrejas
têm aceitado de maneira acrítica premissas filosóficas contrárias à autoridade
das Escrituras.
Dentre as opções para interpretarmos as narrativas patriarcais, temos o
testemunho religioso, o testemunho histórico, o mundo literário e o mundo so-
cial. Cada um destes entendidos isoladamente e sem a cautela necessária pode
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