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IDENTIFICANDO IMPACTOS FÍSICOS DO ECOTURISMO NA TRILHA DO

CARTEIRO EM TIRADENTES/ SERRA DE SÃO JOSÉ-MG: APONTANDO


CAMINHOS PARA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Wanderley Jorge da Silveira Junior, Dowglas Zacaroni Memento, Geraldo Majela


Moraes Salvio; Viniciuis do Couto Carvalho.

Resumo:
A atividade ecoturística desenvolvida em trilhas nas Unidades de Conservação
senão planejada corretamente pode causar impactos negativos inviabilizando os
objetivos conservacionistas e consequentemente a própria atividade. Neste sentido,
conhecer os impactos físicos e atividades conflitantes pode auxiliar no
desenvolvimento de projetos de Educação Ambiental que busquem minimizar os
impactos existentes. Nesta direção, este estudo teve como objetivo conhecer,
descrever e analisar os impactos provocados pelo ecoturismo e atividades
conflitantes na Trilha do Carteiro-Serra de São José/Tiradentes-MG, fornecendo
assim subsídios para projetos de educação ambiental. Para tanto foram utilizados
métodos de pesquisa qualitativa, entrevistas semiestruturadas registros fotográficos
e notas de campo. Foi possível identificar impactos causados por interferência
antrópica durante a realização de práticas ecoturísticas, como lixo, fogueira, restos
de atividades esportivas, bifurcação de trilhas, vandalismo nas trilhas, como também
outras atividades incompatíveis com o ecoturismo e com os objetivos
conservacionistas.

Palavras-chave: Impactos ambientais, Ecoturismo, Educação ambiental.

Abstract
The ecotourism activity developed on trails in protected areas or planned properly
can cause negative impacts precludes the conservation goals and consequently the
own activity. In this sense, knowing the physical impacts and conflicting activities can
assist in the development of environmental education projects that seek to minimize
existing impacts. In this direction, this study aimed to describe and analyze the
impacts caused by the ecotourism and conflicting activities on Trilha do Cartiero in
Serra de São José/Tiradentes-MG, Brazil, thus providing grants for environmental
education projects. For both qualitative research methods were used, semi-
structured interviews photographic records and field notes. It was possible to identify
impacts caused by anthropogenic interference during practices, ecotourism, like dirt,
bonfire, remains of sports activities, trails fork, vandalism on the tracks, as well as
other activities incompatible with the ecotourism and conservation goals.

Keywords: Environmental Impacts, Ecotourism, environmental education.


Introdução
O turismo é considerado como um fenômeno global de crescimento
exponencial. Dados da EMBRATUR (2008) confirmam que desde a década de 1950
vem crescendo em média 7,2% ao ano, passando de 25 milhões para 924 milhões
de chegadas de turistas em todo mundo, produzindo uma receita cambial de
aproximadamente 850 bilhões de dólares. É um setor do mercado econômico que
cresceu rapidamente, capaz de gerar divisas e impactos positivos em regiões
visitadas. No entanto, devido à forma como vem sendo realizado, coloca em risco a
sustentabilidade social, econômica, cultural e ambiental dos destinos turísticos, pois
se fundamenta no lucro imediato, em ampla escala, e na homogeneização de
paisagens (SILVEIRA JUNIOR & BOTELHO, 2011).
Diante do contexto atual, o turismo praticado em áreas naturais, conhecido
como ecoturismo, é um segmento da atividade que se destaca pelo crescimento em
todo mundo, impulsionado, sobretudo pelo crescente interesse do contato com a
natureza, a partir da eclosão da crise ambiental (FERRETTI, 2002; LAYRARGUES,
2004).
Na década de 1990 convencionou-se a utilização do termo ecoturismo, que
também já foi chamado de turismo verde, turismo ecológico, entre outras
nomenclaturas. Lindberg e Hawkins (1995), afirmam que “as raízes do ecoturismo
encontram-se na natureza e no turismo ao ar livre”, e ainda alegam “... o ecoturismo
está tornando toda a indústria de viagens mais sensível ao meio ambiente”.
No Brasil, a década de 1980 é marcada pelos primeiros estudos públicos e
iniciativas privadas de ecoturismo. Em 1985 a EMBRATUR (Instituto Brasileiro de
Turismo) iniciou o “Projeto Turismo Ecológico”. No entanto, foi em 1987 com a
criação da Comissão Técnica Nacional, constituída conjuntamente com o Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) que se
buscou ordenar a atividade. Nesta direção, na década de 1990, sob a influências da
Rio-92, as primeiras definições conceituais e estratégias para o ecoturismo
começam a surgir, materializadas no documento “Diretrizes para uma Política
Nacional de ecoturismo”, onde a atividade é conceituado como:

“Segmento da atividade turística que utiliza, de forma sustentável, o


patrimônio natural e cultural, incentiva a sua conservação e busca a
formação de uma consciência ambientalista por meio da
interpretação do ambiente, promovendo o bem-estar das populações
envolvidas.” (MICT/MMA, 1994).

Como essa atividade necessita de espaço natural para a sua prática, muitas
vezes são escolhidas as unidades de conservação (UC), devido suas paisagens,
fauna, flora e elementos culturais existentes. Além das diversas motivações que
levam os turistas a lugares de preservação ambiental, podem ser citadas como
motivações a fuga dos grandes centros urbanos e religação à natureza
(KRIPPENDORF, 2001; TAKAHASHI, 2004). A procura por ambientes naturais
conservados/preservados, invariavelmente dotados de ecossistemas frágeis e de
grande importância ambiental, tem como consequência o contato com as UC, o que
ocasiona naturalmente, em uma demanda muito grande para gestão das UC
brasileiras” (COSTA, 2002). Já no século XIX essa estreita ligação entre áreas
legalmente protegidas pelo poder público e visitantes se evidenciava nos Parques
Nacionais de Yellowstone e Yosemite, ambos nos Estados Unidos da América
(FERRETTI, 2002).
Já em relação aos riscos potenciais, a degradação ambiental é o problema
mais comumente associado ao turismo em UC. Muitos danos são visíveis: trilhas e
vegetação destruída, distúrbios e danos à vida selvagem, poluição dos cursos
d’água e de praias, danos à infraestrutura e lixo espalhado (PIRES, 2001;
TAKAHASHI, 2004).
Atualmente, diversos estudos apontam para a importância de se planejar a
atividade de ecoturismo para evitar impactos negativos e buscar maximizar os
impactos positivos, pois os ambientes naturais, áreas de prática da atividade, são
muitas vezes sensíveis as ações humanas (TAKAHASHI, 2004). Conforme colocado
por Ignarra (2003), “os impactos são classificados em três tipos: econômicos,
culturais e físicos”, este último será o foco deste estudo.
Em relação aos riscos inerentes ao ecoturismo, Layrargues ( 2004 )ressalta:

Como todo mercado, o ecoturismo não está isento da busca da


economia de escala, que se caracteriza, no caso do turismo, no
consumo de massas. Nesse sentido, o ecoturismo se qualifica como
um voraz consumidor de espaços, colocando-o à mercê do dilema
econômico-ecológico, caracterizado pelo balanço entre a
maximização dos investimentos sem o comprometimento da
capacidade suporte ideal. A sustentabilidade do negócio ecoturístico
depende em grande medida da capacidade de se encontrar esse
ponto de equilíbrio.

Assim, o autor chama a atenção para a possibilidade da educação ambiental


(EA) funcionar como forma de compensação dos riscos causados pelo ecoturismo,
ou seja, a EA já estrategicamente usada para transmitir conhecimentos ecológicos
auxiliando os objetivos conservacionistas, assume, a partir da mercantilização da
natureza, a função de apoio e manutenção também da própria atividade ecoturística,
que só existe em função da natureza conservada. Desta forma, o mercado
ecoturístico apresenta um potencial para proteger o patrimônio natural e cultural, no
entanto, a proteção desses patrimônios não é inerente ao ecoturismo, mas
dependente da educação ambiental (LAYRARGUES, 2004).
A educação ambiental nasceu em meio à crise civilizatória marcada por
diversos problemas ambientais em escala mundial, que se agravaram
consideravelmente na década de 1960. No entanto, foi a partir da conferência
Tibilise, em 1977 na Georgia, quando foram traçadas suas diretrizes e definições,
que a EA passa a ser efetivada (DIAS, 1991). Todavia, no Brasil, assim como a
formalização do ecoturismo, foi somente após a Conferência das Nações Unidas
para o Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, a RIO-92, que EA ganhou
força e corpo legal, por meio Lei Nº 9.795, de 27 de abril de 1999, que instituiu a
Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA) (BRASIL, 1999). É importante
ressaltar que a referida Lei aponta em seu artigo 13, nos incisos IV e VII, que o
poder público nas suas três esferas deve, respectivamente, incentivar a
sensibilização da sociedade sobre a importância das UC e o ecoturismo (BRASIL,
1999).
Contudo, as discussões acerca da proteção dos ambientes naturais no Brasil já
vêm sendo realizada há anos resultando em leis e decretos com objetivos
conservacionistas, como o Código de Caça e Pesca, o Código de Águas, o Decreto
de Proteção dos Animais e o primeiro Código Florestal, ambos criados em 1934,
este último se tornou um dos mais importantes instrumentos da política de proteção
da natureza no Brasil (BENSUSAN, 2006). A partir do referido documento houve,
portanto, um cenário favorável para a criação das primeiras áreas protegidas,
formalizadas por meio dos primeiros Parques e Florestas Nacionais do Brasil, o que
ocorreu três anos mais tarde, em 1937, com a criação do Parque Nacional de Itatiaia
(MEDEIROS, 2004; MEDEIROS et al, 2006).
No ano de 2000, para melhor gestão das áreas protegidas existentes foi
aprovado a Lei 9.985, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação
da Natureza – SNUC, e trouxe considerações ligadas às unidades de conservação,
as quais são definidas como:

“Espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas


jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente
instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites
definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam
garantias adequadas de proteção” (BRASIL, 2000).

A referida Lei separou as doze tipologias de UC em dois grupos. As unidades


de proteção integral, onde o objetivo básico é preservar a natureza, sendo admitido
apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, com exceção dos casos previstos
no SNUC: Parque Nacional (PARNA), Reserva Biológica (Rebio), Estação Ecológica
(ESEC), Refugio da Vida Silvestre (REVIS) e Monumento Natural (MN). E as
unidades de uso sustentável, onde o objetivo básico é compatibilizar a conservação
da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais: Reserva
Extrativista (RESEX), Reserva de desenvolvimento Sustentável (RDS), Reserva de
Fauna (REFAU), Área de Proteção Ambiental (APA), Floresta Nacional (FLONA),
Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) e Reserva Particular do Patrimônio
Natural (RPPN) (BRASIL, 2000).
Entre as doze categorias somente na Rebio e ESEC são proibidas a visitação
pública. Entretanto, no grupo de UC de uso sustentável também pode haver
proibições e restrições quanto à visitação pública, como é o caso da RPPN, que por
ser tratar de uma reserva particular, é necessária anuência do proprietário para que
a visitação pública ocorra. Na APA ocorre situação similar, pois como esta tipologia
abrange além de terras públicas também as privadas, para a que visitação aconteça
nestas segundas também é necessário à autorização e apoio dos proprietários
particulares, nas áreas de domínio público cabe ao órgão gestor estabelecer as
normas necessárias. Entre as UC de uso sustentável, duas são muito semelhantes
em seus objetivos, mas se diferem em relação à visitação pública. Enquanto na RDS
é permitida e incentivada nas RESEX só pode existir se for compatível com os
interesses dos grupos locais e se prevista no plano de manejo (BRASIL, 2000).
No REVIS a visitação pública é permitida, mas está sujeita às normas e
restrições estabelecidas no plano de manejo, nas normas dos órgãos responsáveis
e aquelas preconizadas em regulamento. Outro fator que deve ser considerado no
REVIS é possibilidade desta unidade também abranger terras privadas, desde que
compatíveis com os objetivos da mesma, havendo incompatibilidade ou se o
proprietário não concordar com as condições propostas pelo órgão responsável pela
administração da UC, a área deve ser desapropriada, de acordo com o que dispõe a
lei (BRASIL, 2000).
Desta forma, este estudo objetivou conhecer, descrever e analisar os impactos
físicos provocados pelo ecoturismo e por atividades incompatíveis na Trilha do
Carteiro, a fim de apontar caminhos para uma Educação Ambiental que auxilie na
preservação e conservação das trilhas e consequentemente das UC envolvidas.

Área de Estudo
A trilha do carteiro está localizada no município de Tiradentes dentro dos
limites de duas UC que compõem a área deste estudo, a Área de Proteção
Ambiental Estadual (APAE) Serra de São José e o Refúgio Estadual da Vida
Silvestre (REVIS) Libélulas da Serra de São José, na mesorregião dos Campos das
Vertentes, Minas Gerais, na bacia do Rio das Mortes. É constituída por formações
vegetais da Floresta Atlântica, possuindo um dos maiores fragmentos dessa
tipologia nessa mesorregião, além de Campos rupestres e formações savânicas
(FABRANDT, 2000).
Um levantamento realizado sobre a biodiversidade em Minas Gerais apontou
que esta região é de importância biológica extrema para conservação de aves e
flora, muito alta para a conservação de invertebrados, e alta para conservação da
herpetofauna (DRUMMOND, 2005).
Criada pelo decreto 43.908 em 5/11/2004, com uma área de 3.717 ha a APAE
Serra de São José, foi criada em 16/02/1990 pelo Decreto 30.934 e possui 4.758 ha,
abrangendo os municípios de Tiradentes, Prados, São João Del Rei, Santa Cruz de
Minas e Coronel Xavier Chaves, no estado de Minas Gerais (figura1).

FIGURA 1- VISTA GERAL DA SERRA DE SÃO JOSÉ, LIMITES DAS UC


Fonte: Adaptado de Google Earth. LEMAF/DCF, Universidade Federal de Lavras - UFLA.

A área de estudo compreendeu um percurso de trilha localizada na Serra de


São José, área com precipitações médias anuais em torno de 1435 mm distribuídos
de forma sazonal. As temperaturas apresentam uma média anual em torno dos 19˚C
(BRANDT, 2000), em ambiente com domínio de Cerrado e transição para Campo
Rupestre à medida que a declividade aumenta em direção ao topo da Serra. Na face
sul da Serra, o domínio vegetal é a Floresta Estacional Semidecidual Montana, com
árvores de até trinta metros de altura. Nas adjacências dos córregos encontram-se
as Matas de Galerias (DEFLOR, 2008).
A Trilha do Carteiro é uma passagem mais curta, que facilita o acesso do
município de Coronel Xavier Chaves, na região da “terra caída”, até Tiradentes, após
atravessar a Serra de São José pelo caminho denominado Colo dos Muares,
depressão topográfica existente na cumeada da serra. É marcada por um
calçamento de pedras feito por escravos no séc. XVII e XVIII, que permanece
preservado em parte até os dias atuais e se tornou um patrimônio histórico, devido
ao período de sua construção e o tombamento no âmbito estadual pelo IEPHA – via
município de Coronel Xavier Chaves. Seu valor cultural é devido às travessias na
serra através da trilha, que foi utilizada por várias pessoas por um longo período
levando consigo informações, ouros, crenças, costumes e tradições. Local de
patrimônio natural dotado com um ecossistema raro, onde se encontram duas UC e
local da prática de ecoturismo, observação de aves e momento de reflexão junto à
natureza (DEFLOR, 2008).
O percurso da Trilha do Carteiro (Figura 2) é de aproximadamente 4 Km e
passa pelas três fitofisionomias existentes na Serra São José. Na face voltada para
Tiradentes, inicia-se a Trilha do Carteiro passando por remanescentes da Mata
Atlântica, alcança as formações savânicas e no platô da serra se encontra Campo
Rupestre.
FIGURA 2: MAPA DA TRILHA DO CARTEIRO

Fonte: DEFLOR (2008)

Um estudo realizado pela DEFLOR (2008), com intuito de diagnosticar a


situação das trilhas existentes nas UC da Serra de São José, entre elas a Trilha do
carteiro, gerou um documento que apontou para necessidade de intervenções em
todas elas. Todavia, o referido estudo não registrou especificamente os impactos
físicos provocados pelo ecoturismo, somente ressaltou os impactos provocados por
atividades incompatíveis com as UC, como: presença de equinos e bovinos, bem
como seus dejetos nas trilhas e Motocross. Os resultados mostraram que o acesso a
trilha do Carteiro ocorre a partir de uma propriedade particular, sem uma trilha bem
definida, sendo seu início propriamente dito a partir de um córrego dentro de uma
mata fechada. Entre as recomendações do estudo, destaca-se a necessidade de
equipamentos como, placas educativas, setas sinalizadoras, bancos para descanso
dos visitantes, mirantes para observação e lixeiras.

Metodologia
Utilizou-se neste estudo do método qualitativo como descrito por Leite (2008),
baseado em objetivos classificatórios, de maneira adequada aos valores culturais e
a capacidade de reflexão dos indivíduos. Foram realizadas incursões a campo e
aplicados questionários semiestruturados aos atores envolvidos com a atividade
ecoturística na trilha.
Para obtenção de dados de campo, realizou-se visitas com captura de notas
descritivas e fotografias na Trilha do Carteiro, durante os dias 25 de setembro e 16
de outubro de 2014. Possibilitando assim o contato direto com o ambiente, registros
das primeiras impressões e identificações dos impactos físicos na trilha.
As entrevistas ocorreram no dia 07 de novembro de 2014 com seis sujeitos
envolvidos com a atividade, sendo estes: representante de agência de turismo,
turista, residente, Instituto Estadual de Florestas-IEF e dois representantes da
Prefeitura Municipal de Tiradentes, com o consentimento prévio destes para
gravação de voz e posterior transcrição para melhor análise.
Por fim, analisamos os dados coletados, as entrevistas, as anotações de
campo, as fotos e os vídeos feitos, sendo possível com base nesse material
conhecer o ambiente, identificar os impactos físicos e propor caminhos para uma
Educação Ambiental.

Resultados e Discussão
A fuga dos grandes centros urbanos vem provocando um aumento na procura
pelo contato com a natureza. Desta forma, as UC dotadas de um rico patrimônio
natural e cultural, caracterizados pela beleza cênica e o conhecimento, práticas e
historias das comunidades locais, acabam atraindo um número cada vez maior de
ecoturistas. Fato que ocorre na área objeto deste estudo.
Neste sentido, devido a relevância biológica da área objeto deste estudo, para
conservação da natureza (DRUMOND, 2005) e também dos seus aspectos culturais,
cabe aqui discutir os impactos observados in loco, os registrados na literatura e os
relatados por aqueles que estão relacionados diretamente com atividade na trilha do
carteiro. O resultado desta discussão pode favorecer o desenvolvimento de
iniciativas de educação ambiental que possam colaborar mais efetivamente com
minimização, mitigação ou até mesmo o fim dos impactos físicos na Trilha do
Carteiro, pois os mesmos podem provocar alterações no ambiente natural,
ocasionando a degradação local, ameaçando os objetivos conservacionistas
inerentes as UC e a própria atividade ecoturística (LAYRARGUES, 2004).
Quando se inicia a trilha, o primeiro impacto físico que se destaca é a erosão,
que apesar detratar de um fenômeno natural, seu desenvolvimento está sendo
favorecido pela retirada da vegetação e a compactação do solo, provocada pelo
pisoteio dos visitantes (figura 3). A erosão pode provocar também impactos nos
recursos hídricos, fato que se agrava nas estações chuvosas, quando a água da
chuva lava a trilha levando maior quantidade de sedimentos para os rios, nascentes
e córregos, causando assim o assoreamento destes.

FIGURA 3 - SOLO COMPACTADO E RAÍZES EXPOSTAS.


Fonte: Arquivo pessoal

Outro fator que aumenta o problema da erosão são as bifurcações, que


consistem na abertura de trilhas paralelas que se juntam novamente. As mesmas
puderam ser verificadas na trilha. Quando isso ocorre, a área a ser pisoteada e
consequentemente compactada é ampliada, aumentando o risco de erosão e
escoamento de sedimentos para os corpos d’água.
A prática de Motocross não está relacionada ao ecoturismo, ao contrário, se
constitui de uma prática esportiva incompatível com atividade e com os objetivos
conservacionistas, haja vista o potencial de impacto que pode causar no solo,
vegetação e na fauna silvestre nas UC da Serra de São José (figura 4) (DEFLOR,
2008). Todavia, não foi observado o uso das trilhas por motocicletas durante o
período das visitas de campo.

FIGURA 4 - MOTOCROSS E IMPACTOS CAUSADOS NA TRILHA DO CARTEIRO


Fonte: DEFLOR(2008)

Outro tipo de impacto físico encontrado na trilha do carteiro são os descartes


de resíduos sólidos praticados pelos visitantes (figura 5). Os mesmos são
encontrados espalhados pelo percurso, alguns mais expostos e fácies de serem
encontrados, enquanto outros são necessários um pouco mais de atenção para sua
localização, conforme relato de um turista entrevistado:

“a Trilha do Carteiro apesar de ser uma trilha bem limpa né, a gente
com um olhar assim um pouco mais detalhado consegue identificar
sim alguns impactos, é comum bituca de cigarro, é comum papel de
biscoito, plástico, é comum tampa de garrafa, é bem comum a gente
encontrar esses vestígios ai do pessoal que caminha e está sempre
deixando um pouco de lixo pra traz”.

Durante as visitas de campo foram identificados no caminho da trilha, lata de


alumínio de cerveja, papéis, sacolas plásticas, pontas de cigarro, estas, quando
descartadas ainda com brasa podem causar incêndios florestais, fato muito comum
na área de estudo, segundo o relato do gerente da APA e do RVS.

FIGURA 5 - BIFURCAÇÃO E RESÍDUO NA TRILHA DO CARTEIRO


Fonte: Arquivo pessoal

Conforme preconizado no SNUC (BRASIL, 2000), a existência de terras


públicas dentro dos limites de RVS E APA é permitido, no caso da primeira desde
que esteja compatível com os objetivos conservacionistas, e na segunda podem ser
estabelecidas normas e restrições para a utilização de uma propriedade privada. A
presença de bovinos e equinos em um Refúgio da Vida Silvestre não são
compatíveis com seus objetivos, pois além causar impactos no solo das trilhas
devido ao pisoteio (compactação) e consequentemente provocar o assoreamento
dos recursos hídricos, pode também causar impactos na flora e fauna local por meio
da introdução de espécies invasoras.
De acordo com o guia de turismo entrevistado a maior ameaça consiste na
presença de gado nas trilhas:

“o problema, maior inimigo da serra hoje não é nem o homem, é mais


o gado. Porque o esterco do gado num período de seca é
perigosíssimo, por que quando o gado chega no alto da serra ele
fertiliza o solo da serra com o esterco dele todinho entendeu, nasce
as sementes que vem nos poros, chega ali o terreno tá fertilizado
nasce uma vegetação intrusa, essa vegetação além dela abafar,
porque ela toma espaço de tudo e mata a vegetação nativa e quando
tem incêndios ela aumenta a combustão do incêndio porque como
não é uma vegetação nativa ela seca mais.”

Durante as visitas de campo foi possível confirmar a presença de gado na


trilha, juntamente com estrutura de coxo para alimentação e, área cercada (figura 6).
Esse fato foi também apontado no documento da DEFLOR (2008).

FIGURA 6 - ESTRUTURAS DE BOVINO CULTURANA E FEZES NA TRILHA


Fonte: Arquivo pessoal

Não foi presenciado nas visitas de campo a retirada de plantas. Porém, um


impacto frequente apontado pela literatura se refere “à coleta de espécies
ornamentais, especialmente orquídeas e bromélias para o cultivo doméstico e/ou
comercialização” (BRANDT 2000). Conforme também relatou o secretário de meio
ambiente, sobre a constante apreensão da policia florestal de orquídeas e bromélias
extraídas da Serra de São José para comercialização.
Outros impactos registrados in loco foram no mirante na Trilha do Carteiro,
onde o vandalismo foi praticado nas aflorações rochosas, com inscrições de nomes
de pessoas marcados com tinta e/ou escavados na pedra (figura 7).

FIGURA 7 - VANDALISMO E ESCAVAÇÕES NAS ROCHAS

Fonte: Arquivo pessoal

As atividades de ecoturismo desenvolvidas nas UC podem ser conflitantes e


desordenadas de acordo com os objetivos da APA e da REVS Libélulas, esta última
ainda mais prejudicada por se tratar de uma área de proteção integral.
Foi verificado que o IEF disponibiliza uma cartilha que possui o nome de
conduta consciente em ambientes naturais, esta cartilha foi a única ação de política
pública encontrada na pesquisa e se baseia nas 8 recomendações do “Programa
Pega Leve!”, idealizado em 2003 pelo Centro Excursionista Universitário - CEU/RJ e
apresenta um conjunto de princípios e práticas para o mínimo impacto, adequado à
realidade brasileira, na busca de uma mudança de atitude positiva em relação ao
uso público em áreas naturais e em unidades de conservação.

Conclusões
Conclui-se que é necessária uma maior integração nas ações do IEF e dos
cinco municípios de Minas Gerais integrantes das UC (Cel. Xavier Chaves, Prados,
Santa Cruz de Minas, São João Del Rei e Tiradentes).
Até que ponto o ecoturismo pode crescer sem provocar transformações
bruscas na Trilha do Carteiro e demais trilhas das UC em questão? Neste sentido é
urgente fazer a análise de capacidade de carga das trilhas, pois a atividade está
aumentando consideravelmente na região. O Refúgio Estadual de Vida Silvestre
Libélulas da Serra de São José que é uma unidade de proteção integral, tem muito a
perder com o desequilíbrio de seu habitat com uma visitação desordenada podendo
ser irreversível.
Nas entrevistas foi comprovado que há projetos de educação ambiental em sua
maioria voltados para estudantes do ensino fundamental, também há atividades de
educação ambiental nas praças públicas e nas sedes das UC (Casas da Serra e das
Águas). Porém, para que a educação ambiental atinja também os turistas, este
trabalho sugere que a Trilha do Carteiro seja interpretativa.
Por meio da visitação com interpretação ambiental da trilha, poder-se-á
trabalhar questões dos biomas que abrangem a mata atlântica, o cerrado e os
campos rupestres. A rica e diversificada flora e fauna da região possibilitam que a
interpretação ambiental e a educação ambiental contribuam, de maneira significativa
para a reavaliação de valores e de posturas que influenciam nos padrões de
comportamento dos visitantes em ambientes naturais. Desta forma, os objetivos
conservacionistas serão alcançados e o ecoturismo poderá continuar sendo uma
atividade ecologicamente sustentável, economicamente viável e socialmente
aceitável.

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