Você está na página 1de 4

O déficit de emprego formal e a lenta recuperação do mercado de trabalho

“Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições
justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego”
Artigo 23 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (10/12/1948)

O segundo mandato da dupla Dilma-Temer foi um desastre para o mercado de trabalho formal
no Brasil. Logo depois das eleições presidenciais de outubro de 2014 – quando foram
prometidos milagres para colocar o Brasil nos píncaros – o povo brasileiro começou a sentir o
peso inexorável da realidade. O mercado de trabalho formal teve uma queda de 555 mil
empregos em dezembro de 2014, continuou caindo forte em 2015 e 2016, teve um ligeira queda
em 2017 e uma recuperação pequena em 2018.

Mas compreendido todo o período entre dezembro de 2014 e dezembro de 2018, os governos
Dilma-Temer fizeram o desserviço de reduzir em 3,1 milhões o número de vagas do mercado de
trabalho formal, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados
(CAGED), do Ministério do Trabalho.

Entre dezembro de 2014 e maio de 2016, quando era presidenta Dilma Rousseff e vice-
presidente Michel Temer, a perda de empregos formais foi de 2,6 milhões de vagas. No período
da presidência solo de Temer a perda foi de 522 mil postos de trabalho. Em todo o período da
dupla eleita em 2014, a perda foi de 3,1 milhões de empregos formais.

Nas recessões anteriores do Brasil, como as ocorridas em 1981-83, no governo do general


Figueiredo, e de 1989-91, nos governos Sarney e Collor, a perda de emprego foi grande no
período de maior queda do PIB, mas a recuperação também foi rápida após a retomada da
atividade econômica.

1
O que acontece atualmente é que a recuperação do emprego tem sido muito lenta e o Brasil
está batendo o recorde de crise do mercado de trabalho total, em especial no mercado formal,
pois nunca o país teve um déficit de 3,1 milhões de vagas com proteção social em um período
de 49 meses.

O mais grave é que a perda de empregos em dezembro de 2018, de 334 mil vagas, foi maior do
que a perda de dezembro de 2017, de 328 mil vagas, embora no conjunto de 12 meses, o ano
de 2018 tenha sido melhor do que o ano de 2017. Nos 48 meses entre 2015 e 2018 a perda de
vagas foi de 2,4 milhões segundo o CAGED. O fato é que a herança do estelionato eleitoral de
2014 teve um alto custo para a população brasileira e para a economia do país.

Este desperdício do potencial de trabalho humano acontece no instante em que o Brasil vive o
seu melhor momento demográfico da história, quando a razão de dependência demográfica
(que mede o percentual de pessoas em idade ativa em relação as pessoas dependentes) está
em seu menor valor. No passado, a razão de dependência era alta por conta de uma estrutura
etária jovem e, no futuro, a razão de dependência voltará a subir por conta do envelhecimento
populacional.

O desperdício do bônus demográfico equivale a jogar fora uma oportunidade única para dar um
salto na qualidade de vida da população. Todo país com alto IDH passou pelo bônus demográfico
e soube aproveitar esta chance singular. Mas a crise brasileira (com queda do PIB e do emprego)
e a lenta recuperação (com baixo crescimento do PIB e do emprego) estão fazendo o Brasil ter
a sua segunda década perdida e não haverá condições demográficas tão propícias no futuro.

Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), do IBGE, que
trouxe uma retrospectiva 2012-2018, mostra que a situação do mercado de trabalho é
dramática. Enquanto a população em idade ativa (PIA), de 14 anos ou mais, cresceu de 157,27
milhões de pessoas em 2012 para 169,97 milhões em 2018, a população ocupada (PO) diminuiu
de 92,1 milhões em 2014 e 2015 para 91,9 milhões de pessoas em 2018.

2
Como resultado, a taxa de ocupação (PO/PIA) passou de quase 57% entre 2012 e 2014 para 54%
em 2018. Ou seja, mesmo com o fim da recessão em 2016 e a recuperação de 2017 e 2018, o
percentual de pessoas em idade ativa diminuiu no período, mostrando como o país está
desperdiçando o seu potencial da força de trabalho e como está desrespeitando um direito
humano fundamental, estabelecido na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948.

A taxa de composta de subutilização da força de trabalho (percentual de pessoas desocupadas,


subocupadas por insuficiência de horas trabalhadas e na força de trabalho potencial em relação
a força de trabalho ampliada) – que é um indicador mais amplo da desocupação e do desperdício
do potencial do emprego - foi de 16,7% no trimestre encerrado em dezembro de 2012, caiu para
14,9% nos anos de 2013 e 2014, subiu para 17,3% em 2015 e para 22,2% em 2016, mantendo-
se elevada em torno de um quarto da força de trabalho durante a recuperação do lento
crescimento do PIB. Ou seja, uma em quatro pessoas que gostariam de trabalhar em condições
decentes está desempregada ou subutilizada, significando um grande desperdício do bônus
demográfico brasileiro e um desrespeito a um direito humano básico.

Além da baixa taxa de ocupação e da alta taxa composta de subutilização da força de trabalho,
outro indicador negativo do mercado de trabalho é a diminuição do emprego formal e o
aumento do emprego informal (ou precário e sem proteção social). O gráfico abaixo mostra que
o número de pessoas com carteira de trabalho assinada (no setor privado e no trabalho
doméstico) subiu de 26,2 milhões em 2012, para 38,5 milhões em 2014, mas depois caiu com a
recessão e continuou caindo no período de recuperação, ficando em 34,8 milhões em 2018. No
mesmo período, o emprego informal (trabalhadores sem carteira no setor privado, no trabalho
doméstico e mais os conta própria) subiu de 35,7 milhões em 2012, para 38,9 milhões em 2018.

3
Isto mostra que, depois da crise de 2014 a 2016, o mercado de trabalho ainda não recuperou o
nível de ocupação pré-recessão e o lenta criação de emprego, dos últimos 2 anos, basicamente,
ocorreu no mercado informal, pois o emprego com carteira de trabalho continuou caindo,
segundo os dados da PNADC, do IBGE.

A crise do mercado de trabalho na presente década significa a perda do futuro do país e do


futuro não só da juventude atual (que sofre mais que proporcionalmente com a escassez de
oportunidades de trabalho) mas do futuro das gerações que ainda vão nascer e que vão herdar
mais problemas do que soluções. Significa também que os idosos serão prejudicados, já que sem
uma solidariedade intergeracional não há com garantir boas condições de vida no
envelhecimento.

O Brasil está em uma trajetória submergente durante todo o período da Nova República. O passo
fundamental para mudar esta triste página da história brasileira é possibilitar que cada cidadã e
cidadão possa ter orgulho de estar trabalhando para se sustentar e para garantir a
sustentabilidade econômica e ambiental do país. O trabalho é a base da riqueza das nações e o
pleno emprego e o trabalho decente devem ser a prioridade número 1, pois é o direito humano
mais desrespeitado atualmente no Brasil. Sem trabalho para todos, os demais direitos ficam
comprometidos e a qualidade de vida tende a cair para toda a população nacional.

José Eustáquio Diniz Alves


Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População,
Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas - ENCE/IBGE;
Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

Você também pode gostar