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Agradecimentos
1- Introdução ------------------------------------------------------------------------------------- 1
2.1- Espaço interno e Espaço externo – estamos no espaço ou somos espaço? --------- 6
4.1 – Os Estados Rítmicos na partitura corporal e a conexão com o espaço vazio --- 14
5 - Diário de Bordo n 4 - Partitura e Texto ------------------------------------------------- 17
Tais questões nos levaram a desenvolver este estudo, que em bases teóricas e
práticas investiga a presentidade do acontecimento teatral e a qualidade de presença
física do ator. Tomamos como ponto de partida um dos pressupostos evidenciados no
trabalho de Hans-Thyes Lehmann sobre o teatro pós-dramático que observa que a
presença e o presente serão sempre diferentes um do outro e que a noção dessa
diferença não pode estar separada da busca do ator em trabalhar sobre a qualidade de
sua presença física.
Para aferir estes dois modos de compreensão da presença (em relação ao “aqui e
agora” ou como resultante da produção de uma qualidade de movimento) criamos uma
partitura de movimento composta pelas seguintes características: extrema precisão e
definição dos movimentos e espaços vazios que pudessem ser preenchidos pela relação
estabelecida com o público no momento da atuação.
Tal premissa exposta no texto acima orientou não só o trabalho desenvolvido por
Laban, como influenciou o pensamento de muitos artistas, teóricos e filósofos no final
do século XIX. A abordagem de Laban definitivamente rompia com o modelo
euclidiano que concebia o espaço como um lugar ocupado pelo corpo e abria a
percepção para uma nova compreensão: o corpo é espaço. E mais tarde evoluía essa
compreensão para um patamar mais complexo: o espaço está contido no corpo e o corpo
está contido no espaço, portanto não há o corpo e o espaço, mas CORPO-ESPAÇO que
se relacionam mutuamente numa relação intensiva e extensiva.
Segundo Laban, as conexões criadas entre apreensões sensoriais internas e o
meio externo são responsáveis por nossa organização motora e gestual. A categoria
Corpo, presente em seu Sistema de análise se baseia exatamente no estudo de nossas
ligações ou conexões corporais internas que se organizam espacialmente em diferentes
fluxos e intensidades. Foi possível observar durante a prática, que o trânsito entre
diferentes qualidades de espaço (interno e externo), trouxe uma consciência muito mais
apurada ao nosso corpo, o que facilitou a percepção e a vivência das variações de peso e
tempo do Estado Rítmico.
Poder investigar o movimento a partir dessas interações espaciais foi o que levou
a um aumento do domínio das alterações de tempo e peso. Quando nos
desconectávamos da relação com o espaço e com o parceiro em cena, sentíamos uma
diminuição imediata da percepção de nossa presença física.
Com a nossa percepção, permanentemente conectada com o espaço, pudemos
notar afinidades entre dimensões espaciais e as variações do Estado Rítmico.
Imediatamente associamos o estado forte-lento com o espaço interno e o estado leve-
rápido com o espaço externo. Embora exista uma afinidade entre estes estados e
dimensões, não podemos dizer que há uma correspondência inevitável entre eles.
3- Diário de Bordo Nº 2 - Repetição do movimento e auto-orientação - o
papel da consciência corporal.
Fernandez-Zoila)
Desde sempre o homem está em contato com sua consciência corporal. Talvez
não soubesse que a possuía, mas sempre a utilizou, mesmo que de forma intuitiva. A
consciência do corpo está diretamente ligada à expressividade, à espontaneidade, ao
movimento e principalmente à percepção. É através dela que o homem age, reage e se
relaciona com o outro e com o mundo ao seu redor. Ela pode ser considerada a chave
para o movimento, porque é também por ela que podemos conhecer e desenvolver
nossas habilidades corporais.
Outra categoria fundamental que auxilia esse desenvolvimento e que optamos
para iniciar a pesquisa: é o ritmo. O ritmo tem sido a nossa bússola. É através dele que
tentamos escutar os nossos impulsos internos e externos. Ter consciência de que se tem
um ritmo próprio ajuda a entender porque realizamos movimentos de determinada
maneira e que tipo de força ou qualidade pode-se imprimir neles. Como o ator, autor de
sua expressão corporal pode utilizá-la da melhor forma? Ter consciência de seus
movimentos, de seu ritmo, de sua força é uma ferramenta essencial no trabalho de um
ator.
A utilização da música no nosso trabalho de auto-percepção é um excelente
estímulo, já que esse elemento está associado aos sons ou à ausência deles. Fazer
movimentos corporais ou mesmo dançar livremente pelo espaço ao som de uma música
determina um ritmo próprio interno. Tal ritmo interno serviu para nos orientar no
momento em que resgatávamos os estados: forte-lento e leve-rápido. É a capacidade
que temos de escutar nosso corpo e dessa forma, estar desenvolvendo uma consciência
corporal. Por isso que quando um ator se disponibiliza a escutar seus espaços externos e
internos, ele está se abrindo para uma rede de possibilidades rítmicas. É a partir desse
momento que ele descobre que não existe apenas um ritmo. Existem sim qualidades de
movimento que dialogam com a presença do ator em cena.
O que constatamos com nossa última prática, é que a consciência corporal é
fundamental para nos apropriarmos dos Estados Rítmicos e utilizá-los como ferramenta
para nossa pesquisa.
4 - Diário de Bordo Nº 3: Partitura corporal e espaço vazio.
“Boa notícia para uma criança: em tudo, em tudo você terá a seu favor
o corpo. O corpo está presente ao lado da gente. É o único que, até o fim, não
nos abandona.” (Clarice Lispector, Para não esquecer,1992)
A experiência com o vazio foi muito enriquecedora, porque além de nos colocar
em risco, lidando com o acaso, foi o momento em que pudemos enfrentar nossas
inseguranças e trocar com o público. Notamos o quanto é transformador o contato com
o expectador, ele nos potencializa para preenchermos o espaço com essa relação e para
estarmos mais conectados com o momento presente.
Esse momento de relação com o público é sem dúvida, um dos pontos principais
da pesquisa, mas não é apenas nesse contato que trabalhamos a nossa presença. A
tentativa da permanência de presença passa por uma série de trabalhos individuais, e um
dos principais itens desse trabalho individual é a questão da escuta. A escuta é a
principal ferramenta para o ator e é através dela que ele poderá ativar sua percepção,
acionando a consciência corporal e a partir disso, ser capaz de criar.
O ator deve tentar que essa escuta interna permaneça continuamente durante o
momento cênico. Para isso, ele deve estar atento a sua escuta interna, tentando trocar
com o público no momento presente e ao mesmo tempo, fazendo perdurar essa sensação
que se dá como uma pulsação interna.
Uma das perguntas presentes no início de nossa pesquisa retornou nesse
momento da investigação: saber o que fazer e como fazer nos deixa mais presente do
que estar aberto a um número sem fim de possibilidades? Ficou evidente que o trânsito
entre as duas possibilidades – saber o que fazer e o espaço vazio – potencializou a nossa
conexão com o presente. Só estar em estado de escuta com o momento presente sem
saber o que fazer, muita vezes nos levou a encarar nossos medos e aumentou nossa
atividade mental. Mas, a repetição das partituras nos estados rítmicos foi insuficiente
para promover maiores níveis de expansão corporal. A combinação das duas propostas
nos levou a um posicionamento dialético e pôde produzir um aumento de atenção ao
estado corporal aliado ao risco do momento presente.
5- Diário de Bordo Nº. 4 - A conexão do momento presente com a partitura
corporal e o texto.
A introdução do texto
O vocábulo grego Théatron define o lugar físico do espectador, lugar onde se vê.
Porém, o teatro também pode ser considerado o lugar de acontecimento frente aos
expectadores, isto é, um conjunto de instâncias reais e imaginárias em que ocorre o
fenômeno cênico. É no teatro que podemos assistir ao encontro com a vida, mas esse
encontro será sempre “aqui e agora”, ou seja, no momento presente.
Cabe aos atores, estarem mais presentes para esse encontro com o público. Isso
poderá ser feito através de uma história a ser contada, ou a partir de uma relação que é
estabelecida por determinados estímulos. Ao somarmos a presença do público à
realização desse trabalho de conexão de estímulos corporais no momento presente, a
nossa investigação se tranformou. Deixou de ser um simples exercício com foco na
escuta e na qualidade de movimento e passou a ser realmente uma ação para o outro.
O desejo de agir sobre o público nos tornou mais conscientes de nossas
desatenções e atividades mentais permanentes, que nos desviavam da escuta ao
movimento. A medida em que íamos permitindo estar mais abertas ao público, fomos
conseguindo também aumentar nossa concentração e criar maiores conexões entre a
partitura e a voz.
Nesta pesquisa não contávamos uma história, mas tentávamos unir uma
seqüência corporal a um simples texto. Através de nossas práticas corporais, temos
percebido que fica inviável para o trabalho do ator realizar uma coisa separada da outra.
Principalmente porque a realização dos dois juntos é uma complementação para o
trabalho.
Observamos que o texto passou a ser mais um elemento de escuta, e essa escuta
tem acionado diretamente a nossa percepção para compreendermos como, através da
execução de uma sequência corporal que envolva os estados rítmicos, podemos nos
relacionar com o público e aumentar nossa presença física.
No início da dinâmica, a maior dificuldade estava em manter a qualidade do
movimento sem que o texto interferisse. Mas, logo notamos que é impossível não se
alterar pelo texto, então assumimos a presença desse estímulo e começamos o trabalho
de integrar a voz à fisicalidade. Essa integração trouxe muitas vezes uma sensação de
estranheza, talvez porque nos víamos diante de uma forma absolutamente incomum de
estar como o público. Ter uma história para contar ou um objetivo de um jogo entre nós
talvez facilitasse mais as coisas, mas simplesmente ter objetivos somente em relação a
nossa presença, contribuiu para elevar o nosso nível de atenção em relação a nós
mesmas e ao público.
Mas, a presença não se dá apenas pela maneira como um ator interpreta seu texto
e trabalha sua expressão corporal, e sim pela troca que se estabelece e mantém com o
expectador. Afinal, para o teatro existir precisamos de um ator, um espaço e o público.
O que estamos tentando dizer é que o expectador é uma peça essencial da pesquisa e
que pudemos perceber como a sua reação ao trabalho do ator é modificadora.
Nossas incansáveis práticas têm nos ajudado a perceber o quanto é difícil manter
a presença física durante o momento cênico, mesmo com a troca com público. Mas,
depois de todas essas experiências, ficou bastante claro, que o expectador sempre será
um componente essencial para gerar conexões com o tempo e espaço da criação.
6. Considerações finais
1
Relativo ao conceito de ação física elaborado por Stanislavski (1863-1938). Trata-se de uma qualidade
ou pulsão, anterior ao próprio movimento que define sua qualidade. A ação física é menos determinada
pelo que move e mais pela qualidade intrínseca ao corpo do ator que o faz mover.
nos relacionarmos com o público. E assim, dialogamos com o expectador, o que
aumentava a nossa qualidade de presença no “aqui e agora” do acontecimento teatral.
AZEVEDO, Sônia Machado de. O Papel do Corpo no Corpo do Ator. São Paulo:
Perspectiva, 2004.
Site: http://www.conscienciacorporal.com.br/ativfisica.htm