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O Rei Demônio Foca Em Sua Carreira Por Questões

Monetárias Parte 5

— Que lixeira!

Sua primeira reação tentava parecer a mais heroica possível,


ainda que ela estivesse com um rosto vermelho e olhos
lacrimejantes.

Ashiya estava prestes a dar uma resposta furiosa, mas Maou o


parou, pois sabia que ela não estava exagerando.

— Ei, pelo menos não é bagunçado, não acha? Nem podemos


nos dar ao luxo de ter coisas que podem bagunçar.

— É difícil imaginar que dois homens conseguem mesmo viver


aqui...

— Eu prefiro que meus Castelos Demoníacos sejam mais


funcionais do que confortáveis. — Maou, com suas vias nasais
limpas, voltou a comer a omelete.

— O café da manhã não é grande coisa também.


— Mano, Ashiya é um gênio nisso. Ele faz cafés da manhã com
praticamente nada. Até parece mágica.

— Agradeço pelo elogio, Vossa Majestade Demoníaca. —


Ashiya ajoelhou-se humildemente atrás de Maou, enquanto seu
soberano se sentava de pernas cruzadas à mesa, passando os hachis
no prato para limpar as migalhas.

Emília revirou os olhos com exasperação. Que tipo de charada


ridícula era essa? O Rei Demônio e seu fiel general estavam
saboreando isso?

— Vocês estão loucos? O Rei Demônio está comendo apenas


ovos no café da manhã? Você poderia ter comprado um pouco de
pão para misturar, pelo menos.

— Nós somos pobres, tudo bem? Algum problema com isso? —


Infelizmente, Maou não tinha como se defender.
— Sim! Tenho! Fiz meu caminho até um mundo
completamente diferente apenas para matar esses dois vagabundos
inúteis? Isso é horrível...!

Ver Maou sentado de pernas cruzadas na frente da sua velha


mesa kotatsu, tomando o café da manhã, de cueca e camisa com
manchas de suor que escorria, fez com que Emília finalmente
chorasse.
Seis tatames alinhados no piso do apartamento, desbotados
pelos raios de sol. Contra uma parede, uma estante com três
divisórias, de aparência velha, sobre algum tipo de cartolina para
que não danificasse os tatames. Em outra parede, um guarda-roupa,
com suas portas também descoloridas por causa do sol.

Não havia varanda nem cortinas nas janelas; apenas algumas


barras enferrujadas do outro lado. Algumas roupas — a maioria
eram camisas simples e de cor única, cuecas velhas e meias —
estavam penduradas na armação da janela, ocupando cada
centímetro de espaço. A máquina de lavar estava no corredor do lado
de fora, pois era grande demais para ficar dentro do apartamento.

Olhando ao redor, Emília viu uma única porta, a tinta já


descascava. Uma placa de plástico, que dizia “Banheiro”, estava
pendurada nela, como se os moradores tivessem dificuldade em
saber onde era. O banheiro tinha o antigo estilo japonês, não havia
dúvidas disso.

O balcão da cozinha ostentava um conjunto de acessórios


plásticos, pequenos, frágeis e desbotados; parecia que todos foram
comprados na loja de cem ienes, assim como alguns pratos de
cerâmica, os quais não tinham desenho algum. Um saco de lixo
estava jogado em um canto, quase explodindo de tantas embalagens
do MgRonald, pronto para ser jogado fora no momento em que
alguém se dispusesse a tirar a porcaria do lixo.

Também tinha uma lixeira de aço inox com desenhos de flores;


outro saco de lixo a ocupava. Os amassados e marcas de fitas que
eram visíveis em algumas partes sugeriam que ela era uma relíquia
do brechó local.

A geladeira que tomava conta da cozinha já lotada era de


tamanho médio, provavelmente servia mais para quem morava
sozinho. Um calendário de mesa com “Turnos do Mês” escrito estava
preso à porta com pedaços quebrados de imã para geladeira.
— Eu... eu moro sozinha, e ainda vivo melhor do que isso.
Vocês dois trabalham, mas esse é o melhor que conseguem? —
Emília tentava condenar o estilo de vida patético de Maou, mas o
interesse dele estava em um assunto completamente diferente.

— Sozinha? Você não tem amigos?

— Cale a boca!

Sem hesitar, Emília jogou a caixa de guardanapos nele. Maou


se esquivou com agilidade, e a caixa rebateu inofensivamente em
uma pilha de jornais gratuitos e revistas de emprego, amarrados
com um fio de plástico, antes de cair com um baque no tatame.
— O... o arcebispo devia ter se juntado a mim! Nós voltaríamos
para casa assim que você fosse derrotado! Mas... mas veja o que
aconteceu!

Foi Emília quem decidiu perseguir o Rei Demônio pelo Portal.


Ela assumiu a liderança e saltou para dentro, mas quando foi
engolida, ele se fechou repentinamente, deixando todo o resto para
trás.

A última coisa que viu quando olhou para trás foi o rosto tenso
de Olba Meiyer, seu amigo e um dos arcebispos da Igreja, parecendo
incapaz de compreender o que havia acontecido.

— Hmm...

— O quê?
Emi encarou Maou. Ele balançou a cabeça para indicar que não
era nada, mandando-a continuar.

Quando ela chegou ao Japão, passou pela mesma provação que


Maou e Ashiya: poupar o que restava de seus poderes enquanto
tentava construir uma vida neste novo mundo.

A principal diferença estava no fato de que o seu trabalho de


meio período pagava muito mais por hora do que o de Maou, o
suficiente para que ela se desse ao luxo de ter um apartamento
muito mais decente.

— Você tem um telefone?


— Sim. Um Dokodemo. — Ela pegou um aparelho fino e com
tela sensível ao toque, um de alta tecnologia, o qual as propagandas
diziam ser o poder de um notebook moderno na palma da mão.

— Bem... você ganhou.

— Ganhei o quê?

O telefone de Maou e Ashiya era um modelo velho e impopular,


era difícil de usá-lo para navegar na internet e a câmera teria sido
um grande sucesso treze anos atrás. Eles concluíram que, quando se
tratava de telefone, conversar e mandar mensagens já era mais do
que o suficiente.
— Faz quanto tempo que você está no Japão?

— É..., ainda não faz um ano.

— Quantos anos você tem?

— Dezessete! Por quê?

A maioria das pessoas com dezessete anos no Japão ainda


estaria sob o cuidado dos pais. Estaria no ensino médio. Mas como
esta tinha uma vida melhor e mais tranquila do que a de Maou? Isso
o deixou perplexo por dentro, mas ele optou por não discutir sobre
isso. Não era como se saber a resposta fosse melhorar sua vida.

— Seja o que for, vamos precisar de uma forma para sair desse
mundo antes que o nosso tempo de vida natural acabe. Sei que você
nos achou e tal, mas não temos dinheiro para nos mudar. Então,
bem-vinda ao Castelo Demoníaco. Este apartamento de cômodo
único é tudo o que precisamos para começar o primeiro capítulo de
nossa nova missão de conquistar o mundo. — Maou tentou usar o
máximo de emoção que podia, apontando seus hachis para ela
enquanto fazia isso. A expressão dela, conforme observava o quarto,
era de um pouco de dúvida, de pena e de cautela.

— Você acha que consegue aguentar todo esse lixo? Um Rei


Demônio vivendo dia após dia com um trabalho de meio período?

— Não sou um demônio comum, Heroína. Sei que não posso


resolver todos os problemas com força. Se você pensa que estou
disposto a viver no Japão, trabalhando naquele lugar, está muito
enganada.
— Hein? — Ashiya, inesperadamente, expressou dúvidas ao
ouvir essa afirmação. Maou o ignorou e riu bem alto para Emília.

— Minha intenção é ter o Japão em minhas mãos o quanto


antes.

Emília ficou tensa enquanto o Rei Demônio começava a mudar


seu modo de agir. Ashiya, após perceber isso, entrou em posição,
preparado para o que pudesse acontecer. Uma simples palavra de
Maou era tudo o que precisaria.

Depois de uma pausa, seu mestre falou:

— Ouça. No MgRonald, caso você trabalhe bastante como um


empregado de meio período, pode se tornar um empregado de turno
integral.

— Quê?

Outra palavra foi tudo o que precisou para acabar com a


tensão. Os olhares confusos nos rostos de Emília e Alciel já diziam
tudo. O que o domínio violento sobre o Japão e os departamento de
Recursos Humanos do MgRonald tinham em comum?

— Você deve saber mais do que eu, Emília, o quanto a


escolaridade e experiência afetam sua posição social aqui, no Japão.

— Sim, então? A propósito, é “Heroína Emília”.

— Ouça. Tente usar um pouco mais o seu cérebro, tudo bem?


No Japão, não temos magia. Somos impotentes. O único poder que
podemos ter em mãos é o título de um empregado assalariado! —
Maou deu uma gargalhada, a gargalhada que uma vez semeou as
sementes do terror por toda Ente Isla. — Guarde minhas palavras,
Heroína Emília. Meu objetivo supremo é me tornar um empregado
de turno integral neste mundo!

— Eu... não entendo como isso me afeta. — Emília ficou


congelada, sem saber como reagir a esta declaração inesperada.

— Logo chegará o dia em que eu superarei até mesmo minha


gerente de loja. Então, como um funcionário integral, construirei
meus depósitos de dinheiro e poder social. Sem demora, terei um
poder enorme, a ponto de forçar enormes exércitos de pessoas no
Japão a rastejarem perante mim! Então, usarei este poder como uma
arma para invadir Ente Isla novamente! E então, Emília? Acha que
tem o que precisa para me parar?

Ashiya só conseguiu ficar em silêncio, ouvindo o discurso dito


de maneira aterrorizante.

Com os hachis ainda em mãos, Maou encarou com o orgulho a


perplexa Emília.

— Você é tão... idiota. — Depois de um tempo, ela revirou os


olhos. Maou, ao perceber isso, estufou o peito com orgulho.

— Hah! Eu já imaginava! Um mero humano jamais


compreenderia o tamanho de minha gloriosa força espiritual!
— Perdoe-me — interveio Ashiya —, mas eu acho que ela disse
isso porque compreendeu.

Depois de um suspiro, Emília continuou, com desânimo óbvio


após esse anticlímax:
— Isso só está me deixando mais cansada.... Nem sei se
importa mais. Vou para casa. — Ela limpou os olhos vermelhos antes
de encarar Maou mais uma vez. — Mas espero que você não tenha
tido a ideia errada. Eu não te entendo nem um pouco e, com toda a
certeza, não vou deixá-lo correr livremente. Ainda me resta um
pouco do meu poder. Poderia matá-lo a qualquer momento.
Entretanto, se fizer isso, acabarei ficando sem ter como voltar para
casa. Então, caso eu queira voltar, não poderei te matar. É assim que
é.

O que ela esperava conseguir ao admitir seu próprio dilema? O


fato de ela dizer isso em voz alta, como se fosse a coisa mais natural,
deixou Maou confuso.

— Não seria justo se apenas você me contasse seus planos e eu


não devolvesse o favor, não acha?

Isso deixou tanto Maou quanto Ashiya ainda mais confusos.

— Nossa, quanta generosidade.

— Então... até que eu encontre tanto uma maneira de derrotar


vocês quanto uma de voltar para casa, não os matarei. Mas não
fiquem de guarda baixa ainda! Ugh. — O cansaço estava escrito no
rosto de Emília conforme ela se dirigia até a porta. — Além disso,
meu nome aqui no Japão é Emi Yusa, tá? Tentem não esquecer.

— Tubo bem, pode deixar.

Emília abriu a porta e então olhou para os dois novamente.

— Outra coisa, que tipo de nome é “Sadao”? Isso parece nome


de vovô.

Então, bateu a porta, levantando a poeira do apartamento.


Ashiya encarou a porta, ainda pensando no que aconteceu. Eles
conseguiam ouvir ela descendo as escadas, e, então, tudo ficou em
silêncio.
O Rei Demônio repreendeu logo depois que ela saiu:

— Todos os Sadaos do Japão vão fazer você implorar por


misericórdia!

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