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Equilíbrio extraco tidia no


"A caracte rística mais comum dos ato res !
....I
e dançarinos de diferen tes culturas e
é pocas é o abandono do equ ilíbrio coti-
diano em favor de um equilíb rio "precá-
rio" ou extrucotidiano. O equilíbrio ex-
tra-cotidiano exige um es forço físico
maior, e é esse esforço ex traqu e dilata as
tens ões do corpo, de [;\1 munciru q ue o

ator-builurino parece esta r vivo unt es I
!
mesm o que ele comece n se expressar. •
i'
Atores de várias tradições orientais
tê m codificada a aq uisição de ur» novo
equi líbrio c posições b ásicas ti ue o upreu-
diz de ve adq uirir por me io do exercício
e do treino. Na Índia, por exe m plo (Fig.
2), o corpo é dobrado de acordo com urnn
Iinhu curva que passa através d,l cabeça,
do tro nco e quadril, Esta posição funda -
me ntal é chamad'llribhrmg". "os três ,Ir-
cos'' . Ela é encont rada na escul tura de
rodos os te mplos budis tas e assim se
esp alhou através das cultu ras. des de o
Nepal até o [apão (cf. Oposição).
T ambém se encontra o equilíb rio
precário no teatro ocide ntal, como se
pode ve r neste ator da Co rnme dia
del l'Arte do século XV]] (Fig , 1), cuja
l
posição se assemel ha forteme nte no 11'''-
Mr/llgi. Se olharmos p,tr,] as silhuetas 1·2. Frirrcllino, :I pç r~OI1 :I ~l; 11l lia Co nuuc d i.r, ~r;l""r.l de: Ikrn:l rd Pic art (lõ%), c <f d'lfl\"õlrin'l de Odi xxi. S;Jnjllkl:l
dessas dUtIS figuras, notamos que e m l';l ni~r:Jhi: ~l mÚSl:;Ir.1 d;l Cn lll IlH:d i:1 dct l'Arrc c ;1 t1; ln~':lrin:1 inclian;t_'";tu (orrad:l.' rmuevc rsal mc n tc por linha s de fnrç,t
;ll1 :íll)~~1."~ II III t.:Sl1l 0 priucíl'io de equilíbriu c.~ r;í em ;I\"~l) em 'llll hi I S.
ambos os casos há U l11'l deformação da
posição cotidiana das pernas e lima rc-
du ção tb buse de apoio do pé .
Ambos os corpos parecem ter sido
partidos e, en tão, reformados segui ndo
uma linha similar.
Na rrudição mais recent e d o teatro
ocidental, e m que ,IS funções do ator e
dançarino foram separadas, encontra-se
essa alteração do eq uilíbr iosome nte em
t écnicas forte mente codificadas co rno ,\
mímica (Fig. 3) ou balé clássico.

Equilíbrio de luxo
Po r que todas as f ormas de represe n-
tação codificada, tanto no O rie nte qua n-
to no Ocidente, possuem esta constunte:
a deformação das técnicas cotidia nas de
an dar, mover-seatravés do esp 'lço e mun-
te r imóvel o corpo? Esta d e fo rm a ção da
t écn ica corporal cotidiana é essenc ial-
mente baseada numa alteração do eq ui-
líbrio. Sua finalidade é criar uma cond i-
ção de equilíbri o permanentemente ins-
tável, Rejeitando o eq uilíbrio " uuturul",
o a tor orie n tal inte rvém no espa ço por
meio de um equ ilíbrio "de luxo" , inu til-
me nte complexo, aparent emente su pér-
fluo e custando excesso de ene rgia.
Pod e-se dizer que este eq uilíbrio "de
luxo" cond uz ti sugestividade da estili-
zação e es té tica. Essa afirmação é gera!. 3. Eti cnllc Dcc roux em II Ill t í pil.:ll tlifi'lllililm: lI:1 mímica .

mente aceita sem perguntas, par:Jsab er


porq ue essas posições flsicus, que des-
troem o ser natural e a maneira coridian.t
de usar o corpo, Iorum escolhid as.
O que acontece exatamente?
O equi líbrio - habilidad e huma na
para manter ereto o corpo c mover-se no
~
EQUILÍBRIO 3S
espaço nessa posição - é o resultado de
l. uma série de relações musculares e ten-

~
sões dentro do organismo. Quanto mais
complexo se tornam os nossos movi-

I mentos - quando damos passos mais


largos do que de costume ou mantemos
acubcçumaispuraufrent e ou paratrásdo
que o usual- mais o nosso equ ilíbrio é
urneaçudo. Uma série inceira de tensões
se estabelece para imped ir a queda do
corpo.
Uma tradição na mímica cu rcp éia faz
uso consciente desse déséqllilibre: não
como um meio de expressão, mas como
um meiode in teusificaçã o de certos pro-
cessos orgânicos e aspect os da vida do
corpo. Uma mudança de equilíbrio re-
sulta numa série de tensões orgânicas
específicas, que compromete e enfutiza
a presença material do ator, mas nlima
fase que precede a expressão intencio-
nal, individualizada."
(Euge nio Barba, l\lItrop%gia Teatral: Pri-
melm Hipótese.)

.' 4. D<lnç:1 de upn.'iiç;ín n ll l1l hoho tia curte - IlIU bronze 5. ElIgtlcni V:lk hr;ln~(I\, (IXX.l~IY22) em cqllilíhrio urc -
alemão do século XV (~-IIISC II Vicmria c Albcrc, Lon- ci rio 0)/110 o bobo nu pC\-~1 de 'shilkcs pcarc. Nnilerir: Neis
dre s ). (Tcarro de Arte de Moscou, IlJI9).

(). G rc re \Vicsc nthul. bu.ihutnil c xprc ssioni stu da Alcrn:mha IlOS :Hl OS 3D, em p ()~i 'r'flfJ de equilíhrio precário, !X11; 1 de lJoIJ/(fIW(/k~r (11 II/I!.rf/ de/JlIIlIíhjo).
.16 EQUILÍBRIO
Técnica cxtraco titlia nn: a procura por
uma nova postura.
"No teatro Nô japon ês. o ator caminh a ~.
se m nunca levantar os pés do chão: ele se
move para a frente desl izando os calca-
nha res, Se alguém te nta isso. descobre
imcdiutumcutc quc o cen tro de gravidade
muda de posição e q ue. portan to, seu
equi líbrio tam bé m muda . Sc se dese ja
caminhar com o um ator do Nô,os joe lhos
devem se r levemente dob rados. Isto re-
sulta numa lige ira pressão para baixo du
colu na verteb ral e, portanto, do corpo in- >a.
tei ro. Esta é ex atame nte a posição q ue se
assume q uando se p re para para saltar.
No teatro Kubuk i, tam bém do [up ão,
há dois est ilos difere ntes,flmgoloe wagolo.
No Im/galo, o estilo exa gerado, a assim
chamada lei de diagon ais é usada: a cabe-
ça do ato r dev e semp re estar nu rnu ponta
da linha diagonal fortemente inclinudu: a
outra ponta lia lin ha é um dos pés (F ig. 7).
Todo o corpo mant ém-se em um cquil í-
brio alterado e di nâmico sustentado por
uma s6 perna .
O estilo ü!)ngolo é o est ilo "rcalísrico" o
Ku buki, Aqui o ator se move de mane ira
se melhante ao IJibilflllgi da dunçu indiana
clássica.
Na dança indiana Odissi, o corpo du
dunçarinu é mantido como se a letra 'S'
es tivesse passando através do q uadri l.
ombrõs e cabeça. A sinuosidade do Iri-
bbnllgi é cla ramen te visível e m todas as
esuiruus cl.issicus indian as. Na Iormu &:,'1/-
golo do Kubuki, o ato r move o corpo de
uma manei ra late ral, semelhante à ondu,
q ue reque r uma a ção contí nua da coluna
verteb ral, O eq uilíbrio do atorc , portanto,
també m a relação entre o peso do corpo e
sua base. os pés são conseqüen temente
mudados.
No teatro balinês, o ator-bailarino puxa
com as plan tas dos seus pés ao mesmo .. . .
~.::.

tem po q ue erg ue os ded os. o que reduz ' .:'-'';'' .

pe la me tade seu conta to com o chão, P'lru


7. Ator de Kabnk i. lch ikuwa EI11HI'\l lkc. 11111Ha p()s i~'ãn IIf'f1gnllJ.
evitara queda ele deve ufustarus pernas c
dobrar os joe lhos. O ator de Kuthukuli
indiano puxa com os lados dos p és. rnus as
conscq üênci us são as mesmus, Estu nova
base resul ta numa mu dança fundamcntul
de equ ilíbrio: o ator permanece com os
pés afastados e os joelhos dobrados <Pig.
};).
As regras p'lra a única forma de teatro
codificado nu Europa. o balé clássico, pa-
recem forçar dclibcrudamcntc a bui lurina
i~
a se move r com eq uilíbrio prec ário. Isso é !!
verdade tanto para as posições básicas
q uanto para u totalidade dos movimento s.

~ -\ .•
tuis como nmbeslflles e nltillldes e m que o
peso do corpo intei ro é sustenta do por
uma perna. e mesm o na POn ta dos dedos
de um pé. Um dos movimento s mais irn-
portuntcs, o p/i':. consiste em dançar co III
~J
osjoelh os dobrado s, a mel hor posição para
se iniciururnu pirueta ou II Ill salto (F igs. 11
e 12)."
(Euge nio Barba. ibitl.)

I
;, . -
•....< ".~i;- ,.I'
..
X. ,\prcml izcs K;ldtaka li da csco!u l\;d;lIHõllllhtl;tlll em Kcrala, índia. nu p"siçiio bãs icu. e nsinada no início du
;lllrCn d il''''I~C:IlL
I
EQU ILÍ13RIO

i
.',

9-13. Em cim«, oi esque rda, {l;l lIç'lrin'l PuruliuChl1:111 (Índi;I); e m cimu . ú direic:!, ;' ;Irr iz
Rohcn;! Carrcri; c abai xo, oi direita , Pci Y;l n·l .j l1 ~. :Hri'l. tI;1Ópera de Pcqlli m. cCj llilíh rio
prccuno clHl.'i"' q, rido com IIIlI ufastamcum tias pCfI1;1s . Abaix o, ~ c Sllllcrl(;l. cqll ilíhriu
prcc;írio no ha lé chlxxico cllrnlll:'1l "~lJlj.fllit?

.
3R EQUILÍBRIO
Genernlizações relativas ao equ ilíbrio
"O equ ilíbriodocorpo humano é uma dus
funções de um comp lexo sistema de ala-
vuncus constitu ído de ossos, articulações e
músculos; o centro de gravidade 00 corpo
muda de posição em decorrência das dife-
rentes atitudes e movimentos desse com- .1.,
I
plexo sistema de alavancas. (...)
Osmtido /II115cI/ltrr é a nossa percepção
do escada de conrrução ou relaxamento
dos músculos e do esforço q ue os múscu-
los fazema fimde supo rtar um detenni na-
do peso. Ele também é a sensação tátil dus
plantas dos pés, q ue pe rcebem as varia-
ções da pressão exercida pe lo resto do
corpo. Esse sen tido muscular condicionu
nosso eq uilíbrio em várias atitudes corpo-
rais, porque nos indica uutomat icumeute
os limites de ntro dos qu ais podem os mo-
ver parte do corpo sem cair. (...)
Êstdticn. A mecânica nos ensina que o
centro degravidade de um corpo é o ponto
de equilíbrio de todas as partes desse a b c d e f
corpo e que ,I li1lflll de gravidade é uma
linha perpendic ular uo chão a partir deste
ponto .
Sabemos também que o centro de gru-
vidude de um corpo está situado correta-
mente quando a linha de gravidade alcan-
..
i
ça o chão dentro do perímetro da bas«dr.
apoio. É o caso do corpo hum ano quand o
esni numa posi(l7o erera. Mas, visto que o
esq uele to é feito de muitos elementos
móveis, o corpo humano não seria capaz
de permanecer em equilíbrio se rodos
esses elementos não fossem fixos pelos
ligament os e pejo trabalho dos músculos.
Assim pode-se deduz ir que para man-
ter ocorpo na posiçãovertical, numa posi-
ção confortável e simétrica, necessitamos
somente de uma participação pequena
dos músculos, já que o tmbllllro esseucial i
feitopelos ligaI/mitos.
Mas se o objeti vo em estudo move-se
de uma posição normal ereta para uma
posii<io deIIteJIfão, os músculos exte nsores
da coluna verte bral, o glúteo máximo e o
quadríce ps se contraem imediatamente.
De faro, nessa posição os eixos dos movi-
mentos de extensã o e flexão das articula-
ções (a junção entre o atlas e a cabeça, as
vértebras, as articulações do quadril, do
joelho e do tornozelo) são vistas como
estan do no mesmo plano vertical da linha
de gravidade. Por causa da nova orienta-
ção dessas articulações o corpo est á numa
posição instável de equ ilíbrio, e os vários
segmentos m óveis de vem ser mantidos
fixos pela ação dos m úsculos, (...)
Em todas as posições assumidas pelo
corpo, nas quais se upóiu sobre ambos os
pés, õ centro de gravidade se moverá uo
mesmo te mpo que o eixo do corpo, da
linh a perpend icular de gravidade : quanto
maior for este deslocame nto, maiorserá o.
esforço muscular para manter o corpo em
equil íbrio."
(Angelo Morelli, Giovunni Morclli: Atllllo-
mia para o /ll1islll).

o estudo do equilíbrio torna possívelcompre- 14. Pranclla~ mnsmnulo ; I S Jl C C( ~S de ctJ llilíhrin. da il "" ftJJJlil l/JlJI"(( nrtisms, de An~clo c Giovunni 1\·lorclli. :1:11l1ll1:II1'iil
do corpo rclurivu 11linha de ~m"idllllc; h:a linhu de ~ru\'itl;(dc quumlu se anda c corre;c ; o utccnnismo usado paru f;lzcr
ender como um equilíbrio eu: af'ÍÍo gera uma :1 rml1sic;ão de urna pns i~iio ximétricu crer" pam uma posiç:io usximérrica creru (u linha do IdÚ/lIlt1gi indiano é tamb ém
espécie de drama eiaoentat: a oposição de disccrnivc] 11" pnsiçõfn (ti) no ,ilrinw dC.,·cnho (eI: Op(}.ri(nt.~r).
EQUILíBRIO 39
tensões difere ntes no corpo do atoré pe rcebi- uma visualização de forças conrnirius - e manutenção da posi ção. O ator que não con-
da cincs tesicume nre pe lo es pectad or como es ta é a image m do corpo de um ator q ue segu e dispor-se ,I este eq uilíbrio prec ário c
um conflito entre forças cl cmentu rcs. tv/as sabe como contr olar o equilíbrio -, o cq uilí- dinâmico niio tem vida na ce na: conserva a
para ser capaz de se move r de um eq uilíbrio brio dev e tornar-se dinâmico. Os m úsculos est ática cotidian a do homem, mas como ator
q ue é o result ado do esforço mínimo para em uçâo deve m substituir os ligamentos nu purccc morro.

A e

....

15i. () cq uilib rio di nâm ico é cla ramen te vislvc l nas pose s csnlrica s de ssas bailnr inns r;tilantlcs:ls: te nsão (c pn rtan rn tlinâmit-a) é xnblinlunla pelo con rruxrc rcsult unrc lia direção (Jus
lnuços c pernas (/\ c B) c o <IfôlS[;,11l1C11W e xtremo das pernas CC c D ).
40 EQUI LÍBRIO
o eq uilíbrio em aç ão pução com essa qu alidudc. N uma entr evista
O eq uilíbrio dinâmico do ator, baseado nas Chnrbounicr em 195 1, Matisse disse: " t\
CO I11

imobilidade não é um obst áculo par" ,I sensa-


f'
tensões do corpo, é um fquilíbrio fi/I av i o: isso
gera a sensação de movimentos no especta- ção de movimento . É um moviment o coloca-
do r mesmo q uando só lui imobilidade. do nu m nível que não leva j unto o corpo do
Os artistas conside ramisso como sendo de espectador, massimplesme nte suas me ntes".
gl:lnde importância. Uma fi gl/ I~l pintad:!ii qual Os atores e dançarinos devem estar cicn- .i ,
falta esta li nulidade, é para Leonardo da Vinci tcs de que as conseqü ências ciuesrésicas de
d uplame nte mon a. Primeiramente porq ue é se u trabalho, isto é, as se nsações que são
urna ficção, c, depois, porque não mostra mo- cxperimcntadus pelo espec tador, testem u-
vime nto da ment e ou do corpo. Os artistas nham os mode los dinâmicos de seu compor-
modern os tamb ém dcmostrurumsua prcocu- tamento cênico.

16. 1) ;lrl\-";, rin:1 runia: T1ulml (,."111 1I011:tflljl ill" ( s ul do i\ Ié~ i<:o. século rx): f' CHn["fJlll da I )f l 'ii ~:ii () 110 <:llrpo sem vcsni.iri«, 17. A posição de busc d ;1 dan ça balinc s» tambúnt co nté m
u ;I l rt:ra t;~1l do l:tjllilíilrill pode SCf vista cbmnu c urc 11:1 inclin:n;iill da cnbcct C do nu nco k l". Fig. .2..1. r.r.I/fI':!"m(JfI r 11111 ,1 :d tc ra çi'iCl de
cq uillbriu c ri;ll lol pelo CrlIZ :II Il t: lH n dos
I' ~~II FiJlIJI. . '. pé" (cf. Fi;:<. 1-2).

...
\

IN. 1);1Il<,":lriJ111 ct ruxco: afresco tlu oí lllllln ' {'riclinnuu cru T :lrtl'l íní;l. h :í1i:l (4})OA70 :l. C .).
EQUILÍBRIO 41
. ' . :- -
A ço e a l:(odão
"Minha mestra coseu-
muvu d izer q ue todo
at or tem de en cont rar
SUa própria força cc n-
, tral. E la poderia ser irna-
:< gi nada como uma bola
de aço no cen tro de um
triângulo, cujo vértice é
o ânus e cujos Olmos
dois âng ulos são os can-
tos da pe lve no nível
do umbigo . O utor dcve
te r sucesso em centrar
o equilíbrio nesse pon·
to de força. Se ele o e u-
contra (mas isso é difí-
cil de faze r; eu mesma,
hoje, às vezes não o en -
contro). todos os se us
movimentos, entã o, se-
rão poderosos. Mas esta
força não és inôni mo de
ten são o u violên cia.
Minha mestra disse que
a bola de aço foi cober-
ta com camadas de al-
godão , assemelhando-
se, assim, a algo macio
que, bem no se u ccn-
tro, esc on de algo duro.
O movime nto do ator
pode ser lem o e flexí-
vel e esc onder sua for-
ça, com o :1 pol pa de
um" Fruta esc onde a
semente."
(Kntsu ku Azumu)

1'J-20. 1).\I1~:Jrin a cnrcn"a numa pinturu de Kim l lon!:- 21. Kursuko {\z " tlIa numu p,,,i,"o lia dan~" 11")'0: :1 cxpanxâo do quimono C"
do (.<éclIllI XVII I). No detalh e numcn tado, o c qui lí- abe rtura :-;illlll lt;inca dosdoi'i' leq ues ampl ilicu u visivc lmc nrc (como lima letra
brio prcc:í.riod;l d:lO\-";,lfin;\ c a linha do Iri/lh/tll,!!,; india- cquilibmdu'V') n dificukladc da posição precária que, cn trcmnto, é rotalrncnrc
00 (cC O/IfJJi('ic.') s"ulilci/mcntc disc c rnfvc i-, controlada pel'l d'\I1\,arin'l .

..
I

22-23. Aror Kuthakali indiano numa p()si ~5u de equilíbrio prccir io:aprcndizc« Karhakuli trcinundo a mesma p{)s iç~o. Os jovens aprendizes (em OP{)Si~"lU '1O . itor adulto)
m;mtêm .\ posi\iiu :'msrcnt,ml!o-sc l1Hn seus ;.;mntlc::i dcdo:'i.
42 EQUILÍBRIO

24-25. i\. l:SIIIll,;nla. 110 l" '''mki. ra UJ;lm:w~ ;jJw~ ....i l) u....";u los P;H;I uumc nrur u ;,11111":1c modificar n C1ltlilíbr io. Aqui, (J S;II11l1f:li Suk crok u osrcur u seu c k:gõmtc ves tuário numa posição
rló"irf/,ililJrc earuc rc rfsti cr ; à d ire ita. bo bos dsnçuulo co m suparos ;llms üuiniu ruru do SL:l:llll1 XI, I. j lll ()~c;s. F r.tllç-I).

\
.... :
... i
L
2h. Ator llil Ópcnl de Pequim nu ma pllsiCr.in de cquilfbrio prcet rin accnnuulu pelo usn de botax rlpicax de puno prc tu com solas ulrns bmncas.uue s.10 IIS ill (:lS por pcrso na~cns de
1l0 Silfãu ele\'a dol,rais como illlp c r.ldorcs, ~cnc"l i.'i c juízes. Os ciplJ.'i de $Jp;lIf>.S Ils;ulns pc!o.s atores du Óp c ril de Pequim sã o bnsc ndox nus ca lçados tradicionais lI~d(}s uu Dinasrin
Oi n~ (I 644. I'JI I). l nc lufd nx e ntre ussc s csrão n /s'" i rhj '(In, ox sap a rn.'Ii cx pc ciuix nsadox pcht.~ mu lhe res !,ilra deforma r se us pés nos cha uunlos " pés de lírio" (cf. Fi~. 6, 1·:JJ~J'l!.i(/J.
EQUILÍBRIO 43

4::

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t~
.~ :.;;

27·3 1.1\ d:lllÇ:1 co nsiste na conrlnun mochrlaçlo do cqui -


lihrin, Consc qücn rcmc nre, ()aparen te paradoxo de dun-
cus C.'\CCtHillf;IS e m pos íçlics ajodh.ld.I.... como nos cxc m-
iJlos seguin tes: rlunçnrinax b:llinc.....~ . . .C XCClltôlJ1:lo a dau çu
1~'(JIIg ( Fi~s . 27 c 28); dan ça de div inda de chtnc~;,' COl.11
11111cac heco l (F i~. 29, mural de D rIIIhUilll}!;. 1 ~1I1;1 ~[/i1
'I':lIlJ.:. 6 1X-9(6); Sus .ume L ink e m lima de SII:IS pnrncuus
L compu.. . içJie.:.'i(Fih".10); !Ja/IJIlj 'IISallflllg , CIma :lõ1n çil : .\;C-
cuculu pnr mul heres na cor re de j uva IlnISCl:II Io XV I,
fntn~nl fad ;l e m fins do sé culo pussm ln nu Pnkic io Re a l de
[acur ta (F il:_ 31l.
44 EQUILÍ13 RIO
POI"l]lIe()a tor visa UI11 equilíbrio de luxo?
O que signiCiea para o espectador a alte-
ra çã o de equilíbrio do ator?
"N:I dança ou no teatro. o artista. se u
instrumen to e s uaobra são fundidos numa
coisa física: o eorpo humano. Uma cur iosa
conseq üê ncia é que a dança, criada essen-
cialme nte num meio, aparece para a au-
di ência e m olitro. O espccr.nlor recebe
es tritamente o traba lho vis ual da arte. O
dançarin o usa ocasionalmente um espe-
lho; ele também tem, às vezes, uma ima-
ge m visual -mais ou menos vaga de se u
próp rio dese mpenh o e, nat ural me nte,
como membro de um gru po ou corc ógru-
fo, ele vê o trabalho de Olmos dançarinos.
Mas, tanto quanto se u eorpo csr.i envolvi -
do, e le criu principalme nte por meio de
se nsações cinest ésicus em se us m úsculos,
ten dões e articulações. Este fato é di ~n o
de nota porque alguns cstcticistusassegu -
ram qu e somente os se ntidos mais e leva-
dos da visão e audição produ zem meios
expressivos e artísticos.
Tod a forrna-cincstésicu é d inâmica.
Mich ottc observou que 'o movimento pa-
rece essencial para a existência aparente
do corpo e a postura, provavelmente ex-
pe rimentada apenas como uma luse ter-
min al de movimento'. Mcrlcuu-Pontv
rnostru que "meu corpo parece -me como
postu ra" , e que. em coustrurc com objetos
visuulrncnrc obscrvudos, e le não tem uma
posição de espacialid.ulc, mas uma de si-
ruução. 'Quando fico de frente minha 'I
cscrivnuinhu e me inclino sobre ela com
ambas as mão s, o upoio est á todo nas mâo s,
e nq uanto o corpo inte iro oscilaatr ás delas
como ,I cauda de um cometa. N"o que eu
não esteja ciente da colocação das min has
COStaS ou quadril. m'IS ela está upenas
implícita cm minhus mãos, e m inhu postu -
ra inteira é legível pelo fato de as mãos
estarem upoiudas sobre a escrivanin ha' .
O dança rino constrói sua obra com as
se nsaçõ es de tensão e relaxamento, o sen -
tido de eq uilíbrio. que distin gue a orgu-
lhosu es tabilidade das ave nturas ve rticais
pe rigosas de impu lso e queda. A nut urezn
d inâmica da experiência cincst ésicu é a
chave pam a surpreendente correspon-
dên cia entre o que o dançar ino cria com
suas sensações musculares e a imagem do
corpo vista pelo público. A qu alidade di-
nâmica é o elemento comum que unifica
os dois di lercnt es meios. Quando o dança-
rino e rgue o braço, e le ex perim enta pri-
me irame nte a ten são de levantar. Uma
tens ão se mel hante é transportudu visual-
';2-33. EII1 ci m:1 1.001 is [uu vcr (I :-;X7· 11J$1) ~ l:sllllc rd:1 t:1U lúrn!f! d~ Allllacres, de ~1 ()licrc (Pa ris. 1936). O rlL1sq llililJlr
me nte ao espectador . por meio da irn u- nesta CCIl:1 é rcsu lrudo d;1 rc n rnriva de jouvcr de chuta r (I crindn c tia rugi' d":"HC último , Deve-se levar cru conta que
.l\em do bruço do dançarino. 11 palr.:n no teat ro proscénio-im.:o em estilo ituliaun foi l"cico em de clive . Esse dccfivc. que facilitou :1 pcrspccrivu nu
Finalmente, é essencial pura u execu- projeto di! cena. ohri ~ol1 os urorcs a abrirem suas pc m nx u 1i111de m anter seu equil íbrio , () 11:"1) do palc o em declive nu
ção do dan çarino e do ator que a dinâm ica tea tro C UropCIII'~11 foi uburukmudo até per to dn fim do século XIX. Abai xo, scçâo verti cal do Tea tro Sc ulu de "'·filão,
IIIICfoi plnncjad n pelo a rqu iteto ir:llt-Jnn Gill'ã eppi Pic nu ar ini ( 1734- 1XOX) e complcrad o em 177X. Observe n 1l;Ik"nCIl1
visual seja clurarnenrc separada da mera
dec live.
locomoção. Eu percebo 10/;0 que o movi-
me nte parece morto quando t1,j a impres-
são de mero deslocamento. I~ claro que
fisicame nte todos os movimen tos são cuu-
sudos pela mesma espécie de força, mas o
que conta para a exe cução art ística é a
dinâm ica transmitida ao público visua l-
me nte, porque apena s a dinílmica é rcs-
pons úvcl pela expressão e significado.
(Rudol f Arnhc im, ;I/ter. Pr.rcr./J{'ã o Vis/JJ7/).
EQUILÍI3IUO 45

.l4-.l 7. i\ utriz lhcu N'I ~c1 RõlSlHll.,\"'Cl1 rrci u.unlo IU I Odin 'lcurrcr (197 1,. Os exercícios [~1Jl 11m c fuiro lilH'io sobre li cl\ lIilíhriu do cllfllO (cf '1i riJlIIJIJl'JI/fl) .
46 EQUILÍ13RIO
Eq uilí brio e imaginação
"A fim de pesq uisar as bases fisiolôg icus

C~.
,r.' )
do comport amento, têm sido feitas ex pc-
riê ncias que estu dam a relaçâo en tre ,I
at ividade tônica posturul (o sistema rcgu-
ludor do equ ilíbrio básico, que torna pos-
sív c l ao homem manter uma posição ereta
e o se u equ ilíbrio no espa ço) e a atividade
moto ra qu e resulta em ges to e panto mi-
rua. Essas experiências têm sido feitas
com vários sujeitos; o texto seg uinte se
refere às realizadas com atores C atle tas.
1)0 ponto de vistafisiológico, osis tema
de equilíbrio é constituído de vários ter-
minais se nsório-motores, incluindo ele-

•~.'~'
men tos externo-receptivos (visual, aud i-
tivo, tátil) c ele mentos auto-receptivos
(muscula r, tcndinoso, articu lare esquelé-
tico). O próprio funcionamento dess e sis-
' ...
~
tema torna possível ao home m mant er a
projeção do seu cent ro de gravidade de n-
tro do polígono de apoio.
.
Sabemos que o homem, na posição ~; X. Itllscr;u;iio dos rcxulradox de uma experiência de equilíbr io c i lll a ~i ni1<;ãn : (:1) utlcrnxmostram lima IHlldanç:.1 de
vertical ou em repouso, nunca está imó-
ve l: ele oscila segu indo ritmos particu la-
equilíbriot1pcn:ls quando IIIll peso cxt;í se ndo Glrrc:g;lt/o rcalrncn rc; (h) atores , :It"()"HII I)), u los a jlH:l1-:i nl.lr ~csros c ações,
moxtrum 11111;1 nuulunçn ele equilíbrio duramc ;1 CXCl:lJ(;~O mímica da i.lção. i
res e comp lexos. Esses ritmos são estabe-
lecidos pelos váriossistemas reflexos scn -
sório-rno tores, quc asseguram a regular i-
~
!
zação da atividade tônica posrurul. A am- 1
.f,
plitud e c a freq üência dessas oscila-
ções do eixo do corpo podem ser medidas
com o .I/tI / o-âIW líllt:/r o (Fig , 39).
Durant e um pe ríodo cspecfficodc tcm- I
po o aparelho fornece certas informaçõcs
a respeito da posição do corpo:
- localiza o ponto de projeção do ccn-
t ro de gravidade do corpo c ru relação ao
ce ntro de apoio do polígono;
- uvuliu a amplitude e freqü ência do
dcslocume n ro:
- mede o fenômeno no tempo c cs-
paço.
Enquanto o sujeito est áe m posição na
plat aforma, a informação que obt emos no
osciloscópio, após tratamento ele trônico,
é lida de duas formas:
- ve torial, quando os des locamentos
ante rior, poster iore lateralsão registrados.
Este é o s/aro-ciuesograma (Fig. 40).
- linear, quando os deslocamentos
1I
anterior e posterior são difer enciados dos !
deslocamentos laterais e são registrados
.)C).O cinct êmc rro: iusmuncn ro que tuc dc a nmplitud c c i
no tempo. Este é o slabilogmtlltl (F ig. 311).
No primeiro caso, a área superficial
rrcqiiêlll:i;. clux osc i hl(rik:~ do eixo tlu corpo.
j
coberta pela "munchu" é medi da cm milí- j
metros q uadrados; no segundo caso, o
comprime nto da linha feita pela mancha é
med ido e m centímetros. Os quatro círcu-
I
los concêntricos na tela do osciloscópio
correspondem a diferentes limiares de
pressão exercidos sobre a p lataforma:5,10
ou 15 qui los purudeslocamentos de 1,2 ou
3 centímetros em amplitude e para deslo-
J;
·1
camen tos angulares no plano sugitul do
sujeito de 1,2 ou3 graus. Todas as oscila-
i
ções da "mancha", que vão além do lirni ur
1
determinado nos quatro pontos cardeais,
l
{
são registradas. 40. Cincmp;ri.lIlm: t.I iahralll<1 ve tor de mlllJ,lIlç:1 noequilí- 41. Gh,,,I,,., Dullill (J 885-1949) C0l110 Arpagon em (J
N a prime irasérie de exper iências exa- ln'iu me dida pelo cinctômctro. til: Moli êrc, numa posi ção de equilíbrio ex tra-
tlVII/1!Jl!fJ,
cotidiano.
J
minamos o comportamen to posturul de
dois grupos de sujeitos em boa condiç ão ij

i
física:
- um grupo de nrletus cujo esq uema

i
EQUILÍl3RIO 47
corpóreo é estabel ecido pela expressão
'I
dos gestos adaptada realidade;
- um grupo de atores, cujo esquema
corpóreo é estabe lecido pela expressão do

IJ gesto mímico, imaginário.


Aexperiência constitu iu em comparar
os resultados ante s e durant e o carrega-
mento dos pesos e durante a execução da
mímica dos mesmos gestos. Os resultados
(Fig. 3H) mostram que:

j a) no grupo de atlet as, as variações em


deslocamento do centro de gravidade do
corpo são produzidas e m proporção ao
peso quando o peso é real, enquanto a
execução mímica do mesmo gesto não
causa mudança em deslocamen to.
b) no grupo de atores, acostumados .1
I traduzir uma id éiaimaginária com o corpo
I e com gestos, houve rea ções diferentes
nas duas situações: carregar o peso não
modificou praticnrnenre as zonas de des-
locamento, enquanto a ação mímica am-
pliou os deslocamentos em proporção ao
peso imaginado.
Paradesen volver uma atividade moto-
42-43. () mímico francês Ericnnc Dccn urx c 11111 :1 m.iscum lI:t Cmunnnliu dcll' Arte iralial1i\ numa ~r;t \'ur;l tio sécu lo ra, os sujeitos cujo esq uema corp óreo é
XVII: :I me sma posi~..i () prc:dria de cqnilihrin,
determinadopela expressãodogestoadup-
tuduà realidade - atletas - usam cssen-
oi ciulmcnre informações buseudus num es-
tímulo real e tang ívc] , Os atores, eujo es-
quernu corpóreo é dete rminado pela sua
ex pressão de gesto mais elaborada, me-
morizada, que eles podem repetir se m
suporte real, podem preparar a ação do
corpo essenciulmen te partindo' do imagi-
nário.
(R'1I1k'l Bjelác-Babíc, O uso rio mélodo cietllífí-
co noeslllrlo ria exp ressiío ai/ética e teatral}.

A dança desconhecida de Brecht


t\ influência que Brecht teve sobre o teutro
como diretor, acima e além da influência de
'l
suas teorias, foi devida sua hubilidude de
fazer emergir a "vida" em seus atores. Isso
foi teste munhado por quem viu suas monta-
gens e está documentad o em seus livros mo-
delos, quc foram ded icados aos espe táculos

1 que dirigiu.

I 44.45. A dançuriun indiana de Odixsi. Sanjllkc<1 P<ll1igrahi. c 11m t!;illçarino xumã pi}!;lllclI [t1c.'icnho tio',lIHroPli !ol!:o
fr'lIll:ês l ,cRoy. IH97): os dois builurinos ussum irum uma pClsi~";,tn sem e lhan te de equ ilíbrio prce iri«.

- -- - - - - - - - - - - - - - - - -
L.:.:~.._ _ .. i
-:-:.~-'. --_ . - _ . _ ......

oma runõs l:lt


EQUILÍBRIO 49

.,
i

46-." I . l\ hailarino' ô1..:rohá[iL~1 i(~ ri~H1;l SCl.1:hi (l);í~in;t a urc rior) nu (;o\'cnr C;;lrdcn de.: Londres. em IXI6. A procura tio ato r-bailarino IUH 1I1ll cquilihrio ele luxo não t: orie ntada 0 ;1
t1i(c\:';io ti.. acr ob acia c vin uositl.u lc. m;l.fii n:1t1ircçiio do c xtracorid imo, comn Ile mo nsr r:lfll as sC;':l Iinn.::s pn."iiçik.:."i em v,íriõl.'i cul mras c ~C::n cro_"i: jnlian Bcck (e m cima, à e sq uerd a)
(1925 . l lJXS). nu l .ivin;.:'rhcarcr c lll St:ir ,11M PIiIJ/iaJJ, na llic nul de Vene za. 197$: atriz da Úpt.:id d e Peq uim Pc i Y;lIl .ing (em vim n, ~I d ireito' ); dnnçurina balin cxa Ni Mude \VirJrin i
ol

(1..' 111 1);l ixo , ;', cS'It u.:n la); I~;hlf}rôl J)IIIJLiU l {c tu baixo, nu ce n tro] ; c d an ç:lrin a j" pollCS:t d e H III() , N ;:lfSIt Nil kajimól (e m bai xo. il di n- it a ).
50 EQUILÍBRIO
. O diário guardado por 1-];IOS [oachim
Bunge, o assistente de Brecbt no Círwlode r
; -.-
giz caucasiano, é um re gistro único do uso
d o de sorientamento e preci são nos deta-
lhes de Brecht, práticas pelas quai s ele mes-
mo se deixava guiar c nq uun to trabalhava
no nível de organização da pre sença, dil
pré-expressividade. Durante muitos dos en -
saios ele parecia estar completnmcntc ai heio
'10 resultado, e evitava referir-se ,I qualq uer
coisa já conhecida ou dec idida . Esse pro-
cesso intuitivo "pensamentos relacionam -
se por meio de saltos", ele disse, "pensa- L
mentos saltando dentro de uma conexão "
- confundiu muitos dos seus atores, m,IS
ajudou a destruir premissas recitutivas e
ideológicas e causo u associações não espe-
radas e significados que emergiam das per-
son agens e situações.
Exem pio deste processo é a construção
do comportamento cê n ico da vida da espo -
sa do gove rnador por Helene Weigel, que
iniciou dez dias antes du estréia do espet á-
culo. Os come ntários de Bunge sobre a
per sona gem de Weigel são particularmen-
te interessantes: ele observa que a perso-
nagem assumiu um valor sócio-est ético,que
n,1O est ava presente quando Weigel iniciou
o trabalho, mas emergiu do processo que
I'-,.
ela usou para construí-lo .
Apre sentamos alguns trechos do diário
de Bungc , publicados em Bredtl, o rlinlor,
de C. Meldolesi e L. Olivi, 11m livro indis-
pensável para uma compreensão da relação
de Brecht com se us ato res, tanto na vida
parti cular quanto profi ssionalmente (uma
área at é agora pouco estudada):

~
"27.11.1953. Sétim o dia de ensaio
Quundo dirigc, Brecht purece esque- .
.
-
."f
.
__
l
~,_
'
l

ce r que foi ele quem escreveu a peça . . -


, .
Tem-se freqüenremente u impressão de
que ele a está vendo pela primeira vez.
\
Às vezes, ele parece surpreso com al-
guns acontecimentos do texto e precisa
q ue algué m lhe e xplique as coisas mais
óbv ias. Ele pergunta '10 ator que faz o
pers onagem Azduk : 'Mas o qlle é ele
realmente?' E Busch responde, rindo :
' Estou ce rto de que não se i, não 5011 o
autor'. Brecht: ' O autor. .. uh, bem, nã o se
de ve seguir sempre o autor'.

Oita vo dia de ensaio


O dois udvogudos apresentam seus
argumentos de defesa. Brccht tem lima
idé ia: 'Is so deve se parece r com lima
dança.um bal é. Pura isso eles receberam
quinhentas moed as de prata'. Então ele
salta para o palco e dança a cena int e ira
para eles , recitando parte do texto. De
volta à sua cadeira, continu a mostrando
aos atores como eles deveriam mover-se
e continua a dançar.

D écimo sexto dia de ensaio


O governador está sendo le vudo em - 5Z-54. Sruui sluvski , (111e definiu o ator come "11m mestre
bora . Dois lunceiros, feitos por figuran - (ti:" ;u;õcs Ilxicas", rcri» uprcciado a verdadeira linha 1.11:
açõc_'I: c Ctltll"'-õl<;õc.' no, crês ilrute." .'õcJ.:II;nrc... llir;~itlo.'i
tes, acompanham a procissão. Brecht tem
11m Brccht: l luns C;allgIcr(em cima) corno C rco nrc em
um ator experiente que faz um dos );111-
ce iros, a fim de mostrar ,lOS figurantes
,llill':!.nllll nu Srndnh curc Cluu (ICJ4:-i); LC() n~Hd Srcc kc!
(centro] como Puutila. em ('mui/li c sat " im/li :I l/1l/j no
lkrlilll.:r Enscmhk ( l lJ4lJ); c Ekkdl;ml.l)<:h;II' (em h'li-
r
como isso deveria ser feito . Mas eles 11"0
xo}, ":01110 Eilir em .llliL' r .i Jrtl gl'IIJ, nu Bcrfiucr Enscmbl c
con seguem agir como lunce iros , sua
(1952 ).
EQUILÍBRIO 51
represe ntação é dcscolorida.Brcc h t d izsu- re mos prontos muito ce do'. Com isto ele rompi das, cortada s, reintro duzidus, en cur-
bitamen te, su rpreso: 'E ssa é ;1 diferen ça q uer dizc r que certa s ce nas c det alhe s tudns e finalmente colocadas de volta onde
entre um ator e um ligur'lnte: o ator upc r- scr íio consid erado s ' defi nitivos m uito estavam originalme nte .
Ieiçou as menores ações, e le pe rcebe quão cedo ': de tal modo que os atores torn am-se Os gestos são igualmcnte modif icados,
important e e las são; o extra nem me smo rígidos. novos ges tos são testados, fixados e muda-
conseg ue começar'. B recht usa todos os me ios imaginávei s dos novam e n te . Tu do pode ser mos trado
para impedireste en rijec ime nto. Umace nu e m divers as facetas. Brecht criu o caos, co-
lligésill/o seglll/do rliarle ensaio é e nsaiada até que suas linhas gera is este - mo sempre. Es t á sempre discutindo no-
Brec ht ge ralme l1l c dá a se us atores jam claras. Ent ão, o trab alho sob re essa vas possibilidades. No fim, ningué m sabe
uma grande liberdade e est áuberto às SU;IS cena é interromp ido c outra cena é en saia- o que aconteceu . Nem mesmo o p róprio
suges tões. O que foi trabalhado até este da. Os atores pedem por muiscontinuida- Brecht, Agora ele inte rrompe o ensaio:
ponto é o esquel eto dos e nsaios, m'IS a t é de nos ensaios, de modo que eles possam 'Vamos in ter romper, pois não sabemos o
agora nada foi fixado. Os elemen tos cons- mont ar SU,lS ;lÇÕCS C personagen s. Brecht que fazer em se guida'. E le faz isso com
tituti vos dos e nsaios são, por um lado, as não ccdc pront umentc a ess e pedid o. Ele freqüência , qu ando no palco não conse - '
pe rsona ge n s, poeticamente criadas em e nsaia as ce nas em se qüência some nte gue ir adiante. Desta confusão, entre tan-
ação e, poro utro lado, movimento s reprc - q uando neces sita se conve ncer em sucrifi- to, freqüentemente algo novo su rge:
sentados uuto muticumcn tc por repe tição cur esses mome ntos c ges tos em ce nas es-
constante. Nesta fase fixa-se o qu e foi pcc íficas. que some nte estão lá por sim- CeJllésilllorléâ1llo seglllldo dia rle ensaio
elaborad o, mas muitas peq uenas mudan - ples bele za. A atriz que faz a esposa do gover nador
Ç'IS ainda são feitas, Assim, q uando se fica su bitamente doente.
truhalhuco m Brechr. tem -se sempre 'I im- :\'ollngàiJllo 1"n110 rlia rlerasaia P'lra a est réia não se pode con tar com
pressão deque nada é definitivo . Brccht ensaia a cena da ponte inintcr- seu resta be lecime nto. Helene Wcigel con-
ruptu rncntc, duran te ce rca de d uas horas. corda em assu mir sua parte, e começa a"
()lI ffrlmg':siJllo jJl"Ílllúro dia deensaio Ele começa do princípio, repetindo várias e nsaia r, mas mu ito circu nspectamcn re.
Brecht diz: 'Tenho receio de que esta- vezes, I\S seqüências dos utorcs siio inter- Brechr não pre te nde que se refuça o mo-
de lo de Kuthe Reichel e a deixa tentar
en contrar sua própria interpretação. En -
tão, uma coisa surpreendente acontece:
We igel des cobre uma maneira completa-
men te novu de interpretaru parte da espo -
sa, ao passo que os criados mantêm as
mesmas curacterls ticus que eles tinham
com Re ichel. Reichel viu "a esposa do go-
vcrnador com o uma mul her q ue esruvu
sem pre cm ação e trabalhou com tre men -
da energia: falava suas linhus de m uitus
maneiras diferentes, em \'OZ alta e agud a,
de maneira macia e peno sa, e dominava o
palco com movime ntos muito s rápido s,
Weige/ de u a impressão de que era u ma
Iídc r inata e conseguiu esse efe ito tra ba-
lhundo quase que de manei ra opos ta.
Em vez dos saltos vocais tipicame nte
histér icos de Reiche l, Weige l escolheu
um tom calmo e igual. Ela falou com uma
voz baixa, mas de manei rufirrne e incisiva.
E em lugar de voar ao redo r do palco,
assumiu uma posição mais tranqüila. Em
quas e todas as ce nas e la permaneceu sen-
t'lda em um lugar e de I,í domi nou o palco
inteiro. Ela não mov-eu um dedo, apenas
deu ordens.
Brech t aceito u uma das id éias de Wei-
gc lapós te r verificado a eficácia no palco:
o criado deve se ntar-se sempre ~ direita ,
ao lado du senh ora, e quando ela faz sinais,
ele deve se ajoe lhar e oferecera ela as suas
costas, com o se fosse umu cudeira. t\ espo-
sa do governador interpretada por Rei-
che l, em sua hister ia, mostrava some nte
um perigo limitado e revelava, mais que
qua lquer coisa, o esnobismo obtuso de

i
mu lheres bem -nuscidns. Ela não deve ser
levada mui to" sério . Aesposa do govemu -
dor Icitu por Wcig el mostrau face sedutora
c brut ul da estupidez. Ela é clurarnentc
perigo sa,

i
Gruçus il sua típica ed ucaç ão de classe
alta, a esposa do goverllildorse tornou urna
figuru rígida, semelhante 'I uma bon eca.
55. lidem: \Vci .~c1 como u C S pO~~l do ;.::nq;rn,ulorem {J tÍrmlnriogi:;(({1I{mim/fl. cscritu c d i ri~id;l por llrcch r (llcrlincr Q uando e la está lidando com os criados ,
Enscmhh.:1A upurcntc imobilidade m:lIl r;1 11 111 lll'II.:lcn de rcnsücx. n:sll !i;tl!o n;in snmcnrc da manciru pc.;L! 1111:11 ;IS não parece hu mana, uma caratte rlsticuqu e

I (li n.:~..(k 'Í \ /11 curpu s:io di\'idid:IS(pernas. torxo. face c ()Ihos). Ina..; c;lIl1lJérn (/0 (;((llilíhriopn.,:(.'õí rio ' I,re se det'e :[fI modo
pOIlCO l'ÍmlOdo de.: estar scn r:,l!a sohre 11111;1L""Cr.IY:1 Clln "'lltt .
estÍl perfeitame nte subli nh'ld'l pela suu
gentileza fri'l e form'll."
52 EQUJLÍI3RIO

-~;~
56-59. Q uatro I\ltadro:"i de Hyszartl Cics lak (1937-19tJO), em () /'!i1Jfi/Jer ;'I/!.atl ll /r( I()6S).allapriltlnde Cuklerún por .lnIiIIS'l. SlllW:ft:ki c diriJ!:ido 11M Jcrl.:' G rorowsk]. Um exelll plo '
de "rcarro rmu d"np:--" - lI lll uror conrc mpor.inco xintct iza a da n ~";1 de Clll lilíh rio em tmlax :as ]luSiçlic s pnssi\'ci..: sen tado. ajoelhado. em 11é.
EQUILÍBRIO 53

60·62. EI11 ci ma, 511;1';'


N;Har~ja - Se nhor lia
Dan ça, s":<'; lllo X, bronze
d o su l da Intliíl; em bui-
xo. ~l c....qncnla, n bailari- .
no a lem ão Gerr Pnlucca :
CIH baixo, à dirciru, li~lI­
ra d e Pa n rulcn nc por
jn cqucx Cal lor (~r;l\·IIr:.I.
1( 16). As pnsiçik x rlcx-
scs dançlri no:o;. que cs-
[~O sc pi.l ri.lllos por ;.:m n-
dc s dis[ân ctdS no temp o,
sã o provas inC(llIíw>C;IS
do pape! do cq uillbriocx -
rracoridiano na urrednrc-
prcxcn ração.

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