Você está na página 1de 41

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES- UCAM

JOSÉ DOMINGUES DE GODOI NETO

APLICABILIDADE DA MULTA DO ARTIGO 475-J


DO CPC NO PROCESSO DO TRABALHO

CUIABÁ
2009
JOSÉ DOMINGUES DE GODOI NETO

APLICABILIDADE DA MULTA DO ARTIGO 475-J


DO CPC NO PROCESSO DO TRABALHO

Monografia entregue a Universidade


Candido Mendes como requisito parcial para
conclusão do curso de pós graduação latu
sensu em Direito do Trabalho e processo do
trabalho, turma 2008/09.

Orientadora Profa. MsC. Cleire Oliveira Rodrigues

CUIABÁ
2009
DEDICATÓRIA

Á minha esposa Fabiana,


pelo enorme incentivo.
Resumo

Este estudo visa defender a aplicabilidade da multa do artigo 475-J do


Código de Processo Civil ao processo do trabalho. Garantindo assim que a legislação
infraconstitucional seja interpretada conforme a Constituição Federal de 1988,
atendendo à força normativa de seus princípios e maximizando a eficácia de direitos
fundamentais. Avançando na idéia de tipos de lacunas normativas e através da
heterointegração das fontes processuais os operadores do direito podem conseguir tornar
o processo do trabalho mais célere e efetivo. Pois a aplicação do artigo em comento
pode ser um meio eficaz de tentar coagir o executado ao cumprimento voluntário das
sentenças trabalhistas. Garantindo assim que o processo trabalhista esteja renovado e em
igualdade não só com outros ramos do processo, mas também que mantenha sua
principal característica, a celeridade, em face da evolução do direito e da sociedade
como um todo.

Palavras chave: aplicabilidade; 475-J Código de Processo Civil; processo do


trabalho; interpretação conforme a Constituição Federal; lacunas normativas;
heterointegração de fontes processuais; diálogo das fontes; celeridade.
Abstract

This study intends to defend the applicability of the penalty under Article
475-J of the Code of Civil Procedure to the labor procedure. Ensuring that the ordinary
legislation can be interpreted according to the Constitution of 1988, respecting the
normative force of its principles and maximizing the effectiveness of the fundamental
rights. Advancing the idea of types of loopholes and by procedural sources integration,
law operators can achieve to make the labor procedure faster and more effective. After
all the application of this Article under discussion can be an effective mean of trying to
coerce the defendant to comply voluntarily with labor sentences. Ensuring that the labor
procedure is renewed and equal to other procedure branches, but also to keep its main
feature, celerity , given the law and society evolution as a whole.

Key words: applicability; Article 475-J of the Code of Civil Procedure;


labor procedure; interpretation according to the Constitution; loopholes; procedural
sources integration; procedural sources dialogue; celerity.
Sumário

Introdução........................................................................................07
O art.475-j do CPC..........................................................................09
A execução trabalhista e aplicação do
CPC.............................................................................................................12
Interpretação conforme a CF/88 e heterointegração de normas
processuais..................................................................................................16
Adaptações necessárias à aplicação da multa.................................29
Posição jurisprudencial...................................................................33
Conclusão.......................................................................................37
Bibliografia.....................................................................................40
Introdução

O presente estudo trata da polemica acerca da possível aplicabilidade da


multa prevista do artigo 475-J do Código de Processo Civil- CPC nos processos
trabalhistas.
Considerando que os tribunais trabalhistas não possuem um entendimento
pacificado e que o colendo Tribunal Superior do Trabalho adotou a teoria menos aceita
pela doutrina, afastando a aplicação do artigo em questão.
Em que pese a doutrina e os operadores do direito em geral serem
majoritariamente a favor da aplicação da multa do artigo 475-j do CPC, o egrégio
Tribunal Superior do Trabalho- TST vem modificando as decisões de Tribunais
Regionais do Trabalho-TRTs e afastando a incidência da multa. Para tanto usa como
argumento a existência de rito próprio no diploma celetista. Tal posição parece dotada
de um formalismo exacerbado e incompatível com o atual avanço do ordenamento
pátrio.
Ressalte-se ainda que muitos são os casos em que os credores trabalhistas
não conseguem obter a efetivação de um direito reconhecido em juízo por conta de um
processo de execução que privilegia a mora do devedor.
Portanto se faz necessário um estudo sobre o tema em busca da solução que
melhor se amolde ao nosso ordenamento jurídico pátrio. Uma tese que esteja de acordo
com a carta magna brasileira em busca de uma execução trabalhista efetiva e eficaz.
Enfim, na busca pela tão aclamada efetividade processual deve-se ou não
romper com o formalismo jurídico e proceder a heterointegração das normas
processuais? (neste caso limitado ao estudo do artigo 475-J do CPC). Seria o rito
celetista suficiente para garantir ao credor trabalhista o adimplemento de seu crédito?
Qual a melhor solução de acordo com os modernos parâmetros de uma
constitucionalização do direito processual comum? Estas e outras celeumas serão
debatidas e analisadas ao longo deste estudo, buscando assim elucidá-las ao máximo.
Desta forma o presente estudo visa, através de revisão bibliográfica,
explicar as razões da necessidade de aplicação da multa, e tentar demonstrar qual destas
juridicamente porque aceitar a aplicação é a posição mais adequada a ser adotada pelos
operadores jurídicos em busca de uma justiça do trabalho ainda mais atenta aos ideais
constitucionais de efetividade dos direitos fundamentais.
Assim será feita uma análise da execução trabalhista e seus princípios,
verificando os requisitos para aplicação subsidiária do CPC e buscando analisar a
referida aplicabilidade no enfoque de uma interpretação constitucional adequada.
O artigo 475-J do CPC

O Código de Processo Civil-CPC passou por uma extensa e significativa


reforma em 2005. Tais modificações visavam principalmente garantir uma maior
celeridade à execução. Compatibilizando assim o processo civil à previsão
constitucional do artigo 5º, inciso LXXVIII. O qual foi inserido mediante a Emenda
Constitucional nº. 45, de dezembro de 2004, que estabelece para todos os cidadãos o
direito de um processo judicial e administrativo de duração razoável, imprimindo-se
meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
Vejamos a redação do artigo 475-J do CPC, objeto maior deste estudo.
“Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia
certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o
montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez
por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614,
inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.
(Incluído pela Lei nº 11.232/05 – DOU de 23.12.05)
§ 1o Do auto de penhora e de avaliação será de imediato
intimado o executado, na pessoa de seu advogado (arts. 236 e 237), ou, na
falta deste, o seu representante legal, ou pessoalmente, por mandado ou pelo
correio, podendo oferecer impugnação, querendo, no prazo de quinze dias.
(Incluído pela Lei nº 11.232/05 – DOU de 23.12.05)
§ 2o Caso o oficial de justiça não possa proceder à avaliação,
por depender de conhecimentos especializados, o juiz, de imediato, nomeará
avaliador, assinando-lhe breve prazo para a entrega do laudo. (Incluído pela
Lei nº 11.232/05 – DOU de 23.12.05)
§ 3o O exeqüente poderá, em seu requerimento, indicar desde
logo os bens a serem penhorados. (Incluído pela Lei nº 11.232/05 – DOU de
23.12.05)
§ 4o Efetuado o pagamento parcial no prazo previsto no caput
deste artigo, a multa de dez por cento incidirá sobre o restante. (Incluído pela
Lei nº 11.232/05 – DOU de 23.12.05)
§ 5o Não sendo requerida a execução no prazo de seis meses, o
juiz mandará arquivar os autos, sem prejuízo de seu desarquivamento a
pedido da parte. (Incluído pela Lei nº 11.232/05 – DOU de 23.12.05).”
(Grifo nosso).

Passou assim a existir uma multa para o não cumprimento espontâneo da


obrigação, com o intuito de tornar a execução mais célere. Afinal, o executado que não
efetuar o pagamento deverá ter seu patrimônio reduzido em mais 10% pela recusa no
adimplemento.
Outro aspecto importante a ser considerado é que o devedor será
cientificado ao ser intimado da sentença. Podendo ser intimado na pessoa de seu
advogado ou representante ou pessoalmente, com a possibilidade de tal intimação
ocorrer até mesmo pelo correio.
Conforme o “caput” do artigo 475-J do CPC, uma vez transitada em julgado
a sentença líquida, ou fixado o valor a partir do procedimento de liquidação, o
executado deve, independentemente de qualquer intimação, realizar o pagamento da
quantia em 15 dias, sob conseqüência de multa de 10%, que ser imposta, de ofício, pelo
juiz.
Caso o devedor não realize o pagamento, haverá incidência da multa de
10% sobre o valor total da execução, e mediante requerimento do credor, expedir-se-á
mandado de penhora e avaliação, prosseguindo-se a execução nos seus ulteriores
termos.
Schiavi (2007) acredita que não há necessidade de se citar o reclamado para
se iniciar a fase de execução. Pois o reclamado já tem ciência de que deve cumprir a
decisão a partir do momento que dela tem ciência.
Analisando de forma geral, o CPC tentou com a reforma de 2005 tornar-se
tão ou mais célere que o próprio rito trabalhista, o qual sempre foi invejado pela sua
relativa rapidez e eficácia.
Busca-se com referida norma compelir o executado ao pagamento
atingindo-o em seu patrimônio, aumentando seu ônus em caso de atraso.
Bezerra Leite (2007), nos traz que esta multa tem natureza punitiva,
surgindo como uma espécie de sanção processual. Tendo seu valor fixado por lei, não
caberia ao magistrado majorá-la ou mitigá-la.
Cumpre acrescentar que tentar atingir o patrimônio do devedor inadimplente
é a maneira juridicamente mais compatível com a Constituição Federal de coagir o
executado ao cumprimento voluntário da comanda contida na sentença. Haja vista que
outros meios coercitivos que visam a uma restrição da liberdade são completamente
incompatíveis com ordem constitucional pátria.
Em apertada síntese, para não fugirmos ao tema aqui abordado, podemos
afirmar que a Constituição Federal-CF adota um sistema materialmente aberto de
direitos fundamentais (art. 5º §2º da CF), e que acabou por elevar o status das normas
favoráveis a dignidade da pessoa humana. Assim em reiteradas decisões, o pacto de San
José da Costa Rica, foi base para vedar a prisão do depositário infiel, tendo tal
posicionamento sido consubstanciado na súmula vinculante de número 25.
Desta forma, acertadamente não se pode mais restringir a liberdade do
devedor, o que acaba por tornar o dispositivo em comento ainda mais importante, afinal
deve-se atingir os executados em seu patrimônio, coagindo-os ao pagamento sob pena
de o valor devido ser incrementado pela multa.
Considerando assim que não mais pode existir a prisão do depositário infiel,
a aplicação da multa do artigo 475-J do CPC passa a ser ainda mais essencial para um
processo célere e eficaz.
A execução trabalhista e a aplicação do CPC

A sentença não voluntariamente cumprida dá ensejo a outra atividade


jurisdicional, visando à satisfação da obrigação consagrada no título. Desta forma o
Estado, legitimado pelo ordenamento, irá imperativamente intervir no patrimônio do
executado, para ainda que contra a vontade deste, satisfazer a obrigação consagrada
num título que tenha força executiva. Será assim uma execução forçada, contra a
vontade do devedor.
Primeiramente, cumpre frisar que a execução trabalhista é fase do processo,
e não processo autônomo (embora exista corrente diversa). Configurando assim o
processo trabalhista um procedimento sincrético. Inclusive a reforma de 2005 no CPC,
foi o que introduziu no processo comum o chamado sincretismo processual, onde a
execução passa a ser fase do processo principal, sendo também denominada de
cumprimento de sentença.
Em síntese, no sincretismo processual os atos cognitivos e executivos
ocorrem no mesmo processo, o que contribui e muito para uma eficaz e célere prestação
jurisdicional. Vale frisar que no processo do trabalho as sentenças que contém
obrigação por quantia certa foram sempre executadas no mesmo processo e juízo.
Os argumentos para um processo trabalhista de execução autônomo,
levantados por alguns doutrinadores como Rodrigues Pinto (2006), se baseavam
principalmente no termo “citação” usado pelo artigo 880 caput da CLT, e também no
próprio conteúdo (antigo) do CPC. O artigo 880 da CLT

 “O juiz ou presidente do tribunal, requerida a execução,


mandará expedir mandado de citação ao executado, a fim de que cumpra a
decisão ou o acordo no prazo, pelo modo e sob as cominações estabelecidas,
ou, em se tratando de pagamento em dinheiro, incluídas as contribuições
sociais devidas ao INSS, para que pague em quarenta e oito horas, ou garanta
a execução, sob pena de penhora”.

Para esta corrente, o termo citação aduz inicio de processo, portanto a


execução seria não uma fase, mas sim um novo processo autônomo. Com todas as
vênias, tal entendimento é dotado de um rigor jurídico extremo. Uma interpretação
exclusivamente literal, que desconsidera o microssistema onde se encontra inserida a
norma.
Quanto ao CPC, este mesmo foi objeto de mudança em 2005, com o intuito
de atender o direito fundamental à celeridade processual, portanto não estender o
processo sincrético ao ramo justrabalhista seria ir contra o espírito da execução
trabalhista e do próprio processo trabalhista como um todo.
Afinal, a execução trabalhista prima pela simplicidade, celeridade e
efetividade, princípios estes que somente podem ser efetivados entendendo-se a
execução como fase do processo e não como um novo processo formal, que começa
com a inicial e termina com uma sentença.
Assim parece cristalino, que o sincretismo processual deve ser aplicado no
processo trabalhista, havendo então que falar-se em cumprimento de sentença assim
como previsto na reforma do CPC.
Muito embora o artigo 880 da CLT determine que o devedor seja “citado”
sobre a execução trabalhista para pagar em 48 horas, ou nomear bens à penhora,
pensamos que a exigência da citação para a execução não adotou a melhor técnica, pois
a execução trabalhista, segundo a doutrina majoritária, em razão de título executivo
judicial sempre foi, considerada um exemplo de processo sincrético, onde a execução é
fase do processo. Nos parece que o termo “citação”, deve ser entendido como
“notificação”. Afinal a CLT não menciona o termo “citação” (artigo 841, da CLT)
quando chama o réu a juízo, para querendo vir se defender na fase de conhecimento,
sendo esta uma típica citação, no sentido estrito do termo.
A teor do que dispõe o artigo 880 da CLT, o magistrado determina a
expedição do mandado de citação, o qual, conforme estabelece o parágrafo 2º desse
mesmo artigo, deverá ser cumprido pelo oficial de justiça. De toda sorte, impõe-se
destacar que a jurisprudência começa a conferir interpretação menos formalista a tal
comando, reputando válida a citação que não seja realizada pelo oficial de justiça,
quando for alcançada a sua finalidade. Essa nova visão da jurisprudência denota a
aplicação dos princípios da boa fé, da lealdade processual e da razoabilidade, vedando a
demora na satisfação do direito do credor. Nesse mandado de citação, conforme
prescreve o parágrafo 1º do artigo 880 da CLT, deverá estar contida a decisão
exeqüenda ou o termo do acordo não cumprido. E o devedor deverá pagar em quarenta e
oito horas a quantia devida ou garantir a execução.
Cumpre ressaltar ainda que a execução trabalhista pode ser iniciada de
ofício pelo juiz. Além disto, tem como outras características o contraditório mitigado e
possibilidade de aplicação subsidiária de legislação extravagante.
Na fase de execução trabalhista, em havendo omissão da CLT, aplica-se em
primeiro plano a Lei de Execução Fiscal (6830/80) e, posteriormente, o Código de
Processo Civil, consoante se extrai do artigo 889 da CLT.
Agora vejamos, o real motivo da lei de execução fiscal situar-se como fonte
subsidiária principal da CLT, repousa no fato de que, quando o legislador expressou sua
vontade, a lei de execução fiscal estipulava procedimento mais célere e eficaz do que o
CPC. Afinal o processo trabalhista, por lidar com créditos alimentares, sempre se
pautou na celeridade de seu rito.
No entanto, com as recentes reformas o CPC em alguns aspectos passou a
estipular procedimentos mais eficazes, o que leva a crer na existência de uma lacuna
ontológica, onde a norma existente não mais corresponde aos fatos contemporâneos, ou
ainda ao menos uma lacuna axiológica, onde a aplicação da norma trabalhista acaba por
gerar injustiça com o seu maior beneficiário, no caso o credor trabalhista. Esta inclusive
é a idéia defendida por Bezerra Leite (2007), dentre outros.
O artigo 769, da CLT por sua vez, disciplina os requisitos para aplicação
subsidiária do Direito Processual Comum ao Processo do Trabalho, com a seguinte
redação:

“Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte


subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for
incompatível com as normas deste Título”.

Conforme se extrai do referido dispositivo legal, são requisitos para a


aplicação do Código de Processo Civil ao Processo do Trabalho:
1)omissão da CLT, ou seja, quando a CLT, ou a legislação processual
extravagante: não disciplina a matéria (lacuna normativa); sua norma está ultrapassada
pela realidade social e jurídica do sistema como um todo (lacuna ontológica); sua
norma, se aplicada configura situação injusta e incompatível com o conteúdo
principiológico do sistema (lacuna axiológica).
2)compatibilidade com os princípios que regem o processo do trabalho. Em
síntese: a norma do CPC além de ser compatível com as regras que regem o Processo do
Trabalho, deve ser compatível com os princípios que norteiam o Direito Processual do
Trabalho, máxime o acesso efetivo do trabalhador à Justiça.
Assim, a exegese combinada dos dois dispositivos supracitados (arts. 769 e
889 da CLT), em conjunto com a CF em seus artigos 1º, inciso III, art.5º, inc. LXXVIII
e art. 37 caput (eficiência da Administração), pode levar à permissão de aplicação do
CPC ainda que primeiramente à Lei de Execuções Fiscais.
Cumpre frisar ainda que o artigo 769 da CLT foi redigido quando vigorava
o CPC de 1939, extremamente moroso, e ineficiente para discutir direitos sociais. O
CPC de 1973, por sua vez, manteve a característica de ser mais moroso que a justiça
trabalhista. Por isso a necessidade observada pelo legislador em conter o uso supletivo
do CPC.
Esta foi a razão de ser do artigo 769 da CLT, uma verdadeira cláusula de
contenção, com o intuito de manter a celeridade prevista no rito celetista. Evitando que
fossem importadas para o processo trabalhista a normas do demorado e lento processo
civil.
No entanto, atualmente o que se observa é uma evolução do processo civil,
que em alguns temas acaba ultrapassando o processo trabalhista em eficácia e
otimização.
Tal aplicação subsidiária vem sendo acentuada nos últimos anos por
diversos fatores. Dentre os quais um cumpre ser citado: a quase totalidade dos processos
tem sido acompanhada por advogados cada vez mais especializados, assim o jus
postulandi tem sido pouco utilizado. Afinal com aplicação de teorias como a
distribuição do ônus probatório, com alguns possíveis casos de inversão deste ônus, a
desconsideração da personalidade jurídica, a teoria da causa madura e etc., resta
evidente que o trabalhador até pode demandar sem advogado, no entanto tal prática
poderá lhe custar alguns dos direitos pleiteados meramente por desconhecimento de
técnicas processuais.
Interpretação conforme a CF/88 e heterointegração de normas
processuais

A reforma do CPC em 2005 trouxe a celeuma acerca de quais modificações


poderiam ou não ser adotadas pelo processo trabalhista. Haja vista que na existência de
lacunas neste, o direito processual comum será utilizado como fonte subsidiária,
consoante previsão expressa no diploma celetista, no caso o artigo 769 da CLT.
Não resta dúvida que tal modificação visa atender ao postulado de máxima
efetividade e maior celeridade do processo judicial, consoante previsão constitucional
do artigo 5º, inciso LXXVIII. No entanto poderia ter aplicação ao processo trabalhista?
Seria possível utilizar a heterointegração para transpor referido instituto de direito
processual civil para o processo trabalhista embora exista um rito próprio celetista?
Primeiramente cumpre dizer que uma das grandes dificuldades ao acesso
real e efetivo à Justiça do Trabalho do trabalhador é o da algumas vezes ineficaz
execução trabalhista.
Mesmo a CLT prevendo um procedimento simplificado para a execução,
isto por si só não tem permitido que se evitem inadimplementos, acarretando assim uma
menor efetividade aos direitos sociais postulados perante a justiça do trabalho.
Advogando quase que exclusivamente na seara trabalhista, temos observado
que os reclamantes têm enfrentado inúmeras dificuldades para satisfazer seu crédito.
Sendo que muitas vezes a lentidão processual incita os devedores a deixar para adimplir
o crédito somente quando se esgotar a derradeira possibilidade de impugnação. Assim,
o processo trabalhista vem com o passar do tempo perdendo sua melhor característica,
qual seja a celeridade.

Lacunas e heterointegração
Neste contexto, Bezerra Leite (2007), traz a idéia de que a heterointegração
de normas processuais se faz necessária sempre que a norma processual comum
representar maior efetividade em relação à previsão original celetista.
Assim a lacuna exigida pelo artigo 769 da CLT, não precisa ser uma lacuna
real, devendo ser interpretada no sentido amplo. Alcançando assim as lacunas
axiológicas e ontológicas e não somente as típicas lacunas normativas.
Diniz (2003), nos traz os conceitos destas lacunas: axiológica é a ausência
de norma justa enquanto que ontológica é quando a norma existente não mais
corresponde aos fatos sociais do momento de sua elaboração. Enquanto que a
tradicional lacuna normativa refere-se à ausência de norma sobre determinada situação.
Bezerra Leite (2007) afirma que a regra inscrita no art. 769 da CLT
apresenta duas espécies de lacuna quando comparada com o novo processo sincrético
inaugurado com as recentes reformas introduzidas pela Lei n. 11.232/2005.
Seguindo, Bezerra Leite (2007) afirma a existência de lacuna ontológica,
pois não há negar que o desenvolvimento das relações políticas, sociais e econômicas
desde a vigência da CLT (1943) até os dias atuais revelam que inúmeros institutos e
garantias do processo civil passaram a influenciar diretamente o processo do trabalho,
dentre as quais astreintes, antecipação de tutela, multas por litigância de má-fé e etc.).
Sobre a existência de lacuna axiológica, cumpre transcrever Bezerra Leite
em sua obra Curso de Direito Processual do Trabalho, 2007, página 99:

“b)lacuna axiológica ocorre quando a regra do art. 769 da CLT,


interpretada literalmente, se mostra muitas vezes injusta e insatisfatória em
relação ao usuário da jurisdição trabalhista quando comparada com as novas
regras do sistema do processo civil sincrético que propiciam situação de
vantagem (material e processual) ao titular do direito deduzido na demanda.
Ademais, a transferência da competência material das ações oriundas da
relação de trabalho para a Justiça do Trabalho não pode redundar em
retrocesso econômico e social para os seus novos jurisdicionados nas
hipóteses em que a migração de normas do CPC, não obstante a existência de
regras na CLT, impliquem melhoria da efetividade da prestação jurisdicional,
como é o caso da multa de 10% e a intimação do advogado (em lugar de
citação) do devedor para o cumprimento da sentença.
Para acolmatar as lacunas ontológica e axiológica do art. 769
da CLT torna-se necessária uma nova hermenêutica que propicie um novo
sentido ao seu conteúdo devido ao peso dos princípios constitucionais do
acesso efetivo à justiça que determinam a utilização dos meios necessários
para abreviar a duração do processo.
Com efeito, quando criada (em 1943) a referida norma
consolidada, como já enfatizamos alhures, funcionava como uma "cláusula
de contenção" destinada a impedir a migração indiscriminada das regras do
processo civil, o que poderia comprometer a simplicidade, a celeridade,
enfim, a efetividade do processo laboral.”.
Atualmente, porém, a realidade é outra, pois o processo civil,
em virtude das recentes alterações legislativas, passou a consagrar, em muitas
situações, a otimização do princípio da efetividade da prestação jurisdicional,
de modo que devemos, sempre que isso ocorra, acolmatar as lacunas
ontológica e axiológica das regras constantes da CLT e estabelecer a
heterointegração do sistema mediante o diálogo das fontes normativas com
vistas à efetivação dos príncípios constitucionais concernentes à jurisdição
justa e tempestiva.
Diante destes conceitos o ilustre Bezerra Leite (op. cit.), afirma a existência
de uma lacuna axiológica na CLT no que tange a não previsão de multa de 10% para o
executado que demora a cumprir a sentença. Neste caso o processo civil traz uma
modificação que torna o processo mais efetivo, assim deveria ser aplicada também no
processo do trabalho.
O referido autor, assim como nomes ilustres como Mauro Schiavi (2007),
lembram ainda que o artigo 769 da CLT, foi concebido em 1943, tendo como escopo
evitar o uso de normas processuais comuns que, naquela época, tornariam o processo
trabalhista muito mais lento.
No entanto diante da clara evolução do processo civil, este tem adotado
elementos tão ou mais céleres que o processo trabalhista, o que implica dizer que é o
momento de rever quais os institutos civilistas devem ser transportados ao processo
trabalhista.
Chaves (apud Bezerra Leite, 2007 p.866), em sua obra Curso de Direito
Processual do Trabalho, cita em sua página 866:

“Precisamos avançar na teoria da lacunas do direito ( quer


sejam estas de natureza normativa, axiológica ou ontológica), a fim de
reconhecer como incompleto o microssistema processual trabalhista 9ou
qualquer outro) quando- ainda que disponha de regramento sobre
determinado instituto- este não apresenta fôlego para o enfretamento das
demandas contemporâneas, carecendo da supletividade de outros sistemas
que apresentem institutos mais modernos e eficientes”.

Souto Maior (2007) afirma que o direito processual trabalhista, visa à


aplicação de um direito material, o direito do trabalho, que é permeado de questões de
ordem pública, as quais exigem da prestação jurisdicional muito mais que celeridade.
Exigindo que o conceito de efetividade seja levado às últimas conseqüências, atentando
ao máximo para o comando constitucional do artigo 5º, inciso LXXVIII.
Poderíamos ainda dizer que a CLT não traz dispositivo prevendo multa por
descumprimento do prazo designado para cumprimento da sentença, desta forma seria
possível entender a existência de uma lacuna em sentido estrito. Que serviria como mais
um fundamento para importar o instituto processual civil em comento.
Em que pese alegar-se que a CLT prevê a penhora como sanção pelo não
cumprimento, não pode olvidar-se que tais institutos são de natureza distinta. Sendo que
inclusive convivem em conjunto no processo comum.
A penhora não é uma sanção pelo descumprimento, mas, sim uma
concessão feita pela CF ao judiciário para que este satisfaça a obrigação devida,
reparando a lesão discutida na lide de uma forma forçosa por conta da inércia do
executado.
Podemos afirmar ainda que a multa do 475-J é um meio de coação, com
intuito de fazer o executado proceder ao pagamento voluntário da obrigação, enquanto
que a penhora é meio de sub-rogação, onde a vontade do devedor é desconsiderada em
benefício do detentor do crédito.
Desta forma a penhora existe para garantir a eficácia das decisões judiciais,
enquanto que a multa do artigo 475-J tem como fundamento uma sanção pecuniária
para aquele executado que demora em adimplir sua obrigação, tentando assim evitar que
se chegue à fase de penhora, o que por certo demanda mais custos para o Estado e mais
tempo para a satisfação da obrigação.
Com isso, pode-se falar que quanto à multa do 475-J do CPC, a CLT possui
os três tipos de lacunas previstos no direito. Em especial a axiológica e a ontológica,
mas dependendo do ponto de vista também uma lacuna em sentido estrito, pela não
existência de sanção pecuniária para o não cumprimento espontâneo de sentença
trabalhista.

O princípio da efetividade e celeridade da jurisdição

Cumpre ressaltar que nossa constituição elevou o principio da celeridade e


efetividade processual ao status de direito fundamental (art. 5º, inciso LXXVIII).
Lembrando que as normas infraconstitucionais devem ser interpretadas de acordo com a
Constituição Federal- CF, de modo a garantir a máxima efetividade possível a tais
direitos fundamentais.
Tal princípio foi inspirado na cristalina e crônica morosidade dos processos
no ordenamento pátrio. Passa-se assim a uma preocupação não somente com o acesso à
justiça mas também que este acesso seja célere e eficiente.
É atributo da dignidade humana o Estado velar pela solução dos conflitos de
interesses como forma de garantir o direito pleiteado e deverá atuar eficientemente, ou
seja, sem o tormento do longo tempo de espera da decisão do Poder Judiciário o qual
angustia o jurisdicionado.
Do citado dispositivo constitucional extrai-se o direito fundamental à uma
jurisdição célere e efetiva, e os meios que a garantam. Sarlet (2007) traz a idéia de que
os direitos fundamentais possuem um aspecto objetivo e outro subjetivo.
Subjetivo na concepção clássica de direitos fundamentais como direitos de
defesa em relação ao Estado, ao qual o individuo se submete por força e limites da
constituição. Assim tratam de direitos a uma abstenção do Estado, um limite à atuação
estatal, uma esfera inalcançável pelo Estado.
O aspecto objetivo dos direitos fundamentais se traduz em direitos
fundamentais a prestações objetivas por parte do Estado. São facilmente vislumbrados
no tocante às clássicas prestações assistenciais (saúde, educação e etc). No entanto
deve-se atentar para os efeitos dos direitos fundamentais que versam sobre normas
relativas ao processo.
Exige-se assim dos três poderes estatais uma postura ativa, no sentido de
implementar condições para o exercício do direito fundamental garantido na
Constituição Federal.
Com isso, cabe ao judiciário agir da maneira que lhe for possível no intento
de maximizar a efetividade da prestação jurisdicional. Modificando para tanto suas
posições jurisprudenciais e adaptando a interpretação da legislação infraconstitucional
de acordo com a Constituição Federal.

Interpretação conforme a Constituição e diálogo das fontes


processuais

Neste sentido, sobre interpretação conforme a constituição cumpre citar o


renomado Mestre de Coimbra, Canotilho (2003), que em sua obra Direito
Constitucional e Teoria da Constituição, nas Páginas 1226/1226 nos traz com a
sabedoria que lhe é peculiar:
“O princípio da interpretação das leis em conformidade com a
constituição é fundamentalmente um princípio de controlo (tem como função
assegurar a constitucionalidade da interpretação) e ganha relevância
autónoma quando a utilização dos vários elementos interpretativos não
permite a obtenção de um sentido inequívoco dentre os vários significados da
norma. Daí a sua formulação básica: no caso de normas polissêmicas ou
plurissignificativas deve dar-se preferência à interpretação que lhe dê um
sentido em conformidade com a Constituição. Esta formulação comporta
várias dimensões: (1) o princípio da prevalência da constituição impõe que,
dentre as várias possibilidades de interpretação, só deve escolher-se uma
interpretação não contrária ao texto e programa da norma ou normas
constitucionais; (2) o princípio da conservação de normas afirma que uma
norma não deve ser declarada inconstitucional quando, observados os fins da
norma, ela pode ser interpretada em conformidade com a constituição; 3) o
princípio da exclusão da interpretação conforme a constituição mas ‘contra
legem’ impõe que o aplicador de uma norma não pode contrariar a letra e o
sentido dessa norma através de uma interpretação conforme a constituição,
mesmo através desta interpretação consiga uma concordância entre a norma
infraconstitucional e as normas constitucionais. Quando estiverem em causa
duas ou mais interpretações – todas em conformidade com a Constituição –
deverá procurar-se a interpretação considerada como a melhor orientada para
a Constituição”.

Ainda sobre adequação do processo à máxima efetividade, Marinoni (apud,


Sarlet 2007, p. 212), em sua obra A Eficácia do Direitos Fundamentais, na página 212,
cita em nota de rodapé de número 590:

“...vale destacar as dimensões exploradas com profundidade


por L. G. Marinoni, Técnica Processual e Tutela dos Direitos, especialmente
p. 165-249, destacando o dever do Juiz de conformar o procedimento
adequado ao caso concreto, pelo prisma da efetividade da prestação
jurisdicional”.

Deve-se então estender com a heterointegração de normas processuais, até


mesmo porque a nossa Constituição Federal em seu artigo 22, inciso I, ao estabelecer as
competências legislativas prevê a unicidade do processo. Assim o processo é uno, em
especial os de natureza não penal.
Sempre que uma norma trouxer mais de uma interpretação, aquela a ser
utilizada deverá ser a que mais se compatibilize com a Constituição Federal. Sarlet
(2007) traz que o que deve servir de parâmetro para tanto é a identidade da constituição,
ou seja, aquela idéia básica que se extrai da analise globalizada da Carta Magna.
Observa-se que a Constituição Federal apresenta como princípio
fundamental a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e tem como direito e garantia
fundamental a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de
sua tramitação (art. 5º, LLXXXVIII).
Assim analisando a Constituição Federal de 1988, observa-se o intuito de
privilegiar os direitos fundamentais e os meios de garanti-los. Além de uma
preocupação com a dignidade da pessoa humana, a qual foi elevada ao status de
princípio fundamental. Sendo que em síntese pode-se falar que este princípio é um forte
elo para se entender a CF 88 e seu sistema de direitos fundamentais.
Os princípios e direitos fundamentais que trazem tipificações sobre
processo, são a base para o que Bezerra Leite (2007) chama de Direito Constitucional
Processual. Sendo por certo que tais princípios (incluso aí o da efetividade da prestação
jurisdicional) norteiam todo o sistema processual pátrio. Inclusive o microssistema
trabalhista.
Adotando ainda a idéia vanguardista do neo-constitucionalismo, os
princípios acertadamente possuem valor normativo, sendo verdadeiros mandados de
otimização (Alexy 2001), que podem inclusive impedir a aplicação de normas contrarias
aos comandos contidos nos princípios. Sendo certo que também possuem função de
auxiliar a interpretação das leis dentro do ordenamento, parece claro que o princípio da
celeridade e efetividade na prestação jurisdicional deverá irradiar seus efeitos para os
diversos ramos do processo.
Esta é a base para se romper com o formalismo e a dogmática, Bezerra Leite
(2007) nos traz que o passo básico para uma justiça célere e eficaz começa pelo dialogo
das fontes processuais. Na esteira de tal posição, entendemos que o judiciário deve
buscar sempre uma adequação do procedimento com vista à máxima efetividade dos
direitos fundamentais em geral, sendo por certo que o processo é o meio válido para
proteção de todos os direitos fundamentais.
Podemos afirmar que o devido processo legal é o guardião de todos os
direitos fundamentais, e a busca pela celeridade visa exatamente garantir
substancialidade a tal princípio.
Tratando-se, portanto, de norma de processo, inspirada no princípio do
devido processo legal e na rápida duração do processo judicial e administrativo,
princípios agasalhados nos artigos 5º, LV e LXXVIII da Constituição da República, a
multa do artigo tema deste estudo parece adequada à execução trabalhista, devendo ser
considerada necessária pelo magistrado a uma prestação jurisdicional efetiva.
Como já explicitado neste estudo, o aspecto objetivo dos direitos
fundamentais obriga o Estado a prestações positivas, portanto os três poderes possuem
responsabilidades na efetivação dos direitos fundamentais. Assim a celeridade
processual deve ser garantida por meio de ações positivas do Estado. Quer seja por meio
do legislativo, com edição de novas leis que visem a melhoria na velocidade de
andamento dos processos, quer seja pelo judiciário, atuando de forma a interpretar a
legislação existente sob a ótica dos princípios e comandos constitucionais.
Resta claro que os artigos 769 e 889 da CLT, podem e devem ser
interpretados conforme a Constituição Federal de 1988, para permitir a aplicação de
normas processuais comuns sempre que estas representem maior celeridade e
efetividade para o judiciário trabalhista.
Afinal a dignidade da pessoa humana passa pela garantia de que as lesões a
direitos serão apreciadas de forma célere pelo judiciário e que a efetivação do direito
reconhecido em juízo seja alcançada no menor tempo possível.
Em que pese argumentos que o diálogo das fontes processuais pode gerar
insegurança jurídica, tal não pode proceder, afinal deve-se ponderar o que melhor
corresponde aos ideais constitucionais. Seria um judiciário lento e impossibilitado de
mudar seus procedimentos, enraizado no tempo, prezo a comandos legais
infraconstitucionais anteriores à própria CF por conta de uma suposta maior segurança
jurídica?
Ou seria um judiciário moderno, dinâmico, que busca a celeridade, e que
integra os diversos ramos do direito em busca de uma jurisdição que garanta melhor e
mais rapidamente a reparação a lesões, mas que, no entanto possa atingir alguns poucos
desprevenidos por conta de sua dinâmica? Acreditamos que a balança deve pender para
a segunda hipótese.
Complementar a legislação infraconstitucional para adequá-la à realidade e
à Constituição, nos parece ser a solução que melhor atende a dignidade da pessoa
humana. Assim a ponderação entre celeridade e segurança jurídica deverá pesar para o
lado da celeridade.
Aplicar normas processuais mais eficazes não consubstancia um
comportamento desafiador à segurança jurídica. Afinal não se trata de construir uma lei
nova para cada caso concreto, mas sim adequar os processos com a Constituição
Federal. Trazer uma sanção pecuniária para tentar coagir o devedor ao cumprimento
obrigatório da sentença atende ao direito fundamental à celeridade processual e por
conseqüência visa garantir dignidade aos litigantes em geral, que por muitas vezes tem
de enfrentar processos demorados e lentos, que chegam infelizmente, em casos
extremos, a falecer antes da solução da lide.
Como diz Sarlet (2007), os direitos fundamentais formam o núcleo essencial
da Constituição Federal, os princípios ali garantidos irradiam seus efeitos para todos os
ramos do direito. Norteiam assim a interpretações de todas as normas, esterilizam as
normas contrárias ao seu conteúdo e garantem nova interpretação as normas
ultrapassadas pelo avanço social e do direito.
Os sistemas processuais devem obediência à Constituição Federal, devem
servir de instrumento para consolidação da proteção que a jurisdição estatal representa
para todos os administrados. Desta feita, devem traduzir o espírito da CF e também do
ramo do direito material com o qual possui ligação.
Por este motivo cada microssistema processual possui suas características
próprias, ligadas ao direito material que nele é discutido. No entanto, a teoria geral do
processo é a mesma para todas as áreas do direito. Assim as peculiaridades de cada
ramo existem apenas como complemento no intuito de garantir um sistema processual
adequado para o direito material respectivo.
Considerando que o direito do trabalho contém em seu escopo proteções
jurídicas ao desempenho do labor, e que este labor é condição essencial para uma vida
digna, temos que crer em um processo trabalhista incisivo, capaz de assegurar os
direitos trabalhistas.
O caráter alimentar das prestações demandadas nas lides trabalhistas
também deve fomentar a idéia de que o processo trabalhista tem de adotar um
procedimento eficaz e célere.
A própria concepção inicial do processo do trabalho deve ser respeitada,
afinal quando do surgimento da CLT, a legislação processual trabalhista era muito mais
célere que a comum. Não podemos agora manter um apego a normas claramente
ultrapassadas pela legislação cível em alguns aspectos. Deve-se analisar a existência de
lacunas e supri-las da maneira que melhor atenda aos princípios constitucionais.
Nenhum sistema processual é desprovido de lacunas, ainda mais quando se
interpreta lacuna em seu sentido amplo, conforme já exposto neste estudo. Assim ainda
que não contenha lacuna normativa (ou lacuna no sentido estrito, Diniz 2003),
inevitavelmente conterá lacunas axiológicas ou ontológicas. É neste diapasão que deve
entrar a heterointegração dos sistemas processuais não penais pátrios.
Usando como parâmetro a busca pela efetividade e celeridade, as normas
que dispuserem em sentido contrário, configurando lacuna axiológica ou ontológica,
deverão ter sua aplicabilidade afastada em prol de norma extraída de outro sistema
processual cuja aplicação seja mais compatível com todo este ideal.
Não se trata assim de revogar disposição de lei, mas simplesmente de
aplicar aquelas que melhor se coadunam com a realidade dinâmica que o operador do
direito enfrenta diariamente. Tendo sempre como busca a primazia da máxima
efetivação dos direitos fundamentais.
No caso do microssistema processual trabalhista existe ainda previsão
expressa de aplicação subsidiária do CPC, basta então avançar no conceito de lacunas, e
buscar a manutenção do espírito maior do processo trabalhista, qual seja a celeridade e
uma maior incisividade em busca de uma prestação jurisdicional que seja capaz de
satisfazer os jurisdicionados.
Vale lembrar ainda que o ramo do microssistema processual sempre está
intimamente ligado ao direito material cujo processo serve de instrumento. Bezerra
Leite (2007) e Schiavi (2007) nos trazem a idéia de que o processo trabalhista quase
sempre é instrumento de discussão acerca de direitos de caráter alimentar. Lembramos
ainda que os direitos trabalhistas garantidos pela Constituição Federal (e que muitas
vezes são o objeto dos pedidos formulados nas lides trabalhistas) integram os chamados
direitos fundamentais de segunda dimensão, os chamados direitos sociais.
O diálogo das fontes processuais compatibiliza-se com a Constituição da
República, no tocante ao emprego de meios dotados de eficácia para o processo e sua
rápida solução. Completa-se o microssistema jurídico, importando regras de ramos
diversos do direito, sempre que estas responderem a um mesmo objetivo ideológico,
entendido este como o da finalidade do ordenamento constitucional.
Bobbio (1997) traz que um ordenamento jurídico é dinamicamente
completável pela heterointegração do direito, recorrendo-se a outro ordenamento ou a
uma fonte que não seja considerada como a principal daquele sistema.
Considerando que a teoria geral do processo diz respeito ao direito
processual civil e também ao trabalhista e ao eleitoral, os institutos e procedimentos que
não atentem contra os princípios específicos do direito processual trabalhista, lhe
poderão ser aplicados.
Diante da natureza das matérias discutidas na justiça trabalhista, e também
diante do histórico do processo do trabalho, resta cristalino que o mesmo deve estar
sempre na vanguarda da celeridade e efetividade, seja através de suas próprias normas,
seja com a utilização do diálogo das fontes processuais para suprir eventuais lacunas e
garantir o seu espírito.
Desta forma, essa disposição contida no CPC, alusiva a cominação da multa
de 10%, fortalece os mecanismos já existentes no sistema, no sentido de obter a eficácia
da prestação jurisdicional, autorizando o juiz a responsabilizar patrimonialmente
aqueles executados que atentem contra os princípios orientadores do processo. Coibindo
comportamentos que atrasem ou dificultem o cumprimento da decisão judicial
transitada em julgado.
Tanto no processo civil, quanto no processo do trabalho, a ordem jurídica
pretende evitar a demora no cumprimento de suas decisões, afastando prejuízo ao
credor, sobretudo aquele que tem no crédito alimentar a razão de sua sobrevivência.
Com a possibilidade de aplicação da multa prevista no artigo 475-J do CPC na
execução, o sistema jurídico deixou de proteger excessivamente o patrimônio do
devedor, daquele que tem contra si um título judicial, para atuar em benefício do credor,
da parte que já possuí uma decisão favorável.
Em que pese possa haver criticas a este processo híbrido, deve-se entender
que a evolução do direito não mais permite uma postura extremamente dogmática,
incapaz de entender a noção de sistema aplicável ao direito. Romper com este
formalismo antiquado é o primeiro passo para garantir a um processo trabalhista menos
burocrático e mais eficaz.
Adequar o processo do trabalho para melhor compatibilizá-lo com a nova
ordem constitucional deve ser a meta dos operadores do direito em geral, acatando
assim os efeitos dos princípios constitucionais, em especial o da efetividade e celeridade
processual. Bezerra Leite (2007) clama pelo avanço no reconhecimento de lacunas e
conseqüente utilização supletiva do CPC e quaisquer outros diplomas sempre que isto
resultar em benefício para uma jurisdição efetiva.
Cumpre dizer que não são poucos os casos em que a doutrina e
jurisprudência trabalhistas vem admitindo a heterointegração entre fontes processuais
para adequar o rito trabalhista as demandas que ali são discutidas.
Neste sentido podemos citar a inversão do ônus da prova como exemplo,
extraída do Código de Defesa do Consumidor, muitos vêm acertadamente defendendo a
idéia de que quando uma prova seja extremamente difícil para a parte (em geral o
reclamante), se faça uso da inversão do ônus probatório, pois em muitos casos é mais
fácil a reclamada apontar que atuou de acordo com a legislação trabalhista do que o
reclamante provar o descumprimento.
O processo coletivo no âmbito da justiça do trabalho também muitas vezes é
objeto de aplicação de legislação alienígena ao microssistema processual trabalhista,
com o intuito de garantir um acesso à justiça efetivo e substancial.
Outro item que foi objeto de um diálogo entre fontes processuais, refere-se
as demandas resultantes de relação de trabalho e que foram trazidas para a justiça do
trabalho pela Emenda Constitucional 45, tendo sido regulamentadas pela instrução
normativa 27.
Seguindo este entendimento, estão diversos Enunciados aprovados na I
Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, organizada pela
Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (ANAMATRA), juntamente com o
Tribunal Superior do Trabalho (TST), a Escola Nacional de Formação e
Aperfeiçoamento de Magistrados (ENAMAT) e com o apoio do Conselho Nacional das
Escolas de Magistratura do Trabalho (CONEMATRA).
Os dois mais importantes são a seguir transcritos:

66. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DE NORMAS DO


PROCESSO COMUM AO PROCESSO TRABALHISTA. OMISSÕES
ONTOLÓGICA E AXIOLÓGICA. ADMISSIBILIDADE. Diante do atual
estágio de desenvolvimento do processo comum e da necessidade de se
conferir aplicabilidade à garantia constitucional da duração razoável do
processo, os artigos 769 e 889 da CLT comportam interpretação conforme a
Constituição Federal, permitindo a aplicação de normas processuais mais
adequadas à efetivação do direito. Aplicação dos princípios da
instrumentalidade, efetividade e não-retrocesso social.
71. Artigo 475 – J do CPC. Aplicação no Processo do
Trabalho. A aplicação subsidiária do artigo 475-J do CPC atende às garantias
constitucionais da razoável duração do processo, efetividade e celeridade,
tendo, portanto, pleno cabimento na execução trabalhista.
O enunciado número 66 nos parece refletir de forma brilhante o avanço que
o direito como um todo sofreu nas últimas décadas. Seu texto reúne de forma brilhante
os argumentos já citados anteriormente neste estudo, devendo ser mais utilizado pelos
operadores do direito. Inclusive cumpre dizer que na nossa experiência prática de
advocacia, nos deparamos com vários colegas que sequer sabem da existência de tais
enunciados, e infelizmente parece que ainda não houve avanço substancial.
Este posicionamento permite que as normas do processo civil se
sobreponham, até mesmo, às regras contidas na Consolidação das Leis do Trabalho. Tal
sobreposição é possível em razão do entendimento de que o artigo 769 da Consolidação
das Leis do Trabalho, ao possibilitar a utilização das normas processuais do direito
comum “nos casos omissos”, acaba por incluir dentre estes, as lacunas axiológicas e
ontológicas.
Vale lembrar que, para nossa tristeza, os enunciados possuem força de
doutrina, não se equiparando nem mesmo às orientações jurisprudenciais das Seções de
Dissídios Individuais e Coletivos do colendo TST. No entanto cumpre dizer que seu uso
na prática deve ser incentivado cada vez mais, pois somente assim a riqueza contida
nestes enunciados pode vir a tona, e quem sabe possam desempenhar uma maior
influência dobre os operadores do direito em geral.
Parece-nos assim que este entendimento é o que melhor se coaduna com o
momento de evolução do direito em que nos encontramos. Um momento onde a
Constituição finalmente parece produzir cada vez mais efeitos na legislação
infracontitucional e na interpretação desta.
Adaptações necessárias à aplicação da multa

Neste estudo adotamos a tese de que a multa é aplicável ao processo


trabalhista, no entanto deve-se atentar que são necessários pequenos ajustes para seu uso
no processo trabalho, o que por si só não pode ser considerado um obstáculo
intrasponível, afinal a ação monitória, por exemplo, também necessita de adaptação para
ser admitida no processo trabalhista.
CHAVES (2007) em sua obra A Recente Reforma no Processo Comum
Reflexos no Direito Judiciário do Trabalho, disserta sobre o tema na página 56:

“O art. 880 da CLT ainda conserva a superada idéia de


autonomia do processo de execução, na medida em que alude à necessidade
da expedição de ‘mandado de citação ao executado, a fim de que cumpra a
decisão ou o acordo no prazo’. Cuida-se de comando normativo atingido em
cheio pelo fenômeno do ancilosamento normativo, diante do que preconiza a
atual dinâmica do processo comum, abrindo caminho para o reconhecimento
do que a Ciência Jurídica denomina de ‘lacuna ontológica’.
Ora, não faz sentido algum se manter o intérprete fiel ao
disposto no art. 880 da CLT enquanto o processo comum dispõe, agora, de
uma estrutura que superou a exigência de nova citação para que se faça
cumprias as decisões judiciais, expressando, assim, maior sintonia com as
idéias de celeridade, economia e efetividade processuais. É a hipótese mais
do que evidente de lacuna ontológica do microssistema processual
trabalhista.”.

O mesmo autor traz ainda que o correto seria importar a aplicação da multa
com o mesmo prazo de 15 dias previsto na legislação processual comum. Assim, o
devedor, intimado da sentença teria 15 dias para efetuar o pagamento sob pena de multa
de 10% sobre o valor da execução.
Cumpre dizer que a grande maioria das decisões adota este prazo de 15 dias,
sem excluir a possibilidade de imediata penhora. Assim adota-se a norma de processo
civil exatamente como em sua origem.
Bezerra Leite (2007) por sua vez nos traz outra possibilidade de adaptação
ao discorrer sobre o tema em sua obra Curso de Direito Processual do Trabalho, nas
páginas 882 e 885:

“Na verdade, o processo do trabalho sempre adotou um


processo sincrético, haja vista o disposto no §1º do art.832 da CLT, que diz:
“quando a decisão concluir pela procedência do pedido, determinará o prazo
e as condições para o seu cumprimento”.
No mesmo sentido, o art. 835 do texto consolidado reafirma
“que o cumprimento do ou da decisão far-se-á no prazo e condições
estabelecidas”.
...Assim considerando que há permissão no texto obreiro para o
juiz dispor sobre o prazo e as condições para o cumprimento da sentença,
mostra-se perfeitamente aplicável a regra do art. 475-J do CPC, com as
adaptações que demonstraremos adiante, porquanto absolutamente
compatível com os princípios que informam e fundamentam o processo do
trabalho.
Destarte, ao ser intimado da sentença (ou do acórdão) que
reconheça obrigação de pagar quantia líquida (ou da decisão que homologar a
liquidação). O devedor terá o prazo de oito dias para querendo, efetuar o
pagamento da quantia devida. Caso não o faça, incidirá a multa de 10% (dez
por cento) sobre o total da divida.”.
“Assim, mediante o diálogo das fontes dos subsistemas do
processo civil e trabalhista, parece-nos factível concluir que o cumprimento
da sentença trabalhista poderá ser promovido, de ofício, pelo próprio juiz, ou
a requerimento das partes, sendo certo que em qualquer hipótese o devedor
não será mais citado, e sim intimado na pessoa do seu advogado, que é a
situação mais corriqueira na atualidade, ou diretamente, pelo correio ou por
mandado, caso esteja litigando sem o patrocínio de um causídico (CLT, art.
791).”.

Bezerra Leite (2007) sugere então o uso do prazo recursal comum ao


processo do trabalho como interstício a ser usado como prazo para cumprimento
espontâneo da sentença. Realmente parece ser uma opção muito bem ponderada, que se
coaduna com os ideais de efetividade processual, ao mesmo tempo em que fornece
prazo mais do que suficiente para o executado programar o pagamento voluntário ou até
mesmo impetrar recurso com cautelar pedindo efeito suspensivo.
Além do mais a idéia de 15 dias do processo civil tem relação com o prazo
recursal comum àquele ramo do direito. Como no processo do trabalho os recursos
possuem prazo de 8 dias, nada mais justo que realizar tal adaptação.
Souto Maior (2007) já defende a idéia de que o devedor deve ser intimado
por via postal para cumprir a obrigação em 48 horas, sob pena da incidência da multa de
10%. Faz assim uma releitura do artigo 880 do diploma Celetista, em que pese seu
máximo compromisso com a efetividade, muitos são os argumentos desfavoráveis a esta
adaptação.
Primeiro cumpre dizer que a vida moderna pode tornar excessivamente
difícil o cumprimento espontâneo da obrigação em 48 horas, o tempo esparso pode ser
dificultoso para prover os fundos monetários requeridos ao cumprimento. Além disto o
tempo é curto até mesmo para haver a comunicação entre o advogado que recebe a
intimação e o executado. Neste caso o peso da ponderação entre efetividade e respeito
ao devido processo legal parece não permitir interstício tão curto.
Desta forma esta posição mais radical nos parece ser muito exagerada,
acreditamos então que a melhor possibilidade seria realmente fornecer um prazo de 8
dias antes da incidência da multa. Pois acreditamos que o prazo de 15 dias do processo
civil tem relação com o prazo recursal comum a tal ramo.
No entanto também não nos olvidamos para o fato de que atuar deste modo
pode soar como exagero, como uma inovação excessiva. Afinal se traz a norma do
processo comum e ao mesmo tempo não se utiliza nem mesmo o seu texto original.
Assim, embora a posição tecnicamente mais correta seja a de designar um
prazo de 8 dias, em nome de uma ponderação entre celeridade e segurança jurídica,
talvez devemos admitir que os 15 dias sejam mais razoáveis. Atende-se melhor deste
forma ao princípio da legalidade, previsto na CF/88.
Não pelo caso específico da multa do artigo 475-J do CPC, mas sim por
possíveis outras modificações que operadores do direito possam vislumbrar, tomando
por base o precedente da aplicação da multa.
Assim permitir uma inovação tão grande pode por vezes servir de impulso
para adaptações forçadas, que sejam mal ponderadas e que acabem por gerar mais
injustiças.
Não seria um caso de injustiça fornecer um prazo de apenas 8 dias, mas
talvez o nosso aparelho judiciário ainda não esteja pronto para deter tal poder, assim
esses poucos dias de vantagem podem por vezes servir de base para uma usurpação de
competência pelo judiciário. Afinal seria transportar uma norma e modificar em parte o
seu texto.
O que pode ser extremamente válido neste caso específico pode trazer
injustiças e críticas ao sistema de diálogo das fontes posteriormente, portanto
acreditamos que estas inovações devem ser graduais, até como forma de preparar e
evoluir a teoria de heterointegração do direito.
Cumpre frisar ainda que qualquer que seja o prazo adotado, a possibilidade
de penhora imediata deve ser garantida, sob pena de este atraso impossibilitar o
encontro de bens disponíveis.
Em suma, tecnicamente insistimos que a razão persiste àqueles que pregam
pelo prazo de 8 dias para o cumprimento voluntário, sob pena de incidência da multa,
no entanto dados os motivos aqui explicitados, acreditamos que a melhor aplicação do
artigo 475-J do CPC no processo do trabalho reside na hipótese de designar um prazo de
15 dias para o cumprimento espontâneo, sob pena de multa e sem prejuízo de penhora
imediata.
Posição jurisprudencial

Sobre o tema deste estudo parece não haver um consenso entre os diversos
tribunais trabalhistas, principalmente entre os Tribunais Regionais do Trabalho-TRTs e
o Tribunal Superior do Trabalho-TST.
O tema principal deste estudo não é analisar jurisprudência, mas sim
propugnar pela aplicabilidade da multa do 475-J e demonstrar os motivos para tanto. No
entanto passaremos a seguir a demonstrar algumas decisões acerca desta celeuma.
Em nossa prática da advocacia, no TRT da 23ª região e também no TRT da
1ª região, observamos que a grande maioria dos magistrados de primeiro grau, parecem
mais dispostos a aplicar a multa do 475-J. Sendo que o TRT-23, também tem proferido
decisões em grau de recurso mantendo a multa do 475-J.
Vejamos a seguir duas decisões do TRT-23 que são muitas vezes utilizadas
como paradigmas por magistrados em sentenças de primeiro grau:

“MULTA DO ART. 475-J, DO CPC. APLICABILIDADE NO


PROCESSO DO TRABALHO. Porque coerente com os princípios que
vigoram no direito processual do trabalho e ainda, em face da omissão
legislativa constatada na CLT, é perfeitamente aplicável ao processo
trabalhista a multa de 10% capitulada no caput do art. 475-J do CPC,
especialmente, porque estimula a celeridade e a efetividade da tutela
jurisdicional, com a satisfação do crédito de natureza alimentar. Somente fica
isento da multa o devedor que paga espontaneamente a condenação, no prazo
de 15 (quinze) dias após o trânsito em julgado de decisão judicial líquida.”
(01326.2007.008.23.00-4 DESEMBARGADOR TARCÍSIO VALENTE
DJE/TRT23: 470/2008 -Publicação: 20/5/2008)

“INOVAÇÃO LEGISLATIVA PROMOVIDA NA


EXECUÇÃO CIVIL - ART.475-J DA CLT. APLICABILIDADE NA
PROCESSUALÍSTICA TRABALHISTA. A reforma processual
proporcionada pela Lei 11.232/05 quanto a possibilidade do juízo da
execução aplicar multa de 10% sobre o valor da condenação em desfavor do
devedor, caso este, uma vez intimado, não pague a dívida no prazo de 15
(quinze) dias seguintes ao trânsito em julgado da sentença cognitiva liquidada
não se revela ofensiva aos trâmites processuais previstos na CLT, haja vista
que tal inovação apenas e tão-somente buscou acelerar o curso da fase
executória, prestigiando sua celeridade sem comprometer a inconteste
garantia do contraditório e da ampla defesa assegurada a todos os litigantes.
Se até no processo civil o legislador pátrio pretendeu imprimir
um ritmo bem mais célere do que o conservador, formal e rígido então
existente, com muito mais propriedade tal inovação legal deve preponderar
na processualística laboral, em que a situação de hipossuficiência não rara do
empregado requer uma maior presteza do Poder Público. O princípio da
celeridade, alçado hodiernamente a nível constitucional, impõe-se no
processo trabalhista e necessita da utilização de todos os meios mais eficazes
para a satisfação do crédito, porque este se reveste de caráter eminentemente
alimentar, não podendo ficar submisso às delongas processuais, mais do que
o processo comum. Recurso improvido.” (TRT 23a região. Processo
n00840.2007.051.23.00-4. Desembargador: Osmair Couto. DJE/TRT
23:356/2007. Data da publicação: 09/11/2007).

Ambas as decisões refletem pontos citados neste presente estudo, e assim


utilizam a heterointegração processual para aplicar a multa do art. 475-J do CPC em
busca de maior celeridade e efetividade processual. Observa-se ainda que preferiram por
adotar um prazo igual ao do processo comum, seguindo assim a primeira corrente
exposta no capítulo anterior do presente estudo.
Desta forma, observamos no TRT-23 que a maioria dos magistrados,
citando estas decisões em suas fundamentações inclusive, apóia a aplicação da multa e
estipula em 15 dias o prazo para cumprimento espontâneo da obrigação, sob pena de
incidência da multa de 10%.
No entanto o TST, infelizmente, vem adotando entendimento diverso,
afirmando que a CLT possui rito específico, e que, portanto não existe omissão que
autorize a aplicação do CPC e conseqüentemente da multa de 10%.
Nesse sentido cumpre trazer uma das decisões mais citadas e comentadas do
TST a respeito do tema, que foi proferida por sua 6ª turma:

“RECURSO DE REVISTA. MULTA DO ART. 475-J DO


CPC. INCOMPATIBILIDADE COM O PROCESSO DO TRABALHO.
REGRA PRÓPRIA COM PRAZO REDUZIDO. MEDIDA COERCITIVA
NO PROCESSO TRABALHO DIFERENCIADA DO PROCESSO CIVIL O
art. 475-J do CPC determina que o devedor que, no prazo de quinze dias, não
tiver efetuado o pagamento da dívida, tenha acrescido multa de 10% sobre o
valor da execução e, a requerimento do credor, mandado de penhora e
avaliação. A decisão que determina a incidência de multa do art. 475-J do
CPC, em processo trabalhista, viola o art. 889 da CLT, na medida em que a
aplicação do processo civil, subsidiariamente, apenas é possível quando
houver omissão da CLT, seguindo, primeiramente, a linha traçada pela Lei de
Execução fiscal, para apenas após fazer incidir o CPC. Ainda assim, deve ser
compatível a regra contida no processo civil com a norma trabalhista, nos
termos do art. 769 da CLT, o que não ocorre no caso de cominação de multa
no prazo de quinze dias, quando o art. 880 da CLT determina a execução em
48 horas, sob pena de penhora, não de multa. Recurso de revista conhecido e
provido para afastar a multa do art. 475-J do CPC. (Proc: RR - 668/2006-
005-13-40 – Acórdão da 6ª Turma por unanimidade - Publicação: DJ -
28/03/2008)”

O TST fundamentou tal decisão na previsão de rito específico e também na


impossibilidade de conciliar o prazo de 48 horas para efetuar a penhora, previsto na
CLT, com o prazo de 15 dias do processo comum. Afirma ainda que ofende ao princípio
constitucional do devido processo legal.
Aduz ainda a corrente que nega aplicabilidade ao 475-J do CPC no processo
do trabalho, que a CLT prevê a citação por oficial de justiça, para cumprimento de
sentença.
Ora em que pese tais argumentos, diante de todo o exposto neste presente
estudo tal corrente não deve prosperar, afinal vai contra a própria idéia de maior
celeridade que sempre foi inerente ao processo trabalhista.
A divergência quanto ao prazo é passível de solução, afinal o magistrado
conforme já exposto, pode indicar na sentença o modo e o prazo para cumprimento da
obrigação, assim basta adotar uma das adaptações já citadas para resolver este ponto.
Além disto, o prazo de 48 horas previsto na CLT, muitas vezes é
descumprido, portanto adotar prazos mais curtos não significa garantir o sucesso da
execução, afinal que não quer adimplir com a obrigação não importa se o prazo é de 48
horas ou 48 dias, pois independentemente disto ele não será respeitado mesmo.
Assim o meio de forçar um devedor a cumprir a sua obrigação deve
começar por atingi-lo no seu patrimônio, desta forma a chance de vê-lo compelido ao
pagamento é deveras maior. Mormente dizer que se o prazo não possui sanção caso
descumprido (como é o caso previsto na CLT) de nada serve para garantir que exista
celeridade.
Esta inexistência de sanção inclusive não pode ser interpretada como uma
omissão intencional do legislador, mas sim como uma verdadeira lacuna, ou ao menos
deve ser entendida como uma posição ultrapassada pelo avanço da sociedade e do
direito, que gera uma norma injusta quando comparada a sistemas processuais
semelhantes.
Quanto à necessidade de citação pelo oficial de justiça para inicio da
execução, tal tema já debatido neste estudo, onde afirmamos que o processo trabalhista
é do tipo sincrético, onde a execução é fase do processo, e que embora a CLT tenha
utilizado o termo “citação” a maioria da doutrina e jurisprudência entende que basta a
simples intimação da sentença, podendo ser feita inclusive na pessoa do causídico.
Ao TST parece ter faltado a coragem necessária para inovar, talvez tal
posicionamento sequer corresponda a realidade da maioria de seus membros, talvez
daqui a um tempo o TST se compatibilize com a aplicação da multa, enfim talvez
somente quando um entendimento sumulado for proferido a respeito possamos ter
certeza sobre este tema.
Assim, em que pese a decisão do colendo TST, a razão parece-nos assistir
aos inúmeros magistrados de primeiro grau e aos muitos membros dos TRTs, que optam
pela incidência da multa, demonstrando uma posição arrojada e compatível com a
Contituição Federal.
Conclusão

Consoante o exposto neste estudo, propugnamos firmemente pela aplicação


do artigo 475-J do Código de Processo Civil no âmbito do direito processual do
trabalho. Vejamos neste momento os motivos que nos levam a confirmar tal
entendimento.
Primeiro cumpre frisar a existência em nosso ordenamento de um direito
fundamental à celeridade processual e os meios a ela inerentes. Frise-se ainda que a
dignidade da pessoa humana está posicionada como princípio fundamental da
República.
O direito Constitucional moderno nos traz que os princípios possuem força
normativa, servindo como base de interpretação e hermenêutica de todo o ordenamento,
podendo inclusive negar eficácia a normas que tragam disposições contrárias as idéias
expressadas no conteúdo principiológico da Constituição. Inclusive, mesmo as normas
meramente programáticas possuem esta capacidade de invalidar legislação incoerente
com seu conteúdo.
Assim como o acesso a uma jurisdição efetiva e célere encontra-se no rol de
direitos fundamentais expressos da nossa carta magna, toda a legislação
infraconstitucional deve ser interpretada conforme estes comandos. Desta forma os
sistemas processuais pátrios devem ser sempre interpretados de forma que maximize-se
a eficácia dos direitos fundamentais, respeitando assim força de nossa Constituição.
Mormente dizer que a Consolidação das Leis Trabalhistas prevê a
possibilidade de uso supletivo da legislação processual comum nos casos em que exista
lacuna no diploma celetista. Ora nos parece evidente que tal dispositivo comporta uma
nova interpretação, que reflita melhor o ideal constitucional.
Inclusive, o processo trabalhista sempre primou pela celeridade e eficácia,
conforme já aqui exposto, este sempre foi o espírito norteador do ramo trabalhista.
Afinal os direitos sociais discutidos nesta seara especializada são revestidos de caráter
alimentar, que representa um mínimo de dignidade ao trabalhador postulante, o qual
normalmente necessita das verbas pleiteadas para sua mínima sobrevivência.
Com a reforma do Código de Processo Civil, este diploma trouxe
dispositivos que visam garantir celeridade e eficácia à prestação jurisdicional, o que vai
de encontro com a identidade do processo trabalhista.
Com isto, a CLT deve ser interpretada de modo que o permita-se um avanço
na idéia de tipos de lacunas, para proceder-se assim a heterointegração de fontes
processuais. Frise-se então que os artigos 769 e 889 da CLT comportam interpretação
conforme a Constituição Federal, permitindo a aplicação de normas processuais mais
adequadas à efetivação dos direitos postulados perante a justiça do trabalho.
Ao se comparar os ramos do processo e a identidade da Constituição
Federal e do próprio microssistema trabalhista, deve-se reconhecer a existência de
lacunas axiológicas e ontológicas no sistema processual trabalhista. O que garante
ensejo a aplicabilidade de institutos processuais comuns no ramo trabalhista.
Diante do atual estágio de desenvolvimento do processo comum e da
necessidade de se conferir aplicabilidade à garantia constitucional da duração razoável
do processo, deve-se utilizar o diálogo das fontes processuais para suprir as eventuais
lacunas com normas mais compatíveis com os direitos fundamentais. Garantindo assim
respeito à supremacia da carta magna.
No caso específico da multa do artigo 475-J do CPC, sua aplicabilidade é
cristalinamente compatível com os já citados princípios constitucionais, em especial ao
entendermos que o meio de coagir alguém ao cumprimento espontâneo de sentenças
trabalhistas é por atingi-los em seus patrimônios. Afinal a prisão civil, foi
acertadamente extirpada do ordenamento pátrio, eis que contrária ao sistema de direitos
fundamentais da nossa Constituição.
Acreditamos assim na existência de uma lacuna dupla no rito celetista, tanto
axiológica quanto ontológica, o que permite lançar mão da heterointegração dos
sistemas processuais, para importar a aplicação da multa em comento no processo
trabalhista. Buscando através desta um processo do trabalho ainda mais efetivo e célere.
Ponderando uma eventual insegurança jurídica e a efetividade e celeridade
na prestação jurisdicional, acreditamos que a segunda é o lado mais compatível com o
conteúdo global da Constituição Federal de 1998. Pois o aspecto objetivo deste direito
fundamental exige postura ativa do judiciário trabalhista, que atua neste caso
atualizando a interpretação da CLT, deixando-a de acordo com a CF.
Com seu intuito de coagir o devedor ao adimplemento voluntário da
obrigação, a multa do artigo 475-J do CPC nos parece uma imperdível tentativa de
melhorar a rapidez no processo trabalhista, tentando também evitar a eternização de
muitas execuções.
Considerando que o juiz pode determinar o modo de cumprimento da
sentença trabalhista, deve-se intimar a parte devedora, para cumprir espontaneamente a
obrigação no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de ter o valor da execução acrescido
de 10%. Devendo o juiz seguir tal procedimento de ofício, mesmo que a parte não
requeira expressamente a cominação da multa.
Enfim, romper com a postura dogmática e proceder ao diálogo das fontes
processuais em busca de um processo do trabalho que atenda aos comandos
constitucionais de efetividade e celeridade na prestação jurisdicional é o inicio de uma
adequação deste ramo processual aos novos tempos do direito.
Com isso, concluímos que a multa do artigo 475-J do CPC, tem todas as
características necessárias para possuir aplicabilidade no processo do trabalho. Devendo
ser sempre utilizada como modo de buscar sempre uma maior efetividade e celeridade
na prestação jurisdicional.
Bibliografia

BEZERRA LEITE, Carlos Henrique, Curso de Direito Processual do


Trabalho. São Paulo : 2007.
BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. Brasília : 1997.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes; Direito Constitucional e Teoria da
Constituiçao. Coimbra : 2003.
CHAVES, Luciano Athayde. A Recente Reforma no Processo Comum
Reflexos no Direito Judiciário do Trabalho. São Paulo: 2007.
MAIOR, Jorge Luiz Souto. Reflexos das Alterações no Código de Processo
Civil no Processo do Trabalho. In: Revista LTr 70-08/920.
SARLET, Ingo Wolgang; A Eficácia dos Direitos Fundamentais. Porto
Alegre : 2007.
SCHIAVI, Mauro. Manual de Direito Processual do Trabalho. São Paulo :
2007.

Você também pode gostar