Localizada na região oeste do Estado do Rio Grande do Sul, São Borja,
o primeiro dos Sete Povos das Missões foi fundada em 1682 pelos padres jesuítas. Sendo banhada pelo rio Uruguai, e popularmente conhecida como "Terra dos Presidentes", por ser berço dos ex presidentes da República, Getúlio Vargas e João Goulart, é fronteira natural com a cidade de Santo Tomé - Província de Corrientes na Argentina. Remetente aos processos de colonização e evangelização impostos durante o período das reduções Jesuíticas-Guarani, constitui-se pela civilização mais antiga do estado. Sua economia está canalizada na pecuária, agricultura e atividades provenientes da prática fluvial. São Borja se consolidou a partir da sua relação direta com Santo Tomé- Argentina, caracterizada por particularidades fronteiriças, as cidades-gêmeas regiões com grande potencial de integração econômica e cultural, são cortadas pela linha de fronteira terrestre ou fluvial – integram e socializam histórias, costumes e hábitos. Para OLIVEIRA E SILVA (2008), as cidades-gêmeas são pares de centros urbanos geograficamente próximos, divididos por um limite internacional, que podem ser definidas como núcleos centrais da fronteira. A distância de 16 quilômetros separa o município brasileiro do argentino, Santo Tomé, fundada em agosto de 1863, caracteriza-se por ser terra onde a ação do homem é vista e compreendida facilmente, suas planícies apresentam a modificação da paisagem natural sofrida com o tempo e as evoluções da modernidade. Com temperaturas abundantes, vegetação vasta, grande influência indígena e hábitos culturais próprios, o município argentino é reconhecido como a capital do departamento. Com uma relação de irmandade, Brasil e Argentina, São Borja e Santo Tomé, constituem uma identidade própria. GRIMSON (2005) defende que as zonas fronteiriças constituem espaços onde se produzem identidades transnacionais, assim como conflitos entre grupos nacionais. Nesse sentido, as manifestações culturais e identidades regionais servem como artifícios para entender a cultura política da fronteira. Para VELASCO-GRACIET (2008) as fronteiras são, lugares de práticas, trocas e conflitos vitais para o social, o conhecimento do outro, o reforço da identidade e um espaço propício para a difusão cultural com um forte valor simbólico. A comunidade fronteiriça é peça fundamental no processo de construção e fortalecimento da identidade regional.
2.METODOLOGIA
Este artigo buscou compreender e valorizar os laços fronteiriços entre São
Borja - Brasil e Santo Tomé -Argentina. Com uma pesquisa fundamentada na história, cultura e hábitos dos dois países, objetivou valorizar a consolidação da trajetória das duas cidades a partir da colaboração de fatores culturais, sociais e econômicos. A fronteira localizada na região oeste do Estado constitui uma identidade própria, fundamentada na relação de irmandade e integração. Juntos os dois países formam uma conjuntura de fatos históricos, costumes e hábitos, e auxiliam na formação das particularidades da região.
3.RESULTADOS e DISCUSSÃO
A fronteira São Borja/Santo Tomé representa a disseminação da cultura
construída a partir da integração dos dois países. HALL (2003) afirma que a identidade é algo formado ao longo do tempo, através de processos inconscientes, permanece sempre incompleta, está em constante processo de formação. Tal fortalecimento cultural e social reafirmar através da dança, comidas, vestimentas, artefatos e manifestações artísticas – traços e características construídas aos longos dos anos. O limite entre dois países é denominado de fronteira. Estabelecida para marcar um território, define a inclusão e a exclusão, é uma forma de ordem, uma questão de poder. A fronteira é um espaço de convergência cultural, com hábitos limitados do início ao fim, e que são configurados por um intercâmbio cultural. Tais divergências são responsáveis pela construção de diversas definições para o conceito de fronteira. Há dois diferentes tipos e relações de fronteiras: fronteira natural - linha imaginária - que segue o que foi acordado em tratados internacionais; e fronteira de faixa que é a divisão de uma faixa terrestre de 150 quilômetros de largura, ao longo da fronteira linha, regradas por normas para ocupação, trânsito e exploração econômica. Para Borba (2013), "fronteira limite está ligada a uma concepção precisa e definida de terreno, enquanto fronteira faixa é mais abrangente e se refere a uma região". Separadas pelo Rio Uruguai as cidades de São Borja-Brasil, e Santo Tomé-Argentina, configuram-se como cidades irmãs. Segundo Mendonça (2007), são adensamentos populacionais cortados pela linha de fronteira – seja seca ou fluvial, articulada ou não por obra de infraestrutura, com um grande potencial de integração econômica e cultural, podem entendidas como manifestações condensadas dos problemas característicos da região de fronteira e que modificam de forma direta a estrutura e desenvolvimento regional. Compartilhando uma relação desde o século XIX, os dois limites entrelaçaram-se durante o processo de instabilidade estrutural pela integração. Seguindo uma dinâmica própria, a relação bilateral resultou em grandes mudanças para ambos os municípios, e consequentemente, auxiliou na construção de uma identidade consolidada através de aspectos e hábitos distintos. Colvero (2004) ressalta que as fronteiras se tornaram espaços privilegiados para os estudos sobre as relações com grupos de identidades distintas. Sendo possível análise e compreensão da dinâmica da multiplicidade de fluxos e intercâmbios, onde ocorrem interações, formam-se novas alianças, revelam-se novas identidades sociais e culturais, bem como instauram-se conflitos de variadas ordens. Por este fator é importante ressaltar que “na região é que se forma a identidade" e a relação desta com o local no qual está inserida se encontra diretamente condicionada a diversos outros fatores, como o período de formação e elementos externos a zona de fronteira. O fluxo comercial atualmente é considerado o principal vínculo de relação entre os países. Essa prática, é vista pela comunidade fronteiriça como tradicional, é responsável por injetar na economia de ambos os lados um grande montante de capital. O notório movimento de argentinos no comércio de São Borja é confrontado pelo grande número desses nativos em solo argentino. A busca pelo lazer, turismo e melhores condições financeiras, reforça e reafirma a irmandade consolidada durante os últimos 150 anos. A ligação São Borja-BRA e Santo Tomé-ARG tem como trajeto a Ponte Internacional da Integração, construída há 20 anos como ferramenta para facilitar a transição entre as nacionalidades. A conexão entre as nações fortificou laços governamentais e melhorou o nível de vida das comunidades. Regras, acordos e tratados foram revistos e objetivados para proporcionarem uma relação de convívio mais acessível. Uma vez que, as populações de fronteira caracterizam-se por uma rotina diferente das demais comunidades. Como exemplifica Mendonça (2007) um cotidiano marcado por movimentos pendulares de trabalhadores e cidadãos em busca de serviços e atendimentos oferecidos no outro lado da linha divisória, ou simplesmente em busca de lazer, vantagens que só este tipo de localização pode proporcionar. A relação fronteiriça construída pelas duas cidades ultrapassa as diferenças étnicas, culturais, sociais, políticas e econômicas dos municípios. Santo-tomenhos e São-borjenses socializam ambientes, viabilizam ações e constroem juntos uma relação de irmandade. Diariamente, mais de 300 veículos atravessam a aduana que separa os dois locais, famílias, estudantes, profissionais em serviço, todos fortalecem a relação de compatibilidade estabelecida pelos nativos. A cultura e a identidade criada e fortalecida nas regiões de fronteiras não servem apenas como uma forma de vida, mas estimulam também, discussões e reflexões sobre a importância do pensar e fazer coletivo. Diferenças existem e não devem ser ignoradas, pelo contrário, devem ser entendidas e organizadas na construção de uma melhor comunhão. Press (2004) relembra que não se pode compreender fronteira apenas como uma linha de separação entre lugares diferentes, mas, como um espaço complexo e frágil de integração; um pivô estratégico para a integração nacional. Portanto, fronteira deve ser entendida não somente em suas implicações nas relações internacionais e concebidas como uma linha divisória entre Estados, mas ao mesmo tempo, deve-se compreender e resgatar sua complexidade por ser um espaço no qual existem os domínios [...], gerando dinâmicas próprias de desenvolvimento. O elo entre São Borja-BRA e Santo Tomé-ARG, no processo do contexto de globalização atual, intensifica o impacto de integração que se acentuou. A singularidade do cotidiano faz com que atividades rotineiras, sejam feitas no âmbito bilateral. Viver em São Borja, no Brasil, é desfrutar da economia, gastronomia, lazer e política de Santo Tomé, na Argentina, e vice-versa. CARDIN (2013) explica que para um morador das fronteiras com a Argentina, o comércio de comprar roupas, cosméticos ou ir ao supermercado no país vizinho não é uma postura criminalizada e, muito menos, de cunho exclusivamente econômico. Viver em fronteira é ter uma constante troca de culturas, hábitos e costumes. É reconhecer na comunidade vizinha um pouco de sua essência, e compreender em si características próprias e naturais de uma comunidade diferente. O pesquisador e historiador, Muriel Pinto, destaca que o posicionamento da comunidade em relação à irmandade na fronteira está relacionado com a própria história. São Borja e Santo Tomé, são exemplos disso, uma vez que São Borja foi criada por descendentes indígenas que vieram de Santo Tomé, fortalecendo mais ainda a história e cultura dos dois países. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A região fronteiriça de São Borja – Santo Tomé possui aspectos considerados
responsáveis pelo crescente número de estudos relacionados aos conceitos de fronteira e sua ligação direta como elemento de transformação no espaço geográfico que delimita. As novas perspectivas acerca do assunto retratam as fronteiras, não somente como limites ou delimitações de espaços, mas também, como agentes intercessores na idealização de novas identidades culturais, uma vez que não estão somente estabelecendo limites, mas estão principalmente, construindo pontes de conhecimento, interação e sociabilidade. O presente artigo reafirma a importância da manutenção de relações estabelecidas entre as duas nações, e como elas são essenciais para concepção e concretização da fronteira como base de crescimento e desenvolvimento para os municípios de São Borja e Santo Tomé.
5. REFERÊNCIAS
ÁVILA, Heleniza. Cidades em fronteira: discussão sobre seus múltiplos
significados. Ano 2015. Disponível em <http://www.ufrgs.br/gthistoriaculturalrs/27CDHelenizaAvilaCampos.pdf>
BORBA, Vanderlei. Fronteiras E Faixa de Fronteira: Expansionismo, Limites E
Defesa. Ano 2013. Disponível em <https://www.seer.furg.br/hist/article/viewFile/4131/2524>
CANDEAS, Alessandro. Relações Brasil-Argentina: Uma Análise Dos Avanços E
Recuos. Ano 2005. Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/rbpi/v48n1/v48n1a07.pdf>
Identidades E Políticas públicas: A Singularidade Da Fronteira Oeste Do Rio Grande Do Sul. Revista Relacult – Revista Latino-Americana de estudos em Cultura e Sociedade, ano 2016. Disponível em <http://periodicos.claec.org/index.php/relacult/article/view/368/168>
PINTO, Muriel. Irmandade entre São Borja e Santo Tomé. Entrevista ao autor em São Borja, 06 de julho de 2017. (Comunicação oral)
SABEDRA, Lisiane; COLVERO, Ronaldo; MACHADO, Lia. Processos de
Integração na Fronteira: Mecanismos Adotados por São Borja (Brasil) e Santo Tomé (Argentina). Revista Intellector, ano 2016. Disponível em <http://www.cenegri.org.br/intellector/ojs-2.4.3/index.php/intellector/article/view/100>