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Análise Europeia
REVISTA DA ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE ESTUDOS EUROPEUS
Volume I | Número 1
Disponível em: http://www.apeeuropeus.com/revista
CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS
Capa: Bandeiras europeias hasteadas - autor desconhecido. Página 9: Jean Monnet, c. 1954,
proferindo um discurso na rádio por ocasião da sua tomada de posse como presidente da
Comunidade Europeia do Carvão e do Aço - Gamma-Keystone/Getty Images
Diretor
Pedro Camacho
Editores
André Simões dos Santos
Bruno Correia
Ekaterina Malginova
João Moreira
Conselho Científico
Alice Cunha (IHC – Universidade Nova de Lisboa)
Alina Esteves (CEG/IGOT – Universidade de Lisboa)
António Goucha Soares (ISEG – Universidade de Lisboa)
António Martins da Silva (Faculdade de Letras – Universidade de Coimbra)
Carla Fernandes (IPRI – Universidade Nova de Lisboa)
Célia Morgado (Centro Solvit Portugal – Ministério dos Negócios Estrangeiros)
Eduardo Medeiros (CEG/IGOT – Universidade de Lisboa)
Eduardo Paz Ferreira (Faculdade de Direito – Universidade de Lisboa)
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Isabel Camisão (Faculdade de Letras – Universidade de Coimbra)
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Jorge Malheiros (IGOT – Universidade de Lisboa)
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Luís Moreno (IGOT – Universidade de Lisboa)
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Pedro Camacho
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ISSN
2183-802X
Periodicidade
Semestral
Redação
Rua Coronel Marques Leitão, n.º 2, 1.º Dir.
1700-125 Lisboa
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E-mail: investigacao.apee@gmail.com
EDITORIAL
O Começo ............................................................................................................ 11
Pedro Camacho
ARTIGOS
COMUNICAÇÕES
A revista Análise Europeia foi fundada em 2016 pela Associação Portuguesa de Estudos
Europeus, que detém a sua propriedade e demais direitos de edição e publicação. A
sua fundação nasceu da vontade de criar uma revista científica portuguesa dedicada,
exclusivamente, aos Estudos Europeus, considerando as suas variadas vertentes
enquanto área científica. Assim, a Análise Europeia oferece um espaço, no meio
académico, a todos os alunos, investigadores e professores que desejem publicar os
seus trabalhos de investigação na área dos Estudos Europeus, contribuindo para a
promoção, dignificação e avanço científico da mesma.
EDITORIAL
O COMEÇO
É com muito orgulho que vos apresento o primeiro número desta revista.
Porém, em Portugal, a área científica dos Estudos Europeus continua a ser pouco
acreditada. Este facto pode ser avaliado pela quase inexistência de publicações
periódicas dedicadas à investigação científica na área, que ofereçam espaço a alunos,
investigadores e professores para publicarem a sua produção científica. A Análise
Europeia surge, assim, com o objetivo de promover e dignificar esta área, contribuindo
para o desenvolvimento da investigação científica, a promoção de uma reflexão e
discussão aprofundada sobre as metodologias dessa mesma investigação, e a
divulgação de informação e conhecimento no âmbito dos Estudos Europeus. Enquanto
espaço livre, isento e imparcial, a Análise Europeia permite o diálogo multidisciplinar e
interdisciplinar de ideias e um quadro de análises teóricas e empíricas de entre as várias
temáticas que os Estudos Europeus abarcam.
Com a publicação deste primeiro número almejamos escrever uma nova página na
história da academia em Portugal, desejando que esta revista seja um contributo, ainda
Pedro Camacho
Diretor
A PRIMEIRA ANÁLISE
Perante um contexto difícil, de falta de convicção generalizada no projeto europeu e na
Sabemos também que nem tudo significa sucesso e que o sonho dos pais fundadores
está ainda longe de se tornar real na sua totalidade, especialmente quando vemos a
zona económica e monetária com o maior superavit do planeta, sem capacidade de
resposta aos desequilíbrios sociais, como o envelhecimento da população e o
desemprego jovem dentro das suas fronteiras, sem capacidade de resposta concreta
para milhões de migrantes que fogem da fome, da guerra e da ditadura, vendo na
União Europeia o sonho de uma vida digna. A União Europeia está ainda a atravessar
uma crise económica e financeira, um dominó de dívidas soberanas, onde parte dos
Estados-membros se encontra com níveis elevados de desemprego e regista um
aumento da pobreza e da exclusão social, gerando o chamado “Quarto Mundo” nos
seus centros urbanos. A somar a isso, temos as intervenções e os resgates, os níveis
recorde de emigração jovem, a fraca capacidade produtiva, os sistemas de Segurança
Social em risco de colapso, o êxodo rural e a perda de confiança das populações no
Existe, assim, uma conjugação tóxica de fatores que contribuem para a descrença na
União Europeia. Mais recentemente, entre as offshore e o terrorismo, desde os
Muitas vezes, somos abordados sobre a nossa área de formação e confrontados com a
académico e\ou técnico. Assim, sentimos que o nosso papel na construção europeia é
levar o debate em torno da temática europeia a todas as regiões nacionais e faixas
Sabemos que o Futuro é incerto, que a curto prazo as mudanças requerem uma
abertura de horizontes que nem sempre existe, que muito ainda tem que ser
melhorado no processo de integração europeia e que o cenário global é preocupante,
mas estamos absolutamente certos de que como geração Schengen e Erasmus
queremos viver num mundo e numa Europa pacífica, de fácil mobilidade, cosmopolita e
multicultural. Uma Europa livre de muros, de blocos bipolares, de restrições à liberdade,
Acredito que com isto respondi à pergunta, que a importância das ciências socias e
humanas como os Estudos Europeus se justifique e que seja até uma emergência para
a construção de uma nova ética baseada na solidariedade e na procura de um
desenvolvimento sustentável, o que se tornará mais explícito com o exercício
António Santos
Presidente da Associação Portuguesa de Estudos Europeus
MARTIN GEGNER1
RESUMO
(UE) é igualmente um exemplo de que fronteiras nacionais podem ser superadas, assim como se trata de
um processo longo e demorado, com retrocessos, mal-entendidos e erros devidos à falta de conhecimento
sobre as diferentes culturas administrativas. Estes são baseados em conceitos diferentes da filosofia
ABSTRACT
“Daseinsvorsorge” and “Service public” in the context of European integration. The integration of the German
concept “Daseinsvorsorge” and the French “service public” into a European legislation exemplifies
structural problems within the process of the European integration. The European Union on the one hand
is an extraordinary example that national borders can be overcome, but on the other hand demonstrates
that this is a long lasting process, full of regress and misunderstandings due to missing knowledge of the
different administration cultures to be integrated. These are deeply based on different concepts of the
INTRODUÇÃO
Já que Daseinsfürsorge é retratada aqui como prática social e não como sistema
paternalista prescrito de cima para baixo, Jaspers declara-a como sendo uma conquista
democrática:
alguma forma. Sem a tolerância das massas, ninguém mais se atreve a dar ordens
quanto a tarefas que ela deve cumprir seguindo um plano de força. O aparato
desenvolve-se muito mais na tensão do combate e, ainda assim, atua na mesma
direção de vontade (Jaspers, 1931, p. 33).
de tomar medidas de defesa contra ameaças. Da junção destas duas palavras, Dasein e
Vorsorge, surge uma posição política complexa: as massas humanas tomam medidas de
prevenção para a sua existência (básica).
Forsthoff ligou estas percepções de filosofia existencialista com conhecimentos
sociológicos e delas derivou que o indivíduo não mais poderia tomar precauções por si
mesmo, mas apenas na sociedade solidária do sistema burocrático moderno. Esta
conexão do seu pensamento é formulada de forma tão precisa, que, até hoje na
Alemanha, o termo Daseinsvorsorge ainda é compreendido como sendo um princípio
fundamental de atividade social do Estado.
Correspondente à tradição jurídica e social alemã, Forsthoff vê “a concepção
socialmente justa de direito aos benefícios (Leistungsbeziehung)” localizada em “nível
abaixo do Estado” (ibid., p. 49). Ele localiza o governo como fornecedor de benefícios
(Leistungsträger) nos municípios. Com isso, ele legitima, em retrospectiva, as conquistas
sociais e de política comunal da República de Weimar, já que as reformas políticas
daquele tempo levaram os municípios a assumirem a função de Leistungsträger em
quase todas as áreas, o que mais tarde viria a ser conhecido como Daseinsvorsorge
(vide Ambrosius, 1984). Como objeto material da Daseinsvorsorge, Forsthoff quase
literalmente cita uma passagem tomada de Dessauer (1928, p. 113f), referindo-se ao
velhice, invalidez, doença e muitas outras coisas mais (Forsthoff, 1938, p. 7).
lugar aos “serviços públicos” (ibid., p. 31). Entretanto, faz referência até mesmo ao facto
de empresas privadas poderem assumir serviços públicos. Para isso, vigoraria o
contrato de concessões.
Numa nota de rodapé, notavelmente longa e afirmativa, Forsthoff preocupa-se
com a representação do sistema de Daseinsvorsorge ideal do seu ponto de vista, similar
ao oferecido pelo contrat de concession de service public francês de Leon Duguit (o qual
o autor também não cita). Ali, ele ressalta a separação entre o planeamento do Estado
e a realização económica (privada).
Uma vez que a formação do serviço público é colocada em paralelo à lei, o direito
constatada pelo sociólogo alemão Ulrich Beck (1998), um conceito sociopolítico que
tente minimizar inseguranças e riscos individuais seja um assunto atual.
[…] tarefas que por si só já estão reservadas para o Estado, como a manutenção da
CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA
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ALEXANDRE GUERREIRO2
RESUMO
Numa decisão recente, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem pronunciou-se sobre a detenção de
três cidadãos tunisinos num centro de recepção situado em Lampedusa, após terem sido interceptados
pelas autoridades italianas quando atravessavam o Mar Mediterrâneo. Este acórdão coloca em relevo a
questão da discussão em torno de uma eventual violação do direito à liberdade consagrado no artigo 5.º
manifestação do direito cosmopolita desde que os beneficiários se encontrem em território onde vigoram
instrumentos e princípios de Direitos Internacional Humanitário enquanto factores que concorrem para
uma maximização da protecção dos direitos humanos. Todavia, assiste-se a um paradoxo que coloca
problemas de difícil resolução: por um lado, a responsabilização por falta de meios humanos, sanitários e
de acolhimento digno de pessoas por parte de Estados que se tornam alvos de danos colaterais
provocados por situações de crises humanitárias; por outro, o desafio com que se deparam de garantir que
um cenário de crise humanitária não atenta contra a dignidade da pessoa humana de pessoas que se
encontram em situação natural de fragilidade.
cosmopolita.
protocolos adicionais.
2
Assessor Parlamentar da Assembleia da República e doutorando da Faculdade de Direito da Universidade
Nova de Lisboa. Lisboa, Portugal. E-mail: alexandretguerreiro@gmail.com.
3
Doutorando da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa. Lisboa, Portugal.
E-mail: arturmicaelsilva@gmail.com.
ABSTRACT
Lampedusa and the paradox of human dignity: commentary to the judgment delivered by the European Court
of Human Rights in the case of Khlaifa and Others v. Italy. In a recent judgment, the European Court of
Human Rights has decided on the detention of three Tunisian citizens in a reception centre on Lampedusa
after being intercepted by the Italian authorities after they left Tunisia by sea, in September 2011.Among
other aspects, this decision highlights the debate around the alleged violation of both the right to liberty
enshrined in article 5 of the ECHR and the violation of the prohibition of inhuman or degrading treatment,
set in article 3 of the same Convention., The importance of the present decision should be emphasized as it
stands for the expression of cosmopolitan law whenever those who should take advantage of it are in a
territory where instruments and principles of International Humanitarian Law are in force, maximizing the
protection of human rights. Nevertheless a paradox emerges: on the one hand, liability for lack of human
resources, sanitary facilities and decent detention conditions by countries that become targets of collateral
damages caused by humanitarian crisis; on the other hand, the challenge faced by the same countries in
order to guarantee that a humanitarian crisis would not have an adverse effect to the human dignity of
Keywords: humanitarian crisis, State liability, International Humanitarian Law, cosmopolitan law.
_________________________________________________________________________________________________________________
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por objecto um comentário a uma decisão que versa
sobre um tema actual e interessante. Com efeito, com o crescente aumento de
migração oriunda de territórios em cenário de Guerra, começam a revelar-se problemas
4
jurídicos que colocam em evidência o contexto pós-nacional decorrente da
globalização 5. A macro-problemática que aqui analisaremos e criticamos pode ser
sintetizada da seguinte forma: (i) por um lado, os Estados encontram-se obrigados à
protecção dos Direitos Humanos e ao cumprimento das suas obrigações internacionais,
nomeadamente, corporizadas na Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH);
(ii) por outro lado, ciosos da sua soberania, pretendem manter autonomia na
4
Cfr., por todos, HABERMAS (1998, pp. 65 e ss.).
5
Cfr., sobre a abrangente bibliografia, o elucidativo texto de HELD (1995, pp. 267 e ss.).
2. ENQUADRAMENTO FÁCTICO
6
Não trataremos, contudo, neste texto da interessante questão que envolve a margem livre de apreciação
dos Estados na interpretação as normas da CEDH. Sobre este problema, com indicações, cfr. MEDEIROS
(2015, pp. 347 e ss.) cfr., igualmente, KRISCH (2010, pp. 109 e ss.), LEGG (2012, pp. 32 e ss.), TOMUSCHAT
(2014, pp. 107 e ss.), LORENZ, Nina-Louisa Arold et al. (2013, pp. 69 e ss.).
7
Cfr., por todos, BESSON (2014, pp. 170 e ss.). Em geral, sobre o pluralismo jurídico num quadro pós-
nacional, entre outros, cfr. BERMAN (2012, pp. 141 e ss.).
8
Sobre este, cfr., por exemplo, o incontornável texto de AGAMBEN (2005, pp. 1 e ss.).
9
Relativamente aos antecedentes da Primavera Árabe e ao impacto que teve na democratização das
sociedades muçulmanas, cfr. ESPOSITO, John L. et al. (2016, pp. 1-25). Sobre a utilização das redes sociais
na Primavera Árabe, cfr. JAMALI (2014).
10
Para uma análise aos efeitos da Primavera Árabe na Líbia e a forma como a revolta conduziu à abertura
de investigações no Tribunal Penal Internacional contra figuras do aparelho de Estado líbio, cfr.
GUERREIRO (2012); KERSTEN (2014, pp. 188-207).
11
Para uma comparação dos resultados da Primavera Árabe no Egipto, na Tunísia e na Síria, cfr. SIKA,
(2014, pp. 73-97).
12
Sobre os antecedentes da “Revolução de Jasmim” e o pós-Primavera Árabe na Tunísia, cfr. MARCOVITZ
(2014, pp. 26-38); ESPOSITO, John L. et al. (2016, pp. 174-201).
13
A este respeito e às ameaças de segurança sobre os países do Mediterrâneo decorrentes da Primavera
Árabe, cfr. BOENING (2014, em especial pp. 11-25).
14
Podemos questionar a terminologia adoptada em língua portuguesa tanto para o Tribunal como para a
Convenção Europeia dos Direitos do Homem, mais concretamente sobre a referência a “Direitos do
Homem” ou “Direitos Humanos”. Em francês, a designação oficial é “Droits de l’Homme”, mas em inglês e
em castelhano o conceito é mais moderno e mais amplo: “Human Rights” e “Derechos Humanos”,
respectivamente. A tendência portuguesa para seguir a adaptação do francês não é recente, tendo as suas
origens no facto de, até ao terceiro quartel do século XX, Portugal manifestar uma aproximação e uma
afinidade maior com a cultura e política francesas. A título de exemplo, relativamente à “Declaração
Universal dos Direitos do Homem”, o crescente reconhecimento de direitos às mulheres e a consequente
intenção de eliminar factores passíveis de prolongarem a discriminação com base no género precipitaram
a revisão da terminologia em castelhano, mais concretamente de “Derechos del Hombre” para “Derechos
Humanos”, em 1952, por via da Resolução 548 (VI) da Assembleia-Geral das Nações Unidas. Portugal
nunca procedeu, oficialmente, à mesma alteração, assistindo-se, porém, a uma referência oficial ora a
“Direitos do Homem”, ora a “Direitos Humanos”. Com efeito, a Declaração tem a terminologia moderna
reconhecida por órgãos de soberania como a Assembleia da República, o que não se estende
obrigatoriamente aos restantes.
por factos ocorridos em 201115, numa decisão com impacto considerável na protecção
dos Direitos Humanos que importa conhecer. A decisão que comentamos permite, por
um lado, discutir os problemas que envolvem a migração de cidadãos de países em
cenário de guerra e, por outro, permite discutir elementos que se relacionam com a
aplicação do Direito que deriva da Convenção Europeia dos Direitos Humanos no
espaço cosmopolita dos Estados Contratantes.
Segundo a matéria sujeita a apreciação, os três requerentes, com idades
compreendidas entre os 23 e os 28 anos à data da ocorrência dos factos, foram
interceptados pela guarda-costeira italiana quando atravessavam o Mar Mediterrâneo
numa embarcação, juntamente com outras pessoas, a 16 e 17 de Setembro de 2011,
sendo acompanhados até um centro de acolhimento sito na ilha de Lampedusa.
Uma vez chegados ao Centro de Contrada Imbriacola, foram-lhes prestados os
primeiros socorros e as autoridades procederam à recolha da sua identificação, sendo,
finalmente, encaminhados para um sector do Centro reservado a cidadãos tunisinos
adultos.
Todavia, os requerentes alegam terem sido instalados num espaço sobrelotado
e obrigados a dormir no chão dada a insuficiência de camas para dormir e da má
qualidade dos colchões. As refeições eram tomadas no espaço exterior, tendo de se
sentar no chão. Todo e qualquer contacto com o exterior era impossível e o centro
mantinha um sistema de vigilância permanente garantido pelas forças de segurança.
A 20 de Setembro de 2011, os migrantes ali detidos organizaram um motim que
degenerou num incêndio no interior do centro que forçou as autoridades transalpinas
a transferirem os requerentes para o parque desportivo de Lampedusa com o fim de ali
passarem a noite. No dia seguinte, os requerentes, juntamente com outros migrantes,
lograram romper a barreira de vigilância montada pelas forças de segurança e
chegaram à vila de Lampedusa.
Uma vez aqui, os requerentes, juntamente com cerca de 1.800 migrantes
organizaram manifestações nas ruas da ilha, tendo sido interpelados pelas autoridades
15
O processo “Khlaifia e outros contra Itália” (n.º 16483/12) está disponível para consulta na página do
Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Cfr. TRIBUNAL EUROPEU DOS DIREITOS DO HOMEM (2015),
Khlaifia et autres c. Italie [Em linha]. [Consultado a 15 de Fevereiro de 2016]. Disponível em
http://hudoc.echr.coe.int.
3. FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO
16
Sobre este artigo da CEDH, desenvolvidamente e por exemplo, HARRIS, David et al. (2014, pp. 287 e ss.)
e MOWBRAY (2012, pp. 245 e ss.).
17
Mais concretamente os processos “Gorea contra Moldávia” (n.º 21984/05), “Terziev contra Bulgária” (n.º
62594/00), “Karalevicius contra Lituânia” (n.º 53254/99) e, mais recentemente, “Tarakhel contra Suíça” (n.º
29217/12).
18
Por exemplo, em situações de detenção de deficientes mentais, de obrigação de o detido passar a noite
num espaço reduzido onde não se possa instalar convenientemente ou aceder aos sanitários ou o
confinamento a um local não adaptado ao acolhimento de pessoas ou que se revele perigoso.
19
O TEDH considerou que ocorreu “expulsão colectiva” em quatro processos e de duas formas distintas:
através da identificação de indivíduos em vias de expulsão com base na sua pertença a um grupo com
características comuns, como sucedeu nos processos “Conka contra Bélgica” (n.º 51564/99), “Geórgia
contra Rússia” (n.º 13255/07); e através da identificação de um grupo de indivíduos que se encontram
fisicamente juntos sem considerar a identidade dos mesmos, conforme se verificou nos processos “Hirsi
Jamma e outros contra Itália” (n.º 27765/09) e “Sharifi e outros contra Itália e Grécia” (n.º 16643/09).
20
Por exemplo, critérios étnicos.
21
Cfr. TRIBUNAL EUROPEU DOS DIREITOS DO HOMEM (2013), Case of M.A. v. Cyprus [Em linha].
[Consultado a 15 de Fevereiro de 2016]. Disponível em http://hudoc.echr.coe.int. §246.
22
Considerando precisamente – ao analisar o direito cosmopolita de Ulrich Beck – que “It is the reality of
our times”. Cfr. BLANK (2014, pp. 65 e ss.).
23
Com efeito, nos termos do artigo 34.º da CEDH: “O Tribunal pode receber petições de qualquer pessoa
singular, organização não governamental ou grupo de particulares que se considere vítima de violação por
qualquer Alta Parte Contratante dos direitos reconhecidos na Convenção ou nos seus protocolos. As Altas
Partes Contratantes comprometem-se a não criar qualquer entrave ao exercício efectivo desse direito”.
Sobre o indivíduo como sujeito de direito internacional, cfr., entre outros, ESTEVES (1986, pp. 185 e ss.) e
VILELA (2014, pp. 779 e ss.).
24
Cfr. DOMINGO (2010, p. 36).
25
SWEET (2012, p. 60).
26
Cfr., por todos, KÖHLER (2006, pp. 32 e ss.).
27
portanto, exigível que obtenha um tratamento pacífico e de acordo com a sua
condição 28.
O direito cosmopolita é, no entanto, ainda uma arena propícia a debates e a
divergências que tornam a construção cosmopolita permeável a um desafio que
envolve também o ordenamento jurídico nacional. É que não se encontra ainda
resolvida a interacção entre este direito cosmopolita e o Estado nacional soberano que
impõe limites e regras que ainda não tutelam adequadamente os direitos e as posições
jurídicas dos refugiados29.
Na verdade, a crescente vaga de refugiados que – numa dimensão sem
precedentes no séc. XXI – colocou, em particular, os Estados mais procurados por estes
num cenário de insuficiência30 – que não é, todavia, autoprovocado – de meios
humanos e físicos para acolher aqueles que mais precisam de auxílio para fugir de um
panorama aterrador no seu país de origem.
Esta circunstância coloca em crise um dos supostos pressupostos do direito
31
cosmopolita kantiano: o tratamento dos migrantes como cidadãos cosmopolitas .
Sem condições para receber condignamente os cidadãos mundiais (migrantes), torna-
se imperativo perceber qual a solução para um dilema acentuado que se manifesta da
seguinte forma: (i) ou os migrantes são simplesmente repatriados; (ii) ou poderão ser
recebidos no Estado de acolhimento sem condições suficientes dignas para a sua
condição humana e de cidadãos mundiais; (iii) ou, por último, o Estado de acolhimento
tem a responsabilidade de garantir aos migrantes todas as condições económicas e de
27
Sobre este contexto no projecto de paz de Kant, cfr. WOOD (1998, pp. 59 e ss.).
28
Sobre a questão, com indicações, cfr. SCHMALZ (2016, pp. 226 e ss.). A Convenção de Genebra relativa
ao Estatuto dos Refugiados adopta precisamente esta concepção ao estabelecer no artigo 32.º, n.º 1 que:
“Nenhum dos Estados Contratantes expulsará ou repelirá um refugiado, seja de que maneira for, para as
fronteiras dos territórios onde a sua vida ou a sua liberdade sejam ameaçados em virtude da sua raça,
religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou opiniões políticas”.
29
Neste sentido, cfr. SCHMALZ (2016, p. 237). Sobre as interacções entre o direito nacional e o direito
cosmopolita em matéria de refugiados, cfr. BUCKEL (2013, pp. 49 e ss.) e BABAN (2013, pp. 217 e ss.).
30
São conhecidas as condições em que os refugiados são acolhidos, sujeitando-se a viver em habitações
precárias durante vários anos, com as limitações evidentes que envolvem a vida num campo de refugiado.
Sobre esta questão, cfr., por todos, AGUIER (2011, pp. 36 e ss.).
31
Sem prejuízo de se discutir inclusivamente se existe um direito humano à migração, cfr. VALADEZ, (2010,
pp. 221 e ss.)
sobrevivência que merecem todos os seres humanos, mas não o podendo fazer têm
que responsabilizar-se pela inexistência daquelas condições32.
A solução pode variar consoante a compreensão teórica que se adopte em
torno do direito cosmopolita (Held, 2010, pp. 14 e ss.). Com efeito, na decisão
analisada, parece-nos que o TEDH parte de uma concepção adequada do conteúdo do
direito cosmopolita, na medida em que compreende que este deve consubstanciar um
compromisso de protecção dos direitos humanos de qualquer cidadão que se encontre
no território de uma das partes contratantes.
O direito cosmopolita deixa, assim, de ser entendido como uma forma de
unitarização (e de imposição da maioria à minoria) dos valores de uma determinada
comunidade33, sendo que os respectivos mecanismos de protecção não se dirigem
somente aos cidadãos de uma determinada comunidade, mas também aos cidadãos
mundiais34. O conteúdo do direito cosmopolita do TEDH permite, portanto, assumir
uma inclusão dos cidadãos do mundo num direito de aplicação universal, mas que
protege direitos humanos, seguindo uma lógica de que os cidadãos
(independentemente da sua comunidade de origem) têm uma igualdade axiológica
(Ingram, 2013, pp. 226 e ss.). É, assim, portanto, que o sistema de protecção da CEDH
evita “passa[r] a oferecer caução a todo e qualquer sistema, desde que funcional”
(Coutinho, 2009, p. 537).
32
Importa proceder à distinção entre os conceitos de refugiado e migrante. O primeiro tem como base,
desde logo, a Convenção de Genebra de 1951, relativa ao estatuto dos refugiados, e serve para qualificar
uma pessoa humana que se encontra fora do país da sua nacionalidade por ser ou temer ser perseguida
por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas e à qual é garantido asilo.
No plano europeu, o conceito de perseguição refere, aparentemente, situações mais concretas de
perseguição, conforme resulta das Directivas n.ºs 2004/83/CE, do Conselho, de 29 de Abril, 2005/85/CE, do
Conselho, de 1 de Dezembro, 2011/95/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Dezembro,
2013/32/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Junho, e 2013/33/UE, do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 26 de Junho. Por outro lado, o conceito de migrante é aplicável às pessoas
humanas que abandonam o país da sua nacionalidade rumo a um terceiro Estado tendo motivações
puramente económicas. Embora um migrante possa ambicionar a concessão de asilo, enquanto a
protecção não lhe é concedida manter-se-á como migrante ou mero requerente de asilo, não sendo,
portanto, um refugiado. Neste sentido, cfr. Guerreiro (2016, pp. 165-170).
33
Conforme reconhece Schmalz (2016, p. 237), a questão não está tanto em saber se o direito cosmopolita
é uma solução, mas qual o direito cosmopolita e na necessidade de incorporar elementos críticos na
construção teórica que envolve soluções globais.
34
Afastamo-nos, portanto, das consequências que se retiram da concepção de Walzer (2002, pp. 125 e ss.),
que nega a existência de cidadãos mundiais.
35
Cfr. BARRETO, Ireneu Cabral, A Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 5.ª ed. revista e actualizada,
Coimbra: Almedina, 2015, p. 491.
36
Cfr. TRIBUNAL EUROPEU DOS DIREITOS DO HOMEM (2014), Case of Tarakhel v. Switzerland [Em linha].
[Consultado a 15 de Fevereiro de 2016]. Disponível em <http://hudoc.echr.coe.int>. §119-122.
6. CONCLUSÕES
situações de asilo a causa que justifica o seu estatuto de refugiado deva cessar por
estar comprometida a protecção do indivíduo enquanto Ser Humano.
No processo “Khlaifia e outros contra Itália”, o colectivo de juízes decide num
sentido que deixa mais dúvidas do que respostas relativamente aos deveres dos
Estados-Partes para com os migrantes. Desde logo, é possível aferir das conclusões do
TEDH que o direito à liberdade e à segurança poderá não estar comprometido se os
Estados positivarem uma norma que legitime o confinamento de migrantes que entram
ilegalmente no território de um Estado Parte a um espaço que os prive de contactos
com o exterior e os sujeite a vigilância das autoridades.
Com efeito, é neste sentido que o Tribunal parece apontar ao afastar o regime
aplicável aos beneficiários de asilo, que reconhece a liberdade de circulação dos
refugiados no território onde se encontram, do previsto para os migrantes ilegais ao
direccionar as críticas para a lotação do centro de Lampedusa na altura dos
acontecimentos e para o facto de estas instalações não terem correspondência legal
que as qualifique como centro de acolhimento de migrantes ilegais, motivo pelo qual
se recomenda que as autoridades italianas procedam à clarificação do estatuto da
infra-estrutura utilizada como centro de detenção.
Simultaneamente, o simples facto de migrantes terem em comum a
nacionalidade constituirá fundamento suficiente para se presumir a verificação de
expulsão colectiva motivada neste elemento se forem emitidos documentos tipo de
expulsão mas dirigidos aos destinatários correctos e os documentos não padecerem de
vícios materiais? A ser assim, como podem os Estados, em tempos de crise, garantir o
cumprimento da prestação de informação das razões da prisão no mais breve prazo e
individualizar a redacção da documentação necessária sem evitar a violação da
Convenção por manter os migrantes detidos durante um período prolongado?
Por outro lado, conforme referido anteriormente, parece que o TEDH
considerou uma aplicação ampla e abstracta da proibição de tratamentos desumanos
ignorando o surto inesperado de uma crise humanitária, deixando a ideia de que, ainda
que os Estados Partes não tenham intenção de proporcionar um tratamento desumano,
devem estar preparados para responder a situações de crise extraordinárias, sob pena
de responderem por violação da CEDH.
Assim, será que a prioridade deixa de ser a garantia de protecção a migrantes
cujas características lhes poderá permitir beneficiar de asilo, garantia esta que passaria
a tomar-se por adquirida, ainda que os Estados não a pudessem prever, nem fossem
por elas responsáveis, para passar a ser a disponibilização de instalações em condições
que privilegiem o acolhimento individual?
No mesmo sentido, coloca-se a questão de saber se se tornará irrelevante o
período de tempo e a razão que sustenta a verificação da diminuição da dignidade
humana, ocorrendo violação do artigo 3.º da CEDH a colocação de migrantes num
contexto de sobrelotação e condições de higiene deficientes, o que parece opor-se ao
entendimento geral do Tribunal até ao momento37.
Em suma, a decisão do TEDH no âmbito do processo “Khlaifia e outros contra
Itália” assume um grau de importância fulcral para reflectir se se tratou esta de uma
decisão excepcional ou se o processo em apreço marca a inversão da tendência e o
reconhecimento de uma responsabilidade acrescida para os Estados? Estarão
verificadas as condições para que migrantes e refugiados colocados em campos de
acolhimento na Turquia, Estado Parte da CEDH, possam propor acções de condenação
de Ancara com base nos mesmos princípios, ignorando-se o facto de o território turco
acolher cerca de 1,83 milhões de refugiados em condições inferiores às que a Itália
garante38?
Estas e muitas outras questões permanecem de momento sem resposta mas
mantêm aberto o debate e devem promover a participação e a tomada de decisão por
parte dos diversos Estados Partes na CEDH.
37
Relativamente a situações similares com o caso em apreço, vejam-se as decisões dos processos
“Gavrilovici contra Moldávia” (n.º 25464/05), “Aliev contra Turquia” (n.º 30518/11) e “T. e A. contra Turquia”
(n.º 47146/11).
38
Segundo dados oficiais, em actualização permanente, do Alto Comissariado das Nações Unidas para os
Refugiados. Cfr. ALTO COMISSARIADO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA OS REFUGIADOS (2016), 2015 UNHCR
country operations profile – Turkey [Em linha]. [Consultado a 15 de Fevereiro de 2016]. Disponível em
http://www.unhcr.org.
BIBLIOGRAFIA
CARLOS RODRIGUES1
RESUMO
empresas como de indivíduos. À sua política primária – a prossecução do interesse público ao menor custo
possível – acrescem, por impulso comunitário, as políticas secundárias ligadas ao ambiente e à condição
social. A presente investigação visa analisar a evolução da contratação pública social enquanto pilar da
contratação pública sustentável e instrumento de políticas de apoio aos jovens NEET – Not Currently
Palavras-chave: contratação pública, políticas sociais, desenvolvimento sustentável, União Europeia, Not
Currently Engaged in Employment, Education or Training (NEET).
ABSTRACT
The Public Procurement socially responsible at the service of NEET youth. Public procurement has the
potential to influence markets and model behavior of both companies and individuals. To its primary policy
- the pursuit of public interest at the lowest possible cost – are added, by Community impetus, secondary
policies related to the environment and the social condition. This research aims to analyze the evolution of
social public procurement as a pillar of sustainable public procurement and instrument of support policies
Keywords: public procurement, social policies sustainable development, European Union, Not Currently
Engaged in Employment, Education or Training (NEET).
Histórico do artigo: recebido em 15-02-2016; recebido após revisão em 10-03-2016; aprovado em 19-03-
2016; publicado em 03-05-2016.
1
Jurista e Mestre em Direito Público pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Coimbra,
Portugal. E-mail: csergiomr@gmail.com.
1. NOTAS INTRODUTÓRIAS
A Europa, tal como o resto do Mundo, atravessa uma crise que afeta diversos
campos e áreas de atividade, desde a preservação dos ecossistemas até à
sustentabilidade dos sistemas económicos. Neste sentido, o desafio das sociedades
hodiernas é duplo: por um lado, estimular o desenvolvimento económico e a proteção
ambiental, conducente ao aumento do emprego e ao aumento do bem-estar; por
outro, garantir a sustentabilidade, nomeadamente ambiental, desse desenvolvimento.
A contratação pública ocupa um lugar de peso no orçamento nacional e no
orçamento comunitário. Nas duas últimas décadas, temos assistido a um esforço
considerável pela melhor regulamentação possível deste setor de atividade pública,
com o duplo objetivo de, por um lado, evitar práticas de corrupção, tornando o regime
jurídico aplicável mais robusto e garantístico, em respeito a certos princípios básicos e,
por outro lado, instrumentalizar a influência notável que a contratação pública detém
nos mercados para a prossecução de políticas secundárias, como a proteção do
ambiente e o desenvolvimento e a aplicação de políticas sociais de inclusão e de
empregabilidade.
A presente investigação centra-se, precisamente, na prossecução de políticas
secundárias de cariz social, com especial atenção para os jovens NEET (Not Currently
Engaged in Employment, Education or Training), i.e., a percentagem dos jovens que não
estão a trabalhar, nem a estudar nem a fazer formação. O escopo destas políticas é
bem mais amplo e complexo, mas o recorte aqui operado justifica-se pelo imperativo
atual de se fazer frente a uma série de desafios prementes que perpassam a cena
global, no domínio social, dos quais optamos por analisar a (cada vez mais) crítica taxa
de desemprego entre os jovens, fator de múltiplas consequências como a emigração
forçada, o abandono do ensino superior e a degradação dos sistemas de segurança
social.
A Contratação Pública Socialmente Responsável pode ser definida como a
contratação pública que incorpora critérios sociais no seu âmbito, o que pode ocorrer
em três momentos: na fase de formação do contrato, na definição e consequente
aplicação do critério de adjudicação ou, ainda, na fase de execução do contrato já
2. CONCEITOS
2
Tal como definido na Conferência de Brundtland de 1987, mormente no Relatório daí derivado, “Our
Common Future”, o desenvolvimento sustentável traduz-se no desenvolvimento que permite satisfazer as
necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de satisfação das necessidades pelas gerações
futuras.
3
Neste sentido, RODRIGUES, Nuno Cunha, A Contratação Pública como Instrumento de Política Económica,
Tese de Doutoramento. Coimbra: Almedina, novembro de 2013. O autor constata que os contratos
públicos integram o movimento de globalização económica, o que se deduz do fenómeno de
internacionalização do Direito dos Contratos Públicos.
4
O conceito de contrato administrativo é mais restrito e resulta do número 6, do artigo 1º do CCP. Para
mais desenvolvimentos acerca desta noção, vide GONÇALVES, Pedro, O contrato administrativo – uma
instituição do direito administrativo do nosso tempo, Almedina, Coimbra, 2003. Num comentário ajustado
ao CCP, vide SOUSA, Marcelo Rebelo de, e MATOS, André Salgado de, Contratos Públicos – Direito
Administrativo Geral, Tomo III, Dom Quixote, Lisboa, 2008, pp. 22-72.
milhões de euros em 2004 (Comissão Europeia, 2004, p. 4)5; em 2008, o valor ascendeu
para 18%, ou seja, cerca de 2155 milhões de euros (Comissão Europeia, 2009, p. 23).
Nos anos posteriores, a percentagem ronda os 20% (Comissão Europeia, 2010, p. 10), o
que nos permite concluir pela importância crescente deste instrumento (6) (7).
Considerada a sua importância no cenário económico, a contratação pública
pode desempenhar um papel de (bom) exemplo, tendo em vista o desenvolvimento
sustentável. O cenário sustentável é aqui caracterizado pela existência, em larga escala,
de produtos, bens ou serviços mais amigos do ambiente, socialmente responsáveis e
inovadores em termos tecnológicos. A Comissão Europeia assume a contratação
pública como uma área estratégica – e a sua «ecologização» como uma prioridade no
âmbito da Estratégia Europa 20208.
A Contratação Pública Socialmente Responsável pode ser definida como a
contratação pública que incorpora critérios sociais no seu âmbito, o que pode ocorrer
em três momentos: na fase de formação do contrato, na definição e consequente
aplicação do critério de adjudicação ou, ainda, na fase de execução do contrato já
formado e adjudicado. A mesma definição ajusta-se, mutatis mutandis, ao conceito de
contratação pública ecológica, cuja missão é a preservação ecológica.
5
O estudo conclui que uma mera poupança de 10% pelos então apenas quinze Estados-Membros,
permitiria a três estados ter um superavit orçamental, deixando de estar em deficit.
6
Analisando o papel das autoridades públicas, partindo do poder influenciador da contratação pública
evidenciado na sua importância crescente nos orçamentos, vide DAY, Catherine, Buying Green: The Crucial
Role of Public Authorities, in Local Environment: The International Journal of Justice and Sustainability, vol.
10. Nº 2, abril de 2005, pp. 201-209
(http://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/1354983042000388214?journalCode=cloe20).
7
Dado o seu peso, a contratação pública foi também alvo de mudanças decorrentes do «Programa de
Assistência Económica e Financeira», monitorizado pela troika (FMI, CE e BCE). Para uma análise dos
impactos destes PAEF sobre as PPP, um vetor importante da contratação pública, vide PARDAL, Paulo
Alves, A contratação pública sob os ventos da austeridade orçamental, in FERREIRA, Eduardo Paz e
RODRIGUES, Nuno Cunha (coord.), Novas Fronteiras da Contratação Pública, Colecção Manuais
Académicos IDEFF, Nº 1, Coimbra Editora, Coimbra, 2014, pp. 171 a 204; Também, GONÇALVES, Pedro
Costa, Alterações ao Código dos Contratos Públicos na sequência do «Memorando de Entendimento com
a Troika», in Revista de Contratos Públicos, nº5, CEDIPRE, Coimbra, 2012, pp. 213 a 237.
8
O Relatório Monti indica que a reforma do quadro normativo europeu da contratação pública deve focar-
se na possibilidade de permitir a integração de políticas secundárias ou horizontais na contratação pública.
Tal estratégia permitirá reforçar e concretiza a Estratégia Europa 2020. (Relatório Monti, A new strategy for
the single market at the service of Europe‟s economy and society, Report to the President of the European
Comission Durão Barroso, by Mario Monti, 9 de maio de 2010 (http://www.frank-
cs.org/cms/pdfs/EC/EC_Monti_Report_9.5.10.pdf).
9
Tais são as conclusões de um relatório deveras essencial e detalhado, elaborado por um think tank
dedicado à sustentabilidade: KAHLENBORN, Walter; MOSER, Christine; FRIDJAL, Joep; ESSIG, Michael,
Strategic Use of Public Procurement in Europe – Final Report to the European Comission MARKT/2010/02/C,
Berlin: adelphi, 2011, disponível em:
http://ec.europa.eu/internal_market/publicprocurement/docs/modernising_rules/strategic-use-public-
procurement-europe_en.pdf. A tradução de excertos, devidamente citados e identificados é livre.
10
Apesar de uma quebra recente, a taxa de desemprego referente a 2015 fixou-se em 12,5%, após de no
ano de 2013 ter atingido o pico de 16,2% (Pordata, 2016). Para melhor leitura dos valores, cumpre recordar
que a taxa apenas calcula os desempregados registados no centro de emprego, o que se revela um
número inferior aos desempregados “reais.”
11
A taxa, no ano de 2014, fixou-se nos 10,4% (Pordata, 2015).
12
O autor analisa a “garantia jovem”, aposta das políticas europeias, apontado que o financiamento aos
programas dessas políticas deve ser proporcional à escala do problema (p. 133).
população ativa a fazer descontos, por outro, o que vai aliviar, num cenário ideal mas
possível, a carga fiscal que recai sobre o contribuinte e reforçar a sustentabilidade dos
sistemas de segurança social.
Ora, para definir da melhor forma possível as políticas a aplicar, cumpre partir
de dados estatísticos rigorosos. No que concerne ao nosso tema, a estatística foca-se
na taxa de desemprego. Todavia, a mesma pode não corresponder aos reais números.
Assim, numa tentativa que encontrar uma estatística mais rigorosa, recorta-se da
população jovem os NEET.
A Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho
(EUROFOUND) tem como missão “contribuir para a conceção e o estabelecimento de
melhores condições de vida e de trabalho através de uma ação com vista a desenvolver
e difundir os conhecimentos que permitam facilitar tal evolução.”13 De acordo com o
seu Relatório, no ano de 2011, a União Europeia apresenta uma taxa de NEETs de
15,4% entre a população de 15 e 29 anos. Em Portugal, a taxa é de 14%, sendo o caso
mais preocupante, a nível comunitário, o da Bulgária (24,6%).14
13
Regulamento (CEE) nº 1365/75 do Conselho, de 26 de maio de 1975, relativo à criação de uma Fundação
Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho, entretanto modificado pelos
Regulamentos (CEE) n.º 1947/93, de 26 de julho, n.º 1649/2003, de 1 de outubro e n.º 1111/2005, de 4 de
agosto. Trata-se de um órgão tripartido que, no exercício das suas funções, “avalia e analisa as condições
de vida e de trabalho, dá pareceres autorizados e conselhos aos responsáveis e principais agentes da
política social, contribui para a melhoria da qualidade de vida e informa sobre as evoluções e as
tendências”.
14
Para uma leitura mais detalhada dos dados do Relatório, vide http://observatorio-das-
desigualdades.cies.iscte.pt/index.jsp?page=news&id=230.
15
Oferecendo uma análise do Acórdão, os fatos subjacentes, o quadro legal invocado e o impato nas
legislações dos ordenamentos jurídicos, vide CHARRO, Pablo, Case C-513/99, Concordia Bus Finland Oy Ab
v. Helsingin kaupunki and HKL-Bussiliikenne, Judgement of the Full Court of 17 September 2002, in
Common Market Law Review, nº 40, Kluwer Law International, Holanda, 2003, pp. 179-191. Perspetivando o
mercado ao serviço do Ambiente, através da aceitação de critérios verdes na contratação pública, vide
KUNZLIK, Peter, Making the Market Work for the Environment: Acceptance of (Some) „Green‟ Contract
Award Criteria in Public Procurement, in Journal of Environmental Law, Vol. 15, nº 2, Oxford University
Press, Inglaterra, 2003, pp. 175-201. Por sua vez, colocando frente a frente os setores público e privado
face aos desafios ambientais, deixando importantes notas para os desenvolvimentos que vieram a suceder-
lhe, o estudo seguinte: NEW, Steve, GREEN, Ken e MORTON, Barbara, An analysis of private versus public
sector: responses to the environmental challenges of the suplly chain, in Journal of Public Procurement, Vol.
2, nº 1, 2002, pp. 93-105. (http://ippa.org/jopp/download/vol2/issue-1/NewGreen.pdf)
16
Para uma visão geral sobre os contornos, desafios e objetivos da mesma, vide: PORTO, Manuel, A
Estratégia Europa 20-20: visando um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo, in CORREIA, Fernando
Alves, MACHADO e Jónatas, LOUREIRO, João Carlos, Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor José Joaquim
Gomes Canotilho, Vol. IV, Coimbra Editora, Coimbra, 2012, pp. 549 a 569. O autor conclui que a Estratégia
visa contribuir para o futuro colectivo. Preocupa-se com a defesa e promoção da competitividade,
depositando expectativas elevadas na iniciativa empresarial, a par da existência de uma intervenção
pública considerada indispensável.
Para uma análise centrada no Modelo Social Europeu, os desafios que enfrenta e as propostas à sua
reforma, num contexto marcado (também) pela Estratégia Europa 2020, vide MARQUES, Paulo, Entre a
Estratégia de Lisboa e a Europa 2020 – Para onde caminha o Modelo Social Europeu?, Editora Princípia,
Cascais, setembro de 2011. A obra resulta da Dissertação de Mestrado em Economia e Políticas Públicas
defendida no final de 2010, pelo Autor, no Instituto Universitário de Lisboa.
No sentido de uma resenha sobre o contexto da Europa 2020, da Estratégia de Lisboa e do balanço
possível até então, vide SILVA, António Martins da, História da Unificação Europeia – A integração
comunitária (1945-2010), Imprensa da Universidade de Coimbra, Coimbra, 2010, pg. 313 e sgs.
17
O Sétimo Programa de Ação da União Europeia em matéria de Ambiente – “Viver bem, dentro das
limitações do nosso planeta”, aprovado pela Decisão 1386/2013/UE. Pretende dar continuidade ao
trabalho de orientação do desenvolvimento da política ambiental europeia. Com vista a combater tanto os
estilos de consumo e produção insustentáveis como as alterações climáticas e a perda de biodiversidade,
bem como de qualidade da saúde humana e ambiental, o 7º Programa propugna pela adesão completa e
profícua de todos os Estados - Membros e dos seus cidadãos (conforme o nº 2 do artigo 3º). Nos termos
do nº 1, qualquer ação emergente deste Programa será levada a cabo tendo em consideração os princípios
da subsidiariedade e da proporcionalidade, de acordo com o artigo 5º do TUE.
5. AS DIRECTIVAS EUROPEIAS
18
A saber, as Directivas seguintes: 92/50 (serviços); 93/36/CEE (fornecimentos); 93/37/CEE (empreitadas);
93/38/CEE (setores especiais: água, energia, transporte e telecomunicações); 89/665/CEE e 92/13/CEE
(recursos).
19
Tal como a autora explica, as entidades locais subtraem-se, pelo baixo valor dos seus contratos, à
aplicação das Directivas. Não obstante, a inclusão de considerações ambientais deriva do próprio Tratado
(de Lisboa), pelo que não carece de legitimação e deve obedecer aos princípios europeus e nacionais
vigentes.
20 Imaginemos a seguinte situação: para o fornecimento de lâmpadas, a proposta A é mais cara que a
proposta B, mas tem a especificidade de prever o uso de lâmpadas energéticas. Atendendo a critérios
económicos e ambientais, os quais devem estar devidamente publicitados no início do concurso, é possível
calcular a proposta A como a economicamente mais vantajosa.
21
http://www.eipa.eu/en/pages/show/&tid=44 – o sítio disponibiliza todos os documentos que fizeram
parte integrante do processo de revisão das Diretivas de 2004, na língua inglesa, bem como outra
legislação relevante no setor. Neste sentido, Estorninho, Maria João, Curso de Direito dos Contratos Públicos
– Por uma contratação pública sustentável, Almedina, Coimbra, novembro de 2012, pp. 111 a 158.
22
Utilizaremos a Versão Oficial em Língua Portuguesa publicada no Jornal Oficial da União Europeia L 94,
57º ano, 28 de março de 2014. Por assumir um carácter geral, centraremos as atenções na Diretiva
2014/24, pelo que as remissões apresentadas neste ponto devem ser entendidas no contexto dessa
Diretiva. A referência a outros atos normativos será devidamente identificada em momento próprio.
referência surpreendente. Esta alínea prevê, como um dos dois critérios de adjudicação,
«o preço mais baixo». Ora, os diversos pareceres que se sucederam foram quase
unânimes quanto à retirada deste critério, em prol da «proposta economicamente mais
vantajosa.»23
Verificaram-se duas exceções. A Comissão da Indústria, da Investigação e da
Energia não procede a alguma alteração, embora reconheçamos no seu Parecer um
forte indício de sustentabilidade: de facto, procura incluir nas suas alterações
considerações sociais, que se reportam, principalmente, à condição dos trabalhadores e
ao processo de produção (por exemplo, usar a sustentabilidade social do processo de
produção como critério para aferir a proposta economicamente mais vantajosa). Por
seu lado, a Comissão para o Desenvolvimento Regional admite a existência dos dois
critérios, embora estabeleça que a «proposta economicamente mais vantajosa» deva
prevalecer. O critério do «preço mais baixo» deve ser invocado quando hajam “boas
razões para assim proceder”.24
A revogação tem efeitos a partir do dia 18 de abril de 2016 (art.º 91.º). Na
mesma data devem os Estados-membros pôr em vigor as disposições legislativas,
regulamentares e administrativas necessárias ao cumprimento das Diretivas (n.º1 do
art.º 90.º). Ambas entram em vigor no vigésimo dia seguinte ao da sua publicação no
JOUE (art.º 93.º).25
Por último, destacamos as três mudanças que representam a reforma a que o
regime europeu fica sujeito com estas Diretivas, o que resulta numa modernização há
23
Relativamente à Diretiva 2004/17, temos a COM (2011) 895 final. Deitamos um olhar atento ao “Relatório
sobre a proposta de Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos Contratos Públicos”,
disponível em: http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?type=REPORT&reference=A7-2013-
0007&format=XML&language=PT. Assume uma importância fulcral, pois reúne os diversos Pareceres, os
quais, por sua vez, deram um contributo indispensável para a edificação das Novas Diretivas.
Para uma análise aturada destas propostas, vide PEREIRA, Pedro Matias e FRANCO, João Soares, A
adjudicação de Contratos Públicos em contexto de crise, in Revista de Contratos Públicos, n.º5, CEDIPRE,
Coimbra, 2012, pp. 143 a 165; também, ESTORNINHO, Maria João, idem, 2012, pgs. 307 a 310.
24
Apesar disso, uma proposta de alteração insuficiente: encara a proposta economicamente mais
vantajosa como um meio de alcançar a “melhor e mais vantajosa proposta em termos económicos e socais
e assegurar uma melhor relação qualidade/preço”. Ausentes estão, portanto, considerações de índole
ambiental (conforme as pgs. 422 e 423 do Relatório mencionado na nota de rodapé anterior).
25
Prevendo os mesmos prazos: arts. 51º e 54º da Diretiva 2014/23 e 106º, 107º e 109º da Diretiva 2014/25.
A crítica principal às Diretivas de 2004, nesta matéria, aponta que estas indicam
«o que» fazer, os fins a alcançar, mas pouco ou nada dizem acerca do «como», dos
meios para alcançar esses objetivos. As Diretivas de 2014 tentam colmatar essa falha.
Cumpre recordar que a consideração de políticas secundárias pode ser
introduzida numa, ou em todas, de três fases: formação do contrato, momento de
adjudicação e execução do contrato já adjudicado. Veremos, de seguida, como é que
as Novas Diretivas enxertaram as políticas secundárias.
O preço mais baixo deixa de ser o fator decisivo na adjudicação do contrato
(considerandos 89 e 90 e artigo 67.º da Diretiva 2014/24, bem como os considerandos
94 e 95 e o art.º 82.º da Diretiva 2014/25). As entidades adjudicantes conhecem agora
maior liberdade, devidamente regulamentada, para a inclusão de critérios ambientais e
sociais nas suas especificações de contratações públicas, ao lhes ser incitada a
adjudicação à proposta economicamente mais vantajosa.
A proposta economicamente mais vantajosa pode ser identificada com base no
preço ou custo, através de uma abordagem de custo-eficácia, como os custos do ciclo
de vida, e pode incluir a melhor relação qualidade/preço. Esta deve ser avaliada com
base em critérios que incluam aspetos qualitativos, ambientais e/ou sociais ligados ao
objeto do contrato público (n.º2 do art.º 67.º).
Existe a possibilidade de as entidades adjudicantes serem impedidas de utilizar
o preço ou o custo como único critério de adjudicação, ou ver restringida essa
26
As Diretivas encontravam-se em gestação desde abril de 2010. Tal como podemos ler no considerando 2
da Diretiva 2014/24, as Diretivas de 2004 careciam de uma revisão e modernização que permitissem
aumentar a eficiência da despesa pública, facilitar a participação das pequenas e médias empresas na
contratação pública e permitisse uma melhor utilização desta no âmbito das políticas horizontais ou
secundárias. De outro tanto modo, esta modernização responde à necessidade de noções e conceitos
básicos claros, que garantam a segurança jurídica.
6. O HANDBOOK EUROPEU
27
A Diretiva de 2014/24 contém outras referências relativas às considerações de cariz social: vejam-se os
considerandos 92, 93, 97 e 99. No considerando 96, alerta-se para a necessidade de criar uma metodologia
comum para o cálculo dos custos sociais do ciclo de vida.
28
http://ec.europa.eu/social/main.jsp?catId=738&langId=en&pubId=606&furtherPubs=yes - podemos
colher aqui uma definição de CPSR como os procedimentos concursais que têm em consideração uma ou
mais das seguintes considerações sociais: oportunidades de emprego, emprego decente, adesão
(compliance) a direitos sociais e laborais, inclusão social, oportunidades iguais, design de acessibilidade
para todos, incluindo desafios da troca ética e adesão voluntária a responsabilidade corporativa social, no
respeito pelos princípios presentes no TFUE e nas Diretivas de 2004 (pg. 7., tradução livre).
29
In Livro Branco sobre as compras públicas ecológicas, idem, pg. 11. No âmbito da jurisprudência
europeia, destacamos os Acórdãos: Ac.Viking, proc. C-438/05, de 11 de dezembro de 2007, Coletânea
2007, mormente o parágrafo 79 (na medida em que esclarece que a Comunidade tem tanto uma
finalidade económica como social); Ac. Ruffert, proc. C-346/06, de 3 de abril de 2008, Coletânea 2008, que
reafirma o entendimento do Ac. Viking. Para uma resenha sobre ambos vide RODRIGUES, Nuno Cunha,
idem, 2013, pp. 283-291.
8. CONCLUSÃO
preenchido por jovens NEET. Outro exemplo, pode consistir em prever que a empresa
que venha a produzir e entregar o bem coloque, no âmbito de recrutamento, os
estagiários ao abrigo de um contrato de trabalho, colocando-os numa posição jurídico-
laboral (e pessoal) mais garantística e conforme aos direitos dos mesmos.
A aposta nos jovens NEET é uma aposta no futuro. A jusante, permite
salvaguardar os regimes de segurança social e garantir saídas profissionais a uma
população que, face a ausência de emprego ou de progressão na carreira, se vê forçada
a emigrar, o que empobrece o país – de forma direta, pela ausência de quadros
qualificados e, logo, perda de competitividade; de forma indireta, pelo inverter da
pirâmide demográfica, com todas consequências associadas. A montante, permite
desenvolver uma economia competitiva e virada para o futuro, adaptada à (nova)
realidade laboral da sociedade global e globalizante em que vivemos.
Tanto no campo ambiental como no social, uma lógica de pensamento a médio e
longo prazo é indispensável. O verdadeiro interesse que deve fundamentar qualquer
atuação política e legislativa é o da prossecução de um modelo de desenvolvimento
económico sustentável, que tenha como traves-mestras a preservação do ambiente e o
aumento do bem-estar dos cidadãos.
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196.
RESUMO
O presente artigo pretende demonstrar os benefícios jurídicos, sociais e políticos que a implementação
adequada da teoria da interconstitucionalidade pode originar dentro do sistema legal da União Europeia,
bem como o seu contributo para a formação de uma identidade europeia. Em breves palavras, o artigo
credível para a construção da União Europeia, segundo Gomes Canotilho. Além disso, apresenta as
vantagens que a interconstitucionalidade pode acrescentar em termos jurídicos, assim como uma reflexão
europeia. Por último, mas não menos importante, o artigo pretende abordar a problemática da
interconstitucionalidade no aumento do padrão de proteção dos direitos fundamentais para os
Fundamentais.
ABSTRACT
Interconstitutionality as a propellant system of a European identity. This research paper aims to demonstrate
the legal, social and political benefits that the proper implementation of interconstitutionality theory may
cause within the legal system of the European Union as well as their contribution to the European identity
formation. Briefly, the article discusses the key features that make the theory of interconstitutionality a
credible alternative to the construction of European Union, according to Gomes Canotilho. It also presents
the advantages that interconstitutionality can add in legal terms, also as a reflection of the term nation-
state and the necessary change in the interpretation of the "static" concept of European citizenship. Last
but not least, the article seeks to address the problem of interconstitutionality in increasing the standard of
protection of fundamental rights for the domestic legal systems of member states.
_________________________________________________________________________________________________________________
1. INTRODUÇÃO
económica e monetária foi o motivo chave que levou os vários líderes europeus a
elaborarem uma nova estratégia europeia e continuarem o aprofundamento da
organização, e assim surgiu o Tratado Constitucional. Curiosamente, o entusiasmo
inicial dos líderes europeus facilmente colidiu com o ceticismo do povo francês e
holandês, dois países fundadores da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço. Mais
do que nunca, a União Europeia precisa de encontrar novas respostas para os atuais
desafios económicos, sociais e institucionais que tendem a desagregar a ideia de
unidade europeia original de Jean Monnet e Robert Schuman. A União Europeia é
constituída por vinte e oito constituições compostas por diferentes princípios, normas
ou organismos que, por vezes, em nada são semelhantes. Não obstante, uma nova
corrente doutrinária de prestigiados constitucionalistas europeus, como Gomes
Canotilho, divulgaram uma nova teoria, que pretende aumentar o entrosamento
institucional e democrático dos sistemas políticos nacionais baseado numa espécie de
rede multinível de constituições nacionais – a interconstitucionalidade. Este trabalho
pretende questionar se será a interconstitucionalidade um sistema à altura dos desafios
contemporâneos europeus. De que forma a interconstitucionalidade pode contribuir
para a criação da tão desejada identidade europeia?
Como ainda não existe uma Constituição com características europeias torna-se
por vezes difícil estabelecer as devidas conexões funcionais entre a União Europeia e os
respetivos Estados-membros. Desde o início da organização internacional que o
conflito entre o direito interno e o direito europeu é cada vez mais evidente. O Tribunal
de Justiça da União Europeia tem tido um papel preponderante e inovador com a
interpretação das normas da legislação europeia e o assegurar do normal cumprimento
das mesmas. Todavia, os Tratados e os atos legislativos europeus tornaram os sistemas
dos Estados-membros obsoletos e cada vez menos responsivos aos constantes desafios
que a eles são imputados.
2. A TEORIA DA INTERCONSTITUCIONALIDADE
(Canotilho, 2012, pp. 265 e ss.). Em Portugal, esta teoria foi inicialmente introduzida por
F. Lucas Pires em 1998. A referida teoria pretende enfrentar o problema da articulação
entre os poderes constituintes com fontes e legitimidades diversas e, desta forma,
organizacional das próprias. Segundo Gomes Canotilho, a rede formada por normas
independência, hierarquia das normas, etc.), mas não dissolve na rede os traços
principais das formatações constitutivas dos Estados-membros.
interorganizatividade.
saber se este tato hermenêutico passa pelo recurso a um renovado formalismo jurídico
Segundo Konrad Hesse, a história passou por cima dos fundamentos que se
compunham como partes constitutivas da doutrina do Estado e da Constituição (ibid.,
p. 283). O exemplo mais recente incide sobre a reflexão da necessidade de existir uma
p.283)
As palavras supra aludidas de Konrad Hesse são um bom ponto de partida para
o entendimento da necessidade de uma nova conceção constitucional europeia. Na sua
investigação, Gonçal Mayos (Mayos, 2015, p.1) refere as mesmas preocupações
mencionadas por Konrad Hesse. De acordo com o mesmo, numa era globalizada como
a que vivemos atualmente, as sociedades geram inúmeros e profundos fenómenos
“inter”, os quais despertam características complexas, definitivas e causadoras de novos
riscos e conflitos). Cada vez mais se tem notado o aparecimento de fenómenos
antagónicos na sociedade europeia desenvolvidos por diferentes tipos de “inter”
relações. Estas têm-se tornado numa espécie de processos permanentes nas
sociedades globalizadas que continuarão a crescer a médio prazo.
O progressivo aumento dos fenómenos globais tem trazido problemas
acrescidos tanto aos Estados-membros como à própria União Europeia que não tem
conseguido dar as melhores respostas, em parte graças ao sistema político implantado
na União Europeia e à atitude conservadora e excessivamente protecionista de alguns
Estados-membros no que diz respeito à sua soberania. Sobre este assunto, Lucas Pires
refere que as fronteiras nacionais são incapazes de corresponder às necessidades
exigidas pelo “cidadão moderno” (Pires, 1997, p. 67). O motivo para a crescente
desvalorização do conceito de Estado-Nação está nesta crescente interdependência
regional. Este fluxo global coloca sérios entraves a tradicional resolução de questões
básicas da teoria, e principalmente, da prática democrática (Held, 1995, pp. 16-17).
Desta forma consegue-se perceber que o próprio conceito que tradicionalmente
legitima a soberania - Estado-Nação - mostra-se desadequado para enfrentar os
desafios contemporâneos. Consequentemente, David Held expõe o seu pensamento
sobre a incapacidade deste conceito em controlar a repercussão de políticas externas
dentro dos seus domínios tendo que recorrer a novas formas de controlo constitucional
para legitimar internamente os respetivos processos de decisão. Mas David Held vai
mais longe e admite que atualmente é evidente que os Estados-Nação nunca
satisfizeram totalmente os ideais constitucionais de representação e participação
democrática (ibid., p. 224).
Constituição que os Estados utilizam para protegerem a sua soberania, o seu território
são uma resposta natural às políticas europeias que as respetivas constituições não
conseguem dar a melhor resposta, se agirem de uma forma isolada. Para além disso, a
União Europeia não é formada, nem tem o objetivo de ser constituída por vinte e oito
europeia, o que se revela ainda mais preocupante uma vez que o projeto europeu é
pensado essencialmente para os próprios. No que diz respeito aos assuntos políticos,
os cidadãos costumam estar envoltos de uma inércia e um desinteresse preocupante,
mas o problema fica ainda pior quando está relacionado com assuntos europeus como
podemos verificar nas taxas de abstenção das eleições europeias. Curiosamente,
(Martins da Silva, 2010, p. 282). A negação por parte dos respetivos povos traz uma
agravante devido ao simbolismo que estes países representam para a UE já que foram
al., 2013, p. 482). Estas palavras levam ao entendimento de que é necessário abordar o
tema constitucional por uma perspetiva que esteja ligada mais diretamente aos
cidadãos e deixando para segundo plano qualquer estratégia europeia que passe pelo
aos desafios do nosso tempo (Silveira, 2015, p. 7). Precisamente neste ponto, a lógica
migratórios: pelo facto do cidadão europeu poder circular livremente pelo espaço
Schengen e não ser “prisioneiro” da sua comunidade política, ele tem o privilégio de
usufruir de direitos na sua comunidade original e outros demais direitos (de uma forma
limitada) na outra comunidade que o próprio está inserido. A título de exemplo, podem
ser considerados o seu direito de residência, o direito à segurança social dessa
Por isso urge a necessidade de encontrar uma resposta mais pertinente para
forma cria-se esta espécie de “democracia plural” como refere Miguel Poiares Maduro e
conduz para uma diferente legitimidade dos textos constitucionais nacionais uma vez
que estes seriam apoiados pelo efeito direto proveniente dos cidadãos de cada estado-
membro.
proteger os seus direitos conferidos através das disposições dos Tratados Institutivos
ou de algum acto vinculativo europeu, e que de alguma forma foram lesados por
algum Estado-membro. Assim, os particulares podem recorrer a qualquer órgão
das normas e princípios dos Tratados europeus, também não é menos verdade que o
Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) e todos os tribunais comunitários
concreto.
TJUE é importante salientar para o estudo do tema tudo o que envolve o tema da
cidadania europeia. De salientar também que a cidadania europeia tem uma noção
uma série de direitos que caracterizam essa pessoa como sujeito da respetiva
membros, que ostenta um aspeto mais reservado e limitado dos direitos conferidos a
pessoas singulares e coletivas dessa comunidade, a cidadania europeia vem agraciar os
indivíduos que residem fora da sua comunidade política nacional com direitos
TUE. O acórdão Zambrano é um marco importante pois foi a partir deste acórdão que
não têm nenhuma atividade económica nem qualquer hipótese de o exercer. Segundo
o TJUE:
na defesa dos seus direitos pelo próprio TJUE, que se tem pronunciado, em certos
acórdãos, de uma forma diferente face ao passado. De uma forma bastante sucinta, no
seus respetivos filhos. O facto do senhor Dano não beneficiar do direito de residência
desse Estado-membro de acolhimento, conjuntamente com o facto de não exercer
nenhuma atividade profissional foi o suficiente para o TJUE indeferir o pedido. Sobre
pela respetiva contribuição sob o risco do montante total das prestações sociais não
ao caso supra aludido, a analogia entre o cidadão europeu que está no Estado-membro
revela-se injusta. De certa forma, a decisão do TJUE significa uma limitação à prática da
livre circulação de pessoas e do direito de permanência nos territórios de um Estado-
membro, tal como está consagrado no artigo 20º nº2 do TFUE, pois o critério original
Por esta e outras razões, Alessandra Silveira, Pedro Froufe e Mariana Canotilho
alertam para a urgência de contornar aquilo que os próprios referem como um
conceito “estático de cidadania europeia” (Canotilho et al., 2013, p. 483). Num contexto
cidadania para outros patamares, uma vez que dá a oportunidade aos próprios de
poderem usufruir e defender os seus direitos independentemente do lugar onde estão
inseridos na Europa. Esta “nova” cidadania é baseada nos princípios democráticos e
naquilo que Miguel Poiares Maduro designa como “pluralidade de nacionalidades”
Hugo. Um novo conceito, com novos direitos e novas responsabilidades, que sejam
reguladas pelo direito europeu e pela Carta dos direitos fundamentais da União
Europeia.
referem que uma das formas de evitar o distanciamento insuportável entre o conceito
estático de cidadão europeu e o próprio cidadão europeu está na salvaguarda do
padrão mais elevado de proteção dos direitos fundamentais nos tribunais comunitários
dos Estados-membros, que os próprios cidadãos são responsáveis (ibid., p. 483).
Carta dos Direitos Fundamentais ganhou força vinculativa e passou a ser considerada
princípios gerais como direito da União Europeia. Por força do artigo 6º do TUE, surge a
necessidade de transformar os valores e os direitos fundamentais de diversas fontes: os
tratados constitutivos e a CDFUE para normas europeias e as constituições e os
mesmos tratados para normas nacionais. O primeiro caso onde o TJUE deixou claro que
proteção dos direitos fundamentais garantido pela sua Constituição, quando este é mais
elevado do que o que decorre da Carta, e a opô-lo, se for caso disso, à aplicação de
artigo 53º da CDFUE seria aplicável nos casos em que existam, no mínimo, dois regimes
jurídicos nacionais relativos àquele direito fundamental em que, no final, será aplicado
o regime jurídico que conceda maior proteção ao respetivo indivíduo. Desta forma, a
relação entre cidadania europeia e os direitos fundamentais ainda não foi devidamente
justificada dentro do contexto da União Europeia. A razão para a conclusão supra
mencionada relaciona-se com o facto da definição de cidadania europeia ainda não ser
fluída o suficiente para abranger toda a população da União Europeia e continuar a ser
nacionais de países terceiros não são abrangidos pela salvaguarda desses direitos
fundamentais, o que cria uma falta de universalidade que torna a cidadania europeia e
os direitos fundamentais em duas categorias distintas (Canotilho et al., 2013, p. 483).
5. CONCLUSÃO
Alguns críticos afirmam que a União Europeia apenas manteve uma imagem de
unidade até estar diante dos primeiros grandes desafios desde a sua origem. De facto,
é a primeira vez em sessenta anos que a União Europeia enfrenta crises mais
problemáticas que as sucessivas crises políticas que sofreu até aos dias de hoje. A
mutação da natureza dos desafios europeus é o resultado do sucesso das políticas
seu cariz essencialmente político para se afirmar dentro dos territórios dos Estados-
finalidade pretendida.
cidadão europeu. Por isso, além das conhecidas crises económicas e crises humanitárias
que teimam em permanecer nas fronteiras da União Europeia inclui-se também uma
crise de identidade por toda a Europa: uma crise de identidade nas instituições da UE,
uma vez que estas se encontram à deriva e subjugadas aos interesses dos Estados
integrantes; uma crise de identidade dos Estados-membros pela teimosia em
europeístas; e, por fim, crise de identidade dos cidadãos que começam a perder a
confiança que a UE poderá ser a solução para os problemas que os afeta diariamente.
europeus. A União Europeia encontra-se sob uma avaliação constante dos cidadãos
europeus nos dias de hoje, o que pode levar a que uma ação impopular emanada por
uma instituição europeia possa ser mal compreendida pelos cidadãos europeus.
para outro nível, que deve passar por uma reforma do Modelo Constitucional europeu.
A complexidade e conjuntura dos problemas que a União Europeia enfrenta atualmente
precisa de uma ação conjunta e unânime de todos os Estados-membros. Infelizmente,
tal não se verifica nos dias de hoje, apesar da progressiva integração europeia ter
apresenta-se como a solução ideal uma vez que explora toda a vertente protecionista
das constituições nacionais através dos direitos fundamentais dos cidadãos europeus.
considere que o alto padrão de proteção dos direitos fundamentais não seria possível
de aplicar uma vez que consideram que existem regimes jurídicos incomparáveis no
que diz respeito aos níveis de proteção, em parte considerados como refletores da
identidade e cultura de um Estado-membro. Por outro lado, Alessandra Silveira refere
que tais argumentos só podem ser levados em conta se os ordenamentos jurídicos não
que é pretendida para consolidar a União Europeia, contudo existem dúvidas no que
Europeia. Joseph Weiler é da opinião de que a União Europeia criou um novo modelo
de federalismo, baseado na tolerância constitucional, onde os próprios Estados-
membros se submetem voluntariamente às esferas das competências da União (ibid., p.
25). Porém, essa tolerância constitucional, tal como intitula Joseph Weiler, rapidamente
se torna em intransigência quando algum país dos EM se depara com a mais pequena
adversidade ou não pretende perder o controlo de algum sector onde o próprio seja
soberano.
Cada vez mais, a União Europeia afigura-se como um caldeirão democrático que
se vê obrigada a aceitar as legítimas vontades dos seus cidadãos e a dialogar com
governos nacionais que vão desde a extrema-esquerda até à extrema-direita. No meio
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SOBREVIVÊNCIA COMUM
MICAEL SOUSA1
RESUMO
O nacionalismo está carregado de uma forte conotação negativa – exemplos históricos são imensos,
dos povos e conseguiram criar coesão e os meios necessários para projetos coletivos importantes. A União
Europeia atravessa uma crise de identidade e coesão. O desenvolvimento de um pan-nacionalismo que
assente num modelo de multiculturalismo, tolerância e democracia poderia contribuir para a necessária
coesão para este projeto coletivo. Será necessário encontrar os pontos de contacto, usando a eficácia dos
nacionalismos do passado, mas evitando os seus efeitos negativos. Mais do que surgir uma nova
ABSTRACT
Democratic Nationalism for the European Union: a pragmatic need for the common development and
survival. Nationalism have a strong negative connotation, historical examples are immense, especially in
the European history. However, nationalism contributed to the self-determination and managed to create
cohesion and the means to valuable collective projects. The European Union is going through an identity
crisis and lack of cohesion. The development of a pan-nationalism based on a multiculturalist model,
tolerance and democracy could contribute to the necessary cohesion to the European collective project. It
will be imperative to find the proximity links, using the effectiveness that nationalism proved to achieve,
but avoiding its negative effects. More than generating a new identity from the multiculturalism, the
multicultural nationalism may arise from the contribution of these different parts, without the loss of the
different cultural identity. Thus, it could emerge a European pan-nationalism, orientated to quality of life
and the development of the European Union, without losing freedom and the different European cultures.
_________________________________________________________________________________________________________________
1. INTRODUÇÃO
partindo da soma coincidente dos vários nacionalismo que a constituem, pois para
haver uma união efetiva há forçosamente pontos comuns entre os vários Estados. Caso
contrário, a união seria completamente anacrónica. Poderá ser então esse aspeto que
falta reforçar na atual União Europeia: um sentido de unidade e partilha concretizado
num nacionalismo democrático europeu, capaz de ser um elemento ideológico e
cultural agregador do desenvolvimento das comunidades, fomentando do espírito de
cooperação e aceitação da diferença para propósitos comuns.
base democrática, poderá ser o contraponto para esvaziar as ameaças dos crescentes
movimentos nacionalistas extremistas, anti-europeus, e fomentar o fator de união
cívica europeia.
Modernistas como Ernst Gellner e Michel Mann, mas mais ainda Eric Hobsbawm
e Patrick Geary, tendem a defender que o nacionalismo surge primeiro dos Estados
politicamente instituídos ou em fase de construção, ou seja: é premeditado e orientado
para fins políticos e de governação. Por outro lado Anthony Smith mais timidamente,
mas depois Josep Llobera, Adrian Hastings e outros mais contundentes, defendem uma
versão em que o nascimento do nacionalismo se associa mais a origens étnicas que a
premeditações económicas e políticas. A vertente étnica, com forte relação com a
cultua, a língua e as tradições e organizações sociais mais antigas, diverge, por
natureza, da versão modernista.
Apesar das duas inclinações divergentes, dificilmente alguma delas poderá
assumir uma dimensão universalista. Dos casos concretos reais dos nacionalismos que
conhecemos da história da humanidade, quase sempre, surgiram de uma mescla, mais
ou menos pronunciada, tando do princípio utilitário do Estado como da genuína
vontade étnica de união e autogoverno. É quase impossível haver algum tipo de
nacionalismo a surgir de um modo absoluto fruto somente por via da tendência
modernista ou étnica. A opção mais razoável é a conjugação de ambas.
A origem dos nacionalismos contemporâneos terá então uma componente
“modernista”, proveniente de um objetivo planeado; e uma componente étnica surgida
da cultura e história das próprias sociedades e comunidades.
Desse modo, caso se pretenda fomentar o nacionalismo, ou o pan-nacionalismo para o
caso da União Europeia, o seu sucesso será também o resultado de uma mescla de
criação nova orientada e do reforço das existências e aproximações étnicas.
governantes o tenham tentando recriar à sua maneira. A União Europeia, com o tratado
de Roma de 1950 não escapou também a essa influência.
No início da época moderna, por volta do século XVI, quebrou-se a unidade
religiosa europeia, mas surgiu o prenúncio de outro tipo de unidade: o capitalismo,
ainda que a várias velocidades e em níveis de desenvolvimento contínuos para os
vários Estados. Com o desenvolvimento do capitalismo, depois da queda dos
protecionismos dos Estados mercantilistas, por volta de finais do século XVIII, surge
uma crescente busca pelo liberalismo geral, que reforçou o individualismo, mas não só.
Contribuiu também para a emancipação de grupos culturais em nacionalismos. Uns
tinham mais fundamento étnico que outros, uns foram mais forçados pelos interesses
geopolíticos e económicos, outros pelas aspirações coletivas daqueles que partilhavam
culturas comuns facilmente identificáveis. Esses movimentos de emancipação coletiva
beberam muito do crescente reforço liberal que se tornou movimento democratizante,
ainda que tenham existido exceções na Europa. Fosse como fosse, as inspirações na
antiguidade clássica greco-latina, de nações compostas de cidadãos, que em alguns
casos era aprofundada até ao seu desenvolvimento último em democracia plena,
criaram e fundaram um princípio comum, quer fosse herdado diretamente ou adotado:
a cidadania.
O nacionalismo europeu assumiu uma vertente democratizante inicialmente,
mas depois, durante a primeira e segunda guerra mundial, sob a égide dos
nacionalismos expansionistas e extremistas, potenciou-se a intolerância e a violência,
ainda mais agravadas pelas novas possibilidades tecnológicas, até uma escala nunca
vista.
Como resposta ao cataclismo das guerras mundiais – para que a europa nunca
mais fosse o palco de tais eventos - foi alicerçado, a partir dos anos 50 do século XX,
um projeto europeu de unidade. Enquanto as memórias das guerras estavam vivas, e
pairava a Guerra Fria alimentando receios da repetição do passado, a construção da
unidade europeia, assente nos princípios democráticos e da cidadania, foi facilitada.
Foram os próprios aliados Norte Americanos que exigiram, para a aplicação do Plano
Marshall, uma unidade na Europa, conscientes da necessidade de força e coesão, um
pouco à semelhança da sua realidade federal que os impulsionou para o primeiro lugar
nas nações até aos dias de hoje.
Mas essa construção não conseguiu reinventar um novo tipo de nacionalismo.
Não surgiu verdadeiramente um pan-nacionalismo europeu que fortalecesse a união
naturalmente, e que partisse e vivesse no imaginário cultural dos cidadãos europeus.
Não se cultivou esse formato superior de nacionalismo, que podia ter sido baseado na
ideologia cívica e democrática para a união. O pan-nacionalismo europeu poderia ter
mantido e preservado os vários nacionalismos dos vários Estados, tal como persistem
os regionalismos dentro desses mesmos Estados, pois a democracia está longe de ser
incompatível com a liberdade e tolerância pela diferença, sendo o sistema político mais
apto e capaz de estabelecer pontos de contacto comuns.
Por isso, hoje, quando os desafios vêm de dentro e de fora, os cidadãos
europeus não respondem em uníssono, e nem os próprios representantes políticos
encontram a coesão que necessitavam para responder às ameaças externas e internas.
Hoje o inimigo é, principalmente, a crise e a própria perda de importância e poder dos
europeus. Lembrando Hobbes, a Europa precisa de ser um Leviatã e todos os europeus
precisam de ter um inimigo contra quem unir forças. Esse inimigo não precisa, nem
deve, de maneira alguma, ser identificado como um outro Estado, Nação ou Federação.
O inimigo é pobreza e a perda de qualidade de vida das populações, a perda de
direitos e liberdades. O cimento dessa união é a democracia, a cidadania para a
melhoria da qualidade de vida dos cidadãos.
conceção original - países que não se enquadravam em nenhum dos dois grandes
blocos. Hoje o mundo é também composto por potências, mas são mais os
concorrentes. Existem muitos Estados-potência que podem ser vistos como blocos
também, especialmente como blocos económicos. Ai se inserem os países emergentes,
a Índia, o Brasil e outros, que vêm equilibrar o poder entre os dois antigos blocos
compostos pelos Estados Unidos da América e pela Rússia, e agora também a China.
Falando em Estados não podemos esquecer outros países, ou unidades políticas, que,
independentemente da sua dimensão geográfica, influenciam a economia mundial e a
geopolítica global. Resta saber se a União Europeia terá a capacidade de manter a
unidade e se desenvolver para poder ombrear com as restantes potências.
De modo a sobreviver, garantindo o nível de vida, preponderância económica e
papel de relevo na política mundial, é do senso comum, e está definido há muito, que
os Estados Europeus terão de saber constituir uma união efetiva e funcional. Mas,
atualmente, vive-se numa época crítica: a União parece vacilar e ser incapaz de dar o
passo seguinte.
Os cidadãos europeus não se sentem tão próximos como era suposto da sua
União, sendo esse afastamento decorrente de razões diferentes em cada Estado ou
região. Não é absoluta a tolerância e empatia entre cidadãos de Estados diferentes.
Provavelmente isto acontece por não se reconhecerem como iguais. A União só será
viável se existir um elo comum entre todos, que incuta igualdade e partilha de valores e
objetivos comuns. Isso, tal como já foi referido, poderia ser conseguido através de um
novo tipo de nacionalismo, imunizado pelo valor da liberdade e democracia, pois essa
é uma característica de base nas sociedades europeias, ou por ligação histórica direta
ou por adoção. A história comprova o sucesso possível dessa intenção. Muitos países
europeus passaram por esse processo com sucesso. Apesar das diferenças regiões,
constituíram-se como nações com uma cultura base comum. O mesmo terá de
acontecer na União. O nacionalismo e a noção de pertença acontece a vários níveis. No
nível superior ficaria o nacionalismo europeu. No nível intermédia a associação a
culturas e espaços Estatais, e depois a regiões, podendo terminar na família ou outro
grupo social de maior proximidade. Tudo isto é possível sem conflitos de
compatibilidade, desde que a base comum seja de facto coerente. Para isso a
democracia, num sentido lato, seria a melhor candidata, sempre associada à liberdade,
em todas as variantes que lhe possamos associar. Tal seria ainda mais benéfico pois
sabe-se que as comunidades que vivem em sistemas democráticos mais aprofundados
tendem a ser as mais desenvolvidas e onde os cidadãos conseguem experimentar
melhor qualidade de vida, isto com base nos estudos recentes de Daron Acemoglu e
James Robinson.
Essa união de ideias base poderá ser a forma de aproximar os cidadãos da
própria U.E., pois se a base desse nacionalismo for a própria democracia europeia
facilmente se garantirá coesão, unidade, liberdade, desenvolvimento e robustez para
enfrentar os desafios do futuro.
9. CONCLUSÃO
O nacionalismo sempre serviu para justificar vários fins, quase sempre políticos.
No caso de um nacionalismo para a União Europeia, um tipo de pan-nacionalismo,
obviamente que terá também objetivos políticos pragmáticos, especialmente porque a
própria U.E. também é uma agregação pragmática de Estados unidos para certos
objetivos. A U.E. surgiu para superar as dificuldades sentidas no contexto da época, no
pós-guerra e início da Guerra Fria. Hoje os problemas que enfrentam os Estados
Europeus são substancialmente diferentes, pois o mundo mudou. Poucas são as
soluções viáveis que não passem pelo aprofundamento da união para ultrapassar os
desafios contemporâneos num mundo globalizado. Para isso é necessário envolver os
cidadãos, construindo e reforçando o sentimento cívico de pertença europeia. A isso
chamo de um novo tipo de nacionalismo: o nacionalismo democrático europeu. Esse
BIBLIOGRAFIA
RESUMO
O presente artigo é baseado numa apresentação com o título “A proteção do Investimento Estrangeiro
pela União Europeia”, proferida no Seminário subordinado ao tema “Dilemas da Globalização”, realizado
no dia 21 de Abril de 2016, na Academia das Ciências, em Lisboa, organizado pela Associação Portuguesa
de Estudos Europeus (APEE), conjuntamente com a Academia das Ciências. Tendo como ponto de partida a
alteração do âmbito da política comercial comum, mediante a inclusão da referência ao “Investimento
Directo Estrangeiro”, na redação dada ao artigo 207º do Tratado sobre o Funcionamento da União
Europeia (TFUE), pelo Tratado de Lisboa, o estudo discorre sobre a aparente edificação de um emergente
Direito do Investimento Estrangeiro da União Europeia. O texto identifica os principais atos aprovados pela
União Europeia (direito derivado, Acordos Internacionais em processo de negociação/conclusão) que terão
permitido regular a articulação entre as competências dos Estados-Membros e as competências da União
Europeia, dando lugar ao surgimento de uma Nova Política Europeia de Proteção do Investimento
Estrangeiro.
Investimento Estrangeiro pela União Europeia” - realizada no dia 21 de abril de 2016, na Academia das
Ciências, Lisboa, no Seminário “Dilemas da Globalização”, organizado conjuntamente pela Associação
Portuguesa de Estudos Europeus (APEE) e pela Academia das Ciências.
Os nossos agradecimentos à APEE pelo gentil e honroso convite para publicar a nossa intervenção na
Revista Análise Europeia, dirigida pela mesma Associação.
2
LLM College of Europe. Mestre em Direito FDL. Assistente convidada no Curso de Estudos Europeus,
Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Lisboa, Portugal. E-mail: luzpalma2011@hotmail.com.
ABSTRACT
The protection of Foreign Investment – A new European policy? This article is based on the presentation “The
protection of Foreign Investment by the European Union” given at the Conference “Globalization’s
Dilemmas” held in Lisbon (on 21 April 2016, in the Science Academy) organized by the Portuguese
Association for European Studies (APEE) and the Science Academy. The changes introduced by the Treaty
of Lisbon concerning the scope of the common commercial policy by the inclusion of a reference to foreign
direct investment (article 207 Treaty on the Functioning of the European Union (TFEU)), claim for the
analysis about the newly shaped Foreign Investment Law by the European Union. This text identifies the
main regulations concerning investment law approved by European institutions, the investment
agreements under negotiation and the main questions involving the division of competences between the
member states and the European Union. This framework reveals the emergence of a foreign investment
Keywords: Common commercial policy, Foreign Direct Investment, Lisbon Treaty, Grandfathering
regulation, Investment agreements.
_________________________________________________________________________________________________________________
3
A presente reflexão encontra a sua raiz no nosso estudo – “A nova Política Europeia de Investimento
Estrangeiro decorrente do Tratado de Lisboa: o Regulamento Grandfathering e a articulação entre a
competência da União Europeia e as competências remanescentes dos Estados-Membros”, in Revista
Internacional de Arbitragem e Conciliação, Almedina, Vol. VIII, 2015, p. 83 a 110.
4 Uma vez que o seu uso é generalizado, usaremos a sigla em inglês BIT (Bilateral Investment Treaty) para
fazer referência aos acordos bilaterais de promoção e proteção recíproca de investimento.
5 Alemanha, China, Suíça e Reino Unido são os 4 maiores signatários de BITS a nível mundial. As listas por
país podem ser consultadas em - unctad.org/en/Pages/DIAE/…/Country-specific-List-of-Bits.aspx.
6 Em 2013, o número de BITs celebrados totalizava 3. 240 dos quais 1.382 celebrados pelos Estados-
Membros com 149 países. Vide, UNCTAD, World Investment Report, 2013, p. 114-128,
(http://unctad.org/en/PublicationsLibrary/wir2013_en.pdf).
7 Khawar Qureshi apresenta a seguinte definição: “What is a BIT? These are Treaty arrangements to provide
foreign investors with a “level playing field” and access to an intern national arbitral tribunal in the event the
host State uses its sovereign power with detrimental effect to the foreign investor”, in “Bilateral Investment
Treaties (BITs): The Essentials”, 2007,
http://www.mcnairchambers.com/media/documents/200810/investmenttreatyessentials_.pdf.
8 No que se refere ao tratamento a dar aos investidores estrangeiros existem Tratados há mais de
duzentos anos: os percursores dos Acordos Bilaterais de proteção dos investimentos foram os Acordos de
“Amizade, Comércio e Navegação”, tendo o primeiro destes sido assinado em 1788 entre os Estados
Unidos e a França.
9
O sistema de resolução de litígios usualmente previsto nos BITs surge estruturado quer numa vertente
inter-estadual, quer numa vertente investidor-Estado, admitindo-se um variado leque de remissões para
tribunais arbitrais de onde sobressai a remissão para o Centro Internacional para a Resolução de
Diferendos relativos a Investimentos (CIRDI em Washington), instituído pela Convenção de Washington, de
1965, sob os auspícios do Banco Mundial.
10 O North American Free Trade Agreement (NAFTA) é um acordo assinado pelo Canadá, México e
Estados Unidos, tendo entrado em vigor em 1994.
11 O TPP é uma zona de comércio livre, em negociação desde Dezembro de 2012, entre a Austrália, Brunei,
Chile, Canadá, Malásia, México, Nova Zelândia, Peru, Singapura, os Estados Unidos e o Vietname. O Japão
expressou também o seu desejo de se juntar às negociações. A Coreia de Sul foi convidada pelos Estados
Unidos mas declinou o pedido.
12 A Associação de Nações do Sudeste Asiático (ANSEA/ASEAN) é uma organização regional de Estados
do sudeste asiático que foi constituída em 8 de agosto de 1967. Foi fundada originalmente pela Tailândia,
Indonésia, Malásia, Singapura e Filipinas. Em 1992, os países participantes decidiram transformá-la em
zona de livre-comércio, a ser implantada gradualmente até 2008. A nível de relações externas, a prioridade
da ASEAN é fomentar o contacto com os países da região Ásia-Pacífico, mas foram também estabelecidos
acordos de cooperação com o Japão, China e Coreia do Sul.
13 Em Junho de 2010, na Comunicação sobre a Política Europeia de Investimento (COM (2010) 343, a
Comissão enumera aqueles que considera os parceiros de valor acrescentado - Canadá, Índia, Singapura,
Mercosul, a curto prazo; China e Rússia a médio prazo. Sobre as negociações em curso pode consultar-se,
http://ec.europa.eu/trade/.
14 A 12 de Fevereiro de 2013, o Presidente Barack Obama convidou a UE para o início de negociações
informais de um Acordo Transatlântico entre os Estados Unidos e a União Europeia (the Transatlantic Trade
and Investment Partnership (TTIP). A 12 de Março, a Comissão apresentou um estudo de impacto sobre o
TTPI (SWD (2013) 69 final, 12.3.2013 e solicitou ao Conselho uma autorização para a abertura formal das
negociações. De acordo com os resultados do estudo, este Acordo UE-EUA será o maior acordo bilateral
alguma vez negociado e poderá implicar um output de cerca de 0.5% da economia anual da UE.
15 http://ec.europa.eu/trade/.
Toda esta rede de acordos em que, por vezes, o mesmo parceiro está presente
em vários acordos de comércio tem sido, expressivamente, designada pela doutrina
dedicada ao estudo do direito do comércio internacional de spaghetti bowls – uma
complexa rede de instrumentos de proteção de investimento que origina
sobreposições e inconsistências16.
16 Vide, UNCTAD, 2012, p. xx. Na doutrina, Richard Baldwin: “Multilaterilising regionalism: spaghetti bowls
as building blocs on the path to global free trade”, Working paper nº 12545,
http://www.nber.org/papers/w12545.
17
Publicado no Jornal Oficial da União Europeia, L 351/40, de 20.12.2012.
18
Uma análise do Regulamento Grandfathering pode ser encontrada no nosso estudo supra citado na nota
3.
19 O artigo 351º do TFUE prevê o seguinte: “As disposições dos Tratados não prejudicam os direitos e
obrigações decorrentes de convenções concluídas antes de 1 de Janeiro de 1958 ou, em relação aos Estados
que aderem à Comunidade, anteriormente à data da respetiva adesão, entre um ou mais Estados-membros,
por um lado, e um ou mais Estados terceiros, por outro.
Na medida em que tais convenções não sejam compatíveis com os Tratados, o Estado ou os Estados-
Membros em causa recorrerão a todos os meios adequados para eliminar as incompatibilidades verificadas.
Caso seja necessário, os Estados-Membros auxiliar-se-ão mutuamente para atingir essa finalidade, adotando,
se for caso disso, uma atitude comum (…) - o sublinhado é nosso. A expressão “... por todos os meios ...”
inclui a denúncia ou revogação do acordo.
20
Em junho de 2013, a Alemanha tinha 136 BITs assinados, dos quais 127 em vigor; ao passo que Portugal
tinha 55 BITs assinados e 41 em vigor.
21
Regulamento (UE) n. ° 912/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de julho de 2014 , que
estabelece um regime de gestão da responsabilidade financeira relacionada com os órgãos jurisdicionais
de resolução de litígios entre os investidores e o Estado, estabelecidos por acordos internacionais em que
a União é parte.
22
Ambos os Regulamentos apresentam como base jurídica apenas o artigo 207º do TFUE. Na medida em
que consideramos que estão em causa não apenas competências exclusivas da UE mas, também,
competências partilhadas (ex. portfolio), a base legal elegida foi, assim o entendemos, insuficiente. Para
uma análise crítica dessa escolha vide o nosso estudo referido na nota 3. Enfatizamos que, a questão
ganhará renovada atenção no caso de o TJUE vir a considerar que o investimento estrangeiro é uma
competência partilhada quando se pronunciar no âmbito do Parecer nº2/2015 (infra). As considerações
que o TJUE vier a tecer em termos de classificação das competências em torno dos diferentes tipos de
investimentos (direto e indireto) serão, mutatis mutandis , transponíveis para o campo do direito derivado.
O investimento direto – enquadrável no âmbito do artigo 207º do TFUE – reporta-se a investimento de
longa duração, aquele que deixa lastro na economia de um país, contrapondo-se ao investimento indireto
(ex. portfolio). Para uma análise dos diferentes tipos de investimento e repercussões ao nível da escolha da
base jurídica, vide o nosso estudo referido na nota 3 e bibliografia aí referida.
23
No caso de o TJUE se pronunciar pela competência mista – que defendemos – a celebração dos Acordos
deverá ser conjunta, i.e., pelo Conselho em nome da UE e pelos Estados-Membros de acordo com os
ditames previstos nas respetivas Constituições. Neste sentido, pronunciou-se em tempos, o Tribunal
Constitucional Alemão quando analisou o Tratado de Lisboa, a 30 de junho de 2009, para. 379, 2 BVE 2/08.
Por fim importa referir que, muito embora a UE tenha evitado proceder à
aprovação de um Modelo de BIT/Acordo de Investimento26, é possível verificar que o
clausulado dos Acordos de Investimento da UE é próximo dos BITs dos Estados-
Membros e, também, próximo entre si27, não nos cabendo, porém, nesta sede,
proceder a uma comparação pormenorizada dos mesmos, deixando, apenas,
assinalado que, na medida em que o processo de celebração de novos Acordos – da UE
e dos Estados-Membros - caminha em paralelo nas duas esferas28 - é possível
identificar os traços principais desse percurso.
Dois traços deixamos, aqui, assinalados e que trespassam o conjunto dos
Acordos de Investimento da Nova Era seja no patamar nacional, seja no patamar da UE
– por um, lado, a consagração do direito de regular dos Estados-Membros em defesa
do interesse público (policy space)29 e, por outro, preocupações acrescidas no que se
refere à jurisdicionalização da forma de resolução de litígios.
24
O que o Professor Félix Ribeiro designou expressivamente de “parcerias esmagadoras” por altura da sua
brilhante intervenção no Seminário “Dilemas da Globalização”, na Academia das Ciências em Lisboa, a 21
de Abril de 2016.
25
Assim, “Analysis of the upcoming modernisation of the trade pillar of the European Union – Mexico
Global Agreement”, Directorate-General for External Policies, Policy Department (Parlamento Europeu,
INTA) , 2016, nota 133, p. 41
26
Vide, Comunicação da Comissão Europeia “Towards a comprehensive European international investment
policy”, COM (2010) 343 final, 7 de julho.
27
Certa doutrina identifica um Modelo invisível de Acordo de Investimento da UE. Assim, M. Bungenberg e
A. Reinisch – “The Anatomy of the (Invisible) EU Model BIT”, The Journal of World Investment and Trade
(2014) 15.
28
Para uma lista dos pedidos de autorização para negociar/celebrar BITs submetidos pelos Estados à
Comissão ao abrigo do Regulamento Grandfathering, consulte-se www.europarl.eu/.../COM-AC_DI.
29
Cogitem-se as disposições relativas às atendíveis justificações em caso de expropriação indireta, por
exemplo, no BIT Nigéria/Áustria (assinado em 8/4/2013) onde se assegura o direito de regular dos Estados
justificado pelo interesse publico, com os Anexo X.11 do CETA e Anexo I do TTIP com o mesmo propósito.
Vide, texto consolidado do CETA, publicado a 26 de setembro de 2014 –
http://trade.ec.europa.eu/doclib/docs/2014/september/tradedoc_152806.pdf e textos propostos para o
5. CONCLUSÃO
36
Ver http://www.europarl.eu/sides/getDoc.do?pubRef
37
Ver http://trade.ec.europa.eu/doclib/docs/2015/september/tradoc_153807.pdf e
http://europa.eu/rapid/press-release_MEMO-15-5652_en.htm.
TFUE, não podendo, atualmente, afirmar-se que se trata de uma competência exclusiva,
muito embora o “mote” para a dinâmica da UE tenha vindo do artigo 207º do TFUE que
regula um campo de exclusividade.
A Política Europeia de Investimento Estrangeiro permanece, por ora, uma
competência partilhada entre a UE e os Estados-Membros – ditando a imposição de
celebração de Acordos Mistos na esfera internacional.
Esta Política só assumirá as vestes de uma política exclusiva quando a palavra “
direto” for suprimida do artigo 207 do TFUE38, o que só poderá suceder pela via de uma
revisão formal dos Tratados, a qual implicará a chancela unânime dos Estados-
Membros.
38
Em alternativa, poder-se-á enveredar pela regulação do investimento estrangeiro em disposição
autónoma, o que, em nosso entender, será mais consentâneo com a autonomização da Política de
Investimento Estrangeiro da UE.
2
NUNO CUNHA RODRIGUES
RESUMO
subordinada ao tema “O Sistema Financeiro Português”. Partindo da análise dos três pilares da união
bancária, o artigo reflete sobre a resolução de dois bancos em Portugal – o BES (Novo Banco) e o BANIF –
bem como sobre o surgimento daquela união no contexto da crise financeira, concluindo que, sem uma
verdadeira união económica e monetária, ainda por concretizar, a união bancária não permitirá resolver
alguns dos problemas estruturais da União Europeia.
Palavras-chave: União bancária, união económica e monetária, crise financeira, Banco Central Europeu,
ABSTRACT
Does the Banking Union solve? The article is the text of the speech held on January 26, 2016, at the Law
School of Lisbon, at the conference organized by IDEFF and the European Institute entitled "The
Portuguese financial system." Based on the analysis of the three pillars of the banking union, the article
reflects on the resolution of two banks in Portugal - BES (Novo Banco) and BANIF - as well as the
emergence of the banking union in the context of the financial crisis, concluding that without true
economic and monetary union, yet to be achieved, the banking union will not be able to solve some of the
Keywords: Banking union, economic and monetary union, financial crisis, European Central Bank,
mechanism single resolution.
_________________________________________________________________________________________________________________
3
Com a aprovação do Tratado de Lisboa, a Comunidade Europeia deu lugar à União Europeia com a
consequente mudança da denominação.
4
O principal contributo de Mundell assentou na apresentação, como principal critério para o
estabelecimento de uma zona com uma única moeda, a existência no seu interior de um alto grau de
mobilidade de fatores. Assim, v. ROBERT A. MUNDELL, A theory of optimum currency areas, in American
Economic Review, vol. 53, 1961, pp. 657-664. Assinalando que a União Europeia não é uma zona monetária
ótima uma vez que não existe uma política orçamental de estabilização centralizada; porque os salários e
preços não são suficientemente flexíveis e porque é pequena a mobilidade internacional do fator trabalho,
v. SAMUELSON / NORDHAUS, Economia, 18.ª edição, McGraw Hill, Madrid, 2005, p. 638 e ANÍBAL CAVACO
SILVA, União Monetária Europeia – funcionamento e implicações, Verbo, Lisboa, 1999, p. 93.
5
Já em 1999, PAULO DE PITTA E CUNHA, in De Maastricht a Amesterdão – problemas da União Monetária
Europeia, Almedina, Coimbra, 1999, p. 97, alertava para as dificuldades de implementação da união
económica e monetária então idealizada, nos seguintes termos: “the lauching of EMU, with its unbalanced
structure – decisions on the unification of monetary policy under strict stability rules not paralleled by any
move to centralize budgetary powers -, may create a serious problema to those Member States facing
asymmetric shocks, in the contexto of a single market deprived of real mobility of the labour force (…) it is
advisable, even in the absence of political will to set up the structures of fiscal federalism, to tackle the above
referred problem”.
6
O Tratado sobre a Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária
vulgarmente conhecido como Tratado Orçamental, é um tratado intergovernamental, outorgado fora do
quadro jurídico da União Europeia, tendo sido assinado pelos Estados-Membros da União Europeia (UE),
com exceção do Reino Unido, da Croácia e da República Checa.
O six-pack foi aprovado em 2011 e agrega uma componente de controlo orçamental, que procura garantir
uma maior ação preventiva por parte da União Europeia, bem como uma componente de supervisão
macroeconómica, com vista a prevenir e corrigir os desequilíbrios verificados nos Estados-membros.
É composto por cinco regulamentos e uma diretiva (Regulamento (UE) n.º 1173/2011 do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 16 de novembro de 2011, relativo ao exercício eficaz da supervisão orçamental
na área dos euroafetados ou ameaçados por graves dificuldades no que diz respeito à sua estabilidade
financeira; Regulamento (UE) n.º 1174/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de novembro de
2011, relativo às medidas de execução destinadas a corrigir os desequilíbrios macroeconómicos excessivos
na área do euro; Regulamento (UE) n.º 1175/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de
novembro de 2011, que altera o Regulamento (CE) n.º 1466/97 relativo ao reforço da supervisão das
situações orçamentais e à supervisão e coordenação das políticas económicas; Regulamento (UE) n.º
1176/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de novembro de 2011, sobre prevenção e
correção dos desequilíbrios macroeconómicos; Regulamento (UE) n.º 1177/2011 do Conselho, de 8 de
novembro de 2011, que altera o Regulamento (CE) n.º 1467/97 relativo à aceleração e clarificação da
aplicação do procedimento relativo aos défices excessivos e Diretiva 2011/85/UE do Conselho, de 8 de
novembro de 2011, que estabelece requisitos aplicáveis aos quadros orçamentais dos Estados-Membros).
O two-pack foi aprovado em 2013 e visou introduzir um novo ciclo de monitorização da Zona Euro, com a
submissão prévia à Comissão Europeia dos orçamentos relativos ao ano seguinte pelos Estados-Membros.
É composto por dois regulamentos (Regulamento (UE) n.º 473/2013, de 21 de maio de 2013, que
estabelece disposições comuns para o acompanhamento e a avaliação dos projetos de planos orçamentais
e para a correção do défice excessivo dos Estados-Membros da área do euro e o Regulamento (UE) n.º
472/2013, de 21 de maio de 2013, relativo ao reforço da supervisão económica e orçamental dos Estados-
Membros afetados ou ameaçados por graves dificuldades no que diz respeito à sua estabilidade financeira
na área do euro).
7
Cfr. acórdão do TJUE Comissão vs. Conselho, de 13 de julho de 2004, proc. C-27/04, Coletânea, 2004, p. I-
6649.
8
Cfr. artigo 123.º, n.º 1 do TFUE e artigo 21.º, n.º 1 do Protocolo relativo aos Estatutos do Sistema Europeu
de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu. Esta proibição não impede, contudo, o BCE de poder
intervir nos mercados secundários, nomeadamente ao abrigo do chamado programa OMT.
É neste contexto que surge a União Bancária, constituída pelos seguintes três
pilares:
a) O Mecanismo Único de Supervisão (MUS), que atribui a função de
supervisão bancária direta ao Banco Central Europeu, responsável pela
supervisão direta dos 123 maiores grupos bancários na União Europeia9;
b) O Mecanismo Único de Resolução (MUR) que nos termos do qual, desde
janeiro de 2016, as resoluções devem ser sobretudo financiadas pelos
acionistas e pelos credores dos bancos - em aplicação do princípio
segundo o qual as perdas devem ser suportadas, em primeiro lugar,
pelos acionistas e pelos credores e, não, recorrendo a fundos do Estado
- podendo, a título complementar, haver financiamento pelo Fundo
Único de Resolução (FUR), resultante de contribuições do setor bancário
efetuadas pelos bancos ao longo dos próximos 8 anos e que, quando
atingir o nível-alvo de fundos, permitirá deter cerca de 55 mil milhões de
EUR, ou cerca de 1 % dos depósitos cobertos na área do euro.10
9
O Mecanismo Único de Supervisão (MUC) foi criado na sequência da aprovação do Regulamento (UE) n.º
1024/2013, de 15 de outubro, que atribuiu ao BCE o poder de supervisionar as instituições de crédito
significativas dos países da zona euro e dos outros Estados que, não tendo adotado o euro como moeda,
desejem fazer parte desta colaboração.
10
O Mecanismo Único de Resolução (MUR) visa evitar que a resolução dos bancos afete a estabilidade
sistémica e a situação financeira dos países onde estes operam. Nos termos do MUR, caberá ao BCE
desencadear o processo de resolução e decidir se um banco está ou não em risco de falência, como resulta
do Regulamento (UE) n.º 806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho, que estabelece
regras e um procedimento uniformes para a resolução de instituições de crédito e de certas empresas de
investimento no quadro de um Mecanismo Único de Resolução e de um Fundo Único de Resolução
bancária e que altera o Regulamento (UE) n.º 1093/2010.
Neste contexto foi igualmente aprovada a Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de
15 de maio de 2014, relativa à recuperação e resolução bancária (DRRB), que prevê formas de resolução
das instituições de crédito sem que seja necessário recorrer aos contribuintes.
Em abril de 2014, o Parlamento Europeu aprovou ainda o pacote DRC IV, constituído pela Diretiva bancária
2013/36/UE relativa aos Requisitos de Fundos Próprios (DRC) e pelo Regulamento (UE) n.º 575/2013
relativo aos Requisitos de Fundos Próprios (CRR). Este novo pacote transpõe para o direito comunitário os
requisitos prudenciais em matéria de fundos próprios para as instituições de crédito e as empresas de
investimento, reforçando as normas de capitalização e liquidez dos bancos, as regras relativas às práticas
de remuneração, assim como os incentivos à concessão de crédito, nomeadamente às PME.
Note-se que para aceder a este fundo, os bancos "tóxicos" deverão aplicar
perdas aos seus principais credores, incluindo os detentores de dívida sénior (algo que
não se verificou nos grandes resgates desta crise).
O que implica que a autoridade central, o Conselho Único de Resolução (CUR) -
agência independente da União Europeia que se tornou operacional desde janeiro de
2016 - seja, em última instância, responsável pela decisão de iniciar a resolução de um
banco e por exercer diretamente a função de resolução em relação a todas as
instituições sujeitas à supervisão direta do BCE ou com atividade transfronteiriça na
área do euro, ao passo que, a nível operacional, a decisão será executada em
cooperação com as autoridades nacionais de resolução.
Sabendo-se que, no caso Novo Banco e no caso BANIF, a resolução foi decidida
em escassos dias, é legítima a interrogação de saber se este mecanismo europeu será
suficientemente ágil para resolver grandes bancos europeus em escassos dias.
Registe-se que esta divisão de competências entre o Conselho Único de Resolução
(CUR) e os bancos centrais nacionais traz associada alguma esquizofrenia entre quem
decide – o CUR - e quem paga – os depositantes, obrigacionistas e, no limite,
contribuintes nacionais.
Tudo isto entronca, como veremos mais adiante, num problema central da
União Bancária: carência de legitimidade democrática.
Concordo, por isso, com quem afirma o mecanismo único de resolução não
pode ser visto como a bala mágica capaz de solucionar os problemas de risco
sistémico.11
A União Europeia é totalmente inexperiente neste domínio, uma vez que, no
passado, falências de bancos foram solucionadas sem recurso a mecanismos de
resolução, seja através de intervenções públicas (caso da Irlanda ou da Suécia no início
da década de 90) ou de nacionalizações (v. o caso do BPN em Portugal).
Tudo dependerá, portanto, da forma como o mecanismo único de resolução
vier a ser utilizado no futuro.
11
Assim, v. NICOLAS VÉRON e GUNTRAM B. WOLFF, From supervision to resolution: Next steps on the road
to European banking union, Bruegel Policy Contribution, n.º 2013/04, p. 2, disponível em
http://hdl.handle.net/10419/72128 (acesso em fevereiro de 2016).
12
Cfr. Relatório Especial nº 18/2015 "Assistência financeira prestada a países em dificuldades", disponível
em http://www.eca.europa.eu/Lists/News/NEWS1601_26/INSR_CRISIS_SUPPORT_PT.pdf (acesso em
fevereiro de 2016).
13
A apreciação de uma operação de concentração de empresas (nomeadamente quando resulta da fusão
de dois bancos) pode ser feita a nível nacional (Autoridade da Concorrência) ou europeu (Comissão
Europeia), caso sejam ultrapassados os limiares financeiros estabelecidos no Regulamento 139/2004.
Porém, em qualquer caso, a operação pode não ser autorizada caso resulte na criação de entraves
significativos à concorrência efetiva em consequência, nomeadamente, da detenção de elevadas quotas de
mercado em resultado da operação projetada.
14
O Mecanismo Único de Garantia de Depósitos (SGD) foi criado com a aprovação da Diretiva 2014/49/UE
relativa aos sistemas de garantia de depósitos, que contribui, juntamente com o FUR e o Mecanismo
Europeu de Estabilidade (MEE), para o terceiro pilar da União Bancária.
Sobre a eventual criação deste mecanismo, no contexto da união bancária, v. DANIEL GROS e DIRK
SCHOENMAKER, European Deposit Insurance and Resolution in the Banking Union, Journal of Common
Market Studies, Volume 52. Number 3, 2014, pp. 529–554.
15
Discutindo a realização dos três pilares da união bancária, v. JEAN PISANI-FERRY; ANDRÉ SAPIR;
NICOLAS VÉRON; GUNTRAM B. WOLFF, What kind of European banking union?, Bruegel Policy
Contribution, n.º 2012/12, disponível em http://hdl.handle.net/10419/72098 (acesso em fevereiro de 2016).
É certo que, para alguns, a base jurídica para a criação do mecanismo único de
resolução seria extraída implicitamente do disposto no artigo 114.º do TFUE, referente
à harmonização de legislação entre os Estados-membros.
Ao ler o Regulamento n.º 806/2014 - que criou o Mecanismo Único de
Resolução e o Fundo Único de Resolução bancária -,verificamos que foi aprovado
tendo em conta, justamente, o artigo 114.º do TFUE.
Acontece que, como referi anteriormente, esta norma não confere
explicitamente competências à União neste domínio.
Não sou original nesta afirmação.
A maior parte da doutrina estrangeira considera essencial proceder a uma
revisão dos Tratados a este respeito, para que a União Bancária não esteja, à partida,
condenada por falta de base jurídica adequada no que respeita ao mecanismo único de
resolução.16
Passemos agora à segunda observação: a União Bancária encontra-se
desprovida de legitimidade democrática.
Este ponto já foi analisado pelo Parlamento Europeu. Recorde-se que o
Parlamento esteve diretamente envolvido no processo legislativo que levou à criação
da União Bancária mas competiu-lhe apenas uma função consultiva relativamente à
legislação referente à União Bancária.17
A tudo isto acresce que a União Bancária reforçou os poderes do BCE ficando
por definir que tipo de escrutínio democrático esta instituição ficará submetida.
Trata-se, no fundo, de procurar dar resposta à velha questão latina quis
custodiet ipsos custodes? – quem vigia os vigilantes?
É certo que, dos atos do BCE, admite-se recurso para o Tribunal de Justiça.18
16
Sobre a falta de base jurídica adequada no TFUE para a criação do mecanismo único de resolução, v.
NICOLAS VÉRON, A realistic bridge towards European banking union, Bruegel Policy Contribution, n.º
2013/09, disponível em http://hdl.handle.net/10419/106306 (acesso em fevereiro de 2016), pp. 5-7.
17
Assim, v. DAVID HOWARTH e LUCIA QUAGLIA, Banking Union as Holy Grail: Rebuilding the Single Market
in Financial Services, Stabilizing Europe‟s Banks and „Completing‟ Economic and Monetary Union, in Journal
of Common Market Studies, Volume 51 Annual Review, 2013, p. 119.
18
O artigo 271.º, alínea d) do TFUE prevê que o TJUE é competente para conhecer dos litígios respeitantes
à execução das obrigações resultantes dos Tratados e dos Estatutos do SEBC e do BCE pelos bancos
centrais nacionais.
A este propósito, v. MARIA LUÍSA DUARTE, O Banco Central Europeu e o sistema judicial da união europeia:
supremacia decisória e controlo da legalidade, in Estudos em Homenagem a Sousa Franco, vol. III, Coimbra
Editora, Coimbra, 2006, pp. 149-176.
19
O relatório está disponível em
www.consilium.europa.eu%2Fpt%2Fworkarea%2Fdownloadasset.aspx%3Fid%3D17415&usg=AFQjCNGnh0
c6RzX5cUdrR5623-0BCRvR2g (acesso em fevereiro de 2016)
Não estaremos, de novo, a ser colocados perante uma União Europeia a duas
velocidades: a dos grandes bancos e a dos pequenos e médios bancos e, por outro
lado, a dos bancos da zona euro e a dos bancos de fora da zona euro?20
É que, se partilhamos a mesma moeda – o Euro - e se, consequentemente, a
política monetária nos foi expropriada, por que razão devemos ter um mecanismo
único de resolução para grandes bancos e outros para pequenos e médios bancos,
afeto aos bancos centrais nacionais regido por entidades distintas – BCE e Bancos
Centrais Nacionais?
Poderia até discutir-se a arquitetura institucional deste modelo, indagando se
fará sentido que, a nível nacional, a entidade supervisora tenha simultaneamente
competências de resolução como acontece com o Banco de Portugal.
Esta dúvida ficou claramente à vista de todos no caso BANIF.
É tempo de concluir.
Procurei, de forma sintética, dar resposta à questão de saber se a União
Bancária resolve?
Sei que, sem dar respostas concretas, muitas questões ficam em aberto.
A meu ver, a correção de algumas das deficiências genéticas da União Bancária
permitiriam transformar uma União Bancária “tóxica” numa União Bancária “solidária” e
exemplar para o avanço da União Europeia.
Assim o queiram os decisores políticos.
20
Suscitando questão idêntica v. DAVID HOWARTH e LUCIA QUAGLIA, Banking Union as Holy Grail:
Rebuilding the Single Market in Financial Services, Stabilizing Europe‟s Banks and „Completing‟ Economic and
Monetary Union, in Journal of Common Market Studies, Volume 51 Annual Review, 2013, pp. 114–117.
NORMAS DE PUBLICAÇÃO
As recensões consistem num resumo dos aspetos principais de uma obra, publicada há
menos de 24 meses. O autor deve contextualizar o seu percurso e enquadrar,
brevemente, o âmbito do estado da arte quanto ao tema. O autor deve, ainda, apreciar
a obra quanto ao seu contributo no meio académico e sugerir possíveis caminhos para
uma investigação futura, caso assim o entenda. Não devem ultrapassar 10 000
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bibliografia.
Subtítulo: É opcional.
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Corpo do texto
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Notas: devem ser apresentadas em sequência numérica árabe, em rodapé, Segoe UI,
tamanho 9, justificado.
Referências bibliográficas: São citadas ao longo do texto (ver ponto 5.1.). A referência
bibliográfica remete também para a bibliografia no final do texto, sendo ordenada
alfabeticamente pelo último nome do autor ou pelo título, nos casos de não existir
autor.
3. Elementos do texto
3.1. Figuras
As figuras englobam mapas, gráficos, desenhos, fotografias, etc. A sua inclusão no
texto deve ser pertinente, devendo ser referidas no texto, usando a palavra “figura”, se
esta ficar no meio da frase, ou a abreviatura “fig.”, caso se usem parêntesis: Ex: (fig. 1).
As figuras são numeradas sequencialmente em numeração árabe e a sua legenda deve
ser clara e curta, posicionada abaixo da figura, em Segoe UI, tamanho 9, centrado.
A qualidade das figuras representadas deve ser suficiente para garantir a sua
legibilidade. Sempre que possível, as figuras devem ser a cores, em formato jpeg, gif,
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Cada figura será enviada em separado e não pode exceder os 5 MB, enquanto que o
conjunto não pode ultrapassar os 30 MB. As figuras devem ser identificadas com o
apelido do primeiro autor e respetivo número da figura (ex: Silva_fig. 1.jpg).
Juntamente, deve ser enviado um ficheiro de texto com uma listagem de todas as
figuras, onde constem o número da figura, a respetiva legenda e a fonte. Esta lista deve
ser identificada com o apelido do primeiro autor, seguido de _figuras (ex:
Silva_figuras.docx).
3.2. Quadros
A sua inclusão na publicação deve ser pertinente, devendo ser referidos no texto e
numeradas sequencialmente em numeração árabe. O seu título deve ser claro e
sintético, posicionado acima do quadro, em Segoe UI, tamanho 10, centrado. A fonte
deve ser indicada.
A informação contida nos quadros deve ser simples e concreta, devendo caber dentro
de uma só página. Os quadros devem, obrigatoriamente, ser formatados com linhas
horizontais interiores e exteriores, ficando ao critério do(s) autor(es) a inclusão de
linhas verticais interiores e exteriores.
3.4. Números
Os números, quando não forem seguidos por unidades de medida, deverão ser
apresentados por extenso, de primeiro a décimo e de um a dez (inclusive), e por
algarismos a partir deste último número. As unidades de milhar devem ser separadas
por um espaço (ex.: 1 500).
3.5. Citações
As citações pouco extensas (até 3 linhas) devem ser incorporadas no texto, entre aspas.
As citações mais longas serão recolhidas e formatadas em letra de tamanho inferior ao
do texto (tamanho 10), sem aspas, com um avanço de parágrafo de 1 cm à esquerda e
à direita.
4. Referências bibliográficas
Chave
Tipo de publicação
Citação da fonte no texto
Referência da fonte na bibliografia
Livros editados
(Keene, 1988, p. 89)
KEENE, Eduard ed., (1988), Natural language. Cambridge: University of Cambridge
Press.
Livro eletrónico
(Shapiro e Varian, 1999, p. 45)
SHAPIRO, Carl; VARIAN, Hal (1999), Information rules: a strategic guide to the network
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abril de 2009]. Disponível em:
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Artigo impresso
(Keirstead, 1987, p. 29)
KEIRSTEAD, Carol (1987), Lowell looks for answers. Equity and Choice. Vol. 3, n.º 2, p.
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Artigo eletrónico
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PRICE‐WILKIN, John (1994), Using the World Wide Web to deliver complex electronic
documents: implications for libraries. The Public Access Computer System Review [Em
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<http://www.lib.uh.edu>.
Teses e dissertações
(Silvestre, 2008, p. 65)
SILVESTRE, Susana Margarida (2008), Partilhar livros com bebés dos 9 meses aos 3
anos: o papel das bibliotecas públicas portuguesas no suporte à literacia emergente
[Texto policopiado] Évora: [S.n.]. Dissertação de mestrado.
Portal/Página Web
(Governo de Portugal, 2015)
GOVERNO DE PORTUGAL (2015), Agenda do Primeiro-ministro. [Em linha]. Lisboa:
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<http://www.portugal.gov.pt/pt/os-ministerios/primeiro-ministro/agenda.aspx>.
Base de dados
…conforme dados do Eurostat (2013) ou (Eurostat, 2013).
Eurostat (2013), Main GDP aggregates per capita. [Em linha]. [Consultado em 21 de
junho de 2015]. Disponível em: <http://appsso.eurostat.ec.europa.eu/nui/show.do>.
Legislação nacional
…Dec. Lei nº 239/97 de 9 de Setembro
Decreto-Lei n.º 239/97 de 9 de Setembro. Diário da República nº 208/97 - I Série A.
Ministério do Ambiente. Lisboa.
Exemplo:
COELHO, Jacinto do Prado (1996), Bocage, pintor do invisível. Lisboa: Academia de
Ciências de Lisboa.
___ (1955), Garrett prosador. Rev. Fac. Letras de Lisboa. 2ª Série. 21:1, 35-49.
___ (1944), A poesia ultra-romântica. Lisboa: Clássica Editora.
Exemplo:
FAVARGER, C. (1980a), Un exemple de variation cytogéographic: la complexe de
l'Erysinum grandiflorum-sylvestre. An Inst. Bot. Cavanilles, 35, p. 361-393.
FAVARGER, C. (1980b), Le nombre chromossomique de populations alticoles
d'Erysimum des Picos de Europa. Bull. Soc. Neuchateloise Sci. Nat, 100, p. 93-105.
Exemplo:
London [etc.]
London: Pergamon; New York: Marcel Dekker; Madrid: Interamericana.
4.5. Omissões
Quando algum elemento da referência bibliográfica é omisso (autor, ano, editora, local
de publicação), deve-se colocar a abreviatura n.d. em substituição, que significa “não
definido.”
Exemplo:
Ayuntamiento de Zaragoza (n.d.), Cómo Moverse en Transporte Público. [em linha].
[Consultado em 10 de abril de 2013]. Disponível em:
<http://www.zaragoza.es/ciudad/viapublica/movilidad/como-ir/>
POLÍTICA EDITORIAL
O parecer favorável pode estar condicionado à reformulação dos trabalhos, bem como
sugestões para adequá-los às normas de correção gramatical e ortográfica e às
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