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Lynne Graham Desejo sem amor

Desejo sem amor

Lynne Graham

Título Original: A vengeful passion

1995

“Este Livro faz parte de um Projeto individual, sem fins lucrativos e


de fã para fãs de romances. A comercialização deste produto é
estritamente proibida”.

Tradução: ILNETE

Resumo:

Vito di Cavalieri ainda acreditava que Ashley tinha desprezado seu


pedido de casamento há quatro anos atrás. Entretanto, agora Vito contava com
uma excelente oportunidade para vingar-se: o irmão de Ashley estava com
problemas e só ele podia ajudá-lo... com uma condição: se ela se convertesse em
sua mulher. Mas, dessa vez Vito sabia com certeza do que precisava... e não era
precisamente do amor de Ashley.

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Capítulo 1

ASHLEY não podia ficar quieta. Levantou-se, e voltou a passear pela


cozinha de sua irmã. Quanto tempo mais eles ainda estariam com a polícia?
disse a si mesmo que certamente neste exato momento já se deram conta de
que se equivocaram de pessoa. Seu irmão não era um ladrão de carros.
Por outro lado, disse a si mesmo que Tim não era nenhum anjo. Qual
adolescente era? Mas ele era inteligente. Tinha um futuro promissor. Não
demoraria em realizar seus exames finais. Por que iria tentar roubar um carro
quando tinha seu próprio veículo?
Tim estava vivendo com sua irmã durante os dois últimos meses. Seus
pais se encontravam na Nova Zelândia, visitando uns parentes, de modo que ele
não teve nenhum lugar aonde ir. Mas, Tim não queria ficar na casa de Susan e
Arnold. Ela compreendia sua relutância. Ela tampouco teria querido viver
submetida às regras de Susan. E seus pais não o deixaria ficar na casa de
Ashley.
A ampla e moderna cozinha lhe recordava uma sala de cirurgia. Era fria e
impecavelmente ordenada. Susan jamais teria permitido que houvesse alguma
desordem; ela mesma era fria e metódica. Entretanto, quando falou ao
telefone estava pouco menos que histérica.
Quem infringia o rígido código moral de Susan se convertia em um
inimigo. Ninguém melhor que Ashley sabia. O dia em que Susan descobriu que
sua jovem irmã solteira estava grávida, sem vacilar lhe voltou às costas.
E, nesse momento, se Susan tivesse a menor suspeita de que Tim poderia
ser culpado, teria deixado que Arnold se arrumasse sozinho com a polícia.
—Sirvo-lhe uma taça de chá, senhorita Forrester?
Ashley se voltou, nervosa. A senhora Adams, a governanta de sua irmã,
encontrava-se na porta.
—Não, obrigada. Não poderia —respondeu Ashley.
—Nada...?
—Nada ainda.
—Ele é um... jovem duro e forte —comentou a mulher mais velha.
Ashley ficou pálida ao recordar. Tim tinha o temperamento de seu pai.
Quando o zangavam, voltava-se agressivo. Hunt Forrester adorava a habilidade
de seu filho para lhe fazer frente. Supunha-se que um rapaz devia ter caráter
e guelra. Uma moça, não.

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Ashley se rebelou, mas Susan sempre se submeteu. Arnold apareceu


quando Susan tinha dezoito anos de idade. Embora era quase vinte anos mais
velha que ela, foi o primeiro e único namorado de Susan.
—Chegaram... —repôs a senhora Adams, ficando tensa. — Vou para os
meus aposentos, senhorita Forrester.
Ashley, nervosa, passou uma mão pela frisada e dourada cabeleira, e
respirou profundamente. Susan não sabia que se encontrava ali, esperando, de
modo que provavelmente consideraria sua presença como um ato de
intromissão. Quando ouviu que colocavam a chave na fechadura da porta
principal, saiu ao vestíbulo, rezando para que fosse Tim, depois de ter ficado
demonstrada sua inocência.
O jovem que entrou a toda velocidade nem sequer a viu. Tim subiu
correndo as escadas e a portada que deu ressonou em toda a casa. Logo
apareceu Arnold.
—Ashley? —perguntou ele, ficando imóvel.
Susan passou junto a ele. Estava furiosa.
—Ashley?
—Susan... —Arnold segurou o braço de sua esposa.
—Não se meta nisto! —exclamou Susan. — Me alegro de que esteja aqui.
Quero que saiba o que fez!
—O que eu fiz? —perguntou Ashley com incredulidade.
—Tudo é sua culpa! O que supõe que vou dizer a mamãe e papai quando
voltarem para casa? Deixaram Tim aos nossos cuidados. Era nossa
responsabilidade. Quando papai souber disso, me culpará por ter deixado que
se aproximasse do Tim. Você não precisa se preocupar!
Susan parecia uma desconhecida. Era como se estivesse possuída.
—Susan, por favor. Não sei do que está falando. Como posso estar
metida nisto?
—Não está metida em tudo o que afunda a nossa família? Sabe de quem
era o carro que Tim destroçou? —vociferou Susan. —Sabe por que o
destroçou?
Ashley ficou aturdida ao compreender que Tim era culpado.
—Nosso estúpido irmãozinho foi se vingar do homem que te abandonou
há quatro anos! —exclamou Susan. — Agarrou seu carro e lhe destroçou a casa!
causou danos de milhares e milhares de libras. Esse carro custava mais que
esta casa! Destruiu sua maldita fonte e acabou com a grama! Assim é provável
que o metam na prisão!
—Mas isso é impossível —repôs Ashley, com a garganta seca.

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Arnold tratou de consolar sua esposa, mas esta o rejeitou. Susan subiu
as escadas do mesmo modo que Tim o tinha feito uns minutos antes. Ouviu-se
outra portada.
—Não suporta que alguém a veja chorar —declarou Arnold, suspirando e
levando Ashley para a sala. —Será melhor deixá-la só até que se acalme.
Uma sensação de vertigem se apoderou de Ashley. Pálida, cambaleou-se
e teve que se apoiar com as duas mãos no respaldo do sofá. Disse a si mesmo
que era impossível, que não podia ser verdade. Tim nem sequer sabia com quem
ela tinha saído quando ia à universidade. Susan estava equivocada.
Arnold comentou enquanto se servia uma bebida:
—Ninguém tem culpa. O jovem está fora de controle, mas estava muito
antes de vir morar conosco.
—Não é possível que Tim tenha pegado... o carro de Vito —apontou
Ashley.
Arnold bebeu um gole de uísque; esqueceu de oferecer uma bebida a
Ashley. Isso indicava seu estado de ânimo.
—Sinto muito, querida. Ainda não sabe, não é verdade? Seria mais
prudente que seguisse assim.
—Arnold! Ashley desejava gritar e sacudi-lo pelos ombros. —Preciso
saber o que aconteceu!
Seu cunhado aspirou profundamente.
—Tim vai para a mesma escola que... Pietro, o sobrinho do Cavalieri.
—Não me disse isso! —estalou Ashley. Até recentemente Tim não tinha a
menor idéia de que tivesse havido alguma relação entre nossa família e o clã
Cavalieri.
—Acredite ou não, os dois jovens se converteram em grandes amigos. Foi
Pietro quem começou o problema no bar, mas como sua família tem mais
influência que nós, o pobre Tim pagou o pato...
—Que problema?
—Compareceu ante um juiz por conduta escandalosa, danos e prejuízos,
depois de ter participado de uma briga.
Ashley fechou os olhos.
—Por que ninguém me disse nada?
—Em honra à verdade, travou amizade com as pessoas equivocadas. E
depois disso, deu-se conta de que o tinham escolhido como bode expiatório. O
proprietário do bar não tinha nenhuma intenção de denunciar um Cavalieri.
—Então este não é o primeiro delito de Tim —comentou Ashley,
horrorizada.

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—Sua amizade com Pietro esfriou depois disso, mas no mês passado Tim
foi a uma festa na casa de seu amigo. Alguém que estava ali o identificou como
seu irmão. Os dois jovens já tinham se rivalizado por uma jovem. Pietro seguiu
a corrente, fez alguns comentários ofensivos a respeito de... de sua relação
anterior com seu tio... e se produziu uma briga.
Ashley sentiu que lhe dobravam as pernas.
—Tim deu uma surra no canalha, foi assim que o jogaram de lá —
continuou Arnold. — Mas por desgraça, Pietro e seus amigos, depois de
descobrir o ponto vulnerável do Tim, seguiram perseguindo-o na escola. No mês
passado, quatro deles o espancaram.
Ashley recordou que Tim não tinha querido falar desse incidente, apesar
de sua insistência.
—Continua —ordenou ao Arnold.
—Susan e eu nos preocupamos muito quando ele se negou a nos contar
qual foi o motivo desse ataque. Pensamos nos aproximar da escola, mas nos
pareceu que a Tim isso resultaria humilhante.
—Mas por que ele não me contou o que acontecia?
—Nunca me pareceu boa a decisão de seu pai de te excluir do círculo
familiar. Isso causou uma grande tensão a todos, sobre tudo a sua mãe e ao
Tim... Ele é muito unido a você. Não confia em nós para nos contar o que
acontecia. E, embora ame a minha esposa acredito que é absurdo que, depois de
doze anos de casamento, Susan ainda esteja tão desesperada por conseguir a
aprovação de seu pai, e tão disposta a desprezar a sua única irmã, só porque ele
pediu.
Susan também conservava cicatrizes da infância, pensou Ashley.
—Sinto muito —disse em voz baixa.
—Não tem por que pedir desculpas. Tim tinha uma conta pendente —
afirmou Arnold. — Se meteu na casa dos Cavalieri, ligou o carro, não pôde
controlá-lo e deixou uma esteira de destruição atrás dele. Fugiu antes que o
apanhassem, mas alguém o viu.
Ashley se sentiu fisicamente doente. Seu passado se intrometeu no
presente do Tim.
—Denunciaram-no?
—É obvio. Os Cavalieri são donos de um dos maiores bancos da Europa.
Tim não conseguirá sair disto. Mas ele procurou isso.
—Como pode dizer isso? —Ashley ficou em pé. — Ele me defendeu e
agora está pagando por isso! —exclamou, chorosa.

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—Destruir a propriedade de alguém não tem nada que ver com a valorosa
defesa da irmã.
—De que outro modo ele pôde devolver os golpes? Sei que se comportou
como criança, mas a família de Vito é tão rica e poderosa que não pôde ter se
desforrado de nenhuma outra maneira!
—Conseguiremos-lhe o melhor advogado que pudermos —assinalou ele,
franzindo o cenho.
—Subirei para vê-lo.
Tim estava sentado na borda da cama, com as mãos entrelaçadas entre
as pernas e a cabeça inclinada. Não levantou a vista.
—Não me dei conta de que estava aqui, até que ouvi sua voz, lá embaixo.
—Arnold me contou tudo —assinalou ela, apoiando-se na porta. — Por
que, Tim? Por que? Vito nunca te fez nada...
Ele elevou a cabeça imediatamente.
—Ah, não? E o que fez a você? —perguntou com amargura. — Destroçou
sua vida. Teve que abandonar a universidade. Proibiram-lhe de entrar em sua
própria casa e tem um trabalho asqueroso por culpa dele!
A amargura de seu irmão penetrou nela, como se fosse uma adaga.
—Além disso, esse desgraçado do Pietro zomba de você como se seu tio
tivesse feito algo de que devesse estar orgulhoso!
—Você não sabe o que aconteceu entre Vito e eu —declarou ela,
vacilante.
—Você tinha dezenove anos e ele vinte e oito —repôs Tim, furioso. —
Isso é tudo o que preciso saber.
—Nossa relação simplesmente não resultou, Tim.
—Desfez-se de você quando se inteirou de que estava grávida e se casou
com outra.
—Não foi assim, Tim —expressou ela em voz baixa. —Ele não sabia que
eu estava grávida. Na realidade, quando nos separamos, tampouco eu sabia, e
nunca o disse. Uma vez que se casou, não valia a pena.
Seu irmão a olhou com incredulidade.
—Não minta! Já não sou mais criança.
—Mas foi assim que aconteceu.
—Não acredito. Abandonou-te. Aproveitou-se de ti! Sem dúvida se
inteirou do bebê! Sem dúvida...
—Pietro sabe?
—Bem, não, mas...
—Vito não sabia —assegurou ela, apertando os punhos.

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Sabia que já era muito tarde para contar tudo ao Tim. Mas, o que podia
fazer para que ele entendesse? Pensou que algumas coisas eram muito difíceis
de explicar a um adolescente, que estava decidido a ver sua irmã como uma
vítima inocente, seduzida e abandonada. Mas o que impulsionou Tim a atuar foi
a situação dela, não dele.
—Trata de não se preocupar muito —lhe aconselhou Ashley. —
Provavelmente tudo saia bem.
—Não sou criança, Ash. Cometi um erro. Tudo me dava voltas na cabeça.
Pensava no que lhe fizeram. No que me fizeram. Não podia suportar mais. Pus-
me furioso.
A jovem pensou que, quanto ao temperamento, Tim e ela se pareciam
muito. Tinham o mesmo caráter que seu pai, o qual era uma maldição. Uma
maldição que a ela aborrecia muito.
Arnold a estava esperando lá em baixo.
—Levarei-te para casa.
—Não... não é necessário.
Ajudou-a a vestir a jaqueta.
—Vamos. Preciso tomar um pouco o ar.
Além de que Arnold lhe perguntou como ia com os cursos da universidade
à distância, não conversaram muito. Os dois estiveram ensimesmados em seus
pensamentos. Mas a Ashley parecia que ela tinha certa vantagem.
Depois de tudo, sabia o que devia fazer. Precisava ver Vito. Pelo menos,
ele devia escutá-la. E embora tivesse que se arrastar, obrigaria-o a isso. Por
isso se referia à liberdade e tranqüilidade de espírito de sua mãe, nenhum
sacrifício seria muito grande.
Quando, cansada, meteu-se na cama, pensou nas revelações dessa noite.
Por que teve que acontecer isso? Quantas vezes ela deveria pagar por um
erro? perguntava-se. Um erro que podia ter evitado se não tivesse se
apaixonado pela pessoa errada.
Depois de tudo, sua mãe tinha cometido o mesmo equívoco. Entretanto,
Sylvia Forrester não tinha uma personalidade forte. Depois de ter suportado
durante trinta anos a tirania de seu marido, era uma mulher pacata, muito
fraca para contrariar um homem orgulhoso de sua dominação.
Aos dezoito anos, Ashley havia se sentido muito segura de sua habilidade
para dominar suas próprias emoções. Tinha planejado toda sua vida: iria a
universidade e alcançaria um posto destacado no mundo dos negócios. Em vez
disso, no primeiro ano de carreira fracassou estrepitosamente.

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Durante um espaço de cinco meses perdeu de vista todas as suas metas.


Tinha esquecido as lições aprendidas. E, para piorar as coisas, tinha acreditado
sinceramente que sabia o que fazia.
Uma vez tinha se orgulhado de sua autodisciplina. Não havia lugar para
os homens em seus planos. Os homens exigiam, esperavam, complicavam as
coisas. Tinha pensado com a ingenuidade própria da juventude, provavelmente
quando estivesse estabelecida em sua carreira, deixaria que algum homem
fizesse parte de sua satisfatória existência. Provavelmente só quando tivesse
trinta anos. E esse homem, logicamente, apoiaria com entusiasmo suas
ambições...
Mas o destino foi quem riu por último. O destino lhe fez conhecer Vito,
um homem diametralmente oposto ao ideal que ela concebeu. Uma vez que Vito
acreditou que a tinha onde desejava, tão aturdida que não podia pensar de
forma correta, tratou de convertê-la em uma pessoa diferente. Pouco a pouco
foi acabando com sua confiança em si mesmo. Mas, felizmente, despertou.
Certo dia se olhou no espelho e viu ali a sua mãe, observando-a. Nada
teria sido pior que terminar respeitavelmente casada com Vito di Cavalieri...

—Não vale a pena esperar mais —a recepcionista a olhou com irritação.


—Já lhe disse que o senhor Di Cavalieri não estaria livre. Quando vem a
Londres, está muito ocupado. Sua agenda de entrevistas está cheia.
Não estava livre ao telefone, e tampouco pessoalmente, mas Ashley
devia falar com ele. Ele sabia por que ela se encontrava ali e devia entendê-lo.
Tinha entrado no banco Cavalieri no mesmo momento em que se abriram as
portas. Duas horas depois, ainda estava no andar térreo do edifício de vinte
andares. Suspeitava que Vito não queria lhe conceder nem cinco minutos de seu
tempo.
O lugar era muito elegante. Quatro anos antes tinha entrado naquele
impressionante edifício, vestida com jeans e camiseta, sorrindo despreocupada.
Naqueles dias se sentia segura de si mesmo, mas já não era assim.
Vito não ia vê-la. Não tinham se separado amigavelmente.
—Senhorita Forrester? —era a recepcionista de novo. —Se estiver
disposta a esperar outra hora, provavelmente o senhor Di Cavalieri possa vê-la.
Não é nada concreto. Sua secretária está tratando de encontrar um momento
para você, antes do almoço.
Suas palavras puseram Ashley furiosa.

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—É muito amável —repôs bruscamente.


—Pode esperar no último andar.
O último andar era suntuoso. Estava impressionada, e isso voltou a
incomodá-la. A jovem e esbelta morena que se encontrava atrás da escrivaninha
a olhava furtivamente. Ao que parecia, seu aspecto deixava muito a desejar.
Ao cabo de outra hora, convenceu-se de que Vito a estava fazendo
esperar a propósito.
—O senhor Di Cavalieri a verá agora.
Imediatamente, Ashley se ergueu. Odiou-o por tê-la posto tão nervosa.
—Temo que o senhor Di Cavalieri só pode lhe conceder dez minutos —
declarou uma mulher de meia idade.
Dez minutos para falar do Tim a um homem que a aborrecia? perguntou-
se Ashley. Mas logo pensou que dez minutos eram melhor que nada.
Entrou em um enorme escritório. Viu um escritório com computadores e
vários telefones. O lugar a intimidava. Tinha a débil esperança de que ele não
recordasse seu último encontro, tão bem como ela...
Começou a suar. Nesse momento Vito estava à vista. Mais alto do que
recordava, mais moreno, cem vezes mais arrumado.
—Obrigado por ter aceitado me ver —expressou Ashley, embora não
tinha pensado pronunciar essas palavras. Pareceu-lhe humilhante.

Capítulo 2

—ESTOU seguro de que entenderá que não estou sendo grosseiro ao te


pedir que seja breve. Vito assinalou uma cadeira perto da escrivaninha.
—Serei tão breve como for possível.
—Lembre-se que não desejo te escutar pedir clemência por seu irmão.
Ashley suspirou aliviada quando soou um telefone e ele estendeu uma
mão, impaciente. A tentação de observá-lo era irresistível. Era muito atraente;
suas feições eram duras e seus lábios sensuais. Mas eram seus olhos o que

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qualquer mulher recordaria sempre. Vito tinha uns olhos lindos, dourados à luz
do sol e tão negros como o ébano.
Ainda irradiava uma sexualidade selvagem. Todas as mulheres, entre os
quinze e os cinqüenta anos, elevavam o rosto e ficavam sem fôlego quando Vito
passava perto. E ela não era a exceção à regra.
Vito pendurou o telefone e se desculpou pela interrupção.
—Quer que me ponha de joelhos e te suplique, não é verdade? —depois
de pronunciar essas palavras, Ashley sentiu desejo de morder a língua por ter
perdido o controle.
Vito se tornou para trás na cadeira giratória, pouco surpreso.
—A que veio exatamente? —perguntou.
—Falar do Tim e dos motivos que teve para fazer o que fez.
Provavelmente não saiba, mas seu sobrinho...
Vito a olhou com os olhos entrecerrados.
—Insultou seu irmão? Foi um incidente lamentável. —comentou com tom
irônico.
Ashley ficou rígida.
—Lamentável?
—Pietro perdeu dois dentes. O assunto da lealdade familiar ficou
resolvido com os punhos. Pietro levou a pior parte e foi sincero comigo. Não
vejo nenhuma relação entre esse episódio e a indesculpável invasão de minha
casa por seu irmão.
—Então o primeiro ato já terminou. O que me diz do segundo? Tim foi
esquecido na porta da escola e espancado por quatro jovens, um dos quais era
seu sobrinho.
—Quando isso aconteceu?
Ashley teve que se deter para recordar por uns segundos antes de lhe
dar a data.
—Nesse dia Pietro estava assistindo ao casamento de seu primo em Roma
—repôs ele. —Não pôde ter estado presente.
—Se não esteve ali, ele organizou tudo.
—Está entrando agora no terreno da fantasia. Pietro não é capaz de
meter-se em um ato tão covarde. A menos que tenha provas em que fundar
esses argumentos, aconselharia-te que deixasse isto —a olhou com frieza. —
Se continuar, te resultará pouco produtivo.
Ashley estava furiosa por não ter os detalhes exatos do incidente.
Quatro jovens tinham atacado o Tim; isso era tudo o que sabia. Apertou os
dentes.

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—Tenho entendido que a inimizade entre seu sobrinho e meu irmão


estava relacionada originalmente com alguma rivalidade por uma garota...
—E que importância tem essa informação para a situação atual?
—A relação resulta bastante evidente para mim!
—Pois eu não vejo nenhuma relação —declarou Vito com tom sarcástico.
—Não está disposto a reconhecer nada, não é verdade? —perguntou ela,
irritada.
—Eu, em seu lugar, teria tentado desde o começo pedir desculpas por
uma conduta assim —comentou ele, sorrindo. —Sua única razão para estar aqui
parece ser sua decisão de culpar o Pietro. Se isso não fosse algo desprezível,
sentiria-me divertido ao ver seus esforços por perdoar o imperdoável.
Ela se ruborizou. Sua maneira de expor o problema era equivocada. Para
entrar no escritório tinha necessitado reunir todas suas forças. Vito a havia
posto tensa, inclusive antes da entrevista, e ela tinha reagido de uma forma
histérica.
—Eu estava... estou muito preocupada. Tim esteve submetido a uma
forte pressão ultimamente, pois está muito perto dos exames. Simplesmente
queria que tivesse uma visão mais clara de seu estado de ânimo.
—Mas eu não tenho o mais remoto interesse por seu estado de ânimo.
Não é uma criança nem um atrasado mental. É responsável por suas ações.
De repente, Ashley compreendeu por que Tim tinha reagido com tanta
violência ante as brincadeiras do Pietro. Entretanto, ela jamais poderia falar
com Vito de sua gravidez.
Em um momento de debilidade, tinha contado a Susan que ia ter um filho
de Vito. Confiava em que sua irmã tomaria cuidado com essa informação, mas
não foi assim. Seu pai escutou por acaso Susan e Arnold falarem da gravidez
de Ashley, de maneira que imediatamente seu segredo foi revelado.
Hunt Forrester tinha sido sempre o primeiro em rir zombadoramente,
quando os filhos de outras pessoas se metiam em problemas. Alardeava da
rígida disciplina que impunha dentro de sua casa, censurando a outros os pais
mais liberais.
O descobrimento de que Ashley estava grávida o escandalizou. O medo
de ver-se desprestigiado na comunidade local de negócios foi suficiente para
que a repudiasse. Logo, a notícia de que o pai do bebê já estava casado com
outra mulher foi a gota d`água.
Ashley estava grávida de quatro meses quando teve um aborto natural,
embora a maior parte de sua família supôs que tinha decidido abortar. Viu-se
presa em suas próprias redes. Quando era uma adolescente, já era conhecida

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sua decisão de não se casar nunca nem ter filhos, assim que todo mundo supôs
que tinha optado pelo aborto. Definitivamente não podia contar a Vito, ao que,
por outro lado, adorava as crianças. Vito, com quem Ashley tinha tido
acalorados debates sobre o direito das mulheres a escolher ter filhos,
tampouco acreditaria e, se pensava que ela tinha escolhido essa possibilidade,
desprezaria-a ainda mais.
—Tim só tem dezoito anos —começou a dizer ela. —E parte de tudo isto
é minha culpa. Nunca lhe disse... quero dizer, ele não sabe nada do que
aconteceu entre nós. Tirou algumas conclusões errôneas, mas eu não sabia o
que pensava, até que aconteceu...
O silêncio se prolongou. Vito podia usar o silêncio como uma arma.
Permanecia sentado, cômodo, indiferente, tranqüilo. Isso a intimidava.
—Olhe, não estou tratando de desculpá-lo... declarou ela.
—Mas precisamente disso é culpado.
A palavra «culpado» a assustou.
—Se Tim for à prisão, toda sua vida ficará destruída. Por um momento
perdeu o julgamento, Vito. Ele lamenta muito o que fez.
—Onde ele está?
—Não sabe que estou aqui. E não sei por que me pergunta isso. É injusto.
Montou um escândalo tão grande com a polícia, que talvez o detenham se se
aproximar deste edifício!
—É ardilosa —repôs Vito em voz baixa. —Tinha esquecido quão ardilosa
podia ser. Mas me diga: se eu ou algum membro de minha família atravessasse
no caminho do carro, acha que seu irmãozinho teria pisado no freio?
—Por que quer piorar o que já aconteceu? voltou-se louco com o carro,
mas não tentou matar ninguém! Estava sob a influência do álcool. Não era
consciente do que fazia até que já era muito tarde!
—Trata de abrandar meu coração? Quem viola a lei deve ser castigado.
Desculpar seu irmão das conseqüências de sua própria conduta não será bom
para ele.
—Só agarrou seu maldito carro, Vito! —exclamou ela, furiosa. — Não
pensava destroçá-lo. Há castigos e castigos. Enviar um adolescente à prisão por
destroçar um carro e uma estúpida fonte, é o que eu chamo de um exagero.
Isso acabará com o Tim!
—É pouco provável que vá a prisão se se tratar de seu primeiro delito.
—Mas não é o primeiro... —de repente se deteve, horrorizada.
—Então terei a consciência tranqüila. Muito a propósito tratou de me
enganar ao afirmar que ele não estava acostumado a comportar-se assim. Mas

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se antes já violou a lei, merece um castigo. É evidente que a primeira


advertência não bastou para refrear suas tendências violentas.
—Conhece o Tim?
—Muito pouco. Vi-o na festa de meu sobrinho e sustentei uma breve
conversa com ele. Se parece muito com você, tanto em um plano físico como em
seu temperamento.
—Acha que eu também tenho tendências violentas? —perguntou ela com
amargura.
—Têm os mesmos olhos. Os dois têm um grande atrativo físico, mas em
seu caso, como no teu, isso resulta superficial quando os conhecemos melhor.
Ela levantou a cabeça, furiosa.
—Entretanto, deve admitir um fator atenuante...
Ele suspirou e jogou uma olhada a seu relógio.
—E qual é?
Ashley lhe dirigiu um olhar acusador.
—Cada um de nós pode enlouquecer de raiva se nos provoca o suficiente.
Você o fez uma vez, mas suponho que não recorda dessa ocasião.
—O aviso é desnecessário e irrelevante.
Ela esteve a ponto de perder o controle. Ele havia perdido o controle em
seu último encontro. Violação? perguntou-se. Não, não se tratava de uma
violação. Tudo começou com ira e amargura, e terminou em uma selvagem
paixão. Não foi um ato de amor, nem sequer de desejo. Foi uma humilhante
expressão de desprezo masculino, que destruiu o amor próprio da jovem
durante muitos, muitos meses.
—Seria capaz de te suplicar...
—Isso não diminuiria minha ira.
Ashley elevou o queixo.
—Está bem. O que te parece uma indenização econômica?
Vito sorriu com frieza.
—Sua família não tem os meios necessários. Essa «estúpida fonte» era
uma escultura, uma obra de arte inestimável. O carro? Uma Ferrari F40. Paguei
por ele quatrocentas mil libras faz quatro anos e já era uma peça de coleção.
—Qua-quatrocentas mil libras por um carro? —perguntou Ashley,
gaguejando com incredulidade.
—Era uma versão limitada para celebrar o quadragésimo aniversário da
Ferrari.
—É repugnante... todo esse dinheiro por um carro! O dinheiro não
significa nada para você!

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—Mas tudo para você, Ashley.


—Quando nos amávamos...
—De verdade? Que estranho que fale agora de amor; não falava disso
quando estávamos juntos...
—Podemos falar só do Tim? —perguntou ela.
—Foi você quem escolheu voltar ao passado.
—Só porque fui o bastante tola para tratar de recorrer...
—Ao pouco de sentimentalismo que provavelmente eu tenha? —espetou-
lhe ele, burlando-se. —Não sou sentimental no que se refere ao sexo...
Ashley não só se sentiu humilhada, mas também enganada.
—Mas você...
—Destruiu o que sentia por você.
—Pois teve um efeito bastante similar sobre mim!
—Acreditei que já tinha esquecido essas idéias ridículas. Na realidade te
honrei com uma proposta de casamento...
—OH, não cometamos o erro de nos referir a esse oferecimento em
termos de honra! —exclamou Ashley, furiosa. — Me deixou muito claro que
pensava que estava me fazendo um grande favor. Além disso, queria ter um
bom pretexto para se desfazer da mulher com a qual seus pais desejavam te
casar! Isso, antes que recuperasse o juízo, tirasse sua calculadora e... se
lançasse em seus braços!
Sem nenhuma advertência, Vito ficou em pé de um salto e caminhou para
ela para lhe fazer frente. Suas feições pareciam esculpidas em granito.
—Se voltar a falar assim de minha falecida esposa, provavelmente possa
esquecer que é uma mulher e te dê a resposta que merece.
—Disse... falecida? —ela inclinou a cabeça. — Sinto muito.
—Não, não sente —lhe espetou Vito, apertando os dentes.
—De acordo. Não posso senti porque não a conheci! —replicou Ashley,
com pouco tato. —Mas estou segura de que era uma Santa e uma pessoa
maravilhosa, muito diferente de mim...
—Muito diferente de você. Tem o rosto de um anjo do Botticelli, o
temperamento de uma fera e a imoralidade de uma vadia. Não se parece em
nada com Carina.
Ashley se tinha posto muito pálida e estava começando a suar.
—Deus santo! —murmurou, estremecendo-se. —Devo ter perdido o juízo
quando me relacionei com você!
—Nós dois estávamos loucos.

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Ashley sacudiu a cabeça. Carina estava morta. Foi o casamento do ano, a


fusão de duas grandes fortunas. Vito não tinha perdido tempo. Um mês depois
de deixar Ashley, ele ficou noivo, e ao cabo de outro mês se casou com Carina,
que parecia radiante, vestida de branco, feliz de ter Vito. Resultava evidente
que a noiva estava apaixonada.
Entretanto, Vito se casou sem amor, sem sequer o estímulo da atração
sexual. Em sua noite de núpcias, Ashley chegou a desejar a morte, pois a dor
lhe resultava insuportável. Até esse instante não podia acreditar que tivesse
conseguido superar isso.
Vito tinha conseguido. Imediatamente, e sem arrependimentos, tirou
Ashley de sua vida. As lembranças ainda a faziam estremecer-se. Ela, que tinha
sido tão forte, ficou quebrada como uma boneca. Descobriu que não era menos
vulnerável que qualquer outra mulher apaixonada. Durante os longos e
angustiantes meses que seguiram, viveu em um mundo em que conviveu como um
fantasma. Ao final se viu obrigada a aceitar a dolorosa verdade: Vito nunca a
tinha amado. Se a tivesse amado, não teria se casado com outra mulher.
«Odeia-me», disse a si mesmo. «Odeia-me porque uma vez foi o bastante
tolo para pedir que me casasse com ele e eu tive a audácia de lhe dizer que
não». Perguntou-se como se desenvolveria aquela confrontação. Supunha-se que
se encontrava ali para defender o Tim. Mas até esse momento não tinha
conseguido nada.
—Sinto muito —declarou com dificuldade, mas insistiu pelo bem de seu
irmão. — Não devia ter perdido os estribos.
—Ninguém nunca a ensinou a dominar-se. Mas eu poderia fazê-lo.
Ashley se sentiu como um vulcão a ponto de erupção. Só duas pessoas
tinham esse efeito nela. O primeiro era seu pai; o outro era Vito.
Ao fim, lançou-lhe um olhar em que se mesclavam o desafio e o
aborrecimento.
—Não vou arrastar-me...
—Nunca a vi tentar essa façanha.
—Mas você gostaria de vê-lo, não é verdade? —Ashley se levantou de um
salto, muito intranqüila para manter-se quieta, muito ameaçada por sua
proximidade. O repentino movimento fez que o cabelo se soltasse e caísse
sobre seus ombros. Irritada, afastou o cabelo da cara e, ao levantar a cabeça,
descobriu que Vito a olhava fixamente. —Sei o que quer escutar e o que está
pensando neste mesmo momento. Na realidade sei o que esteve pensando desde
que entrei aqui!
—Espero que não.

15
Lynne Graham Desejo sem amor

—Quer que diga que sinto profundamente não ter me casado com você.
—De verdade?
—Devo ser sincera para que possamos superar o acontecido há quatro
anos —repôs ela com valentia.
—OH, seja sincera, por favor, cara —a animou com tom indolente.
—Deve saber que, de fato, ainda estou orgulhosa por ter me negado a me
converter em tua propriedade. Uma vida de vigilância e submissão teria me
afogado. Nunca teria resultado.
—Deu resultado na cama... e que resultado!
Nervosa e incômoda depois do comentário de Vito, Ashley não disse
nada. Ele a observou com frieza.
—Teria sido um sacrifício tão grande ser minha esposa, se vestir de seda
e exibir colares de diamantes?
—Desde o começo sabia o que pensava do casamento. Não pode dizer que
não lhe adverti isso. O casamento é uma instituição patriarcal que beneficia aos
homens e oprime as mulheres.
—Um sermão feminista. Nunca tinha ouvido tantas tolices!
Ashley se encolheu de ombros.
—Certamente, tem direito a expressar sua opinião... como eu tenho
direito a expressar a minha. Em todo caso, não vim ressuscitar um passado que
nós dois preferimos esquecer. Faz-me dizer coisas que não quero dizer.
—Com que diplomacia pede desculpas...
Fazia muito tempo que Ashley tinha expressado suas crenças.
Entretanto, por alguma razão inexplicável, não tinha a mesma convicção que
tinha tido antes. Mas isso não importava nesse momento.
Recordou que, durante uns cinco meses após o rompimento, esteve
brigando ao menos duas vezes por dia. Perto do final, para ela tinha sido como
viver a beira de um precipício e ter um forte medo às alturas. Sentiu vontade
de chorar. Ela era a única pessoa que podia interceder pelo Tim diante Vito, e,
entretanto, também era o pior defensor que este podia ter tido.
O tempo não tinha diminuído a antipatia que Vito sentia por ela. Olhou-o
furtivamente e observou a crueldade de suas feições. Não, nunca poderiam ter
se separados em bons termos. Vito procedia de uma família orgulhosa e muito
rica. Tudo o que desejava ele obtinha.
—Retire a queixa contra Tim —lhe rogou ela.
—Por que tenho que fazer isso? De um ponto de vista meramente
mercantil, estaria fechando um trato muito desigual. Liberar seu irmão do

16
Lynne Graham Desejo sem amor

castigo que merece não fará que me sinta benevolente. Sua liberdade não vale
nada para mim. Quanto vale para você?
—Qualquer coisa... tudo —respondeu Ashley em voz baixa, estremecendo
enquanto pensava no Tim e na frágil estabilidade mental de sua mãe, assim
como em que só ela seria culpada se não convencesse Vito de que mudasse de
opinião.
—Vale o mesmo que a sua liberdade?
—Não compreendo.
—Qualquer coisa... tudo? Curioso —murmurou ele. —Se retornasse a
minha cama, provavelmente me convencesse para que retirasse a queixa.
—Isto não é engraçado, Vito —comentou ela, apertando as mãos.
—Não supunha que fosse — ele se sentou na borda de sua mesa. —Se
aceitar as minhas condições... todas as minhas condições — afirmou ele — seu
irmão ficará livre.
—Isso é indecente! —exclamou Ashley sem fôlego.
—Antes compartilhava minha cama sem amor. Também poderia fazê-lo
com ódio —indicou ele com tom cansado.
Ashley de novo apertou as mãos.
—Sua linguagem corporal resulta muito expressiva —comentou Vito. —
Leve uma parte desse fogo à cama e provavelmente me convença de comprar ao
seu irmão delinqüente uma Ferrari.
Ashley estremeceu de raiva. Como ele se atrevia a zombar assim dela?
Queria humilhá-la. Mas esse era o lado escuro de Vito, seu aspecto cruel,
vingativo.
Ele jogou a cabeça para trás e riu.
—Vamos querida. Uma vez me disse: «Se desejar muito algo, o
conseguirá». Assim agora mesmo o estou conseguindo.
—Mas não é possível que fale a sério...
—Precisaríamos nos casar...
—Por que demônios quer se casar comigo agora?
Ele sorriu com ironia.
—Você já sabe a resposta a essa pergunta, cara —repôs com ar
contemporizador. — Me disse o motivo, há quatro anos. Quero uma criada que
mantenha limpa minha casa, uma escrava que me dê massagens e uma mulher da
qual possa presumir. Além disso, quero ter sexo... sexo ilimitado, sempre que
desejar. Só o casamento poderia me proporcionar todos esses elementos
essenciais.

17
Lynne Graham Desejo sem amor

Ashley ficou sem fôlego. Fazia muito tempo que tinha esquecido essas
amargas palavras. Mas, ao que parecia, Vito não o tinha feito.
—Além disso, continuou ele — debaixo dessa roupa há um corpo perfeito
e uma mulher muito linda. Ainda quero possuir essa mulher. E por que não teria
que fazê-lo se tenho os meios ao meu alcance?
—Está louco! Completamente louco!
—Estou? —Vito a olhou com uma certa satisfação, que a fez estremecer-
se. —Está me dizendo que poderia ter você de outra maneira? Desejo-te,
Ashley. Tudo depende de você.
—Preferiria estar morta antes de me casar com você!
—É sua resposta definitiva?
Ashley se dirigiu até a porta. Uma vez ali, voltou-se para exclamar:
—Maldito porco vingativo! Espero que queime no inferno pelo que me
disse hoje!
—Eu te diria que «quando dois fogos incontroláveis se encontram,
consomem aquilo que alimenta sua fúria». Não leu “A fera domada”, Ashley?
Em sua pressa e desespero por ir embora, tropeçou com sua secretária.
—Como pode trabalhar para um porco machista que odeia às mulheres?
—perguntou à outra mulher.

Capítulo 3

“SEXO ilimitado, sempre que desejar...” Ashley apertou os dentes


enquanto saía do elevador. Soprando de raiva, abandonou o edifício. Perguntou-
se como Vito se atreveu a lhe falar dessa maneira.
«Bom, fez tudo que era possível, mas fracassou», disse a si mesmo. Em
sua mente apareceu o rosto aflito de Tim. Foi nesse preciso instante, em meio
da calçada cheia de gente, quando compreendeu a crua realidade da situação
em que Tim se encontrava. A ira que havia sentido desapareceu de repente.

18
Lynne Graham Desejo sem amor

Acaso pensava render-se e ver como levavam seu irmão à prisão?


Invadiu-a um sentimento de culpa. Ao menos, Vito tinha aceitado em vê-la. Mas
o que ela tinha feito? Em lugar de defender o Tim com tato e humildade, tinha
ido às nuvens e falado de assuntos pessoais que não tinham capacidade no
diálogo. Tinha acabado com a única esperança de conseguir a liberdade de Tim
devido a sua satisfação egoísta de provocar o Vito.
Sentiu náuseas. Com tantas coisas em jogo, só um lunático teria agido
como ela tinha feito.
Tim a tinha defendido. E por isso o tinham espancado e humilhado. A
raiva e o ressentimento de seu irmão se centraram em Vito, o homem a quem
ele considerava o responsável por todas as desgraças de sua irmã. Talvez lhe
tinha ocorrido levar a Ferrari de Vito e deixá-lo em alguma parte, para lhe dar
um bom susto.
Ashley estava convencida de que, levado pelo desejo de vingar-se, Tim
tinha se aventuroso em uma travessura tola e infantil, que concluiu em um
desastre. Entretanto, o tribunal não entenderia à provocação que durante
muitas semanas Tim tinha suportado.
«Não é responsável por tudo o que afunda a nossa família?», Susan a
tinha acusado.
Disse a si mesmo que quem violava as leis, pagava um preço. Quatro anos
antes, Ashley tinha se mudado ao apartamento de Vito, consciente de que
estava transgredindo os princípios morais de seu pai. Manteve-se desafiante
até o final e depois teve que pagar um alto preço, mas acabava de lhe ocorrer
que não foi a única que teve que pagar.
Ashley recordou a tremenda aflição que aquele período de sua vida tinha
causado a sua mãe. Mas isso não seria nada em comparação com o que teria que
suportar, ao saber que o filho que idolatrava iria à prisão. Era muito possível
que a crise levasse Sylvia Forrester a outra depressão nervosa. Tudo estava
nas mãos de Ashley.
Perguntou-se se ainda seria muito tarde. Teve que fazer um grande
esforço para armar-se de coragem e voltar a entrar no banco Cavalieri.
Ruborizada, aproximou-se da recepção. Uma das empregadas se dirigiu a ela.
—O senhor Cavalieri chamou para dizer que pode subir imediatamente,
senhorita Forrester.
Desconcertada, Ashley piscou. Como era possível que Vito a estivesse
esperando? Como podia saber que ela retornaria?
De novo no elevador, pensou que não tinha sentido que Vito lhe exigisse
que se casasse com ele. Ele não era um escravo do sexo. O demonstrou ao

19
Lynne Graham Desejo sem amor

abandoná-la para casar-se com outra mulher, desdenhando qualquer tentativa


para continuar com uma relação em que o casamento não seria o resultado final.
Além disso, perguntou-se, como era possível que ainda lhe parecesse
desejável?
—Como sabia que eu voltaria? —perguntou-lhe Ashley quando esteve de
novo em frente a Vito.
—Refere-se à fúria, a saída, o reaparecimento agressivo? Todo isso já
me resulta conhecido.
—Tem-me em suas mãos.
—É duro, mas verdadeiro —reconheceu ele.
—Que prazer poderia encontrar ao me obrigar a me casar com você? —
perguntou ela, frustrada. — Isso não é justo!
—A vida nem sempre é justa.
—Está me pedindo o impossível!
—Então, não temos nada mais do que falar.
—Poderíamos falar a respeito disto.
—Na realidade, temos muito que discutir. Almoçaremos em meu
apartamento.
—Almoçaremos?
—Tenho fome —indicou Vito, vestindo uma jaqueta.
—Acreditava que agora tinha uma casa aqui.
—Um apartamento é mais conveniente durante as horas de trabalho.
Um elevador privado os levou, do escritório de Vito, até um
estacionamento subterrâneo.
—Então... a que te dedica? —perguntou-lhe ele quando sua limusine se
abria passo entre outros carros. — Seu irmão não quis satisfazer minha
curiosidade quando nos conhecemos.
—A que me dedico?
—Seu trabalho —repôs ele com impaciência. — O trabalho que escolheu
para me substituir.
—OH —Ashley decidiu mentir. — Ao comércio varejista.
—Surpreende-me. Não era o campo que acreditava que escolheria.
Supunha que escolheria algo melhor.
Ashley encolheu de ombros. Não, não podia dizer-lhe seria a pior
humilhação. Se tivesse terminado seus estudos de contabilidade, já levaria um
ano trabalhando e recebendo um salário. Por que dizer a Vito que ele sempre
teve razão?

20
Lynne Graham Desejo sem amor

Contra os conselhos de todos, escolheu a contabilidade. Mas tinha


tomado a decisão de dedicar-se aos negócios e demonstrar a seu pai que podia
triunfar em uma disciplina dominada pelos homens. Obstinada como era,
fracassou antes de enfrentar-se à verdade, embora ainda acreditava que se
Vito não a tivesse abandonado um mês antes do começo de seus exames; e se
não tivesse sofrido o trauma de sua gravidez, ao menos teria superado esses
testes.
Adorava trabalhar com crianças. Era uma inclinação natural que tinha
reprimido durante sua adolescência. Atualmente estava estudando para
conseguir um título, com a esperança de poder graduar-se como professora. E
todo isso, deu-se conta de repente, estava a ponto de terminar. Sua vida
ficaria destruída pela segunda vez, pelo simples feito de que Vito desejava
vingar-se.
—É provável que tenha algum problema para deixar o emprego?
—Nenhum. Mas ainda não entendo por que quer se casar comigo.
—Tenho uma razão importante que ainda não compartilhei com você.
Acredito que se alegrará quando souber.
—Diga-me agora.
—Prefiro a intimidade do apartamento.
O apartamento não era o que tinham compartilhado antes. Era menor,
mobiliado em um estilo mais formal.
Voltou a sentir-se incômoda; não lhe acontecia isso desde quatro anos
atrás.
Um assistente lhes serviu a comida. Embora Ashley quase não tinha
comido desde a detenção do Tim, mal provou bocado. Vito, em troca, comeu
com apetite. Serviram-lhes o café no amplo salão.
—Bem, falemos então —repôs ela, sentada no sofá —a respeito dessa
razão tão importante que tem para desejar se casar comigo.
—Certamente, não estou pensando em um compromisso para toda a vida.
Mas acredito que poderia valer cada libra que me custou o que seu irmão fez.
—Como? —perguntou ela, cada vez mais nervosa.
Vito continuou olhando-a com atenção.
—Só há uma coisa que desejo na vida, mas que até agora o destino me
negou.
—As pérolas da Coroa? —brincou ela.
—Quero um filho.
Aquilo caiu em Ashley como um golpe no estômago. A jovem ficou
petrificada.

21
Lynne Graham Desejo sem amor

Perguntou-se se Vito estaria informado do bebê que ela tinha perdido.


Imediatamente se disse que não havia maneira de que ele se inteirasse de sua
gravidez, anos atrás.
—Não tem filhos? —viu-se obrigada a perguntar.
—Seis meses depois de nosso casamento, Carina caiu doente —respondeu
Vito a contra gosto. — Tinha leucemia. Certamente devido ao tratamento a que
foi submetida, não havia nenhuma possibilidade de conceber um filho.
Ashley estava comocionada. Não tinha lhe ocorrido perguntar por que
Carina tinha morrido tão jovem. Supôs que havia falecido em algum acidente de
carro. Aquilo era totalmente diferente.
—Sinto muito —declarou aturdida, ainda muito confusa para entender o
que lhe estava dizendo.
—Por que teria que sentir?
—Porque não sou insensível! —exclamou ela, furiosa. —A minha
compreensão é menos aceitável que a de outras pessoas?
—Sim. De algum modo é.
—O que tem que ver comigo o fato de que deseje ter um filho?
—Estou disposto a me casar com você para que você possa me dar esse
filho.
—Está louco! —exclamou ela, sem fôlego.
—Não vejo que seja um pedido impossível. É obvio, não é nada insensata.
É perfeitamente adequada para desempenhar o papel de uma mãe. Você não
quer ter seus próprios filhos. Depois do nascimento da criança nos,
divorciaríamos e ficaria livre para continuar sua vida a seu gosto, sem nenhuma
intromissão da minha parte.
Tremendo, Ashley passou uma mão pelo cabelo e o olhou fixamente, com
incredulidade.
—Devo estar sonhando —lhe espetou. —É a sugestão mais indecente que
ouvi em minha vida! Poderia se casar com outra mulher, estou certa disso.
—Mas não quero outra esposa —declarou Vito, sorrindo — Tampouco uma
esposa «para sempre». Seria injusto que me casasse com outra mulher só para
ter um filho.
—Mas não te parece injusto fazer isso comigo!
—Em nossa relação não haveria simulações. Além disso, você nem sequer
gosta de criança. Nunca teve intenção de assumir essa responsabilidade ou de
arriscar seu trabalho para ter uma família. Tudo isto foi o que me disse há
quatro anos.

22
Lynne Graham Desejo sem amor

Ela desejava lhe gritar que na época tinha dezenove anos. Desgostava-
lhe a idéia mesma da gravidez, depois de ver como declinava a saúde de sua
mãe, ao cabo de uma longa série de abortos, em sua tentativa por ter o filho
varão que seu marido tanto desejava.
—Mas ainda pode se casar dentro de vários anos.
—E talvez nunca conheça a mulher com a qual deseje me casar. Além
dessa possibilidade —replicou ele — não tenho desejo de ser um pai com idade
avançada. O meu tinha quase cinqüenta anos quando eu nasci e já morreu.
Nunca fomos muito unidos.
Vito nunca tinha contado a Ashley esse detalhe a respeito da idade de
seu pai. Sem dúvida Elena di Cavalieri era ao menos trinta anos mais nova que
seu marido. «Se Vito soubesse que tinha estado tão perto de converter-se em
pai...», pensou a jovem, alarmada. Mas imediatamente se disse que isso não
tinha ocorrido, ao recordar o pouco que durou sua gravidez.
—Nunca pensei que me considerasse digna da honra de te dar um
herdeiro —assinalou ela, aterrada de perder o domínio de si mesmo, — depois
de conhecer a opinião que segue tendo de mim.
Vito apertou os lábios.
—É muito atraente, inteligente e valorosa.
—Quer dizer que como mãe em potencial sou perfeita, mas não como
mulher!
—Parece-me que não disse isso.
—Mas é o que deu a entender! Acha que para uma verdadeira mulher,
um homem é o mais importante, inclusive mais que ela mesma!
—Em seu caso, tudo o que sei é que eu não era o homem capaz de te
convencer de que fizesse o menor sacrifício por mim.
—O menor sacrifício? Pedia-me que partíssemos para a Itália, que
deixasse meus estudos e toda esperança de ter um trabalho próprio, que me
casasse com você contra meus instintos e princípios mais básicos, e que te
proporcionasse filhos com a eficiência de um coelho! Durante todos esses
meses acreditava entender como me sentia...
—Mostrei-me bastante paciente e discreto.
—Foi retorcido e pouco íntegro!
—Estava comprometendo minhas próprias convicções em uma tentativa
para salvar nossa relação. Houve ocasiões em que cheguei a desejar utilizar a
força física para te obrigar a que me escutasse!

23
Lynne Graham Desejo sem amor

—Sempre te disse que a única classe de mulher que te convinha era um


robô! —exclamou Ashley, recolhendo sua bolsa. — Basta! Eu não gostaria de te
dizer exatamente o que penso de tua proposta.
—Se sair agora mesmo por essa porta, seu irmão irá à prisão!
Ao chegar à porta, Ashley ficou paralisada.
—Filho de...! —exclamou ofegante.
—Sou o que fez de mim —respondeu Vito em voz muito baixa. —Sou o
homem que te deu sexo, mas não a convenceu de que chegássemos a um
compromisso permanente.
Ashley agarrou a xícara de café e a jogou.
—Como se atreve a me falar assim? —inquiriu, bufando de raiva.
A xícara se estrelou contra a borda da chaminé, mas seu conteúdo se
derramou sobre a jaqueta de Vito. «Ele mereceu», pensou ela.
—Uma vez meu pai me assegurou que um cavalheiro sempre seria incapaz
de bater em uma dama —murmurou Vito. —Entretanto, acredito que agora
mesmo deveria me desforrar. Depois de tudo, não há nenhuma dama nesta
habitação.
—Se puser um dedo em cima...
Ashley se deteve quando bateram na porta e entrou um assistente para
lhes oferecer uma segunda xícara de café.
—Obrigado —indicou Vito. — Mas já me fartei de café.
Quando a porta se fechou, Vito agarrou Ashley pelas mãos e a puxou
para si.
—Me solte! —exclamou furiosa, mas ele não fez conta.
Decidida, começou a lutar. Então Vito a levantou e a sacudiu no ar, como
se fosse uma boneca de pano.
—Se quer se comportar como um animal selvagem, eu adorarei te colocar
em uma jaula —repôs ele, pondo-a de novo no chão, de pé.
Seus olhares se encontraram. A luta final tinha terminado, e ela tinha
resultado derrotada. Vito a tinha nesse momento onde sempre quis tê-la: em
seu poder.
Ainda não a tinha soltado, mas a apertava contra si, um contato que ela
tratava desesperadamente de evitar.
—Me deixe em paz! —exigiu Ashley.
Vito enredou os dedos em seu cabelo e a obrigou a jogar a cabeça para
trás.
—Está agindo como um...

24
Lynne Graham Desejo sem amor

—Um macho excitado? —inquiriu ele, sorrindo. —É obvio que estou...


...muito excitado.
—Vito... não!
Mas ele já tinha pressionado os lábios contra seu pescoço. Ashley gemeu
e começou a estremecer. Vito introduziu a ponta da língua entre seus lábios
meio fechados.
Muito a seu pesar, o desejo foi apoderando-se de Ashley. Pouco a pouco
o segurou pelos ombros e abriu os lábios.
Vito a beijou do mesmo modo em que fazia amor: com paixão e
intensidade sexual. Moveu-se contra ela com o erotismo de um felino da selva,
deixando que Ashley sentisse sua masculinidade. Ela cedeu e se abandonou à
força de seu desejo. De repente, ele a levantou nos braços e saiu com ela da
habitação.
—Tire o resto do dia livre. — Ashley ouviu que ele ordenava a alguém.
Logo se deu conta de que Vito a estava colocando em uma cama. Abriu os
olhos e o olhou à cara. Em sua expressão reconheceu o desejo que ela conhecia
tão bem.
—Parece que é a primeira vez, e que voltamos ao começo —assinalou Vito
com voz rouca. — Só que agora está usando muita roupa.
Deslizou as mãos debaixo da camiseta que ela usava. Ashley deixou
escapar um longo suspiro quando Vito se apoderou de seus seios, deslizando os
polegares pelos mamilos.
A jovem ficou paralisada. Já não era uma adolescente com os hormônios
muito ativos. Como podia deixar que Vito lhe fizesse isso? Olhou-o à cara,
procurando uma resposta ao inexplicável.
As mãos de Vito deixaram de mover-se.
—Nada mudou, não é verdade, cara? Temos uma insaciável avidez mútua.
Algo tão capitalista que nem sequer acreditava que existisse até que te
conheci. Não tive o suficiente com a última vez.
Ashley fez outra fraca tentativa por soltar-se.
—E que alívio é estar com uma mulher que acredita que pode fazer amor
com tanta naturalidade como um homem; que não espera que a cortejem e se
apaixonem, e que certamente nunca lhe ocorreria me exigir que fizesse algo
tão aborrecido e convencional como esperar até depois das núpcias —continuou.
Algo parecido ao pânico se apoderou perigosamente de Ashley.
—Aconteceu algo? —perguntou-lhe ele.
Aconteciam muitíssimas coisas. Recordou o ocorrido quatro anos atrás.
«É pura química, é por causa de minha idade, é uma simples teimosia», havia-se

25
Lynne Graham Desejo sem amor

dito então. «Não o amo, não o necessito». Assim ela se defendeu. E tinha se
comportado de acordo com isso.
Certamente, não tinha se comportado dessa forma sem alguma
justificação. Mas Vito se comportou como se fosse dono dela, pois pensava que
a liberação não tinha nada que ver com o sexo feminino. Ao vê-lo nesse
momento tão tranqüilo, para Ashley resultava difícil recordar a violência de
suas discussões, assim como o ciúme e a atitude possessiva que demonstrou
quando ela se atreveu a lhe dizer que não tinha direito a ordenar cada um de
seus movimentos.
—«Se desejar muito algo, conseguirá» —repôs Vito, desafiante. — Não
pode me dizer que não têm vontade de fazer amor, porque sei que não é
verdade.
—Pare de repetir todas as tolices que digo! —exclamou ela, mas voltou a
render-se quando Vito deslizou um dedo por seu seio.
—Então admite que diz algumas tolices. Ou será que admitiria algo, antes
que compartilhar a cama comigo?
Desesperada, Ashley se perguntou se compartilhar sua cama era o
método que Vito utilizava para selar o trato ou se simplesmente queria
humilhá-la. Se a liberdade de seu irmão ia depender disso, o que devia fazer?
—Nunca fui promíscua —declarou ela.
E, sem nenhuma advertência, quarenta e oito horas de preocupação,
vigília e falta de apetite, de repente surtiram seu efeito. Ashley explodiu em
soluços. Desejava estar sozinha, mas Vito a segurou antes que ela pudesse
levantar-se da cama.
—Me solte! —exclamou ela, soluçando.
—Como posso fazê-lo? —a tomou em seus braços.
—Já não suporto mais! Não sou nenhuma vadia.
—Não, tem muita atitude e muita classe —lhe assegurou Vito
imediatamente, enquanto lhe afastava o cabelo da testa com gesto consolador.
—Não... não posso estar com você neste momento e você sabe! —
exclamou ela. —Nunca choro! Desprezo às mulheres que choram!
Ele murmurou algumas palavras tranqüilizadoras em italiano e ela chorou
ainda mais porque, no fundo, adorava que ele a consolasse. Seu aroma
masculino, tão conhecido, envolveu-a. Não podia recordar quando foi a última
vez que alguém a tinha abraçado... talvez tinha sido mesmo o Vito...
Ele deslizou um dedo por uma de suas úmidas bochechas, e Ashley não se
moveu. Estava cômoda, e quando Vito a pôs sobre o sofá, ao pé da cama, de

26
Lynne Graham Desejo sem amor

maneira inconsciente se apertou contra ele. Esgotada, negou-se a analisar a


incongruência de sua conduta.
—Deveria te pedir desculpas —assinalou Vito, vacilante. —Às vezes
provoca em mim algo que eu não gosto muito. Não lute contra mim. Se o fizer,
resultará machucada.
—Sempre chuta às pessoas quando estão no chão?
—Não está no chão —assegurou ele, ficando de pé. — Só está voltando a
carregar suas pilhas. Sugiro que se mude para este apartamento enquanto
estiver fora.
—Fora?
—Vou à Genebra dentro de duas horas. Voltarei à semana que vem.
Provavelmente te leve a ópera.
—E Tim? —perguntou ela.
—Entrarei em contato com a polícia.
—Serei uma esposa desprezível, Vito.
—Considera-o como um acordo comercial, um intercâmbio que beneficia
nós dois. Se te esforçar para não ser uma esposa detestável, eu me esforçarei
no mesmo sentido. Portanto, será a única responsável pelo que aconteça entre
nós depois do casamento.
Ashley lhe dirigiu um olhar de desprezo. Vito já estava falando no
telefone, e insensível ante a atitude dela, pedia que lhe preparasse o carro.
Virtualmente o nosso será um casamento normal.
—Se vivêssemos em um manicômio, suponho que sim.
Ele sorriu divertido.
—Sabia que não demoraria muito tempo em voltar a carregar suas pilhas.
Ah, sim, antes que vá, uma coisa mais. Tem as normas de procedimento.
—Como diz?
—Espero que se mostre agradável com minha família. Também espero
que se vista de acordo com sua posição social. Arrumaremos isso à semana que
vem.
Ela apertou os lábios.
—E, por último, nada de homens, nada de paqueras, nada de amigos. Se
violar a lei, a vida não te parecerá digna de ser vivida, asseguro-lhe isso, cara.

27
Lynne Graham Desejo sem amor

Capítulo 4

—De verdade quer que acredite que me agradece por tê-los reunido de
novo? —perguntou-Tim a Ashley.
Igual a ela, Tim era perspicaz. E diferente de Susan, não tinha
acreditado no que lhe contou. A garota também tinha tido que insistir muito
para convencer seu irmão de que não fora ver Vito para lhe expressar suas
desculpas e seu agradecimento. Tinha-o convencido de que lhe escrevesse uma
carta.
—Acha que desta vez poderia terminar se casando com ele? —perguntou-
lhe Tim.
—É muito cedo para saber.
Tim sacudiu a cabeça.
—Mas deve estar muito apaixonado por você para ter me perdoado...
Ashley sorriu ao pensar que essa era a maneira adequada de tratar o
Tim. Não queria que seu irmão se preocupasse com ela. Seus pais tinham
retornado da Nova Zelândia e não tinham a menor idéia de que poderiam ter
tido uma volta muito mais traumática.
—Quando voltar para casa vou vender meu carro e enviarei o dinheiro a
Vito.
—Não pode fazer isso. Papai vai querer saber por que!
—Não posso pagar o Vito integralmente, mas devo fazer o que puder.
—O seguro não lhe pagará?
—Isso não tem nada que ver. Não posso esquecer o que fiz a seu carro.
Não posso me comportar como se não fosse responsabilidade minha só porque
você me tirou do apuro.
—Vai contar a verdade a papai —supôs ela, segura de que terminariam
lhe jogando a culpa.
Pouco depois, Ashley se dirigiu ao apartamento de Vito. Embora ainda
não se instalou ali, tinha levado suas coisas essa mesma manhã, antes de passar
o dia com o Tim. Pensou que, se fosse inteligente, provavelmente o casamento
não aconteceria. O primeiro passo consistia em instalar-se no apartamento e
não provocar outra briga com Vito. E o seguinte passo? Quando ela terminasse
de lhe dizer que era pouco provável que lhe desse um filho em um tempo
razoável, talvez ele mudaria de opinião quanto a sua proposta.

28
Lynne Graham Desejo sem amor

Perguntou-se pela intensidade do desejo de Vito de ter um filho e


herdeiro e até onde chegaria seu desejo de vingança. Ashley não punha em
dúvida a importância que isso tinha para ele. Seu próprio pai tinha estado
obcecado por ter um filho varão. O dia em que Ashley nasceu, outra filha em
lugar do filho que tanto tinha desejado, Hunt Forrester saiu do hospital e não
voltou a aparecer até que chegou a hora de levar sua esposa e a recém-nascida
para casa.
Ashley entrou no apartamento e logo se dirigiu ao quarto menor que
tinha escolhido para ela. Deteve-se de repente; ali não estavam suas malas.
Abriu o armário e só encontrou uma roupa que não conhecia. O mesmo ocorreu
quando abriu as gavetas da cômoda.
—Onde demônio esteve?
Surpreendida, Ashley se voltou rapidamente. Tinha acreditado que
estava sozinha no apartamento, mas Vito se encontrava na porta. Olhou-a de
cima a baixo.
—Acreditei que ainda estava em Genebra!
—Estive tratando de entrar em contato com você ligando para cá há
cinco dias! Assim volto a perguntar: onde esteve? Acaba de trazer suas coisas
esta mesma manhã.
Ashley encolheu de ombros.
—Mas onde estão?
—Desfiz-me delas.
—O que diz?
—Desfiz-me de toda a roupa que tinha.
—Não acredito.
Vito abriu o armário.
—Fui às compras em Genebra. Veste-se muito mal; necessitava de roupas
novas. Em efeito, a única vez que te vi bem vestida foi à noite em que nos
conhecemos. Só põe camisetas, calças muito grandes e botas. Por alguma
estranha razão, despreza sua própria feminilidade...
—Isso não é verdade...
—Devia está cego a quatro anos. Você não gosta de ser mulher —Vito a
olhou com calma.
Ashley se sentiu como se ele a tivesse despido de repente. Sua
feminilidade nunca tinha sido causa de orgulho ou celebração, dentro de uma
família em que ser mulher tinha sido uma séria desvantagem.
Olhou dentro do armário.

29
Lynne Graham Desejo sem amor

—Então por fim encontrou uma boneca de carne e osso a qual vestir —
assinalou. — Mas lembre-se que a mulher de fantasia que criou só será pura
aparência. No fundo seguirei sendo eu.
—Quero que desenvolva suas possibilidades.
«Como um bom investimento», pensou ela enquanto abria distraidamente
uma gaveta. Roupa nunca tinha importado a Ashley. Ele nunca tinha gostado da
maneira em que ela se vestia. Entretanto, sentia-se muito doída.
—Diga-me: a perspectiva de usar seda e renda em minha cama a
incomoda tanto?
Ashley sabia que Vito estava tratando de salvar as aparências; era
consciente de que a tinha ferido.
—Não me incomoda tanto —respondeu.
Entretanto, sim a incomodava. Pensou que era como se ela mesma
estivesse confabulando com Vito, animando-o a tratá-la como um objeto sexual,
cuja única meta na vida fosse agradar a seu dono e senhor.
—O resto de suas coisas está ali —declarou ele, assinalando uma caixa
que estava em um canto. Estava cheia de álbuns de fotografias, jornais, suas
coisas verdadeiramente pessoais.
—Quem o fez?
—Eu.
A confissão não a incomodou tanto como tinha suposto. Vito nunca
bisbilhotava; sempre tinha respeitado sua intimidade. E Ashley sempre tinha
acreditado em que ele não a defraudaria.
Por isso se sentiu tão ferida quando ele se casou com Carina. Vito lhe
havia dito que a amava e que sempre o faria; que fizesse o que fizesse, esse
amor sempre estaria ali. E Ashley começou a acreditar. Mas só eram palavras.
Ela não sabia quando Vito partiu; pensava que voltaria uma vez que se
acalmasse. Mas em vez disso, casou-se com outra mulher. Depois dessa traição,
Ashley acreditava que não voltaria a ter valor para amar alguém.
—Se formos jantar antes da ópera, será melhor que troque de roupa.
—Por que não escolhe algo para mim? —perguntou ela com tom mordaz. —
Isso é o que se faz com uma boneca.
Indiferente a seu comentário, Vito jogou um vestido de noite, negro,
sobre a cama. Era um modelo esplêndido. A jovem pensou que certamente lhe
havia custado uma fortuna.
—Há algo que deveria saber antes de se casar comigo —disse ela de
repente.
—A semana passada chegamos a um acordo.

30
Lynne Graham Desejo sem amor

—Não poderei te dar um filho! —confessou-lhe ela com dor.


—Quer dizer que não está disposta a ter meu filho?
—Não, não é isso o que quero dizer. As mulheres de minha família... —
vacilou, mas logo se obrigou a continuar, — não somos muito eficientes para ter
filhos. Susan nem sequer tomou a moléstia de tentá-lo. Minha mãe teve três
filhos, mas também onze abortos...
—Embora essa informação resulta inquietante, não entendo o que tem
que ver conosco...
—Me leve a um médico, então! Você verá que ele te dirá que não sou boa
candidata para ser mãe!
Vito fez uma careta.
—Não é uma égua de criação, mais sim uma mulher. Terá que dar uma
oportunidade à natureza.
—Não quer me escutar, não é verdade?
—Acredito que faria e diria qualquer coisa para não se casar comigo.
Ashley mordeu o lábio inferior. Elevou a vista e descobriu que Vito a
olhava com evidente sensualidade. Com dificuldade afastou o olhar dele.
—Mas como... isso não te incomoda?
—Absolutamente. Já tenho o que quero.
Quando ele saiu, Ashley estremeceu. Efetivamente, Vito a tinha na palma
da mão. Assim se ela continuasse brigando, ele fecharia a mão.
Tomou uma ducha rápida. Logo vestiu o vestido negro, sentou-se diante
da penteadeira e passou uma escova pelo cabelo. Não queria olhar-se no
espelho. O luxuoso modelo se ajustava a suas perfeitas curvas. Por estranho
que parecesse, também vestia negro na noite em que se conheceram...
E de repente, encontrou-se de novo na véspera do Ano Novo, no princípio
da noite que mudou toda sua vida. Estava sozinha, compadecendo-se de si
mesmo. Todas suas companheiras de apartamento se encontravam com suas
famílias, mas Ashley tinha tido uma briga espantosa com seu pai no primeiro dia
depois de Natal. À manhã seguinte tomou o trem de volta a Londres, consciente
de que uma vez que partisse, seu pai voltaria a acalmar-se.
Uma das amigas de suas companheiras de apartamento a abordou.
tratava-se de Phoebe, uma garota frívola que passava o tempo na universidade,
até que algum jovem adequado lhe declarasse amor. Tinha um convite para ir a
uma grande festa. Outra garota tinha faltado e ela não queria ir sozinha.
Era a festa mais importante do ano, conforme lhe disse Phoebe. Iriam
muitos ricos e famosos. Ashley decidiu que seria divertido ver como se divertia

31
Lynne Graham Desejo sem amor

a classe alta. Phoebe lhe emprestou um vestido negro. Ao olhar-se no espelho,


Ashley ficou surpreendida por sua própria aparência.
—Céus! Chamará a atenção de todo o mundo! —exclamou Phoebe.
Uma vez no táxi, sua acompanhante lhe aconselhou:
—Não diga que é estudante. Diga que é secretária ou algo assim, mas não
revele sua idade. As adolescentes não estão muito solicitadas.
A festa se celebrava em um hotel. Phoebe não demorou em encontrar o
homem ao qual tinha ido procurar e desapareceu entre a multidão. Ashley se
viu rodeada por vários jovens, e não pôde menos que se emocionar ante os
cuidados que recebia.
Quando se encontrara sentada ante uma mesa, em companhia de um
jovem, um garçom lhe entregou uma preciosa taça, da parte de um
desconhecido. A jovem ficou sem fôlego.
—Não é possível que seja para mim —repôs.
—Para a dama da mesa vinte e dois —insistiu o garçom.
Em seguida chegou a garrafa de champanha. Seu companheiro começou a
zangar-se.
—O que aconteceu? —perguntou com voz queixosa.
—Alguém deve ter cometido um erro —declarou ela, tocando a pequena
taça.
—Que diabos deseja agora? —perguntou seu acompanhante quando o
sorridente empregado apareceu pela terceira vez. Pôs diante dela um cartão.
—O cavalheiro deseja que o acompanhe à mesa, madame.
—Está sentado em uma cadeira de rodas?
—Não, madame. Sua mesa é a número três.
Ela jogou uma olhada no nome, enrugou o cartão e a jogou em um
cinzeiro. Foi seu acompanhante quem o resgatou.
—Vito di Cavalieri?
—Nunca ouvi falar dele —assinalou ela, reprimindo um bocejo.
—Não conheço ninguém que não tenha ouvido falar de Vito di Cavalieri —
a olhou como se suspeitasse que era uma intrusa. Ele tem uma má reputação
com as mulheres.
—Não me importo com isso
Seu acompanhante se levantou e partiu, furioso.
A emocionava o estilo que Vito tinha empregado para apresentar-se.
Ashley morria de curiosidade. Subiu os degraus da pista de dança,
esforçando-se por parecer indiferente, com a única intenção era de olhá-lo
furtivamente. Mas Vito se aproximou dela.

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Lynne Graham Desejo sem amor

—Por que não me convidou para dançar? —repôs ela, entre dentes.
—Não vou competir com uma multidão —a envolveu com o olhar. A carga
de sexualidade que continha foi tão forte que ela se sentiu enjoada.
—E se eu não tivesse subido aqui...?
—Teria ido lhe buscar —lhe respondeu em voz baixa ao mesmo tempo em
que lhe beijava a mão. Ashley começou a derreter-se.
Na única ocasião em que viu a Giulia, a irmã adolescente de Vito, esta
quis saber como se conheceram. Ashley lhe contou a verdade e Giulia se negou
a acreditar.
—Deve estar brincando —insistiu a outra jovem. — Vito é o tipo mais
aborrecido e convencional que existe. Nunca se separa do trabalho e de sua
devoção ao banco. É incrivelmente antiquado... por isso Carina lhe convém, e
quando se casar com ela...
Giulia ruborizou e rapidamente trocou de assunto. Essa foi a primeira
vez que ouviu o nome de Carina, mas não a última. Carina era virtualmente um
membro da família de Vito, filha de uns amigos íntimos.
Rindo, um dia Vito confessou a Ashley que seus pais tinham a esperança
de que se casasse com Carina.
Ashley se perguntou por que não fugiu nesse momento, quatro anos
atrás. Disse-lhe que trabalhava como secretária e acrescentou quatro anos a
sua idade. Nunca tinha tido problemas para manter a seus namorados sob
controle. No geral, era ela quem tinha o caráter mais forte.
Mas desde o primeiro momento foi Vito quem teve o comando durante
sua primeira conversa. Era um desafio para ela. Admitia que se mostrou
bastante provocadora uma ou duas vezes. Além disso, tinha bebido muito
champanhe.
Ele beijou-a enquanto dançavam; esse beijo a fez arder por completo.
Saiu na noite, e de repente se encontrou no interior de uma limusine com
chofer e de novo nos braços de Vito, vítima de um doloroso desejo de
constante contato físico. Deixou os sapatos de Phoebe no elevador, quando
subiam ao apartamento de Vito. E perdeu o vestido na entrada.
—Toda minha vida estive sonhando encontrar uma mulher como você —
declarou ele ao mesmo tempo em que lhe tirava uma meia, depois de entrar no
quarto. — E agora que ao fim te encontrei, nunca te deixarei partir. Quanta
paixão... quanta espontaneidade...
Mas essa paixão e espontaneidade resultaram incômodas à manhã
seguinte. Vito ficou paralisado quando viu as manchas de sangue sobre o lençol.
Comportou-se mais como um juiz que como um amante. Como pôde ter deixado

33
Lynne Graham Desejo sem amor

que a tratasse assim? Não se dava conta de quão preciosa era a virgindade?
Tinha-lhe perguntado Vito. Além disso, que idade tinha? À luz do dia não
parecia ter vinte e três anos.
Ao descobrir que era pouco mais que uma adolescente, Vito ficou pálido.
Nu, ficou a passear pela habitação, dizendo blasfêmia em italiano, mas
utilizando o inglês suficiente para assegurar-se de que ela entendesse o motivo
de sua fúria. E o essencial da mensagem consistiu em que ela era muito
estúpida para cuidar de si mesmo. Com arrogância, disse-lhe que tinha tido
muita sorte ao conhecer alguém como ele.
Estremecendo de vergonha e raiva, Ashley se envolveu em um lençol e
começou a recolher sua roupa.
—O que está fazendo? —perguntou-lhe Vito.
—Vou para casa.
—Mas precisamos conversar —ele pareceu assombrado ante sua atitude.
—É o habitual depois de uma aventura de uma noite? —perguntou ela com
amargura.
—Não é isso! —exclamou Vito. — Nunca em minha vida tive aventuras de
uma noite. Deus, que tipo de homem acha que sou? Ontem à noite houve algo
mais que sexo.
—Sim?
—Como esperava que reagisse hoje? Mentiu-me. Se soubesse que era
virgem, nunca teria me deitado com você. Devia está louco. Nem sequer tomei
precauções quando fizemos amor. Nunca fui tão irresponsável. Poderia ter
ficado grávida...
—OH, acredito que não. Estou tomando pílula.
—Mas...
Viu que os traços de Vito se endureciam quando chegou à conclusão que
ela esperava: que tinha se preparado para qualquer amante e que simplesmente
tinha escolhido a ele. Na realidade estava tomando anticoncepcional para
corrigir irregularidades em seu ciclo menstrual.

Ao voltar para a realidade, pensou com tristeza que foi nesse momento
que começou a fingir. No dia que se conheceram, negou-se a deixar que Vito
descobrisse sua confusão e vulnerabilidade. Só queria escapar. Ficou furiosa
consigo mesma e com ele, mas também sabia que o acontecido na noite anterior
tinha sido mútuo, um pouco incrivelmente poderoso e especial. Mas esses
sentimentos a assustaram.
Quando estavam no carro, ela assinalou:

34
Lynne Graham Desejo sem amor

—Sua família não me aceitará. Há quatro anos pensavam que eu era só


uma garçonete com a qual se divertia!
—Por que diz que provavelmente pensem isso de você?
Ashley não quis comentar nada a respeito da visita da mãe de Vito. Isso
também teria sido muito degradante. Não era que Elena di Cavalieri tivesse
sido grosseira; o que mais doeu em Ashley foi seu evidente desespero quando
tratava de convencê-la de que destroçaria a vida de Vito se se casasse com ele.
—Ashley, eu fiz uma pergunta.
—Porque isso era o que pensavam de mim.
—E isso influiu em sua resposta a minha proposta de casamento?
«Proposta?», perguntou Ashley. Conteve uma gargalhada de desprezo
ante aquele eufemismo. Vito lhe recordou que tinha estado compartilhando a
cama com ele durante cinco meses. E o que ele desejava era uma esposa e uma
futura mãe para seus filhos.
—Ashley —insistiu ele.
—Não influiu em mim. Eu não queria me casar com você.
Entretanto, Ashley sabia que isso não era totalmente verdade. Dois dias
depois de descobrir sobre a gravidez, ela ligou para Vito, que se encontrava na
Itália. Foi Giulia quem respondeu a chamada e lhe disse, incômoda, que seu
irmão estava celebrando sua festa de noivado. Ashley desligou sem responder;
estava tão surpresa que não soube o que dizer.
—Mas desta vez se casará comigo. E muito provavelmente não será tão
presunçosa quando esse casamento acabar.
—Eu não sou presunçosa! —exclamou Ashley com veemência.
Vito a olhou com total desprezo.
—Vou tirá-la dessa concha de agressividade em que vive.
—Se o fizer, odiarei-te mais do que já o odeio!
—Então já não tenho nada mais a perder.
Jantaram em Park Lane. Ashley pediu sua refeição. Vito nem sequer se
alterou. Enquanto comia, sentiu-se menos tensa.
Logo descobriu que ele a olhava fixamente.
—O que aconteceu? —perguntou—Por que me olha assim?
Vito pôs o guardanapo junto ao prato.
—Acredito que é hora de que voltemos para o assunto que te permiti
esquecer antes —assinalou ele em voz muito baixa. — Onde esteve hoje?
Ela franziu o cenho, desconcertada.
—Passei o dia com o Tim. Ele foi para casa para estudar para seus
exames.

35
Lynne Graham Desejo sem amor

A raiva com que Vito a olhou a fez acovardar-se.


—Está mentindo —lhe espetou ele com tom ameaçador. — Esta manhã,
quando encontrei suas malas no apartamento, liguei para sua irmã para saber se
você estava com ela. Disse-me que seu irmão tinha pegado o trem para casa,
umas horas antes...
Imediatamente, Ashley compreendeu que Tim havia dito uma mentira
inocente a sua irmã, antes que se arriscar a ofender Susan lhe contando que
pensava passar seu último dia com Ashley e não com ela.
—Queria pegar o trem antes. Passamos o dia juntos e...
—Então, sem dúvida ele te deu essa dentada no pescoço observou ele
com amargura.
—Dentada? —repetiu ela e levou uma mão ao pescoço.
Vagamente recordou ter tentado tirar algo de uma mala aberta. Deu-se
um golpe com a fechadura, esfregou a ferida e não demorou em esquecer-se
desse pequeno incidente enquanto seguia guardando as coisas.
—Vadia...! exclamou Vito em um tom tão violento que lhe gelou o sangue
nas veias. —Passou o dia na cama com seu amante...
—Isso... isso é mentira —gaguejou Ashley sem saber o que dizer.
—E se eu não tivesse visto a prova, nunca teria sabido —grunhiu ele e
pediu a conta. — Terminaremos o vinho — anunciou, apertando os dentes.
—Vito, por favor... vamos sair daqui.
Tornando-se para trás na cadeira, ele sorriu sem humor.
—Não —murmurou. —Vai me escutar, e aqui ao menos está segura. Lá
fora estaria em considerável perigo.
—Vito... —pediu com tom suplicante, aterrada. Nunca o tinha visto tão
zangado.
—Fui muito tolerante com você. Sempre fui. Esta tarde me acusou de
tratar de inventar uma mulher ideal. Não o é e jamais será. Necessitaria de um
milagre para isso. Não pensava tirar este assunto agora, mas como decidiu me
recordar da maneira mais crua possível o que é, não posso deixar passar este
momento...
—Não sei do que está falando.
—De novo demonstrou o que é. Há quatro anos saiu do meu apartamento
vinte e quatro horas depois de minha partida. E aonde foi? Não voltou para a
habitação que você tinha alugada, não é verdade? Foi diretamente à cama com
outro homem...

36
Lynne Graham Desejo sem amor

—Não! —exclamou ela. Quando algumas pessoas que estavam em uma


mesa próxima se voltaram para eles, mordeu a língua e fechou os olhos,
esforçando-se por dominar-se.
—Não era um homem, não é verdade? Era só um menino.
—Só era um amigo.
—Então você também gosta de se deitar com seus amigos. Em questão de
horas foi de minha cama à dele. Como descreveria uma mulher que se comporta
assim?
—Está equivocado...
—Não. Preferiria estar equivocado, mas não é assim. Sim, um mês depois
de viver com ele marcou uma consulta em uma clínica para resolver o pequeno
problema que tinha surgido. E acabou com esse pequeno problema sem
remorsos, não é verdade?
Ashley inclinou a cabeça, sem poder falar. Se tivesse aberto a boca,
teria se derrubado. Estava tão comocionada que nem sequer podia pensar. Mais
tarde, não recordaria ter saído do restaurante.

Capítulo 5

ASHLEY estava traumatizada. Sentou-se na parte posterior da limusine


como se fosse um autômato sem vontade própria. Vito lhe tinha feito uma
acusação contra a qual não podia defender-se. Quase acreditava que merecia
suas acusações. Não importava como tinha descoberto. Parecia inútil lhe
explicar que se instalou no apartamento do Steve porque não tinha nenhum
outro lugar aonde ir. Havia arrendado sua habitação pouco antes de terminar
com Vito, em um esforço por reduzir os gastos.
Steve a deixou dormir no sofá. Era um bom amigo e a ajudou quando mais
precisou. Entretanto, era muito jovem e imaturo, inclusive para começar a
entender a complexidade dos sentimentos de uma mulher, quando ela se deu
conta de que estava grávida.
A primeira reação de Ashley foi de terror, e quando se inteirou de que
Vito estava comprometido com Carina, derrubou-se moralmente. Assustou-se

37
Lynne Graham Desejo sem amor

pelo que seu pai faria se descobrisse o acontecido. Steve marcou uma consulta
para ela na clínica. Disse-lhe que Vito a tinha abandonado, que ela estava
sozinha e que, além disso, nunca quis ter filhos. Não dispunha de dinheiro para
manter a criança. Como ela ia viver? Que tipo de vida ia dar a seu filho? O
aborto segundo ele era a única solução.
Sentia-se doente, débil e desesperadamente sozinha, apesar dos
esforços do Steve.
Tinha ido sozinha à clínica, mas uma vez ali, deu-se conta de que não
podia fazê-lo. Encontrava-se em tal estado emocional que os empregados da
clínica insistiram em que chamasse alguém para que fosse buscá-la. Ashley lhes
deu o número telefônico da Susan, pois Steve tinha um exame esse dia.
Disse a sua irmã que, por mais difícil que fosse, queria ter o bebê. Foi
essa atitude o que quase levou seu pai à violência. Quando perdeu o bebê,
pensou que era um castigo divino por não ter querido seu filho desde o começo.
—Vito...
—O assunto está encerrado.
—Então por que o tirou agora? —perguntou-lhe Ashley, aturdida.
—Eu não gosto de segredos.
—Abortei contra minha vontade...
—Não ofenda minha inteligência.
—Nunca em minha vida me deitei com o Steve! —embora se dizia que
devia calar-se, precisava defender-se.
—Em sentido figurado provavelmente diga a verdade. Tampouco se
«deitava» em minha cama.
—Hoje estive com o Tim —insistiu ela. —E este machucado foi quando me
inclinei sobre uma mala esta manhã e me golpeei com a fechadura. Além disso,
não tenho nenhum amante.
—A palavra amor não figura em seu vocabulário. Só quer sexo.

Vito a levou a ópera. Não podia acreditar que pudesse ser tão cruel, mas
era. E Ashley, a quem a ópera sempre tinha encantado, só escutou uma
cacofonia ensurdecedora de vozes. Ele não quis escutá-la; não fez nenhum caso
de seus protestos. Não lhe acreditou. As lágrimas escorregaram por suas
bochechas.
Levou-a ao apartamento antes do intervalo. O silêncio se abatia entre
eles como um grande muro. Sem dizer nada, Ashley se meteu em seu quarto e
tirou a elegante roupa que ele tinha escolhido. Nunca ninguém a tinha ferido
tanto. Meteu-se nua na cama, como um animal ferido em busca de refúgio.

38
Lynne Graham Desejo sem amor

—Ashley, por favor...


Uma mão lhe afastou o cabelo do rosto, que ocultou no travesseiro para
afogar os soluços.
—Saia daqui!
Vito se sentou na cama.
—Fui duro e cruel com você. Como um malvado. Admito. Queria te ferir...
—Conseguiu. Agora vá e me deixe chorar sozinha.
—Durante todo o tempo em que estivemos juntos, há quatro anos, nunca
a vi chorar. E agora já chorou duas vezes em uma semana... Foi sempre tão
dura...
—Estava acostumada a chorar no banheiro com a torneira aberta, para
que não me ouvisse.
Vito sorriu sem humor.
—Quem me dera tivesse sabido.
—Teria gozado com isso —repôs ela. Em atitude defensiva, cobriu-se
com o lençol. — Acreditei que tinha saído...
—Não podia te deixar assim —lhe pôs um copo de conhaque na mão e ela
o bebeu de um gole.
Vito enterrou os dedos em seu cabelo e a fez levantar a cabeça.
—Vamos nos casar dentro de dez dias e, como tenho um mês e meio de
férias, passaremos no Sri Lanka.
Ela estremeceu ao ver o brilho implacável de seus olhos. Outras emoções
começaram a aflorar à superfície. Não era de surpreender que Vito a tivesse
chamado de vadia, aquele primeiro dia em seu escritório. Só uma mulher que
merecesse esse nome teria se levado como ele acreditava que o tinha feito,
quatro anos atrás, e agora de novo. Ele tinha falado do aborto como se Ashley
carecesse de sensibilidade feminina, como se tal decisão não tivesse
significado absolutamente nada para ela em caso de tê-la tomado. Começou a
sentir ódio por Vito.
Ele tinha se casado com outra mulher, e, entretanto se reservava o
direito de julgá-la por ter pensado em uma opção que muitas outras mulheres,
em sua mesma situação, teriam tomado.
Embora não a tenha amado, certamente tinha estado fisicamente
obcecado por ela. Tinha vivido com ela durante cinco meses e tinha pedido que
se casasse com ele. Mas sua negativa deve tê-lo deixado afligido, e a crença de
que ela foi embora imediatamente com outro homem, certamente aumentou
essa sensação.

39
Lynne Graham Desejo sem amor

—É possível que comecemos de novo? —perguntou ele, com muita


dificuldade. — Isto não era o que queria que acontecesse.
—Sangue a cada cinco minutos? por que não se encarrega de que eu sofra
um acidente? Seria muito mais rápido.
—O ódio e o amor não são duas caras de uma mesma moeda.
—Então será melhor que tome cuidado. Tanto ódio se aproxima muito à
obsessão.
—E você deveria saber por que.
Ashley estremeceu e de repente tomou consciência da intimidade da
habitação, assim como de sua nudez e da candente sexualidade de Vito.
—Porque tive o incrível mau gosto de procurar outro homem? —
perguntou ela, provocando-o.
Vito nem sequer piscou.
—Porque eu te amava —respondeu, apertando os dentes. —Parece
surpresa, mas por que? —deslizou um dedo por seu pescoço. — Acreditava que
nunca poderia me apaixonar. Tinha vinte e oito anos, mas, em muitos sentidos,
sentia-me muito mais velho. Então, uma noite, a vi em uma pista de dança e te
desejei mais que qualquer outra coisa no mundo...
—Amor obsessivo —repôs ela. — E aconteceu o mesmo a nós dois.
—Mas isto não... —ele baixou a cabeça e lhe mordiscou o lábio inferior
com delicadeza.
O calor do corpo de Vito contra o seu era uma forte tentação. Ashley
começou a estremecer, esforçando-se para lutar contra a debilidade que
invadia suas pernas. Devia deter aquilo. Vito não podia obrigá-la a nada.
—Não... não, isto não! —exclamou com voz rouca, tratando de romper o
feitiço.
Antes que ela pudesse escapar, Vito a segurou pelas duas mãos. Seu
olhar a queimou.
—Se não pode viver sem nenhum homem, eu posso te agradar.
—Se me violentar te excita, vá em frente!
—Como você gosta de dramatizar! Por que ao menos não é sincera quanto
a isto? A semana passada me viu pela primeira vez em quatro anos e meio, e em
questão de minutos começou a me devorar com os olhos...
—Essa é uma mentira asquerosa!
—Se acostume com a idéia de que, se não tivesse me tocado assim, não
estaria aqui agora —repôs ele, sorridente. — Cavou sua própria sepultura, cara.

40
Lynne Graham Desejo sem amor

Com um esforço sobre-humano, Ashley se liberou das mãos de Vito e


saltou da cama. Agarrou o vestido que tinha usado e saiu correndo da
habitação.
Vito a segurou em uma das mãos, mas ela, em sua decisão de escapar, a
puxou com tanta violência, que se estrelou de costas contra a parede.
—Está fora de controle! —exclamou ela quando Vito a apanhou ali.
—Você também. Exatamente como eu gosto.
Sem poder acreditar no que estava acontecendo, Ashley tentou lhe dar
uma joelhada, mas ele o impediu com a perna e ao mesmo tempo a beijou nos
lábios.
Pareceu iniciar um incêndio incontrolável. Quando Vito deslizou a língua
dentro de sua boca, Ashley emitiu um rouco gemido de prazer. Seu corpo
começou a derreter-se, e correspondeu a seus beijos com total abandono.
O tempo perdeu todo significado. Vito a levantou e escondeu a cara
entre seus seios até que encontrou um mamilo; imediatamente se dedicou a
excitá-lo com os lábios. Ela enterrou os dedos em seu negro cabelo; desejava
gritar de prazer.
Vito afogou uma maldição ao se chocar contra uma porta, mas logo voltou
a beijá-la. Depositou-a na cama, no meio da escuridão.
Com dificuldade, tirou a camisa enquanto ela tratava de ajudá-lo.
De repente, separou-se de Ashley e terminou de despojar-se da roupa.
Murmurou algo em italiano e logo perguntou:
—Como demônios me faz isto? supunha-se que não ia ser assim...
Vito voltou para seus braços. Ashley ofegou de prazer quando ele
deslizou uma mão entre suas coxas e encontrou o centro de seu desejo.
—Me diga o que sente —exigiu ele, enquanto se movia em cima dela.
—Vito, por favor... OH, Deus, por favor...! Não pare!
A força de seu primeiro ataque a obrigou a emitir uma exclamação de
dor, mas imediatamente sentiu um prazer intolerável. Começou a mover-se
ritmicamente, com abandono, levada por uma intensa excitação. Logo, de
repente, gemeu de satisfação. Vito se desabou sobre ela, também satisfeito.
Ashley se abraçou a ele e quase imediatamente ficou adormecida.
Teve um despertar horrível. As luzes estavam acesas e o primeiro que
viu, quando abriu os olhos, foram umas fotografias que estavam sobre a
cômoda, junto à cama. A imagem de Carina sorrindo, em um porta-retrato
prateado. Carina nos braços de Vito; uma cena que bem podia ter ocorrido em
sua lua-de-mel. Ashley sentiu que lhe revirava o estômago. Voltou-se e olhou
Vito aos olhos.

41
Lynne Graham Desejo sem amor

Ele já estava pondo a jaqueta do terno. Sua expressão era indiferente.


Estremecendo, ela fechou os olhos e se esforçou por esquecer o acontecido
durante as últimas horas.
—Acredito que devo ir —declarou ele sem emoção alguma.
Ela apoiou uma bochecha no travesseiro.
—Eu também posso ir? —sabia que seu tom era de súplica, mas pela
primeira vez em sua vida não se importou.
—Foi inevitável que isso acontecesse.
—Foi tua culpa.
—De nós dois —replicou ele. —Eu não planejei. Pensava esperar até
depois do casamento.
Ela pôs-se a rir, quase histérica, e mordeu com força a língua até quase
sair sangue. Vito não estava disposto a deixá-la ir. Tomaria o que desejava dela
sem lhe importar o preço.
—Deveria levar um bloco de notas e selar cada página, cada vez que eu...
—Não! Não foi nada planejado!
—Não? Durante o jantar me destroçou, levou-me a ópera. Logo me tirou
do teatro, ofereceu-me um conhaque e um pouco de compreensão, e depois
você... você... você...
—Acha que estou orgulhoso do que fiz esta noite? Acha que estou
orgulhoso de não poder tirar as mãos de cima de você?
—Por que não joga um pouco de dinheiro sobre a cama? Não é isso o que
faz com as vadias?
—Você não é uma vadia!
—Disse que eu era.
Vito elevou as mãos, em gesto de frustração.
—Deus, estava com ciúme, tão ciumento que não quis atender a razão.
Agora reconheço que esteve com o Tim e que essa estúpida ferida não era o
que eu supunha, mas antes acreditava que tinha estado com outro homem!
—Pois eu tenho notícias para você. Sinto-me como uma prostituta. O que
você sente não tem nada que ver com o que eu sinto.
Ele lançou uma maldição e fechou os punhos.
—Quer que vá às nuvens para que te deixe ir. Não farei isso. Na próxima
semana nos casaremos e nada mudará esse fato.
—Parece-me que o castigo excede o delito.
Vito permaneceu um instante junto à porta. Apertou os lábios como se
algo lhe incomodasse.
—Mas de quem é o castigo e quem cometeu o delito?

42
Lynne Graham Desejo sem amor

Ela voltou a deitar-se, olhou as fotografias e rapidamente se levantou de


novo. Pegou as fotos, abriu a gaveta da cômoda e as lançou lá dentro. A seguir
se perguntou por que tinha feito isso. Acaso estava com ciúmes?
Encontrava-se uma vez mais na cama de Vito, presa em uma relação de
tortuosa complexidade e amargura. Não lhe servia de consolo saber que Vito se
encontrava também sumido em um pequeno caos. Não tinha planejado o
acontecido. Não gostava das situações confusas. Não gostava de perder o
controle.
Mas Ashley tampouco gostava de perdê-lo. A paixão se deu procuração
dela e a tinha traído. Já não o amava. Obrigou-se a não amá-lo. Não tinha
deixado de pensar em sua traição, até que a amargura lhe deu forças. Mas o
que aconteceu com a amargura e o ódio quando mais os necessitava?
Se tivesse podido resistir a essa paixão... Nesse instante seria tão livre
como o vento! Enfastiada de si mesmo, apertou os dentes. Ansiava as ardentes
carícias de Vito. Agora se sentia farta de seu próprio abandono. Desejava-o...
desejava-o tanto como ele parecia desejá-la. Tinha que enfrentar às
conseqüências. Entretanto, odiava-o pelo que lhe tinha feito no passado e pelo
que seguia lhe fazendo.
Mas parecia que isso não importava quando a tocava. Disse a sim mesmo
que estava muito, muito zangada. Vito chegou no pior momento, e todas as
dolorosas emoções estouraram, convertendo-se em paixão. Uma paixão que não
tinha podido experimentar com ninguém mais.
Na realidade, no ano anterior tinha conhecido na creche um homem
especial. Um médico, um pai solteiro com uma menina. Gostavam-se
mutuamente, mas quando chegou o momento decisivo, teve que deixar de vê-lo
porque essa simpatia se negou a converter-se em amor ou inclusive em desejo.
Então apareceu Vito. Na noite assada perdeu o julgamento. Não pensou
em nada, nem sequer nas conseqüências. Levava anos tomando pílula, uma pílula
de baixa dose que não a liberava da possibilidade de ficar grávida. Duvidava
que pudesse lhe acontecer pela segunda vez, mas não pensava correr esse
risco. No dia seguinte veria um médico e lhe pediria que lhe receitasse pílulas
anticoncepcionais. Assim estragaria os planos de Vito. Seria muito discreta a
respeito.

—Não me parece justo que me faça isto. Não quero conhecer sua família.
Não quero ter nada que ver com eles, e não acredito que eles queiram ter nada
que haver comigo! —explodiu Ashley, desafogando a tensão que sentia.

43
Lynne Graham Desejo sem amor

—Não seja ridícula —declarou Vito com impaciência. —É obvio que lhes
gostaria de ver-te antes do casamento.
Ashley não queria converter-se em uma surpresa desagradável para
Elena di Cavalieri, que certamente não tinha deixado de chorar desde que seu
filho lhe comunicou a notícia de seus planos matrimoniais. E certamente, não
desejava que lhe oferecesse outro cheque.
—A festa foi idéia de minha mãe. Por que está contra que ela queira te
receber na família e te apresentar a alguns de nossos amigos? Asseguro-te que
não foi fácil organizar uma festa tão grande em tão pouco tempo.
Então por que ela tinha se incomodado? perguntou-se Ashley enquanto
pensava naquela mulher, cuja aparente fragilidade ocultava um forte
temperamento.
—Não quero que se desgoste —repôs Vito.
Ashley engoliu em seco. Não pôde menos que se fixar no brilho do anel
de diamantes que luzia no dedo. Vito o tinha dado durante o jantar, à noite
anterior.
—Não é muito tarde para convidar sua família ao casamento —indicou
ele.
Ashley estremeceu.
—Não, obrigada.
—Acaso sua irmã...?
—Não somos muito unidas.
—E esteve unida a alguém?
Pensou que tinha estado unida a Vito como com ninguém mais, mas não
lhe satisfazia o que ela estava disposta a dar. Com ele, era tudo ou nada.
Ele tinha feito caso omisso de suas necessidades. A idéia de que Ashley
desejasse ser independente era como um insulto a sua masculinidade.
Entretanto, Vito acreditava que estava lhe oferecendo um paraíso.
Na semana anterior tinha transcorrido em meio de uma dolorosa tensão.
Vito a levou três vezes para jantar, e uma vez a um bar, onde nem sequer a
convidou para dançar. Todas as noites a levava ao apartamento e a deixava ali
só e trancada. Não a havia tocado, mas Ashley não sabia se o fazia para
castigar a ela ou para castigar a si mesmo.
O brilho das luzes da enorme casa era cegador. Disse a si mesmo que
essa seria sua casa quando estivessem em Londres, mas não por muito tempo.
Seu casamento não duraria mais de um ano. Quando lhe demonstrasse que era
estéril, graças às pílulas anticoncepcionais que estava tomando em segredo,
Vito não teria nenhuma razão para continuar com a farsa.

44
Lynne Graham Desejo sem amor

Uma diminuta figura os recebeu com afeto.


—Morria de vontade de lhe ver —declarou Elena di Cavalieri, e
imediatamente segurou Ashley pelo braço.
Surpreendida, a jovem olhou Vito, e este sorriu.
Pensou que provavelmente fora o sorriso mais franco que lhe tinha dado
nas duas últimas semanas.
Acredito que precisamos conversar —assinalou Elena, abrindo
discretamente uma porta.
Ashley se encontrou então em uma biblioteca. Sua futura sogra lhe
ofereceu uma taça de champanha, em uma bandeja de prata.
—Sente-se, por favor —lhe pediu a mulher mais velha.
Ashley se sentou em uma poltrona.
—Vamos nos casar depois de amanhã —explicou ruborizada, consciente
de que parecia uma mulher disposta a lutar.
—E nada poderia me fazer mais feliz —lhe assegurou Elena com calma.
Ashley a olhou com assombro.
—Falo sinceramente —repôs Elena, suspirando. —Sinto muito ter me
intrometido no que não era meu assunto, há quatro anos. Se não tivesse sido
tão obstinada, teria contado a Vito o que fiz assim que retornou de Londres.
Ficou tão destroçado quando o rejeitou... Nunca o tinha visto assim, mas sabia
que se recuperaria.
—Mas você não tem por que se sentir responsável. Eu... eu tinha outros
motivos para não me casar com ele —respondeu Ashley, vacilante.
—Por que não lhe contou de minha visita?
—Não há razão para que o faça. Isso já faz parte do passado.
—De verdade, quero que seja feliz com meu filho. Quem dera pudesse
voltar atrás no tempo —assinalou Elena, com vontade de chorar. — Mas espero
que algum dia possamos ser amigas.
Sua sinceridade era indiscutível. Ashley pensou que evidentemente Elena
acreditava que ela era a mulher a quem Vito amava. Entretanto, ela não pensava
o mesmo. Como se sentiria Elena quando esse casamento também tivesse um
final desventurado?
Vito estava do outro lado do vestíbulo, junto com outros homens. Ao vê-
la se aproximar, imediatamente se desculpou.
—Pensei ter dito que não havia nada do que preocupar-se —comentou ele.
— Minha mãe é uma mulher muito amável.

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«Às vezes os homens são muito estúpidos», pensou Ashley, irritada.


disse a si mesmo que Elena era uma mulher emotiva, assim como uma mãe
protetora, muito menos frágil do que aparentava.
A seguinte hora foi para ela uma rápida sucessão de nomes e rostos. Vito
conseguiu pô-la furiosa. A exibia como se fosse um troféu. Só uma de suas três
irmãs estava presente. Giulia, nesse momento grávida, saudou-a como se fosse
uma velha amiga.
—Me alegro muito por você e por Vito. Insisti em estar aqui esta noite.
Não teria perdido isso por nada —declarou com tom cordial.
—Quando se casou? —perguntou Ashley.
—Faz quase três anos —Giulia se deu uns tapinhas no ventre. —E este vai
ser nosso terceiro filho.
—O terceiro?
—Tive gêmeos na primeira vez —confessou Giulia, rindo.
Ashley sorriu forçada, pensando em quão fácil era para algumas
mulheres ter filhos e em quão difícil era para outras.
—Giulia está louca com os meninos —assinalou Vito, com tristeza.
Algo se rompeu dentro de Ashley.
—OH, se cale e vá ao inferno! —exclamou furiosa e se afastou. Disse a si
mesmo que não estava de humor para suportar comentários sarcásticos.
—Ashley! —disse-lhe, entre surpreso e alegre, um homem que passava a
seu lado. — Que demônios está fazendo aqui?
Ela piscou, perplexa, ao reconhecer o Josh. Logo sorriu.
—Poderia te fazer a mesma pergunta.
—OH, figurei na lista de convidados desde que assisti Giulia no
nascimento dos gêmeos. E você por que razão está aqui? Poderia me contar isso
enquanto dançamos?
Deixou que Josh a abraçasse. Vito era tão alto que Ashley podia vê-lo
perfeitamente por cima da multidão. Pensou ironicamente que ali estava ela,
confraternizando com um membro do gênero proibido... um homem! perguntou-
se se seria fuzilada ao amanhecer.
—Cheguei tarde. Já a viu?
—Quem?
—À futura esposa de Vito di Cavalieri.
—Está dançando com ela —repôs Ashley, suspirando.
—Está brincando! —sacudiu a cabeça e logo apertou os lábios. —Não está
brincando. Como demônio o conheceu?

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Lynne Graham Desejo sem amor

—Faz muito tempo —advertiu sua expressão de dor e de maneira


impulsiva lhe deu um beijo na bochecha. Foi nesse momento quando se deu
conta de que tinha bebido bastante champanha. —Por que não podemos amar
as pessoas que queremos amar, Josh? por que sempre devemos nos apaixonar
pelas pessoas erradas?
—Assim a natureza nos mantém alertas. É tão bela que não posso pensar
bem, perto de ti...
—Então, me permita que pense por você, senhor Hennessy. Se voltar a
pôr as mãos em cima de minha mulher, quebrarei-lhe os ossos!
Ao ouvir a voz de Vito, Ashley se voltou rapidamente. Ele a agarrou pelo
braço com uma expressão de ira contida. A jovem estava intensamente pálida.

Capítulo 6

—COMO pôde me fazer isso? perguntou Ashley. — Como pôde


envergonhar assim o Josh?
Furioso, Vito se serviu um uísque que estava sobre a mesa da biblioteca.
—Adverti-lhe. Se não tivesse sentido pena por esse desventurado, o
teria golpeado! Deus! Que tipo de mulher é?
—O que tem de errado um beijo no rosto? Josh é um velho amigo.
—E talvez os lençóis já se esfriaram —declarou ele com tom zombador.
—Nem sequer vou responder a isso.
—Está apaixonado por você. Como antiga vítima, conheço os sintomas.
Fez-lhe a mesma falsa promessa que a mim? Foi o suficientemente fraco para
suplicar? É um estúpido. Se alguém suplicar em nossa relação, essa será você.
Ela estremeceu.
—Antes quero a morte.

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—Não, cara —a contradisse Vito. — Tudo o que devo fazer é te levar


para cama. Algo que penso fazer uma e outra vez muito em breve.
—Não... não sei do que está falando.
—Olhou-me e logo se apertou contra Hennessy.
Ashley se ruborizou. Sim, tinha-o descoberto observando-a. Não podia
negar. Vito a tinha ferido e ela tinha reagido de maneira impulsiva, como
sempre. De repente, envergonhou-se de ter animado o Josh a colocar-se em
uma situação tão incômoda.
—Por que fez isso?
—Vá ao diabo —repôs ela, levantando a cabeça.
—Se for ao diabo, levarei-te comigo —cheio de ira, estendeu uma mão
para ela. — Quero saber por que te pareceu necessário fazer isso.
Segurou-a com força pelo ombro, lhe impedindo de escapar.
—Deveríamos retornar à festa... —indicou ela.
Vito deslizou o dedo por seu pescoço, e Ashley engoliu em seco. O
ambiente era pesado, intenso. A garota sentiu a boca seca e entreabriu os
lábios. Lutou contra a tentação de aproximar a bochecha à palma de sua mão
como um gato que solicitasse ser acariciado.
—A festa —repetiu.
Vito a olhou nos olhos e a apertou contra si. Ela estremeceu e fechou os
olhos com desespero.
—Por que? —insistiu ele.
—Como por que?
—Hennessy?
—Giulia... Faz-me mal.
Vito afastou as mãos e retrocedeu. Deixou-a no meio da habitação.
Aturdida, Ashley o olhou; tremiam-lhe as pernas. Pensou que o pior de tudo era
esse desejo que ainda exigia satisfação. Deixou-se cair em um sofá, pálida,
esgotada e envergonhada de que ele pudesse exercer esse poder sobre ela.
—Odeia-me, não é verdade? E me culpa de tudo que aconteceu há quatro
anos. Não quer aceitar que eu tenho uma versão muito diferente.
—De verdade? —perguntou ele, sem emoção.
—Você me abandonou, não eu a você. Necessitava de um lugar para viver
e não tinha dinheiro...
—O aluguel do apartamento foi pago até o final do ano. Não era
necessário que fosse dali. Também te abri uma conta bancária, para que não te
faltasse dinheiro.

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Lynne Graham Desejo sem amor

—Sim... sorriu levemente. — Nunca esquecerei essa despedida tão


sentimental: um talonário de cheques entregue por um mensageiro especial. O
que toda mulher deseja como uma última lembrança comovedora. O que
acreditava que era? Uma prostituta pela qual devia pagar?
Ele se ruborizou um pouco.
—Era responsável por você.
—Não aceitei seu dinheiro quando vivia com você. Por que teria que fazê-
lo depois que se fosse? Não podia voltar para o apartamento que tinha
compartilhado, porque o arrendei duas semanas antes que me deixasse. Por isso
terminei no sofá do Steve...
—O bebê... era meu? —fez a pergunta sem nenhuma advertência prévia.
—Como pode me perguntar isso? —inquiriu ela, surpreendida.
Vito elevou as sobrancelhas com expressão zombadora. Ashley inclinou a
cabeça e se perguntou, estremecida, onde estava sua ira. Necessitava-a. Em
vez disso, estava experimentando uma desesperada sensação de perda e
inutilidade… por que lhe doía tanto odiá-lo, por que se sentia tão vulnerável?
Por que de repente lhe resultava tão importante que lhe acreditasse?
—Era teu —declarou ela, dando-se por vencida e desprezando-se por sua
debilidade. — e...
—Isso era tudo que queria saber —a interrompeu Vito.
—Mas como se inteirou?
—Contratei um investigador particular. Tinha curiosidade. Acreditava
que havia outro homem envolvido. Por acidente, descobri que tinha uma razão
muito mais capitalista para desejar que saísse de sua vida...
Ashley piscou assombrada. Vito pensava que ela tinha querido ter
liberdade para se desfazer do bebê, ainda não nascido.
—Me escute. Não abortei. Mudei de idéia. Mas tive um aborto natural
dois meses depois.
—Devemos retornar à festa.
—Vito, não pode me fazer isso!
—Isso faz parte do passado. Vamos enterrar o passado juntos. Nunca
devia ter dito que eu sabia.
—Mas o disse, assim não pode enterrá-lo de novo!
—Temos que fazê-lo. Aceito que estava equivocado ao supor que a
decisão que tomou não te supôs nenhum sofrimento. É evidente que sim, porque
ainda te causa muita dor, mas deve reconhecer que nós dois recebemos uma
educação muito diferente; de alguma forma, somos também vítimas disso. Não

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Lynne Graham Desejo sem amor

posso mudar o que sinto, mas posso aprender a esquecer esse sentimento. É
algo que deveria ter feito há muito tempo.
Com uma dolorosa e amarga frustração, Ashley se levantou. Vito a
julgava e reprovava seu comportamento. Os olhos se alagaram de lágrimas.
—Por que não esquece esses sentimentos e trata de se concentrar no
que deveria sentir?
—A que se refere?
—Onde demônio estava quando precisei de você? Onde estava, Vito? Eu
tinha dezenove anos e não tinha nenhum lugar aonde ir! Deixou-me grávida.
Abandonou-me. Casou com outra mulher. E diz que me amava? Bem, a única
pergunta que agora tenho para você é... onde você estava? E onde estava esse
amor quando precisei dele?
Ele ficou paralisado pela surpresa. Ashley aspirou profundamente e
estremeceu.
—Não vive na realidade, Vito. Tem uma família carinhosa que te apóia, e
muito dinheiro. Não sabe nada a respeito da vida dos outros! Nunca se
perguntou onde será sua próxima refeição, nem como vai sobreviver... e é então
quando os ideais se vêem comprometidos!
Vito ruborizou. Levantou uma mão, com gesto vacilante, e enxugou as
lágrimas que escorregavam pelo rosto da jovem. De repente, Ashley sentiu
desejos de deitar-se em seus braços. O teria feito se Vito não tivesse retirado
a mão.
Nesse momento chamaram fracamente à porta e Elena entrou.
—Espero não ter incomodado, mas há uma festa da qual faltam os dois
principais convidados –disse ela.
—Ashley se reunirá conosco dentro de um momento —assegurou Vito,
conduzindo sua mãe para fora da habitação.
No silêncio que seguiu, Ashley fez um esforço para acalmar-se. Em
alguma parte, um relógio indicou que já era meia-noite. Ashley estremeceu ao
tomar consciência de que em menos de trinta e seis horas seria a esposa de
Vito.

—Dentro de uma hora chegaremos à vila —indicou Vito, reclinando-se em


seu assento, enquanto desfrutava de uma longa conversa em cingalês com o
Bandu, o condutor.
A casa tinha pertencido à família Cavalieri durante quatro gerações.
Tinha mencionado esse fato, quando subiram ao avião em Londres, com rumo ao
Sri Lanka, mas não lhe havia dito que falava cingalês.

50
Lynne Graham Desejo sem amor

Depois de uma hora exasperante, Ashley ainda seguia em seu assento,


assustada. Bandu conduzia a uma velocidade excessiva.
—Conduzir no Colón requer nervos de aço —comentou Vito com tom
divertido.
Sem deixar de estremecer-se, Ashley bocejou.
—Ainda está cansada? perguntou Vito, assombrado.
—Um pouco —respondeu ela, embora tinha dormido durante a maior
parte do interminável vôo.
Pensou que, provavelmente por essa razão, nada do que estava
acontecendo lhe parecia real. O casamento tinha acontecido no dia anterior e
tinham passado a noite no avião. Não podia entender por que seguia tão
cansada. Talvez se devia ao enorme esforço que tinha feito para aceitar ser a
esposa de Vito.
Ainda não acreditava; já era a senhora di Cavalieri. Os jornalistas se
apertaram na porta da igreja, pondo-a muito nervosa. Ela tinha esperado uma
cerimônia tranqüila. Evidentemente Vito não lhe havia dito que o seria, mas
Ashley supôs que, como não se tratava de um casamento normal, ele preferiria
um simples e sóbrio casamento civil.
Como resultado, ela não estava preparada para a entrega, para a prova
de última hora de um magnífico vestido de noiva; tampouco esteve para o buquê
de flores, os duzentos convidados, a festa privada e o bolo. Além disso, graças
à repercussão do sucesso nos meios de comunicação, toda sua família saberia
que se casou.
Sua mãe se sentiria profundamente ferida; seu pai ficaria furioso e
Susan se ofenderia. Quanto ao Tim, seu irmão suspeitaria da rapidez com que
tinha tido casado com Vito.
Já tinham deixado atrás as ruas cheias de crianças de bicicletas e todos
outros meios possíveis de transporte. Nesse momento o sinuoso caminho subia
em meio dos coqueirais.
Bandu freou para evitar atropelar um menino nu que jogava em um
atoleiro. Ashley sorriu. Os meninos eram iguais em todo mundo. A atração de
brincar com água era universal.
—Que menino precioso! —exclamou.
—Os cingaleses são pessoas muito atraentes.
Algo no tom de Vito a fez voltar a cabeça. Havia um brilho interrogante
em seus olhos. Consciente de que tinha esquecido sua atitude indiferente ante
as crianças, Ashley olhou para o outro lado.

51
Lynne Graham Desejo sem amor

Alguns quilômetros mais adiante, o carro atravessou um bosque. Ashley


desceu do veículo e observou o edifício. Tinha toda a solidez e o encanto de
uma casa de campo vitoriana.
—Meu bisavô comprou o imóvel de um colono inglês. Eu cedi a plantação
de chá a uma cooperativa de trabalhadores explicou Vito. — Mas conservei uma
quantidade considerável de terras para me assegurar de que a casa ficasse
isolada.
Um número assombroso de rostos sorridentes os recebeu.
—Certamente sua dignidade não requer tantos empregados, não é
verdade?
Vito lhe dirigiu um olhar de recriminação.
—O emprego não abunda aqui. Enquanto que a riqueza provavelmente me
proteja do que você chama o «mundo real», eu sigo a política de proporcionar
trabalho a tanta gente quanto é possível.
Ashley ruborizou ante a réplica de Vito. A apresentou aos empregados;
os mais jovens falavam um bom inglês.
Ela voltou a bocejar. Ao vê-la, Priya, a pequena governanta, sorriu e a
conduziu ao andar superior. Mostrou-lhe um amplo quarto, decorado com
formosos móveis de mogno de estilo colonial. Mas Ashley não teve tempo para
admirá-los, pois o primeiro que viu foi uma grande fotografia de Carina, a um
lado da enorme cama.
Imediatamente, Priya se deu conta do que era o que havia posto tensa a
Ashley.
—Quer que a esconda? —perguntou, preocupada.
—OH, deixa-a aí, por favor —disse Ashley, sorrindo forçadamente.
Estava confusa. Haveria fotografias de Carina em todas as partes? Essa
noite estaria nos braços de Vito com a imagem de sua primeira mulher como
testemunha? Sentiu-se humilhada e cheia de raiva ao mesmo tempo.
Depois que Priya terminou de lhe mostrar as dependências do quarto,
Ashley disse que desejava deitar um momento. Estendeu-se na cama e
contemplou a fotografia.
Se Carina não tivesse morrido, Vito ainda estaria com ela. Já teriam tido
filhos. Por que seguia insistindo em negar a evidência?
Por que não podia fazer frente ao fato de que Vito tinha amado a
Carina?
Até esse momento, Ashley tinha se negado rotundamente a aceitar que
Vito poderia ter se casado com Carina por algo mais que por conveniência,
dadas as circunstancias entre eles. O ciúme e o ressentimento a tinham

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Lynne Graham Desejo sem amor

cegado. De repente, teve consciência de que tudo o que Vito desejava era que
lhe desse um filho e saísse o quanto antes de sua vida.

Um ruído leve a despertou. Sentou-se rapidamente ao mesmo tempo em


que alguém acendia um abajur. Sentiu náuseas e a cabeça lhe deu voltas. Vito a
estava olhando do pé da cama.
—Está doente? —perguntou preocupado, e Ashley o olhou com ódio. —
Vou chamar um médico.
—Não necessito de nenhum médico! —exclamou ela, irritada. —Não quero
ter nada que ver com você!
—Jantaremos dentro de meia hora, então —repôs ele com tom cansado.
—Não vou levantar-me. Tenho muito calor.
—Não me surpreende; tem as janelas fechadas, as cortinas corridas e o
sistema de ar condicionado desligado —respondeu Vito e entrou no banheiro.
—Não sabia que havia ar condicionado —indicou ela.
Da porta, ele lhe lançou um lenço umedecido, com o qual refrescou o
rosto.
—Descerei logo —declarou ela, suspirando.
—Há quanto tempo está usando isto?
Ashley o olhou e ficou paralisada. Vito lhe mostrou três pequenas caixas;
era seu fornecimento de anticoncepcionais. Surpresa abriu a boca. Não podia
acreditar que ele as tivesse descoberto.
—Onde o encontrou?
—Uma das criadas deve tê-las tirado quando desfez sua bagagem,
enquanto dormia. Estavam a um lado do lavabo.
—Não sei como chegaram ali —confessou, atordoada.
—Quer que pergunte à criada?
Ashley ficou pálida e fechou os punhos. Houve um longo momento de
silêncio.
—Chegamos a um acordo —assinalou ele, guardando as caixas no bolso da
jaqueta. —Mas é uma trapaceira.
—Porque o que me pede é... é...
—O que você aceitou. E não quero que minhas esperanças se vejam
defraudadas pela tecnologia.
«Acordo... trapaceira... defraudar», pensou Ashley, dizendo-se que essa
terminologia pertencia ao mundo dos negócios. Vito não se dava conta de que
ela era um ser humano vivo, dominado pelas emoções?

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Lynne Graham Desejo sem amor

—Só durará um ano —comentou ele. — Se não conceber um filho nesse


ano, deixarei-te ir.
«Um ano», pensou Ashley contendo uma risada histérica. Perguntou-se
se Vito lhe pediria que lhe devolvesse o dinheiro ao final desse período de
prova. Negava-se a pensar o que aconteceria se ele tivesse êxito.
Desceu para jantar, mas antes, enquanto se vestia, perguntou-se de onde
procedia o ruído que estava ouvindo. Quando Priya a levou para fora, cessou o
canto de muitas vozes. Foram jantar no terraço, à luz de uma vela, mas não
sozinhos. Fixou-se nas chamejantes tochas de azeite de coco, colocadas para
iluminar um cenário circular diante da casa.
—Para mim também isto é uma completa surpresa —assegurou Vito. — Os
empregados prepararam o espetáculo em honra de nosso casamento.
Foram desfrutar de uma representação do Kolam Natima, um drama
popular, conforme lhe explicou Vito. Fez sua aparição um narrador e logo dois
percussionistas e um flautista apoiaram sua entrada. Um por um os bailarinos
foram interpretando o papel de deuses, demônios e outros seres místicos.
Ashley estava extasiada.
Quando Priya se aproximou com duas diminutas taças de um estranho
licor, Ashley perguntou:
—Mas do que se trata toda esta representação?
Priya sorriu e decidiu intervir. Assinalando as duas figuras mascaradas,
as mais espetaculares, disse:
—Este é o rei e aquela é a rainha. Ela deseja ter um filho —e rindo,
afastou-se.
Ruborizada, Ashley compreendeu que tinha entendido tardiamente o
significado dos movimentos eróticos dos bailarinos. Não queria olhar o Vito.
—Não foi idéia minha —lhe recordou ele, lhe tocando uma mão.
Ela afastou a mão e voltou a concentrar sua atenção nos bailarinos.
—Sempre está molesta.
—O que esperava?
—Este não é um lugar para discussões.
Quando a representação terminou, Ashley sorriu. Vito pediu que lhes
servissem o café no salão.
—Ceder um pouco é tão inaceitável para você? —perguntou-lhe ele com
impaciência, logo que ficaram sozinhos.
—Sim —ela inclinou a cabeça. Sabia que se cedesse um pouco terminaria
cedendo muito. Vito só aceitaria sua rendição total.
—Deus! —estourou ele. — O que quer de mim? O passado é o passado.

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Lynne Graham Desejo sem amor

—É meu passado e está aqui! —exclamou ela, perdendo o domínio de si


mesmo. —Não posso me liberar de você!
—Fiz um grande esforço para ser razoável. Nem sequer sorriu nas fotos
do casamento!
—Se quer uma noiva sorridente, não precisa de mim! —declarou ela. —
Tem fotos de Carina por toda parte em todas as suas casas. Carina... por toda
parte! Surpresa, surpresa, há uma mais nessa mesa!
—Mandarei guardar todas —anunciou ele. — Ou seria mais apropriado
queimá-las em uma cerimônia?
—A que se refere?
—Está com ciúmes.
—Insultada por sua falta de sensibilidade —repôs ela, apertando os
dentes. — Mas isso não é nada novo para mim!
Saiu do salão dando uma portada, subiu correndo ao seu quarto e se
trancou no banheiro. Enquanto tirava a roupa e se metia sob a ducha,
perguntou-se por que, quando estava na companhia de Vito, seu maior inimigo
quase sempre era ela mesma. Quando saiu do banheiro, esperava encontrá-lo no
quarto, mas não foi assim.
Isso a enfureceu. Ainda não tinha terminado com ele. Depois de tirar a
toalha da cabeça, começou a escovar o cabelo. Estava tão absorta que não o
ouviu entrar. De repente, viu-o no espelho. Vito lhe tirou a escova e com calma
começou a lhe escovar o cabelo.
—Não faça isso —replicou ela com voz débil.
—Fui pouco sensível ao expressá-la. Deveria tê-lo saboreado em silêncio.
—Por que não me deixa em paz?
—Já sabe a resposta.
Ashley permaneceu ali, sentada, como uma estátua, até que ele terminou
seu trabalho. Mas quando a segurou pelos ombros, ela começou a tremer.
—Isto... nós —Vito parecia saborear as palavras. — É inevitável.
—Não deve acontecer —pediu ela, quando ao fim pôde falar.
Vito lhe desfez o nó do cinto do roupão, e Ashley respirou agitada. A
pegou entre seus braços, beijou-a no pescoço e deslizou as mãos por seu corpo,
até encontrar os seios. Ela gemeu quando seus dedos peritos brincaram com
seus mamilos.
—Por que você pode se conter e eu não? —perguntou Vito com voz rouca,
e a beijou nos lábios.

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Capítulo 7

Seu comentário provocou a rebelião de Ashley. Fazendo um esforço


sobre-humano, afastou-se. Odiando a si mesmo, esfregou os lábios como se
precisasse apagar seus beijos.
—Eu posso me conter —assegurou.
—Por que luta com você mesma? Deseja-me. Acredito que me deseja
mais do que desejou a qualquer outro homem. Por isso luta contra mim. Sente-
se ameaçada...
—E de que livro de psicologia para aficionados tirou isso? Não acha que
não sei por que pensa assim. Do seu ponto de vista é uma interpretação muito
lisonjeira.
—De verdade? —sem piedade, olhou-a nos olhos. —Em minha vida muitas
mulheres me desejaram, cara.
O ódio se apoderou dela. Pensou que era verdade. Vito o tinha tudo:
poder, riqueza, carisma e uma sexualidade que magnetizava as mulheres. Nunca
lhe surpreendeu apaixonar-se por Vito, mas a força desses sentimentos a
aterrou. Sua frágil segurança tinha estado apoiada na necessidade de ter um
controle absoluto de sua própria vida. Sabia que, na menor oportunidade, Vito a
dominaria.
—Então, por que me escolheu? —perguntou ela, com desprezo.
—Por sua beleza, seu caráter... e as pequenas coisas...
—Como quais?
—Sua maneira de me desafiar —respondeu ele, sorridente. — Do seu
ponto de vista oposto ao meu, em todas as discussões. Intriga-me. É como um
quebra-cabeça chinês...
Ashley pensou que, para ele, ela era um mistério que pensava resolver.
Decididamente, sentia-se ameaçada. Jogando a cabeça para trás, Vito a olhou
com olhos brilhantes.
—Por que sempre se esconde atrás de um móvel grande quando temos
uma discussão?
—Não faço isso —declarou ela, e só então se deu conta de que estava em
pé,d outro lado da cama, tão longe dele como lhe era possível.
—Sim. Antes me irritava, mas já estou acostumado a isso. Fisicamente
tem medo de mim, e há quatro anos isso me pareceu insultante —lhe confessou
ele, aproximando-se. —Como pode ter medo de mim se nenhuma vez te fiz mal?
Isso me leva a pergunta óbvia: quem lhe fez isso?

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Pálida e trêmula, Ashley baixou o olhar para ocultar a agitação que


sentia. Não pôde mover-se quando Vito a segurou entre seus braços.
—Porque se conseguir pôr as mãos nele —assegurou Vito— matarei-o.
Ashley não foi uma menina maltratada, pensava. Seu pai nunca tinha
espancado sua mãe, sua irmã ou seu irmão, e estava acostumado a criticar aos
homens que utilizavam a força para submeter aos mais débeis. Mas quando
perdia os nervos, não era consciente de sua forte constituição e às vezes
acabava lhe dando as bofetadas. Mas só com ela. E essa constatação a tinha
feito ver que seu pai não a amava como amava o Tim ou a Susan.
—Quem a maltratou? —perguntou Vito.
—Está imaginando coisas.
—Acreditei que estava fazendo isso, até que vi sua cara. Quem foi? —
insistiu.
Ashley pensou que, se fosse uma ingênua, provavelmente teria
acreditado que Vito estava preocupado com ela. Sentiu vontade de chorar.
—Aconteceu... há muito tempo. Deixa assim. Algumas coisas são pessoais.
—Não entre um homem e sua mulher.
—Não sou sua mulher!
Vito a segurou pelos ombros, aprisionando-a.
—É minha mulher, e quanto antes aceitar esse fato, melhor será.
Enquanto isso reconheça também o fato de que nunca utilizarei a força para te
ferir.
Ela estremeceu. Havia outros tipos piores de dor que ele podia lhe
causar. O tipo de dor que não deixava marcas visíveis.
—Algum dia não precisará discutir mais comigo —declarou Vito com
calma, — e aprenderá a confiar em mim.
—Não só é ambicioso, mas também egocêntrico.
—Simplesmente eu não gosto do fracasso.
Ashley teve medo. Que mais Vito desejava dela? Amor? estremeceu-se,
perguntando-se qual seria sua vingança se ela satisfizesse essa ambição.
—Não posso conviver com o fracasso —repôs ele, fazendo-a deitar-se na
cama.
A cada palavra que ele pronunciava, aumentavam os temores de Ashley.
Segurou sua mão e aproximou aos lábios o anel que usava.
—Isto parece uma prisão?
—Um símbolo de posse. Surpreende-me que não queira que me tatuem em
todo o corpo o sobrenome Cavalieri, no caso de extravio!
—Não se extraviará, cara. Tenho muito cuidado com meus pertences.

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—Maldito! —exclamou ela, tratando de sentar-se.


Vito deslizou a ponta da língua pelo vale que se abria entre seus seios.
—Deus...! Quase esqueci —assinalou e tirou uma caixinha, da qual extraiu
uma diminuta pílula. — A ciência médica tem suas vantagens. Estou disposto a
chegar a um acordo...
Desconcertada, ela entreabriu os lábios.
—Mas você...
—Não necessitamos que ocorra tão cedo. O êxito poderia anular outros
prazeres que no momento, para mim, são muito mais importantes.
Ashley sentiu alívio ante a mudança de assunto de Vito.
—Não está satisfeita? —perguntou ele.
—Exaltada... mas em troca quer tudo o que tenho para dar.
Vito lhe acariciou um seio, e ela fechou os olhos.
—E isso é incrivelmente generoso, não? Tendo em conta que eu poderia
tomar sem pedir.
Logo deslizou a outra mão por uma coxa. Rindo, abriu-lhe o roupão,
inclinou a cabeça e deixou que seus lábios vagassem por sua sensível pele.
—Vou fazê-la perder o juízo —prometeu ele.
Vito tirou seu roupão e acomodou Ashley sobre a cama, como se fosse
uma boneca. O olhar dela se chocou com o dele, que parecia devorar seu corpo.
Ela respirava agitada enquanto o contemplava, deixando que seu olhar se
deslizasse por seus amplos ombros e seu musculoso peito. Então, fechou os
olhos.
Vito fechou os lábios em torno de um mamilo, e atormentou Ashley com
os dentes. Colocou-se em cima dela e deslizou a língua entre seus delicados
lábios. A jovem estremeceu, excitada. Aconteceu tão depressa, que não pôde
controlá-lo.
As mãos de Vito se moviam em cima dela com precisão. Ashley não podia
permanecer quieta. Lenta e inexoravelmente, ele não deixava nenhuma parte de
seu corpo sem acariciar. Mordiscou-lhe um ponto sensível da coxa e ela arqueou
as costas. Logo gemeu, ofegante.
Então Vito fez o que ela nunca antes lhe tinha permitido. Ashley abriu as
pernas e ele, aproximando os lábios ao lugar mais íntimo de seu corpo,
saboreou-o. Uma avalanche de sensações frenéticas a fez estremecer-se em
um clímax de paixão.
—É minha, absolutamente minha.
Sem saber se seguia consciente, olhou-o fixo enquanto ele se ajoelhava e
a observava com expressão de triunfo. Segurando-a pelos quadris a atraiu para

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Lynne Graham Desejo sem amor

si. Ela já não ofereceu resistência alguma. Entrou nela com força e
profundidade, até que Ashley não soube onde começava ela e onde terminava
ele.
Passou um longo momento antes que ele se retirasse.
Ashley não queria que se movesse. Desejava que ficasse para sempre
onde estava.
Vito se afastou e permaneceu deitado durante vários minutos em
silêncio, satisfeito. Incauta, ela apoiou o queixo sobre uma mão e o olhou. Deu-
se conta de que sua atitude relaxada era muito enganosa. Havia tensão em seus
traços. De repente, ele se levantou da cama, pegou seu roupão e o pôs
rapidamente.
Ashley não podia acreditar que ele fosse sair da habitação, depois do
que acabavam de compartilhar. Só o deixou chegar até a porta.
—Sinto muito, senhor. Decepcionei-o?
—Isto não é nada divertido — repôs ele, ao voltar-se.
—Não se supunha que o fosse. Mas, não deveria dizer a um homem de sua
experiência que há certas maneiras para estas ocasiões...
—E você sabe tudo a respeito, não é verdade? Com quantos homens
esteve?
Ela ficou pálida e se arrependeu de tê-lo desafiado, mas seu orgulho a
obrigava a negar-se a ser tratada dessa maneira.
—Diga-me. —Pediu ele. —Quero saber.
—Parece-me que agora não seria o momento mais propício —assinalou ela,
contendo as lágrimas de humilhação que apareciam em seus olhos.
—Estou me deixando levar pela imaginação. Prefiro a verdade.
—Não reconheceria a verdade embora a tivesse diante do seu nariz. Não
permitirei que me trate assim. Disse... disse que o passado era o passado...
—Como pode ser possível se cada vez que eu te tocar, vem tudo de novo?
Acha que eu gosto de me humilhar e te fazer essas perguntas tão
vergonhosas?
—O que quer? Uma lista de nomes, lugares e horas?
Vito ficou tenso.
—Provavelmente você gostaria que sublinhasse os nomes dessa lista —
replicou ela, gaguejando. — O que foi que disse a respeito de que confiasse em
você? Nem sequer há quatro anos confiava em mim —se obrigou a olhá-lo
diretamente nos olhos. —E sabe por que? Porque cometi o colossal erro de me
deitar com você na mesma noite em que nos conhecemos. Está tão absorto em
seu código medieval do que constitui uma mulher decente, que não pode

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Lynne Graham Desejo sem amor

perdoar isso. Não importa o fato de que tenha sido meu primeiro amante.
Durante todo o tempo em que estivemos juntos só esperava que voltasse a
fazê-lo com outro homem. E não pense que eu não sabia!
Depois de dizer isso, levantou-se rapidamente da cama, refugiou-se no
banheiro e passou a chave.
—Ashley... saia daí.
Ashley sacudiu a cabeça enquanto as lágrimas escorregavam por suas
bochechas. Dessa vez Vito tinha chegado muito longe. Tinha-lhe permitido que
chegasse muito longe. Mas a nenhum preço estava disposta a viver, embora
fosse brevemente, com um maldito hipócrita. «Acha que estou orgulhoso de
que não possa deixar de te tocar?», recordou que ele lhe havia dito isso em
Londres. «Certamente não está», Ashley disse a si mesmo ao reviver o
rapidamente que se afastou de sua presença contaminadora, depois de
satisfazer seu desejo.
—Ashley...
Abriu o grifo da ducha. Muito depois, saiu sem nenhum plano na cabeça,
exceto a firme decisão de escapar. Vestiu-se a toda pressa. Depois de colocar
algumas coisas em uma bolsa, saiu na ponta dos pés da habitação e foi ao andar
térreo. A casa estava às escuras. A porta da entrada nem sequer estava
fechada com chave.
Quando descia os degraus do pórtico, uma figura vestida de branco
surgiu das sombras.
—Vai sair senhora? Deseja um carro?
—Sim —respondeu ela, encantada de quão fácil ia resultar-lhe tudo. —
Quero ir ao Colón.
—Chamarei o Bandu. Levará um tempo.
—Você não pode me levar? —apressou-se a lhe perguntar Ashley.
—Eu? Kumar? —inquiriu o homem e sorriu. —Sim, eu levarei a senhora.
Kumar é muito bom condutor.
Não parecia que Kumar fosse tão bom condutor, a julgar pela maneira em
que arrancou o veículo dando tombos, mas Ashley não disse nada. O homem
pisou fundo no acelerador.
—Poderia conduzir mais devagar? —ela não demorou em lhe perguntar,
sem fôlego.
—Muito devagar, Kumar conduz muito devagar.
Desceram a rua a toda velocidade.
—Devagar! —exclamou ela dez minutos depois, aterrorizada, ao recordar
o pronunciado desfiladeiro pela qual tinham descido.

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De repente, Kumar pisou no freio. O carro derrapou, fora de controle,


de um lado a outro. Ao introduzir uma roda em uma sarjeta, o veículo se
inclinou, antes de deter-se. Ashley gritava. Kumar gritava mais forte. O
silêncio, ao fim, abateu-se sobre eles.
Ashley desabotoou o cinto de segurança e saiu do veículo, igual ao Kumar.
de repente, um tremendo ruído chamou sua atenção. À luz da lua, viu com
incredulidade como o carro caía rodando pela costa. Kumar tinha esquecido de
puxar o freio de mão.
O condutor lançou um grito de espanto e se lançou ao chão. Encontrava-
se em tais condições que passou um momento antes que ela pudesse tranqüilizá-
lo, lhe assegurando que não perderia seu emprego e que Vito não o culparia pela
perda do carro. De todas as formas, parecia pouco convencido, o qual a fez
sentir-se mais culpado que nunca.
Ao fim, Ashley conseguiu inteirar-se de que havia uma pequena pensão a
alguns quilômetros dali. Começaram a caminhar. Demoraram uma hora em
chegar até o lugar. Quando Kumar despertou o dono da pensão, e este, sua
curiosa esposa e seus emocionados filhos tiveram escutado toda a história, já
eram as três da madrugada. Ashley se perguntou então como demônios tinha
podido ser tão impulsiva.
Com amabilidade a levaram a uma pequena e sóbria habitação. Depois de
lavar-se no lavabo que havia em um canto, deitou-se.
Acaso não era uma jovem inteligente? perguntou-se. Mas quando tinha
demonstrado ser inteligente com Vito? De maneira inexorável seus
pensamentos voltaram para o passado, mas tampouco encontrou consolo nisso...
A manhã posterior a aquela fatídica festa, ela insistiu em afirmar que
não queria voltar a ver Vito.

A contra gosto, deixou que a levasse a casa. Vito a convidou para jantar
essa noite e Ashley lhe disse que estava ocupada. Propôs-lhe que saíssem à
tarde seguinte, mas lhe respondeu que estaria ocupada durante o resto de sua
vida.
Vito sorriu, mas não disse nada. E essa mesma noite apareceu com um
enorme buquê de rosas. Suas companheiras de apartamento ficaram
assombradas. Ela pensou que não seria correto rechaçá-lo diante de suas
companheiras, assim que foi jantar com ele.
—Não precisa fazer isso —repetia Ashley quando se encontravam no
restaurante cinco estrelas, pois não queria que Vito gastasse seu dinheiro com
ela. — Não me deve nada.

61
Lynne Graham Desejo sem amor

—Por que está tão decidida a me deixar?


Resultava evidente que se tratava de uma experiência muito nova para
ele. De acordo com Vito, o acontecimento da noite anterior tinha transcorrido
com muita rapidez. Ele era mais velho que ela, mais sensato. Disse-lhe que tudo
era culpa dela, assim queria que voltassem a começar como se nada tivesse
ocorrido.
—Por que? —perguntou-lhe ela com franqueza.
Ele sorriu com ironia.
—Acredito que me apaixonei por você.
—Luxúria. É luxúria o que sente.
—Também acredito que vou me casar com você, se guardar silenciar
durante o tempo suficiente como para que lhe peça —repôs isso ele, muito
seguro de si mesmo.
Entretanto, Ashley decidiu que Vito não podia estar falando a sério.
Mesmo assim, passou o resto da tarde lhe explicando porque nunca se casaria
com ele nem com ninguém mais.
—Então tenhamos uma aventura —declarou Vito com calma.
—Não tenho tempo para aventura.
—Terá tempo para mim —respondeu ele, sem a menor vacilação.
E tinha razão. Mas não tiveram tempo suficiente. O negócio do banco era
muito absorvente. Ashley assistia às aulas; além disso, trabalhava de
garçonete.
Embora o plano consistia em que voltassem a começar e se conhecessem
bem, não resultou assim. O incompatível de seus programas de trabalho
provocou que quase não se vissem durante as três primeiras semanas. Na
realidade nunca falaram de viver juntos. Vito lhe propôs que, quando ele
estivesse no estrangeiro, utilizasse seu apartamento para estudar com maior
tranqüilidade. Pouco a pouco Ashley foi levando ali seus pertences e noite após
noite Vito conseguiu assegurar-se de que ela não voltasse para sua casa.
Mas assim que Ashley começou a estabelecer-se, os desacordos que
tinham tido desembocaram em verdadeiras discussões. Uma vez que conheceu
seu plano de trabalho, Vito esperava que ela deixasse os compromissos que ele
considerava desnecessários ou pouco importantes. O fato de que Ashley
insistisse em seguir trabalhando de garçonete o enfureceu.
O mesmo ocorreu com a decisão de Ashley quanto a conservar seus
amigos e assistir de vez em quando as festas estudantis.
Ao que parece, quando Vito mantinha uma relação com uma mulher,
esperava direitos exclusivos de vinte e quatro horas.

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Lynne Graham Desejo sem amor

As discussões se voltaram cada vez mais apaixonadas e destrutivas.


Nenhum dos dois estava disposto a ceder absolutamente, e Ashley foi se
voltando cada vez mais insegura. Não tinha a força suficiente para deixá-lo.
Cada vez mais, o quarto foi se convertendo no único lugar onde se encontravam
em completa harmonia.
Quando Vito a criticava, discutia com ela ou inclusive tentava raciocinar,
Ashley partia do apartamento. Permanecia acordada pelas noites, preocupada,
enquanto ele dormia como um tronco. Seu professor lhe disse que seu
rendimento já não satisfazia os requisitos. Já não podia concentrar-se; só
pensava em Vito. Ele tratou de ajudá-la, mas quando uma noite Ashley o culpou
pelos problemas que tinha, Vito perdeu os estribos e lhe disse que ela não
estava em seu elemento porque não parecia entender as complexidades da
contabilidade.
Vito lhe pediu desculpas, mas Ashley compreendeu que tinha razão. Logo,
um dia ele se foi a Itália e demorou toda uma semana em chamá-la.
Elena a visitou um dia, antes que ele retornasse. E Vito voltou com um
ultimato. Planejava viver na Itália. Seu pai se encontrava doente. Tinha uma
família e compromissos de trabalho, dos quais não podia ocupar-se de Londres.
—Teremos que nos casar —declarou e pediu a sua governanta que lhe
preparasse a bagagem. — É hora de que amadureça. Quero ter uma família,
agora que ainda sou jovem para desfrutá-la. Estou farto dessa basu... dessas
tolices feministas. Deve aceitar que meu trabalho no banco e minhas
responsabilidades têm prioridade sobre as tuas —e quando ao fim se deu conta
de que ela não ia aceitar ansiosa o anel de ouro que ele lhe oferecia, exclamou
com incredulidade: — Mas se está compartilhando minha cama durante meses!
Depois disso seguiu uma terrível discussão. Ashley lhe disse umas
verdades. Em poucas palavras, Vito pôs o grito no céu.
Durante cinco meses ele tinha estado mimando-a, agradando-a. Mas de
repente Ashley descobriu que Vito podia jogar por terra todos seus
argumentos e fazê-la sentir-se como uma estúpida.
Ashley se agitou sobre o duro colchão e voltou para o doloroso presente.
Levantou-se depois das oito. Pensou que, nesse momento, Vito já saberia que
tinha fugido.
Quando seu anfitrião a conduziu até uma desvencilhada mesa, de onde
podia ver a cascata que se encontrava na parte posterior da propriedade,
voltou a piscar para conter as lágrimas.
Ao amanhecer tinha compreendido a verdade. Amava o Vito. Só o amor
podia proporcionar a ele um poder para feri-la tanto.

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Um débil ruído a fez levantar o rosto. Ficou paralisada. Vito se


encontrava na galeria. Segurava com força a jaqueta que ela havia usado; usava
a camisa aberta à altura do pescoço, tinha o cabelo úmido e despenteado.
Parecia muito nervoso.
Vito tragou saliva enquanto a olhava fixamente.
—Acreditei que estava morta —declarou.

Capítulo 8

VITO bebeu de um gole uma taça de arrack que lhe serviu o dono da
pensão antes de voltar a falar. O ardente líquido pareceu reanimá-lo.
—Priya despertou para me dizer que um carro que levava uma mulher
européia tinha sofrido um acidente ontem à noite. Logo me informou que tinha
sumido...
—Sinto muito —expressou Ashley, pálida.
—Quando vi o carro, compreendi que ninguém poderia ter saído vivo dali.
Vim aqui para perguntar se sabiam aonde... aonde a tinham levado...
—Kumar e eu saímos antes que o carro saísse do caminho. Ele esqueceu
de puxar o freio de mão. Mas o acidente não foi culpa dele.
—É obvio que sim! —exclamou Vito. — Não tem carteira de motorista.
Podia ter morrido!
—Não sabe dirigir? Não me ocorreu pensar que não soubesse. Eu insisti
muito em que me levasse. Não pode culpá-lo. Ele só tratava de me agradar.
Vito pareceu pouco convencido e interessado ao mesmo tempo.
—Deixarei que Priya se faça acusação dele. É seu sobrinho. Ela é terrível
quando se zanga.
—Não perderá seu emprego? —insistiu ela.
—Está viva. Estou disposto a perdoar.

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Lynne Graham Desejo sem amor

—De verdade? Quando meu irmão se confessou culpado, estava disposto


a colocá-lo na prisão.
—Kumar não tem nenhuma irmã com a qual queria me casar —assinalou
ele com sarcasmo. — Em vez disso prefiro perdoar.
—Provavelmente se pergunte o que estou fazendo aqui...
—Dependia de você que nossa noite de núpcias resultasse algo fora do
comum. Vamos tomar o café da manhã.
Enquanto tomavam o café da manhã, o silêncio de Vito a turvou.
—Suponho que agora pensa que sou uma trapaceira. Tivemos uma
discussão...
—Eu tive minha parte nela.
—Foi um período muito duro para nós dois.
—Mas eu não facilitei as coisas. Ontem à noite não tinha nenhum direito
a me intrometer em seu passado e nenhuma desculpa para zombar de ti. Depois
de tudo, não sou um monge.
—Era compreensível.
—Tive uma amante durante o último ano e meio.
A declaração de Vito a deixou paralisada. Mordeu a língua.
—Terminei com ela faz alguns meses. Mas, sabe o que é o que me atraiu
nela?
Ashley sentiu náuseas. Desejou desesperadamente que se calasse, pois
não queria ver-se obrigada a imaginá-lo fazendo amor com outra mulher.
—Tinha o cabelo da mesma cor que o teu —declarou ele, desprezando a si
mesmo. — Mas não era você.
—Não. Ela não teria escapado de madrugada nem teria te destroçado o
carro, suponho.
—Só você seria capaz de fazer isso —assinalou com um tom quase
amável, lhe agarrando uma mão.
Ashley inclinou a cabeça. Desejava lhe dizer que nunca tinha tido outro
amante. Mas em vez disso concentrou sua atenção na cascata. Vito não só não
necessitava dessa informação, mas também provavelmente se negaria a
acreditá-la.
—Há cinco dias preciso dizer-lhe isso —continuou Vito. — À noite da
festa, foi um duro golpe para mim quando me contou sua versão do acontecido...
—Não quero falar disso —era sua oportunidade para interrompê-lo. O
assunto do bebê era muito doloroso para ela.
—Ashley...
—Não! —exclamou ela, retirando a mão.

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Lynne Graham Desejo sem amor

—Devemos falar disso.


—Mas eu não quero!
—Talvez seja muito cedo —reconheceu Vito com surpreendente
generosidade.
Provavelmente não fosse algo tão surpreendente, pensou Ashley. Vito
tinha ficado impressionado ao ver o carro destroçado, e tinha se convencido de
que, se não tivesse morrido, encontrava-se gravemente ferida. Mas quanto
tempo duraria sua amabilidade?

Dez dias depois, Ashley se encontrava nos templos das covas da


Dambulla. Admitiu então que Vito estava fazendo um verdadeiro esforço para
mostrar-se amável e simpático, e não hostil. Começava a entender que em
alguns aspectos não tinha conhecido absolutamente o Vito, quatro anos atrás...
Isso a incomodava, mas era verdade. Ele era muito mais conservador do que
tinha acreditado. A maneira em que a deixou louca na noite em que se
conheceram distorceu a imagem que Ashley tinha dele, igual à que Vito tinha a
respeito dela.
Contemplou a vista panorâmica da cidadela de Sigiriya e o gigantesco
monólito de pedra vermelha, que se elevava centenas de metros para o céu.
Tinha calor, apesar do chapéu de palha que usava, graças à insistência de Vito.
—Acha que poderei conseguir um copo de água?
Vito interrompeu sua conversa com o pequeno sacerdote budista, com o
qual revelava outra faceta de sua personalidade. Não era o esnobe que ela
supunha, nem tampouco um viciado no trabalho.
—Tem um aspecto terrível —assinalou ele.
—O calor...
Levou-a a sombra, junto à parede.
—Não devia ter te trazido aqui.
—Estarei bem dentro de um instante —indicou ela, turvada por sua
própria fragilidade. Desde dois dias atrás tinha sentido debilidade nas pernas,
assim como náuseas, embora tinha conseguido ocultar de Vito.
Nesse momento ele estava fazendo acusação da situação e se desfazia
em cuidados com ela. Depois de que Ashley se sentasse em um degrau, Vito foi
procurar um leque. Parecia em seu elemento.
Fizeram a descida pouco a pouco. Vito a levou ao pequeno café do
povoado e lhe comprou uns refrescos.

66
Lynne Graham Desejo sem amor

—Ficaremos sentados aqui um momento, antes de voltar ao carro —


decidiu ele.
—Visitar lugares de interesse é mais exaustivo que trabalhar admitiu
ela, suspirando pesarosa.
—Suponho que sente falta de sua profissão —expressou ele, tenso.
—Não era precisamente uma profissão.
—Nunca fala disso —comentou ele com estudada naturalidade.
—Não há muito que falar a respeito.
—E certamente me culpa por isso. Sei o muito que sua profissão deve
significar para você. Se... quero dizer... quando nos separarmos, darei-te toda a
ajuda que necessite para que volte a conseguir um emprego apropriado. Tenho
muitos contatos.
—Pode estar certo de que a influência Cavalieri seria fantástica —lhe
espetou ela, apertando os lábios.
«Quando nos separarmos», disse a si mesmo. Pensou que da última vez
tinha lhe dado um talonário de cheques, agora um emprego novo... Vito podia lhe
dar o que quisesse, mas não o que mais desejava. Não a havia tocado desde
aquela noite. Todos os dias, depois de jantar, Vito se despedia dela e ia
trabalhar no computador do cômodo que utilizava como escritório, enquanto ela
ia dormir sozinha.
—Onde trabalhava exatamente?
—Em nenhum lugar que conheça.
—Por que é tão reservada a respeito disso?
—Abandonei a universidade, Vito.
Ele a olhou com incredulidade.
—Você o que...!
—Não fui aprovada nos exames.
—Não passou? —perguntou com assombro.
Ashley lhe explicou os fatos.
—Mas por que não voltou a fazer os exames?
—Eu não estava bem e meu pai retirou seu apoio.
—Por que?
—Porque descobriu que estive vivendo com você.
—Não existe um sistema de bolsa para estudantes?
—Devia muito dinheiro, Vito. Sem o apoio de minha família não podia
sobreviver e estudar ao mesmo tempo.
—Entretanto, não aceitou meu dinheiro.
—Jamais aceitaria.

67
Lynne Graham Desejo sem amor

—Como ganhou a vida depois?


—Como todos os outros: trabalhando. Durante um tempo trabalhei em
uma loja. Não seja tão esnobe, Vito! —exclamou ao ver como se tornava para
trás.
—Não sou esnobe. Mas estou muito preocupado pelo que acaba de me
dizer.
—OH, vamos! Se ainda tivesse estado comigo quando me suspenderam,
teria se encantado! Teria evitado a moléstia de me dizer que minhas
necessidades e ambições eram menos importantes que as tuas. Mas isso não me
surpreendeu, Vito.
—Não quero tratar de me defender quando está com esse ânimo.
—Acredito que se te defendesse poria a prova sua ingenuidade.
Ela se negou a falar com ele durante todo o trajeto de volta a casa.
Sabia que resultava infantil, mas gostava de ter a oportunidade de expressar
seu ressentimento e utilizá-lo para manter Vito controlado. Mesmo estando
apaixonada por ele, mas isso não significava que tivesse esquecido que acima de
tudo era um egoísta.
—Somos muito parecidos—comentou Vito.
Ela se acovardou e se perguntou se ele podia adivinhar seu pensamento.
—Nós dois somos arrebatados, decididos e egocêntricos.
—Eu não sou.
Vito a olhou com incredulidade.
—Durante toda nossa relação, há quatro anos, nunca te ocorreu pensar
em meus sentimentos. Disse-me o que pensava, assim como o que desejava e o
que faria. Mas jamais teve em conta o que eu poderia pensar —comentou Vito.
Seu tom de censura a desconcertou.
—E como a amava, joguei limpo, mas me submeter às regras de outra
pessoa nunca me pareceu natural —continuou. — Nem tudo foi minha culpa.
—Você nunca me amou.
Vito não se preocupou com refutar essa acusação, o qual a encolerizou
ainda mais. É obvio, ele não a amava. Um homem apaixonado não ia
imediatamente casar-se com outra mulher. Entretanto, Vito tinha pensado que
Ashley estava vivendo com o Steve. Não tinha sido isso suficiente para que se
convencesse de que não existia nenhuma possibilidade de viver com ela? E que
Carina, a quem conhecia desde a infância, seria uma esposa muito mais
conveniente?
Mas isso não o desculpava por tê-la abandonado por completo. Como pôde
ter aceitado, com tanta facilidade, que ela recorresse imediatamente a outro

68
Lynne Graham Desejo sem amor

homem em busca de consolo? Depois Vito lhe havia dito que albergava muitas
dúvidas a respeito dela. Talvez isso simplesmente tinha sido um pretexto para
tirá-la de sua vida.
A segunda semana de sua estadia transcorreu preguiçosamente. Ashley
estava acostumado a vadiar pelas tardes, junto à piscina, e dormia a sesta sob
a sombra de uma enorme sombrinha. Vito passava mais e mais tempo no
escritório. A tensão crescia por momentos. Ashley pensou que provavelmente a
falta de sexo estivesse afetando-o. Aquela lua-de-mel era muito estranha.
Aborrecida, Ashley entrou na casa em busca de outra revista. Priya
estava colocando umas flores no vestíbulo. Junto a ela se encontrava um
menino pequeno que não deixava de queixar-se.
Sorridente, Ashley se inclinou para ele.
—Quem é?
—Nuwan, meu neto mais novo —confessou Priya, suspirando com cansaço.
—Meu genro está no hospital e minha filha o acompanha.
—Nada grave, não é verdade?
—O apêndice. A operação será hoje.
—Me deixe levar o menino ao jardim. Faz um belo dia.
Priya protestou, mas o pequeno pareceu entusiasmado. A mulher também
se deu conta de que a esposa de seu patrão estava desejosa de fazer algo.
Duas horas depois, o único que se ouvia no jardim era a risada do Nuwan
enquanto Ashley brincava com ele. Meia hora mais tarde, o menino ficou
adormecido, enroscado em seus braços. Priya se aproximou com um copo de
suco de lima, em uma bandeja de prata, e advertiu o cansada que se encontrava
Ashley.
—Deveria descansar, madame —indicou com inquietação a mulher mais
velha. —Não é bom para a criança que se canse tanto.
Ashley ficou paralisada; Priya não se referia a seu neto.
—Acha que não sei? comentou a mulher. —Tenho onze filhos e vinte
netos. Ele se pergunta por que está cansada todo o dia. Diga-lhe logo, faça-o
feliz.
Priya retornou a casa. «Não é possível», Ashley disse a si mesmo, mas
sim, sim o era. Aconteceu naquela noite em Londres, quando essa paixão
desesperada se apoderou deles. Não havia tornado a pensar no risco que correu
aquela noite.
E nesse instante, de repente, parecia-lhe evidente. Não tinha
reconhecido as provas do que tinha diante: as náuseas, o enjôo, o cansaço...
—Vi você com o neto de Priya.

69
Lynne Graham Desejo sem amor

Ashley voltou a cabeça e ruborizou.


—Acreditava que estava trabalhando.
—Não me casei com você para passar os dias trancado, trabalhando com
o computador.
A jovem, em seu foro interno, deu-lhe razão: Vito tinha se casado com
ela para ter um filho, e por alguma razão insondável tinha adiado esse desejo.
Entretanto, sua mudança de opinião tinha chegado muito tarde para salvá-la.
Apesar disso, Ashley experimentou o desejo de ser mãe, desejo que
afogou imediatamente. Estava convencida de que provavelmente teria outro
aborto. Perguntou-se como era possível que ele a fizesse passar por isso de
novo.
Depois de um momento de silêncio, Vito comentou:
—Para uma mulher a quem não gosta de criança, tem um grande talento
para entretê-los.
—Nunca em minha vida eu disse que não gostava de crianças! —exclamou
ela. — E por que não teria que ter esse talento do que fala? Esse é o trabalho
para o qual me preparei... era meu trabalho até que você apareceu e também
danificou isso!
O assombro de Vito era evidente.
—Seu trabalho?
—Trabalhava em uma creche —se levantou e se dirigiu para as árvores.
—E por que não me disse isso antes? —perguntou ele, agarrando-a em um
braço com firmeza.
Furiosa, ela retirou a mão.
—Não era teu assunto!
Vito a alcançou. Detiveram-se em um claro onde se formou um lago
natural, alimentado por um riacho da montanha. Era um lugar afastado, um
refúgio onde a vegetação era exuberante e floresciam as orquídeas.
Ashley o olhou nos olhos.
—Não pode compreender que quero ficar sozinha?
—Deixa de fugir. Dou-me conta de que me afastar de você foi um erro.
—E o que se supõe que isso significa? —perguntou ela, nervosa.
—Deixei-te sozinha com a esperança de que aproveitasse esse tempo
para aceitar nosso casamento, mas tudo o que tem feito é voltar a se afastar
de mim. Queria que reconhecesse o laço que existe entre nós e se aproximasse
de mim...
—Laço? Aproximar-me de você? perguntou ela, tornando-se a rir. Ao que
parece, nenhuma rendição satisfazia Vito.

70
Lynne Graham Desejo sem amor

Ele a olhou intensamente.


—Não —repôs ele em voz baixa.
—Não o que? Que não ria? —perguntou ela, irritada.
—De verdade pensa que não sei o que sente? Quer me arranhar e me
rasgar como um tigre para me manter à distância, mas não resultará. Nosso
casamento não é uma competição. Não se trata de que um dos dois ganhe ou
perca.
—Se soubesse o que sinto, não estaria falando de perder. Odeio-te!
—Não, tem medo de confiar em mim —a contradisse com arrogância. —
Mas não me odeia.
—Odeio-te! Odeio-te! Odeio-te!
Ashley tremia. Perguntava-se o que nesse momento Vito estava tratando
de fazer com ela. No princípio se perguntou o que era mais forte: se o desejo
dele de ter um filho ou seu afã de vingar-se. Na noite de núpcias, ele
respondeu a sua pergunta postergando o primeiro para poder concentrar-se no
segundo.
—Nunca voltarei a te amar! Ouviu?
—Deveria te abandonar ao menos duas vezes ao dia, e te fazer perder a
cabeça —assinalou ele, sorrindo. —No final da semana te conheceria a fundo...
todos seus segredos... todos seus pensamentos. Então, há quatro anos
acreditava que me amava?
Horrorizada, Ashley começou a afastar-se dele.
—Não irá a nenhuma parte —a segurou com firmeza antes que pudesse
mover-se.
Desesperada, ela levantou uma mão para lhe dar uma bofetada, mas Vito,
com extraordinária agilidade, jogou a cabeça para trás, fazendo-a perder o
equilíbrio. Com firmeza a segurou pela cintura e a fez deitar-se na grama.
Encontrando-se de repente em uma posição muito vulnerável, Ashley tentou
rechaçá-lo. Vito sorriu e continuou segurando-a.
—Está assustada, não é verdade? —inquiriu. — Quer atacar e se retirar.
Ashley lhe dirigiu um olhar desafiante.
—Por que me faz isso?
De repente, ela tomou consciência de que somente estava vestida com
um biquíni, enquanto Vito se apoderava de seus lábios com toda a avidez de um
homem que tinha estado reprimindo seus sentimentos.
Sua língua conseguiu penetrar entre seus lábios. Seguiu beijando-a até
que Ashley começou a derreter-se de prazer. Só então ele se afastou, e com

71
Lynne Graham Desejo sem amor

impaciência lhe tirou o sutiã do biquíni. Inclinou a cabeça e lhe acariciou um


mamilo com os lábios.
—Desejo-te tanto que, quando terminar, será como morrer e voltar a
nascer.
Ashley gemeu e jogou a cabeça para trás, quando ele tomou seus seios
com gesto possessivo.
—Quero despertar ao amanhecer e te encontrar me fazendo amor —
continuou ele.
—Não —lhe espetou ela sem fôlego, mas seu corpo a estava traindo.
Atormentava-a a necessidade de tocá-lo com tanta intimidade como ele estava
fazendo.
Vito estremecia, suava, revelando dessa forma sua excitação. Ashley se
deu conta que, igual a ela, já não podia dominar-se. Apertou-se contra ele e o
acariciou. Ouviu-o gemer.
Parecia que nunca tinham estado separados. Quando ao fim Vito se
colocou entre suas coxas, ela elevou a mão e lhe acariciou o rosto. Detento do
desejo, ele estremeceu e gemeu, e logo a possuiu. Fez-lhe amor de uma maneira
que superava as fantasias mais vividas de Ashley.
Quando tudo terminou, ela permaneceu com a cabeça apoiada em seu
peito, escutando os batimentos de seu coração, abraçada a ele. Tinha sido como
morrer e voltar a nascer. Depois, foi como despertar no paraíso.
Vito a acariciou com ternura. Ela recordou que, em toda sua vida, a única
vez que se sentiu segura foi em seus braços.
—Provavelmente no fim de ano considere a possibilidade de tentar a seu
irmão com outra Ferrari.
A ilusão do paraíso se desfez de repente. Ela sentiu vontade de chorar e
gritar desesperada. Não podia retroceder. Tampouco podia seguir adiante.
Sempre o passado se interporia ante ela.

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Lynne Graham Desejo sem amor

Capítulo 9

—Se fosse um felino, ronronaria, minha cara —depois de lhe dar um


beijo na testa, Vito se levantou da cama. Totalmente vestido e irradiando
energia, sorriu para Ashley. — Suponho que não queira tomar o café da manhã
comigo, não é verdade?
—Não —respondeu ela, consciente de que no momento em que tentasse
sentar-se ante a mesa, vomitaria.
Ele sorriu e caminhou pela habitação com toda a indolente graça de um
predador, satisfeito depois de uma boa refeição.
—Até mais tarde!
Priya apareceu com uma bolacha e uma xícara de um aromático chá de
ervas. Resultava-lhe muito difícil comer deitada, mas Ashley fez todo o
possível. A mulher lhe havia dito algo a respeito de que precisava ver um
médico, mas Ashley não prestou atenção aos seus conselhos. A cena dessa
manhã se converteu em algo rotineiro desde que Priya a encontrou muito
doente no banheiro. Ashley tinha se conversado com ela para ocultar seu
estado. Como já tinha perdido um bebê antes, não queria que Vito albergasse
falsas esperanças. Priya compreendeu o motivo. Em sua cultura teria que
proteger aos homens de experiências preocupantes, e fazê-lo era o dever das
mulheres.
Sem dúvida, estava grávida. Não precisava fazer nenhum teste ou exame
para confirmar esse fato. Mas, durante quanto tempo poderia guardar
segredo?
Vito compartilhava a cama com ela e faziam amor todas as noites, assim
como também pelas tardes. Gostava que sempre estivesse ávido dela.
Sentindo pena de si mesmo, conteve as lágrimas, piscando. Disse a si
mesmo que deveria sentir-se envergonhada. Fazia já um mês que devia ter
contado a Vito que provavelmente estava grávida. Logo, com toda
probabilidade, ele a teria deixado em paz. O problema era que tinha a
impressão de que estava vivendo nas nuvens, mas era muito feliz. Nunca tinha
estado tão contente, mas tinha conseguido essa façanha apagando o fato de
que o seu casamento não era normal.
No dia seguinte retornariam a Londres. A lua-de-mel terminaria e pendia
sobre ela a ameaça de um aborto. Tinha a certeza de que uma vez que isso
acontecesse, ele a deixaria ir. A menos que conseguisse lhe ocultar também o
aborto. Entretanto, desejava ter o bebê. Precisava fugir e criá-lo em um lugar

73
Lynne Graham Desejo sem amor

onde, nem sequer com toda sua riqueza e influência, os Cavalieri pudessem
encontrá-la.
Desceu um pouco antes da hora do almoço. Estava muito bonita, com um
vestido de cor esmeralda combinado com seus olhos. Ao vê-la, Vito titubeou
enquanto falava por telefone. Segurou sua mão, deu-lhe um beijo na palma e,
com evidente dificuldade, continuou conversando pelo telefone.
—Cada dia está mais bonita —declarou ele.
Ashley parecia um gato contemplando uma grande e saborosa tigela de
leite, enquanto observava Vito. Não podia afastar os olhos dele. Havia uma
forte carga elétrica no ambiente.
—Deus! Vai me matar —expressou ele em voz baixa, hipnotizado por seu
sorriso sensual.
Ashley saboreou com delícia uma uva, consciente do efeito que exercia
sobre ele. Amava-o e se conformava levando a pior parte.
—Quero comer —assinalou ela.
—E este é nosso último dia —lhe recordou ele com evidente
desinteresse. — Me disse que você gostaria de ver outra vez os elefantes.
A visita à reserva de elefantes da Pinawella a tinha encantado, na
semana anterior. Ele era um companheiro e amante perfeito, atento e
inteligente. Entretanto, recordou-se que esse mesmo homem a tinha
abandonado, tinha pensado o pior dela e se casou com outra mulher, a quem
nunca mencionou, apesar de que Ashley lhe tinha dado várias oportunidades
para fazê-lo.
—Em lugar de ir, poderia ver as fotos que fiz —repôs ela.
—E provavelmente poderíamos permanecer fora da cama o tempo
suficiente para conversar. Devo te dizer algumas coisas.
Parecia sério. E quando isso acontecia, ela ficava nervosa. Perdeu o
apetite e colocou o prato de lado.
—Por que conversar sempre te resulta tão intimidante?
—Porque discutimos.
—Não devemos discutir.
—Para que se preocupar? dentro de alguns meses terei ido embora...
não?
Ele ficou tenso.
—Sim, é obvio, mas isso não impede que estabeleçamos uma melhor
comunicação entre nós, não é verdade?
—Será que alguma vez está satisfeito? Trato de te dar o que deseja,
mas é insuficiente! Sei que o que temos agora só é uma ilusão, eu...

74
Lynne Graham Desejo sem amor

—É?
—É obvio que sim —respondeu ela, ruborizando-se. Orgulhosa, levantou
o rosto. — Está pagando um bom preço!
Vito ficou pálido. Levantou-se da mesa com um olhar de desprezo.
—Quando necessitar de uma prostituta buscarei-a, mas certamente você
merece uma bonificação por seu entusiasmo! com um gesto zombador, arrojou
uma pequena bolsa de pele sobre a mesa. — Pelos favores feitos, muito além da
chamada do dever.
Vito saiu rapidamente, subiu em seu carro e partiu. Tremendo, Ashley
abriu a bolsa. Dentro encontrou um anel de safira. Ashley sabia que era uma
gema da mais alta qualidade, que valia milhares e milhares de libras, o qual a
fez sentir-se pior. Não pôde evitar explodir em pranto.
Eram mais de nove horas quando ele retornou. Ashley estava esperando-
o no salão. Quando Vito apareceu na porta, ela se levantou de um salto.
—Não falava a sério. Sinto muito! exclamou ela. Não queria parecer tão
suplicante, mas, ao olhá-lo à cara e descobriu que não sorria, sentiu medo.
—Esqueça. —repôs ele com frieza. —Se tem aquilo pelo qual se paga. E
como eu paguei por você, não posso pôr reparos em sua sinceridade.
—Onde esteve durante todo o dia?
—Parece uma verdadeira esposa.
«Vito, amo-te, por favor, não me faça isto», esteve a ponto de declarar
em voz alta. Não estava preparada para isso. Pensou que provavelmente nunca o
estaria, pois assim que saía da casa, ela ficava a tremer.
Vito se serviu uma bebida e ofereceu outra a Ashley, mas quando esta
respondeu que não, lhe sugeriu:
—Por que não vai se deitar? Sairemos amanhã cedo.
—Não falava a sério.
—Relaxe, pois seu irmãozinho saiu do apuro faz semanas.
—Não é por isso pelo que trato de discutir com você.
—Não? Bom, só existe outra possibilidade, não é verdade? A ameaça de
uma noite sem orgia sexual te horroriza? diga-me lhe exigiu. —Segundo sua
ampla experiência com os de meu sexo, sou tão bom que está disposta a se
arrastar e suplicar?
Ashley ficou muito pálida.
—Não... não sei realmente. Nunca estive com outro homem.
—Há quatro anos eu te vi nos braços desse maldito, na rua. Vi com meus
próprios olhos. Se tivesse descido de meu carro, teria te matado!

75
Lynne Graham Desejo sem amor

—Há qua... quatro anos? —gaguejou ela. — Me viu com o Steve... na rua?
M... mas isso significa que sem dúvida...
—Voltei depois de que você recusou meu pedido? Fiz isso. Era um
verdadeiro estúpido. Mas já não sou.
Ela estava tremendo.
—Mas não pôde ter visto nada entre o Steve e eu!
—Estava em seus braços e dormia em seu apartamento.
De repente, ela compreendeu quando deve tê-la visto Vito: foi no dia em
que descobriu que estava grávida. Ashley tinha começado a chorar no bar da
associação de estudantes, de modo que Steve teve que levá-la a seu
apartamento. Durante o trajeto, lhe contou o que acontecia então ele a
abraçou.
—Por Deus! Tudo o que ele fez foi me abraçar... tratava de me consolar,
mas eu estava preocupada com o bebê e com você!
—Nessa ordem. Horrorizava-te o bebê, depois a mim.
Algo se rompeu dentro de Ashley; foi a gota d`água. Atravessou a
habitação e agarrou o Vito das lapelas da jaqueta. De repente, as emoções se
apoderaram dela.
—Foi no dia em que descobri que estava grávida! —explodiu. —E ainda se
atreve a me dizer que estava por ali perto, em um carro, deixando-o fazer o
que você deveria ter feito? Como se atreve a me dizer isso agora? Deveria se
sentir envergonhado de admitir que se aproximou, mas não fez nada! Não me
amava, Vito. Não confiava em mim. Importava-se mais o seu amor próprio!
—Isso...
—E logo, para arredondar tudo, casou-se com outra mulher quando ainda
me pertencia! Acha que vou esquecer ou perdoar isso? Tem uma dívida comigo,
Vito...
Ashley afastou bruscamente as mãos dele. Sua frustração e dor eram
tão grandes, que realmente não confiava em si mesmo para não golpear Vito,
uma vez que sabia o que lhe tinha ocultado quatro anos antes. Tinha sido uma
interpretação errônea dos sucessos que, entretanto, destroçaram sua vida,
assim como suas esperanças de ser feliz. Mas Vito ainda tinha sido o bastante
sereno para prejudicar sua própria vida. Isso era o que tanto doía a ela.
—Eu não a amava —lhe confessou Vito a contra gosto, com voz grave.
Ashley disse que Vito tinha amado a ela, e, entretanto ao final se casou
com Carina. A ira voltou a invadi-la. Tinha sofrido tanto por tão pouco.

76
Lynne Graham Desejo sem amor

—Quer falar um pouco mais, Vito? Quer continuar estabelecendo uma


melhor comunicação? —perguntou Ashley. — Não a amava, mas se casou com
ela...
—Você não me queria — recordou ele com aspereza.
—OH, que tolo! —exclamou ela, rindo com incredulidade. — Não se dá
conta quando uma mulher o ama? Disse não ao pedido de casamento de seis
homens antes de completar os vinte e cinco anos... mas, não disse não a você!
Vito parecia aturdido.
—Deus! —exclamou.
Ashley teve vontade de chorar.
—Me vou deitar —declarou.
—Ashley —enquanto ele falava, ela se voltou a contra gosto. —Alguma
vez te ocorreu pensar que nós dois somos culpados de ter tomado decisões
irrefletidas e estúpidas?
—Você tinha mais possibilidades de escolher que eu.
—Pedi que se casasse comigo porque essa era a única possibilidade que
tinha. Não podia ficar em Londres, e só podia te levar a Itália como minha
esposa.
Dirigiu-lhe um olhar de desprezo.
—Não me pediu que me casasse com você, disse-me que devíamos nos
casar. Era um ultimato, uma lista do que queria e do que esperava que
aceitasse.
Vito sorriu sem humor.
—Foi assim que entendeu? Sei que não queria se casar, mas isso era tudo
o que eu tinha para te oferecer. Acabava de me inteirar de que ao meu pai só
restava alguns meses de vida...
—Disse que ele estava doente... mas não me disse que estava morrendo!
—De todas as maneiras, não parecia interessada.
Sentindo-se culpada, Ashley ruborizou e recordou seu próprio estado de
ânimo, à defensiva, o dia posterior à visita da mãe de Vito.
—Eu já estava zangado — confessou ele. —Meu pai pediu que me casasse
com Carina... apesar do fato de que eu já tinha lhe falado sobre você! Mas se
tratava do último desejo de um homem moribundo. Tivemos uma violenta
discussão em torno do assunto. De tudo o que ele podia ter pedido, era o único
que eu não podia fazer...
—Eu não sabia —comentou Ashley, emocionada.
Deu-se conta de que, ao desejar casar-se com ela, Vito tinha suportado
muito mais que a oposição de sua família. Seu pai lhe fez um pedido e Vito não

77
Lynne Graham Desejo sem amor

cedeu, mas isso lhe havia doído muito. Ele procedia de uma família encantadora.
Provavelmente até esse momento tinha sido um filho leal e obediente, que
nunca tinha causado nenhuma preocupação. Nesse momento entendia os
motivos que tinha tido Elena di Cavalieri para intrometer-se. Seu marido estava
morrendo e ela tinha acreditado que ela não poderia fazer feliz ao seu filho.
Esses foram os motivos que a levaram a tentar separá-los.
—O que poderia importar a você? Diz que me amava, mas deve saber
quão impossível teria sido para nós tratar de manter uma relação estando tão
separados...
—Provavelmente teria gostado dessa possibilidade!
—Talvez tivesse lhe dado essa opção, se não tivesse feito que
resultasse tão insultantemente óbvio, que pensasse que nossa relação não
duraria. Sempre me dizia: «se conhecesse outro homem... se você conhecesse
outra mulher...»
Ashley levantou o rosto.
—Acreditava que era muito jovem para fazer promessas. Não queria me
sentir amarrada...
—Em vez disso, fez com que eu me sentisse como se tivesse desfrutado
de uma aventura de uma noite!
—Acreditava que isso só eu o fazia!
—Tinha medo de que um melhor cliente pudesse estar esperando à volta
da esquina —assinalou Vito, lhe dirigindo um sorriso ofensivo. — Ao que parece
não era assim.
—Os homens não figuravam em minha lista de prioridades, e agora que te
ouvi sei exatamente por que! Ofereci uma relação aberta, adulta, mas não pôde
mantê-la!
—E como você a teria mantido, se uma noite eu tivesse me reunido com
você e te dissesse com toda naturalidade que tinha conhecido outra mulher?
Não tinha a mínima idéia do que significava ser adulto. Desejava-me, mas não
queria estabelecer um compromisso comigo. Tudo o que me deu foi sexo,
discussões estúpidas e confusões!
—Mu... muito obrigada! —exclamou ela com voz trêmula e os olhos
desmesuradamente abertos. — É um tipo agressivo e autoritário que nunca
pensa nos meus sentimentos! —e saiu a toda pressa da habitação.
Vito saiu ao vestíbulo.
—Por certo, não haverá trancas nas portas dos banheiros de nossa casa,
em Londres. O que vai fazer? —perguntou ele com tom zombador. —Acha que

78
Lynne Graham Desejo sem amor

poderia se encontrar na espantosa situação de compartilhar esses sentimentos


comigo?
Como resposta se ouviu uma portada. Ashley se deitou sobre a cama. A
intensidade de suas emoções a tinha deixado esgotada. Bateram na porta e
Priya entrou na habitação.
—Espero que não se ofenda —começou a dizer a mulher mais velha, —
mas poderia ter caído pelas escadas e pôr em perigo a vida do bebê...
—Tem razão... por um momento esqueci de meu filho...
—Não é prudente que uma mulher se esqueça de que está grávida —
insistiu Priya. — Quando a vi, tive medo de que caísse.
—Não voltarei a fazê-lo.
Ashley estava zangada consigo mesma por ter tornado a perder os
estribos. De repente, ficou tensa quando Vito apareceu na porta. Priya saiu
rapidamente.
—O que quer? —perguntou Ashley. Não estava segura de que ele não
tenha escutado sua conversa com Priya a respeito de sua gravidez.
—Desejar boa noite.
—Boa noite!

—Tão interessante como o histórico ginecológico de sua mãe, sem


dúvida, senhora Di Cavalieri... —comentou o senhor Beckett.
—Necessito de uma total discrição. Não quero que ninguém saiba que
estou grávida —pediu Ashley enquanto saía da habitação onde tinha estado
vestindo-se.
—Como lhe dizia, as desgraças de sua mãe têm uma grande influência em
sua mente. Sinceramente, estou mais preocupado por seu estado de ânimo que
por sua saúde. Está muito magra. Mas o problema resolverá quando as náuseas
cederem. Sente-se, por favor.
—O que está acontecendo? —perguntou ela, tensa.
—Não está acontecendo nada. Se tivesse olhado a tela como lhe sugeri...
—Não quero ficar muito apegada ao bebê.
—Se quer ser minha paciente, nego-me a seguir escutando comentários
pessimistas —lhe espetou ele. — Quanto a que não deseja que ninguém se
inteire de que está grávida... temo que dentro de muito pouco tempo isso será
bastante difícil. Não vai ter um bebê, mas dois...
Ashley quase caiu da cadeira. Gêmeos... não podia acreditar! Sentiu-se
enjoada.

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Lynne Graham Desejo sem amor

Josh a estava esperando lá fora. Ela desceu cambaleante pelas escadas.


—O que está fazendo aqui? —perguntou-lhe.
—É essa a maneira de saudar um velho amigo? ajudou-a a entrar em um
táxi. — Se mostrou tão reservada quando me ligou para me pedir que lhe
recomendasse alguém, que fiquei muito preocupado.
—Estou grávida! —exclamou ela.
—Parabéns! —expressou o condutor do táxi.
—São gêmeos —declarou ela.
—Realmente está preocupada.
Ele a levou a um restaurante elegante, onde Ashley pôde desafogar-se.
—Por que não compartilha esse medo com Vito?
Ashley disse a si mesmo que era uma pergunta razoável. Mas como podia
ser sincera com um homem que pensava lhe tirar seu filho? O fato de não
poder ocultar seu estado durante muito tempo a atormentava. Deveria deixar
Vito antes do que tinha pensado.
—Não posso lhe dizer isso
—Ele a trata mal? —perguntou Josh, furioso, segurando sua mão.
Ela tragou saliva. Na realidade Vito a tratava muito bem, mas não
exatamente como a uma esposa. Todo o atrativo sexual que ela tinha
desapareceu da noite para o dia, como se tivesse ficado no Sri Lanka. Levavam
já dez dias em Londres e Ashley tinha o quarto só para ela. Fazia cinco dias que
Vito foi a Milão e nem sequer a havia convidado para que o acompanhasse.
Sexo, estúpidas discussões e brigas... era evidente que a inteligência de Vito
tinha prevalecido sobre seus instintos, pois o melhor que nesse momento podia
lhe oferecer era uma cortês conversa e um comportamento muito considerado.
Sim, segundo ela, tratava-a muito mal.
—Não, ele é muito amável. Não tivemos nenhuma discussão. Está de
acordo com tudo o que digo. Mas toda a paixão morreu.
—A alguns homens resulta um pouco difícil acostumar-se a gravidez...
—Ah, ah! Olha só o que vejo! Exclamou uma voz atrás deles.
Josh afastou a mão da de Ashley e olhou o jovem que estava de pé, junto
à mesa, sorrindo com afeto.
—Olá, Pietro! —saudou-o.
—Tia, comento isto com meu tio ou guardaremos segredo? —perguntou
Pietro com desprezo.
—Vá embora, seu desgraçado —respondeu Ashley, irritada, — ou
quebrarei seus dentes!

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Lynne Graham Desejo sem amor

Pietro ficou muito surpreso. Lançou-lhe um olhar de ódio, ao afastar-se


dali.
—Esta situação poderia ser mal interpretada —assinalou Josh, inquieto.
Ashley tinha visto o Pietro no casamento. O jovem era o único filho da
irmã mais velha de Vito. Era uma mãe muito indulgente e o tinha mimado muito.
Ashley sabia que seu casamento com Vito tinha deixado Pietro pasmo.
—Se ele achar que estamos assustados, isso só servirá para incitá-lo —
comentou ela, olhando nervosamente seu relógio. — Devo ir.

Vito se encontrava no vestíbulo quando Ashley retornou a casa.


Ficou pálida.
—Supunha que não voltaria até manhã!
—Deveria procurá-lo nos armários? —perguntou ele, brincando.
Ashley o olhou desconcertada.
—O seu amante —explicou ele. — Bom, simplesmente estava brincando.
Teria gostado de umas boas-vindas do tipo: «Alegra-me de ver-te de novo,
querido.»
Ashley ruborizou.
—Sinto muito —repôs.
—O último que necessito neste momento é que me peça desculpas. Deus!
O que sou para você? Sou seu carcereiro, para que se acovarde dessa maneira
quando me vê?
O peso de seu próprio secreto a incomodou. Perguntou-se o que ele teria
feito se ela se jogasse em seus braços. Certamente Vito não teria recebido
bem tal demonstração de afeto, pois já não lhe parecia desejável, refletiu
Ashley de mau humor, enquanto tomava assento no salão.

—O senhor Angeli, madame.


Franzindo o cenho, Ashley levantou a vista da revista que estava
folheando. Era Pietro.
—Vito está no andar de cima —declarou ela, tensa.
Pietro se aproximou de Ashley.
—Sem dúvida pensa que sou um estúpido. Ele está em Milão.
—Está lá em cima.
—Contou-lhe sobre seu encontro amoroso?
—Está me ameaçando? —perguntou ela com incredulidade.

81
Lynne Graham Desejo sem amor

Ele tirou um cigarro e o acendeu.


—O que acha?
—Preferia que não fumasse —indicou ela, com calma.
Pietro a olhou. Ainda era um adolescente, mas havia algo em sua maneira
de olhá-la que indicava maior maturidade.
—Se acha que estou disposto a que me diga o que é que eu posso ou não
fazer na casa de meu tio, é mais tola do que parece.
—Quero que vá embora, Pietro —lhe ordenou ela.
—Parece-me que não. Eu não gostaria de causar problemas —afirmou ele,
burlando-se. — Giulia me disse que ele está muito ciumento... que quase armou
um escândalo na festa de seu casamento. Sempre pensei que meu tio fosse um
tipo muito ardiloso...
—Fora!
—É tão sensível como o imbecil de seu irmãozinho. Meus amigos lhe
deram uma lição; deveria aprender com seus erros. Acredito que muito em
breve vai ser muito amável comigo.
Ashley se sentiu doente.
—Então... digo a meu tio que vi você e o médico de mãos dadas ou guardo
silêncio a respeito?
—Diga o que quiser.
Pietro fez uma careta.
—Mas uma vez que comece a falar, provavelmente conte tudo. Poderia
lhe contar do dinheiro que aceitou para se desfazer dele da última vez...
—Como? —interrompeu-o ela, sem poder dar crédito a seus ouvidos.
—Minha mãe me contou isso. É um segredo na família. Você recebeu um
cheque com muitos zeros, e ele teve a Carina como prêmio de consolação.
—Nunca aceitei esse cheque! —exclamou Ashley. A cabeça lhe dava
voltas.
—Meu tio Vito tem muito orgulho... acredito que não vai ficar muito
contente quando descobrir que se desfizeram dele por um preço...
—Porco repugnante! —estalou Ashley, de repente. — Tem idéia do dano
que poderia causar a sua avó? O dano que poderia causar em sua relação com
Vito?
De repente, Ashley não teve perfeita consciência do que aconteceu a
seguir. Enjoada, cambaleou. Voltou a sentar-se no sofá no momento em que
Pietro soltava um grito. Quando elevou o olhar, não pôde dar crédito a seus
olhos. Vito tinha encurralado seu sobrinho contra a parede e o insultava em
italiano. Estava furioso.

82
Lynne Graham Desejo sem amor

Assustada, Ashley se levantou.


—Está lhe fazendo mal, Vito!
—Como se atreve a entrar em minha casa e ameaçar minha esposa
grávida? —espetou-lhe Vito. — Quando terminar com você desejará estar
morto!
Ela ficou atônita. Vito havia dito «minha esposa grávida». Sem nenhuma
advertência, caiu desmaiada.

Capítulo 10

QUANDO Ashley voltou a si, encontrava-se deitada em sua cama.


Imediatamente recordou tudo. Vito sabia que estava grávida. Todas suas
ridículas precauções tinham resultado ser uma absoluta perda de tempo. Além
disso, agora compreendia por que ele tinha mudado sua atitude com ela.
—Como se sente? —perguntou-lhe Vito, um pouco inquieto. — Chamo o
médico?
Ela se negou a abrir os olhos.
—Não, armaríamos um escândalo.
—Temo que já armei —declarou ele, suspirando. —chamei o nosso médico
particular.
—Então por que tomou a moléstia de me perguntar?
—Esperava uma resposta sensata —admitiu ele. — Sabe que eu estava
sabendo...
—Como?
—Aquela última noite no Sri Lanka... escutei por acaso sua conversa com
Priya.
Ashley abriu os olhos.
—Não me parecia que o tivesse feito! —protestou.
Ele se encolheu de ombros.
—A habilidade para não revelar emoções é útil no mundo dos negócios.
Ela olhou para o outro lado.

83
Lynne Graham Desejo sem amor

—Deveria ter me dito isso. Sinto-me como uma tola...


—Esperava que você me contasse isso. Também me surpreendi muito —
confessou. — Foi àquela noite...?
—Sim! —exclamou ela.
—Não vai acreditar, mas de verdade sinto muito...
—Tem razão... não acredito!
—Não estava preparada para isso. Foi mal calculado.
Ashley olhou fixamente a parede. A conduta de Vito, desde que
retornaram a Londres, já lhe resultava compreensível. Ele tinha estado
preocupando com sua saúde por causa do bebê. Isso era o único que lhe
importava, certamente.
—Tem o que queria, assim me deixe em paz —repôs ela com amargura.
—De verdade acha que é isso o que quero? Se não tivesse desmaiado,
provavelmente teria estrangulado meu sobrinho.
—Não teria sido uma grande perda.
—Estava a ponto de entrar na habitação, quando ouvi que ele estava
dizendo algo. Aguardei até escutar tudo.
Ela mordeu o lábio. Perguntou-se quanto Vito teria escutado. Estava de
pé, junto à janela, muito quieto. Entretanto, irradiava agitação.
—Ao que parece Pietro mentiu quanto ao acontecido com seu irmão...
—Meu irmão delinqüente?
Vito pestanejou.
Ashley sentiu desejos de consolá-lo. Ele era uma dessas pessoas que
raramente se equivocavam. Certamente, Tim não merecia que o metessem na
prisão por ter perdido a cabeça, já que tinha sido violentamente provocado.
Ashley estava segura disso, depois do que tinha sofrido por culpa do Pietro.
Tim nem sequer tinha mencionado o tema da acusação, nem tampouco o do
dinheiro que supostamente tinha aceitado. Seu irmão sabia que era mentira.
Mas e Vito?
—Julguei tão mal a ele como a meu sobrinho. Minha única desculpa é que
tive pouco contato com o Pietro recentemente, e se não o tivesse surpreendido
falando com você, teria continuado defendendo-o porque... porque é meu
sobrinho —admitiu ele, apertando os lábios. — Desde que seu pai morreu, todos
nós consentimos, estragando seu caráter...
—OH, deixa de se culpar. É um rapaz desagradável e presunçoso.
—Sinto muito que tanto você como seu irmão tenham sofrido por sua
culpa...
—Eu sofri mais por sua culpa.

84
Lynne Graham Desejo sem amor

Logo que o disse, Ashley se arrependeu. Não conhecia Vito nesse estado
de ânimo; encontrava-se submetido a uma grande tensão. Entretanto, seguia
conservando o controle. Envergonhava-se da conduta de seu sobrinho. Apesar
de tudo, não estava disposto a deixá-la livre, e muito menos quando sabia que
estava grávida.
—É verdade que minha mãe lhe deu dinheiro?
Ashley o olhou nos olhos e se deu conta de que Vito desejava ouvir que
Pietro tinha mentido.
—Ela veio ver-me um dia antes de você me propor casamento...
Ele apertou os dentes.
—E lhe ofereceu dinheiro para que saísse de minha vida? —perguntou.
Ashley assentiu com a cabeça.
—Não, não foi assim tão grosseira. Pôs o cheque sobre a mesa ao partir.
Isso foi tudo.
—Se não me contar tudo, terei que tirar isso dela —afirmou ele com
frieza. — Quero saber exatamente o que ela te disse.
—Não adivinha? —perguntou ela em voz baixa. — Me disse que nunca
poderia me adaptar, que o colocaria em apuros; em poucas palavras, que
destroçaria sua vida.
Vito estava de costas a ela. Sem nenhuma advertência, golpeou a parede
com um punho.
—Estava equivocada —indicou ele. —Não era necessário que você
destroçasse minha vida. Então, e também agora, era perfeitamente capaz de
fazê-lo por mim mesmo.
—Ela o fez com a melhor intenção. Não me conhecia. Devia estar muito
preocupada com seu pai...
—Nunca a perdoarei —disse Vito com violência. — Eu não era nenhum
adolescente incapaz de valer-se por si mesmo, que necessitasse de seu amparo!
—Os filhos seguem sendo filhos sem importar a idade que tenham.
—Está defendendo-a? —olhou-a com total incredulidade. —Por que?
Ashley suspirou.
—Acredito que nos salvou de cometer um grave erro.
Resultou evidente que Vito mal conseguiu controlar suas emoções.
—Que pena que agora não tenha podido se salvar. Ao que parece, nos
teria feito um grande favor.
Ashley ficou pálida. Era tanto o rechaço de Vito, que inclinou a cabeça e
fechou os olhos, esforçando-se para suportar a dor.

85
Lynne Graham Desejo sem amor

A chegada do médico foi uma agradável interrupção. Recomendou a


Ashley calma e descanso total, e nada de contratempos. Serviram-lhe o jantar
em uma bandeja. Dormiu um pouco depois de comer, depois de dar-se por
vencida ao esperar que Vito voltasse a aparecer.
Muito depois abriu os olhos, quando o abajur já estava aceso. Vito se
encontrava junto à janela. Não usava gravata nem jaqueta. Tinha um copo em
uma mão.
—Que horas são? —perguntou ela.
—Meia-noite... —respondeu ele, encolhendo-se de ombros. —Na
realidade não sei —adicionou com certa dificuldade. Esclareceu-se garganta. —
Falei com a Lorena, a mãe do Pietro. Já sabe o que seu filho fez. Tem intenção
de voltar para a Itália com ele. Está muito unida à família de seu falecido
marido, de modo que acredita que eles a ajudarão a exercer um maior controle
sobre seu filho. Eu não sou tão otimista. Suspeito que Pietro seguirá sendo um
problema.
Ashley se sentou na cama.
—Teve uma tarde muito ocupada —repôs, deslizando os dedos por sua
cabeleira, que se derramou sobre seus pálidos ombros. Foi um esforço inútil;
Vito nem sequer a olhou. — Me sinto muito melhor —acrescentou.
—Que bom —declarou ele com voz forçada. —Parece que tenho um
talento extraordinário para destruir o que aprecia. Entretanto, deve
reconhecer que nunca quis que fosse assim. Acreditava ter o direito...
acreditava que me devia esta oportunidade... Nunca fui humilde —lhe
confessou. —Pensava que poderia fazer que me amasse...
Ashley estremeceu. Vito tinha confirmado suas suspeitas.
—Acreditava que se tomasse as medidas necessárias, aconteceria —
continuou ele. — Um dia despertaria e, longe de desejar me cravar uma faca no
peito, pensaria: «não posso viver sem este homem». E então se acostumaria
comigo.
—Parece-me que já entendi, Vito —comentou ela, fazendo um esforço
para falar, tratando de suportar a terrível dor.
Não era de se surpreender que ele tivesse decidido não deixá-la grávida.
Tinha estado empenhado em vingar-se, o qual significou um grande esforço. Em
efeito, tinha sido capaz das coisas mais incríveis para tomar o que ele tinha
chamado «as medidas necessárias». Ashley se sentiu terrivelmente doída e
humilhada.
—Eu era tão incrivelmente presunçoso...

86
Lynne Graham Desejo sem amor

«Sim, e com razão», pensou ela. Ashley tinha sido um alvo vulnerável,
uma vítima disposta.
—Esperar que, depois de tudo o que tinha feito a você, voltasse a
preocupar-se por mim... —comentou ele em voz baixa... — foi imperdoável.
Ela assentiu com a cabeça.
—Mostrei-me frio e calculador —sussurrou desesperado. — Não posso
evitar ser assim...
Ashley sabia o que ele queria. Desejava que lhe gritasse e o acusasse;
isso faria que se sentisse melhor. Mas pela primeira vez em sua relação com
Vito, ela não tinha nada que dizer. Sentia muita dor para enfurecer-se.
—Não suporto seu silêncio —admitiu ele com voz rouca.
Acidentalmente, Ashley elevou a vista e seu olhar se encontrou com o de
Vito. Ele parecia ter os nervos destroçados. Nunca antes o tinha visto assim:
vulnerável e inseguro.
—Provavelmente prefira que falemos amanhã, quando estivermos mais
tranqüilos... —indicou ele.
Ashley não queria voltar a falar com Vito de novo, mas assentiu com a
cabeça. Depois daquilo não poderia dormir. Tiraria-lhe os bebês? Não tinha
assinado nada. Não imaginava o que Vito poderia alegar em um tribunal. Perto
do amanhecer conseguiu dormir.

—Não sente náuseas? —perguntou-lhe Vito, olhando-a com preocupação.


Ashley apertou os dentes. Essa era a terceira vez que ele se referia a
sua saúde, além de outros três comentários sobre o tempo e a beleza do
campo.
Ela tinha passado o dia anterior na cama. Mas sabia que não poderiam
viver no limbo para sempre.
O último que tinha esperado essa manhã foi o anúncio de que tinham um
compromisso, um almoço no Berkshire. Vito lhe disse que não queria dar
desculpas pela ausência dela.
—Quero que estejamos juntos —assinalou ele, enquanto se dirigiam no
carro para Berkshire. Seu tom decidido a deixou sem fôlego. — Até que nasça
o bebê —acrescentou com muita calma. — É muito importante para mim.
—Canalha! —exclamou ela, mordendo um lábio.
Não podia escapar. Devia ficar até que nascessem seus filhos. Sentiu
náuseas. Acaso Vito não tinha absolutamente sensibilidade? Precisava fugir,
retornar a seu próprio mundo.
—Da outra vez não estive com você... —insistiu Vito.

87
Lynne Graham Desejo sem amor

—Não preciso de você! Não preciso de você para nada.


—Eu não disse que precisasse de mim —declarou ele, medindo suas
palavras. — Mas queria que ficasse...
—Para poder me vigiar? Para te assegurar de que não escape de novo e
aborte?
Vito apertou os dedos no volante.
—Não o fez a primeira vez. Por que teria que fazê-lo agora?
Ashley estava surpresa. Vito estava dizendo que acreditava nela.
—Quando mudou de opinião e descobriu que eu não mentia?
—Faz algumas semanas, mas você não queria falar a respeito.
—Não vi por que teria que seguir me defendendo.
—De verdade, quero esse bebê —murmurou Vito, quase com aspereza. —
Provavelmente tenha falhado no passado, mas isso não significa que agora não
tenha direitos.
—Não quero falar de seus direitos.
—Por que demônio nenhuma vez aprendeu a falar meu idioma? perguntou-
lhe, repentinamente furioso. — Não é fácil para mim, encontrar as palavras
adequadas em inglês, para expressar minhas emoções. O que acha que isto é
para mim? Eu tenho culpa! Embora passasse o resto de minha vida te dizendo
que o sinto, isso não mudaria nada!
—Se durante cinco minutos me dissesse que o sente, isso já me
pareceria muito assombroso. Não nos passemos da raia falando do resto de sua
vida!
—Vou sair da auto-estrada —repôs ele, apertando os dentes.
—Não é uma de suas idéias mais brilhantes —respondeu ela com voz
suave. —E se não deixar de conduzir a essa velocidade, talvez não cheguemos
ao nosso destino.
Vito pegou a próxima saída, em silêncio, e cinco minutos depois deteve o
carro.
—Sinto muito... é isso o que quer?
Jogando faíscas, Ashley o olhou e logo voltou a cabeça. Pensou que Vito
nunca sentiria o suficiente o acontecido. De modo que desejava o bebê...
«Sente náuseas? Sente-se débil? Quer que paremos para tomar café?», eram
as perguntas que lhe tinha feito, preocupado.
—Sinto ter te obrigado a se casar comigo. Sinto ter ameaçado seu irmão.
Sinto ter te deixado grávida. Isso a faz se sentir melhor?
—Não muito —respondeu ela, apertando os lábios. Aterrava-lhe a idéia
de estourar em soluços.

88
Lynne Graham Desejo sem amor

Vito alargou um braço e tratou de tomar sua mão, mas ela fechou o
punho.
—Me importa o que possa te acontecer — confessou ele.
—Se disser algo mais asqueroso, vomitarei!
Vito se tornou para trás em seu assento. O silêncio se alongou.
—Não posso mudar o que aconteceu entre nós há quatro anos! —
exclamou ele de repente. — Não foi aprovada nos exames. Sua família lhe
voltou às costas. Eu me casei com outra mulher e perdeu o bebê. Eu não estava
ali, mas devia ter estado. Sinto-me muito culpado...
—Isso não durará —comentou ela, ocultando sua angústia.
—Não custa nada me deixar falar —respondeu Vito com aspereza. —Eu
te abandonei. Reconheço. Estou muito envergonhado de minha própria conduta.
Tomei a saída mais fácil, feriu-me e fui embora.
—Não esqueça do talonário de cheques.
Logo que o disse, Ashley se arrependeu. Tinha sido um golpe baixo. Fazer
todas essas confissões resultava muito difícil a Vito. Era muito orgulhoso. Pela
primeira vez em sua vida, via-se obrigado a reconhecer abertamente seus
erros. Mas seguia sem amá-la.
—Até então eu não sabia que podia te machucar. Não a compreendia.
Tinha medo de te perder. Quanta mais liberdade exigia, mais furioso eu ficava.
Às vezes... às vezes eu te odiava tanto quanto te amava...
De maneira acidental, seus olhares se encontraram. Produziu-se uma
mútua compreensão. Mas Ashley afastou a vista imediatamente.
—Fez que me sentisse inseguro, e ninguém tinha me feito isso antes...
Ashley estava surpreendida, de maneira que o olhou contra sua vontade.
—Era muito jovem para mim —repôs Vito.
—Sim. Não entendia o que fazia. Tratava de me proteger; não queria
resultar ferida. Não queria te amar, te dar nenhuma vantagem.
—Eu não tinha nenhuma —confessou ele, em voz baixa e tom sarcástico.
Mas, segundo Ashley, isso não era verdade: sim levava vantagem. Sua
vida era mais importante que a dela.
—Eu liguei para você... liguei na Itália —se apressou a dizer Ashley. —Ia
contar sobre o bebê...
—Não recebi nenhum telefonema —comentou ele, franzindo o cenho.
—Giulia atendeu ao telefone. Respondeu-me que estavam celebrando sua
festa de noivado... eu não lhe disse mais nada —confessou Ashley.
Ele disse algo em italiano, mas não se defendeu. Tenso, evitou olhá-la nos
olhos. Voltou a ligar o carro.

89
Lynne Graham Desejo sem amor

—Está ficando tarde.


—Não podemos faltar? —perguntou ela. —Não podemos ligar e pedir
desculpas?
—Não —respondeu ele, tenso.
—Não tenho vontade de ir.
—Nem pense nisso. Temos que ir.
Meia hora depois, Ashley se deu conta de que estavam chegando a um
lugar conhecido, perto da casa de sua família.
—Onde vivem essas pessoas? —perguntou Ashley.
—Não longe daqui.
—Eu me criei neste lugar —expressou ela a contra gosto. —Poderia ser
mais preciso.
—Pode me orientar quando chegarmos a sua cidade natal.
Ashley ficou sem fôlego.
—Vivem ali? —perguntou.
Vito lhe dirigiu um olhar pesaroso e suspirou.
—Levo-a para casa, cara.
A jovem ficou paralisada.
—Não acredito!
—Ontem liguei para sua mãe e ela nos convidou para almoçar...
—Pare o carro! —exclamou Ashley. — Não irei!
—Sim, irá. Além disso, vão se reconciliar. Por minha culpa brigou com sua
família. Isto é o que posso fazer por você...
—Fazer isso por mim? —repetiu ela, a beira da histeria.
Sem entender por que estava tão angustiada Vito sorriu com arrogância.
—Não lhe rejeitarão. Sua mãe deseja ver-te. Desfez-se em lágrimas
quando falei por telefone com ela.
Ashley acreditava, mas também sabia que sua mãe não tinha feito o
menor esforço por vê-la em vários anos.
—Meu pai me odeia —confessou ela.
—Os pais não odeiam seus filhos. Meu pai também teria se zangado se
uma de minhas irmãs tivesse vivido com um homem sem ter se casado. Agora
que estamos casados, a situação é bastante diferente. Faz muito tempo que os
ânimos se acalmaram.
Ela pensou que Vito não podia entendê-la. Estavam atravessando a
cidade; ele não necessitava que ela o guiasse. Staverston não era muito grande
e a concessionário de carros do pai de Ashley dominava o final da rua principal.
Ao chegar a casa, Vito desceu rapidamente do carro.

90
Lynne Graham Desejo sem amor

—Vamos —disse a Ashley, que permanecia imóvel.


Foi Susan quem saiu para recebê-los. Parecia nervosa. Vito se apresentou
com muita calma.
—Estamos no jardim —repôs Susan, incômoda. — Mamãe nos convidou.
Espero que não se importem.
—Quanto mais gente, melhor —comentou Ashley, brincando. — E Tim?
—Está na Grécia com seus amigos. Foi um presente que lhe fez papai.
Ashley avançou para as portas que davam ao jardim. De repente, Susan
lhe impediu o passo.
—Papai não sabia que vinham se apressou a dizer. — Não posso acreditar
que mamãe faça isto...
Antes que Ashley pudesse responder, ouviu a voz áspera de seu pai
procedente da cozinha.
—Que mulher tão estúpida! —vociferou. — Não vou comer porcaria! Como
se atreve a gastar meu dinheiro em...?
Durante um momento que pareceu interminável, os três ficaram
paralisados. Ashley pôde escutar como sua mãe se desculpava. Revirou-lhe o
estômago.
—Vamos ao jardim — indicou Susan ao Vito, com tom quase suplicante.
Ashley se sentiu humilhada, enquanto sua irmã se ruborizava. Disse a si
mesmo que Vito deveria recorrer a toda sua habilidade para encontrar-se com
seu pai.
Além das portas do jardim, Ashley viu seu pai sair zangado ao pátio, onde
Arnold se encontrava lendo um jornal. A jovem deteve Vito.
—Acredito que será melhor que faça isto sozinha. —declarou.
—Boa idéia —interveio Susan. —Deixe que te sirva uma bebida, Vito.
Ashley cruzou o pátio. Seu pai estava dizendo ao Arnold que só os vagos
jogavam golfe. Arnold fazia caso omisso dos insultos, pois era um homem
tranqüilo que se negava a ver-se envolto em disputas com seu sogro.
—Papai... —expressou Ashley, vacilante, mas com a cabeça bem alta.
Hunt Forrester a olhou com incredulidade.
—Que demônios está fazendo aqui?
—Não acha que já é hora de que façamos as pazes?
—Desavergonhada, como se atreve a vir aqui? —vociferou ele,
segurando-a pelos ombros. — Te disse que não voltasse. Já não faz parte desta
família! Nunca mais, sua prostituta! Mas não pode nos deixar em paz, não é
verdade? Por sua culpa Tim esteve a ponto de ir a prisão...
—Papai, por favor...

91
Lynne Graham Desejo sem amor

Estava-lhe afundando os dedos na pele como aço.


—Solte minha mulher —gritou Vito, com desdém.
—Não se meta nisto, Vito! —exclamou Ashley, temerosa.
—Pois poderia resultar ferido —afirmou Hunt Forrester com tom de
desprezo.
—Sua filha está grávida —confessou Vito friamente.
Ashley se sentiu enjoada. Em alguma parte, no fundo da casa, pôde ouvir
sua mãe soluçar. Tudo lhe resultava terrivelmente conhecido, mas pela primeira
vez se deu conta de que não tinha medo de seu pai. Vito jamais permitiria que
lhe fizesse mal.
—De maneira que assim conseguiu levá-lo a altar! —declarou seu pai,
burlando-se. —Parece que teve sorte...
Vito golpeou o homem mais velho com força. Susan gritou e Arnold se
levantou de um salto. Ashley teve que se apoiar na mesa, pois sentia as pernas
muito fracas.
—Se quer brigar —espetou Vito, — faça-o com alguém de sua condição!

Capítulo 11

—Nossa, que murro! —exclamou Arnold, sacudindo a cabeça com


admiração.
—Ao menos tem mais cérebro que esse idiota que está atrás de mim! —
grunhiu Hunt enquanto se levantava. —Leve sua mulher daqui...
—Se eles se forem, eu também vou! —a ameaça fez que todos voltassem
a cabeça para a Sylvia Forrester, que olhou desesperada a sua filha mais
jovem. — Poderia me alojar em sua casa durante algum tempo?
—Que demônios significa isto? —perguntou Hunt, incrédulo. — Srá que
perdeu o juízo, Sylvia?

92
Lynne Graham Desejo sem amor

—Devia tê-lo feito há anos... mas não tinha guelra —confessou Sylvia,
estendendo uma trêmula mão para Ashley. — Mas quando não pude assistir ao
casamento de minha filha... dava-me conta do terrivelmente fraco que era.
Sinto muito todo o acontecido.
—Será bem-vinda em nossa casa, senhora Forrester —indicou Vito com
amabilidade.
—Um momento... —gritou o pai de Ashley.
—Me chame de Sylvia —respondeu timidamente a senhora. — É muito
amável...
—Ele golpeou-me! —exclamou Hunt.
—Você mereceu —apoiando-se no braço de Ashley, Sylvia acrescentou:
— vou dizer-lhe por que a trata assim. Tem direito de saber.
—Não! —gritou Hunt.
—Vamos lá dentro —sugeriu Vito.
Desconcertada, Ashley olhou seu pai. A cabeça lhe dava voltas. Ainda não
acreditava que fosse possível que sua mãe tivesse adotado essa postura contra
ele.
—Susan, parece-me que você e Arnold deveriam ir para casa —sugeriu a
mulher maior, suspirando. —Lhes chamarei mais tarde.
Quando, a contra gosto, Susan e seu marido partiram, o pai de Ashley
apareceu na porta.
—Não diga, por favor —pediu a sua mulher. — Não é assunto dele.
—Você conseguiu que fosse assunto de Ashley —assegurou Sylvia, com a
cabeça bem alta. — Todos sofreram por meu erro. Deveria ter se divorciado de
mim. Em lugar disso, desforraste-se com todos nós durante mais de vinte anos.
—Sylvia... —pediu-lhe Hunt.
—Tive... tive uma aventura —confessou Sylvia, sem olhar a ninguém nos
olhos. — E seu pai se inteirou. Quando descobri que estava grávida, eu... eu...
não sabia se era de seu pai...
—OH, Deus...! —Ashley se deixou cair na cadeira mais próxima.
Sua mãe estava chorando.
—Seu pai soube... e quando nasceu, ruiva, tão diferente de Susan... nós
dois supusemos que não podia ser filha dele. Eu estava tão envergonhada... e
agradecida de que seu pai estivesse disposto a te criar como sua filha...
«Mas não pôde cumprir sua promessa», pensou Ashley, afligida. Estava
assombrada pelo que sua mãe lhe estava revelando.
—Acredito que Ashley não compreendeu —murmurou Vito. —Não pode
dizer que não é filha de seu pai. Tim e Ashley poderiam se passar por gêmeos.

93
Lynne Graham Desejo sem amor

—O outro homem tinha o cabelo loiro, de um tom avermelhado —


comentou Sylvia. —E nos esquecemos de que minha avó tinha o cabelo
avermelhado. Quando Tim nasceu, seis anos depois, nos demos conta de que
tínhamos cometido um erro, mas então, o prejuízo à relação de Ashley com seu
pai já havia ocorrido. Ele seguia comportando-se como se ela não fosse sua
filha... acredito que cada vez que a olhava, recordava do outro homem...
Houve um longo momento de silêncio. O pai de Ashley estava sentado em
uma cadeira, cobrindo o rosto com as mãos. Parecia um homem a quem
acabassem de sentenciar de morte. Ashley estava aturdida. Sua mãe a tinha
comovido, mas logo sentiu compaixão por seu pai. A confissão de Sylvia o tinha
privado de toda dignidade. Entretanto, agora Ashley sabia muito mais. Sem
dúvida seu pai devia ter amado sua mãe, pois não se divorciou dela. Mas depois,
a tinha tratado muito mal.
—Ainda deseja ir conosco? —perguntou Vito com calma a Sylvia.
Ashley reprimiu uma risada quase histérica. Seguiu um longo momento de
silêncio.
—Acredito... acredito que Hunt e eu temos muito que falar —repôs
Sylvia, vacilante. Levantou-se com um ar de segurança em si mesmo que
surpreendeu a sua filha.
—Comeremos em um hotel —declarou Vito, conduzindo Ashley ao
vestíbulo.
Sylvia abraçou a sua filha.
—Sinto muito, mas não posso deixar seu pai agora.
—Sua mãe não o deixará —afirmou Vito quando se foram. —Seu pai se
derrubou. Acredito que o acontecido esclareceu as coisas. Era necessário que
tirasse o chapéu a verdade. Pena que, para o seu bem, não tenha acontecido
antes.
Ashley o olhou furtivamente. Estava equivocada ao acreditar que o
incidente não o tinha afetado, embora na realidade não podia entender por que
parecia ter os nervos tão destroçados.
—Me diga, como pôde suportar um pai assim? Com uma mãe que não dava
a cara por você, e um cunhado que também preferia manter-se à margem?
A Ashley tremiam as mãos. Não podia encontrar nenhuma de suas
frívolas respostas. Ainda estava muito transtornada pelo que tinha ocorrido.
—Todos sofreram muito —declarou ela. — Acredito que Tim menos,
porque era muito jovem, além de ser o favorito de papai. Susan se casou com o
Arnold para escapar. Havia muita tensão... muitas discussões. Sempre lutei
contra ele. Agora me parece algo estúpido, mas me sentia muito doída.

94
Lynne Graham Desejo sem amor

De repente começaram a surgir às lembranças. As críticas constantes e


o desprezo; o sarcasmo e os castigos; o fato de que sua mãe tinha pagado o
preço de seu desafio; a culpa; a vergonha de que seu pai pensasse que ela não
merecia nem sua atenção nem seu afeto...
—Ainda não me disse se seu pai a maltratou —inquiriu Vito. — O vi em
sua cara e na tua. Desejava seguir lhe batendo. Teria me dado uma imensa
satisfação.
—Não! Não me maltratou em um sentido estrito, mas sempre tinha medo
de que o fizesse, pois se zangava muito comigo.
—Não é de surpreender que desejasse ser livre na universidade. Nunca o
tinha sido.
—Não fui.
Vito lhe perguntou se tinha apetite. Revirou-lhe o estômago ante a só
idéia de comer. Uma ou duas vezes tratou de reatar a conversa, mas Vito se
voltou pouco comunicativo.
Separaram-se ao chegar a casa. Disse-lhe que devia fazer algumas
chamadas.
Ashley se perguntou o que era o que estava acontecendo, mas antes que
pudesse falar, Vito subiu a seu quarto.
Uma hora depois ela foi procurá-lo. Na escada se encontrou com o
chofer de um táxi, que levava duas malas. Franzindo o cenho, Ashley entrou no
quarto de Vito. Este se encontrava junto à janela, como se estivesse em transe.
—Não sabia que ia viajar de novo —disse ela. — Não me disse isso.
Vito se voltou.
—Vou a Itália. Não posso permanecer aqui.
—Vai? —pálida Ashley o olhou fixamente. — Mas disse...
—Que queria ficar até que o bebê nascesse. Mas nós dois sabemos que
não é isso o que você deseja.
—Não entendo.
Vito a olhou nos olhos.
—Acredito que já é hora de que tenha em conta seus desejos.
—Mas eu não disse que desejo que se vá...
—Não é necessário que o faça. Sei o que sente por mim. Insistir seria
algo insensato. Não te culpo. Tendo em conta o que fiz... bem, foi muito
tolerante. Mas devo fazer frente aos fatos. Estaria muito mais a gosto se eu
não estivesse aqui...
—Se está tratando de me convencer de que está fazendo isto por mim e
não por ti, não conseguirá!

95
Lynne Graham Desejo sem amor

—Hennessy estará mais contente se não estiver presente, assim eu irei.


—O que tem que ver Josh com isto?
—Deus! —exclamou Vito. — Está comprometida com ele e eu sou o
intruso, não Josh, pois te obriguei a se casar comigo.
Ashley compreendeu alarmada que se esqueceu da tentativa de
chantagem do Pietro, de que Vito testemunhara.
—Não tenho a menor intenção de me comprometer com Josh —declarou
ela, irritada. — Diferente de você, eu não vou com uma pessoa e logo com outra.
—Não aconteceu assim com Carina —repôs ele com amargura. — O fiz
quando estava bêbado!
—Como diz?
—Na realidade não é importante...
—Para mim é sim!
—Considerava-a uma amiga íntima —lhe confessou ele. — Uma noite, não
muito depois de me inteirar de sua visita a essa clínica, fui a seu apartamento...
—E?
—Precisava falar com alguém, mas estava muito bêbado. À manhã
seguinte, despertei em sua cama e não recordava como tinha chegado até ali.
Profundamente afligida ao evocar essa imagem, Ashley olhou para outro
lado.
—Por isso me casei com ela —continuou ele. —Ela me amava. Acreditava
que você estava com outro homem...
—Sim.
—Meu pai se encontrava muito doente. Tinha te perdido. Na realidade
não me importava o que fazia, e assim foi como me casei. Só depois do
casamento, Carina me confessou que não tinha acontecido nada aquela noite.
Dá-se conta? Comportei-me como um autêntico estúpido.
Ashley compreendeu que Vito não tinha lhe contado a verdade a respeito
de seu casamento com Carina, porque ao fazê-lo teria ficado como um estúpido.
Carina o tinha enganado.
—Devia ter sido totalmente sincero com você —prosseguiu ele,
apertando os lábios. — Essa não foi a única razão pela qual me casei com ela.
Ela amava-me e eu queria que soubesse que podia viver sem você. Ela sabia que
eu não a amava, mas tinha a esperança de que no final o faria. Foi ela quem pôs
as fotos em todas partes. O fazia para que me sentisse culpado...
Ashley fez uma careta.
—Tratei de fazê-la feliz, mas fracassei. Não sou muito bom para as
relações... na realidade, sou um inútil!

96
Lynne Graham Desejo sem amor

—Não, não é. Se ela sabia que não a amava, sem dúvida era consciente de
que haveria problemas...
—Mas quem pode assumir uma atitude tão prática? Há quatro anos
estava tão apaixonado por você, que teria me casado com você na semana em
que nos conhecemos. Isso tampouco era prático, não? Por isso vou embora. Não
quero que tenha pena de mim.
—Por que teria pena de você? —perguntou Ashley com amargura. —
Estava decidido a se vingar.
—Nunca quis me vingar. Desejava-te... necessitava-te. Em questão de
dias me dava conta de que ainda seguia apaixonado por você! Mas não teria me
dado uma segunda oportunidade se lhe tivesse pedido isso. Odeia-me.
Acreditava que poderia fazer com que me amasse...
Ashley recordou que Vito lhe havia dito exatamente o mesmo, dois dias
antes, em seu quarto, só que ela não entendeu. Havia-lhe dito que ainda a amava
e lhe tinha pedido que o perdoasse pelo que tinha feito... mas não lhe
respondeu. «Não suporto seu silêncio», tinha comentado ele.
—Mas disse que desejava um filho! —exclamou ela.
—Não queria que suspeitasse o muito que te necessitava. E se houvesse
um filho, queria me valer dele para te conservar.
—Quando se deu conta de que não te mentia, ao te dizer que tive um
aborto natural?
—Importa isso agora? —perguntou ele, olhando-a com impaciência.
—Sim —insistiu ela. Devia sabê-lo.
—Depois de que teve o acidente no Sri Lanka. Acreditei que tinha te
perdido. Dava-me conta de que te amava e que isso era o único que importava.
Minha própria obstinação era a maior barreira que existia entre nós. Nunca
tinha me mentido, assim. Por que teria que fazê-lo respeito desse assunto?
—Será melhor que desfaça as malas de novo. Não quero que vá.
—Mas não posso viver com você assim! Sei o que pensa de mim. Acha que
sou um homem como seu pai...
—Nunca —afirmou ela, decidida. — Meu pai fez com que tivesse medo de
me apaixonar, do casamento, de ser como minha mãe. A idéia de lhe amar me
aterrava há quatro anos! Não podia entendê-lo. Mas agora sim. Não se dá
conta? Não te odeio, Vito... amo-te.
Vito a abraçou e a beijou.
—Deus! passou tanto tempo —exclamou ele. — Daria dez anos de minha
vida para fazer amor com você agora!
—Não se requer tanto sacrifício.

97
Lynne Graham Desejo sem amor

Quando Ashley o conduzia à cama, Vito repôs:


—Não podemos. O bebê. Estou lendo um livro sobre isso.
—Que livro?
Ele a olhou com expressão séria.
—Se existir perigo de aborto... nada de sexo.
—Meu médico me disse que não existem motivos para que me preocupe.
—Está certa disso?
Fazia mais de duas semanas que Vito não a tocava. Agora que já sabia por
que não o tinha feito, Ashley deixou de lado as inibições. Ele estava
incrivelmente excitado.
—Deus! Morreria se te perdesse de novo.
—Não há nenhuma possibilidade —afirmou ela.
—De verdade me ama?
—Com paixão... para sempre. Vito... o chofer deve estar te esperando no
táxi!
Vito caiu sobre a cama com ela.
—Não posso acreditar que me perdoe. Sou todo seu —comentou enquanto
lhe tirava o sutiã e lhe mordiscava um seio. — Os ciúmes me cegaram e me
impediram de ver o que lhe fazia no passado. Passei quatro terríveis anos te
desejando. Logo, aquele dia, chegou a meu escritório e de repente compreendi
que era capaz de mover céu e terra para te recuperar. Aquela noite, depois da
ópera, soube que ainda te amava. Perdi o controle...
—Eu também, e assim deve ser. Fez que nos reuníssemos de novo. Como
poderia não te perdoar por isso? —brincou ela.
—Nunca me perdoarei por não ter estado presente quando perdeu o
bebê.
—Eu o desejava com todo meu coração; era tudo o que restava de você...
—Não... —murmurou ele, enquanto ocultava o rosto entre seus seios. —
Fiquei destroçado quando não aceitou se casar comigo. Mas tinha razão. Em
grande parte, foi culpa de meu orgulho.
—Não deveria ter saído do apartamento tão cedo. Comportei-me de
modo infantil. Não podia acreditar quando não foi me buscar.
—Amo-te tanto —lhe confessou ele, abraçando-a. — Nunca voltarei a te
falhar...
—Está me falhando agora. Parece-me recordar algo a respeito desse
homem que me fazia o amor de uma maneira tão fabulosa...

98
Lynne Graham Desejo sem amor

—Os levarei para que durmam a sesta —anunciou Priya.


Marco correu para dar um beijo em Ashley. Dos dois gêmeos, era o mais
tranqüilo. Carlo, para não ficar atrás, também a beijou em uma bochecha.
—Nada de sestas, mamãe —exigiu Carlo, o mais inquieto.
—Não posso acreditar que já vão fazer dois anos —comentou Ashley,
sorrindo a sua irmã.
—O tempo voa quando somos felizes. Pergunto-me como será o meu —
respondeu Susan, dando tapinhas no ventre. — O único que me importa é que
seja saudável.
—Será.
—Nunca acreditei ter a coragem... Se não fosse pelos gêmeos...
—Uma gravidez totalmente livre de problemas —lhe recordou Ashley
com um sorriso.
Vito e Arnold se aproximaram.
—Parece muito cansada querida —expressou o primeiro. — Deve ser o
calor.
—É um descarado —declarou Ashley um pouco depois, quando ninguém
podia ouvi-los.
Vito a seguiu escada acima.
—Por que os convidados têm que mudar nossa rotina? —sorriu ele com
malícia.
—Assim agora só sou algo rotineiro, não é verdade?
—É a mulher mais apaixonada que existe e sabe disso —afirmou, levando-
a até a cama. — Aproveitemos o tempo antes que seus pais cheguem.
—Acha que gostarão deste lugar?
—Sylvia adorará, mas quanto a seu pai... o que dirá ao ver-se rodeado de
estrangeiros?
Mas Hunt Forrester tinha mudado muito. De fato, transformou-se.
Vito deslizou a ponta da língua pelo lábio inferior de Ashley.
Enquanto Vito se estremecia, ela sorria em segredo. Algum dia, quando
ele estivesse de muito bom humor, perguntaria-lhe quem tinha se submetido a
quem.

FIM

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