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TEMA 02

TEMA 2: INTRODUÇÃO À FILOSOFIA II: O


PENSAMENTO FILOSÓFICO DE SÓCRATES,
PLATÃO E ARISTÓTELES.

Bem-vindos de volta!

Figura 1 - Pólis (cidade) grega – Berço da Filosofia.

Fonte: Disponível em: www.pixabay.com

Hoje avançaremos na História da Filosofia e aprenderemos


sobre a filosofia de três pensadores importantes para o
desenvolvimento do pensamento do ocidente, tanto para a
matéria da Filosofia e da Ética, como para as ciências em geral.

FILOSOFIA , ÉTICA E
DESENVOLVIMENTO HUMANO 1
Eles oferecem os alicerces teóricos que sustentam as bases
de vários conhecimentos que hoje utilizamos. Para a Ética,
principalmente, esses autores são àqueles que vão lançar as
primeiras questões que guiarão a discussão posterior.
Então, vamos iniciar nossa explicação com uma exposição
sobre a figura enigmática de Sócrates e seu papel para o
nascimento da Filosofia, apresentando uma postura ética em
relação à sociedade, aos outros seres humanos e no trato com o
conhecimento.
Sócrates inventa uma espécie de atitude que define um
modelo do que é ser filósofo. Em seguida, trataremos de Platão,
que lança as bases da ética e da filosofia que, posteriormente,
servirá de base para uma moral que, mesmo modificada, persiste
até hoje. Depois conversaremos sobre Aristóteles, um autor
crucial para o nascimento das ciências e, mais tardiamente,
também para a ética. Estão curiosos? Vamos começar?
Na nossa leitura passada tratamos do percurso do mito
para a filosofia e aprendemos sobre o pensamento mitológico,
fundamentado em narrativas sobre os deuses e sobre o modo
como eles manipulavam as forças da natureza e o destino dos
homens. Vimos como esse pensamento foi fundamental para
o surgimento de uma outra concepção, de um modo de lidar
com a realidade baseado na capacidade do homem de conhecer
por si mesmo e compreender a realidade de forma racional,
sistematizando esse conhecimento no formato de argumentos.
Os chamados pré-socráticos abrem caminho para a
formulação do pensamento sistemático dos autores que os
sucederam e que conheceremos nesse material.

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1 SÓCRATES: A ATITUDE FILOSÓFICA

Sócrates é uma figura bastante enigmática para a história.
Ele não deixou nenhum escrito publicado, mas sua influência na
cultura foi tão forte que deixou discípulos e uma marca muito
forte no pensamento grego, sendo retratado constantemente
como personagem central dos diálogos que Platão escreveu com
o objetivo de transmitir seu pensamento filosófico.
Sócrates representa a atitude filosófica. Seu modo de viver,
argumentar e lidar com as pessoas durante as discussões define
essa atitude. Quando pensamos em um filósofo, pensamos em
uma pessoa questionadora, não é isso? Uma pessoa que pode te
tirar da sua zona de conforto e te mostrar modos diferentes de
compreender algo que você achava que conhecia plenamente.
Inquieto, o filósofo é aquele que não para de conhecer,
fazendo dessa procura pela verdade a motivação de seu trabalho
constante de questionar a si e aos outros. Pois é aquele que ama o
conhecimento. Essa figura desestabilizadora, que tira os outros
da zona de conforto, que pensa fora da caixa, é exatamente a
descrição que se faz de Sócrates e que dá origem à atitude do
filósofo em relação ao conhecimento.
Como mencionamos, Sócrates não escreveu. Ele escolheu
não escrever. O pensamento dele se desenvolvia através
de diálogos com seus discípulos que transmitiram seu
conhecimento. Sócrates procedia dessa forma não por acaso.
Para ele, o diálogo era o meio pelo qual a argumentação filosófica
deveria desenvolver-se e o modo peculiar como ele conduzia
essas conversas é uma marca importante desse pensador.
Isso se deve também à estrutura da sociedade grega. A
política na Grécia funcionava através de uma democracia em
que todas as decisões públicas passavam por uma discussão em
um espaço chamado Ágora. Na Ágora os cidadãos (vale lembrar

FILOSOFIA , ÉTICA E
DESENVOLVIMENTO HUMANO 3
que naquela época eram os homens aristocratas, excluindo os
escravos e servos e também as mulheres dessa função) reuniam-
se e discutiam sobre as questões políticas que surgiam no
convívio social e votavam para decidir como resolvê-las. Então,
o debate era uma prática muito usual e um elemento central da
vida pública da Grécia. Mas Sócrates inventa um modo diferente
de dialogar, um método, que marca o surgimento da filosofia.
Esse método inovador de Sócrates é o que chamamos de
maiêutica. Vejamos como funciona. Sócrates vivia andando pela
cidade e abordando as pessoas que encontrava pelo seu caminho.
Então, ele iniciava uma conversa sobre um tema aparentemente
banal elaborando uma questão como, por exemplo, “o que é
felicidade?”.
O interlocutor de Sócrates então, respondia à questão a
partir dos seus conhecimentos e experiências, acreditando
com certeza que sabia a resposta da pergunta proposta. Diante
disso, Sócrates se colocava sempre na posição daquele que não
sabe e permanecia perguntando ao seu interlocutor e, para
cada resposta dada, Sócrates aprofundava o debate com mais
perguntas, fazendo o seu interlocutor repensar algo que era
supostamente óbvio.
O que a maiêutica de Sócrates produzia era um processo de
exame da alma e da conduta daquele com quem ele conversava.
Isso acontecia não porque Sócrates afirmava alguma coisa sobre
a conduta ou as verdades que o seu interlocutor acreditava. Mas
pela forma como ele se colocava, como aquele que não sabe,
e pelo modo como perguntava, fazendo o seu interlocutor,
durante o diálogo, perceber que também não sabe o que pensava
saber e, assim, se ver obrigado a pensar sobre aquela questão
através de um novo ângulo.
Ao assumir a posição daquele que não sabe, Sócrates assume
o papel daquele que vive perguntando. Interessante, não é? O

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filósofo seria aquele que nunca presume saber seguindo apenas
o que mostra o senso comum e, por isso, dedica-se a perguntar
e investigar a fundo todas as aparentes verdades e conceitos que
possuímos e utilizamos de maneira não refletida, repetindo o
que nos foi ensinado ou apenas aplicando algum raciocínio
que conhecemos, mas sem nunca efetivamente investigar seu
sentido e sua causa.
O “não saber” funcionava como uma postura que, para
Sócrates, o filósofo deve assumir como estratégia do método
maiêutico, com o objetivo de produzir um diálogo em que o
interlocutor do filósofo fosse obrigado a refletir e a tornar-se
filósofo, em alguma medida.
Além do “não saber”, a maiêutica também funcionava a
partir da “ironia socrática”. Sócrates, ao escutar seu interlocutor,
assumia o que lhe foi afirmado em resposta, mesmo discordando
do conteúdo e, a partir de um tipo de simulação, fazia surgir
as contradições no interior da ideia que lhe foi apresentada.
Como uma espécie de jogo com objetivo de gerar autorreflexão.
Sócrates afirmava: “Só sei que nada sei”.
E é precisamente por não saber que Sócrates é um filósofo
e dedica-se a conhecer. Essa postura de busca pela verdade o
colocava à frente daqueles que pensam que já sabem e, por
isso, nunca investigam. Talvez isso valha também para nós,
atualmente, diante da postura que assumimos em relação ao
conhecimento em nossa vida, você não acha?
A atividade de Sócrates de perguntar e provocar as pessoas
com quem conversava a examinar a própria alma provocou
incômodo na Grécia da época, o que levou o filósofo a ser
julgado na Ágora e condenado à morte.

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Figura 2 – Pintura “A morte de Sócrates” de Jacques-Louis David,
executada em 1787.

Fonte: Disponível em: https://m.epochtimes.com.br/jacques-louis-david-representante-


estilo-neoclassico-parte-1/

Platão escreveu um diálogo que descreve o debate que


ocorreu na Ágora sobre a condenação de Sócrates, mostrando
a acusação e a defesa do próprio Sócrates. É um texto muito
bonito, chama-se “A apologia de Sócrates” e vale muito a pena
ser lido!

2 PLATÃO: AS IDEIAS, AS APARÊNCIAS E A


BUSCA PELA VERDADE
Platão, um pensador até hoje importante para o pensamento
ocidental, escreveu suas obras no formato de diálogo. Os seus
textos são todos descrições de debates em que Sócrates aparece
(na maior parte deles) na posição de filósofo e exercendo sua

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maiêutica com vários interlocutores distintos. A partir da
demonstração do jogo da argumentação (pergunta, resposta,
hipótese, refutação), Platão expunha suas teses sobre os assuntos
debatidos.
É um método interessante porque demonstra a natureza
argumentativa a partir da qual se desenvolve a filosofia e que
é parte essencial desse saber, desde seu surgimento. Dentre
os vários assuntos sobre os quais Platão escreveu (e foram
realmente muitos assuntos, como ética, estética, política etc), um
ponto importante da obra do autor é a sua Teoria das ideias, que
levou ao surgimento da disciplina que chamamos “metafísica”
no interior da Filosofia.
No seu livro A República, Platão escreve sobre uma
república ideal, mostrando qual a melhor forma de organizar
a cidade e os cidadãos para uma convivência harmônica e uma
cidade melhor. Nesse texto, Platão compreende a cidade como
uma representação em grande escala da alma humana. É como
se, para ele, uma sociedade refletisse a alma dos indivíduos que
a compõem.
Então, na medida em que expõe a organização social, ele
expõe as características da alma humana, seus vícios e virtudes.
Para Platão, são três as partes da alma: a concupiscente, ligada
aos desejos e apetites mais básicos; o lado irascível, ligado à
coragem, honra e impetuosidade e, por último, a razão, cuja
função é organizar e guiar da melhor forma as outras duas partes.
Para Platão, cada parte da alma corresponde a uma função na
cidade, respectivamente: o servo, o guerreiro e o filósofo. Para o
filósofo, a parte mais nobre e elevada da alma é a parte racional
e alcançar o pleno contato e controle dessa faculdade é crucial
para o desenvolvimento da alma humana.
No capítulo 5 desse livro, Platão escreve uma metáfora
ilustrativa com intenção de mostrar o processo de evolução do

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DESENVOLVIMENTO HUMANO 7
apego aos sentidos e às partes mais baixas da alma, até o contato
com sua parte racional. Essa alegoria expõe também sua teoria
das ideias, que vamos conhecer agora.

O mito da caverna

Nesse texto, Platão nos


pede para imaginar uma
caverna. Nessa caverna
encontram-se várias
pessoas acorrentadas
viradas de frente para
uma parede de pedra.
Atrás dessas pessoas está
uma fogueira acesa. A luz
dessa fogueira faz refletir
na parede para qual
estão virados os presos as
sombras dos animais que
transitam e das coisas que
se encontram em volta
Fonte: Disponível em: https://bitylink.
da fogueira dentro da com/kgufp
caverna.
Como estão acorrentados, os homens veem apenas as
sombras na parede, mas nunca os objetos reais. Isso
reflete, para Platão, como vive o homem comum. Ele
tem contato apenas com o mundo sensível e desconhece
as formas reais, reconhece somente suas “sombras”, ou
seja, suas manifestações no mundo que acessamos a
partir dos sentidos.

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Para Platão, existem duas realidades, a realidade inteligível e
a realidade sensível. A primeira é imutável e universal, o mundo
das ideias. A segunda é múltipla e mutável, o mundo sensível. O
mundo sensível, como o nome já demonstra, é composto pelo
que acessamos com nossos sentidos: uma variedade de coisas,
animais, objetos etc. Essas coisas são múltiplas. Conhecemos o
que é um cavalo, por exemplo, mas, ao longo de nossas vidas,
cada cavalo singular que entramos em contato será diferente em
relação ao outro.
É sobre isso que fala Platão quando diz que no mundo
dos sentidos os seus objetos são múltiplos, pois são singulares
e possuem características específicas que os diferem entre si,
mesmo que reconheçamos que pertencem a mesma categoria,
a de cavalos, por exemplo. No mundo sensível também as
coisas perecem, envelhecem, mudam, adquirem ou perdem
características. Ou seja, o mundo sensível está em constante
movimento. Esse é o mundo que temos contato imediato, mas
não é a única realidade possível. Existe a realidade inteligível
que acessamos com a razão. Para entrar em contato com ela
precisamos deixar de lado o apego aos sentidos e nos dedicarmos
a reflexão.
O mundo das ideias é fixo, permanente e infinito. Ele abriga
os conceitos e ideias gerais que definem as coisas no mundo,
mas que não se reduzem às suas representações singulares no
mundo sensível. É como se para Platão o mundo tivesse uma
forma a priori, ou seja, anterior ao mundo sensível que, por sua
vez, é uma estrutura inteligível.
Voltemos ao exemplo do cavalo, para ficar mais claro.
Conhecemos cavalos de diversos tipos, cores, tamanhos, porém,
apesar das diferenças entre eles, reconhecemos que todos
fazem parte da categoria cavalo. Cavalo aí é uma ideia geral que
possuímos que nos possibilita reconhecer os vários e diferentes

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animais, mesmo com suas características particulares, são todos
cavalos. Essa é a ideia de cavalo, ela define o cavalo real que
vemos, montamos, tocamos, alimentamos, mas não se reduz a
essa representação sensível. Esse conceito é universal, podendo
ser aplicado a objetos distintos, e imutável, apesar de sua
representação sensível estar em constante mudança. O mundo
das ideias abriga toda espécie de ideias que são anteriores e
independentes do mundo físico, mas que o definem.
Voltemos para a alegoria da caverna. Agora fica mais claro
porque as pessoas presas que enxergam apenas as sombras
projetadas na parede estão acessando apenas o mundo sensível?
Para Platão, elas não conseguem ver as coisas em si, apenas
a representação sensível das coisas, ou seja, sua apresentação
imperfeita e transitória, como sombras que são apenas silhuetas
dos objetos reais projetados pela luz. Isto é, são representações
ilusórias. Para alcançar o mundo das ideias é preciso romper as
correntes que prendem o homem à mesma posição, permitindo
apenas a visão de uma perspectiva, e virar-se para entender o
mecanismo que gera as sombras na parede.
Ao homem que romper as correntes, será possível também
escalar para fora da caverna e ver, com os próprios olhos, o
mundo lá fora. Esse processo Platão chama de educação, é
o empenho para desenvolver a razão, se desvencilhando das
ilusões dos sentidos e escalando em direção à uma percepção
mais ampla e verdadeira sobre as coisas. Esse homem que decide
mover-se e romper as correntes é o filósofo.
Após vencer os estágios da escalada para fora da caverna
que limitava sua percepção das coisas, o filósofo então volta
à caverna com o intuito de avisar aos outros homens sobre o
caráter ilusório das sombras que eles viram projetadas na parede
durante toda a vida. No entanto, segundo Platão, o filósofo
não é compreendido por todos que, apegados ao que veem e

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conhecem, consideram que esse homem só pode estar louco ao
afirmar que possa existir outras coisas que não as sombras que
eles conhecem.

Figura 4 - Platão

Fonte: Disponível em: https://bitylink.com/9cr3B

Essa é a teoria das ideias de Platão. A partir dessa teoria


surge o que chamamos de metafísica. A metafísica seria o
estudo daquilo que está além do físico. Ao definir a existência
de um mundo das ideias, Platão inicia os estudos dessa matéria
da filosofia que vai se desenvolver ao longo da história e é
estudada até hoje. Platão apresenta uma imagem interessante
para explicar que tipo de investigação realiza a metafísica: a
segunda navegação.

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No vocabulário dos navegantes da época, a segunda
navegação é aquela que acontece quando cessam os ventos e,
desse modo, o barco não pode mais navegar usando as velas,
é necessário que se recorra à força dos remos para mover a
embarcação. O impulso do vento, que leva o barco ao sabor de
sua força e intensidade constantemente mutável, representa,
na metáfora apresentada por Platão, a atenção aos sentidos, ao
mundo natural e a sua representação real sensível.
Figura 5 – O mito da caverna

Fonte: Disponível em: https://bitylink.com/9cr3B

A navegação realizada à remo, por outro lado, depende


das forças dos navegantes e, assim, de seu esforço e vontade.
Ela representa o trabalho de compreender aquilo que está para

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além do mundo sensível através de uma elaboração pessoal e do
uso da razão. A metafísica seria essa procura pelas verdadeiras
causas. A procura pela ideia, ou forma, a tentativa de alcançar a
natureza real das coisas, as coisas em si, e não sua representação
ilusória.

Vejamos a síntese dos dois mundos propostos por Platão.

Quadro 1 - Os dois mundos de Platão

Mundo das ideias


Formas
Estáveis
Imutáveis
Universais

Mundo sensível
Objetos sensíveis
Mutáveis
Falíveis
Particulares

3 ARISTÓTELES: A SISTEMATIZAÇÃO DAS


CIÊNCIAs
A pintura mostra a academia, local onde os filósofos
reuniam-se para discutir filosofia. Ao centro estão Platão e
Aristóteles. Platão aponta para cima, remetendo a sua doutrina
das ideais. E Aristóteles aponta para baixo, remetendo a sua
dedicação às ciências.

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Figura 5 – Academia de Filosofia

Fonte: Disponível em: www.pixabay.com

Aristóteles avança no debate da metafísica iniciado por


Platão e realiza um trabalho importante de sistematização das
ciências, seus tipos e funções, que serviu de base, inclusive,
para a forma como hoje compreendemos e organizamos o
conhecimento. Aristóteles define quais são os tipos de ciência
que existem, qual o objeto de cada uma dessas ciências, como
se relacionam entre si e, desenvolvendo uma hierarquia, define
qual é a ciência mais fundamental e quais são as outras menos
fundamentais.
Aristóteles definiu as ciências em três ramos: as ciências
teoréticas, as ciências práticas e a poiéticas. As teoréticas
procuram investigar o saber pelo saber, são elas a metafísica e a
física. As práticas, utilizam o saber com a intenção de propiciar
o aperfeiçoamento moral, são a ética e a política. As ciências

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poiéticas se ocupam da criação de coisas e objetos e buscam o
saber em função do fazer, é a técnica. Para ele, as ciências mais
elevadas são as ciências teoréticas, que se ocupam do saber
em si, as outras duas são formas secundárias de conhecer, na
medida em que submetem o saber a um uso prático e, assim, o
limitam a um objetivo específico, no caso, sua utilidade.
As ciências teoréticas realizam uma reflexão ampla e
profunda, já que não estão condicionadas a um objetivo
específico. Elas seriam, por isso, ciências mais elevadas. Dentre
as ciências teoréticas, a metafísica é, para Aristóteles, a ciência
mais elevada. Ele chama de ciência primeira. Primeira no sentido
de que ela trata dos princípios mais basilares, mais gerais e mais
abstratos que são anteriores a qualquer utilização e aplicação
de ciências com objetivos práticos. Aristóteles circunscreve o
objeto da metafísica a partir de quatro definições:

I. Ela pergunta pela causa ou princípios supremos.


II. Ela indaga pelo ser enquanto ser.
III. Questiona sobre a substância.
IV. Pergunta por Deus e a substância supra-sensível.

O objeto principal de investigação da metafísica é a busca
pelas causas primeiras. Segundo Aristóteles, existem quatro
causas que determinam o ser, elas são o fundamento e o
princípio das coisas, correspondem as causas formal, material,
eficiente e final.
As causas formal e material dizem respeito à forma ou
essência da matéria que constituem todas as coisas. A causa
eficiente aponta para a causa que gerou determinada coisa, a
força motriz, e a causa final se refere ao fim ou objetivo ao qual
se destina o devir. Talvez um exemplo nos ajude a compreender
melhor. Se pensarmos no homem, a causa material seria o que

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constitui seu corpo: carne, osso, pele, órgãos. A causa formal
seria sua essência, sua alma. Se perguntarmos sobre quem gerou
esse homem, estaremos perguntando pela causa eficiente. E se
quisermos entender a que se destina a existência desse homem,
qual seu objetivo, perguntaremos pela causa final.
Com essa divisão colocada, Aristóteles pergunta o que
é a substância e como defini-la. Os pré-socráticos definiam
a substância através dos elementos materiais, como Tales,
que considerava que a água é a origem (arché) da natureza
(physis). Platão disse que a substância é a forma, ou ideias,
que são universais e estáveis, e que definem as coisas em sua
multiplicidade no mundo sensível. Quem teria razão, para
Aristóteles?
Ninguém tem razão, para ele. Porque, se tomadas
individualmente, essas respostas apontam para elementos
parciais, mas não para o todo da questão. É preciso pensar em
um conjunto. A matéria é o princípio constitutivo de todas as
coisas sensíveis. Se eliminássemos a matéria não haveria coisas
sensíveis. Porém, Aristóteles argumenta que a matéria sozinha
é indefinida e somente a substância lhe oferece determinação.
A forma é o princípio que concretiza e realiza a matéria.
Ela define o que é cada coisa, a substância. Diferente de Platão,
Aristóteles não separa a matéria e a forma (ou substância) como
duas realidades separadas. Ao contrário, para ele as duas coisas
coexistem no ser. Os seres seriam compostos de forma e matéria,
mas a substância, o ser em si, estaria determinado pela forma.
Assim, em sentido impróprio apenas pela matéria e em sentido
mais próprio pela junção entre matéria e forma.
Porém, a definição mais basilar e mais fundamental do
ser que o define por excelência é a substância. Esse é o objeto
da metafísica, a ciência primeira justamente porque trata das

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causas primeiras, àquelas que antecedem a todas as definições
particulares que podemos oferecer ao ser.
Vejamos, a partir desse momento, os quadros-resumo da
divisão das ciências de acordo com a perspectiva aristotélica,
das características do objeto da metafísica e, por fim, das causas
que determinam o ser.

Quadro 2 - A divisão das ciências segundo Aristóteles

Teoréticas
Física e Metafísica
Práticas
Ética e Política
Poiéticas
Técnica

Fonte: Autoria própria, 2019.

Quadro 3 – Metafísica: objeto e causas determinantes do ser

O objeto da Metafísica
I. Pergunta pela causa ou princípios supremos;
II. Indaga pelo ser enquanto ser;
III. Pergunta sobre a substância;
IV. Por Deus e a substância supra-sensível.

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AS CAUSAS
Formal
a alma ou essência
Material
refere-se à matéria que compõe o corpo
Eficiente
aquilo que gera, força motriz
Final
a finalidade ou objetivo

Fonte: Autoria própria, 2019.

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REFERÊNCIAS
SOUZA, José Cavalcante de (Org). Os pré-socráticos: Fragmentos, Doxografia
e Comentários. Trad. José Cavalcanti de Souza et al. São Paulo: Nova Cultural,
1996. (Coleção os Pensadores).

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