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Entrevista com o técnico Bernardinho dada ao portal Empregos.com.

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Empregos.com.br – Segundo Carlos Alberto Julio, presidente da HSM, a


idéia de convidar você para o Fórum era saber por que sua equipe muda
sempre mas mesmo assim a vitória permanece. Qual é o segredo?
Bernardinho - As peças geralmente são trocadas por necessidades técnicas
ou físicas, e também pela busca da evolução. Mesmo assim, o corpo de
talentos é voltado para a equipe, independente dos anseios individuais. O
objetivo coletivo é que leva à evolução do grupo.
O talento individual vale muito, mas desde que esteja inserido na equipe. Por
isso, a partir do momento que temos esse espírito, mesmo com algumas
mudanças conseguimos vencer pelo coletivo.

Empregos.com.br – Quais são os componentes necessários para formar


uma equipe vitoriosa?
Bernardinho - Talento, treinamento, empenho, dedicação, obstinação e o
comprometimento coletivo. Temos que ganhar campeonatos, não só partidas.
O trabalho de longo prazo depende disso, por isso esses itens devem ser uma
constante. Precisamos de paixão, de intensidade máxima naquilo que fazemos.

Empregos.com.br – Como fazer com que a equipe esteja sempre


disciplinada e motivada para vencer?
Bernardinho - Pessoas que não tem a capacidade de se motivar e superar
geralmente não conseguem se manter em ambientes de alta performance. É
algo próprio de cada um, mas nós líderes podemos ajudar, dando condições
para isso e propondo desafios. É preciso conhecer as pessoas para saber que
instrumentos usar para motivá-las. Durante o processo ganha-perde, é preciso
que o atleta ou o profissional do mundo corporativo continue motivado e firme
depois de uma vitória, para não acomodar, e também que saiba lidar com a
pressão constante das exigências, que só aumentam. Um ponto positivo das
últimas Olimpíadas é que conseguimos ganhar sendo apontados como favorito,
porque assim conseguimos evitar a acomodação. Mesmo perdendo alguma
partida, precisávamos manter o foco naquilo que esperavam de nós, que era o
primeiro lugar.

Empregos.com.br - As competências para a alta performance podem ser


desenvolvidas ou já é preciso ter uma base?
Bernardinho – É muito bom que a pessoa tenha algum tipo de vocação nata
sim, mas uma série de outras características, como a liderança, importante
para atletas de ponta e empresários, pode ser desenvolvida. Não adianta ter
muito talento e não ter determinação, por exemplo. Cabe aos gestores
descobrir isso e ajudar seus liderados a desenvolver. O Cafu, da seleção
brasileira, passou por 12 peneiras no início da carreira e foi barrado em todas.
Poderia ter desistido, mas por sorte não o fez. Ele é o mais talentoso? Não,
mas é o mais eficiente e persistente. Acredito que aqueles que os testaram
buscavam nele o que ele não tinha, e não enxergaram o resto. A melhor equipe
não é a soma dos melhores talentos mas a soma dos talentos que se
complementam da melhor forma possível. Assim, na hora de selecionar
pessoas, é preciso ter atenção para enxergar aquilo que elas tem de melhor, e
não aquilo que gostaríamos que elas tivessem.

Empregos.com.br - Como você percebe o talento no atleta? Como faz a


seleção daqueles que têm futuro e daqueles em quem não vale a pena
investir?
Bernardinho – Por meio da observação, ao vê-los em ação. Além disso, avalio
o comportamento, a postura, o equilíbrio emocional e o histórico, ou currículo,
como dizem no ambiente corporativo. As estatísticas também são
fundamentais: muitas vezes somos iludidos por uma performance magnífica,
mas o rendimento efetivo não a acompanha, ou então em outras situações o
profissional cometeu erros que podem atrapalhar toda a estratégia. Nós
fazemos o contraponto entre erro e acerto. Queremos índice de eficiência
máximo.

Empregos.com.br - Você sugere que os profissionais de Recursos


Humanos usem esses critérios para selecionar talentos?
Bernardinho - Eu tenho a vantagem de poder observar durante o processo de
evolução, e talvez trocar o componente da equipe, já às empresas não podem
esperar para contratar depois de observar muito. Mesmo assim eu me
considero um profissional de RH hoje, já que tenho a tarefa de juntar talentos
que rendam o máximo. Eu trabalho com pessoas, eu me preparo para a
tomada de decisão exatamente com base em processos seletivos, e na hora de
cortar eu também preciso considerar qual a melhor formação da equipe, e não
apenas o talento individual.

Empregos.com.br - Como o líder deve agir quando se forma uma lacuna


entre os resultados esperados e os que a equipe consegue?
Bernardinho - A primeira coisa é avaliar o próprio desempenho, porque líderes
tem que ser autocríticos, mais do que com as outras pessoas. Eles devem se
perguntar “até que ponto eu fui capaz de prepará-los?” O bom líder aprende
com as derrotas, entende onde está a falha, inclusive porque essa é a única
chance de não sucumbir à frustração e ter fôlego para tentar de forma
diferente. Superação é ter a humildade de aprender com o passado e investir
no futuro. O que me mantém vivo é a possibilidade de tentar novamente no dia
seguinte. Por isso os líderes estão sempre observando e aprendendo com os
outros. Isso é melhor ainda, porque ajuda a evitar o erro. Buscar exemplos de
sucesso é fundamental também, além de promover a capacitação constante.

Empregos.com.br - Por que no mundo corporativo parece mais difícil


fazer tudo isso funcionar?
Bernardinho - As pessoas com real capacidade fazem as coisas funcionar
muito bem, certamente há grandes lideranças no mundo empresarial, mas a
diferença está no “day by day” da minha atividade. Numa empresa não dá para
ter contato constante com os funcionários, trocar coisas o tempo todo, porque
há muito volume de trabalho e o número de pessoas é grande. Às vezes o
contato de grandes empresários com as pessoas é esporádico, por isso pelo
menos o grupo de líderes tem que ser multiplicador e disseminar a idéia. Eu
não acredito em equipes que tem um só líder, é preciso ter pessoas que
assumam o bastão em algumas situações. Quanto mais líderes a empresa
tiver, mais pessoas com essa capacidade, é melhor. Temos no Brasil grandes
empresários, só que eles não aparecem tanto como os grandes atletas. A
diferença está apenas no nível de visibilidade.

Empregos.com.br - Você tem gurus ou exemplos inspiradores? Quem são


eles?
Bernardinho - Eu estou sempre lendo e observando pessoas do esporte,
empresários e também pessoas de outras áreas. Pessoas de sucesso. Eu olho
para a Gerdau, por exemplo, e penso na capacidade dos líderes, na técnica, e
fundamentalmente nos valores e princípios que eles inspiram nos
colaboradores. Eles contaminam as pessoas. Eu tenho livros e tive contatos
com pessoas que aprendi a admirar. São profissionais que têm como
preocupação principal as pessoas, afinal não há empresa que não se envolva
com o crescimento das pessoas e consiga atingir a inteligência nos negócios.
Michael Jordan, por exemplo, é alguém que soube associar o talento com o
ideal de busca da excelência.

Empregos.com.br - Você se considera um líder?


Bernardinho - Eu estou um líder. Tenho conseguido inspirar as pessoas e
atingir resultados, mas se eu perder alguns atributos, não renovar minha
capacidade, meu porto não é perpétuo. Eu sou alguém que peca pelo excesso
e não espero que sejam como eu, pelo contrário, minha equipe técnica é
multidisciplinar, são talentos complementares, assim como a equipe de
jogadores.

Empregos.com.br - Qual foi o momento mais difícil para você exercer sua
liderança? Por quê?
Bernardinho – Um momento bastante difícil foi o que passei com a seleção
feminina em Atlanta, quando perdemos para Cuba na semi-final e menos de
48h depois fomos disputar o bronze. Elas estavam arrasadas e a estratégia
que usei foi dar treinamento dobrado, para tirar o foco da derrota e fazer com
que pensassem só no próximo jogo. Quando uma atleta me disse “ai, estou
cansada e não vou conseguir jogar amanhã” eu percebi que estava
funcionando, porque ela já tava pensando no dia seguinte. A melhor maneira de
superar a derrota de ontem é pensar na vitória de amanhã.

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